Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
334/14.7T4AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA JOSÉ COSTA PINTO
Descritores: AÇÃO DE IMPUGNAÇÃO DO DESPEDIMENTO COLETIVO
RECLAMAÇÃO DE CRÉDITOS RETRIBUTIVOS
PRESCRIÇÃO DE CRÉDITO
RETRIBUIÇÃO VARIÁVEL
Nº do Documento: RP20150615334/14.7T4AVR.P1
Data do Acordão: 06/15/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I – A regra especial da prescrição de créditos no plano laboral consagrada no art. 337º n.º 1 do CT 2009 não é substituída pelo prazo de 6 meses que o art. 388º n.º 2 do mesmo CT fixa como prazo limite para a instauração da acção de impugnação do despedimento colectivo.
II – A reclamação de créditos retributivos emergentes da execução do contrato de trabalho que findou por despedimento colectivo aceite pelo trabalhador, mostra-se sujeita aquele prazo de prescrição mas não a qualquer prazo de caducidade.
III – Os factos de o trabalhador não ter impugnado a decisão do despedimento, ter aceite a compensação disponibilizada pela cessação do contrato e não ter, nas reuniões de negociação, manifestado a sua pretensão em ser ressarcido de tais créditos, não é susceptível de criar no empregador um estado objectivo de confiança no sentido de que o trabalhador se abstenha, no futuro, de reclamar outros direitos de que entenda ser titular.
IV – À luz da Convenção Colectiva de Trabalho entre a D… e a FETESE-Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e outros, a “retribuição variável mensal” prevista nas suas cláusulas que regulam a atribuição dos subsídios de férias e de Natal, abrange a média da remuneração do trabalho suplementar prestado regularmente ao longo dos 12 meses anteriores.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 334/14.7T4AVR.P1
4.ª Secção

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
II
1. Relatório
1.1. B…, intentou em 30 de Abril de 2014 contra “C…, S.A.” a presente acção com processo comum, peticionando seja a ré seja condenada a reconhecer-lhe a categoria de “Preparador de laboratório”, desde Agosto de 1992 até Maio de 2005 e de “Expedidor-controlador”, a partir de Junho de 2005, inclusive, e a pagar-lhe a quantia de € 41.435,50, a título de diferenças salariais decorrentes da reclassificação profissional devida e diferenças retributivas referentes a férias, subsídios de férias e subsídios de Natal vencidos nos anos de 1993 em diante, calculadas em função da integração nos mesmos da média das retribuições pagas a título de trabalho suplementar, nos doze meses anteriores, acrescida de juros de mora até integralmente pagamento.
Alega para tanto, em síntese: que desempenhou até Maio de 2005, por ordem e no interesse da R., no âmbito do contrato de trabalho entre ambos celebrado em 13 de Julho de 1992, funções próprias da categoria profissional de “Preparador de Laboratório”, tal como se encontram definidas no Instrumento de Regulamentação Colectiva do Trabalho aplicável à relação laboral; que esteve indevidamente categorizado pela R. como “Preparador auxiliar de laboratório”, a partir de 1 de Junho de 2005, como “Operador de central de betão” e a partir de Outubro de 2008 e até à cessação do contrato de trabalho como “Operador de Produção I” categoria esta que detinha, à data da cessação do respectivo contrato de trabalho; que as funções que exerceu a partir de 01 de Junho de 2005 até final são as da categoria profissional de “Expedidor-controlador” (mais tarde redenominada de “Operador de produção II”); que, não obstante, a R. pagou-lhe a retribuição base mensal correspondente às categorias que lhe atribuiu, pelo que lhe são devidas as correspondentes diferenças salariais; que a título de férias, subsídios de férias e subsídios de Natal vencidos nos anos de 1993 em diante, a R. apenas lhe pagou importâncias correspondentes ao respectivo vencimento base e diuturnidades (quando passou a recebê-las), mas por ordem e no interesse da R. e pelo menos desde Agosto de 1992 (inclusive), o A. prestou, com regularidade mensal, trabalho suplementar, tendo recebido, igualmente com regularidade mensal, a retribuição correspondente, pelo que a respectiva média deve ser integrada nas retribuições referentes a férias e a subsídios de férias e de Natal.
Realizada a audiência de partes, e não tendo havido conciliação, foi ordenada a notificação da R. para contestar, vindo esta a apresentar o correspondente articulado no qual alegou, em síntese: que a aceitação do despedimento colectivo e a interposição da presente acção configuram um comportamento por parte do A. contraditório e atentatório do princípio da confiança e da boa-fé, pois se o A acreditasse verdadeiramente naquilo que vem alegar, não teria deixado de invocar esses mesmos direitos e pretensões na reunião de negociação do despedimento colectivo em que participou, ou na reunião individual subsequente onde lhe foram apresentados os cálculos das contas finais; que nos termos do art. 383º do Código do Trabalho, o não pagamento dos créditos salariais devidos pela execução e cessação do contrato de trabalho e da compensação legal, gera a ilicitude do despedimento, pelo que se deve considerar que, ao não ter impugnado o despedimento com base no não pagamento desses créditos, o A. renunciou ao direito de os obter; que no caso de contratos de trabalho que cessem no âmbito de um despedimento colectivo, o prazo de prescrição dos créditos laborais previstos no art. 363/5 do Código do Trabalho, cuja falta de pagamento justificaria a ilicitude do despedimento, é de 6 meses, por corresponder ao prazo para questionar a licitude do despedimento, e não já um ano; que é correcta a classificação do A. face às funções por si desempenhadas, desempenhando os mesmo outras tarefas de forma precária e residual, pelo que não pode exigir a sua reclassificação profissional; que não assiste razão ao A., em relação à pretendida integração da média das quantias pagas a título de trabalho suplementar, nas remunerações por férias, subsídios de férias e de Natal, na medida que a remuneração do trabalho suplementar não deverá ser entendida como parte da retribuição base; que, se assim não se entender, só serão devidos juros de mora sobre as eventuais prestações em dívida a partir da interpelação da R. para pagamento com a interposição de presente acção. Pede que se considere a acção totalmente improcedente, por inexistirem quaisquer créditos salariais em dívida ou, se assim não se entender, deverá concluir-se que o A. renunciou a tais créditos, ao não ter impugnado judicialmente a decisão do despedimento ou que esses créditos prescreveram, por não terem sido reclamados no prazo de 6 meses após o despedimento.
O A. respondeu sustentando, em suma, que o facto de não ter reclamado os créditos e direitos que agora veio peticionar no âmbito das alegadas negociações que precederam o despedimento colectivo que o abrangeu, não significa que a isso estivesse obrigado nem que não acredita na razão e fundamento dos mesmos ou, sequer, que a reclamação formulada na presente acção consubstancie qualquer comportamento contraditório e atentatório do princípio da confiança e da boa-fé; que nada existe na lei que imponha ao trabalhador a obrigação de apresentar no procedimento de despedimento colectivo a reclamação de todos os créditos que considere ou não serem-lhe devidos, até porque pode haver alguns de que só posteriormente tenha conhecimento e, muito menos, que, pelo facto de não os reclamar nesse momento e de aceitar o despedimento por não oposição ao mesmo e receber a compensação que lhe seja indicada pela entidade empregadora, fique impedido de fazê-lo em acção própria visando esse desiderato; que não houve propriamente negociação na reunião em causa, onde a empresa apresentou as razões do despedimento colectivo e, como facto consumado, os valores que tencionava pagar como indemnização e nunca houve renúncia do A. aos direitos invocados na presente acção, nem prescrição dos créditos
Foi proferido despacho saneador em que se relegou para final o conhecimento das excepções suscitadas e dispensou-se a realização de audiência preliminar, bem como do saneamento do processo. Fixou-se aí à acção o valor de € 49.353,61 (fls. 347 e ss.).
Após realizado o julgamento, foi proferido despacho que decidiu a matéria de facto em litígio, o qual não foi objecto de reclamação (fls. 351 e ss.).
Em 30 de Outubro de 2014 foi proferida douta sentença que terminou com o seguinte dispositivo:
“[…]
Em face de todo o exposto, julgando a acção parcialmente procedente, decide-se:
A) Reconhecer ao A. a categoria profissional de “Preparador de laboratório”, desde Agosto de 1992 até Maio de 2005 e de “Expedidor-controlador”, a partir de Junho de 2005, inclusive, até final do contrato.
B) Condenar a R. a pagar ao A.:
- A quantia de € 41.428,52 (quarenta e um mil, quatrocentos e vinte e oito euros e cinquenta e dois cêntimos), a título de diferenças salariais decorrentes da reclassificação profissional devida e de diferenças retributivas referentes a férias, subsídios de férias e subsídios de Natal vencidos nos anos de 1993 em diante, calculadas em função da integração nos mesmos da média das retribuições pagas a título de trabalho suplementar, nos doze meses anteriores;
- Juros de mora contabilizados sobre cada um desses diferenciais em dívida, desde o respectivo vencimento até à data da propositura da acção (30/04/2014), às taxas legais em vigor na altura desse vencimento, no valor global de € 7.917,73 (sete mil, novecentos e dezassete euros e setenta e três cêntimos), mais os vencidos e vincendos sobre o capital em dívida, desde 01/05/2014, até efectivo e integral pagamento.
C) No mais, absolver a R. do pedido.
[…]”
*
1.2. A R, inconformada, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar a sua alegação, as seguintes conclusões:
“1. O A, não ter impugnado a decisão do despedimento e ao vir reclamar créditos laborais cujo não pagamento geraria a licitude do seu despedimento, e ao não ter, nas reuniões de negociação (colectivas e Individuais), manifestado a sua pretensão em ser ressarcido de tais créditos, vem exercer de forma abusiva o seu direito numa conduta atentatória do princípio da confiança e da boa-fé, tanto mais que no passado o Ré, sempre que se achou credor da Empresa não deixa de manifestar essa sua posição à Ré.
2. Ao decidir em sentido contrário a douta decisão em crise violou o disposto no art. 334. do Código Civil.
4. No âmbito de um despedimento colectivo que, por definição, abrange vários colaboradores, é justificável, em nome da preservação da unidade produtiva que permanece, da paz social e dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, que a entidade patronal possa, num prazo relativamente curto, conhecer os impactos dessa sua decisão, seja ao nível dos fundamentos do despedimento seja ao nível de outras questões que o trabalhadores despedidos possam ter contra si, sobretudo se estas últimas forem susceptíveis de ter impacto na validade do despedimento, como é o caso do créditos laborais por liquidar.
5. Esse prazo, através de uma interpretação logico/sistemática dos arts. 337º/1, 363º/5, 383º/c) e 388/2 do Código do Trabalho, será o prazo de 6 meses, por corresponder ao prazo para questionar a licitude do despedimento, pelo que aos créditos laborais de um trabalhador cujo contrato de trabalho cesse no âmbito de um despedimento colectivo aplicar-se-á um prazo de prescrição 6 meses e não já o prazo de 1 ano previsto no art. 337º/1.
6. Ao decidir em sentido contrário, a douta decisão em crise violou os arts. 337º/1 (interpretado como regra e que comporta a excepção que se defende …), 363º/5, 383º/c) e 388º/2 do Código do Trabalho com o alcance referido.
7. No período posterior à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003, os subsídios férias e de Natal a que o A tem direito deverão ser calculados sem considerar o valor do trabalho suplementar por força do novo regime do Código do Trabalho na versão de 2003 e de 2009.
8. Contrariamente ao defendido na decisão em crise, o nº1 do art. 11º da Lei Preambular do Código do Trabalho de 2003 só se aplica aos casos que se traduzam numa descida de remuneração face a um histórico/prática no âmbito de uma determinada relação laboral (o nº 2 do 11º reforça, claramente, este entendimento...)
9. A circunstância de a Ré, efectivamente, não computar o trabalho suplementar no cálculo do subsídio de Natal do A, antes de 2003, não legitimará a aplicação do referido art. 11º/nº1, pois de tal prática não resultou, efectivamente, a partir de 2003, a diminuição da retribuição auferida pelo A.
10. A retribuição variável mensal prevista na cláusula do CCT que regula a atribuição do subsídio de Natal, com a alteração operada em 15/02/2008, não abrange a média da remuneração do trabalho suplementar, na verdade,
11. A essência da retribuição variável, ao contrário da retribuição certa que se determina em função do tempo de trabalho, assenta, precisamente, na inexistência de uma relação directa entre o seu valor e o tempo de trabalho: será assim numa comissão por vendas, prémio por objectivos, prémios de produção, etc..
12. Ora, a remuneração por trabalho suplementar, como é inequívoco, não sobrevive sem a relação tempo/valor.
13. Quanto ao cálculo do subsídio de férias, o pagamento do trabalho suplementar não integra o conceito de prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho, conceito - introduzido pelo Código do Trabalho de 2003(art 255º/2) e mantido na versão de 2009 (art. 264º/2). Na verdade
14. Modo e tempo são conceitos que não se confundem. Assim o modo específico terá que ver com condicionalismo externos e contingências que rodeiam a forma/maneira como a prestação é executada (perigosidade, toxidade, o trabalho nocturno etc)..
15. O pagamento do trabalho suplementar é reflexo apenas e tão só da contrapartida do trabalho que excede o horário diário, sendo que a prestação executada e as condições que a enquadram são rigorosamente idênticas às que se verificam durante o horário de trabalho.
16. A decisão em crise, ao concluir pela inclusão da média do trabalho suplementar prestado pelo A no cálculo dos subsídios de férias e de Natal que se venceram a partir de 2003, violou o disposto nos arts 250º/1, 252º/1, 254º/1, 255º/2 do Código do Trabalho na versão de 2003, e arts 261º/2, 262º /1, 263º/1, e 264º/2, na versão de 2009.
Termos em que deve ser dado provimento ao presente recurso, concluindo-se pela inexigibilidade dos créditos peticionados, seja por via do abuso do direito, seja por via da prescrição ou, se assim não se entender, o que por mera cautela de patrocínio se pondera, deverá ser revogada a decisão em crise na parte em que considera que na determinação dos subsídios de férias e de Natal posteriores a 2003 é relevante o valor do trabalho suplementar prestado pelo A.”
1.3. O A. apresentou contra-alegações em que pugna pela manutenção da sentença.
1.4. O recurso foi admitido com efeito suspensivo, atenta a caução prestada.
*
1.5. Recebidos os autos neste Tribunal da Relação, a Exma. Procuradora-Geral Adjunta pronunciou-se, em parecer que não mereceu resposta das partes, no sentido de ser negada a apelação.
Colhidos os “vistos” e realizada a Conferência, cumpre decidir.
*
*
2. Objecto do recurso
*
Sendo o âmbito do recurso delimitado pelas conclusões do recorrente – artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil aplicável “ex vi” do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho – as questões que fundamentalmente se colocam à apreciação deste tribunal, por ordem lógica da sua apreciação, consistem em saber:
1.ª – se se verifica a prescrição dos créditos reclamados pelo A;
2.ª – se o A. agiu em abuso do direito ao reclamar créditos salariais que não referiu nas negociações conducentes ao despedimento colectivo que aceitou;
3.ª – se a média da retribuição paga por trabalho suplementar prestado se reflecte nos subsídios de férias e de Natal vencidos após a entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003.
*
*
3. Fundamentação de facto
O tribunal recorrido considerou provados os seguintes factos:
«1. A R. dedica-se à fabricação de betão pronto.
2. A R. possui e explora, por sua conta e risco, entre outros estabelecimentos do mesmo género existentes noutros pontos do país, uma C1… sita na Rua …, ..., ….-… Aveiro.
3. No exercício dessa actividade industrial, a R. admitiu o A. ao seu serviço, em 13/07/1992.
4. O A. sempre exerceu com zelo e assiduidade a respectiva actividade profissional, sob as ordens, direcção e fiscalização da R., sem qualquer solução de continuidade do respectivo contrato de trabalho, na aludida C1….
5. Onde sempre desempenhou, por ordem e no interesse da R. e com carácter de regularidade, até Maio de 2005, funções de responsável pelo planeamento e recolha de amostras de betão; pelos ensaios de abaixamento dos betões na central e em obra; pela recolha de amostras das matérias-primas; pela realização de ensaios de agregados na central; pelos ensaios à compressão dos provetes de betão e seu registo; pela análise diária dos resultados obtidos nos ensaios de betão; e pelo equipamento do laboratório da central.
6. De início e durante bastante tempo, o A. foi o único trabalhador em atividade no laboratório da central, tendo posteriormente passado por esse laboratório outros trabalhadores, que ficaram sempre sob a orientação do A..
7. A R. é associada da D….
8. Até Outubro de 2005, a R. categorizou sempre o A. como “Preparador auxiliar de laboratório”.
9. Os colegas do A., E…, da C2…, F…, da C3… e G…, da C4..., executavam nas referidas Centrais de Betão, exploradas pela R., as mesmas tarefas e funções executadas pelo A. na C1….
10. Os referidos colegas estavam categorizados pela R. com a categoria de “Preparador de Laboratório”.
11. A partir de 1 de Junho de 2005, com a saída da empresa do encarregado da central, H… e por decisão da R., o A. passou a trabalhar no sector de produção, continuando pontualmente a ajudar no laboratório.
12. Tendo-lhe sido atribuída, a partir de Novembro de 2005, a categoria profissional de “Operador de central de betão” e, de Outubro de 2008 em diante, a de “Operador de Produção I”, categoria esta que o A. detinha, à data da cessação do respectivo contrato de trabalho.
13. As funções que o A. exerceu, por ordem e no interesse da R., a partir de 01/06/2005, até final do respectivo contrato de trabalho, juntamente com o colega I…, consubstanciavam-se em controlar e assegurar, recorrendo aos meios de comunicação existentes, o fornecimento de betão dentro do horário previsto, bem como o respectivo planeamento, segundo as possibilidades da produção e meios de distribuição. Sendo responsável pelo preenchimento de guias de fornecimento (guias de remessa) e outro expediente (recepção das encomendas e preenchimento das respectivas notas de encomendas, execução do planeamento, elaboração das escalas de entrada ao trabalho dos colaboradores da Central, à excepção dos serviços administrativos), e executando ainda tarefas de manobra da central.
14. A R. pagou ao A. a retribuição base mensal correspondente, de início, à categoria profissional de “Preparador Auxiliar de Laboratório” (Grupo XIII constante do Anexo III do IRCT para o sector) e, depois, a partir de 01/01/1999 e até 31/05/2005, a retribuição base mensal correspondente ao Grupo XII, constante do Anexo III do IRCT para o sector, embora sem lhe atribuir qualquer outra categoria.
15. A partir de 1 de Junho de 2005, o A. recebeu da Ré a retribuição base mensal correspondente à categoria de “Operador de Central de Betão”, tendo-lhe sido atribuídos em Novembro de 2005 os respectivos retroactivos.
16. Enquanto ao serviço da R., as retribuições base e diuturnidades auferidas pelo A. foram as seguintes:
Período Salário Base Diuturnidades
- Em Julho de 1992 € 282,42
- De 01.08.1992 a 30.11.1992 € 445,93
- De 1.12.1992 a 30.04.1993 € 477,35
- De 31.05.1992 a 30.11.1993 € 489,82
- De 1.12.1993 a 31.03.1995 € 515,26
- De 1.04.1995 a 30.11.1995 € 540,70
- Em Dezembro de 1995 € 560,00
- De 1.1.1996 a 31.12.1996 € 565,14 € 20,19
- De 1.1.1997 a 28.02.1997 € 565,14 € 20,19
- De 01.03.1997 a 31.12.1997 € 588,58 € 21,02
- De 01.01.1998 a 30.06.1998 € 588,58 € 21,64
- De 01.07.1998 a 31.12.1998 € 605,79 € 43,28
- De 01.01.1999 a 31.12.1999 € 643,70 € 44,56
- De 1.01.2000 a 31.12.2000 € 662,90 € 45,91
- De 1.01.2001 a 31.12.2001 € 682,85 € 71,46
- De 1.01.2002 a 31.12.2002 € 708,79 € 74,25
- De 1.01.2003 a 31.12.2003 € 736,50 € 76,41
- De 1.01.2004 a 31.12.2004 € 757,90 € 104,72
- De 1.01.2005 a 31.12.2005 € 778,89 € 104,72
- De 1.01.2006 a 31.12.2006 € 890,07 € 104,72
- De 1.01.2007 a 30.06.2007 € 912,32 € 104,72
- De 1.07.2007 a 31.12.2007 € 940,00 € 130,90
- De 1.01.2008 a 31.12.2008 € 940,00 € 145,35
- De 1.01.2009 a 31.12.2011 € 969,00 € 147,60
- De 1.01.2012 a 31.06.2012 € 984,00 € 147,60
- De 1.07.2012 a 31.12.2012 € 984,00 € 177,12
17. A título de férias, subsídios de férias e subsídios de Natal vencidos nos anos de 1993 em diante, a R. apenas pagou ao A. importâncias correspondentes ao respectivo vencimento base (e ainda, quando passou a recebê-las, às respectivas diuturnidades) em vigor em cada um desses anos.
18. Por ordem e no interesse da R., o A. prestou trabalho extraordinário/suplementar e recebeu a correspondente remuneração, nos seguintes meses, anos e montantes (em Euros):
1992
Agosto 18,60 €
Setembro 138,17 €
Outubro 66,54 €
Novembro 95,77 €
Dezembro 88,38 €
1993
Janeiro 59,57 €
Fevereiro 111,84 €
Março 148,45 €
Abril 216,15 €
Maio 151,34 €
Junho 149,48 €
Julho 138,37 €
Agosto 130,86 €
Setembro 209,71 €
Outubro 219,36 €
Novembro 8,64 €
Dezembro 9,09 €
1994
Janeiro 44,20 €
Fevereiro 134,74 €
Março 268,62 €
Abril 123,35 €
Maio 117,41 €
Junho 269,98 €
Julho 9,09 €
Agosto 269,12 €
Setembro 452,42 €
Outubro 340,46 €
Novembro 347,92 €
Dezembro 378,93 €
1995
Janeiro 147,67 €
Fevereiro 109,47 €
Março 206,75 €
Abril 183,35 €
Maio 293,54 €
Junho 371,84 €
Julho 176,87 €
Agosto 0,00 €
Setembro 130,37 €
Outubro 270,01 €
Novembro 301,44 €
Dezembro 111,14 €
1996
Janeiro 34,57 €
Fevereiro 0,00 €
Março 82,40 €
Abril 213,84 €
Maio 114,56 €
Junho 376,01 €
Julho 232,00 €
Agosto 349,09 €
Setembro 163,19 €
Outubro 267,37 €
Novembro 266,10 €
Dezembro 274,18 €
1997
Janeiro 237,23 €
Fevereiro 225,75 €
Março 316,79 €
Abril 404,19 €
Maio 336,84 €
Junho 322,51 €
Julho 152,11 €
Agosto 638,95 €
Setembro 418,81 €
Outubro 267,56 €
Novembro 134,35 €
Dezembro 296,66 €
1998
Janeiro 206,90 €
Fevereiro 263,43 €
Março 320,84 €
Abril 446,88 €
Maio 307,87 €
Junho 584,77 €
Julho 377,37 €
Agosto 404,74 €
Setembro 0,00 €
Outubro 950,76 €
Novembro 365,48 €
Dezembro 358,55 €
1999
Janeiro 315,67 €
Fevereiro 347,78 €
Março 410,80 €
Abril 642,33 €
Maio 496,31 €
Junho 654,27 €
Julho 551,62 €
Agosto 519,17 €
Setembro 304,79 €
Outubro 347,14 €
Novembro 307,34 €
Dezembro 478,16 €
2000
Janeiro 329,43 €
Fevereiro 358,16 €
Março 653,12 €
Abril 640,90 €
Maio 405,02 €
Junho 626,61 €
Julho 582,24 €
Agosto 734,34 €
Setembro 863,09 €
Outubro 366,76 €
Novembro 175,87 €
Dez 576,78 €
2001
Janeiro 423,63 €
Fevereiro 480,59 €
Março 529,52 €
Abril 545,55 €
Maio 460,20 €
Junho 559,93 €
Julho 603,10 €
Agosto 637,85 €
Setembro 774,11 €
Outubro 497,47 €
Novembro 129,32 €
Dezembro 538,20 €
2002
Janeiro 205,29 €
Fevereiro 578,71 €
Março 567,33 €
Abril 421,79 €
Maio 673,57 €
Junho 503,92 €
Julho 437,93 €
Agosto 417,46 €
Setembro 252,02 €
Outubro 246,52 €
Novembro 329,24 €
Dezembro 415,35 €
2003
Janeiro 245,70 €
Fevereiro 316,61 €
Março 252,01 €
Abril 224,61 €
Maio 189,49 €
Junho 424,60 €
Julho 193,34 €
Agosto 471,34 €
Setembro 184,78 €
Outubro 191,23 €
Novembro 394,36 €
Dezembro 264,32 €
2004
Janeiro 194,90 €
Fevereiro 211,26 €
Março 189,28 €
Abril 326,51 €
Maio 274,46 €
Junho 307,06 €
Julho 286,57 €
Agosto 302,19 €
Setembro 167,85 €
Outubro 236,55 €
Novembro 234,03 €
Dezembro 213,44 €
2005
Janeiro 56,62 €
Fevereiro 6,12 €
Março 0,00 €
Abril 148,74 €
Maio 281,00 €
Junho 493,70 €
Julho 271,12 €
Agosto 509,39 €
Setembro 146,76 €
Outubro 199,76 €
Novembro 20,18 €
Dezembro 256,88 €
2006
Janeiro 203,65 €
Fevereiro 302,97 €
Março 198,22 €
Abril 270,72 €
Maio 222,17 €
Junho 325,68 €
Julho 283,17 €
Agosto 161,72 €
Setembro 367,11 €
Outubro 423,58 €
Novembro 366,09 €
Dezembro 282,43 €
2007
Janeiro 314,68 €
Fevereiro 269,81 €
Março 269,02 €
Abril 355,93 €
Maio 450,59 €
Junho 17,64 €
Julho 417,66 €
Agosto 338,84 €
Setembro 176,02 €
Outubro 500,61 €
Novembro 272,56 €
Dezembro 316,74 €
2008
Janeiro 106,62 €
Fevereiro 342,25 €
Março 491,52 €
Abril 636,39 €
Maio 792,82 €
Junho 411,82 €
Julho 575,08 €
Agosto 493,70 €
Setembro 311,32 €
Outubro 318,89 €
Novembro 425,70 €
Dezembro 218,71 €
2009
Janeiro 70,45 €
Fevereiro 122,53 €
Março 109,50 €
Abril 41,50 €
Maio 232,41 €
Junho 80,58 €
Julho 234,52 €
Agosto 261,95 €
Setembro 509,92 €
Outubro 110,74 €
Novembro 307,34 €
Dezembro 115,64 €
2010
Janeiro 133,28 €
Fevereiro 34,30 €
Março 49,00 €
Abril 37,24 €
Maio 89,18 €
Junho 192,90 €
Julho 304,76 €
Agosto 689,90 €
Setembro 243,86 €
Outubro 93,10 €
Novembro 47,00 €
Dezembro 70,23 €
2011
Janeiro 120,54 €
Fevereiro 169,35 €
Março 274,21 €
Abril 386,92 €
Maio 309,01 €
Junho 435,92 €
Julho 655,86 €
Agosto 372,37 €
Setembro 695,77 €
Outubro 270,80 €
Novembro 129,68 €
Dezembro 67,46 €
2012
Janeiro 0,00 €
Fevereiro 9,80 €
Março 0,00 €
Abril 0,00 €
Maio 6,53 €
Junho 0,00 €
Julho 0,00 €
Agosto 0,00 €
Setembro 0,00 €
Outubro 0,00 €
Novembro 0,00 €
Dezembro 0,00 €
19. A R. não integrou nos montantes remuneratórios que pagou ao A. a título de férias, subsídios de férias e subsídios de Natal, referentes aos anos de 1993 em diante, a média das retribuições por este auferidas a título de trabalho extraordinário ou suplementar.
20. A R. pagou ao A. o subsídio de férias nos seguintes meses:
1993 – Abril
1994 – Maio
1995 – Junho
1996 – Junho
1997 – Julho
1998 – Junho
1999 – Julho
2000 – Julho
2001 – Junho
2002 – Julho
2003 – Maio
2004 – Abril
2005 – Maio
2006 – Maio
2007 – Abril
2008 – Abril
2009 – Abril
2010 – Abril
2011 – Abril
2012 – Abril
21. No dia 6 de Fevereiro de 2013, teve lugar nas instalações da R., sitas na …, Porto, uma reunião entre representantes da R. e trabalhadores da empresa, incluindo o A., inserida na fase de informações e negociações do processo de despedimento colectivo movido pela R..
22. Nessa reunião, a R. apresentou as razões do despedimento colectivo, não tendo existido qualquer negociação dos valores que a R. tencionava pagar aos trabalhadores, a título de compensação.
23. Na dita reunião, os trabalhadores colocaram questões aos representantes da R..
24. Posteriormente à aludida reunião, tiveram lugar conversas individuais, onde os representantes da R. disseram a cada um dos trabalhadores que entenderam nelas participar, qual o valor que iriam receber a título de compensação pelo despedimento colectivo.
25. O contrato de trabalho do A. cessou em 4 de Maio de 2013, na sequência do procedimento de despedimento colectivo instaurado pela R., que o abrangeu.
26. A presente acção foi interposta em 30/04/2014, tendo a R. sido citada em 02/05/2014.»
*
*
4. Fundamentação de direito
*
4.1. Da prescrição dos créditos reclamados pelo A.
Invoca a recorrente que no âmbito de um despedimento colectivo que, por definição, abrange vários colaboradores, é justificável, em nome da preservação da unidade produtiva que permanece, da paz social e dos princípios da segurança jurídica e da protecção da confiança, que a entidade patronal possa, num prazo relativamente curto, conhecer os impactos dessa sua decisão, seja ao nível dos fundamentos do despedimento, seja ao nível de outras questões que o trabalhadores despedidos possam ter contra si, sobretudo se estas últimas forem susceptíveis de ter impacto na validade do despedimento, como é o caso do créditos laborais por liquidar, e que esse prazo, através de uma interpretação logico/sistemática dos artigos 337º/1, 363º/5, 383º/c) e 388º/2 do Código do Trabalho, será o prazo de 6 meses, por corresponder ao prazo para questionar a licitude do despedimento. E daqui conclui que aos créditos laborais de um trabalhador cujo contrato de trabalho cesse no âmbito de um despedimento colectivo aplicar-se-á um prazo de prescrição 6 meses e não já o prazo de 1 ano previsto no art. 337º, n.º 1 do Código do Trabalho.
A sentença da 1.ª instância não acolheu esta perspectiva, sustentando que a regra especial da prescrição de créditos no plano laboral consagrada no art. 38º n.º 1 da LCT e que se manteve, em moldes semelhantes, no art. 381 n.º 1 do Código do Trabalho 2003 e, posteriormente, no art. 337º n.º 1 do CT 2009 não pode ser afastada ou contrariada através da interpretação conjugada daquelas disposições legais, não sendo substituída pelo prazo de 6 meses que o art. 388º n.º 2 do CT 2009 fixa especificamente como prazo limite para a instauração da acção de impugnação do despedimento colectivo.
E fê-lo com acerto.
Com efeito, há que distinguir o prazo de caducidade que a lei estabelece para a impugnação judicial da decisão do despedimento, ao dispor no n.º 2 do artigo 388.º do Código do Trabalho de 2009 que “[a] acção de impugnação do despedimento colectivo deve ser intentada no prazo de seis meses contados da data da cessação do contrato”, por um lado, e, por outro, o prazo prescricional de “um ano” que o art. 337.º, n.º 1 do mesmo código estabelece para os "créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação".
Este último prazo, de acordo com a jurisprudência que se firmou já em face do Código do Trabalho de 2003 – que neste aspecto rege similarmente ao Código do Trabalho de 2009 –, reporta-se aos direitos que decorrem da prestação do trabalho ou que passaram a ser imediatamente exigíveis por força da cessação ou violação do contrato. O Supremo Tribunal de Justiça pronunciou-se sobre esta temática no Acórdão de 7 de Fevereiro de 2007 (Recurso n.º 06S3317, in www.dgsi.pt) e veio a reiterar a doutrina aí expressa nos acórdãos de 7 de Novembro de 2007, de 21 de Maio de 2008, de 27 de Maio de 2010 e de 15 de Setembro de 2010 (procs. nºs 4614/06, 607/08, 66/10, e 1920/07.7TTPRT.S1, todos sumariados in www.stj.pt) e, mais recentemente, no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça 17 de Abril de 2013 (Processo n.º 36/12.9TTPRT.S1, in www.dgsi.pt).
Segundo o primeiro dos citados acórdãos, a previsão de uma norma que define um prazo de caducidade para a impugnação judicial da decisão de despedimento [como é o caso do art. 388.º, n.º 2 do CT 2009] afasta a aplicação de um prazo prescricional em relação aos efeitos de direito decorrentes da ilicitude do despedimento que se pretendem obter com a impugnação judicial e limita o artigo 381º, n.º 1, do Código do Trabalho [agora art. 337.º, n.º 1], cuja expressão "créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação" se reporta, apenas, aos direitos que decorrem da prestação do trabalho ou que passaram a ser imediatamente exigíveis por força da cessação ou violação do contrato.
Mesmo assim, este último preceito – que prevê a prescrição dos "créditos resultantes do contrato de trabalho e da sua violação ou cessação" – tem um amplo campo de aplicação, embora não abarque as consequências jurídicas legalmente definidas para o despedimento colectivo ilícito. Nele deverão incluir-se todos os direitos retributivos que decorrem directamente da prestação do trabalho ou que passaram a ser imediatamente exigíveis por força da cessação do contrato, como sejam os proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal, e, bem assim, a compensação a que se refere o artigo 366.º do Código do Trabalho, a qual é resultante de uma “responsabilidade civil por intervenções lícitas”[1], nada tendo a ver com a ilicitude do despedimento.
Mas já se excluem do âmbito de aplicação do art. 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho de 2009 os direitos para cujo exercício processual a lei fixou expressamente um prazo de caducidade, como é o caso do artigo 388.º, n.º 2, que se reporta à acção de impugnação de despedimento colectivo e que abarca na sua previsão os direitos emergentes da ilicitude do despedimento.
Ainda na palavra do referido acórdão de 7 de Fevereiro de 2007, "[p]ode facilmente aceitar-se que o legislador tenha querido preencher uma lacuna do regime legal, fixando um prazo de caducidade para a acção de impugnação do despedimento, por compreensíveis razões de certeza e segurança jurídica, nele abrangendo todos os efeitos de uma eventual declaração de ilicitude, desde a indemnização por danos patrimoniais ou não patrimoniais, ao direito de reintegração e à indemnização substitutiva e ao direito às retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o despedimento, fazendo reconduzir, ao mesmo tempo, o prazo prescricional, nos termos tradicionalmente previstos, aos direitos de crédito mais directamente correlacionados com as vicissitudes da relação laboral" e, acrescentamos nós, com a sua "cessação", desde que não questionada a respectiva licitude, nem peticionadas prestações que decorram de tal ilicitude[2].
Na petição inicial que apresentou na presente acção, a pretensão do A. não é a de impugnar o despedimento de que foi alvo, mas que a R. cumpra as obrigações para si decorrentes da execução do contrato de trabalho e da sua cessação por despedimento colectivo, pressupondo a licitude deste. O pedido nela formulado – que se reporta ao reconhecimento da categoria profissional que entende correcta ao longo da execução do contrato, ao pagamento de diferenças salariais decorrentes da reclassificação profissional e a diferenças retributivas de férias e de subsídios de férias e de Natal – não corresponde, pois, a qualquer dos efeitos típicos da ilicitude do despedimento e, por isso, os créditos nele incluídos não estão abrangidos pelo prazo de caducidade estabelecido no n.° 2, do artigo 388.° do Código do Trabalho.
Assim, cessando o contrato de trabalho em 4 de Maio de 2013, na sequência do procedimento de despedimento colectivo desencadeado pela R (facto 25.), e sendo instaurada a acção em 30 de Abril de 2014, sendo a R. citada em 2 de Maio de 2014 (facto 26.), nem caducou o direito de acção – por inexistir preceito legal que estabeleça, a este propósito, um prazo de caducidade – nem prescreveram os créditos reclamados – por se mostrar claramente observado o prazo de um ano estabelecido no artigo 337.º, n.º 1 do Código do Trabalho.
Improcedem, nesta parte, as conclusões do recurso.
*
4.2. Do abuso do direito
Numa outra vertente, a recorrente invoca que o recorrido, ao não ter impugnado a decisão do despedimento, ao vir reclamar créditos laborais cujo não pagamento geraria a licitude do seu despedimento e ao não ter, nas reuniões de negociação (colectivas e individuais), manifestado a sua pretensão em ser ressarcido de tais créditos, exerce de forma abusiva o seu direito numa conduta atentatória do princípio da confiança e da boa-fé, tanto mais que no passado, sempre que se achou credor da empresa, não deixou de manifestar essa sua posição à Ré.
Na sentença sob censura, discorreu-se, a este propósito, nos seguintes termos:
«Defende a R. que o A. renunciou aos créditos peticionados, ao não ter impugnado judicialmente o despedimento colectivo, argumentando que a aceitação desse despedimento é contraditória com a interposição da presente acção, em termos que configuram um comportamento atentatório do princípio da confiança e da boa-fé. Tanto mais que o A. não invocou tais direitos na reunião de negociação do despedimento colectivo que teve lugar no dia 6 de Fevereiro de 2012, na qual participou, nem na reunião individual subsequente, com representantes da R., na qual que lhe foram apresentados os cálculos das contas finais.
Sem razão, segundo nos parece.
Desde logo, porque não existe qualquer norma legal ou convencional que imponha ao A., ou a qualquer outro trabalhador, o ónus de impugnar o despedimento de que foi alvo, sob pena de, não o fazendo, deixar de poder reclamar créditos laborais a que entenda ter direito, que em nada dependem da licitude ou ilicitude desse despedimento. Como nada o obrigava a invocar esses créditos na reunião inserida na fase de informações e negociações do processo de despedimento colectivo movido pela R., que constitui uma formalidade imposta pelo art. 361º do CT 2009, destinada a tratar questões relacionadas com o despedimento propriamente dito, e não reivindicações de qualquer outro tipo.
Não sendo manifestamente possível extrair dessa não impugnação do despedimento por parte do A., nem da não invocação na dita reunião dos créditos aqui peticionados, qualquer manifestação de vontade passível de ser entendida como renúncia a esses créditos.
Nem se vendo de que forma a instauração da presente acção pode ser encarada como uma violação do princípio da confiança e da boa-fé, nada legitimando sequer o entendimento de que, ao não impugnar o despedimento e ao não invocar os créditos na tal reunião, o A. deu à R. razões para confiar que nunca reivindicaria qualquer direito relacionado com o contrato de trabalho que mantiveram.»
Sufragamos este juízo.
Nos termos prescritos no artigo 334.º do Código Civil, é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular “exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes ou pelo fim social ou económico desse direito”.
O Código Civil adoptou uma concepção objectiva do abuso de direito, ou seja, entendeu que os efeitos advindos da ilegitimidade do exercício manifestamente abusivo do direito titulado se haveriam de produzir desde logo, uma vez atingidos a boa fé, os bons costumes ou o fim social e económico do direito que foi conferido, sem necessidade da exigência da consciência desse atingir por parte do titular do direito.
E estabeleceu uma condição para o funcionamento deste último reduto ou «válvula de segurança» que é o abuso de direito: a exigência de a ofensa ser manifesta.
Na vertente de venire contra factum proprium, o exercício manifestamente abusivo do direito entronca-se na violação da boa fé, no sentido de atentar ou violar a confiança que a outra parte depositava na actuação do titular do direito que, ao não o exercer, razoavelmente a fazia contar com que um tal exercício já não iria ser levado a efeito, por isso prosseguindo essa outra parte uma actuação de acordo com a expectativa de não exercício, ainda que soubesse que sobre si impendia (ou, ao menos, tinha impendido) a obrigação decorrente desse direito[3].

Ora no caso vertente não vemos que atitude adoptou o recorrido susceptível de criar na recorrente um estado objectivo de confiança no não exercício do direito, quer ao não ter impugnado a decisão do despedimento, quer ao não ter, nas reuniões de negociação, manifestado a sua pretensão em ser ressarcido de tais créditos.
Com efeito, o facto de aceitar a decisão de despedimento colectivo e, até, a compensação disponibilizada pela cessação do contrato, não determina, de per si, se crie a convicção de que o trabalhador se abstenha no futuro de reclamar outros direitos de que entenda ser titular, emergentes daquele mesmo contrato.
O mesmo se diga quanto à participação nas negociações que integram o procedimento legal de despedimento colectivo. Note-se que o intuito da lei com a fase de informação e negociação prevista no artigo 361.º do Código do Trabalho consiste em assegurar que a decisão de despedimento colectivo não seja tomada sem que os trabalhadores tenham a possibilidade de conhecer e debater com o empregador as razões do despedimento, o respectivo alcance e as condições em que será efectuado, bem como a eventual adopção de medidas alternativas[4]. Não se destina a fixar em termos finais o valor dos créditos emergentes dos contratos de trabalho dos trabalhadores envolvidos no procedimento de despedimento, ainda que tais trabalhadores não se oponham ao despedimento e recebam a compensação que o empregador lhes disponibiliza pela cessação. E não tem – nem se lhe pode atribuir – o significado de um acerto global de contas entre as partes.
Por esta razão, não se pode perspectivar como contraditória ou atentatória da boa fé a atitude do trabalhador que, dentro do prazo que a lei assinala para a prescrição daqueles créditos, desenvolve actos com vista ao reconhecimento dos respectivos direitos.
Finalmente, mesmo a indemonstrada alegação da recorrente de que, no passado, sempre que se achou credor da empresa, o recorrido não deixou de manifestar essa sua posição à R., a ser provada, não seria igualmente de molde criar na R uma situação objectiva de confiança digna da especial protecção jurídica do instituto do abuso do direito. Entender o contrário seria infirmar as particulares razões de tutela do trabalhador que determinaram o especial regime da prescrição dos créditos laborais. Segundo João Leal Amado, "constituindo fundamento específico da prescrição a penalização da inércia negligente do titular do direito, a lei entendeu não ser exigível ao trabalhador credor que promova a efectivação do seu direito na vigência do contrato, demandando judicialmente o empregador. Digamos que, neste caso, o não exercício expedito do direito por parte do seu titular não faz presumir que este a ele tenha querido renunciar, nem torna o credor indigno de protecção jurídica (dormientibus non sucurrit ius)"[5].
Os factos de o recorrido não ter impugnado o despedimento, não ter aludido aos créditos que reclamou na petição inicial na fase das negociações do procedimento que o precedeu e até, eventualmente, de ser lesto no decurso do contrato de trabalho a reclamar outros direitos, não são de molde a ser entendidos como uma tomada de posição vinculante do recorrido relativamente a não reclamar aqueles créditos no futuro, nem justificam que a recorrente, agindo com o cuidado e precauções usuais no tráfico jurídico, tenha passado a confiar em que o mesmo o não faria uma vez findo o contrato de trabalho.
Em suma, não se verificando uma situação objectiva de confiança da recorrente que mereça a tutela excepcional prevista no art. 334.º do Código Civil, não pode afirmar-se que a conduta do recorrido, ao instaurar a presente acção, consubstancia abuso do direito.
Improcede, assim, a tese de que o recorrido abusou do seu direito.
*
4.3. Dos subsídios de férias e de Natal
*
A terceira questão a analisar prende-se com saber se, no período posterior à entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003 – 1 de Dezembro de 2003 –, os subsídios férias e de Natal a que o recorrido tem direito devem ser calculados sem considerar o valor do trabalho suplementar por força do novo regime do Código do Trabalho nas versões de 2003 e de 2009, como defende a recorrente, ou se, ao invés, os valores auferidos pelo recorrido ao longo da execução do contrato de trabalho depois daquela data, a título de subsídios de férias e subsídios de Natal, devem incluir a média das quantias pagas pelo trabalho suplementar prestado nos doze meses anteriores, como decidiu o Mmo. Juiz a quo.
As alterações decorrentes do Código do Trabalho de 2003 não se aplicam aos efeitos dos factos totalmente ocorridos em data anterior à da sua entrada em vigor (artigo 8.º, nº 1, parte final, da Lei Preambular), ou seja, não se aplicam aos subsídios de férias e de Natal vencidos em data anterior a 1 de Dezembro de 2003.
A questão que se coloca prende-se com a repercussão, ou não, de tais alterações quanto aos subsídios de férias e de Natal vencidos a partir 1 de Dezembro de 2003 relativamente aos contratos de trabalho que, embora celebrados em data anterior à da entrada em vigor do Código do Trabalho, se mantêm em execução após essa data, como sucedeu com o contrato de trabalho sub judice.
A sentença sob censura, depois de tecer doutas considerações sobre o conceito de retribuição ao longo dos regimes do Decreto-Lei n.º 49.408 de 24 de Novembro de 1969 (L.C.T.), do Decreto-Lei n.° 874/76, de 28/12, Decreto-Lei n.° 88/96, de 3/7, do Código do Trabalho de 2003 e do Código do Trabalho de 2009, bem à luz do instrumento de regulamentação colectiva aplicável[6], de afirmar a natureza retributiva da contrapartida paga pelo trabalho suplementar prestado quando a mesma é percebida durante um período mínimo de seis meses por ano (critério mínimo de regularidade de que lança mão) e de afirmar que nas retribuições de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal, vencidos antes de 01 de Dezembro de 2003, deve ser incluída a média das quantias auferidas pelo A. nos 12 meses anteriores, a título de trabalho suplementar – aspectos que não foram questionados nas alegações da apelação – , teceu as seguintes considerações quanto ao período ulterior:
«[…]
Com respeito às retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal vencidas entre 01/12/2003 e 16/02/2009, em relação às quais rege o regime consagrado no CT [2]003, estabelece o art. 250º n.º 1 do citado código – de forma inovadora, em relação à LCT – uma regra supletiva para efeitos de determinação do montante das prestações complementares e acessórias estabelecidas em disposições legais, convencionais ou contratuais, de acordo com a qual caso essas disposições nada digam em contrário, a base de cálculo tem em conta apenas a retribuição base e diuturnidades. Entendendo-se por retribuição base “aquela que, nos termos do contrato ou instrumento de regulamentação colectiva do trabalho, corresponde ao exercício da actividade desempenhada pelo trabalhador de acordo com o período normal de trabalho que tenha sido definido” – cfr. n.º 2, al. a) do mesmo artigo. E por diuturnidade, “a prestação pecuniária, de natureza retributiva e com vencimento periódico, devida ao trabalhador, nos termos do contrato ou do instrumento de regulamentação colectiva de trabalho, com fundamento na antiguidade” – cfr. n.º 2. al. b).
Ou seja, a retribuição base corresponde ao montante fixo auferido pelo trabalhador, com exclusão das outras prestações pagas pelo empregador como contrapartida do trabalho, ainda que regulares e periódicas, enquanto que os complementos salariais representam acrescentos a essa retribuição base, podendo ser certos (por exemplo, os subsídios de férias e de Natal) ou incertos (v.g. comissões ou percentagens de vendas) [15 cfr. Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, 4ª Edição, págs. 590 e seg..]
Vale isto por dizer que, apesar de determinadas prestações pecuniárias pagas pelos empregadores aos seus trabalhadores poderem integrar o conceito de retribuição, isso não significa necessariamente que os respectivos valores devem ser considerados na determinação de todas as atribuições patrimoniais que lhes cabem receber.
Com efeito, no que concerne por exemplo ao subsídio de Natal, que consubstancia uma prestação complementar, sem correspectividade directa com a quantidade de trabalho prestado [16 Assim, Monteiro Fernandes, Direito do Trabalho, 12ª edição, 2004, pág. 470], a terminologia utilizada no art. 254º n.º 1 do CT 2003 (…tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano), onde se acha previsto, não deixa a nosso ver margem para outro entendimento que não seja o de que se opera uma remissão no que respeita ao seu cálculo para o conceito estrito de retribuição base, previsto no art. 250º n.ºs 1 e 2, al. a) do mesmo código, pelo menos até à produção de efeitos da alteração operada pelo BTE n.º 6, de 15/02/2008, já que até lá, nada existia na lei ou no ACT em sentido contrário [17 cfr. acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 18/04/2007, in www.dgsi.pt.jstj.], não entrando como tal as aludidas prestações na base do cálculo.
Relativamente às férias propriamente ditas, a sua abrangência é mais ampla, na medida em que a retribuição a que a tal respeito se alude (art. 255º n.º 1 do CT 2003) não difere da recebida aquando da prestação efectiva do trabalho, englobando consequentemente quer a retribuição base, quer a recebida, por exemplo, por trabalho suplementar.
Já não assim no que concerne ao subsídio de férias, que sendo embora, tal como o subsídio de Natal, uma prestação complementar, compreende “a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho” (cfr. n.º 2 do art. 255º do CT 2003), abrangendo como tal algo mais que a mera retribuição base prevista no art. 250º, normativo que nessa medida contraria, assumindo-se como excepção ditada pela própria lei à regra geral nele consignada.
As tais prestações retributivas contrapartida do modo específico da execução do trabalho têm vindo a ser definidas como os condicionalismos externos ou condições extrínsecas da prestação convencionada, que se referem à própria prestação do trabalho, isto é, às contingências que a rodeiam, como sejam a penosidade, o isolamento, a toxixidade, a perigosidade, o trabalho nocturno ou por turnos; por contraposição às condições intrínsecas da prestação laboral, que se reportam ao próprio trabalhador e ao seu desempenho, ou seja, aos condicionalismos que pressupõem a efectiva prestação do trabalho (como prémios, gratificações ou comissões). Ficando ainda excluídas as atribuições pecuniárias que consistam na assunção pelo empregador de despesas em que incorreria o trabalhador por causa da prestação de trabalho, quando devam considerar-se retribuição (v.g. subsídios de refeição e de transporte) [18 cfr. Jorge Costa, A Retribuição e Outras Prestações Patrimoniais no Código de Trabalho, publicado na Reforma do Código do Trabalho, C.E.J., Coimbra Editora, pág. 404, e o aí citado Código do Trabalho Anotado de Pedro Romano Martinez e outros, pág. 408]. Nessa perspectiva, as prestações pecuniárias auferidas pela A. a título de remuneração por trabalho suplementar, entrariam no cômputo da retribuição por subsídio de férias, porque se relacionam com o circunstancialismo temporal em que o trabalho é executado.
Sucede que, de acordo com o art. 11º n.º 1 da Lei Preambular ao CT 2003 (Lei n.º 99/2003, de 27/08) “A retribuição auferida pelo trabalhador não pode ser reduzida por mero efeito da entrada em vigor do Código do Trabalho”, tendo por conseguinte o legislador salvaguardado expressamente a eventualidade dos trabalhadores verem, através da mera aplicação de normas legais inovadoras que em matéria de retribuição se consagraram no Código do Trabalho 2003, automaticamente diminuído o valor da sua retribuição, contra o que seriam as suas legítimas expectativas.
Ora seria justamente isso que sucederia, no caso concreto, no que se refere ao subsídio de Natal – pelo menos até à entrada em vigor da alteração operada pelo BTE n.º 6, de 15/02/2008 –que por força da aplicação do regime introduzido pelos arts. 250º n.ºs 1 e 2, 254º n.º 1 e 255º n.º 2 do CT 2003 se veria reduzido no respectivo montante, ao não incluir todas as prestações relativas a trabalho suplementar que o A. recebeu regularmente ao longo de vários anos e que se viu deverem integrar o conceito de retribuição e serem contabilizadas nas férias e subsídios de férias e de Natal, face ao regime legal aplicável até à entrada em vigor do Código do Trabalho 2003.
Nessa medida, não poderá aplicar-se ao caso a disciplina que os citados preceitos legais vieram implementar, em sede de cálculo do subsídio de Natal, mantendo-se a contabilização da média das retribuições auferidas a título de trabalho suplementar nos 12 meses anteriores, também nas retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal vencidas entre 01/12/2003 e 16/02/2009, à semelhança do que acontecia até aí, nos mesmos termos já acima expostos [19 No sentido exposto, podem ver-se os acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra de 24/10/2013 e 28/11/2013 (proferidos, em sede de recurso, nos processos n.ºs 377/12.5T4AGD e 230/12.2T4AGD, ambos do Juízo do Trabalho de Águeda) e do Tribunal da Relação do Porto de 21/02/2011, proferido no processo n.º 547/09.3TTGDM.P1 e disponível em www.dgsi.pt/jtrp].
No tocante às retribuições por férias, respectivo subsídio e subsídio de Natal, vencidas de 17/02/2009 em diante, rege o CT 2009 (cfr. arts. 264º n.ºs 1 e 2 e 263º n.º 1, respectivamente), de forma semelhante ao do pretérito CT 2003, incluindo no que respeita à regra supletiva para efeitos de determinação do montante das prestações complementares e acessórias, consagrada no art. 250º n.ºs 1 e 2 do CT 2003 – cfr. art. 262º n.ºs 1 e 2 do Código do Trabalho 2009.
Com a diferença porém de no preâmbulo da Lei n.º 7/2009, de 12/02 não se prever qualquer proibição de redução da retribuição do trabalhador, por mero efeito da entrada em vigor do CT 2009, ao contrário do que sucedeu com o CT 2003 – cfr. o já citado art. 11º do respectivo diploma preambular.
Acontece porém que, como se disse já, a partir da alteração operada pelo BTE n.º 6, de 15/02/2008, o ACT passou a prever expressamente a inclusão, nas retribuições relativas às férias e ao subsídio de Natal, para além da retribuição base, o valor médio da retribuição variável mensal auferida nos últimos 12 meses. Enquanto o subsídio de férias passou a integrar, para além da retribuição base, todas as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho – como é o caso, a nosso ver, da remuneração por trabalho suplementar.
O que significa que se deve manter a contabilização da média das remunerações pagas por trabalho suplementar, auferidas nos 12 meses anteriores, também nas retribuições de férias e subsídios de férias e de Natal vencidas a partir de 16/02/2009 e até ao ano de 2011 (inclusive).
No que concerne ao ano de 2012, as férias e respectivo subsídio venceram-se em Abril de 2012 (mês em que o A. recebeu o subsídio de férias [20 Cfr. cláusula 46ª n.º 3 do ACT/2008 e art. 264º n.º 3 do CT 2009.]) e o A. prestou trabalho suplementar remunerado em 10 dos 12 meses anteriores, pelo que deverão as referidas retribuições por férias e subsídios de férias incluir a média das quantias auferidas por trabalho suplementar prestado nos 12 meses anteriores.
Quanto ao subsídio de Natal, que se venceu em 15 de Dezembro de 2012 [21 cfr. cláusula 36ª n.º 1 do ACT/2008 e art. 263º n.º 1 do CT 2009], o A. apenas prestou trabalho suplementar remunerado em 3 dos 12 meses anteriores, não revestindo por conseguinte as retribuições auferidas a esse título, no período em causa, natureza regular e periódica – como aliás já acima se fez notar. Pelo que deverá improceder o pedido, no que concerne às diferenças no montante do subsídio de Natal vencido no ano de 2012, no valor de € 6,98.
[…]»
Concluiu depois a sentença que assiste ao A. direito aos montantes que peticiona por conta de diferenças salariais referentes a férias, subsídios de férias e subsídios de Natal vencidos nos anos de 1993 a 2011.
A recorrente não questiona os valores arbitrados até 1 de Dezembro de 2003, nem os ulteriormente arbitrados a título de retribuição de férias.
Mas defende que no período posterior à vigência do Código do Trabalho de 2003, os subsídios férias e de Natal a que o recorrido tem direito devem ser calculados sem considerar o valor do trabalho suplementar por força do novo regime do Código do Trabalho nas versões de 2003 e de 2009.
Adiantando, devemos dizer que acompanhamos a perspectiva expressa na sentença sob censura, a qual, na sua essencialidade, se mostra em consonância com a jurisprudência que tem sido emitida nesta matéria por este Tribunal da Relação do Porto, designadamente pelo colectivo que subscreve o presente aresto[7], pelo que pouco se nos oferece acrescentar ao expendido pelo tribunal a quo.
Com efeito, no âmbito dos Códigos do Trabalho aprovados pelas Leis n.º 99/2003 e 7/2009, o problema da imputação retributiva nos subsídios de férias e de Natal das prestações que excedem a retribuição base sofreu alterações de monta e distintas, pelo que iremos proceder separadamente à sua análise.
A) Quanto ao subsídio de férias
No Código do Trabalho de 2003 a disciplina da retribuição do período de férias e do respectivo subsídio de férias consta do artigo 255.º. Segundo o n.º 1 deste preceito, “[a] retribuição do período de férias corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo”. E o n.º 2 estabelece que “[a]lém da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho”.
Assim, quanto à retribuição de férias, o legislador consagrou o chamado “princípio da não penalização retributiva”. Como diz o Professor João Leal Amado, “ainda que o contrato de trabalho se apresente, indiscutivelmente, como um contrato bilateral, marcado pelo sinalagma entre trabalho e retribuição, o certo é que o período de inactividade produtiva correspondente às férias não deverá ter qualquer impacto negativo sobre a retribuição a pagar ao trabalhador”[8]. Já quanto ao subsídio de férias o legislador abandonou a tradição da equiparação do seu valor ao valor da retribuição de férias e utilizou uma formulação enigmática[9] susceptível de trazer problemas aplicativos e determinando que, muitas vezes, a referida equiparação se não verifique (pense-se por exemplo na retribuição composta, também, por comissões nas vendas, que não constituem contrapartida do modo específico da execução do trabalho[10]).
Nos mesmos termos dispõe o artigo 264.º do Código do Trabalho de 2009.
No caso em análise, contudo, esta restrição emergente da lei quanto ao subsídio de férias cede perante a expressa previsão do instrumento de regulamentação colectiva que, neste aspecto do subsídio de férias, não se reveste de carácter imperativo [cfr. o artigo 533.º, n.º 1, alínea a) do Código do Trabalho de 2003].
Na verdade, segundo a cláusula 26.ª da Convenção Colectiva de Trabalho em vigor em 2003, “[a] retribuição aos trabalhadores durante as férias é igual à que receberiam se estivessem efectivamente ao serviço (…)” (n.º 1) e “[a]lém da retribuição referida no número anterior, os trabalhadores têm direito a um subsídio de férias de montante igual ao dessa retribuição” (n.º 2).
O subsídio deveria pois ser de montante igual à retribuição de férias que, como a recorrente não questiona na apelação, inclui as médias do auferido pelo trabalho suplementar prestado nos últimos 12 meses.
A partir da revisão global da Convenção Colectiva de Trabalho operada pelo BTE n.º 6, de 15 de Fevereiro de 2008, que entrou em vigor em 20 de Fevereiro de 2008 (de acordo com a sua cláusula 2.ª, n.º1), a cláusula 46ª, referente à “retribuição e subsídio de férias”, mantendo no seu n.º 1 que a retribuição do período de férias “corresponde à que o trabalhador receberia se estivesse em serviço efectivo”, passou a prever, no seu n.º 2, que “[a]lém da retribuição mencionada no número anterior, o trabalhador tem direito a um subsídio de férias cujo montante compreende a retribuição base e as demais prestações retributivas que sejam contrapartida do modo específico da execução do trabalho” e no n.º 4 que “[o]s trabalhadores receberão, além do estabelecido no n.º 1 desta cláusula, um subsídio nunca inferior à média da retribuição variável mensal auferida nos últimos doze meses ou no tempo de execução do contrato, se este tiver durado menos tempo”.
A este propósito, a recorrente alega que a “retribuição variável mensal” prevista na cláusula do CCT que regula a atribuição dos subsídios de férias e de Natal, com a alteração operada em 15 de Fevereiro de 2008, não abrange a média da remuneração do trabalho suplementar, pois a essência da retribuição variável, ao contrário da retribuição certa que se determina em função do tempo de trabalho, assenta, precisamente, na inexistência de uma relação directa entre o seu valor e o tempo de trabalho (será assim numa comissão por vendas, prémio por objectivos, prémios de produção, etc.), mas a remuneração por trabalho suplementar não sobrevive sem a relação tempo/valor.
Não lhe assiste razão.
Com efeito, e desde logo, a retribuição por trabalho suplementar, embora paga todos os meses do ano, foi percebida em valores sempre distintos e variáveis ao longo dos anos em causa, como bem espelha a decisão de facto (vide o facto 18.).
Além disso, se é certo que a retribuição por trabalho suplementar tem uma relação intrínseca com o tempo por que perdura a sua duração – cfr. os artigos 258.º do Código do Trabalho de 2003 e 268.º do Código do Trabalho de 2009 –, é igualmente certo que constituiu um acrescento à retribuição base que não depende estritamente do tempo de trabalho (de se desenvolver durante x minutos, ou horas, ou dias), pois são diferentes os valores devidos consoante o tipo de dia (útil, feriado, de descanso semanal obrigatório ou complementar) e consoante é prestado na 1.ª hora ou nas subsequentes.
Não deve ainda esquecer-se que, constituindo trabalho que é prestado para além do que foi convencionado entre as partes quanto ao horário de trabalho, depende também da necessidade da sua prestação (artigos 199.º do Código do Trabalho de 2003 e 227.º do Código do Trabalho de 2009) e de uma ordem concreta do empregador ou da sua realização de modo a não ser previsível a oposição do empregador (artigos 258.º do Código do Trabalho de 2003 e 268.º do Código do Trabalho de 2009), não resultando apenas do mero dispêndio de tempo a ele inerente.
Temos, pois, quanto ao subsídio de férias:
- desde 1 de Dezembro de 2003 até 19 de Fevereiro de 2008, a expressa consagração convencional do princípio da não penalização retributiva, com a equiparação da retribuição de férias ao salário devido pelo trabalho efectivo e a equiparação do valor do subsídio de férias ao da retribuição de férias (cláusula 27.ª da CCT) e,
- a partir de 20 de Fevereiro de 2008, a determinação de que o subsídio de férias integra a “média da retribuição variável mensal auferida nos últimos doze meses ou no tempo de execução do contrato, se este tiver durado menos tempo” (n.º 4 da cláusula 46.ª).
A partir de 17 de Fevereiro de 2009, data em que entrou em vigor o Código do Trabalho de 2009, igual raciocínio deverá ser feito, atento o que neste prescreve o artigo 264.º, n.º 2 quanto ao subsídio de férias, sendo que o enquadramento convencional desta prestação não se alterou, prevalecendo as regras do instrumento de regulamentação colectiva sobre a lei que, neste aspecto do subsídio de férias, continua a não se revestir de carácter imperativo [cfr. o artigo 478.º, n.º 2, alínea a) do Código do Trabalho de 2009].
Assim, uma vez que no período codicístico houve expressa previsão convencional do conteúdo do subsídio de férias, a qual prevalece sobre a prescrição legal não imperativa no sentido de que o subsídio de férias se quede pelas prestações retributivas que sejam contrapartida do “modo específico da execução do trabalho”, não cabe discutir, por prejudicada, a alegação da recorrente de que este conceito de “modo específico” terá que ver com condicionalismo externos e contingências que rodeiam a forma/maneira como a prestação é executada (perigosidade, toxidade, o trabalho nocturno etc.) e de que o pagamento do trabalho suplementar é reflexo apenas da contrapartida do trabalho que excede o horário diário e é executado em condições rigorosamente idênticas às que se verificam durante o horário de trabalho[11].
B) Quanto ao subsídio de Natal
O artigo 254.º do Código do Trabalho de 2003 dispôs no seu n.º 1 que «[o] trabalhador tem direito a subsídio de Natal de valor igual a um mês de retribuição que deve ser pago até 15 de Dezembro de cada ano».
Por seu turno o n.º 1 do artigo 250.º do Código do Trabalho de 2003 estabeleceu que, «[q]uando as disposições legais, convencionais ou contratuais não disponham em contrário, entende-se que a base de cálculo das prestações complementares e acessórias nelas estabelecidas é constituída apenas pela retribuição base e diuturnidades». Este preceito tem um campo de aplicação potencial muito dilatado, valendo como “chave interpretativa” de várias disposições do Código que se referem à retribuição sem mais, a propósito do cálculo de determinadas prestações complementares[12].
O subsídio de Natal é inequivocamente uma prestação “complementar”, na medida em que “não tem correspectividade directa com certa quantidade de trabalho”, pelo que o mês de retribuição a que se refere o artigo 254.º, n.º1, é equivalente ao somatório da retribuição base e diuturnidades[13].
A noção de retribuição base e diuturnidades é dada pelas alíneas a) e b) do n.º 2 do sobredito artigo 250.º, nelas se não enquadrando quaisquer das prestações em causa no presente recurso. Assim, face a este regime legal e uma vez que o «mês de retribuição» a que se refere o n.º 1 do artigo 254.º do Código do Trabalho terá de ser entendido de acordo com a regra supletiva constante no n.º 1 do artigo 250.º do mesmo Código, nos termos do qual a respectiva base de cálculo se circunscreve à retribuição base e diuturnidades, conclui-se que, no domínio do Código do Trabalho, a base de cálculo do subsídio de Natal, salvo disposição legal, convencional ou contratual em contrário, se reconduz ao somatório da retribuição base e das diuturnidades[14].
À mesma conclusão se chega por aplicação dos artigos 262.º e 263.º do Código do Trabalho de 2009.
Inexiste disposição legal que contemple especificamente a situação do autor e não há notícia nos autos de cláusula de contrato individual de trabalho que sobre esta matéria disponha, pelo que resta analisar se as disposições do instrumento de regulamentação colectiva aplicável contrariam a sobredita solução legal.
A cláusula 24.ª, n.º 1, do CCT aplicável e vigente em 2003 previa, a respeito do “subsídio de Natal ou 13º mês”, que “[o]s trabalhadores abrangidos por esta convenção terão direito a receber, até 15 de Dezembro, um subsídio cujo valor será correspondente a um mês de vencimento”. Esta cláusula manteve a mesma redacção até 2008 e, se à luz da LCT a jurisprudência entendia que, na falta de outros elementos interpretativos, retribuição, ou vencimento, ou remuneração são vocábulos equivalentese abrangem todos os segmentos que integram a noção de retribuição nos termos do artigo 82.º da LCT[15], o que valia quer para a retribuição de férias e subsídio de férias, quer para o subsídio de Natal – à luz do Código do Trabalho de 2003, não pode dizer-se, como outrora que o intérprete apenas se pode socorrer do conceito legal de retribuição previsto no artigo 249.º, pois a referida norma supletiva do artigo 250.º, n.º 1 circunscreve o conceito de retribuição a atender quando ele constitua base de cálculo de prestações complementares.
Acresce que esta norma supletiva demanda expressamente, para que se não aplique, a existência de norma legal, convencional ou contratual que a contrarie (vide a 1.ª parte do n.º 1 do artigo 250.º), o que claramente afasta resultados interpretativos que, injustificadamente, afastem a sua estatuição.
Ora quanto ao subsídio de Natal inexistia em Dezembro de 2003 qualquer norma convencional com teor similar que contrariasse a previsão do artigo 250.º, n.º 1.
Apenas a partir da alteração operada pelo BTE n.º 6, de 15 de Fevereiro de 2008, a cláusula 36ª, que regula o “Subsídio de Natal”, passou a prever, no seu n.º 4, que “[o]s trabalhadores que aufiram retribuição mista terão direito a receber um subsídio correspondente calculado sobre a sua retribuição de base certa fixa acrescido do valor médio mensal da retribuição variável mensal auferida ou que tinham direito a auferir nos últimos 12 meses”[16].
Pelo que, desde 1 de Dezembro de 2003 e até 19 de Fevereiro de 2008, não relevariam para o cômputo do subsídio de Natal as médias da retribuição variável.
Contudo, por força do disposto no artigo 11º da Lei Preambular ao Código do Trabalho de 2003, “[a] retribuição auferida pelo trabalhador não pode ser reduzida por mero efeito da entrada em vigor do Código do Trabalho”. Pelo que, tendo o artigo 250.º do Código do Trabalho de 2003 natureza supletiva e decorrendo do instrumento de regulamentação colectiva vigente à data da entrada em vigor do código, conjugado com a legislação anterior, um conceito de retribuição mais amplo que abrange as médias da retribuição por trabalho suplementar prestado nos últimos doze meses – como foi decidido na sentença sob recurso no período anterior a 1 de Dezembro de 2003, sem que a recorrente o tenha posto em causa na apelação – os subsídios de férias e de Natal nunca poderiam ser reduzidos por mero efeito da entrada em vigor do Código do Trabalho de 2003[17].
Não acompanhamos a recorrente quando a mesma afirma que o n.º 1 do art. 11.º da Lei Preambular do Código do Trabalho de 2003 só se aplica aos casos que se traduzam numa descida de remuneração face a um histórico/prática no âmbito de uma determinada relação laboral e que da prática da Ré de, efectivamente, não computar o trabalho suplementar no cálculo do subsídio de Natal do A. antes de 2003 não resultou, efectivamente, a partir de 2003, a diminuição da retribuição auferida pelo A. (conclusão 9.ª).
Com efeito, a aferição da existência de uma diminuição da retribuição deve fazer-se por reporte à retribuição que era devida antes da vigência do Código e não por reporte à retribuição efectivamente paga, quando esta era menor do que devida. Ou seja, se a R. antes do Código do Trabalho de 2003 não computava no cálculo do subsídio de Natal a média do trabalho suplementar prestado de forma regular, omissão a que procedia indevidamente – como a recorrente acata, pois não interpôs recurso do segmento da decisão que a condenou a pagar tais médias retributivas no período anterior a 2003 –, é manifesto que a apreciação sobre se houve, ou não, diminuição da retribuição por efeito da vigência do Código do Trabalho deve fazer-se face aos valores correctos que o A. anteriormente tinha direito a auferir e não aos valores, menores, que indevidamente a R. se limitou a pagar-lhe.
Assim, por força do artigo 11.º da Lei Preambular do Código do Trabalho de 2003, deve o subsídio de Natal devido após 1 de Dezembro desse ano contemplar aquelas médias retributivas de trabalho suplementar, tal como se decidiu na sentença sob censura,
A partir de 20 de Fevereiro de 2008 (data da entrada em vigor da alteração ao instrumento de regulamentação colectiva operada pelo BTE n.º 6, de 15 de Fevereiro de 2008), já não há que atender à aludida lei preambular, mas às disposições expressas da CCT sobre o subsídio de Natal que afastam a circunscrição do subsídio de Natal à “remuneração de base e diuturnidades” e fazer nele reflectir nos subsídios de Natal a que o recorrido tem direito nesse período um acréscimo equivalente ao valor médio da retribuição variável mensal auferida nos últimos 12 meses (n.º 4 da cláusula 36.ª).
C) Em suma:
Até 30 de Novembro de 2003, é pacífico que o valor dos subsídios de férias e de Natal deve tomar em consideração todas as prestações regulares e periódicas pagas ao trabalhador como se ele estivesse em serviço efectivo, ou seja, como se ele estivesse a desempenhar o seu trabalho no concreto condicionalismo em que o costuma desempenhar (condicionalismo designadamente de tempo, de penosidade, de antiguidade, etc.).
Após 1 de Dezembro de 2003, exacta situação deve persistir quanto ao subsídio de férias por força do instrumento de regulamentação colectiva aplicável e quanto ao subsídio de Natal por força do já citado artigo 11.º da Lei preambular do Código do Trabalho nesse ano aprovado e atenta a regularidade e periodicidade dos pagamentos de trabalho suplementar, que persistiu, pelo que deverão os valores pagos a este título integrar-se no cômputo do valor retributivo a atender para efeitos de fixação do valores daqueles subsídios, sempre que a frequência do pagamento perfez o meio ano de trabalho, tal como se decidiu na sentença.
A partir de 20 de Fevereiro de 2008 e até à cessação do contrato, enquanto se manteve aquele condicionalismo da prestação periódica e regular de trabalho suplementar, tendo em consideração que a retribuição respectiva deve perspectivar-se como retribuição “variável”, devem as médias respectivas continuar a reflectir-se nos valores daqueles subsídios, em conformidade com as cláusulas 36.ª e 46.ª do instrumento de regulamentação colectiva aplicável, após a revisão de 2008, não tendo, por isso, qualquer relevo para o caso sub judice a circunstância de o Código do Trabalho de 2009 não conter no seu preâmbulo norma de salvaguarda similar à do artigo 11.º do Código do Trabalho de 2003.
Soçobra o recurso, mantendo-se a condenação da 1.ª instância.
*
As custas serão suportadas pela recorrente, uma vez que decaiu no recurso – cfr. o artigo 527.º, n.º 1 do Código de Processo Civil.
*
*
5. Decisão
*
Em face do exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso, confirmando-se a douta sentença da 1.ª instância.
Custas pela recorrente.
Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, anexa-se o sumário do presente acórdão.
__________
Porto, 15 de Junho de 2015
Maria José Costa Pinto
João Nunes
António José Ramos
___________
[1] A expressão é de Pedro Romano Martinez, in Código do Trabalho Anotado, sob a sua coordenação, 8.ª edição, Coimbra, 2009, p. 964.
[2] Assim também se decidiu também no Acórdão da Relação do Porto de 17 de Junho de 2013, processo n.º 527/10.6TTMAI.P1, relatado pela ora relatora. Vide ainda os acórdãos também desta Relação de 2 de Novembro de 2012, Processo: 1202/11.0TTMTS-A.P1 e de 20 de Maio de 2013, Processo nº 279/12.5TTMTS.P1, todos in www.dgsi.pt.
[3] Vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 2009.02.05, Recurso n.º 2574/08 - 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt.
[4] Vide Pedro Furtado Martins, in Cessação do Contrato de Trabalho, 3.ª edição revista e actualizada, Principia, 2012, p. 317.
[5] No seu estudo A prescrição dos créditos laborais. Nótula sobre o art.º 381.º do Código do Trabalho, in Prontuário do Direito do Trabalho, Actualização nº 71, pág. 70 e o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 14 de Dezembro de 2006, in www.dgsi.pt.
[6] O Acordo Colectivo de Trabalho (ACT) para o Betão Pronto, mais tarde Convenção Colectiva de Trabalho entre a D… e a FETESE-Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e outros, ACT inicialmente publicado no BTE n.º 1 de 08/01/1979, com as revisões/alterações publicadas nos BTEs n.ºs 12, de 29/03/1980; 13, de 08/04/1981; 14, de 15/04/1982; 14, de 15/04/1983; 15, de 22/04/1984; 15, de 22/04/1985; 11, de 22/03/1986; 15, de 22/04/1986 (rectificação); 11, de 22/03/1987; 11, de 22/03/1988; 11, de 22/03/1989; 10, de 15/03/1990; 9, de 08/03/1991; 11, de 22/03/1992; 16, de 29/04/1993; 9, de 08/03/1994; 13, de 08/04/1995; 13, de 08/04/1996; 13, de 08/04/1997; 12, de 29/03/1998; 13, de 08/04/1999; 13, de 08/04/2000; 18, de 15/05/2001; 17, de 08/05/2002; 18, de 15/05/2003; 6, de 15/02/2008; 21, de 08/06/2008 (rectificação); e 26, de 15/07/2009, invocado por ambas as partes e que a R. aplica na sua empresa, como resulta dos articulados da acção. Tal instrumento de regulamentação colectiva foi objecto de Portarias de Extensão, tal como noticia o A., publicadas nos BTE n.ºs 28 de 29/7/82, 23 de 22/6/83, 26 de 15/7/84, 26 de 15/7/85, 24 de 29/6/87, 23 de 22/6/88, 31 de 22/8/89, 22 de 15/6/90, 28 de 29/7/91, 7 de 22/2/95, 22 de 15/6/97, 29 de 8/8/98, 24 de 29/6/99, 21 de 8/6/00, 26 de 15/7/01, 36 de 29/9/02, 26 de 15/7/03, 29 de 2008 e 10 de 2010.
[7] Vide, por exemplo, os Acórdão da Relação do Porto de 9 de Dezembro de 2013, Processo n.º 492/11.2TTSTS.P1 e de Acórdão da Relação do Porto 20 de Janeiro de 2014, Processo n.º 688/10.4TTPRT.P1, o primeiro inédito, ao que supomos, e o segundo in www.dgsi.pt.
[8] No seu artigo Comissões, Subsídio de Natal e Férias à luz do Código do Trabalho, publicado no Prontuário do Direito do Trabalho, n.ºs 76, 77,78, Coimbra, 2007, pp. 229 ss.
[9] A expressão é de Monteiro Fernandes in Direito do Trabalho, 13.ª edição, Coimbra, 2006, p. 418.
[10] Vide João Leal Amado, in estudo citado, p. 241.
[11] No sentido de que o suplemento remuneratório conferido pela prestação de trabalho suplementar regular se configura como contrapartida do modo específico da execução do trabalho com a penosidade agravada de o trabalhador ter que desenvolver as suas funções, regularmente, para além do seu horário, pelo que deve a correspondente retribuição média relevar para o cômputo do valor do subsídio de férias, vide Júlio Gomes, in Direito do Trabalho, Relações Individuais de Trabalho, vol. I, Coimbra, 2007, p. 781 e o Ac. do Supremo Tribunal de Justiça de 16 de Janeiro de 2008, processo n.º 07S3790, in www.dgsi.pt.
[12] Vide João Leal Amado, in Contrato de trabalho, 3.ª edição, Coimbra, 2011, p. 306, a propósito do equivalente artigo 262.º do Código do Trabalho de 2009.
[13] Vide Monteiro Fernandes, in Direito do Trabalho, 13.ª edição, Coimbra, 2006, p. 470.
[14] Sublinhando a atitude de ruptura do Código do Trabalho de 2003 com o direito anterior, no que toca à limitação da base de cálculo do subsídio de Natal, vide os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 2006.03.14, Processo n.º 3825/05, de 2007.04.18, Processo n.º 4557/06 e de 2010.03.25, Processo n.º 1052/05, todos da 4.ª Secção e sumariados in www.stj.pt.
[15] Vide o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 19 de Fevereiro de 2003, Revista n.º 4072/2002 da 4.ª Secção, sumariado in www.stj.pt.
[16] A Convenção Colectiva de Trabalho publicada no Bol. Trab. Emp., 1.ª série, n.º 18, de 15 de Maio de 2003 previa já a inclusão do valor médio mensal da retribuição variável mensal auferida nos últimos 12 meses no subsídio de Natal, mas apenas para os trabalhadores técnicos de vendas que aufiram retribuição mista, mantendo quanto à generalidade dos trabalhadores a correspondência do valor do subsídio a “um mês de vencimento”.
[17] Vide os Acórdãos da Relação do Porto, de 2010.09.13, Proc. n.º 208/09.3TTSTS, de 2010.11.15, Proc. nº 342/08.7TTVLG e 752/10.0 TTVNG e de 2011.02.21, Proc. n.º 547/09.3TTGDM.P1.
___________
Nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil, lavra-se o sumário do antecedente acórdão nos seguintes termos: I – A regra especial da prescrição de créditos no plano laboral consagrada no art. 337º n.º 1 do CT 2009 não é substituída pelo prazo de 6 meses que o art. 388º n.º 2 do mesmo CT fixa como prazo limite para a instauração da acção de impugnação do despedimento colectivo.
II – A reclamação de créditos retributivos emergentes da execução do contrato de trabalho que findou por despedimento colectivo aceite pelo trabalhador, mostra-se sujeita aquele prazo de prescrição mas não a qualquer prazo de caducidade.
III – Os factos de o trabalhador não ter impugnado a decisão do despedimento, ter aceite a compensação disponibilizada pela cessação do contrato e não ter, nas reuniões de negociação, manifestado a sua pretensão em ser ressarcido de tais créditos, não é susceptível de criar no empregador um estado objectivo de confiança no sentido de que o trabalhador se abstenha, no futuro, de reclamar outros direitos de que entenda ser titular.
IV – À luz da Convenção Colectiva de Trabalho entre a D… e a FETESE-Federação dos Sindicatos dos Trabalhadores de Serviços e outros, a “retribuição variável mensal” prevista nas suas cláusulas que regulam a atribuição dos subsídios de férias e de Natal, abrange a média da remuneração do trabalho suplementar prestado regularmente ao longo dos 12 meses anteriores.

Maria José Costa Pinto