Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
785/08.6TYVNG-D.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA PAULA AMORIM
Descritores: INSOLVÊNCIA
NULIDADES DE SENTENÇA
VERIFICAÇÃO DE CRÉDITOS
QUALIFICAÇÃO DE CRÉDITOS
CONTRATO-PROMESSA
CONTRATO DE EMPREITADA
DIREITO DE RETENÇÃO
GRADUAÇÃO
Nº do Documento: RP20160407785/08.6TYVNG-D.P1
Data do Acordão: 04/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 622, FLS.48-88)
Área Temática: .
Sumário: I - Em processo de insolvência o promitente - comprador nas situações típicas definidas no AUJ nº 4/2014 e o empreiteiro pelas despesas e serviços realizados com a obra, gozam do direito de retenção.
II - Provada a conexão material entre o crédito e a coisa, a lei não impede o reconhecimento do direito de retenção pelo facto de existir uma identidade de fonte – o contrato de empreitada.
III - O empreiteiro tem a detenção da coisa objeto do direito de retenção quando no prédio mantém diverso equipamento e materiais seus e tutela pela sua guarda.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Insolv-Recl-Retenção785-08.6TYVNG-D
Comarca do Porto-Inst Central Vila Nova de Gaia
2ª Sç Comércio-J2
Proc. 785-08.6TYVNG-D
Proc. 1257/15-TRP
Recorrente: I…, SA
E… e mulher

Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim
Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes
Rita Romeira
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Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] (5ª secção judicial – 3ª Secção Cível)

I. Relatório
Na sequência da sentença que declarou a sociedade “B…, Lda.”, em estado de insolvência, fixou prazo para reclamação de créditos e em que se encontra apreendido nos autos de apreensão (apenso n.º 785/08.6TYVNG-B) os bens móveis e os bens imóveis aí identificados, foram reclamados diversos créditos.
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O Administrador de Insolvência juntou lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, com parecer.
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Os credores C… e mulher, D…, E… e mulher F..., G…, Ld.ª e H…, Ld.ª. apresentaram impugnações.
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O Administrador da Insolvência respondeu às impugnações.
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Realizou-se tentativa de conciliação.
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Proferiu-se sentença que homologou a lista dos credores reconhecidos constante de fls. 5 a 9 do presente apenso, no que se reporta aos créditos não impugnados, prosseguindo os autos para apreciação do montante e natureza dos créditos reclamados pelos credores C… e mulher, D…, E… e mulher F…, G…, Ld.ª e H…, Ld.ª.
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Procedeu-se à realização da audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades prescritas na lei.
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O despacho que contém as respostas à decisão de facto consta de fls. 394 a 397.

Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:
“Face ao exposto, declaro verificados os créditos supra reconhecidos e graduo-os para serem pagos através do produto da massa insolvente, pela seguinte ordem:
- Através do produto da venda do bem imóvel – verba 4:
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido dos credores C… e esposa e H…, Ldª, em pé de igualdade e rateadamente;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.;
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do Instituto da Segurança Social, I.P.;
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
6.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º, n.º 4, al. c));
7.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º.
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- Através do produto da venda do bem imóvel – verba 31:
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido dos credores E… e H…, Ldª, em pé de igualdade e rateadamente;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º, n.º 4, al. c));
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º.
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- Através do produto da venda dos bens imóveis – verbas 1 a 3, 5 a 25:
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido do credor H…, Ld.ª;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.;
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do Instituto da Segurança Social, I.P.;
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
6.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º, n.º 4, al. c));
7.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º
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- Através do produto da venda dos bens imóveis – verbas 26 e 27:
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º, n.º 4, al. c));
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º
- Através do produto da venda dos bens imóveis – verbas 28 e 29:
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º, n.º 4, al. c));
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º.
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- Através do produto da venda dos bens móveis:
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P.;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do credor/requerente da insolvência;
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º, n.º 4, al. c));
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º.
Custas pela massa insolvente - art. 304º, do C.I.R.E.
Valor da ação - o correspondente ao valor do ativo - art. 301º, parte final, do diploma legal em referência”.
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O credor I…, SA veio interpor recurso da sentença.
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Nas alegações que apresentou o apelante formulou as seguintes conclusões:
1. A douta sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia (artigo 615.º, n.º 1, alínea d) do NCPC), uma vez que não gradua os créditos – designadamente o da ora Recorrente, que deveria ter sido graduado em primeiro lugar por beneficiar de hipoteca e ter sido devidamente reclamado naquela execução – sobre o produto da venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692, arrematado pela credora J….
2. A douta sentença recorrida enferma de nulidade por contradição entre os fundamentos e a decisão, tornando a decisão ininteligível (artigo 615.º, n.º 1, alínea c) do NCPC), uma vez que, apesar de concluir, em relação aos créditos de C… e esposa, H… Lda. e E… e esposa, que “o direito de retenção é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída” (sublinhámos), gradua a final os créditos dos referidos credores com prevalência sobre as anteriormente constituídas hipotecas de que beneficia a ora Recorrente,
3. Foi requerida a retificação das diversas inexatidões ou lapsos evidentes na douta sentença recorrida, a saber:
A douta sentença recorrida graduou os créditos da ora Recorrente logo após as dívidas da Massa Insolvente relativamente às verbas n.ºs 26 e 27 e não relativamente às verbas n.º 28 e n.º 29, sobre as quais incide a garantia hipotecária da Recorrente.
Esta troca das verbas em que a Recorrente surge graduada (sendo que o foi, e bem, logo após as dívidas da Massa Insolvente) dever-se-á a mero lapso, cuja correção foi requerida ao Tribunal a quo.
Refere-se na sentença recorrida que as verbas sobre as quais incide a garantia hipotecária da ora Recorrente são as verbas 1 a 25, porém, as verbas relativamente às quais esta credora tem garantia hipotecária são, não só aquelas, mas também as verbas n.º 28 e n.º 29, pelo que se impõe também a retificação daquela referência, como requerido.
A verba n.º 31 constitui o imóvel descrito sob o n.º 1686 de ….
O credor E… reclamou um crédito com alegado direito de retenção sobre um imóvel não apreendido para a Massa, porque vendido em processo de execução fiscal – fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692, ali arrematado pela credora J… (entretanto habilitada aqui na insolvência pela ora Recorrente).
Foi apreendido para a insolvência o produto daquela venda na execução fiscal, no montante de € 96.400,00, depositado pela referida credora previamente à cessão dos seus créditos à agora habilitada e recorrente I….
O reconhecimento de direito de retenção relativo ao crédito de F… e esposa por referência ao bem imóvel apreendido e que constitui a verba n.º 31, bem como a graduação do crédito daquele credor após as Dívidas da Massa Insolvente relativamente ao imóvel que constitui aquela verba – para além do que relativamente ao mérito da decisão se alegará – dever-se-á a mero lapso manifesto, ou erro evidente, cuja correção igualmente se impõe e foi requerida.
4. Só com a requerida retificação a douta sentença será expurgada dos erros materiais que a viciam e se harmonizará com as verbas apreendidas e com cada um dos direitos invocados pelos credores em relação às mesmas.
5. Dos factos considerados provados em sede de audiência de julgamento das impugnações à lista de créditos elaborada pelo Ilustre Administrador da Insolvência – que são os elencados na douta sentença recorrida – não poderia concluir-se e decidir-se como vem expresso na douta sentença relativamente aos créditos de C… e mulher D… e de E… e mulher F…, e nem, sem prescindir, desta decisão resultaria a graduação conforme vem a final ordenada na douta sentença recorrida.
6. A simples alegação de um direito de retenção (previsto na alínea f) do nº 1 do artigo 755º do CC), é insuficiente para que lhes possa ser reconhecido o mencionado direito.
7. Em processo de verificação e graduação de créditos, apenso a processo de insolvência, para que seja reconhecido o privilégio consagrado no nº 2 do artigo 759º do CC não basta a simples alegação, por parte do credor reclamante, de factos eventualmente integradores do direito de retenção, consagrado na alínea f) do nº 1 do artigo 755º do Código Civil. É necessário que o credor reclamante prove os factos dessa alegação, juntando, para tanto, o título justificativo, que, no caso, é a sentença condenatória a reconhecer o incumprimento do promitente vendedor e a tradição da coisa para o promitente-comprador – Acórdão do STJ de 30.11.2010, Processo nº2637/08.0TBVCT-F.G1.S1, disponível in www.dgsi.pt.
8. Se assim não fosse, seria o Administrador obrigado a reconhecer a existência de um qualquer contrato-promessa apenas mediante a simples alegação do promitente-comprador de que, tendo havido traditio, houve incumprimento por banda do promitente-vendedor, tornando incompreensível o regime excecional consagrado no artigo 106º.
9. Nenhum dos credores em apreço juntou qualquer sentença nos moldes indicados, que pudesse determinar o reconhecimento do seu crédito como garantido por direito de retenção e nem resulta do teor das suas reclamações que tenham, sequer, demando em juízo a Insolvente, por referência ao alegado incumprimento dos seus contratos promessa.
10. Os Credores em causa não invocaram sequer, e muito menos tal foi demonstrado em sede de julgamento das impugnações, que tivessem interpelado a Insolvente para cumprir o(s) suposto(s) contrato(s) prometido(s), muito menos que tenha ocorrido incumprimento definitivo da(s) promessa(s).
11. Para que o beneficiário de promessa de transmissão goze de direito de retenção e da aplicação do sancionamento da restituição do sinal em dobro, tem de haver incumprimento definitivo e não simples mora imputável à outra parte.
12. Para existir incumprimento definitivo teria previamente que existir interpelação para o contraente em mora cumprir, a designada interpelação admonitória – uma expressa e formal intimação ou advertência ao devedor moroso de que, se não cumprir dentro do prazo razoável que o credor lhe fixar, incumpre definitivamente o contrato, consubstanciada - na intimação para o cumprimento; - na fixação de um termo perentório para o cumprimento;- na comunicação de que a obrigação se terá definitivamente por não cumprida se não se verificar o cumprimento daquele prazo.
13. Não se mostra demonstrada a mora no cumprimento das obrigações contratuais pela ora Insolvente, pois que “o devedor só fica constituído em mora depois de ter sido judicial ou extrajudicialmente interpelado para cumprir” e essa interpelação não vem em lado algum alegada e muito menos provada, entre a factualidade em que se funda a decisão recorrida.
14. Mas não basta a simples mora para desencadear o sancionamento previsto na norma, pois esta é pressuposto da execução específica, e não da resolução do contrato. E, sem de forma alguma conceder, ainda que se considerasse ter ocorrido mora no cumprimento dos contratos, os aludidos credores não a converteram em incumprimento definitivo.
15. Do conjunto dos factos alegados e provados nenhum permite inferir quanto a uma recusa categórica e séria de cumprimento por parte da promitente-vendedora, isto é, quanto à sua vontade ou intenção definitiva de não querer cumprir, não existe incumprimento definitivo dos contratos-promessa de compra e venda e, em consequência, é inaplicável a cominação prevista no n.º 2 do artigo 442.º do CC, sendo inexistentes os alegados créditos sobre a Insolvente, bem como a correspondente garantia que, sem fundamento legal, lhes foi reconhecida.
16. No que respeita ao crédito de C… e mulher D…, da douta sentença recorrida não decorre a verificação de qualquer incumprimento definitivo do contrato, quando muito e sem prescindir (designadamente por ausência de interpelação para o cumprimento – artigo 805.º do CC) decorre uma situação de mora, de atraso no cumprimento, que não justifica por si só a resolução do contrato e nem consubstancia incumprimento definitivo, conforme referido.
17. Quanto à fundamentação deste direito e garantia, desconhece-se a que “conduta posterior da insolvente” se referirá o Tribunal a quo, que haja revelado que a Insolvente “não queria cumprir definitivamente o acordado”, pois nada se provou a respeito de condutas posteriores, conforme resulta da fundamentação factual da decisão.
18. Relativamente ao crédito reconhecido a E… e mulher, valem as mesmas considerações, não tendo sido invocada e nem demonstrada (sequer nesta sede de reclamação de créditos – sendo certo que o deveria ter sido em ação judicial própria e adequada a obter a competente sentença) a interpelação da Insolvente para cumprir e nem, muito menos, uma interpelação admonitória.
19. Não existindo incumprimento definitivo, não têm os credores o direito de resolver o contrato, de exigir o pagamento do sinal em dobro e de invocar o direito de retenção.
20. Estaria na livre disposição do Administrador da Insolvência optar, ou não pelo cumprimento dos contratos promessa, conforme estatui o artigo 102º e nº 1 e 2 do art.º 106º do CIRE. Caso a opção fosse no sentido do não cumprimento dos contratos, qualquer crédito a favor de algum dos identificados credores seria apurado com base nas regras conjugadas do artigo 106.º n.º 2 e n.º 5 do artigo 104.º do CIRE, emergindo tal crédito da opção de recusa de cumprimento dos contratos pelo Sr. Administrador da Insolvência e não de qualquer outra causa, não estando, assim, garantido por direito de retenção, constituindo ao invés um crédito meramente comum.
21. Como foi expressamente afirmado pelo Ilustre Administrador da Insolvência na sua resposta às impugnações, o mesmo não considerava ter ocorrido um incumprimento contratual definitivo por parte da Insolvente, o próprio Administrador não denunciou os contratos promessa de compra e venda celebrados com os impugnantes, e ao invés mostrou disponibilidade para os honrar, existindo assim, tão só e quando muito, uma mera situação de mora no cumprimento dos contratos, face às datas neles estipuladas.
22. O beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real terá direito de retenção se tiver obtido a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, e se o seu crédito resultar de não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442.º do CC (artigo 759.º, n.º 1, alínea f) do Código Civil), dependendo a constituição de um direito de retenção da verificação dos pressupostos previstos no artigo 755.º, n.º 1, do Código Civil.
23. O requisito basilar da tradição material do bem [o “corpus possessório”] não foi demonstrado por nenhum dos credores.
24. A mera “traditio”, resultante de um contrato-promessa não pode catalogar-se como sendo pura posse, ou seja, como contendo no seu âmbito o corpus e o “animus”, mesmo que os credores houvessem obtido as chaves do imóvel.
25. O direito de retenção do promitente comprador tradiciário não pode ser constituído por negócio jurídico ou acordo, dependendo a sua constituição da verificação dos pressupostos materiais previstos no art.º 755º, nº 1 alínea f) do Código Civil, os quais têm previamente que ser reconhecidos por sentença para que possam ser exercidos em sede de reclamação de créditos no processo de insolvência.
26. Por referência ao requisito essencial da tradição material do bem [corpus possessório] a douta sentença recorrida revela-se absolutamente lacónica e ligeira, tratando a matéria sem qualquer caráter de essencialidade, como se o mesmo não constituísse, como constitui, um fator absolutamente essencial para o reconhecimento do direito de retenção.
27. Não estavam nem estão, porém, por tudo o exposto, reunidas as condições de facto e de direito para que aos credores em apreço seja reconhecido um crédito e a respetiva garantia por direito de retenção.
28. Sem de forma alguma prescindir de tudo o que acabou de expor-se, cumpre referir que o direito de retenção do beneficiário da promessa de transmissão ou constituição do direito real, tal como se encontra consagrado no art.º 755.º/1, alínea f) do CC, transporta um regime jurídico-legal perturbador de princípios básicos do Estado de direito, designadamente os princípios da
proporcionalidade (que impõe a salvaguarda de outros direitos ou interesses constitucionalmente protegidos), da igualdade (que impõe que situações idênticas sejam objeto do mesmo tratamento, proibindo diferenciações destituídas de fundamento racional), da confiança e segurança jurídica e na estabilidade dos direitos anteriormente constituídos, ínsitos no princípio do estado de direito democrático e plasmados no art.º 2.º da CRP, afeta gravemente as fundadas e legítimas expectativas de terceiros, lesando inexoravelmente a certeza e a segurança do tráfego jurídico e a proteção da confiança e da segurança jurídica dos particulares, sendo por isso inconstitucional, como se invoca para todos os efeitos legais.
29. Acresce, ainda, que o reconhecimento e graduação do crédito de E… e esposa relativamente ao imóvel que constitui a verba n.º 31 (imóvel sobre o qual não invocaram, nem têm, nem demonstraram qualquer direito) consubstancia um mero lapso manifesto e a sentença recorrida enferma de nulidade por omissão de pronúncia, uma vez que não gradua os créditos – designadamente o da ora Recorrente – sobre o produto da venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692, arrematado pela credora J…, o qual foi apreendido para os presentes autos de insolvência.
30. Os credores E… e esposa não invocaram e muito menos demonstraram que na execução fiscal hajam reclamado qualquer alegado crédito, apesar de invocarem terem tomado conhecimento prévio da venda.
31. O credor hipotecário (a J…, cujo crédito foi entretanto cedido à Recorrente) exerceu tempestivamente os seus direitos no processo de execução fiscal onde ocorreu a venda, e nesse condicionalismo apresentou proposta de aquisição e depositou o respetivo preço, na expectativa e convicção de que o mesmo lhe viria a ser devolvido por gozar de garantia preferencial, pelo que o seu direito tem que ser protegido na insolvência, nos mesmos termos em que o estaria na execução fiscal em que reclamou atempadamente o seu crédito e onde apresentou proposta e depositou o preço.
32. Suprindo a nulidade de omissão de pronúncia revelada na sentença recorrida, o crédito da Recorrente, reclamado e reconhecido, deverá – por tudo o exposto, quer quanto ao não reconhecimento de direito de retenção aos credores reclamantes E… e mulher F…, quer quanto à sua não intervenção no processo de execução fiscal onde o bem foi vendido, quer quanto à salvaguarda legal dos direitos da credora hipotecária – ser pago com preferência sobre quaisquer outros credores, graduando-o logo após as dívidas da Massa Insolvente, até ao montante do produto da venda.
33. Não sendo reconhecido direito de retenção relativamente ao crédito de C… e mulher D…, não pode, também, o respetivo crédito ser graduado com prevalência sobre o da ora Recorrente, devendo este, ao invés, prevalecer sobre aquele crédito de natureza comum.
34. Dada a estrutura do direito de retenção, garantia real de origem legal, o direito de retenção só pode ser constituído invocados e verificados que estejam os pressupostos de facto legalmente previstos, o que pressupõe a prévia apreciação de uma situação de facto e de direito.
35. Deste modo, não basta, para o preenchimento da previsão legal, a mera invocação nominal desse direito.
36. Nenhum dos credores a que se reporta o presente recurso alegou qualquer dos factos integrativos de um direito de retenção, na sua reclamação de créditos, onde se contêm o pedido e a causa de pedir da sua pretensão, e nem esses factos se contêm entre os elencados como provados na douta sentença recorrida, constituindo a base factual em que assenta a apreciação jurídica da causa.
37. É manifesta a falta de cumprimento, por todos os credores cujos créditos e respetiva graduação vem nesta sede posta em causa, do ónus da alegação e prova dos factos constitutivos do direito [de crédito e da garantia retenção], pelo que a decisão final sempre se imporia no sentido do não reconhecimento dessa garantia especialíssima.
38. Relativamente aos créditos de H… Lda., vêm os mesmos graduados logo após as dívidas da Massa Insolvente, que saem precípuas, e previamente ao da Recorrente, em relação a todos os imóveis que constituem as verbas 1 a 25.
39. Para que exista direito de retenção é necessário que o respetivo titular detenha licitamente uma coisa que deva entregar a outrem, que simultaneamente seja credor daquele a quem deva a restituição e por último que entre os dois créditos haja uma relação de conexão (debitum cum re junctum) por “resultar o credito de quem esteja obrigado a entregar a coisa de despesa com ela feitas ou de danos por ela causados”.
40. Ao empreiteiro não é legalmente reconhecido um direito de retenção, garantia excecional do credor, unicamente aplicável nos casos expressamente previstos na lei e não podendo aplicar-se analogicamente, pois ele não figura em nenhum dos casos excecionais previstos nas diversas alíneas do art. 755.º e, por outro lado, não cabe no perímetro do art. 754.º (neste sentido, PIRES DE LIMA / ANTUNES VARELA, «Código Civil Anotado, Vol. II…», pp. 875 e ss.).
41. O direito de retenção é atribuído ao devedor que disponha de um crédito sobre o seu credor, desde que o crédito resulte de despesas feitas por causa da coisa ou de danos por ela causados – e o crédito do empreiteiro tem por objeto o preço da empreitada, o qual não deve ser confundido com despesas (neste sentido, também, cfr. o Acórdão da Relação de Lisboa, de 05.06.1984, CJ, Ano IX, Tomo III, pp. 137 e ss. e o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 08.04.1997, Proc. n.º 96A849, acessível em www.dgsi.pt).
42. Mas acresce ainda, sem de forma alguma prescindir, que dos factos provados, que constituem a base sobre que assenta a decisão jurídica, não resulta, sequer, que a credora em causa seja por qualquer forma detentora (de qualquer) das 25 frações em relação às quais no entanto lhe vem reconhecido este direito real de garantia especialíssimo.
43. Manter “na referida obra diverso equipamento e materiais seus” e tutelar “pela sua guarda”, conforme foi (unicamente) provado, não corresponde de forma alguma a deter o prédio, a retê-lo como salvaguarda e exigência para o pagamento do seu alegado crédito, pelo que deste facto (ou de qualquer outro provado) não poderia o tribunal a quo concluir pelo exercício de um direito de retenção pela credora em causa.
44. A única coisa que a credora em causa comprovadamente retém é o seu equipamento e materiais, que guarda no local da obra. Nada a credora em causa alegou ou demonstrou, nem consequentemente se refere na douta sentença recorrida, quanto ao imóvel em si mesmo, onde a alegada obra terá sido concretizada.
45. Não se provando a detenção legítima ou posse material do imóvel pela Credora em causa, com a subsequente obrigação de o entregar, no momento em que dispõe do crédito, verifica-se a falta de um dos requisitos essenciais e basilares do direito de retenção, que não pode nem poderia haver-lhe sido reconhecido.
46. Acresce ainda, sem de forma alguma prescindir, que, como referiu o Ilustre Administrador da Insolvência em resposta à impugnação da lista de créditos, e como foi admitido pela credora em causa, a obra não foi concluída nem entregue, e nem existe nenhum documento que ateste a sua boa execução, sendo certo que não existia incumprimento definitivo imputável à Insolvente, mas quando muito uma mera situação de mora – ainda que o contrato de conta corrente estabelecido entre as duas sociedades não estipulasse prazos de pagamento –, e uma rescisão unilateral por parte da aludida credora reclamante.
47. Por outro lado, a exercer-se o direito de retenção sobre a generalidade das frações autónomas do prédio em questão – ainda que a credora em causa apenas haja individualizado uma fração, onde residiria uma pessoa singular, e nenhum facto foi demonstrado sequer quanto a ela, ou a outras – invocar-se-ia uma garantia de valor muito superior ao montante do crédito reclamado pela aludida credora.
48. Para além de que, tendo a credora em causa intervindo apenas na “fase de conclusão da obra” no referido prédio, mediante “fornecimento e assentamento de caixilharias e serralharias” (cfr. artigo 4.º da respetiva reclamação de créditos), estão introduzidos na obra, no empreendimento em que se inserem as frações autónomas em questão, materiais de muitos outros fornecedores, que igualmente não se encontram pagos e que merecem tutela equiparada, não sendo essa pequena parcela de bens embutida na obra apta a configurar – em conjunto com a totalidade de todo o imóvel – a coisa que a credora houvesse que restituir à Insolvente mas que, face ao não pagamento do preço das caixilharias e serralharias, a habilitasse a reter todo o prédio, ou todas as frações autónomas relativamente às quais a garantia não peticionada nem demonstrada lhe foi porém reconhecida.
49. Sem prescindir da inexistência de direito de retenção a favor do empreiteiro, da factualidade demonstrada não poderia o Tribunal a quo concluir no sentido da existência de qualquer direito de retenção a favor da credora em causa, porque não detentora do prédio, de qualquer fração, muito menos de todas aquelas sobre as quais lhe foi reconhecida a garantia.
50. A decisão recorrida não teve, assim, em atenção todos os factos essenciais para a correta decisão da causa, concluindo juridicamente de forma incorreta relativamente ao reconhecimento, classificação e graduação dos créditos.
51. Deste modo, na procedência do presente recurso e suprimento das nulidades invocadas, bem como após retificação dos erros materiais de que padece a douta sentença recorrida, não pode senão tal sentença ser substituída por douto acórdão que gradue os créditos da Credora ora Recorrente logo após as dívidas da Massa Insolvente que hajam que sair precípuas dos bens, e com prioridade sobre qualquer dos créditos cuja graduação se ataca nesta sede de recurso, relativamente a todos os imóveis que constituem as verbas n.ºs 1 a 25 (frações autónomas do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692) e as verbas n.º 28 e n.º 29 (frações P e Q da mesma descrição CRP 246 de Porto – Campanhã, artigo matricial urbano 10770), bem como sobre o produto da venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de Fânzeres, CRP Gondomar 2692, apreendido para a insolvência.
52. A sentença recorrida enferma das nulidades previstas no artigo 615.º, n.º 1, alíneas c) e d) do NCPC e contém diversos erros materiais cuja correção foi requerida, revelando-se ainda violadora, entre outras que V. Ex.as doutamente suprirão, das seguintes disposições legais: Artigos 9.º, 342.º, 442.º, 754.º, 755.º, 759.º, 805.º, 824.º, n.º 3, todos do Código Civil, Artigos 102.º, 104.º, 106.º do CIRE Artigos 264.º e 664.º do CPC aplicável ao tempo do julgamento Fazendo (uma errada) aplicação da norma inconstitucional contida no artigo 755.º do Código Civil.
Termina por pedir que seja concedido provimento ao presente recurso, sendo consideradas verificadas e supridas as nulidades invocadas, bem como retificados os erros materiais contidos na sentença recorrida, revogando-se a decisão recorrida e substituindo-a por douto acórdão que não reconheça o direito de retenção aos créditos a que se refere o presente recurso e que gradue os créditos da Credora ora Recorrente logo após as dívidas da Massa Insolvente que hajam que sair precípuas dos bens, e com prioridade sobre qualquer dos créditos cuja graduação se ataca nesta sede de recurso, relativamente a todos os imóveis que constituem as verbas n.ºs 1 a 25 (frações autónomas do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692) e as verbas n.º 28 e n.º 29 (frações P e Q da mesma descrição CRP 246 de Porto – …, artigo matricial urbano 10770), bem como sobre o produto da venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de Fânzeres, CRP Gondomar 2692, apreendido para a insolvência.
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Os credores-impugnantes E… e mulher F… e H…, LDA., vieram apresentar resposta ao recurso.
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E… e esposa F… na resposta ao recurso formularam as seguintes conclusões:
1. A alegação da Recorrente, não obstante a sua extensa exposição, não retrata com rigor a realidade carreada para o processo e procede a uma errada interpretação do direito aplicável.
2. Assim, ainda que se reconheça pertinência da argumentação da Recorrente quanto a alguns dos lapsos identificados na decisão recorrida, não poderá a pretensão quanto ao seu crédito vir a ser atendida,
3. Pugnando-se, portanto, perante V. Exas., pela manutenção da graduação do crédito dos Recorridos, reconhecido no valor de 170.000,00€, logo após as dívidas da Massa Insolvente, tal qual argumentado e requerido na sua impugnação da lista de credores reconhecidos.
I. Da nulidade e dos erros materiais constantes da sentença recorrida
4. As frações apreendidas no âmbito da presente insolvência, assim com os respetivos ónus e encargos, encontram-se discriminadas, designadamente, nas fls. 419 a 424 dos presentes autos.
5. Da análise desse documento resulta que a verba n.º 31 se reporta a um prédio rústico, da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o artigo 1686.
6. Na linha imediatamente seguinte à reservada à verba n.º 31 consta a menção à fração U de um prédio urbano, da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o artigo n.º 6117.
7. No campo, daquela linha, reservado à discrição sobre a situação da fração consta: “Não foi apreendido por ter sido objeto de venda em processo de execução fiscal. Prom. Comp. – E… (…) Bem vendido em processo de execução fiscal por € 96.400,00, encontrando-se apreendido a favor da massa €96.000,00”
8. É certo que os Recorridos não reclamam qualquer crédito sobre a verba n.º 31, tal qual o é que a verba nº 31 se reporta ao imóvel descrito na matriz sob o n.º 1686 de …, inversamente ao que, à partida, parece decorrer da sentença recorrida,
9. No entender dos Recorridos, a menção à verba n.º 31, constante da douta decisão recorrida (particularmente nas suas página 4 e 13), é fruto de um evidente lapso de identificação do bem sobre o qual os Recorridos reclamaram o seu crédito.
10. Conforme decorre dos autos - particularmente de fls. 419 a 424 e da própria sentença -, a fração “U” foi vendida, no âmbito de um processo de execução fiscal, em data anterior à declaração de insolvência da B…, Lda. (cfr. documento n.º 19 da impugnação dos Recorridos).
11. No entender dos Recorridos resulta, então, que referências à verba nº 31, na douta sentença, constituem, verdadeiramente, referências ao produto da venda da fração “U”,
12. Ou seja, à quantia de 96.000,00€, essa sim apreendida à ordem dos presentes autos e relativamente à qual os Recorridos possuem direito de retenção, por força do n.º 3 do artigo 824.º do CC.
Neste sentido:
13. Não existe qualquer omissão de pronúncia quanto à graduação do produto da venda da fração “U”, pois que essa graduação, atenta a contextualização efetuada na página 4, consta da página n.º 13 da sentença, sob a designação através do produto da venda do bem imóvel – verba 31,
14. Não podendo, por conseguinte, o crédito da Recorrente ser graduado no lugar que esta lhe sugere, por sobre aquele bem recair o direito de retenção dos Recorridos que prevalece, por força do n.º 2 do artigo 759º CC, sobre o crédito da Recorrente.
15. Destarte, a existir omissão, ela reportar-se-á, somente, ao imóvel rústico, da freguesia de …, inscrito sob a respetiva matriz sob o artigo n.º 1686, livre de qualquer ónus.
Por outro lado,
16. A Recorrente advoga, ainda, a ininteligibilidade da sentença, por contradição entre os fundamentos e a decisão, com a consequente nulidade.
17. A nulidade que a Recorrente identifica não passa de um lapso de escrito revelado pelo seu contexto e circunstâncias, que, portanto, deve ser, naturalmente, retificado.
10 De acordo com a certidão junta aos autos, como documento n.º 19 da impugnação dos Recorridos, a fração “U” foi adjudicada à J… no dia 17-12-2008, pelo valor de 96.400,00€.
18. A construção gramatical do trecho referido pela Recorrente, a frase “ O direito de retenção confere ao seu titular o direito a ser pago com preferência sobre os demais credores (art. 666º, por força dos artºs 758º e 759º).”11 e a letra do artigo 759.º do CC são bastantes para concluir que, por evidente lapso, naquela frase se omitiu a expressão “ainda que”,
19. E, por isto, evidente no entender dos Recorridos, que o que ali se pretendia escrever era “O direito de retenção de que goza o referido credor, por demonstrada tradição e detenção do imóvel, é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invoca-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída”.
20. A sentença recorrida não padece, portanto, de qualquer nulidade, carecendo, tão só, da correção, nos termos do n.º 1 do artigo 614.º do NCPC, das referidas inexatidões.
II. Das alegações da Recorrente quanto ao crédito dos Recorridos
21. A Recorrente discorda, ainda, dos termos da sentença de verificação e graduação de créditos na parte em que reconhece aos Recorridos um direito de crédito garantido por direito de retenção e o gradua, quanto ao bem substituto da fração “U”, em seguida às dívidas da massa insolvente.
22. Não obstante a sua imensa diversidade argumentativa, as alegações da Recorrente encontram-se minadas por erros analíticos quanto aos atos praticados e provas produzidas nos presentes autos e revelam uma errada interpretação das normas legais aplicáveis in casu.
23. Assim, atentos os fundamentos que infra demonstraremos, deve a pretensão da Recorrente ser declarada improcedente, mantendo-se reconhecido o crédito, no valor de 170.000,00€, e o direito de retenção dos Recorridos, assim como a sua graduação, quanto ao produto da venda da fração “U”, logo após as dívidas da Massa Insolvente.
Primeiramente:
24. De acordo com o n.º 1 do artigo 131º do CIRE, às impugnações da lista de credores reconhecidos podem responder o administrador de insolvência e qualquer interessado que assuma posição contrária, sendo que, se não houver lugar a resposta, a impugnação deverá ser julgada procedente.
25. Ora, apenas o Senhor Administrador se pronunciou quanto à impugnação deduzida pelos Recorridos,
26. E, atentos os termos em que o fez, somente para reiterar não possuir condições para sobre ele se apreciar e, dessarte, reservar essa apreciação ao tribunal a quo.
27. Da resposta do Senhor Administrador de Insolvência não resulta que este conteste a existência do crédito, a existência de condições processuais para que esse crédito pudesse ser apreciado ou a verificação dos elementos constitutivos do direito de retenção.
28. Ora, porque assim é, são os Recorridos do entendimento que a oposição que a Recorrente vem, ora, oferecer à impugnação deduzida é, absolutamente, inadmissível porque, manifestamente, extemporânea.
29. A impugnação da lista de credores reconhecidos constitui um incidente do processo de insolvência, que, por força do seu objetivo, – a saber: a declaração do Direito relativamente à existência de direitos e qualificação do respetivo crédito – tem caráter declarativo e, portanto, deve obediência às regras do Código de Processo Civil, designadamente, as vertidas nos seus artigos 566º e seguintes, 573º e 574º ( vd. neste sentido Luís Fernandes e João Labareda, in Nota n.º 7 ao artigo 131º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, Quid Juris - Sociedade Editora, Lda., Lisboa, 2008.)
30. Porque assim é, encontra-se a Recorrente impedida de vir, agora e somente agora, aduzir a argumentação vertidas nas suas alegações recursivas.
31. É que, na medida em que o artigo 573.º do NCPC determina que toda a defesa deve ser deduzida na contestação – o que, aqui, se traduzia na obrigação da Recorrente alegar todos os argumentos de oposição à impugnação deduzida pelos Recorridos em sede de resposta –, o silêncio da Recorrente, no momento da apresentação da resposta, fez precludir a possibilidade de vir aduzir os fundamentos da sua oposição neste momento,
32. O qual, sem prejuízo da devida vénia, não é adequado à discussão das questões que ora são levantadas pela Recorrente.
33. A Recorrente vem agora levantar questões de ordem factual relativamente às quais os Recorridos se encontram, claramente, impossibilitados de exercer adequado contraditório, bem assim impossibilitados de produzir novos meios probatórios.
34. Decidir o inverso constitui, no entender dos Recorridos, uma clamorosa violação ao princípio da igualdade, por importar um desequilíbrio relativamente aos meios processuais que cada uma das partes tem, neste momento, à sua disponibilidade para fazer vencer a sua argumentação e aos ónus probatórios que sobre cada uma recaem.
35. Até ao presente momento, nenhum dos factos constitutivos do seu direito foi verdadeiramente colocado em causa, tendo, apenas agora – em sede de recurso - vindo a Recorrente referir que, no seu entender, deveria ter sido junto título justificativo do seu direito.
36. Acontece que, na medida em que tal problemática jamais foi levantada e, ademais, não decorre da lei, não se justificou, até agora, a realização de qualquer espécie de diligências processuais especificas a esse título.
37. Porém, agora, momento em que as mesmas se poderiam justificar, estão os Recorridos impedidos de as realizar por tal faculdade não lhe ser permitida de acordo com as regras processuais aplicáveis (neste sentido, cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 15.01.2013).
38. Refere a Recorrente que a factualidade dada como provada não é suficiente para suportar a decisão proferida.
39. A Recorrente não alcança, porém, a extensão da factualidade que, nos presentes autos, se deverá considerar como provada.
40. Não são apenas os factos elencados na sentença (mais concretamente nas suas páginas 3 e 4) que se encontram provados. 41. Porque, atento o silêncio da Recorrente em sede de resposta e o âmbito da pronúncia do Senhor Administrador, nenhuma da factualidade alegada pelos Recorridos, em sede de impugnação, foi colocada em crise, ter-se-á de considerar que toda a factualidade aí alegada se encontra provada por acordo.
42. E, por isso, sobejamente alegados e provados os factos constitutivos do crédito dos Recorridos, sua garantia e, inelutavelmente, reconhecido o seu direito de retenção e definida a sua graduação nos termos propugnados. Porém,
43. Ainda que assim não se entendesse, a reclamação de créditos na insolvência não se encontra dependente da obtenção e apresentação, por parte do reclamante ou (mesmo) do impugnante de título justificativo, onde, designadamente, se reconheça o incumprimento do promitente vendedor, a tradição da coisa e o direito de retenção.
44. A insolvência não é um processo executivo e tal exigência não tem qualquer fundamento legal.
45. A ideia de universalidade presente no processo de insolvência clama que todos os credores do insolvente possam intervir no processo, independentemente de possuírem ou não título justificativo da sua pretensão.
46. Associado à universalidade, a urgência do processo de insolvência justifica a inexistência de qualquer entrave ou limitação, do ponto da vista da forma, à intervenção processual de todos os credores do insolvente.
47. Apenas a livre intervenção processual permite alcançar o desiderato de, no mais curto espaço de tempo, se promover pela distribuição das perdas, causadas pelo estado de insolvência do devedor, por todos os seus credores.
48. Caso a intervenção processual estivesse dependente da obtenção de um qualquer título justificativo, correr-se-ia o risco de terem os autos de insolvência de aguardar pela obtenção do mesmo ou, então, prejudicar-se-iam os credores que, não logrando obter título atempadamente, se veriam afastados do processo e seus efeitos.
49. Por outro lado, ainda, salvo se do processo destinado à obtenção de título fizessem parte todos os credores do devedor, jamais a decisão aí proferida produziria qualquer efeito perante os demais credores do devedor, tornando este, por conseguinte, um passo vazio de efeito e com um elevado risco associado.
50. Uma tal solução não se coadunaria, portanto, com o princípio da tutela jurisdicional efetiva.
51. O legislador optou por não estabelecer qualquer condição de acesso ao processo de insolvência por parte dos credores do insolvente, e, singelamente, determinar que, pretendendo intervir no processo, devem todos os credores interessados, dentro do prazo que lhes seja fixado na sentença declaratória de insolvência, reclamar a verificação dos seus créditos por meio de requerimento acompanhado de documentos que se limitem a comprovar as situações elencadas no nº 1 do artigo 128º do CIRE
52. Por outro lado, tal solução não obrigaria o Administrador a, em todos os casos, reconhecer a existência do direito,
53. É que, em qualquer situação é lícito ao administrador de insolvência, no exercício das suas funções, designadamente para reconhecimento dos créditos reclamados, realizar as diligências de averiguação que repute necessárias para o efeito.
54. Por isto, no âmbito dos presentes autos, veio o Senhor Administrador de Insolvência, com vista a poder reconhecer o crédito reclamado, a notificar os Recorridos para juntarem documentos aos autos.
55. Acresce que, a reclamação do crédito não importa, sem mais o seu reconhecimento.
56. Ainda que em primeira linha, o processo de insolvência seja caracterizado como um processo de execução universal, ele contempla momentos – dos quais o incidente de impugnação da lista de credores reconhecidos é exemplo – de índole puramente declarativa, nos quais qualquer credor poderá defender a sua posição (neste sentido, vd. acórdão do TRC, de 01.10.2013).
57. Sem prescindir, sublinhe-se que foi a precipitação das diversas ações pendentes contra a Insolvente na presente ação de insolvência que impediu os Recorridos de obter esse mesmo título.
58. Contrariamente ao que afirma a Recorrente, os Recorridos intervieram na referida execução fiscal n.º 3468200701012673 – 2.º Serviço de Finanças de Gondomar, requerendo ademais, ao abrigo do disposto no art. 869º do CPC ex vi art. 246º CPPT, que os autos de reclamação de créditos que corriam por apenso àquela execução fossem declarados suspensos até à obtenção de título exequível ( cfr. documento n.º 19 da impugnação).
59. Esse pedido, datado de 12/12/2008, foi anterior à declaração de insolvência da B…, Lda., no âmbito dos presentes autos.
60. É falso que os Recorridos não tenham invocado ou demonstrado que interpelaram a insolvente para cumprir o contrato prometido ou que não tenha ocorrido incumprimento definitivo.
61. Nos pontos 46 e seguintes da Impugnação, os Recorridos identificam e caracterizam as inúmeras solicitações que dirigiram à Insolvente, no sentido da Cfr. carta do Senhor Administrador de Insolvência K… dirigida ao mandatário dos Recorridos e datada de 10 de agosto de 2009 outorga da escritura do contrato prometido e, bem assim, o resultado dessas mesmas solicitações.
62. A factualidade aí vertida, particularmente em 46. a 77., porque não questionada pelo Senhor Administrador de Insolvência ou outro credor da Insolvente, considera-se provada por força dos artigos 573º e 574º do NCPC e 17º do CIRE.
63. Ademais, da douta sentença expressamente resulta, como facto dado como provado, a recusa, por parte do gerente da insolvente, em setembro de2007, no cumprimento do contrato de promessa de compra e venda (cfr. ponto 9 dos factos identificados como provados).
64. A recusa séria, perentória e definitiva é qualificada como verdadeiro incumprimento definitivo.
65. Todavia, ainda que assim não fosse – o que apenas se admite por hipótese académica – de acordo com o art. 801º do CC, tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação.
66. A sentença de declaração de insolvência da B…, Lda. foi proferida em 30.03.2009.
67. Previamente a esta data, mais concretamente a 17.12.2008, ocorreu a venda em execução da fração “U”, objeto do contrato promessa celebrado entre a insolvente e os Recorridos.
68. Por força da dita venda, a titularidade do direito de propriedade da fração “U” transferiu-se da esfera jurídica da insolvente para a esfera jurídica da J….
69. A partir do momento em que o objeto do contrato promessa de comporá e venda foi vendido, cessou a possibilidade de celebração do contrato prometido; bem como se tornou impossível o cumprimento do contrato de promessa de compra e venda.
70. A insolvente foi parte principal nos autos de execução fiscal supra identificados,
71. Foi o incumprimento por parte das suas obrigações que deram origem à referida ação, sendo-lhe, por conseguinte, atribuída a responsabilidade na necessidade da venda da fração “U”.
72. Porque assim é, torna-se evidente a existência de incumprimento do contrato de promessa de compra e venda por parte da promitente vendedora, a aqui Insolvente.
73. Os Recorridos lograram, assim, alegar e demonstrar a existência do incumprimento definitivo por parte da Insolvente, com base em dois momentos distintos: o da recusa expressa e o resultante da impossibilidade da prestação por causa que era imputável à devedora.
74. O crédito dos Recorridos é inegável, assistindo-lhes, perante o incumprimento definitivo da insolvente a possibilidade de resolução do contrato de promessa de compra e venda e a exigência do sinal em dobro.
75. Questiona-se, como iria o senhor Administrador vender um imóvel que já não era propriedade da insolvente?
76. Salvo o devido respeito que a Recorrente nos merece, é sublime o seu equívoco ao advogar que os Recorridos não alegaram qualquer facto integrativo de um direito de retenção, não estando qualquer um desses factos dados como provado em sede de sentença.
77. Constituem, assim, elementos constitutivos do direito de retenção, de acordo com o referido preceito: i) a existência de um contrato de promessa de compra e venda; ii) a tradição da coisa prometida ao promitente comprador; iii) o incumprimento do promitente vendedor e iv) a existência de um crédito, decorrente do incumprimento do contrato de promessa de compra e venda, a favor do promitente comprador.
78. Foram carreados e provados nos autos factos suficientes para se considerarem verificados os pressupostos de constituição do direito de retenção.
79. Resulta provado (cfr. ponto 5 e 6 da sentença) que os Recorridos celebraram com a insolvente um contrato de promessa de compra e venda relativamente à fração “U”, tal qual decorre, aliás, dos documentos n.º 1 e 4 juntos com a impugnação que, por sua vez não foram objeto de qualquer contestação por qualquer sujeito processual.
80. Resulta, igualmente alegado e provado que, em cumprimento do estipulado naquele contrato, os Recorridos entregaram à Recorrente, a quantia de 85.000,00€ a título de sinal (cfr. documentos n.º 1 a 9 da impugnação e ponto 7 da sentença),
81. O que, nos termos do artigo 442.º do CC importa, para estes, o surgimento, em caso de incumprimento do contrato de promessa de compra e venda por parte do promitente vendedor, do direito ao ressarcimento do valor do sinal em dobro.
82. Decorre, dos presentes autos que partir de 2005, os Recorridos, por «diversas vezes interpelaram a insolvente para a outorga do contrato prometido, tendo-se esta perentoriamente recusado tal possibilidade e, a final, em 17.12.2008, perdido a legitimidade necessária para a celebração de um tal negócio (cfr. documentos n.º 19 a 21 da impugnação e pontos nº 9 e 10 da sentença).
83. A isto acresce que, a partir de novembro de 2004 os Recorridos passaram a habitar na fração “U”, arcando com as responsabilidades inerentes, ou seja pagando os valores devidos e necessários para a utilização da mesma e, até, a seu bel prazer realizando as restantes obras necessárias e indispensáveis à habitabilidade da fração “U” (cfr. documentos n.º 11 a 17 da impugnação e pontos nº 7 e 8 da contestação).
84. Contrariamente ao sugerido pela Recorrente, a posse não é um elemento constitutivo do direito de retenção, bastando a tradição da coisa objeto do contrato promessa, tradição que poderá, inclusive, ser meramente simbólica.
85. A traditio para que se constitua o direito de retenção reclama apenas a detenção material lícita da coisa – não sendo necessário, para esse efeito, uma posse.
86. No entanto, ainda que assim se entendesse, seria difícil decidir no sentido da inexistência do animus possessório.
87. É que, após a celebração do aditamento ao contrato de promessa de compra e venda, os Recorridos assumiram a faculdade e a obrigação de realizarem as demais obras necessárias à conclusão da fração,
88. Obras essas que seriam concluídas ao seu gosto e como melhor entendessem, o que os Recorridos fizeram.
89. A partir de novembro de 2004, os Recorridos passaram, ademais, a habitar a referida fração “U” dispondo de todas as suas comodidades sem pedir autorização e dando qualquer explicação à Recorrente e celebrando os contratos indispensáveis e convenientes à cómoda habitabilidade da fração.
90. O valor atribuído às obras de finalização – que foram levadas a cabo pelos Recorridos – e as quantias entregues a título de sinal totalizaram o preço devido pela aquisição da fração,
91. Constituindo, assim, a outorga do contrato de compra e venda da fração “U” a simples formalização de uma situação fáctica previamente consolidada, indispensável ao abrigo das disposições legais aplicáveis.
92. Assim, embora a posse não seja requisito do direito de retenção, certo é que os Recorridos exerciam a posse efetiva do imóvel.
93. Atento o exposto, deverá, por conseguinte ser reconhecido, aos Recorridos, a existência de direito de retenção sobre o produto da venda da fração “U”, por força do vertido nos artigos 775.º e 825º, ambos do Código Civil,
94. O qual deverá ser graduado com primazia sobre o direito hipotecário da Recorrente, tal qual, aliás foi decidido pelos Digníssimos Juízes Conselheiros Cfr. Acórdão do TRC de 15.01.2013, disponível em www.dgsi.pt do Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão de uniformização de jurisprudência proferido em 30.05.2013.
95. Não são, no entender dos Recorridos, legítimas ou atendíveis as considerações que a Recorrente expende a propósitos da eventual violação de princípios constitucionais ou da não tutela da expectativa da J… aquando da aquisição da fração “U” no âmbito do processo de execução fiscal.
96. Por imperativo de Justiça, a operar uma tutela de expectativas, aquelas que devem ser tuteladas serão as dos Recorridos que durante os cinco anos antecedentes à declaração de insolvência da B…, Lda. habitaram a fração “U”, dela fazendo o centro da sua vida familiar e onde investiram 115.000,00€, na firme convicção de que aquela era a sua casa e que, a final, se viram despojados do seu lar e de todo o dinheiro nele despendido.
97. E, note-se, a J… beneficiou, diretamente dos esforços e das expectativas dos Recorridos, pois que, como se disse, foram estes que concluíram as obras de construção da fração que, aquela entidade, veio a adquirir.
98. Todavia, não obstante o coro de criticas que se fizessem sentir àquele preceito, jamais, veio o legislador decidir no sentido da alteração daquela norma e, se não o legislador escolheu não fazer qualquer distinção, não deverá o interprete desrespeitar essa escolha,
99. Particularmente atendendo ao momento socio económico em que nos encontramos.
100. Como se pode ler no acórdão de uniformização de jurisprudência supra citado, a ratio da al.f) do artigo 755º do CC prendia-se à necessidade de proteção dos particulares consumidores, parte mais débil que por via da regra investem no imóvel as suas poupanças e contraem uma dívida por largos anos, estando menos protegidos do que o credor hipotecário (normalmente a banca) que dispõe, regra geral, de aconselhamento económico, jurídico e logístico que lhe permite prever com maior segurança os riscos que corre caso por caso e ponderar uma prudente seletividade na concessão de crédito.
101. As concretas condições sociais, económicas e financeiras em que o país, atualmente, se encontra trazem à ribalta as preocupações vertidas naquela diploma legal e justificam a manutenção da regra que, por aquela via, se estabeleceu,
Terminam, por pedir, que mantendo-se reconhecido e qualificado o crédito dos Recorridos nos termos em que o foi na douta sentença recorrida, graduado com prevalência ao crédito da Recorrente se estará a cumprir a lei.
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H…, LDA renovou os argumentos expostos nos autos.
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A convite do juiz, as alegações de recurso do apelante foram objeto de aperfeiçoamento, quanto à matéria da nulidade da sentença e da respetiva retificação – 27 de janeiro de 2014 ( ref.: 15741439 ).
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O Administrador da Insolvência deu o seu parecer ( fls. 599 ).
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Exerceu-se o contraditório.
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Por despacho de 15 de setembro de 2014 (fls. 652) proferiu-se decisão, com o teor que se transcreve:
“A fls. 580 e ss o credor I… veio requerer a retificação do despacho saneador sentença nos termos e pelos fundamentos expostos.
Cumpre apreciar e decidir.
Resulta dos autos e em conformidade com o mapa de frações apreendidas para a massa junto aos autos pelo Administrador de Insolvência que sobre as verbas 28 e 29 e não como por mero lapso se referiu sobre as verbas 26 e 27 que incide a garantia hipotecaria do credor I…, SA.. Anote-se que goza, ainda de garantia hipotecária, relativamente ao produto da vendo (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 do freguesia de …, CRP Gondomar 2.692 arrematado pela credora Caixa J….
Assim determina-se que a fls. 427 no segmento em causa passe a constar:
"ln casu, além dos créditos comuns, existem créditos com garantia hipotecaria reclamados por J… /I… S.A onerando os bens Imóveis apreendidos - verbas 1 a 25, 28 e 29 e o produto do venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de … CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J… - e pelo Instituto da Segurança Social, IP, onerando os bens móveis apreendidos - verbos 1 a 25 - sendo certo que parte do crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social, IP goza, ainda, de privilégio imobiliário geral. Ter-se-á que atender ainda, ao crédito privilegiado do credor/requerente da insolvência".
Ademais determina-se que a fls. 431, in fine e no segmento em causa passe a constar:
"ln casu, o crédito reclamado por J…, SA atual I…, S.A., goza de garantia real/hipoteca sobre os bens imóveis apreendidos sob as verbas 1 a 25, 28 e 29 e o produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J… bem como o crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., prevalecendo a hipoteca primeiramente registada".
Por sua vez e em defluência do exposto, determina-se que a fls. 439/440, nos segmentos em causa, passe a constar:
“ - Através do produto da venda dos bens imóveis verbas 26 e 27:
1° - As divides da massa Insolvente saem precípuas, no devido proporção do produto da venda do bem imóvel;
2° - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto do Segurança Social, I P na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3° - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47°, nº 4, al c))
4° - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem previsto no artigo 48°,
-
- Através do produto da venda dos bens imóveis - verbas 28 e 29:
1° . As divides da massa Insolvente saem precípuas na devido proporção, do produto do venda do bem Imóvel:
2° - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social IP no parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º nº 4, al. c))
5º - Do remanescente. dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pelo ordem previsto no artigo 48º”.
Por sua vez, resulta dos autos que o verba nº 31 constitui o imóvel descrito sob o nº 1686 de ….
A referência feita a fls. 429 - último parágrafo e em sede de graduação à verba 31 por reporte aos créditos aí mencionados resulta, por isso e nessa parte, de mero lapso, que se retifica. Com efeito, pretendia reportar-se ao produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692, arrematado pela credora J…, cujos créditos foram cedidos à I… como resulta do demais teor da decisão. Impõe-se, por isso, a devida retificação, a fls. 438 e aditamento a fls. 440 previamente à determinada graduação dos créditos por reporte aos bens móveis assim se suprindo a omissão e contradição alegado, nos seguintes termos:
“- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal inscrito na matriz predial sob o artigo 6117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692, arrematado pela credora J…:
1º As dividas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda;
2º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, IP na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º/4 al. c));
5º Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores subordinados graduados pela ordem prevista no artigo 48º
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- Através do produto da venda do bem imóvel - verba 31 – imóvel rústico da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o art. 1686:
1º - As dívidas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda do bem imóvel;
2º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, LP. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores comuns (artigo 47ª/4 c));
4º- Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pela ordem previsto no artigo 48º.
Refere-se, ainda a fls 431 - 3 o parágrafo que
“ O direito de retenção é oponível erga omnes permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída". Note-se, porém, que a contradição invocada foi motivada por mero lapso de escrita, por se pretender referir "(… ) ainda que posteriormente constituída (…)".
Em decorrência do despacho acima proferido, consideram-se sanadas as eventuais nulidades invocadas que, em nossa ótico promanam de meros lapsos de escrita motivados pela complexidade dos autos.
Notifique e, oportunamente, conclua-se de novo”.
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Os credores-impugnantes E… e mulher F… vieram interpor recurso do despacho.
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Nas alegações que apresentaram formularam as seguintes conclusões:
1. Não obstante o enorme respeito que nos merece o douto tribunal a quo e, bem assim, o evidente cuidado havido aquando da elaboração da douta sentença recorrida, não podem os Recorrentes conformar-se com a mesma, por entenderem que padece de vícios que a podem, inclusive, ferir de nulidade.
2. Têm, assim, os Recorrentes a segura convicção de que V. Exas., avaliando os fundamentos que infra se expenderão, não deixarão de acolher a pretensão dos Recorrentes, determinando a correção da decisão de verificação e graduação de créditos nos termos aqui propugnados.
3. Diante da declaração de insolvência da B…, os Recorrentes apresentaram, junto do Senhor Administrador de Insolvência, a competente reclamação de créditos, tendo este, após a realização de diligências de averiguação, reconhecido o crédito reclamado, no valor de 170.000,00€, e o graduado como crédito comum.
4. Não se conformando com a graduação efetuada pelo Sr. Administrador de Insolvência, os Recorrentes deduziram, nos termos do artigo 130.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE), impugnação à relação de credores reconhecidos por entenderem que o seu crédito deveria ter sido qualificado como garantido, pelo direito de retenção que lhes assistia, nos termos da al. f), do n.º 1, do artigo 755.º do Código de Processo Civil.
5. A 02 de dezembro de 2013 foi proferida a sentença de verificação e graduação de créditos no âmbito deste processo de insolvência da sociedade comercial “B…, LDA.” (cf. fls. 426 a 441 do processo).
6. A douta sentença deu provimento à pretensão dos aqui Recorrentes, graduando-os em 2.º lugar relativamente ao produto daquela venda (neste sentido, cfr. fls 654 do processo, onde se esclarece que a menção à verba 31, constante de fls. 438, enferma de lapso, por, na verdade, se pretender reportar aí ao produto da venda da fração U (96.400,00€)).
7. Perante o teor da sentença, veio a credora reclamante I…, S.A. dela interpor recurso (cf. requerimento com a referência 15444086, apresentado em 23 de dezembro de 2013), invocando a verificação de nulidades e erros materiais constantes da sentença recorrida e desacordo quanto ao reconhecimento, classificação e graduação dos créditos, entre outros, dos aqui Recorrentes E… e F….
8. No que aos ora Recorrentes respeita, a alegação da credora I… referia a existência de omissão de pronúncia relativamente ao valor de 96.400,00€, discordando, ademais, quanto ao reconhecimento, classificação e graduação do crédito dos ora Recorrentes.
9. É neste contexto que é proferida a decisão de fls. 652 a 656 do processo.
10. Pelo que compreendem os Recorrentes, aquela decisão foi proferida ao abrigo do n.º 2 do artigo 617.º, destinando-se a suprir anulidade ou reformar a sentença inicialmente proferida, passando a considerar-se parte integrante daquela.
11. Acontece que, procurando, por via do referido despacho, eliminar quaisquer dúvidas que existissem quanto à ordem de pagamento por via do produto da venda (96.400,00€), o douto tribunal a quo ditou, a fls. 654, qual deveria ser essa ordem e ao reescrever a graduação, a douta sentença foi omissa quanto ao crédito dos ora Recorrentes que já havia reconhecido.
12. Perante tal omissão, não restou aos Recorrentes qualquer alternativa que não a de requerer, por via da interposição do presente recurso, a reapreciação daquela sentença de verificação e graduação de créditos.
A)Dos erros materiais
13. Nos termos do n.º 1 do artigo 614.º do Código de Processo Civil (doravante CPC), se a sentença omitir o nome das partes, for omissa quanto a custas ou a algum dos elementos previstos no n.º 6 do artigo 607.º, ou contiver erros de escrita ou de cálculo ou quaisquer inexatidões devidas a outra omissão ou lapso manifesto, pode ser corrigida por simples despacho, a requerimento de qualquer das partes ou por iniciativa do juiz.
14. Da análise do teor de fls.652 a 656, resulta, claro, para os Recorrentes, que o propósito do tribunal a quo, com a prolação daquela decisão foi, apenas, o de efetuar alterações pontuais à sentença cuja versão inicial constava de fls. 426 do processo, de modo a dar provimento aos lapsos mencionados pelo credor I….
15. Acontece que o produto final daquela alteração não se ficou pelas suscitadas retificações.
16. Ou seja, ainda que com a prolação das palavras constantes de fls. 654 do processo, o douto tribunal a quo tenha deixado claro que a única alteração que pretendia efetuar era aquela que se impunha, por lapso, na identificação do bem, por se ter confundido a verba 31 com o produto da venda da fração “U”, i.e., que não pretendia, em momento algum, proceder à alteração das considerações anteriormente expendidas a propósito da existência e classificação do crédito dos Recorrentes,
17. A verdade é que, aquando da graduação, por reporte aos concretos bens que integram a massa insolvente, o douto tribunal olvidou-se de mencionar o crédito dos ora Recorrentes
18. Assim, dado que do fundamento da sentença permanece todo o raciocínio lógico do qual deriva a conclusão que o crédito dos Recorrentes deve ser reconhecido e graduado como um crédito garantido, nos termos por si reclamados, sendo, apenas, no momento de plasmar essa conclusão, que existe omissão quanto à posição dos Recorrentes, acabam os Recorrentes por concluir que a ausência de menção ao seu crédito mais não é que uma inexatidão resultante de uma omissão ou lapso manifesto, sendo e devendo, por conseguinte, nos termos do artigo 614.º do Código de Processo Civil, ser retificada, o que, se requereu e requer que seja considerado por V. Exas.
19. Na eventualidade de assim não se entender, o que apenas se admite por mera hipótese de raciocínio e diligência de patrocínio, a douta sentença enfermará de nulidade
20. Nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, é nula a sentença quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
21. A fls. 429 (com as alterações determinadas a fls 654) determina-se que o crédito dos Recorrentes, no montante de €170.000,00, goza de direito de retenção sobre o produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração “U”.
22. A fls. 431 (com o esclarecimento de a fls. 655), a douta sentença, referindo-se ao direito de retenção, determina que “ O direito de retenção é oponível erga omnes permitindo ao respetivo titular invoca-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, ainda que posteriormente constituído.”
23. A fls. 434, estabelece-se que “ O direito de retenção confere ao seu titular o direito de ser pago com preferência sobre os demais credores (art. 666º, por força dos artªs 758º e 759º).
24. Ora, na medida em que, mantendo-se na sentença o raciocínio lógico que leva à conclusão da existência do crédito dos Recorrentes e da sua graduação como crédito garantido, ocorre oposição com a decisão a partir do momento em que estes não são contemplados na graduação do produto da venda da fração U (96.400,00€),
25. É que, ao ser assim, não se compreende a razão que subjazeu à desconsideração, no momento da graduação, do crédito dos Recorrentes como crédito garantido.
26. Mais, sendo essa solução voluntária, na medida em que os fundamentos de facto e de direito que a justificam não se encontram plasmados na sentença, é a decisão recorrida nula, também, por força da al. b) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
27. Por tudo isto, são os Recorrentes da opinião que a omissão se deveu a um mero lapso que, como tal, deve ser retificado,
28. Porém, caso se verifiquem errados os pressupostos dos Recorrentes, são estes da opinião que a sentença padece, ainda, de nulidade, nos termos da al. d), do n.º 1 do artigo 615.º do Código de Processo Civil.
29. Nos termos da al. d), do n.º 1 do artigo 615.º do CPC, é nula a sentença quando o juiz se pronuncie sobre questões de que não podia tomar conhecimento.
30. Como acima se referiu, as alegações da credora I…, que estiveram na base da decisão recorrida, opunham-se à sentença de verificação e graduação de créditos por duas ordens de razão, a saber: pela verificação de erros materiais e pelo reconhecimento, classificação e graduação dos créditos, designadamente, dos aqui Recorrentes.
31. Nos termos do artigo 613.º do Código de Processo Civil, proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria da causa, sendo-lhe, porém, lícito retificar erros materiais, suprir nulidades e reformar a sentença.
32. Acontece que, na eventualidade de ter sido voluntária a despromoção do crédito dos Recorrentes a crédito comum, a douta sentença conheceu, neste segundo momento, de matéria que não podia conhecer.
33. Decidir que o crédito dos Recorrentes é, afinal, um crédito comum, motivo pelo qual não surge expressamente identificado na graduação relativa ao produto da venda da fração U, é conhecer do mérito da causa, o que por via do n.º 1 do artigo 613.º do Código de Processo Civil, lhe estava vedado conhecer.
34. Ao tomar conhecimento desse ponto – o que, refira-se, apenas se aventa por mera hipótese de raciocínio e diligência de patrocínio – , o douto tribunal a quo excedeu o âmbito da mera retificação e supressão de nulidade, acabando por ferir a sentença de nulidade, desta feita nos termos da al. d) do n.º 1 do artigo 615.º do CPC.
35. Assim, deve aquela falha ser sanada, por via da correção da graduação dos créditos relativos ao produto da venda da fração “U”, graduando-se o crédito dos Recorrentes na 2ª posição, após as dívidas da massa insolvente, conforme, ab initio, constava de fls. 438 do processo.
36. Ainda assim, em qualquer situação, no que à graduação dos créditos reclamados relativamente ao produto da venda da fração “U” concerne, sempre a decisão que gradua o crédito dos Recorrentes em segundo lugar deverá prevalecer sobre aquela de que ora se recorre, atento o vertido no artigo 625.º do CPC.
37. Sem prescindir, caso se entenda que a douta sentença recorrida não padece de qualquer vício, tendo voluntariamente decidido sobre a despromoção do crédito dos Recorrentes, a crédito comum, graduando-o por conseguinte em 4.º lugar relativamente ao produto da venda da fração “U”, hipótese que apenas se admite por diligência de patrocínio, são os Recorrentes da opinião que a douta decisão, ao decidir, no sentido acima referido, violou o disposto nos artigos 47.º do CIRE e 442.º, 755.º f), 759.º e 824.º do Código Civil.
38. Na génese dos presentes autos encontra-se a declaração de insolvência da sociedade comercial B…, Lda., com quem os Recorrentes, em 23/05/03, celebraram um contrato de promessa de compra e venda.
39. Nos termos do referido acordo e respetivo aditamento, a Insolvente prometeu vender aos Recorrentes, que lhe prometeram comprar, um andar de tipologia T4, com entrada pelo n.º 5244 do prédio sito na estrada … em Gondomar ( cfr. pontos 5 e 6 dos factos provados), aqui vindo a ser designado por fração “U”.
40. Por conta do referido negócio, os Recorrentes entregaram à Insolvente, a título de sinal, a quantia de 85.000,00€ e despenderam a quantia de 115.000,00€ nas obras de conclusão da referida fração (cfr. ponto 7 dos factos provados).
41. Em novembro de 2004, os Recorrentes passaram a habitar a fração “U “(cfr. ponto 7 dos factos provados).
42. Em setembro de 2007, porém, o gerente da insolvente comunicou aos Recorrentes que a escritura de compra e venda relativa à promessa de compra e venda não iria ser outorgada (cfr. pontos 8 e 9 dos factos provados),
43. Tendo, inclusive, a referida fração vindo a ser alienada no âmbito de uma execução fiscal, que correu contra a Insolvente, e, nesse contexto, a propriedade do prédio adquirida pela J…, cuja posição processual nos presentes autos é, atualmente, ocupada pela credora I….
44. Diante da declaração de insolvência daquela B…, os Recorrentes apresentaram, junto do Senhor Administrador de Insolvência, a competente reclamação de créditos, tendo este, após a realização de diligências de averiguação, reconhecido o crédito reclamado, no valor de 170.000,00€, e o graduado como crédito comum.
45. Não se conformando com a graduação efetuada pelo Sr. Administrador de Insolvência, os Recorrentes deduziram, nos termos do artigo 130.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (doravante CIRE), impugnação à relação de credores reconhecidos por entenderem que o seu crédito deveria ter sido qualificado como garantido pelo direito de retenção que lhes assistia, nos termos da al. f), do n.º 1, do artigo 755.º do Código de Processo Civil.
46. Apenas o Senhor Administrador de Insolvência respondeu à impugnação dos Recorrentes.
47. Na sua resposta, referindo-se à impugnação dos Recorrentes, o Senhor Administrador limitou-se a dizer: “(…) mantenho a posição de não me pronunciar quanto à natureza do crédito, dado que se trata de bem não pertencente à massa insolvente, mas cujo produto da venda se encontra apreendido a favor desta, embora admita que, caso venha a ser reconhecido o direito de retenção, este deva incidir apenas em singelo sobre os valores efetivamente pagos à Insolvente.” (sublinhado nosso) 48. De acordo com o n.º 1 do artigo 131º do CIRE, às impugnações da lista de credores reconhecidos podem responder o administrador de insolvência e qualquer interessado que assuma posição contrária, sendo que, se não houver lugar a resposta, a impugnação deverá ser julgada procedente.
49. Ora, como supra se referiu, apenas o Senhor Administrador se pronunciou quanto à impugnação deduzida pelos Recorrentes, e somente para reiterar não possuir condições para sobre ele se apreciar e, dessarte, reservar essa apreciação ao tribunal a quo.
50. Porque assim é, são os Recorrentes do entendimento que o crédito por si reclamado, no montante de 170.000,00€, tem de ser reconhecido e classificado como crédito garantido.
51. Da factualidade elencados na sentença (cf. fls. 428 e 430) e dada como provada e o silêncio dos demais credores e do Senhor Administrador, em sede de resposta à impugnação da lista de credores apresentada pelos Recorrentes, nenhuma da factualidade alegada pelos Recorrentes, em sede de impugnação, foi colocada em crise, devendo, por isso, considerar-se que toda a factualidade aí alegada se encontra provada por acordo.
52. Encontram-se, por isto, sobejamente alegados e provados os factos constitutivos do crédito dos Recorrentes e sua garantia, devendo, por isso, inelutavelmente, ser reconhecido o direito de retenção e definida a sua graduação nos termos propugnados.
53. Nos termos do artigo 442.º do Código Civil, se quem constitui o sinal deixar de cumprir a obrigação por causa que lhe seja imputável, tem o outro contraente a faculdade de fazer sua a coisa entregue; se o não cumprimento do contrato for devido a este último, tem aquele a faculdade de exigir o dobro do que prestou.
54. Nos pontos 46 e seguintes da sua Impugnação, os Recorrentes identificam e caracterizam as inúmeras solicitações que dirigiram à Insolvente, no sentido da outorga da escritura do contrato prometido e, bem assim, o resultado dessas mesmas solicitações.
55. A factualidade aí vertida, particularmente em 46. a 77., porque não questionada pelo Senhor Administrador de Insolvência ou outro credor da Insolvente, considera-se provada por força dos artigos 573º e 574º do CPC ex vi artigo 17º do CIRE.
56. Ademais, da douta sentença, expressamente, resulta, como facto dado como provado, a recusa, por parte do gerente da insolvente, em setembro de 2007, no cumprimento do contrato de promessa de compra e venda (cfr. ponto 9 dos factos identificados como provados).
57. Tal como anteriormente sufragado, a recusa séria, perentória e definitiva é qualificada como verdadeiro incumprimento definitivo.
58. Todavia, ainda que assim não fosse – o que apenas se admite por hipótese académica – de acordo com o art. 801º do CC, tornando-se impossível a prestação por causa imputável ao devedor, é este responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação.
59. Por força da dita venda em sede de execução fiscal, a titularidade do direito de propriedade da fração “U” transferiu-se da esfera jurídica da insolvente para a esfera jurídica da J….
60. A partir do momento em que o objeto do contrato promessa de compra e venda foi vendido, cessou a possibilidade de celebração do contrato prometido; bem como se tornou impossível o cumprimento o contrato de promessa de compra e venda.
61. Encontra-se, assim, alegada e demonstrada a existência do incumprimento definitivo por parte da Insolvente, com base em dois momentos distintos: o da recusa expressa e o resultante da impossibilidade da prestação por causa que era imputável à devedora. 62. O crédito dos Recorrentes é, assim, por força da verificação dos pressupostos do artigo 442.º do CC, inegável, assistindo-lhes, perante o incumprimento definitivo da insolvente a possibilidade de resolução do contrato de promessa de compra e venda e a exigência do sinal em dobro.
63. Nos termos do artigo 47.º do CIRE, os créditos sobre a insolvência são garantidos se beneficiarem de garantias reais.
64. De acordo com a al. f) do art. 755º do CC assiste direito de retenção ao beneficiário da promessa de transmissão ou constituição de direito real que obteve a tradição da coisa a que se refere o contrato prometido, sobre essa coisa, pelo crédito resultante do não cumprimento imputável à outra parte, nos termos do artigo 442.
65. Salvo devido respeito por opinião contrária, foram carreados e provados, nestes autos, factos suficientes para se considerarem verificados os pressupostos de constituição do direito de retenção.
66. O que, nos termos do artigo 442.º do CC importa, para estes, o surgimento, em caso de incumprimento do contrato de promessa de compra e venda por parte do promitente vendedor, do direito ao ressarcimento do valor do sinal em dobro.
67. De acordo com o vertido na al. f) do artigo 755.º do CC, a tradição da coisa prometida e o incumprimento do contrato prometido constituem fundamento para o reconhecimento, a favor do promitente cumpridor – os aqui Recorrentes – de um direito de retenção,
68. O qual, nos termos do artigo 759.º do CC, prevalece sobre a hipoteca, ainda que esta tenha sido registada anteriormente.
69. Porque assim é, deverá ser reconhecido, aos Recorrentes, a existência de um crédito, qualificado como garantido, sobre a massa insolvente,
70. E esse crédito, aquando da graduação, deve ser graduação à frente de qualquer hipoteca que pudesse existir sobre o bem.
71. Esse bem, no caso dos presentes autos, por força da referida venda, deixou, porém, de ser a fração “U”, para passar a ser o produto da sua venda, tal qual o impõe o artigo 824.º do Código Civil, quando refere que na venda em execução, os direitos de terceiros que caducarem nos termos do número anterior transferem-se para o produto da venda dos respetivos bens.
Termina por pedir que se conceda provimento à pretensão dos Recorrentes, mantendo reconhecido e qualificado o crédito dos Recorrentes nos termos em que o foi na decisão constante de fls.426 do processo, qualificando-o como garantido e graduando-o, por conseguinte, em 2.º posição, após pagamento das dívidas da massa insolvente, relativamente ao produto da venda da fração “U”.
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Os recursos foram admitidos como recurso de apelação.
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A convite do tribunal, vieram os apelantes E… e mulher F… aperfeiçoar as alegações, quanto à matéria da nulidade do despacho, conforme requerimento de fls. 737-738, com o teor que se transcreve:
“1. Os Requerentes reiteram todo o vertido nos seus requerimentos com as ref.as n.os 656828, 672782, 814430, 1105041 e 5054247 e, bem assim, na posição assumida na diligência realizada em 10.02.2015.
Posto isto,
2. Os Requerentes apresentam infra, em resposta ao douto despacho datado de 01.07.2015, a retificação que admitem poder existir, considerando não só a posição por si assumida nos autos, mas, bem assim, a sentença complementar proferida a fls… de processo, que considerou a posição da credora I….
Destarte,
3. Com a devida vénia, entendem os Requerentes que, na sentença, onde se lê:
“- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…:
1º As dividas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda;
2º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, IP na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º/4 al. c));
5º Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores subordinados graduados pela ordem prevista no artigo 48º”
4. Deverá ler-se:
- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117, da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…;
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido dos credores E… e esposa e H…, Ldª, em pé de igualdade e rateadamente; [conforme decisão proferida na sentença de fls. 438 do processo]
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.; [conforme decisão proferida na sentença de fls. 654 do processo]
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º,n.º 4, al. c));
6.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.”.
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Exercido o contraditório sobre tal matéria, em 16 de outubro de 2015 ( fls. 739 ) proferiu-se o seguinte despacho:
“ Fls. 737 e 738:
Tendo em consideração o vertido e o anteriormente decidido nos autos, defere-se a retificação solicitada sob os pontos 3 e 4.
Notifique e, oportunamente, remetam-se os autos ao Venerando Tribunal da Relação do Porto”.
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No Tribunal da Relação, após audição prévia, o juiz relator rejeitou o recurso interposto por L… e M….
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Fundamentação
1. Delimitação do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 639º do CPC.
As questões a decidir:
a) Apelação do credor I…, SA
- retificação e nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/ c) e d) CPC;
- mérito da causa:
> verificação dos créditos em relação aos credores;
> qualificação; e
> graduação.
b) Apelação dos credores-impugnantes E… e mulher
- nulidade da sentença;
- qualificação do crédito reclamado.
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2. Os factos
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:
1. Por contrato promessa de compra e venda, outorgado em 05.07.2005, a insolvente prometeu vender a C… e mulher D… e estes prometeram comprar-lhe a fração AC, .. ..º/…, do prédio sito na Estrada …, …, com entrada pelo n.º …...
2. Na primeira quinzena de junho de 2006, a insolvente entregou as chaves da fração referida em 1. tendo estes passado a ocupar e residir na mesma.
3. Os outorgantes C… e mulher D… entregaram, a título de sinal, a quantia de 30.000,00€.
4. A escritura de compra e venda que as partes acordaram celebrar no prazo máximo de 30 dias após obtenção do alvará de habitabilidade não foi realizada por a insolvente não estar habilitada com os documentos necessários à sua realização, nomeadamente, a licença de habitabilidade.
5. Por contrato promessa de compra e venda, outorgado em 23.05.2003, a insolvente prometeu vender a E… e esposa F… e estes prometeram comprar-lhe um andar de tipologia T3, situado ao nível do 1.º andar …, com entrada pelo n.º …., fração autónoma que, após a constituição do prédio em regime de propriedade horizontal, seria designada pela letra M, sita na estrada …, em Gondomar.
6. Em 05.06.2003 os outorgantes do contrato promessa referido em 5. assinaram um aditamento ao mesmo, alterando o teor de algumas cláusulas. A cláusula segunda foi alterada, passando o objeto do contrato promessa a ser um andar de tipologia T4, situado no 2.º andar … do mesmo prédio – fração U – com entrada pelo n.º ….. e o preço da compra e venda prometida de 200.000,00€.
7. Os referidos outorgantes entregaram à insolvente a quantia de 85.000,00€, a título de sinal e despenderam 115.000,00€ nas obras de conclusão da referida fração U.
8. Em novembro de 2004, os referidos outorgantes passaram a habitar na fração U, arcando com todas as responsabilidades inerentes.
9. Em setembro de 2007, o gerente da insolvente N… comunicou aos referidos outorgantes que não iria outorgar a escritura de compra e venda uma vez que a insolvente atravessava uma fase muito difícil em termos financeiros e não tinha dinheiro para terminar o prédio e a licença de habitabilidade não poderia ser concedida.
10. A fração U veio a ser alienada no âmbito de uma execução fiscal instaurada e que correu contra a insolvente.
11. G…, Ldª foi contratada pela insolvente para prestação dos seus serviços de eletricidade a executar na sua obra, sita no lugar do …, …, em Gondomar, constituída de um bloco habitacional composto de 30 frações autónomas, garagem coletiva, individuais e arrumos sendo titular de um crédito no montante de 36.978,53€.
12. No exercício da respetiva atividade comercial, em 08 de maio de 2001, H…, Ldª celebrou com a insolvente um contrato de empreitada, tendo por objeto a fase de conclusão da obra do prédio sito ao lugar do …, Estrada …, nºs. …. a ….., Gondomar, constituído em propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2.692/19.991.203 e inscrito na matriz predial urbana sob o n.º 6.117.
13. No exercício do referido contrato e no período compreendido entre outubro de 2001e novembro de 2008, H…, Ldª executou e prestou diversos trabalhos e serviços de empreitada na referida obra, sendo titular de um crédito em relação à insolvente no montante de 269.740,30€.
14. H…, Ldª mantém na referida obra diverso equipamento e materiais seus e tutela pela sua guarda.
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3. O direito

- Apelação do credor I…, SA -

- Retificação da sentença e nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/ c) e d) CPC -
A apelante veio requerer em requerimento próprio dirigido ao juiz do tribunal “a quo” a retificação da sentença com fundamento em nulidade e erros materiais.
Nas conclusões de recurso, que apresentou na mesma ocasião, sob os pontos 1 a 4 e 29, suscitou de novo a retificação e a nulidade da sentença, com os mesmos fundamentos.
A sentença na sua formulação pode conter vícios de essência, vícios de formação, vícios de conteúdo, vícios de forma, vícios de limites[2].
No âmbito do processo de insolvência, o regime das nulidades da sentença obedece ao critério do art. 615º CPC, por remissão do art. 17º CIRE.
As nulidades da sentença incluem-se nos “vícios de limites“ considerando que nestas circunstâncias, face ao regime do art. 615º CPC, a sentença não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia[3].
O Professor ANTUNES VARELA no sentido de delimitar o conceito, face à previsão do então art. 668º CPC, que corresponde ao atual art. 615º CPC, advertia que: “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário […] e apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença”[4].
A apelante nas conclusões de recurso sob os pontos 1, 3 e 29 suscita a nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 d) CPC, porque na sentença omitiu-se a graduação do crédito da apelante em relação ao produto da venda da fração”U” do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o art. 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2692, arrematado pela credora J….
A omissão de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar ou o conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento constitui um dos fundamentos de nulidade da sentença, previsto no art. 615º/1 d) CPC.
A omissão de pronúncia sobre questões que o juiz devesse apreciar, constitui um vício relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento“ – art. 608º/2 CPC.
Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das
questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
A respeito do conceito “questões que devesse apreciar“ referia ANSELMO DE CASTRO que deve “ser entendida em sentido amplo: envolverá tudo quanto diga respeito à concludência ou inconcludência das exceções e da causa de pedir (melhor, à fundabilidade ou infundabilidade dumas e doutras) e ás controvérsias que as partes sobre elas suscitem. Esta causa de nulidade completa e integra, assim, de certo modo, a da nulidade por falta de fundamentação. Não basta à regularidade da sentença a fundamentação própria que contiver; importa que trate e aprecie a fundamentação jurídica dada pelas partes. Quer-se que o contraditório propiciado ás partes sob os aspetos jurídicos da causa não deixe de encontrar a devida expressão e resposta na decisão”[5].
LEBRE DE FREITAS por sua vez tem a respeito de tal matéria uma visão algo distinta, pois considera que devendo: “ o juiz conhecer de todas as questões que lhe são submetidas, isto é, de todos os pedidos deduzidos, todas as causas de pedir e exceções invocadas e todas as exceções de que oficiosamente lhe cabe conhecer ( art. 660º/2 ), o não conhecimento de pedido, causa de pedir ou exceção cujo conhecimento não esteja prejudicado pelo anterior conhecimento de outra questão constitui nulidade, já não a constituindo a omissão de considerar linhas de fundamentação jurídica, diferentes da da sentença, que as partes hajam invocado”[6].
Para melhor precisar o seu entendimento remete para o estudo do Professor ALBERTO DOS REIS cuja passagem se transcreve:
“Resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação “ não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis, de solução do pleito (art. 511º/1), as partes tenham deduzido ou o próprio juiz possa inicialmente ter admitido: por um lado, através da prova, foi feita a triagem entre as soluções que deixaram de poder ser consideradas e aquelas a que a discussão jurídica ficou reduzida; por outro lado, o juiz não está sujeito às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas (art. 664º) e, uma vez motivadamente tomada determinada orientação, as restantes que as partes hajam defendido, nomeadamente nas suas alegações de direito, não têm de ser separadamente analisadas”[7].
Seguindo estes ensinamentos atendendo ao regime processual vigente, afigura-se-nos ser esta a interpretação que melhor reflete a natureza da atividade do juiz na apreciação e decisão do mérito das questões que lhe são colocadas, pois o juiz não se encontra vinculado às alegações das partes quanto à indagação, interpretação e aplicação das normas jurídicas.
Resulta desta interpretação que a sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito.
No caso presente, a sentença é omissa a respeito da qualificação do crédito reclamado pela apelante J…, SA, atual I…, SA, em relação às verbas nº 28 e 29 e produto da venda em processo de execução fiscal da fração “U” do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117, da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…, atual I…, SA - € 96.400,00 - e atribui uma garantia aos credores E… e mulher, que não foi indicada pelo próprio, em relação ao imóvel relacionado sob a verba nº31.
Na sentença de verificação e graduação de créditos constituem questões a resolver o reconhecimento dos créditos, mas ainda, a sua qualificação e graduação, pelo que, mostrando-se omissa a respeito de qualquer das questões é nula, ainda que, parcialmente.
O juiz do tribunal “a quo” proferiu em 15 de setembro de 2014 despacho no qual supriu tais omissões, nos seguintes termos:
“"ln casu, além dos créditos comuns, existem créditos com garantia hipotecaria reclamados por J…/I… S.A onerando os bens Imóveis apreendidos - verbas 1 a 25, 28 e 29 e o produto do venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de … CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J… - e pelo Instituto da Segurança Social, IP, onerando os bens móveis apreendidos - verbas 1 a 25 - sendo certo que parte do crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social, IP goza, ainda, de privilégio imobiliário geral. Ter-se-á que atender ainda, ao crédito privilegiado do credor/requerente da insolvência".
Ademais determina-se que a fls. 431, in fine e no segmento em causa passe a constar:
"ln casu, o crédito reclamado por J…, SA atual I… S.A., goza de garantia real/hipoteca sobre os bens imóveis apreendidos sob as verbas 1 a 25, 28 e 29 e o produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J… bem como o crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., prevalecendo a hipoteca primeiramente registada".
[…]
- Através do produto da venda dos bens imóveis - verbas 28 e 29:
1°- As divides da massa Insolvente saem precípuas na devido proporção, do produto do venda do bem Imóvel:
2°- Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º- Do remanescente dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social IP no parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º- Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º nº 4, al. c))
5º- Do remanescente. dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pelo ordem previsto no artigo 48º”.
Por sua vez, resulta dos autos que o verba nº 31 constitui o imóvel descrito sob o nº 1.686 de ….
A referência feita a fls. 429 - último parágrafo e em sede de graduação à verba 31 por reporte aos créditos aí mencionados resulta, por isso e nessa parte, de mero lapso, que se retifica. Com efeito, pretendia reportar-se ao produto da venda (€96.400 00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…, cujos créditos foram cedidos à I… como resulta do demais teor da decisão. Impõe-se, por isso, a devida retificação, a fls. 438 e aditamento a fls. 440 previamente à determinada graduação dos créditos por reporte aos bens imóveis assim se suprindo a omissão e contradição alegado, nos seguintes termos:
“- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…:
1º As dividas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda;
2º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, IP na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º/4 al. c));
5º Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores subordinados graduados pela ordem prevista no artigo 48º
-
- Através do produto da venda do bem imóvel - verba 31 – imóvel rústico da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o art. 1.686:
1º - As dívidas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda do bem imóvel;
2º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, LP. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores comuns (artigo 47ª/4 c) );
4º- Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pela ordem previsto no artigo 48º”.
Este despacho veio a ser novamente retificado, por despacho de 16 de outubro de 2015, nos seguintes termos:
“- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117, da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…;
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido dos credores E… e esposa e H…, Ldª, em pé de igualdade e rateadamente; [conforme decisão proferida na sentença de fls. 438 do processo]
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.; [conforme decisão proferida na sentença de fls. 654 do processo]
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º,n.º 4, al. c));
6.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º”.
Resulta, assim, das retificações operadas a seguinte graduação:
“"ln casu, além dos créditos comuns, existem créditos com garantia hipotecaria reclamados por J… /I… S.A onerando os bens Imóveis apreendidos - verbas 1 a 25, 28 e 29 e o produto do venda (€ 96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de … CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J… - e pelo Instituto da Segurança Social, IP, onerando os bens móveis apreendidos - verbas 1 a 25 - sendo certo que parte do crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social, IP goza, ainda, de privilégio imobiliário geral. Ter-se-á que atender ainda, ao crédito privilegiado do credor/requerente da insolvência".
Ademais determina-se que a fls. 431, in fine e no segmento em causa passe a constar:
"ln casu, o crédito reclamado por J…, SA atual I… S.A., goza de garantia real/hipoteca sobre os bens imóveis apreendidos sob as verbas 1 a 25, 28 e 29 e o produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J… bem como o crédito reclamado pelo Instituto da Segurança Social, I.P., prevalecendo a hipoteca primeiramente registada".
[…]
- Através do produto da venda dos bens imóveis - verbas 28 e 29:
1° - As divides da massa Insolvente saem precípuas na devido proporção, do produto do venda do bem Imóvel:
2° - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social IP no parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º nº 4, al. c))
5º - Do remanescente. dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pelo ordem previsto no artigo 48º”.
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Por sua vez, resulta dos autos que a verba nº 31 constitui o imóvel descrito sob o nº 1.686 de ….
A referência feita a fls. 429 - último parágrafo e em sede de graduação à verba 31 por reporte aos créditos aí mencionados resulta, por isso e nessa parte, de mero lapso, que se retifica. Com efeito, pretendia reportar-se ao produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…, cujos créditos foram cedidos à I… como resulta do demais teor da decisão. Impõe-se, por isso, a devida retificação, a fls. 438 e aditamento a fls. 440 previamente à determinada graduação dos créditos por reporte aos bens imóveis assim se suprindo a omissão e contradição alegado, nos seguintes termos:
- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117, da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…;
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido dos credores E… e esposa e H…, Ldª, em pé de igualdade e rateadamente; [conforme decisão proferida na sentença de fls. 438 do processo]
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.; [conforme decisão proferida na sentença de fls. 654 do processo]
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º,n.º 4, al. c));
6.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º”.
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- Através do produto da venda do bem imóvel - verba 31 – imóvel rústico da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o art. 1.686:
1º - As dívidas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda do bem imóvel;
2º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, LP. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores comuns (artigo 47ª/4 c) );
4º- Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pela ordem previsto no artigo 48º”.
Nos termos do 617º/2 CPC “se o juiz suprir a nulidade ou reformar a sentença, considera-se o despacho proferido como complemento e parte integrante desta, ficando o recurso interposto a ter como objeto a nova decisão”.
Verifica-se que nos despachos proferidos o juiz do tribunal “a quo” para além de qualificar os créditos da apelante, procedeu à respetiva graduação em relação ás verbas nº 28 e nº 29 e produto da venda, em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117, da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…, no montante de € 96.400,00. Na verba nº 31 eliminou a referência aos credores E… e mulher.
Desta forma tomou conhecimento das questões a apreciar, suprindo a nulidade cometida, passando os despachos proferidos a constituir complemento e parte integrante da sentença.
Apenas nos cumpre corrigir o valor do produto da venda apreendido à ordem dos autos de insolvência, que como resulta da informação prestada pelo Administrador da Insolvência a fls. 424 (requerimento de 21 de outubro de 2013) corresponde a € 96.000,00 e não € 96.400,00 como se refere na sentença.
Conclui-se, assim, que suprida a nulidade apontada, mostra-se válida a sentença, sem prejuízo da apreciação das questões de mérito que se suscitam na apelação.
-
Nas conclusões de recurso, sob o ponto 2, a apelante suscita, ainda, a nulidade com fundamento no art. 616º/1 c) CPC, por considerar que existe uma construção viciosa, tornando a decisão ininteligível, quando considera em relação aos credores C… e esposa, H… Lda. e E… e esposa, que “o direito de retenção é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for
que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída” e gradua a final os créditos dos referidos credores com prevalência sobre as anteriormente constituídas hipotecas de que beneficia a ora Recorrente.
Resulta do disposto no art. 615º/1 c) CPC, que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.
A previsão da norma contempla as situações de contradição real entre os fundamentos e a decisão e não as hipóteses de contradição aparente, resultante de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.
Como refere ANTUNES VARELA: “[…]a norma abrange os casos em que há um vício real no raciocínio do julgador: a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente“[8].
No caso presente verifica-se a apontada contradição, que resultou de um lapso manifesto, que ficou sanado com a retificação operada por despacho de 15 de setembro de 2014, onde se escreveu:”[r]efere-se, ainda a fls 431 - 3 o parágrafo que “ O direito de retenção é oponível erga omnes permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída". Note-se, porém, que a contradição invocada foi motivada por mero lapso de escrita, por se pretender referir "(… ) ainda que posteriormente constituída (…)".
A retificação operada, nos termos do art. 617º/2 CPC, passou a constituir complemento da sentença e nessa conformidade existe na sentença uma perfeita coerência no raciocínio e a decisão resulta como a conclusão lógica desse raciocínio, pois considerou-se que o direito de retenção é oponível erga omnes permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, ainda que posteriormente constituída. Em conformidade com este raciocínio atribuiu-se na graduação prevalência ao direito de retenção sobre a hipoteca, apesar da hipoteca (de que beneficia o crédito reclamado pelo credor I…, SA) se ter constituído em data anterior ao direito de retenção.
Conclui-se, assim, que suprido o lapso, a interpretação e análise dos factos à face do direito, apenas podia conduzir à decisão a que chegou o juiz do tribunal “a quo”, motivo pelo qual não se verifica a apontada nulidade.
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Procedem, nesta parte, as conclusões de recurso, sob os pontos 1 a 4, 29 e sanados os vícios com os despachos retificativos, que passaram a fazer parte integrante da sentença, julga-se válida a sentença.
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- Mérito da causa -
A apelante como refere sob o ponto 50 das conclusões de recurso insurge-se contra a sentença, quanto à verificação, reconhecimento e graduação dos créditos reclamados pelos credores E… e mulher, C… e mulher e H…, Lda..
Cumpre assim reapreciar a sentença recorrida ponderando estes aspetos, quanto aos alegados créditos.
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- Verificação dos créditos em relação aos credores E… e mulher e C… e mulher –
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 10 a 15 a 19, 19, 36, 37, insurge-se a apelante contra a decisão pelo facto de ter reconhecido os créditos em causa. Argumenta, em síntese, que não assiste aos credores o direito à indemnização peticionada e restituição do sinal, porque não alegaram e não provaram o incumprimento definitivo do contrato por facto imputável à insolvente.
A sentença pronunciou-se nos termos que se transcrevem:
“Quid iuris relativamente ao montante e à natureza do crédito dos credores C… e mulher D… e quanto ao montante e à natureza do crédito dos credores E… e esposa F…?
Em sede de audiência de julgamento e relativamente ao crédito dos referidos credores provou-se que:
1. Por contrato promessa de compra e venda, celebrado em 05.07.2005, a insolvente prometeu vender a C… e mulher D… e estes prometeram comprar-lhe a fração AC, 2.º …, do prédio sito na Estrada …, com entrada pelo n.º ….
2. Na primeira quinzena de junho de 2006, a insolvente entregou as chaves da fração referida em 1. tendo estes passado a ocupar e residir na mesma.
3. Os outorgantes C… e mulher D… entregaram, a título de sinal, a quantia de 30.000,00€.
4. A escritura de compra e venda que as partes acordaram celebrar no prazo máximo de 30 dias após obtenção do alvará de habitabilidade não chegou a ser realizada por a insolvente não estar habilitada com os documentos necessários à sua realização, nomeadamente, a licença de habitabilidade.
5. Por contrato promessa de compra e venda, celebrado em 23.05.2003, a insolvente prometeu vender a E… e esposa F… e estes prometeram comprar-lhe um andar de tipologia T3, situado ao nível do 1.º andar …, com entrada pelo n.º …., fração autónoma que após a constituição do prédio em regime de propriedade horizontal seria designada pela letra M, sita na estrada …, em Gondomar.
6. Em 05.06.2003 os outorgantes do contrato promessa referido em 5. assinaram um aditamento ao mesmo, alterando o teor de algumas cláusulas. A cláusula segunda foi alterada, passando o objeto do contrato promessa a ser um andar de tipologia T4, situado no 2.º andar … do mesmo prédio – fração U – com entrada pelo n.º ….. e o preço da compra e venda prometida de 200.000,00€.
7. Os outorgantes a título de sinal entregaram a quantia de 85.000,00€ e despenderam 115.000,00€ nas obras de conclusão da referida fração U.
8. Em novembro de 2004, os impugnantes passaram a habitar na fração U, arcando com todas as responsabilidades inerentes.
9. Em setembro de 2007, o gerente da insolvente N… comunicou aos referidos outorgantes que não iria outorgar a escritura de compra e venda uma vez que a insolvente atravessava uma fase muito difícil em termos financeiros e não tinha dinheiro para terminar o prédio e a licença de habitabilidade não poderia ser concedida.
10. A fração U veio a ser alienada no âmbito de uma execução fiscal instaurada e que correu contra a insolvente.
Atenta a factualidade provada concatenada com o disposto no artigo 754º do Cód. Civ. constitui nosso entendimento que o crédito a reconhecer a C… e mulher D… no montante de € 60.000,00 goza de direito de retenção sobre o bem imóvel apreendido – verba n.º 4. Afigura-se-nos, com efeito, que houve incumprimento do contrato promessa por parte da insolvente, assistindo ao credor reclamante o direito de resolver o contrato e haver da insolvente a quantia de € 60.000,00 relativo ao sinal em dobro (cf. artigo 442.º, n.º 2 do Código Civil). Com efeito, a conduta da insolvente demonstra que não pretendeu cumprir o contrato promessa de compra e venda, valendo tal ato como incumprimento definitivo.
Com efeito, a escritura A escritura de compra e venda que as partes acordaram celebrar no prazo máximo de 30 dias após obtenção do alvará de habitabilidade não chegou a ser realizada por a insolvente não estar habilitada com os documentos necessários à sua realização, nomeadamente, a licença de habitabilidade. A conduta posterior da insolvente revelou que não queria cumprir definitivamente o acordado.
O direito de retenção de que goza o referido credor, por demonstrada a tradição e detenção do imóvel, é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída.
Tal raciocínio é extensivo aos credores E… e esposa F….
Atenta a factualidade provada concatenada com o disposto no artigo 754º do Cód. Civ. constitui nosso entendimento que o crédito a reconhecer a E… e esposa F… no montante de € 170.000,00 goza de direito de retenção sobre o bem imóvel apreendido – verba n.º 31. Afigura-se-nos, com efeito, que houve incumprimento do contrato promessa por parte da insolvente, assistindo ao credor reclamante o direito de resolver o contrato e haver da insolvente a quantia de € 170.000,00 relativo ao sinal em dobro (cf. artigo 442.º, n.º 2 do Código Civil). Com efeito, a conduta da insolvente demonstra que não pretendeu cumprir o contrato promessa de compra e venda, valendo tal ato como incumprimento definitivo.
O direito de retenção de que goza o referido credor, por demonstrada a tradição e detenção do imóvel, é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída”.
Resulta dos fundamentos expostos, que a sentença reconheceu os créditos reclamados, por considerar assistir aos credores o direito à resolução do contrato, por incumprimento do contrato-promessa, imputável ao promitente vendedor, a insolvente e tal juízo não merece censura pelos motivos que se passam a expor.
O não cumprimento de qualquer obrigação é suscetível de desencadear, atento o efeito produzido, designadamente as situações de incumprimento definitivo ou de mora, sendo certo que, quanto ao contrato promessa, só o não - cumprimento definitivo permite abrir caminho à resolução do contrato (art. 432.° do CC) e à sanção prevista no art. 442,°, n.° 2, do CC..
A mora do devedor é o atraso culposo no cumprimento da obrigação. Na concreta estatuição do n.° 2 do art. 804.°, o devedor incorre em mora quando, por causa que lhe seja imputável, não realiza a prestação no tempo devido, continuando esta a ser ainda possível. Porém, a simples mora do devedor não confere, em regra, — como já se disse — ao credor o direito de resolver o contrato. A resolução do contrato só é permitida quando haja incumprimento definitivo imputável ao devedor.
Dois casos há, no entanto, que o art. 808.° do CC equipara ao não cumprimento definitivo, ao prescrever no seu n.° 1 que: “se o credor, em consequência da mora, perder o interesse que tinha na prestação, ou esta não for realizada dentro do prazo que razoavelmente for fixado pelo credor, considera-se para todos os efeitos não cumprida a obrigação.”
Assim, nos termos deste artigo, há incumprimento definitivo em duas situações:
- quando, em consequência da mora, se verificar a perda do interesse (objetivamente apreciada, por imposição do n.° 2 do mesmo artigo) do credor na prestação;
- quando, mantendo-se o interesse, a prestação não for realizada no prazo cominatório, suplementar e razoável, que o credor fixar.
Quanto à primeira situação, convém ter presente que a perda de interesse — não basta a simples diminuição - tem de resultar (sempre) da mora no cumprimento e não de qualquer outra circunstância. Depois, a perda do interesse tem de assumir um caráter objetivo, não podendo resultar de uma simples perda subjetiva de interesse. Ou seja, a superveniente falta de utilidade da prestação para o credor terá que resultar objetivamente das condições e das expectativas concretas que estiveram na origem da celebração do negócio (art. 808.°, n.° 2, do CC), bem como das que, posteriormente, venham a condicionar a sua execução.
A par destas situações geradoras de incumprimento definitivo, existem ainda outras que necessariamente o implicam.
Concretizando, deve também afirmar-se o incumprimento definitivo, sem necessidade de interpelação admonitória, quando o devedor comunica ao credor, de forma categórica, séria e definitiva, quer antes do vencimento, quer na pendência da mora, a sua intenção de não cumprir. Apesar de não estar diretamente prevista na lei, a configuração desta situação como incumprimento definitivo impõe-se pela sua própria natureza, uma vez que tanto a interpelação como a fixação de prazo suplementar seriam atos inúteis.
Acresce ainda que as partes podem fixar no contrato um prazo para o cumprimento das prestações, o que é suscetível de, quando não respeitado o prazo, gerar também o incumprimento definitivo. No entanto, o alcance dessa fixação de prazo é variável de acordo com a vontade das partes, expressamente indicada ou dedutível por interpretação negocial. Concretamente, a fixação do prazo pode revestir a natureza de um termo absoluto, essencial, quando puder concluir-se que a prestação tem de ser efetuada dentro dele sob pena de a prestação já não ter interesse para o credor; e há também casos em que, embora não esteja expressamente previsto um prazo, pelo menos de forma direta, se verifica a manifesta perda de interesse do credor, como sucede nos exemplos clássicos do artista convidado para um festa de aniversário. Nestes casos, há, então, um termo essencial.
No fundo, o importante é a indagação do significado do prazo certo fixado para serem emitidas as declarações de vontade e que terá que ser deduzido do material interpretativo fornecido pelas partes, da natureza da promessa, do comportamento posterior dos promitentes ou de outras circunstâncias relevantes. O fulcro da questão reside na essencialidade ou não do termo fixado como característica inerente ao contrato e na sua projeção no acordo celebrado. Com efeito, se estivermos perante um prazo essencial, a sua não observância, haja ou não uma qualquer imputação ou responsabilidade nesse desinteresse recíproco, gerará um incumprimento definitivo, conducente à resolução. Pelo contrário, a inclusão, no contrato - promessa, de um prazo apenas “relativamente fixo” não acarreta incumprimento definitivo, mas, quanto muito, é suscetível de constituição em mora - sem prejuízo de, aqui, ser aplicável o disposto no art. 808.° CC.
Em suma, podem-se elencar do seguinte modo as situações em que, com interesse para o caso concreto, tem lugar o incumprimento definitivo e, consequentemente, a resolução do contrato e a aplicação das sanções previstas no art. 442.°, n.° 2, do CC:
- quando, em consequência da mora, se verificar a perda do interesse (objetivamente apreciada) do credor na prestação;
- quando, mantendo-se o interesse, a prestação não for realizada no prazo cominatório ,suplementar e razoável, que o credor fixar;
- quando estiver fixado, no contrato, um termo essencial;
- quando o devedor faça a inequívoca e categórica declaração de que não pretende cumprir, caso em que estará, naturalmente, dispensada a dita interpelação.
No caso concreto, apurou-se:
4. A escritura de compra e venda que as partes acordaram celebrar no prazo máximo de 30 dias após obtenção do alvará de habitabilidade não chegou a ser realizada por a insolvente não estar habilitada com os documentos necessários à sua realização, nomeadamente, a licença de habitabilidade.
9. Em setembro de 2007, o gerente da insolvente N… comunicou aos referidos outorgantes que não iria outorgar a escritura de compra e venda uma vez que a insolvente atravessava uma fase muito difícil em termos financeiros e não tinha dinheiro para terminar o prédio e a licença de habitabilidade não poderia ser concedida.
Resulta, assim, da conjugação destes factos no contexto das circunstâncias que presidiram à celebração dos contratos - promessa, que o promitente vendedor de forma inequívoca e categórica declarou que não pretendia cumprir e por isso, estava dispensada a sua interpelação, por constituir um ato inútil.
Desta forma, assistia aos credores reclamantes o direito à resolução do contrato e a receber o pagamento do sinal que prestaram em dobro, nos termos do art. 442º/2 CC.
Contudo, mesmo que assim não se entenda, sempre se dirá que os credores alegaram e lograram demonstrar o direito que reclamam.
Com efeito, provou-se que entre os credores e a insolvente foram validamente celebrados dois contratos - promessa de compra e venda de uma fração do prédio sito na Estrada …, com entrada pelo nº …. e com a celebração de tais contratos receberam do promitente vendedor a chave das frações prometidas vender e passaram a ocupar as respetivas frações (pontos 2 e 8 dos factos provados).
A situação de insolvência do promitente vendedor, que assenta no incumprimento da generalidade das suas obrigações é revelador de não estar em condições de cumprir os aludidos contratos. Nestes casos, como se observa no Ac. STJ 22 -11 -2011, Proc.nº1548/06.9TBEPS-D.S1( disponível em www.dgsi.pt ): “[…]verifica[-se] uma imputabilidade reflexa considerando o comportamento da insolvente na origem do processo falimentar”.
Acresce que recaía sobre a insolvente-devedor o ónus de ilidir a presunção de culpa que se presume, em matéria de responsabilidade civil contratual — artigo 799º nº 1 do Código Civil.
Resta referir que os créditos constam da lista de créditos reconhecidos elaborada pelo Administrador da Insolvência, o que não foi impugnado por qualquer credor, reconhecendo, assim, o Administrador da Insolvência o direito dos credores ao sinal em dobro, nos termos do art. 442º/2CC ( art. 129º, 130º/3, 131º/3 CIRE ).
Em relação ao credor C… e mulher apenas se discutiu, face ao teor da impugnação apresentada por este à lista de créditos reconhecidos, o montante do sinal pago e como resulta dos factos provados, cuja decisão não foi impugnada, ascende a valor superior ao inicialmente reconhecido pelo administrador da insolvência.
As impugnações e resposta às impugnações centraram-se fundamentalmente na questão da qualificação dos créditos, porque o Administrador da Insolvência não reconheceu os créditos como “garantidos”, por considerar que não beneficiavam da garantia concedida pelo direito de retenção.
Mostra-se, assim, irrelevante a argumentação tecida sob o ponto 21 das conclusões de recurso, pois estando em causa um contrato - promessa válido e eficaz celebrado entre o consumidor promitente - comprador e a insolvente, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, mantêm-se os efeitos do incumprimento, a que se reporta o artigo 442º nº 2 do Código Civil.
Neste contexto, recaía sobre a insolvente o ónus de ilidir a presunção de culpa, do art. 799º/1 CC, o que também não ocorreu.
Conclui-se, assim, que a sentença que julgou verificados e reconheceu os créditos, não merece censura, improcedendo nesta parte as conclusões de recurso.
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- Qualificação dos créditos -
Na sentença os créditos reconhecidos em relação aos credores E… e mulher, C… e mulher e H…, Lda.. foram qualificados como “créditos garantidos”, por beneficiarem do direito de retenção.
Nas conclusões de recurso sob os pontos 5, 6, 7, 9, 25, 30 e 31 insurge-se a apelante contra tal qualificação em relação aos créditos reconhecidos e verificados de E… e mulher e C… e mulher, por considerar que em processo de verificação e graduação de créditos, apenso a processo de insolvência, para que seja reconhecido o privilégio consagrado no artigo 759º do CC não basta a simples alegação, por parte do credor reclamante, de factos eventualmente integradores do direito de retenção, consagrado na alínea f) do nº 1 do artigo 755º do Código Civil. É necessário que o credor reclamante prove os factos dessa alegação, juntando, para tanto, o título justificativo, que, no caso, é a sentença condenatória a reconhecer o incumprimento do promitente vendedor e a tradição da coisa para o promitente - comprador.
Tal argumento não procede dada a particular natureza do processo de insolvência e o regime legal consagrado.
Atenta a finalidade do processo de insolvência, enquanto execução de vocação universal – art. 1.º /1 do CIRE — postula a observância do princípio “par conditio creditorum”, que visa a salvaguarda da igualdade (de oportunidade) de todos os credores perante a insuficiência do património do devedor, afastando, assim, a possibilidade de conluios ou quaisquer outros expedientes suscetíveis de prejudicar parte (algum/alguns) dos credores concorrentes.
Decorre do art. 128º CIRE, conjugado com o art. 85º CIRE, não sendo pedida pelo administrador da insolvência a apensação da ação declarativa em que se discutam questões de natureza patrimonial, devem os créditos ser reclamados no prazo fixado na sentença que declarou a insolvência.
Ora, se a declaração de insolvência obsta à instauração ou ao prosseguimento de qualquer ação executiva contra a massa insolvente, como se prevê no art. 88º CIRE, mesmo no caso de a ação declarativa prosseguir e ser proferida sentença de condenação do insolvente essa sentença não pode ser dada à execução.
Conforme se prevê no nº 3 do art. 128, o credor que tenha o seu crédito reconhecido por decisão definitiva não está dispensado de o reclamar no processo de insolvência, se nele quiser obter pagamento. Haverá, nestas circunstâncias, que proceder à reclamação do crédito exista, ou não, uma sentença transitada a reconhecer o mesmo, a fim de que, apreciada a sua existência e montante (art. 128º e seguintes do CIRE), este venha a ser considerado na sentença de verificação e graduação dos créditos (art. 140º do CIRE).
Como se observa no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº1/2014[9]: “[d]eclarada a insolvência, todos os titulares de créditos de natureza patrimonial sobre o insolvente, cujo fundamento seja anterior à data dessa declaração, são considerados credores da insolvência, destinando -se a massa insolvente — que abrange, por regra, todo o património do devedor à data da declaração de insolvência, bem como os bens e direitos que adquira na pendência do processo — à satisfação dos seus créditos, ‘ut’ arts. 46.º/1 e 47.º/1)”.
O atual art. 90º CIRE veio reforçar este princípios ao prever que os credores da insolvência apenas poderão exercer os seus direitos em conformidade com os preceitos do presente Código, durante a pendência do processo de insolvência.
Daqui resulta que na pendência do processo de insolvência, os credores têm de exercer os seus direitos no processo de insolvência e segundo os meios processuais regulados no CIRE, sendo esta a solução que se harmoniza com a natureza e a função do processo de insolvência, como execução de vocação universal, tal como a caracteriza o art. 1.º do CIRE.
Como observam JOÃO LABAREDA e CARVALHO FERNANDES[10]:”[u]m corolário fundamental do que fica determinado é o de que, para poderem beneficiar do processo de insolvência e aí obterem, na medida do possível, a satisfação dos seus interesses, têm de nele exercer os direitos que lhes assistem, procedendo, nomeadamente, à reclamação dos créditos de que sejam titulares, ainda que eles se encontrem já reconhecidos em outro processo […].[…]a estatuição deste art. 90.º enquadra um verdadeiro ónus posto a cargo dos credores”.
Desta forma, o reconhecimento do direito de garantia deve ser feito no processo de insolvência, no confronto com os demais credores, por constituir um pressupostos da graduação dos créditos e subsequente pagamento, pelo produto da liquidação.
A obtenção de sentença que reconheça o direito de garantia em ação própria, apenas tem valor inter partes, mais não constituiria do que um documento para instruir o requerimento da reclamação/verificação de créditos (art. 128.º/1), não dispensando por isso, os credores de reclamar o seu crédito no processo de insolvência, nem isentando da probabilidade de o ver impugnado e de ter de aí fazer toda a prova relativa à sua existência e conteúdo.
Acresce que impondo a lei a todos os credores o ónus de reclamarem o seu crédito no processo de insolvência se pretendem obter pagamento, forçoso é concluir que elege o processo de insolvência como o processo competente para apreciar e decidir do direito de garantia que acompanha o respetivo crédito.
Conclui-se, assim, que o reconhecimento do direito de retenção em relação aos créditos reclamados por E... e mulher e C… e mulher, não estava dependente da instauração de ação declarativa prévia para reconhecimento do direito.
Argumenta, ainda, a apelante, sob o ponto 8 das conclusões de recurso, que a não ser assim o Administrador da Insolvência seria obrigado a reconhecer a existência de um qualquer contrato - promessa apenas mediante a simples alegação do promitente - comprador de que, tendo havido tradição da coisa, ocorreu incumprimento por parte do promitente - comprador, tornando incompreensível o regime previsto no art. 106º CIRE.
Por outro lado, defende, sob o ponto 20 das conclusões de recurso que está na livre disposição do Administrador da Insolvência optar ou não pelo cumprimento dos contratos - promessa.
A este respeito cumpre ter presente desde logo o Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/ 2014[11] que veio uniformizar a jurisprudência nos seguintes termos:
“No âmbito da graduação de créditos em insolvência o consumidor promitente -comprador em contrato, ainda que com eficácia meramente obrigacional com traditio, devidamente sinalizado, que não obteve o cumprimento do negócio por parte do administrador da insolvência, goza do direito de retenção nos termos do estatuído no artigo 755º nº 1 alínea f) do Código Civil”.
Decorre, assim, da interpretação do art.106º do CIRE, fixada no douto aresto, que constitui um ónus do administrador da insolvência diligenciar pelo cumprimento do contrato
promessa e comprovar tal situação, quando confrontado com a reclamação do consumidor promitente - comprador, com traditio, devidamente sinalizado.
Como se defende no citado aresto, nestas circunstâncias, perante a omissão da lei, aplica-se por recurso ao “lugar paralelo” o regime previsto na lei para o contrato - promessa com eficácia real ( art. 106º/1 CIRE ) e o regime da compra e venda com reserva de propriedade ( art. 104º CIRE ), com base na seguinte interpretação:
“O art. 106º do CIRE prevê:
“1 — No caso de insolvência do promitente -vendedor, o administrador da insolvência não pode recusar o cumprimento de contrato -promessa com eficácia real, se já tiver havido tradição da coisa a favor do promitente - comprador.
2 — À recusa de cumprimento de contrato –promessa de compra e venda pelo administrador da insolvência é aplicável o disposto no nº 5 do artigo 104º, com as necessárias adaptações, quer a insolvência respeite ao promitente -comprador quer ao promitente -vendedor”.
Decorre do nº 1 que “no caso de insolvência do promitente -vendedor, o administrador da insolvência não pode recusar o cumprimento de contrato -promessa com eficácia real, se já tiver havido tradição da coisa a favor do promitente -comprador”.
Em tal hipótese e caso o administrador não cumpra o contrato celebrando o contrato definitivo em conformidade, poderá o promitente -comprador lançar mão da execução específica de harmonia com o estatuído nos artigos 827º, 830º e 442º nº 3 todos do Código Civil.
No entanto o artigo 106º supracitado não menciona a situação relativamente vulgar em que o contrato -promessa, mau grado de natureza obrigacional, foi acompanhado de tradição da coisa para o promitente -comprador; é também o caso que aqui analisamos.
Dúvidas não há, que não se verificando a tradição da coisa e tendo o contrato efeito meramente obrigacional, ao administrador cabe ponderar e decidir pelo cumprimento ou não cumprimento do mesmo; isto só não sucede caso alguma das partes tenha cumprido na íntegra a sua obrigação e havendo incumprimento definitivo.
Contudo, havendo tradição da coisa, a norma não esclarece qual a consequência daí resultante; todavia tal omissão é ultrapassada fazendo apelo ao “lugar paralelo” resultante da conjugação dos artigos 106º nº 2 e 104º nsº 1 do CIRE (respeitante à venda com reserva de propriedade) aplicável no caso em análise, já que as razões determinantes do que ali vem exposto quanto ao que lá se regula (compra e venda a prestações) são idênticas às que aqui estão em causa.
Subjacente a esta tomada de posição está a forte expectativa que a traditio criou no “promitente - comprador” quanto à solidez do vínculo. Cimentada esta confiança, e “corporizada” destarte a posse, existe, na prática, do lado do adquirente um verdadeiro animus de agir como possuidor, não já nomine alieno mas antes em nome próprio. A partir do momento em que o insolvente entregou as chaves dos prédios ao promitente -comprador, materializou a intenção de transferir para este os poderes sobre a coisa, faltando apenas legalizar uma situação de facto consolidada.
Parificada tal situação com as hipóteses do efeito real dos contratos em termos de impedir a resolução respetiva, poderá assentar-se em que o incumprimento dá assim origem ao despoletar do “direito de retenção” a que se reporta o artigo 755º nº 1 alínea f) do Código Civil viabilizado pela interpretação a que acima fizemos referência no tocante ao artigo 106º, pelo que assim sendo subsiste a preferência a que aludimos. […]ficará o nº 2 do artigo 106º aplicável apenas ao contrato promessa com efeito meramente obrigacional e em que não tenha havido aquela tradição ao promitente –comprador. Só aqui, e a menos que uma das partes tenha cumprido integralmente a sua obrigação, poderá o administrador optar por cumprir ou recusar a execução do contrato”.
No caso concreto, atento os factos apurados, não resulta que o Administrador da Insolvência cumpriu os contratos ou estava em condições de cumprir. Desde logo não se questionou a celebração dos contratos - promessa e respetiva validade.
Na lista de créditos reconhecidos elaborada ao abrigo do art. 129º do CIRE o Administrador da Insolvência reconheceu o crédito reclamado pelos credores E… e mulher, no montante de € 170.000,00, por incumprimento do contrato promessa celebrado com a insolvente. O crédito reconhecido não foi objeto de impugnação, por qualquer credor, nomeadamente, a apelante.
Em relação ao crédito reclamado pelo credor C… e mulher, de igual forma, reconheceu o crédito de € 46.885,00, por incumprimento do contrato - promessa, com a condição de opção pelo cumprimento do contrato. Constata-se que não logrou provar tal condição, uma vez provada a “traditio”.
Provou-se, como decorre dos factos provados – pontos 2 e 8 – que os promitentes - compradores após celebração dos respetivos contratos - promessa passaram a ocupar as frações prometidas vender. Operou-se, assim, a tradição da coisa.
Conclui-se, atento o regime específico previsto no CIRE, a respeito dos efeitos da insolvência sobre os negócios em curso, que se mostra inútil obter sentença que reconheça previamente o direito de crédito e a respetiva garantia, nem o cumprimento dos contratos - promessa ficava na livre disposição do Administrador da Insolvência.
Argumenta, ainda, a apelante sob os pontos 22 a 27, 33, 34, 35, 36, 37 que os factos provados não permitem reconhecer que os créditos em causa, gozam da garantia concedida pelo direito de retenção.
Reconhece a lei o direito de retenção por incumprimento do contrato - promessa por parte do promitente - vendedor que consentiu na “traditio“, nas situações em que é devida indemnização por via do mecanismo do sinal – art. 442º, nº2 e art. 755º/1 f) , do Código Civil. O direito de retenção conferido ao promitente - comprador não visa mantê-lo na fruição de qualquer direito de gozo, mas antes garantir o pagamento do seu crédito – dobro do sinal prestado – no pressuposto de que existe incumprimento definitivo imputável ao promitente - vendedor que recebeu o sinal.
A este respeito observa-se no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº4: “a norma do artigo 102º do CIRE acima transcrito se aplica, como se vê do próprio texto, “sem prejuízo do estatuído nos artigos seguintes”, conferindo de certa forma autonomia ao estatuído no artigo 106º; e aqui a lei é expressa ao referir que “no caso de insolvência do promitente vendedor, o administrador da insolvência não pode recusar o cumprimento se já tiver havido tradição da coisa a favor do promitente - comprador; a isto acresce que nada apontando, a nosso ver, para o facto de ter havido intuito de modificar com a entrada em vigor do CIRE a orientação legislativa ao nível das consequências de incumprimento da promessa do contrato e suprindo pelo recurso ao regime da compra e venda com reserva de propriedade, a omissão da regulamentação do contrato promessa com efeito obrigacional e tradição do objeto, ficará o nº 2 do artigo 106º aplicável apenas ao contrato promessa com efeito meramente obrigacional e em que não tenha havido aquela tradição ao promitente -comprador.
Só aqui, e a menos que uma das partes tenha cumprido integralmente a sua obrigação, poderá o administrador optar por cumprir ou recusar a execução do contrato. Não se aduza ainda, contra o entendimento exposto, que não há imputação de culpa a fazer em caso de insolvência porque com a declaração desta última, a relação jurídica existente, então reconfigurada, não a poderá comportar, já que ao insolvente se substitui e passa a figurar em juízo apenas a massa falida e o administrador; é para nós claro o cariz redutor deste entendimento; a insolvência não surge do nada, radicando antes e à partida no comportamento de uma entidade que se mostrou não ter cumprido as suas obrigações. Nestes casos já foi decidido e bem, neste Supremo Tribunal de Justiça 18, que se verifica uma imputabilidade reflexa considerando o comportamento da insolvente na origem do processo falimentar; acresce que, seria sempre a esta última que cumpriria afastar a culpa, que se presume, em matéria de responsabilidade civil contratual — artigo 799º nº 1 do Código Civil. Por último diremos que o artigo 97º do CIRE que se reporta à extinção de privilégios creditórios e garantias reais, com a declaração de insolvência, não enumera “o direito de retenção” no elenco dos extintos. Adiante -se ainda que, como bem salienta o recorrente, bastaria, caso contrário, que uma empresa promitente vendedora e incumpridora do contrato, se apresentasse à insolvência para evitar as consequências do incumprimento.
Em suma concluímos que não sendo afetado o contrato--promessa, mantêm -se os efeitos do incumprimento a que se reporta o artigo 442º nº 2 do Código Civil“.
Tendo presente a interpretação exposta, em confronto com os factos provados, somos levados a concluir que os créditos gozam da garantia concedida pelo direito de retenção. Os créditos verificados - valor do sinal em dobro – têm como causa o incumprimento de contratos - promessa celebrados no âmbito da relação consumidor promitente - comprador e promitente - vendedor/insolvente, com tradição da coisa, pelo que, estão reunidos os pressupostos do art. 755º/1 f) CC para reconhecer o direito de retenção.
Improcedem, nesta parte, as conclusões.
No ponto 28 das conclusões de recurso suscita a apelante a inconstitucionalidade do art. 755/1 f) CC. A argumentação exposta pela apelante em defesa da sua tese foi analisada no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº4/2014, que vimos seguindo de perto, e uma vez que não se invocam novos e diferentes argumentos, renovamos aqui a posição expressa no citado acórdão:
“No tocante ao princípio da igualdade estatui o artigo 13º nº 1 da Constituição da República que “todos os cidadãos têm a mesma dignidade social e são iguais perante a lei”. Mas seria ocioso tecer grandes considerações sobre aquilo que é de há muito um dado adquirido sobre aquele normativo: não se pode tratar de uma forma igual aquilo que à partida é desigual. Ora a dilucidação desta problemática depende essencialmente de uma ponderação dos valores e interesses legítimos vigentes na sociedade num determinado momento histórico. E
considerações semelhantes valem também no tocante ao princípio da proporcionalidade, também informador do sistema jurídico; a sua aplicação ao caso concreto terá que fazer -se tendo em vista os valores que se entende constituírem os prevalentes na comunidade, harmonizando - os axiologicamente entre si. Como em muitos outros setores do ordenamento jurídico, também aqui, ao nível do contrato promessa, o legislador no seu poder -dever de corrigir desequilíbrios e tomando em linha de conta os interesses e riscos em presença, entendeu propender para a proteção da parte mais débil, o promitente -comprador, face ao credor hipotecário, desde que aquele tivesse entregue ao outro outorgante o sinal e obtido a tradição do objeto do contrato. Assim e na linha do entendimento do que tem vindo a ser repetidamente decidido por este Supremo Tribunal e ainda pelo Tribunal Constitucional, não vemos que haja qualquer inconstitucionalidade naquela opção legislativa.
A acrescer ainda a estas razões, não pode igualmente esquecer -se que no momento em que a garantia hipotecária se constituiu, já estavam em vigor os artigos 755º nº 1 alínea f) e 759º nº 2 do Código Civil, o que reforça a necessidade de o credor hipotecário ter de acautelar -se contra os efeitos para eles possivelmente nefastos daquela preferência.
Não se argumente pois de igual modo que os princípios da previsibilidade e segurança seriam afetados pela concessão e prevalência do direito de retenção; trata -se de mais uma escolha do legislador, à semelhança de outras — v. g. créditos de trabalhadores — que evidencia claramente uma ponderação de interesses em atenção à parte mais fraca no âmbito da relação contratual, o que implica necessariamente compressão de alguns direitos com vista à busca de uma solução mais equitativa; é o que sucede quanto à prevalência excecional do crédito emergente de contrato promessa ainda, que de natureza obrigacional, sobre a hipoteca, desde que se tenha verificado a tradição do respetivo objeto acompanhada pelo pagamento total ou parcial do preço. Poder -se -á dizer, parafraseando um acórdão deste Supremo Tribunal, estarem assim presentes, na interpretação exposta das normas aplicadas, os critérios práticos da justa medida, razoabilidade e adequação material ínsitos no princípio da proporcionalidade que temos vindo a comentar.
Equacionada desta forma a problemática, especialmente sob o ponto de vista de ambos os reclamantes apontados no âmbito do processo de insolvência, diremos que a solução obtida encontra no contexto socioeconómico que vivemos, premente atualidade; é que se bem que as normas legislativas pertinentes, maxime as constantes do Código Civil, tenham tido na sua génese, de um modo especial, a inflação que se viveu entre o final da década de 70, aproximadamente até meados dos anos 80 do século passado, não é menos certo que o eclodir da crise económica que atravessamos, inesperada para a generalidade dos consumidores, trouxe consigo um elevadíssimo número de insolvências em que naturalmente se poderão surpreender questões desta natureza. Daí que o entendimento adotado se imponha com força redobrada”.
A posição expressa vai ao encontro do já decidido pelo Tribunal Constitucional nos Ac. TC 356/04, Ac TC 357/2004; Ac. TC 594/2003 e Ac TC 374/2003, todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.
Consideramos, assim, não se verificar a apontada inconstitucionalidade.
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A apelante, sob os pontos 38 a 45, 47, 48, 49 das conclusões de recurso, insurge-se contra o segmento da sentença que qualificou como garantido, por beneficiar de direito de retenção, o crédito reclamado por H…, Lda.
Defende com apoio na posição de PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA[12] que a lei não confere ao empreiteiro no confronto com o dono da obra o direito de retenção para garantia dos seus créditos.
Na sentença reconheceu-se o direito de retenção com os seguintes fundamentos:
“1. No exercício da respetiva atividade comercial, em 08 de maio de 2001, H…, Ld.ª celebrou com a insolvente um contrato de empreitada, tendo por objeto a fase de conclusão da obra do prédio sito ao lugar do …, Estrada …, nºs. …. a …., Gondomar, constituído em propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2.692/19.991.203 e inscrito na matriz predial urbana sob o n.º 6.117.
2. No exercício do referido contrato e no período compreendido entre outubro de 2001 e novembro de 2008, H…, Ld.ª executou e prestou diversos trabalhos e serviços de empreitada na referida obra, sendo titular de um crédito em relação à insolvente no montante de 269.740,30€.
3. H…, Ld.ª mantém na referida obra diverso equipamento e materiais seus e tutela pela sua guarda.
Atenta a factualidade provada concatenada com o disposto no artigo 754º do Cód. Civ. constitui nosso entendimento que os créditos reclamados por H…, Ld.ª, gozam de direito de retenção sobre o prédio sito ao lugar do …, Estrada …, nºs….. a …., Gondomar, constituído em propriedade horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º 2.692/19.991.203 e inscrito na matriz predial urbana sob o n.º 6.117. Aliás, tal natureza não é colocada em crise pelo próprio credor hipotecário, único afetado pela mesma.
Com efeito, o empreiteiro, seja qual for a modalidade da empreitada, tem o direito de retenção da obra (total ou parcialmente realizada) para garantia do pagamento das despesas que realizou com a execução da mesma.
O direito de retenção é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída”.
Com efeito, tem sido discutida na doutrina a questão de saber se o crédito do empreiteiro pelo preço da obra e por despesas nela realizadas lhe faculta o exercício do direito de retenção contra o dono da obra que seja seu devedor.
ANTUNES VARELA e PIRES DE LIMA[13] defenderam a tese que não beneficia desse direito por não estar expressamente consagrado no art. 755º CC e por outro lado, o crédito do empreiteiro tem por objeto o preço da empreitada e por isso, não se enquadra na previsão do art. 754ºCC, por não constituir despesas feitas com o imóvel/móvel ou com os danos por estes causados.
Na doutrina em sentido contrário destaca-se o estudo de FERRER CORREIA e JOAQUIM SOUSA RIBEIRO, Parecer publicado na Coletânea de Jurisprudência; Ano XIII, Tomo I, págs. 17 a 23.
A jurisprudência, maioritariamente, tem reconhecido a garantia, com argumentos que também temos acolhido.
Em tese geral, o direito de retenção, previsto no art. 754º e seguintes do Código Civil confere ao devedor, que se encontra adstrito a entregar certa coisa e disponha de um crédito sobre o seu credor, de não efetuar a sua prestação, mantendo a coisa que deveria entregar em seu poder.
Constitui condição necessária para recorrer ao direito de retenção que o crédito do devedor da entrega da coisa resulte de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
O direito de retenção tem a natureza de direito real de garantia e uma vez verificada a situação factual suscetível de gerar o direito, o devedor obtém o direito de ser pago preferencialmente pelo valor da coisa retida[14].
Constituem pressupostos gerais do direito de retenção: a licitude da detenção de certa coisa, pertencente ao devedor e sobre a qual não exerce qualquer poder ou domínio e que o crédito do devedor da entrega da coisa resulte de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.
O credor que invoca o direito de retenção pode não só recusar a entrega dela enquanto este não cumprir, mas também de executar a coisa e de se pagar à custa do valor dela, com preferência sobre os demais credores.
O art. 754.º do Código Civil constitui-se como a norma - regra ou a norma - pressuposto onde o legislador estabeleceu os pressupostos ou requisitos gerais do direito de retenção. Verificando os pressupostos nela estabelecido aquele que estiver nas condições estabelecidas na norma adquire o direito de reter a coisa para garantia do pagamento do crédito resultante de despesas efetuadas por causa da coisa que tenha a obrigação de entregar.
O art. 755.º CC constitui-se como norma especificadora “gozam ainda do direito de retenção” os sujeitos jurídicos especificados nas respetivas alíneas, o que significa que qualquer sujeito que reúna as condições ou se encontre no quadro condicionante estatuído no artigo goza ainda desse direito de forma especifica.
O contrato de empreitada consubstancia uma obrigação de facere, mas para além da obrigação de fazer/construir a obra, por parte do empreiteiro, e do correspetivo pagamento do preço, da parte do dono da obra, o empreiteiro para realização da sua prestação obriga-se a fornecer os bens materiais para concretização do resultado a que se obrigou. Revela-se determinante a conexão entre o crédito e a obra realizada.
Neste sentido pronunciou-se o Ac. STJ 10.05.2011, Proc. 661/07.0TBVCT-A.G1.S1.:
”I - Tendo o empreiteiro, por causa da relação contratual – obrigação de facere – que estabeleceu com o dono da obra, que realizar despesas para obtenção do resultado que tem de entregar ou restituir, tem o direito de reter a coisa de que resultaram as despesas efetuadas.
II - O art. 754.º do CC constitui-se como a norma-regra ou a norma-pressuposto onde o legislador estabeleceu os pressupostos gerais e fundantes do direito de retenção; o art. 755.º do CC constitui-se como uma norma especificadora: vale dizer que, para além de qualquer sujeito que reúna as condições ou se encontre no quadro condicionante estatuído no preceito geral, gozam ainda desse direito, de forma específica, aqueles que estão referenciados no art. 755.º
III - O empreiteiro, mercê da sua específica posição perante o resultado da obra e a atitude possessória que exerce sobre ela, deve assumir, perante a mesma, uma posição de privilégio garantístico de modo a poder reter a coisa em seu poder, perante terceiros, e adquirindo o direito de ser pago, preferencialmente, mesmo perante aqueles que possuam outra garantia real, de cariz mais formal (designadamente, hipoteca) mas não com a intensidade material e intencional com que o retentor detém a coisa objeto da garantia”.
No Ac. STJ 03.06.2008, Proc. 08A1470, anota-se no sumário:
“ I - Demonstrado que a A no âmbito da empreitada de um edifício levada a efeito por contrato celebrado com os 1ºs RR se constituiu credora destes por efeito das diversas faturas que lhes foi endereçando e relativas às obras desenvolvidas, de harmonia com o esquema entre eles acordado de pagamento faseado, sendo que por via do não pagamento das mesmas, reteve em seu poder o edifício cujo acesso proibiu a qualquer pessoa, incluindo aos ditos RR, não existindo facto algum que importe uma eventual indefinição temporal da detenção do edifício pela recorrida, tem de se concluir que essa detenção preexistia ao vencimento das faturas.
II - No contrato de empreitada, o empreiteiro face ao não pagamento do preço pela contraparte, goza do direito de retenção”.
Revertendo ao caso dos autos, atenta a matéria de facto apurada, o crédito reconhecido ao credor H…, Ld.ª decorre da obra executada no imóvel. O credor executou e prestou diversos trabalhos e serviços de empreitada na referida obra, sendo titular de um crédito em relação à insolvente no montante de 269.740,30€.
O crédito do devedor da entrega da coisa - o empreiteiro - resulta de despesas feitas por causa dela, relacionadas com trabalhos e serviços executados no prédio. Está provada a conexão material entre o crédito e a coisa. A lei não impede o reconhecimento do direito de retenção pelo facto de existir uma identidade de fonte – o contrato de empreitada.
Argumenta a apelante que não decorre dos factos provados que o credor detém o imóvel, em relação ao qual invoca o direito de retenção. Os argumentos que desenvolve nas conclusões sob os pontos 42, 43, 44, 45 não têm suporte nos factos provados, cuja decisão não foi objeto de impugnação.
A garantia incide sobre o prédio onde foram executadas as obras, local onde o credor mantém diverso equipamento e materiais seus e tutela pela sua guarda, como se provou. A prática de atos materiais sobre a coisa - detenção -, sem exclusão de qualquer fração, abrange todo o prédio. Não se provou que a detenção da coisa recai apenas sobre a fração “D”, o que aliás, o credor nunca admitiu.
No tocante aos pontos 46, 47, 48 das conclusões de recurso, a apelante leva em consideração um conjunto de factos que não estão provados.
Com efeito, na decisão de facto, conforme despacho de 22 de julho de 2013, consideraram-se não provados os demais factos alegados.
Escreveu-se: “Não se provou outra factualidade alegada e relevante para decisão incompatível e diversa da acima descrita como provada”.
Esta decisão não foi objeto de impugnação.
Sob o ponto 46, argumentou-se que a obra não foi concluída nem entregue, e nem existe nenhum documento que ateste a sua boa execução e que não existia incumprimento definitivo imputável à insolvente, mas quando muito uma mera situação de mora e uma rescisão unilateral por parte da aludida credora reclamante.
Nada se provou, sendo certo que recaía sobre o devedor - insolvente o ónus da prova de tal matéria ou pelo administrador da insolvente (que alegou os factos), atento o disposto no art. 799º/2 CC.
Também não se provaram factos suscetíveis de exclusão do direito de retenção (art. 756º CC) ou que justifiquem a sua extinção (art. 761º CC).
Sob os pontos 47 e 48 suscita a apelante a questão da desproporção entre o montante do crédito e o valor do imóvel retido como garantia, para além de outros fornecedores não beneficiarem de igual garantia.
A este respeito cumpre ter presente que com o produto da venda do imóvel – o prédio na sua globalidade – se dará pagamento aos credores e não apenas ao concreto credor e crédito. No concurso são vários os credores, alguns com a mesma garantia sobre o mesmo bem e cujos pagamentos serão efetuados de forma rateada, não permitindo por vezes tal operação obter a satisfação integral do crédito apenas com o produto da liquidação de um bem.
Os factos provados não permitem concluir pela alegada desproporção entre o valor do crédito e o valor do produto da venda do imóvel.
Se outros credores dispõem de igual garantia, não a reclamaram e por isso, não pode o tribunal suprir tal omissão, que apenas aos próprios interessados é imputável.
Conclui-se, assim, por considerar que a sentença não merece censura quando reconheceu que o crédito verificado e reconhecido de H…, Lda beneficia da garantia concedida pelo direito de retenção.
Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso enunciadas e ainda, o ponto 49.
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> Da graduação
Nos pontos 32, 51 das conclusões insurge-se a apelante contra a graduação dos créditos, entendendo que prevalece o seu crédito sobre o crédito reclamado e reconhecido aos credores E… e mulher, C… e mulher e H..., Ld.ª.
A sentença, neste segmento da decisão não merece censura, na medida em que beneficiando os créditos da garantia concedida pelo direito de retenção, no concurso entre direito de retenção e hipoteca, prefere o direito de retenção, como resulta da decisão (art. 759º/2 CC).
Improcedem, nesta parte, as conclusões.
- Apelação dos credores E… e mulher –
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- Das nulidades da sentença –
Nas conclusões de recurso sob os pontos 1 a 36 suscitam os apelantes a nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 /2 b), c) e d) CPC.
Com efeito, nos termos do art. 615º/1 b) CPC, a sentença é nula, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
A nulidade ocorre desde que se verifique a falta absoluta de fundamentação, que pode referir-se só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
A irregularidade está diretamente relacionada com o dever imposto ao juiz de motivar as suas decisões, conforme resulta do disposto no art. 607º CPC[15].
Para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e coloca na base da decisão[16]. O dever de fundamentação da matéria de facto, previsto no art. 653º/2 CPC, não se confunde com o dever de fundamentação da decisão final, onde se trata da aplicação do direito aos factos e apenas este vicio pode gerar a nulidade da sentença.
Resulta do disposto no art. 668º/1 c) CPC e atual art. 616º/1 c) CPC, que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.
A previsão da norma contempla as situações de contradição real entre os fundamentos e a decisão e não as hipóteses de contradição aparente, resultante de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.
Como referia ANTUNES VARELA: “a norma abrange os casos em que há um vício real no raciocínio do julgador: a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente“[17].
A omissão de pronuncia sobre questões que o juiz devesse apreciar ou o conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento constitui outro dos fundamentos de nulidade da sentença, previsto no art. 615º/1 d) CPC.
O conhecimento de questões de que não podia tomar conhecimento, constitui um vício relacionado com a norma que disciplina a “ordem de julgamento“ – art. 608º/2 CPC.
Com efeito, resulta do regime previsto neste preceito, que o juiz na sentença: deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras. Não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
A sentença não padece de nulidade porque não analisou um certo segmento jurídico que a parte apresentou, desde que fundadamente tenha analisado as questões colocadas e aplicado o direito.
No caso concreto, proferida sentença procedeu-se à sua retificação, no sentido de suprir as omissões e nulidades suscitadas pela apelante I…, SA, nas respetivas alegações de recurso, consignando-se no despacho retificativo:
“Por sua vez, resulta dos autos que o verba nº 31 constitui o imóvel descrito sob o nº 1.686 de ….
A referência feita a fls. 429 - último parágrafo [sublinhado nosso] e em sede de graduação à verba 31 por reporte aos créditos aí mencionados resulta, por isso e nessa parte, de mero lapso, que se retifica. Com
efeito, pretendia reportar-se ao produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…, cujos créditos foram cedidos à I… como resulta do demais teor da decisão. Impõe-se, por isso, a devida retificação, a fls. 438 e aditamento a fls. 440 previamente à determinada graduação dos créditos por reporte aos bens móveis assim se suprindo a omissão e contradição alegado, nos seguintes termos:
“- Através do produto da venda (€96.400,00) em processo de execução fiscal inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…:
1º As dividas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda;
2º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, IP na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º/4 al. c));
5º Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores subordinados graduados pela ordem prevista no artigo 48º
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- Através do produto da venda do bem imóvel - verba 31 – imóvel rústico da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o art. 1.686:
1º - As dívidas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda do bem imóvel;
2º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, LP. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores comuns (artigo 47ª/4 c) );
4º- Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pela ordem previsto no artigo 48º.
Refere-se, ainda a fls 431 - 3 o parágrafo que
“ O direito de retenção é oponível erga omnes permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída". Note-se, porém, que a contradição invocada foi motivada por mero lapso de escrita, por se pretender referir "(… ) ainda que posteriormente constituída (…)".
A fls. 429 da sentença escreveu-se:
“Atenta a factualidade provada concatenada com o disposto no artigo 754º do Cód. Civ. constitui nosso entendimento que o crédito a reconhecer a E… e esposa F… no montante de € 170.000,00 goza de direito de retenção sobre o bem imóvel apreendido – verba n.º 31. Afigura-se-nos, com efeito, que houve incumprimento do contrato promessa por parte da insolvente, assistindo ao credor reclamante o direito de resolver o contrato e haver da insolvente a quantia de € 170.000,00 relativo ao sinal em dobro (cf. artigo 442.º, n.º 2 do Código Civil). Com efeito, a conduta da insolvente demonstra que não pretendeu cumprir o contrato promessa de compra e venda, valendo tal ato como incumprimento definitivo.
O direito de retenção de que goza o referido credor, por demonstrada a tradição e detenção do imóvel, é oponível erga omnes, permitindo ao respetivo titular invocá-lo eficazmente, de molde a fazê-lo prevalecer contra seja quem for que tenha ou se arrogue uma posição incompatível, de direito ou de facto, posteriormente constituída”.
Por efeito, do disposto no art. 617º/2 CPC a retificação passou a constituir parte integrante da sentença.
Face à retificação operada, o crédito reclamado pelos apelantes passou a beneficiar do direito de retenção sobre o produto da venda da fração “U”, do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117 da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J….
Contudo, na graduação dos créditos, desconsiderou a garantia e graduou-se o crédito, como crédito comum.
No caso presente a sentença, com a retificação operada por despacho de 15 de setembro de 2014, não é omissa quanto aos factos que estão na base da decisão, nem ainda, quanto aos fundamentos de direito, que analisa de forma detalhada em relação a cada crédito e tipo de garantia. Analisam-se, ainda, as questões que são objeto da decisão: verificação dos créditos, qualificação e graduação.
Contudo, a respeito do crédito reclamado pelos apelantes E… e mulher não existe na sentença uma perfeita coerência no raciocínio, porque a decisão não resulta como a conclusão lógica desse raciocínio, pois considerou-se perante os factos provados, que o crédito beneficiava da garantia concedida pelo direito de retenção, sendo por isso um crédito garantido, mas na graduação foi considerado como crédito comum.
Perante os factos provados, a interpretação e análise dos mesmos à face do direito, não podia concluir-se como resulta da sentença retificada motivo pelo qual se verifica a apontada nulidade por oposição entre os fundamentos e a decisão.
A nova retificação operada, por despacho de 16 de outubro de 2015, na sequência das nulidades suscitadas na presente apelação, veio sanar o vício, ao graduar o crédito dos apelantes em segundo lugar e antes do crédito do credor I…, SA, credor hipotecário, repondo a decisão inicial. O despacho proferido passou a constituir complemento da sentença retificada e parte integrante desta (art. 617º/2 CPC).
Aliás, mesmo que não fosse proferido tal despacho, sempre se teria de considera esgotado o poder jurisdicional do juiz, a respeito de tal matéria, pois uma vez decidido que o crédito dos apelantes gozava de um direito real de garantia, só pela via do recurso poderia tal decisão ser alterada, por se tratar de questão relacionada com o mérito da causa e não de mera retificação ou nulidade da sentença (art. 627º/1 CPC).
Atento o exposto julgam-se procedentes as conclusões, sanado o vício com o despacho retificativo e válida a sentença.
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- Da qualificação do crédito -
Os apelantes sob os pontos 37 a 71 insurgem-se contra a primitiva sentença retificada, pelo facto de não atribuir ao crédito reclamado e reconhecido a natureza de crédito garantido.
As questões colocadas nesta sede mostram-se prejudicadas com a decisão da anterior questão (art. 608º/2 CPC, por remissão do art. 663º/2 CPC). Como decorre do exposto, a sentença foi objeto de retificação pelo juiz, passando a integrar na graduação, em segundo lugar como crédito garantido, o crédito dos reclamantes-apelantes e tal decisão não merece censura, como se concluiu na análise da apelação de I…, SA.
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Nos termos do art.303º e art.304º CIRE as custas são suportadas pela massa insolvente.
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III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar parcialmente procedentes as apelações e confirmar a sentença recorrida, com as retificações operadas pelos despachos proferidos em 15 de setembro de 2014 (fls. 652 a 656 – ref. 337914908) e 16 de outubro de 2015 ( fls. 739 – ref. 358096304 ), o que importa em sede de graduação dos créditos:
- Através do produto da venda dos bens imóveis - verbas 28 e 29:
1° - As dividas da massa insolvente saem precípuas na devido proporção, do produto do venda do bem Imóvel:
2° - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, SA;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social IP no parte que goza de privilégio imobiliário geral;
4º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47º nº 4, al. c))
5º - Do remanescente. dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pelo ordem previsto no artigo 48º”.
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- Através do produto da venda do bem imóvel - verba 31 – imóvel rústico da freguesia de …, inscrito na respetiva matriz sob o art. 1.686:
1º - As dívidas da massa Insolvente saem precípuas, na devida proporção do produto da venda do bem imóvel;
2º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, LP. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
3º - Do remanescente dar-se-á pagamento aos credores comuns (artigo 47ª/4 c));
4º- Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados graduados pela ordem previsto no artigo 48º”.
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- Através do produto da venda (€96.000,00) em processo de execução fiscal da fração U do prédio urbano inscrito na matriz predial sob o artigo 6.117, da freguesia de …, CRP Gondomar 2.692, arrematado pela credora J…;
1.º - As dívidas da massa insolvente saem precípuas, na devida proporção, do produto da venda do bem imóvel;
2.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito garantido dos credores E… e esposa e H…, Ldª, em pé de igualdade e rateadamente;
3.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do credor I…, S.A.;
4.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto da Segurança Social, I.P. na parte que goza de privilégio imobiliário geral;
5.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos comuns (artigo 47.º,n.º 4, al. c));
6.º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos subordinados, graduados pela ordem prevista no artigo 48.º.
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Custas a cargo da massa insolvente.
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Porto, 07 de Abril de 2016
(processei e revi – art. 131º/5 CPC)
Ana Paula Amorim
Manuel Domingos Fernandes
Rita Romeira
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[1] Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico - convertido pelo Lince
[2] JOÃO DE CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, vol. III, Lisboa, Associação Académica da Faculdade de Direito, 1982, pag. 297.
[3] JOÃO DE CASTRO MENDES, Direito Processual Civil, ob. cit., pag. 308.
[4] ANTUNES VARELA, J.M.BEZERRA, SAMPAIO NORA, Manual de Processo Civil, 2ª edição Revista e Atualizada de acordo com o DL 242/85, S/L, Coimbra Editora, Limitada, 1985, pag. 686.
[5] ANSELMO DE CASTRO Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, Coimbra, Almedina, 1982, pag. 142.
[6] JOSÉ LEBRE DE FREITAS, A. MONTALVÃO MACHADO E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, Vol.II, 2ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, 2008, pag. 704.
[7] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, vol. V, Coimbra, Coimbra Editora Lim, 1984, pag. 143.
No mesmo sentido pode ainda ler-se o ANTUNES VARELA et al Manual de Processo Civil, ob. cit., pag.688.
[8] ANTUNES VARELA, et al, Manual de Processo Civil,ob. cit., pag. 690.
[9] Ac. STJ 08 de maio de 2013, Proc. 170/08.0TTALM.L1.S1, DR I série, nº 39, 25 de fevereiro de 2014.
[10] JOÃO LABAREDA e CARVALHO FERNANDES Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas Anotado, 2ª edição, Quid Júris, Lisboa, 2013, pag. 459
[11] Ac. STJ 13 de março de 2014, Proc. P. 92/05. 6TYVNG -M.P1.S1, DR I série, nº 95 de 19 de maio de 2014
[12] Cfr.PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA Código Civil Anotado, Vol. II, 4ª edição Revista e Atualizada, Coimbra Editora Wolters Kluwer, Coimbra, 2010, pag. 875
[13] Cfr.PIRES DE LIMA e ANTUNES VARELA Código Civil Anotado, Vol. II, ob. cit., pag. 875-876
[14] Cfr. LUIS MANUEL TELES DE MENEZES LEITÃO Garantias das Obrigações, 2ª edição, Coimbra, Almedina, 2008, 239-244.
Cfr. PEDRO ROMANO MARTINEZ e PEDRO FUZETA DA PONTE Garantias de Cumprimento, 5ª edição, Coimbra, Almedina, 2006, pag. 226-227.
[15] JOSÉ LEBRE DE FREITAS E A. MONTALVÃO MACHADO, RUI PINTO Código de Processo Civil – Anotado, vol II, 2ª edição, pag. 675 e ANSELMO DE CASTRO Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, pag. 141.
[16] ANTUNES VARELA J.M.BEZERRA, SAMPAIO NORA, Manual de Processo Civil ob.cit., pag. 688.
[17] ANTUNES VARELA, et al, Manual de Processo Civil, ob. cit., pag. 690.