Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2645/15.5T8GDM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MADEIRA PINTO
Descritores: RESPONSABILIDADE CIVIL EXTRACONTRATUAL
PRÁTICAS DISCRIMINATÓRIAS EM RAZÃO DA DEFICIÊNCIA DO LESADO
Nº do Documento: RP201711232645/15.5T8GDM.P1
Data do Acordão: 11/23/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 112, FLS.207-225)
Área Temática: .
Sumário: I - O autor fundamenta a presente acção no instituto da responsabilidade civil extracontratual e no disposto na Lei nº 46/2006, de 28.08, que “Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde”, que foi regulamentada pelo DL nº 34/2007, de 15.02 e, no que agora interessa, entrou em vigor no dia seguinte ao da publicação no DR, Iª Série de 28.08- artº 17º da referida Lei.
II - O autor não demonstrou, com factualidade suficiente, que tivesse sido alvo de práticas discriminatórias por parte do réu, a título de culpa deste, no relacionamento administrador/condómino que fundamentem a obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais.
III - As provadas e apontadas omissões por banda do réu, enquanto administrador do Condomínio e para com a pessoa do autor não configuram práticas discriminatórias em razão da deficiência deste (deficiência visual), que importem obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais.
IV - Não resultou provado que a instabilidade, ansiedade e agravamento da saúde psíquica do autor decorresse directa e necessariamente das omissões do réu no âmbito dessa relação condómino/administrador do Condomínio, de acordo com o disposto no artº 563º CC, na interpretação adoptada pela nossa lei da formulação negativa da teoria da causalidade adequada, segundo a qual o facto que actuou como condição do dano deixa de ser considerado como causa adequada, quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, atípicas, excepcionais, extraordinárias ou anómalas, que intercederam no caso concreto.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 2645/15.5T8GDM.P1
Relator: Madeira Pinto
Adjuntos: Carlos Portela
José Manuel Araújo de Barros
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Sumário:
1 - O autor fundamenta a presente acção no instituto da responsabilidade civil extracontratual e no disposto na Lei nº 46/2006, de 28.08, que “Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde”, que foi regulamentada pelo DL nº 34/2007, de 15.02 e, no que agora interessa, entrou em vigor no dia seguinte ao da publicação no DR, Iª Série de 28.08- artº 17º da referida Lei.
2 - O autor não demonstrou, com factualidade suficiente, que tivesse sido alvo de práticas discriminatórias por parte do réu, a título de culpa deste, no relacionamento administrador/condómino que fundamentem a obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais.
3 - As provadas e apontadas omissões por banda do réu, enquanto administrador do Condomínio e para com a pessoa do autor não configuram práticas discriminatórias em razão da deficiência deste (deficiência visual), que importem obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais.
4 - Não resultou provado que a instabilidade, ansiedade e agravamento da saúde psíquica do autor decorresse directa e necessariamente das omissões do réu no âmbito dessa relação condómino/administrador do Condomínio, de acordo com o disposto no artº 563º CC, na interpretação adoptada pela nossa lei da formulação negativa da teoria da causalidade adequada, segundo a qual o facto que actuou como condição do dano deixa de ser considerado como causa adequada, quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, atípicas, excepcionais, extraordinárias ou anómalas, que intercederam no caso concreto.
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I- RELATÓRIO
Autor – B….
Réu – C….
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1.2 - Objeto do litígio:
O autor intentou a presente ação declarativa pedindo a condenação do réu no pagamento de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros) a título de indemnização com base na responsabilidade civil, por danos não patrimoniais. Mais pediu o pagamento de juros vincendos à taxa legal contados desde a citação até integral pagamento. Para tanto alegou, em síntese, que o autor reside numa fração autónoma de prédio do qual o réu foi administrador. O autor sendo deficiente visual solicitou ao réu o envio digital de todos os documentos, o que o réu não cumpriu, causando-lhe danos morais.
O réu contestou, impugnando a matéria de facto alegada pelo autor, alegando, além do mais, que as irregularidades verificadas se deveram à sua inexperiência, não pretendeu humilhar ou descriminar o réu, nem o colocar em posição de desvantagem em face dos demais condóminos. A administração e o réu não tinham meios adequados.
Saneado o processo, sem audiência prévia ou prolação de despacho destinado a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova, veio a ser realizada audiência final e proferida sentença, em 30.03.2017, que julgou improcedente a presente acção e absolveu o réu do pedido.
Na sentença foram considerados os seguintes Factos provados:
A) O autor reside na fração Y do prédio sito na Rua …, n.º …, …, em … (artigo 1.º da petição inicial – matéria aceite).
B) O réu foi administrador do condomínio do edifício identificado, no período de 18 de Janeiro de 2013 a 31 de Março de 2015 (artigo 2.º da petição inicial – matéria aceite).
C) O autor em 2010 foi vítima de um AVC que afetou diretamente a visão, perda gradual e progressiva, ao nível do olho direito e de 80% ao nível do olho esquerdo (artigo 3.º da petição inicial, v. docs. de fls. 13-21).
D) Em 2012 ficou com uma incapacidade permanente global de 99%, de acordo com o atestado médico de incapacidade multiuso (artigo 4.º da petição inicial e doc. de fls. 22).
E) Em Julho de 2013, o autor foi vítima de AVC hemorrágico, que lhe provocou a cegueira (artigo 5.º da petição inicial e doc. de fls. 23).
F) Em data não concretamente apurada, mas não posterior a 2014, o autor começou a circular com bengala para cegos, de óculos escuros e em regra acompanhado de 3.ª pessoa, face à incapacidade que lhe tolheu os movimentos e afetou todas as suas rotinas diárias (artigo 6.º da petição inicial).
G) A deficiência visual implicou uma adaptação gradual em todos os atos do seu dia-a-dia (artigo 7.º da petição inicial).
H) A 26 de Março de 2013, o autor enviou para “D…@iol.pt”, via email, uma comunicação de realização de obras; tal comunicação não foi afixada, pedidas explicações alegou problemas com email (v. artigos 9.º e 10.º da petição inicial e doc. de fls. 26 e 32).
I) Na sequência de um assalto nas garagens do prédio, foi afixado no placard da entrada do prédio um aviso a informar todos os condóminos, o réu não comunicou ao autor via mail (artigo 11.º da petição inicial, fls. 27).
J) O autor enviou mail para D…@iol.pt a 7 de Fevereiro de 2014 comunicando além do mais: «pedir o favor que a partir de hoje 7-02-2014, que todas as afixações, nomeadamente convocatórias, atas de reuniões de assembleias gerais de condóminos e do Bloco, quer ordinárias, quer extraordinárias, relatórios e contas, orçamentos anuais, orçamentos para inovações, avisos, alertas, obrigações, e tudo o mais que seja de interesse, me sejam enviados por correio eletrónico, para o seguinte endereço (…) Estes pedidos são feitos, dado que sou portador de deficiência visual comprovada e atestada, sendo como único e exclusivo meio para leitura. (…)» (doc. de fls. 28) (artigo 12.º da petição inicial).
L) No final de Fevereiro de 2014, o réu afixou autorização para festa de carnaval, na Gelataria E…, sita na Rua …, n.º .., no placard da entrada do prédio, que se iria realizar a 3 de Março de 2014 (artigo 13.º da petição inicial e fls. 29).
M) Tal informação não foi remetida ao autor (artigo 14.º da petição inicial).
N) Em data não concretamente apurada, mas no final de Maio ou início de Junho e 2014 foi afixada nova autorização para evento a realizar pelo estabelecimento Gelataria E…, sito na Rua …, n.º .. (artigo 15.º da petição inicial e fls. 30).
O) Apesar de ambas estarem assinadas pelo réu, nenhuma desta informação foi enviada ao autor (artigo 16.º da petição inicial).
P) Em Janeiro de 2014, o réu deslocou-se à residência do autor munido das atas n.ºs 90 e 92, solicitando a sua assinatura (artigo 17.º da petição inicial).
Q) O réu entregou as atas ao autor, mas posteriormente o autor veio a constatar que a ata 92 que a posteriori foi junta ao processo judicial que correu termos nos Julgados de Paz do Porto com as respetivas assinaturas, tinha sido alterada e a percentagem constante das mesmas não era igual (artigo 19.º da petição inicial, dls. 37 e ss, admitido no artigo 16.º da contestação).
R) Na ata entregue ao autor para assinar a percentagem era de 48,33% (Doc. 12), na ata junta ao processo a percentagem é de 51,13% (Doc. 13), para além desta alteração, sucede que o autor esteve presente nas duas assembleias, na geral e na que respeita ao Bloco …, onde reside, ata 92, onde passou uma folha para todos os presentes assinarem (artigo 20.º da petição inicial e artigo 16.º da contestação).
S) O réu não recolheu a assinatura do autor, nem sequer lhe perguntou se podia assinar (artigo 21.º da petição inicial e artigo 16.º da contestação).
T) Em 04/04/2014 o autor foi informado via email da convocatória para a reunião extraordinária da assembleia de condomínio a realizar no dia 26 de Abril de 2014, assembleia em que o autor por motivos de doença não esteve presente (artigo 22.º da petição inicial).
U) Em 3 de Maio de 2014 a ata foi enviada por email para o autor; contudo, não foram enviados os anexos (lista de presenças e lista de votos), enviaram a lista de pagamentos (artigo 23.º da petição inicial e fls. 43 e ss).
V) Considerando estar a ser alvo de discriminação, o autor solicitou ajuda ao provedor para a deficiência (artigo 24.º da petição inicial).
X) Em 28 de Abril de 2014, foi enviada carta pela Associação F… (…), com o seguinte teor: «Venho a pedido do n/ sócio B…, residente na Rua …, … - …º, …, solicitar que em cumprimento do estabelecido na Lei 46/2006 e do dec. Lei 34/2007 não sejam cometidos atos de discriminação em razão da Deficiência e, possa, ser o N/ Sócio e V/ Condómino, informado de forma acessível, sobre toda a documentação do Condomínio, por e-mail, conforme já foi por ele solicitado em 7 de fevereiro de 2014, assegurando, desta forma, o seu acesso à informação, como os demais condóminos, sob pena de poder vir a ser apresentada queixa por incumprimento junto do INR (…)» (v. artigo 26.º da petição inicial e fls. 46).
Z) Em Junho de 2014, G…, advogado e provedor do deficiente, dirigiu ao réu comunicação com o seguinte teor «Em nome do m/constituinte, Exm.º Senhor B…, solicito toda a documentação referente a assuntos do condomínio sejam remetidos para o email (….). Com V. Ex.a sabe o m/constituinte é uma pessoa cega, mas por isso mesmo a lei protege-o. (…) É do conhecimento de V. Ex.ª, (…) no seu lugar de garagem infiltrações de água (…) A convocatória para a realização de assembleia a realizar no dia 20/21 de Junho p.p. além de não respeitar o formalismo próprio das assembleias extraordinárias, não está datada (…). Atentamente, Porto 13 de Junho de 2014» (artigo 27.º da petição inicial e fls. 49).
A)’ Em Julho de 2014, G…, reuniu com o réu (artigos 28.º da petição inicial e 14.º da contestação)
B)’ A deficiência visual de que o autor é detentor, é ostensiva perante qualquer pessoa que consigo priva, para além do mesmo passar a usar óculos escuros, bem como a bengala para cegos, muitas das vezes é orientado por terceira pessoa (artigo 31.º da petição inicial).
C)’ O réu enviou para o autor a ata n.º 94, mas sem anexos (artigo 33.º da petição inicial).
D)’ Em Dezembro de 2014, o réu deslocou-se à residência do Autor, pelas 21:30h, mais uma vez para recolher a assinatura do autor em como recebia a ata, o réu que no dia 30 de Dezembro recebe pelo correio registado com AR, as atas que no dia anterior lhe haviam pedido para assinar (artigo 34.º da petição inicial).
E)’ O autor, sentiu-se profundamente ofendido, revoltado, humilhado na sua consideração como pessoa e desrespeitado (artigo 36.º da petição inicial).
F)’ A sua saúde piorava (artigo 37.º da petição inicial).
G)’ O autor não conseguia dormir (artigo 38.º da petição inicial).
H)’ Estava sempre a recorrer à F… para o ajudar, onde foi assistido em várias sessões pela Psicóloga, no sentido de encarar esta situação de forma diferente (artigo 41.º da petição inicial).
I)’ Pelo que o autor perdeu competências de autonomia que já havia adquirido, atendendo a que afetou de forma direta o estado emocional do autor, o conceito de si próprio, a autoestima, a perceção de si próprio e a capacidade de autodeterminação (artigo 42.º da petição inicial e doc. 18).
J)’ Tornando mais demorada a sua readaptação à nova realidade (artigo 43.º da petição inicial)
L)’ Em 2013, o réu foi eleito administrador do condomínio onde ambos habitam bem como administrador da administração geral que era constituída pela torre onde ambos vivem e mais duas (artigo 5.º da contestação).
M)’ O autor discordou com deliberações da assembleia geral sobretudo em relação a obras a realizar no condomínio (artigo 6.º da contestação)
N)’ Nos Julgados de Paz do Porto, nos processos 186/2014 e 428/2014 propostos pelos condóminos H… e I… e mulher, respetivamente, contra o administrador/réu, e condóminos que votaram favoravelmente as deliberações das atas de 17 e 18 de Janeiro de 2014 (artigo 7.º da contestação).
O)’ Tendo sido acordado a 17-09-2014:
«Artigo 1.º O demandado por si e na qualidade de administrador de condomínio (…), bem como na qualidade de representante judiciário dos condóminos que votaram favoravelmente as deliberações tomadas nas assembleia de condóminos do Bloco … de 17-01-2014 e nas assembleias gerais de condóminos de 18-01-2014 e 26-01-2014, melhor identificadas nas atas n.º 90, 92 e 93, respetivamente reconhece que as referidas deliberações são nulas por falta de cumprimento do disposto no artigo 1432.º, n.º 1 e 6 do Código Civil.
Artigo 2.º Nessa medida, o demandado compromete-se a convocar regularmente até ao final do presente ano as assembleias de (….)
Artigo 3.º O demandado compromete-se ainda a apresentar os documentos referentes às contas do ano de 2013 aos demandantes (…)
Artigo 4.º Os documentos referentes às contas serão apresentados (…) nos seguintes locais: as contas relativas ao bloco … no átrio da entrada (…)
Artigo 5.º O demandado renuncia desde já ao cargo de administrador do condomínio com efeitos a 31 de Dezembro de 2014, (…), comprometendo-se ainda a não aceitar a recondução do cargo no ano de 2015, nem a candidatar-se ao mesmo no ano de 2016 (…)» (artigo 8.º da contestação e doc. fls. 73-76).
P)’ O autor propôs uma ação que correu termos no Tribunal de Gondomar, Comarca do Porto, sob o número 495/14.5 T8GDM, Instância Local, Seção cível – J3, que deu entrada em juízo a 29-10-2014, em que pedia a exoneração do administrador (artigo 9.º da contestação - fls. 77-80).
Q)’ Acabando por desistir do pedido (artigo 10.º da contestação e fls. 80).
R)’ Os anexos das atas não eram enviados aos condóminos, assim já era habitual (artigo 12.º da contestação).
S)’ Os avisos foram colocados no placard como eram habitualmente (artigo 13.º da contestação).
T)’ O réu nunca tinha sido administrador (artigo 16.º da contestação)
U)’ O réu, enquanto administrador, não respeitou todos os formalismos legais para a convocação das assembleias gerais e não ter procedido ao envio de todos os documentos mas tal verificou-se em relação a todos os condóminos e na sequência do que as anteriores administrações faziam (artigo 19.º da contestação – v. tb. alínea N)’ supra).
V)’ O autor nas assembleias gerais não levantou a questão do envio dos documentos por via digital (artigo 20.º da contestação).
X)’ A administração não tinha internet, nem computador, nem impressora (artigo 21.º da contestação).
Z)’ Os e-mails que o réu enviou foram a título de favor de uma cunhada que lhe facultou o acesso à internet e a possibilidade de digitalizar documentos dado que o réu não tinha sequer scanner (artigo 22.º da contestação).
A)’’ O réu só desde 3-07-2014 tem internet sua e a administração nunca teve (artigo 23.º da contestação e doc. fls. 182).
B)’’ O réu usou o seu computador pessoal para elaborar as atas e usou a internet da cunhada e o scâner para digitalizar os documentos que enviou por e-mail (artigo 24.º da contestação).
C)’’ As atas eram colocadas num placard no hall das torres e não eram enviados ao autor e aos demais (artigo 26.º da contestação).
D)’’ O réu vê-se desde Março de 2014, a responder a processos por questões formais, o que levou a que o réu visse agravada a sua situação de saúde com agravamento da sua depressão (artigo 32.º e 33.º da contestação e doc. de fls. 82).
E os seguintes Factos não provados:
1.º- Face à sua incapacidade visual, no início do ano de 2013, o autor pediu ao administrador do condomínio que lhe enviasse a documentação referente às assembleias de condóminos, comunicações e informações através de email, posto que desta forma consegue converter os documentos em linguagem através do programa Open Book ou em braille (artigo 8.º da petição inicial).
2.º- Dirigida aos condóminos, com o intuito de ser afixada, no placard da entrada do prédio como era habitual (artigo 9.º da petição inicial).
3.º- Na mesma semana enviou email com informações para outros condóminos (artigo 10.º da petição inicial).
4.º- “Em Julho” (artigo 15.º da petição inicial).
5.º- “Dia 21” e “de imediato” (artigo 17.º da petição inicial).
6.º- O autor mais uma vez informou o réu que para poder assinar primeiro teria que confirmar o conteúdo das atas, por pessoa da sua confiança, ou através do sistema informático do programa Open Book, que transmite diretamente a respetiva leitura para voz, dos documentos informatizados (artigo 18.º da petição inicial).
7.º- Em Junho o provedor para a deficiência, voltou a reiterar a necessidade do réu tratar de forma igual todos os condóminos evitando atos de discriminação, nomeadamente o facto do réu não resolver a questão da infiltração de águas (doc. 16 e artigo 27.º da petição inicial).
8.º- Em Julho de 2014, o Provedor do deficiente reuniu com o réu, no sentido de o sensibilizar para o facto de não poder tratar de forma desigual os condóminos, já que a questão seria facilmente superada com o envio digital de todos os documentos, viabilizando a conversão informática, ou então em braille, tendo-lhe ainda solicitado a entrega dos documentos que são parte integrante das atas e consubstanciam a prestação de contas (artigo 28.º da petição inicial);
9.º- Ao que o réu lhe respondeu que não tem provas da deficiência visual do autor e que para obter meios para diligenciar no sentido de o poder informar teria que estar na posse de um atestado de incapacidade (artigo 29.º da petição inicial).
10.º- Tal atitude da parte do réu demonstra a intenção deliberada de discriminar o autor (artigo 30.º da petição inicial).
11.º- O réu a 17 de Julho de 2014, enviou para o autor, a ata n.º 94, contudo incompleta, na medida em que não remeteu os anexos, nem as assinaturas (artigo 33.º da petição inicial e doc. 17).
12.º- “Retorquiu que não iria assinar o que não conseguia ler, qual não é o seu espanto (artigo 34.º da petição inicial).
13.º- Qual a intenção do réu ao perturbar o descanso do autor, quando já havia remetido a ata pelo correio? Mais uma vez humilhar o autor e confrontá-lo com a sua incapacidade (artigo 35.º da petição inicial).
14.º- Durante o dia andava agitado, apreensivo, pouco falava, quando falava era com frequência sobre a falta de respeito e a revolta que estava a sentir (artigo 39.º d apetição inicial).
15.º- “Janeiro” – artigo 5.º da contestação.
16.º- “Momento da sua realização e precedência relativamente aos condóminos” (artigo 6.º da contestação).
17.º- “Sabendo disso, porque fora indicado como testemunha, o autor” (artigo 9.º da contestação).
18.º- Os avisos mencionados não tinham a ver com a torre onde autor e réu viviam e não foram enviados por qualquer outra forma a ninguém (artigo 13.º da contestação).
19.º- Desconhecendo se este era provedor do deficiente, dado que este nunca se apresentou como tal mas como advogado que estaria a tratar de assuntos relativos ao condomínio, às convocatórias e ao não envio de documentos como consta do documento apresentado pelo autor (artigo 14.º da contestação).
20.º- As irregularidades ficaram a dever-se (…) e como os condóminos sabiam, e na sequência do que era habitual fazer nas administrações anteriores (artigo 16.º da contestação).
21.º- Em virtude de se ter acordado e considerando o número de condóminos determinou-se em assembleia geral há anos atrás que” “para diminuir os gastos” (artigo 26.º da contestação).
Ainda foi referido que “A matéria que não consta do elenco de factos provados e não provados constitui matéria de direito, conclusiva ou irrelevante para o objeto do processo, tendo-se, ainda, em atenção as regras de distribuição do ónus da prova. Consigno que considerei de conteúdo incompreensível a redação dada ao artigo 32.º da petição inicial”.
Da sentença recorreu o autor, apresentando as seguintes conclusões, depois de acatar o convite do relator a sintetizar as anteriores:
A» O Recorrente não se conforma com a decisão do Tribunal a quo,
B - Impugnando a matéria de facto, nos seguintes termos:
C - O Tribunal a quo deu como não provado os seguintes factos, que deveriam ter sido considerados como provados, considerando a prova produzida em Audiência de Julgamento:
- O Art.° 32° do petitório foi considerado incompreensível, contudo pelo menos a última oração da frase é absolutamente perceptível e deveria ter sido considerada como matéria dada como provada nos seguintes termos:
- "O Réu nunca apresentou junto da assembleia as cartas que recebeu da F…, nem transmitiu à assembleia a necessidade de transmitir as informações via digital ou em braille."
- Considerando para o efeito: o depoimento das testemunhas I…, a fls 12 no final do 1º parágrafo da motivação da sentença "O réu não comunicou em assembleia que precisava da informação por maiL" e
- O depoimento da testemunha, J…, a fls 13 da sentença, que na motivação refere "nunca foi falado ou pedido para enviar as atas por mail ao autor"
D - O Tribunal a quo, considerou não provado, o ponto 6 dos factos não provados, matéria que tem expressão na al. D'dos factos provados, que face à prova produzida deveria ter sido dado como provado nós seguintes termos: "Em de Dezembro de 2014, o réu deslocou-se á residência do Autor, pelas 21:30h, mais uma vez para recolher a assinatura do Autor cm como recebia a acta, este disse que não ia assinar porque não conseguia ler o que estava lá escrito, no dia 30 de Dezembro recebe pelo correio registado com AR, as actas que no dia anterior lhe haviam pedido para assinar."
- Prova que deveria ter sido considerada:
- depoimento da testemunha K…, aos minutos: 15:09h e 15:32;
- motivação da sentença constante a fls 11 "Da 2ª vez, em Dezembro de 2014, não assinou pois não conseguia ler."
- depoimento da testemunha L…, constante da sentença, "Uma vez foi com o réu a casa do autor com umas atas, para ver se ele queria assinar, o que faziam aos demais condóminos. Ele disse que não assinava".
E - Ao dar-se como provada a alínea D' nos termos expostos, terá que sé excluir dos factos não provados o ponto 12° “retorquiu que não iria assinar o que não conseguia ler”.
F - Existe uma contradição ostensiva entre os factos provados c os não provados, posto que em A)' da matéria dada como provada na sentença pode ler-se "Em Julho de 2014, G…, reuniu com o réu (artigos 28,'' da petição inicial e 14.° da contestação)." E em 8.° dos factos não provados, no inicio da frase pode ler-se exactamente o mesmo facto dado anteriormente como provado.
G - Existe também contradição no que diz respeito ao Doc. 16, junto a fls 49 e 50 dos autos:
- Tal documento é considerado para prova da matéria dada como provada em Z) onde pode ler-se "Em Junho, G…, advogado e provedor do deficiente, dirigiu ao réu comunicação com o seguinte teor «Em nome do meu constituinte, Exmo, Senhor B…, solicito que toda a documentação referente a assuntos do condomínio sejam remetidos para o email (...).Como V. Exa sabe o meu constituinte é uma pessoa cega mas, por isso mesmo, a lei protege- o. (...) É do conhecimento de V. Exa (…) no seu lugar de garagem infiltrações de água,(…) A Convocatória para a realização da assembleia a realizar no dia 20/21 de Junho p.p. além de não respeitar o formalismo próprio das assembleias extraordinárias, não está datada, (...). Atentamente, Porto 13 de Junho de 2014»
- E o mesmo doe, £ utilizado para dar como não provada a matéria constante do ponto 7 dos factos não provados (alegadamente por não se encontrar assinado);
- Este documento foi assertivamente considerado como provado, porque resulta do teor da matéria vertida para a contestação, a admissão do referido documento quando alega no art° 14º "O Réu deslocou-se ao escritório do Dr. G…, desconhecendo se este ara provedor do deficiente, dado que este nunca se apresentou como tal mas como advogado que estria a tratar de assuntos relativos ao condomínio, às convocatórias c ao não envio de documentos como consta do documento apresentado pelo autor. "
- Não se pode segmentar um documento e considerá-lo numa parte desconsiderando na outra. Ou seja, a parte em que o documento refere a discriminação também deve ser considerada, atendendo a que a prova deve ser considerada no seu todo em articulação com os seguintes depoimentos: Da testemunha K… m. - 22:22h ao minuLo 26:00h do seu depoimento, da Testemunha J… do m: I3:15h ao 14;QQh} quando refere que se tratou de um trabalho em equipa, da Testemunha M…, a partir do m:14:33h;
- Dos vários depoimentos resulta que quem acompanhou o Recorrente foi a Dra. J…, a Dr.a M… e o Dr. G…. Ora este processo resulta de uma equipa multidisciplinar, que para averiguarem quais os procedimentos a adoptar, apresentam os resultados das diligências.
- Não se trata de um depoimento indirecto, na medida cm que envolvem pessoas empenhadas na defesa dos direitos daqueles que se encontram em desvantagem, no caso, diminuído na obtenção da informação igual aos demais condóminos, que trabalham em grupo com o mesmo desiderato.
- Considerando esta questão no âmbito da distribuição do ónus da prova, aos actos de discriminação, aplica-se a Lei n.° 46/2006 de Agosto, que no artº 6.º inovadoramente nos apresenta uma distribuição do ónus da prova mitigado, ora se o Recorrido admite o doc. 16, porque se serve do mesmo para contra-alegar, para tentar demonstrar que apenas se trataria de um advogado em defesa do seu representado e não do provedor do deficiente, considerando ainda que o Recorrido, admite ainda a existência da reunião,
- O Julgador deve efectivamente usar de todos estes elementos, no sentido de concluir que o réu não afastou de forniu credível a imputação que é formulada» dando tal facto como provado.
- Não obstante o referido documento não estar assinado, o Tribunal a quo, deveria ter considerado, que no verso desse documento e como tal parte integrante do mesmo, consta a declaração do autor da missiva, Dr. G…, a dar conhecimento ao Autor via email (para que o mesmo acedesse à informação) dc que aquela era a carta enviada à administração, facto este que não foi contestado pelo Recorrido. Efectivamente como muitas vezes acontece, o subscritor, não assina a carta para ficar consigo, assina a que envia. Facto que deveria ter sido considerado pelo Tribunal a quo e não foi.
H- Concluindo quanto à matéria de facto: deve ser alterada a matéria dada como não provada nos pontos 6, 7, 8, 9, e 10 da sentença, considerando-se como matéria provada os seguintes factos:
- Em Junho o provedor para a deficiência, voltou a reiterar a necessidade do Réu tratar de forma igual todos os condóminos evitando actos de discriminação: enviando a carta com o seguinte teor: "Em nome do meu constituinte, Exmo. Senhor B…, solicito que toda a documentação referente a assuntos do condomínio sejam remetidos para o email B1…@hotmail.com. Como V. Exa sabe o meu constituinte é uma pessoa cega mas, por isso mesmo, a lei protege-o. O legislador criou mecanismos para prevenir e punir a discriminação em razão da deficiência, Assim, quem praticar discriminação para com as pessoas com deficiência responde civil e criminalmente por tal ilícito. É do conhecimento de V. Exa., o m/constituinte tem, no seu lugar de garagem infiltrações de água, causando-lhe não só transtorno como graves prejuízos. Razão pela qual, se essa Administração continuar a não atuar, seremos obrigados a utilizar os meios ao dispor, Por último, lembrarei que, conforme o artigo 1431°do Código Civil, a Assembleia de condóminos reúne ordinariamente duas vezes por ano, nas datas fixadas na citada norma ou em regulamento do próprio condomínio. Assembleias convocadas fora dessas datas serão extraordinárias obedecendo a Sua convocatória e funcionamento a formalismo próprio. A Convocatória para a realização da assembleia a realizar no dia 20121 de Junho p.p. além de não respeitar o formalismo próprio das assembleias extraordinárias, não está datada, pelo que, todas as suas deliberações - caso não esteja representado todo o capital - serão impugnáveis. Atentamente, Porto 13 de Junho de 2014, documento enviado ao riu pelo Dr. G…, (Teor do doe 16, junto a fls 49 e 50 dos autos);
"Em Julho de 2014, o Provedor do deficiente reuniu com o réu, no sentido de o sensibilizar para o facto de não poder tratar de forma desigual os condóminos, já que a questão seria facilmente superada com o envio digital de todos os documentos."
- O réu transmitiu ao provedor da deficiência que para obter meios para diligenciar no sentido de o poder informar teria que estar na posse de um atestado de incapacidade do Autor"
- Tal atitude da parte do réu demonstra a intenção deliberada de discriminar o Autor (retirando-se tal facto da matéria hão provada - ponto 10 da sentença).
I - Da sentença resulta ainda a Contradição da alínea C)' dos factos assentes, com o facto não provado no ponto 11º dos factos não provados,
- Deve pois ser excluído o ponto 11º dos factos posto que se trata de matéria confessada (artigo 19º da contestação) e do doc. 17, cfr. fundamentação,
J - Foi dado como provado e não devia porque está em contradição com a prova documental produzida, QUE:
- A)" O réu só desde 3/7/2014. tem internet sua e a administração nunca teve fatt° 23° da contestação e doe, fls 182).
- Da prova documental resulta que o Recorrido tem internet, senão vejamos:
- do teor da acta n." 92, com data de 18 de Janeiro de 2014, junta como doc. 12 e 13 do petitório, consta "No ponto 5 da acta pode ler-se a) Foi apresentada uma carta pelo Sr, B… com 6 pontos a discutir: 1º Ponto- Por qual o motivo não tinha sido afixado o seu pedido de autorização para efectuar as obras na sua fracção, para que todos os moradores tivessem conhecimento. Foi-lhe respondido que devido a problemas com o email iol só tive conhecimento mais tarde, quando o email iol foi reposto cm funcionamento na totalidade”.
- O Recorrido admite que recebeu o email do Recorrente a solicitar que toda a documentação condominial fosse enviada por email em Fevereiro de 2014. O email utilizado foi D…@iol.pt;
- Este email já havia sido utilizado pelo Recorrente, para enviar a comunicação de obras em 2013- email que o administrador recebeu conforme confirma, no teor da acta 92 - Alínea H) dos factos provados,
- Ou seja em Fevereiro de 2014 o Recorrido já dispunha de internet;
- A acta n.° 92, foi considerada para prova da matéria constante das alíneas Q) e R).
- Na Alínea T) da matéria assente resulta que, em 4/4/2014, o Autor foi informado via email da convocatória para a reunião a realizar a 26 de Abril dc 2014.
- A 3 de Maio de 2014 a acta foi enviada por email para o Autor, tendo sido utilizado o mesmo email acima identificado Cfr. fls 43 dos autos - Alínea U) da matéria assente,
- Consta ainda dos autos, a fls 115, acta n.9 89, não impugnada "Referente à conta na N… (…………), o administrador pode pedir a senha da internet para ter acesso a conferências do saldo e, fazer pagamentos por transferência a fornecedores”.
K - O facto de em Junho, o Recorrente, ter mudado para outra operadora e deixado de ter a conta iol, não colide com a ampla prova documental constante dos autos, que atesta que o Recorrido tinha acesso à internet, para estabelecer comunicações.
L - A prova produzida que deve ser considerada como um todo» sendo a documental muito mais segura.
M - Contudo mesmo a testemunhal, acaba por ser consentânea com a documental, posto que das declarações da testemunha J…, que por sinal reside no mesmo edifício, resulta que o Recorrido tinha acesso à internet, quando queria, pois provavelmente no período em que teve problemas, este pediu à cunhada para usar a sua internet.
N - Quando falamos de condomínio, consideramos os consortes que aí habitam, dizer que o condomínio não tem internet é falacioso e contradiz as regras de direito.
O - Termos em que a alínea A)" dos factos provados, deve ser excluída da matéria considerada como provada.
P - Na sentença devem, ainda ser considerados como provados os factos instrumentais, nos termos do disposto no nº 4 do artº 607º do CPC, que resultaram da discussão da matéria de facto e que são importantes para densificar a matéria de facto alegada pelo Recorrente, contribuindo para uma decisão de mérito que valoriza a verdade material, nomeadamente:
-"O réu foi eleito administrador em 2013, por unanimidade (cfr doc e declarações da testemunha L… (fls 13 da sentença);
-“O cargo de administrador era remunerado, com cerca de 120 euros por mês”.
-"O réu não comunicou em assembleia que necessitava de enviar a informação por mail para o Recorrente".
Q - O Tribunal a quo não faz uma apreciação crítica das provas, conforme acima se deduz no que se refere objectivamente à internet, dando excessiva importância à prova testemunhal, em detrimento da prova documental, muito mais segura na formação da convicção do julgador.
R - Apesar do comportamento do Recorrido estar directamente relacionado com o condomínio e ser no exercício dessas funções que o mesmo viola o dever de informação que sobre ele impende, relativamente aos condóminos, in casu, trata-se de uma responsabilidade pessoal, externa aos demais consortes, posto que passa por decisões que não foram transmitidas aos condóminos, nem deliberadas pelos mesmos em assembleia.
S - Com tal omissão o Recorrido violou o dispositivo artº 2º,nº 2, do Decreto Lei nº 268/94, contudo não prejudicou os condóminos, mas sim o condómino lesado, porque tem deficiência;
T - A responsabilidade do Recorrido é ainda deduzida pelo facto de não obstante as solicitações externas: da F…, do provedor do deficiente e do próprio Recorrente,
U - Não existir qualquer comportamento do Recorrido que traduza a vontade de fazer chegar a informação completa ao Recorrente, colocando-o numa situação de igualdade perante os demais condóminos.
V - O Recorrido foi alertado da desvantagem em que se encontrava o Recorrente e sensibilizado pela equipa que colaborou na recuperação e adaptação do Recorrente, W- A partir do momento em que estes alertas são concretizados, a atitude do Recorrido passa a ser dolosa,
X - Dolo também traduzido no facto de ter solicitado o atestado dc incapacidade ao Dr. G…, conforme supra se alude, considerando-se a alteração da matéria dc facto requerida.
Y - Esta reclamação perdurou meses, de acordo com o depoimento de Testemunha M… e D. K….
Z - A sensibilização para a deficiência, não surtiu efeito, perante o Recorrido, que manteve sua atitude.
AA - Conforme alega, que recorreu à internet da cunhada, também condómina, para certas comunicações, porque é que não recorreu ao mesmo procedimento para as outras, tal circunstância não é justificada??
BB - Ou mesmo porque não solicitou a outros condóminos colaboração, estamos na era das tecnologias em que com certeza, facilmente desbloquearia a situação caso subsistisse vontade nesse sentido.
CC - O Recorrido, violou o princípio da igualdade, consagrado no art.° 13P da CRP, no sentido negativo, na discriminação almeja-se um objectivo de igualdade material, que no caso seria a informação igual aos demais condóminos, que no caso se frustrou.
DD - Violou também o disposto no art.º 26 n.° 1 in fine da CRP e o art.° 71 da CRP.
EE - Atendendo à mitigação do ónus da prova, artº 6° da Lei da não discriminação, o visado, ou seja o Recorrido deveria ter demonstrado que não havia outra forma de informar o Recorrente aqui lesado, como principio dc boa fé, o que não fez, na medida em que dispunha de diversas alternativas, por exemplo a internet da cunhada, também condómina, ou no trabalho, conforme refere a testemunha J… ao minuto 12;34h, 12:40h, 3ó:34h, 36,42h, 36:53h
FF - Termos em que se conclui que o Recorrido violou o art.° 4º da Lei que pune a discriminação e como tal incorre na obrigação de indemnizar o Recorrente, de forma equitativa. Na medida em que a justificação apresentada não é objectivamente legitima para afastar a discriminação.
GG - Deve pois a sentença ser anulada e reformada, por forma a rectificarem-se as contradições apontadas, caso se entenda não ser possível, deve a sentença ser considerada nula, por violação do disposto no art/1 607 n.° 4, por referência ao preceituado no urt,ü 615° n,° 1 al.c).
NESTES TERMOS E NOS DEMAIS DE DIREITO APLICÁVEL, SEMPRE COM O MUI DOUTO SUPRIMENTO DE VOSSAS EXCELÊNCIAS, DEVE O PRESENTE RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE POR PROVADO, DEVENDO A DOUTA DECISÃO RECORRIDA SER REVOGADA E SUBSTITUÍDA POR OUTRA CONSIDERANDO-SE OS FACTOS ALEGADOS E APLICANDO-SE O PRINCÍPIO DO ÓNUS DA PROVA MITIGADO, EM CONFORMIDADE COM O QUE SUPRA SE ESGRIMIU FAZENDO-SE, ASSIM SERENA E SÃ JUSTIÇA.
O réu apresentou contra alegações concluindo pela manutenção do julgado.
Recebido o recurso nesta Relação e colhidos os vistos legais cumpre decidir.
*
II - DO RECURSO:
Os recursos são balizados pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal superior apreciar e conhecer de matérias que naquelas não se encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido e que o tribunal ad quem não aprecia razões ou argumentos, antes questões- artºs 627º, nº1, 635º e 639º, nºs 1 e 2, CPC, na redacção da Lei nº 41/2013, de 26.06.2013, aplicável ao presente processo por força do disposto no seu artº 8º.
No recurso é impugnada matéria de facto e decisão de direito e, quanto aquela são em abstracto cumpridos os ónus da impugnação da matéria de facto, nos termos dos artºs 637º, nº2, 639º, nºs 1 e 2 e 640º, nºs 1 e 2, NCPC.
Pode, ainda, entender-se que se argui a nulidade da sentença.
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II.1 - Nulidade da sentença:
Dado que as conclusões de recurso que inicialmente apresentou eram prolixas, obscuras e confusas, apesar do convite do relator contido no despacho de 14.09.2017, o apelante veio apresentar novas conclusões em que conclui pela revogação da sentença recorrida.
Na conclusão GG. o apelante conclui que “a sentença deve ser anulada e reformada, por forma a retificarem-se as contradições apontadas, caso se entenda não ser possível, deve a sentença ser considerada nula por violação do disposto no artº 607º, nº 4, por referência ao preceituado no artº 615º, nº 1, al. c)”, presumivelmente do CPC.
Ora, é evidente que está fora do âmbito da apreciação deste tribunal ad quem qualquer rectificação de lapso manifesto da sentença recorrida ou a sua reforma, que apenas poderiam ser requeridas ao tribunal ad quo nos termos e com os fundamentos dos artºs 613º, nº2, 614º, nºs 1 e 2 e 616º, nº 2, NCPC.
Quanto à nulidade da sentença, o apelante invoca a norma do artº 615º, nº 1, al. b), CPC, onde se prevê situações em que “os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível”, sem que nas conclusões ou sequer no corpo das alegações apresente o argumentário concreto em que funda qualquer um dos vícios previstos na norma legal.
Os vícios previstos no art.º 615º do Código de Processo Civil, geradores de nulidade da sentença, são vícios de cariz adjectivo ou processual e que afectam a decisão na sua estrutura processual, invalidando-a ou tornando-a incompleta ou incompreensível.
Citando o Acórdão do TRL de 9.7.2014 (Pedro Brighton), in www.dgsi.pt:
“O Prof. Castro Mendes (in “Direito Processual Civil”, Vol. III, pg. 297), na análise dos vícios da Sentença enumera cinco tipos:
- vícios de essência;
- vícios de formação;
- vícios de conteúdo;
- vícios de forma;
- vícios de limites.
Refere o mesmo Professor (in “Direito Processual Civil”, Vol. III, pg. 308), que uma Sentença nula “não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia”.
Por seu turno, o Prof. Antunes Varela (in “Manual de Processo Civil”, pg. 686), no sentido de delimitar o conceito, face à previsão do artº 668º do Código de Processo Civil (actual artº 615º), salienta que “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário (…) e apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença”.
Lebre de Freitas (in “Código de Processo Civil Anotado”, Vol. II, pgs. 668 e 669) considera que apenas a “falta de assinatura do juiz” constitui fundamento de nulidade, pois trata-se de “um requisito de forma essencial. O acto nem sequer tem a aparência de sentença, tal como não tem a respectiva aparência o documento autêntico e o documento particular não assinados”. A respeito das demais situações previstas na norma, considera o mesmo autor tratar-se de “anulabilidade” da sentença e respeitam “à estrutura ou aos limites da sentença”.
Ora, a sentença recorrida não padece de erro lógico entre os seus fundamentos de facto e de direito e a decisão de improcedência da acção, nem ocorre ambiguidade ou obscuridade concretamente invocada que tenha a virtualidade de tornar a decisão (no seu todo) ininteligível.
Assim, indefere-se a invocada nulidade da sentença.
*
II.2 - Questão de facto:
Face ao Novo Código de Processo Civil, é na sentença que o juiz declara quais os factos que julga provados e os que julga não provados.
A selecção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos conclusivos. Caso contrário, as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante- artº 607º, nº 4, NPCP.
A fundamentação é imposta constitucionalmente pelo art. 205º nº 1 da CRP de 1976.
A fundamentação cumpre uma dupla função: de carácter objectivo - pacificação social, legitimidade e autocontrole das decisões; e de carácter subjectivo - garantia do direito ao recurso e controlo da correcção material e formal das decisões pelos seus destinatários. Para cumprir a exigência constitucional, a fundamentação há-de ser expressa, clara e coerente e suficiente. Ou seja, não deve ser deixada ao destinatário a descoberta das razões da decisão; os motivos não podem ser obscuros ou de difícil compreensão, nem padecer de vícios lógicos; a fundamentação deve ser adequada à importância e circunstância da decisão.
Quanto aos factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, o juiz está sujeito a essa prova vinculada- artº 607º, nº 4, NCPC.
Quanto aos demais factos necessitados de prova, vigora o princípio da livre convicção do juiz face as restantes provas legalmente admissíveis pela forma que foram realizadas- artºs 607º, nº 5 e 410º, NCPC, sem prejuízo da relevância dos factos que não carecem de alegação e de prova face ao disposto no artº 412º NCPC.
Esta Relação deve alterar a decisão da matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente, impuserem decisão diversa-artº 662º, nº 1, NCPC.
Nesta matéria citemos os seguintes arestos do STJ sobre o alcance da tarefa deste Tribunal de recurso, instância que fixa em definitivo os factos provados.
Ac. STJ de 11.02.2011 (Abrantes Geraldes):
“Na sequência do que já constava do art. 712º do CPC de 1961, pretendeu-se que ficasse ainda mais claro que, sem embargo da correcção, mesmo a título oficioso, de determinadas patologias que afectam a decisão da matéria de facto e sem descurar as exigências que rodeiam o cumprimento do ónus de impugnação que recai sobre o recorrente e que estão concretizadas no art. 640º, a Relação, uma vez confrontada com a impugnação de determinados pontos de facto cuja prova tenha sido sustentada em meios de prova submetidos a livre apreciação do tribunal, deve proceder à reapreciação desses meios de prova e introduzir na decisão da matéria de facto as alterações que resultarem da convicção formada, em conjugação com outros elementos que estejam acessíveis.
Manteve-se, agora com mais vigor e clareza, a possibilidade de sindicar a decisão da matéria de facto quando assente em prova que foi oralmente produzida e tenha ficado gravada, afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para os casos de “erro manifesto” (como o Preâmbulo do Dec. Lei nº 329-A/95, de 12-12, deixava entender) ou de que não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação, como alguma – ainda que cada vez mais reduzida – jurisprudência das Relações tendia a defender.
(…)
Esta tem sido a tese adoptada pela doutrina em geral e que, além disso (ou mais do que isso), corresponde à jurisprudência reiterada expressa em numerosos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, em qualquer dos casos afirmando que o exercício dos poderes da Relação no que respeita à decisão da matéria de facto não pode quedar-se pela enunciação de argumentos marginais de pendor abstracto, impondo sempre a reapreciação dos meios de prova oralmente produzidos”.
Acórdão do STJ de 07.09.2017 (Tomé Gomes), que mitiga essa sindicância da forma que consta deste seu sumário:
“1. É hoje jurisprudência corrente, mormente do STJ, que a reapreciação, por parte do tribunal da 2.ª instância, da decisão de facto impugnada não se deve limitar à verificação da existência de erro notório, mas implica uma reapreciação do julgado sobre os pontos impugnados, em termos de formação, pelo tribunal de recurso, da sua própria convicção, em resultado do exame das provas produzidas e das que lhe for lícito ainda renovar ou produzir, para só, em face dessa convicção, decidir sobre a verificação ou não do erro invocado, mantendo ou alterando os juízos probatórios em causa.
2. No âmbito dessa apreciação, dispõe o Tribunal da Relação de margem suficiente para, com base na prova produzida, em função do que for alegado pelo impugnante e pela parte contrária, bem como da fundamentação do tribunal da 1.ª instância, ajustar o nível de argumentação probatória de modo a revelar os fatores decisivos da reapreciação empreendida.
3. Todavia, a análise crítica da prova a que se refere o n.º 4 do artigo 607.º do CPC, mormente por parte do Tribunal da Relação, não significa que tenham de ser versados ou rebatidos, ponto por ponto, todos os argumentos do impugnante nem que tenha de ser efectuada uma argumentação exaustiva ou de pormenor de todo o material probatório. Afigura-se bastar que dessa análise se destaquem ou especifiquem os fundamentos que foram decisivos para a formação da convicção do tribunal.
4. Também nada obsta a que o tribunal de recurso secunde ou corrobore a fundamentação dada pela 1.ª instância, desde que esta se revele sólida ou convincente à luz da prova auditada e não se mostre fragilizada pela argumentação probatória do impugnante, sustentada em elementos concretos que defluam da prova produzida, em termos de caracterizar minimamente o erro de julgamento invocado ou que, como se refere no artigo 640.º, n.º 1, aliena b), do CPC, imponham decisão sobre os pontos da matéria de facto diversa da recorrida.
5. O nosso regime de sindicância da decisão de facto pela 2.ª instância tem em vista não um segundo julgamento latitudinário da causa, mas sim a reapreciação dos juízos de facto parcelares impugnados, na perspetiva de erros de julgamento específicos, o que requer, por banda do impugnante, uma argumentação probatória que, no limite, os configure”.
Isto posto, alega o autor que “O Art.º 32º do petitório foi considerado incompreensível e como tal, a matéria constante do mesmo não foi considerada, contudo a última oração da frase é absolutamente perceptível e deveria ter sido considerada como matéria dada como provada nos seguintes termos:
O Réu nunca apresentou junto da assembleia as cartas que recebeu da F…, nem transmitiu (à assembleia) a necessidade de transmitir as informações via digital ou em braille.”
Conforme depoimentos das testemunhas I…, a fls 12 no final do primeiro parágrafo da motivação da sentença “O réu não comunicou em assembleia que precisava da informação por mail” e J…, a fls 13 da sentença, na motivação escreve-se “nunca foi falado ou pedido para enviar as atas por mail ao autor.”
Ora, por um lado, não há dúvidas que o autor apresenta no artigo 32º da petição inicial um discurso confuso e incompreensível, alegando diversos comportamentos imputados ao réu, o que poderia constituir imprecisão da exposição da matéria de facto que não foi suprida pelo senhor juiz ad quo no momento processualmente adequado- artº 590º, nº 3, NCPC. Cremos, no entanto que, mesmo aproveitando a última parte do ali alegado como pretende o autor apelante, enquanto alegação de matéria de facto, tal matéria não constitui factos essenciais da causa de pedir invocada pelo autor na presente acção para responsabilizar o réu no pagamento de uma indemnização por danos não patrimoniais. Somente tais factos essenciais devem ser alegados pelo autor, nos termos dos artºs 5º, nº 1 e 552º, nº 1, al. d), NCPC. Somente esses factos devem constar como provados ou não provados na sentença, não sendo o caso dos factos pretendidos incluir pelo apelante nos factos provados segundo as soluções de direito plausíveis. É totalmente irrelevante para a procedência da acção, face ao pedido e causa de pedir assente na responsabilidade pessoal do réu para com o autor e atenta a invocada deficiência visual deste, as invocadas comunicações à assembleia de condóminos do prédio em regime de propriedade horizontal onde o autor era morador e o réu era administrador do condomínio.
De todo o modo, assenta o apelante a impugnação da matéria de facto em causa, que pretende ver provada, em depoimentos de duas testemunhas sem localizar no registo digital de forma precisa esses depoimentos, antes com referência a trechos da fundamentação de facto da sentença. Assim, o recurso de impugnação da matéria de facto nessa parte é de rejeitar- artº 640º, nº 2, al. a), NCPC.
Assim, não se considera tal factualidade como provada e com interesse para a decisão da causa.
*
Alega o ré que “E- Ao dar-se como provada a alínea D' nos termos expostos, terá que se excluir dos factos não provados o ponto 12° “retorquiu que não iria assinar o que não conseguia ler”.
Ora, o apelante não conclui que a matéria do ponto 12º dos factos não provados deva ser considerada provada e assenta a impugnação da matéria de facto em causa em depoimentos de duas testemunhas sem localizar no registo digital de forma precisa esses depoimentos, antes com referência a trechos da fundamentação de facto da sentença. Assim, o recurso de impugnação da matéria de facto nessa parte é de rejeitar- artº 640º, nº 2, al. a), NCPC.
No entanto, importa que esta Relação dentro dos seus poderes de alteração da matéria de facto ao abrigo do disposto no artº 662º, nº 1, NCPC, dê uma correcta redacção ao ponto da matéria de facto em causa para que seja compreensível.
Assim, o facto provado D)` é o seguinte: “Em Dezembro de 2014, o réu deslocou-se à residência do Autor, pelas 21:30h, mais uma vez para recolher a assinatura deste em como recebia a ata e, no dia 30 de Dezembro, o autor recebe pelo correio registado com AR, as atas que no dia anterior lhe haviam pedido para assinar”.
Ao contrário do alegado pelo apelante, não existe contradição alguma entre o facto provado na alínea A)` e o facto não provado do ponto 8º da sentença. Com efeito, está provado que “Em Julho de 2014, G…, reuniu com o réu”- parte do alegado no artigo 28º da petição inicial e admitido no artº 14º da contestação- mas já não ficou provado o demais alegado nesse artigo 28º da petição inicial conforme se refere expressamente na motivação de facto da sentença: “A alínea A)’ baseou-se no alegado pelo autor e admitido pelo réu. Na verdade, nenhuma testemunha esteve presente na dita reunião, desconhecendo-se por isso e de todo o conteúdo da mesma” e “No que tange à factualidade não provada, há a destacar pontos 8.º - v. resposta à alínea A)”.
Mantêm-se, assim, os factos provados e não provados em causa.
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Entende o apelante que deve ser alterada a matéria de facto dada como não provada nos pontos 6 a 10 da sentença, considerando-se como matéria provada a seguinte:
-“Em Junho o provedor para a deficiência, voltou a reiterar a necessidade do Réu tratar de forma igual todos os condóminos evitando actos de discriminação: enviando a carta com o seguinte teor: "Em nome do mf constituinte, Exmo. Senhor B…, solicito que toda a documentação referente a assuntos do condomínio sejam remetidos para o email B1…@hotmail.com. Como V. Exa sabe o meu constituinte é uma pessoa cega mas, por isso mesmo, a lei protege-o. O legislador criou mecanismos para prevenir e punir a discriminação em razão da deficiência, Assim, quem praticar discriminação para com as pessoas com deficiência responde civil e criminalmente por tal ilícito. È do conhecimento de V. Exa., o m/constituinte tem, no seu lugar de garagem infiltrações de água, caus ando-lhe não só transtorno como graves prejuízos. Razão pela qual, se essa Administração continuar a não atuar, seremos obrigados a utilizar os meios ao dispor, Por último, lembrarei que, conforme o artigo J43L°do Código Civil, a Assembleia de condóminos reúne ordinariamente duas vezes por ano, nas datas fixadas na citada norma ou em regulamento do próprio condomínio. Assembleias convocadas fora dessas datas serão extraordinárias obedecendo a Sua convocatória c funcionamento a formalismo próprio. A Convocatória para a realização da assembleia a realizar no dia 20121 de Junho p.p. além de não respeitar o formalismo próprio das assembleias extraordinárias, não está datada, pelo que, todas as suas deliberações - caso não esteja representado todo o capital - serão impugnáveis. Atentamente, Porto 13 de Junho de 2014, documento enviado ao réu pelo Dr. G…, (Teor do doc. 16, junto a fls 49 e 50 dos autos)”;
- "Em Julho de 2014, o Provedor do deficiente reuniu com o réu, no sentido de o sensibilizar para o facto de não poder tratar de forma desigual os condóminos, já que a questão seria facilmente superada com o envio digital de todos os documentos."
- "O réu transmitiu ao provedor da deficiência que para obter meios para diligenciar no sentido de o poder informar teria que estar na posse de um atestado de incapacidade do Autor"
- Tal atitude da parte do réu demonstra a intenção deliberada de discriminar o Autor (retirando-se tal facto da matéria não provada - ponto 10 da sentença)”.
Neste último ponto tem o apelante razão, embora não pelos argumentos que invoca. Efectivamente, esta matéria alegada no artigo 30º da petição inicial é absolutamente conclusiva e daí que o tribunal a quo a ela não devesse responder, por não se tratar de um facto essencial para a decisão da causa - artº 607º, nº 4 NCP. Assim, retira-se esse ponto da matéria de facto dada como não provada na sentença.
Quanto aos pontos 6 a 9 da matéria dada como não provada na sentença.
Ficou provado que “P) Em Janeiro de 2014, o réu deslocou-se à residência do autor munido das atas n.ºs 90 e 92, solicitando a sua assinatura (artigo 17.º da petição inicial)”.
Não ficou provado que:
“6.º- O autor mais uma vez informou o réu que para poder assinar primeiro teria que confirmar o conteúdo das atas, por pessoa da sua confiança, ou através do sistema informático do programa Open Book, que transmite diretamente a respetiva leitura para voz, dos documentos informatizados (artigo 18.º da petição inicial)”.
7.º- Em Junho o provedor para a deficiência, voltou a reiterar a necessidade do réu tratar de forma igual todos os condóminos evitando atos de discriminação, nomeadamente o facto do réu não resolver a questão da infiltração de águas (doc. 16 e artigo 27.º da petição inicial).
8.º- Em Julho de 2014, o Provedor do deficiente reuniu com o réu, no sentido de o sensibilizar para o facto de não poder tratar de forma desigual os condóminos, já que a questão seria facilmente superada com o envio digital de todos os documentos, viabilizando a conversão informática, ou então em braille, tendo-lhe ainda solicitado a entrega dos documentos que são parte integrante das atas e consubstanciam a prestação de contas (artigo 28.º da petição inicial);
9.º- Ao que o réu lhe respondeu que não tem provas da deficiência visual do autor e que para obter meios para diligenciar no sentido de o poder informar teria que estar na posse de um atestado de incapacidade (artigo 29.º da petição inicial).
Na sentença recorrida fundamenta-se estas respostas deste modo” - Os pontos 5.º e 6.º decorreram de ausência de prova suficiente.
- O ponto 7.º decorreu do facto do documento de fls. 49 não se encontrar assinado, inexistir prova documental do seu envio, e quando muito poderá ter sido enviado por mandatário (“em nome do meu constituinte”).
- Pontos 8.º e 9.º - v. resposta à alínea A)’ (já vimos atrás o teor dessa resposta)”.
Quanto aos pontos 8 e 9 dos factos não provado, já referimos atrás que não existe contradição alguma entre o facto provado na alínea A)` e o facto não provado do ponto 8º da sentença. Com efeito, está provado que “Em Julho de 2014, G…, reuniu com o réu”- parte do alegado no artigo 28º da petição inicial e admitido no artº 14º da contestação- mas já não ficou provado o demais alegado nesse artigo 28º da petição inicial conforme se refere expressamente na motivação de facto da sentença: “A alínea A)’ baseou-se no alegado pelo autor e admitido pelo réu. Na verdade, nenhuma testemunha esteve presente na dita reunião, desconhecendo-se por isso e de todo o conteúdo da mesma” e “No que tange à factualidade não provada, há a destacar pontos 8.º - v. resposta à alínea A)”.
Assim, relativamente a estes pontos não resultou provado o teor da conversa que o Provedor do deficiente teve com o réu, dado que a ela nenhuma das testemunhas ouvidas declarou ter assistido e aquele Provedor não depôs como testemunha, mantendo-se esses factos como não provados.
Quanto ao ponto 7 dos factos não provados, é evidente que o que é matéria factual retirada do artigo 27 da petição inicial e resulta provado com base no documento de fls 49 é o que consta já da alínea Z) dos factos provados da sentença, ou seja “Em Junho de 2014, G…, advogado e provedor do deficiente, dirigiu ao réu comunicação com o seguinte teor «Em nome do m/constituinte, Exm.º Senhor B…, solicito toda a documentação referente a assuntos do condomínio sejam remetidos para o email (….). Com V. Ex.a sabe o m/constituinte é uma pessoa cega, mas por isso mesmo a lei protege-o. (…) É do conhecimento de V. Ex.ª, (…) no seu lugar de garagem infiltrações de água (…) A convocatória para a realização de assembleia a realizar no dia 20/21 de Junho p.p. além de não respeitar o formalismo próprio das assembleias extraordinárias, não está datada (…). Atentamente, Porto 13 de Junho de 2014» (artigo 27.º da petição inicial e fls. 49)”.
Retira-se esse ponto dos factos não provados.
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Quanto ao ponto 6 dos factos não provados da sentença “ O autor mais uma vez informou o réu que para poder assinar primeiro teria que confirmar o conteúdo das atas, por pessoa da sua confiança, ou através do sistema informático do programa Open Book, que transmite diretamente a respetiva leitura para voz, dos documentos informatizados (artigo 18.º da petição inicial)”, diz a sentença recorrida que decorrem da ausência de prova.
Tal facto é a sequência do provado na alínea P) dos factos provados “Em Janeiro de 2014, o réu deslocou-se à residência do autor munido das atas n.ºs 90 e 92, solicitando a sua assinatura (artigo 17.º da petição inicial)”.
Ora, das depoimentos prestados pelas testemunhas K…, esposa do autor e L…, vizinho de ambas as partes e morador no mesmo edifício e que dá ajuda à administração do condomínio, que ouvimos no registo áudio, conforme se expõe na motivação de facto da sentença recorrida não resulta que nessa data concreta o autor tivesse informado o réu que para poder assinar primeiro teria que confirmar o conteúdo das atas, por pessoa da sua confiança, ou através do sistema informático do programa Open Book. O que resulta provado é apenas que o autor não assinou as actas.
Mantem-se, assim, como facto não provado.
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Alega o apelante que na sentença resulta contradição da alínea C)' dos factos assentes, com o facto não provado no ponto 11, devendo ser excluído este ponto 11 dos factos não provados.
Ora, ficou provado que “C)’- O réu enviou para o autor a ata n.º 94, mas sem anexos (artigo 33.º da petição inicial)” e não provado que “11.º- O réu a 17 de Julho de 2014, enviou para o autor, a ata n.º 94, contudo incompleta, na medida em que não remeteu os anexos, nem as assinaturas (artigo 33.º da petição inicial e doc. 17)”.
Na fundamentação de facto da sentença diz-se que “o ponto 11.º decorreu de ausência de prova quanto à data de envio”.
Assim, é manifesto que o facto não provado que deve ali constar é que “O envio da ata referido em C`) ocorreu em 17.07.2014”.
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Alega o apelante que a facto provado da alínea A)" “O réu só desde 3/7/2014 tem internet sua e a administração nunca teve (artº 23° da contestação e doc. de fls 182)”, deve ser considerado não provado.
Invoca que “da prova documental resulta que o Recorrido tem internet:
- do teor da acta nº 92, com data de 18 de Janeiro dc 2014, junta como doe. 12 e 13 do petitório, consta "No ponto 5 da acta pode ler-se a) Foi apresentada uma carta pelo Sr. B… com 6 pontos a discutir: 1ºPonto- Por qual o motivo não tinha sido afixado o seu pedido de autorização para efectuar as obras na sua tracção, para que todos os moradores tivessem conhecimento. Foi-lhe respondido que devido a problemas com o email iol só tive conhecimento mais tarde, quando o email iol foi reposto cm funcionamento na totalidade.'
- O Recorrido admite que recebeu o email do Recorrente a solicitar que toda a documentação condominial fosse enviada por email em Fevereiro de 2014. O email utilizado foi D…@iol.pt;
- Este email já havia sido utilizado pelo Recorrente, para enviar a comunicação de obras em 2013- email que o administrador recebeu conforme confirma, no teor da acta 92 - Alínea H) dos factos provados,
- Ou seja em Fevereiro de 2014 o Recorrido já dispunha de internet;
- A acta n.° 92, foi considerada para prova da matéria constante das alíneas Q) e R)
Na Alínea T) da matéria assente resulta que, em 4/4/2014, o Autor foi informado via email da convocatória para a reunião a realizar a 26 de Abril dc 2014.
A 3 de Maio de 2014 a acta foi enviada por email para O Autor, tendo sido utilizado o mesmo email acima identificado cfr. fls 43 dos autos - Alínea U) da matéria assente,
Consta ainda dos autos, a fls 115, acta n.9 89, não impugnada "Referente à conta na N… (………), o administrador pode pedir a senha da internet para ter acesso a conferências do saldo e, fazer pagamentos por transferência a fornecedores.11
O facto de em Junho, o Recorrente, ter mudado para outra operadora e deixado de ter a conta iol, não colide com a ampla prova documental constante dos autos, que atesta que o Recorrido tinha acesso à internet, para estabelecer comunicações.
A prova produzida que deve ser considerada como um todo» sendo a documental muito mais segura.
Contudo mesmo a testemunhal, acaba por ser consentânea com a documental, posto que das declarações da testemunha J…, que por sinal reside no mesmo edifício, resulta que o Recorrido tinha acesso à internet, quando queria, pois provavelmente no período em que teve problemas, este pediu à cunhada para usar a sua internet”.
Ora, relativamente a essa pretensa prova testemunhal o apelante não cumpre o ónus previsto no artº 640º, nº 2, al. a), NCPC, pelo que não pode esta Relação sindicar nessa parte a decisão da primeira instância e a sua fundamentação de facto.
Quanto a qualquer confissão em depoimento de parte do réu relativa a esta matéria ela inexiste, dado que não foi objecto de assentada sem qualquer reclamação, conforme acta de julgamento de 31.03.2016- artº 463º NCPC e artºs 352º, 355º, nº2 e 356º, nº 2, Código Civil de 1966.
Acresce que o apelante não impugna o facto provado na alínea X`” A administração não tinha internet, nem computador, nem impressora (artigo 21.º da contestação)”. Quanto ao facto que resta a mais provado na alínea A`` ”O réu só desde 3/7/2014 tem internet sua…” resulta da carta da Vodafone junta a fls 182.
Acresce que esta factualidade assim provada não é contraditória com a provada nas alíneas H) e T) dos factos provados, nem com as declarações do réu transcritas na acta da assembleia de condóminos nº 92, com data de 18 de Janeiro dc 2014, junta como doe. 12 e 13 do petitório. O réu servia-se de uma conta de mail designada D…@iol.pt, durante um período de tempo que não ficou provado e cujo titular se ignora.
Mantem-se, assim, o facto provado sob a alínea A)``.
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Finalmente pretende ao apelante que se considerem, ainda, provados os factos instrumentais, nos termos do disposto no nº 4 do artº 607º do CPC, que resultaram da discussão da matéria de facto e que são importantes para densificar a matéria de facto alegada pelo Recorrente, contribuindo para uma decisão de mérito que valoriza a verdade material, nomeadamente:
-"O réu foi eleito administrador em 2013, por unanimidade (cfr doc e declarações da testemunha L… (fls 13 da sentença)”;
- “O cargo de administrador era remunerado, com cerca de 120 euros por môs”.
- "O réu não comunicou em assembleia que necessitava de enviar a informação por mail para o Recorrente";
Nenhum dos aludidos factos assumem a natureza de factos instrumentais que tivessem resultado da discussão da causa e que tivessem interesse para a prova dos factos essenciais em que assenta a causa de pedir da acção e daí que não sejam referidos na fundamentação de facto da sentença- artºs 5º, nº1, al. a) e 607º, nº 4, NCPC.
Assim, essa matéria fica excluída da factualidade provada.
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Em conclusão, quanto ao recurso da matéria de facto, mantem-se a matéria de facto que consta como provada na sentença com a seguinte alteração da redacção do ponto D)`, que passa a ser a seguinte: “Em Dezembro de 2014, o réu deslocou-se à residência do Autor, pelas 21:30h, mais uma vez para recolher a assinatura deste em como recebia a ata e, no dia 30 de Dezembro, o autor recebe pelo correio registado com AR, as atas que no dia anterior lhe haviam pedido para assinar”.
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II.3 - O Direito:
É mediante a apreciação da factualidade assim considerada provada na sentença e confirmada por este tribunal ad quem que deve proceder-se à subsunção jurídica, sendo certo que o tribunal não está adstrito à qualificação jurídica dos factos e à aplicação do direito invocada pelo autor/apelante- artº 607º, nº 3 ex vi artº 663º, nº 2, NCPC.
O autor pede a condenação do réu no pagamento de uma indeminização a título de danos morais em virtude de condutas por omissão do réu, enquanto administrador do Condomínio do prédio urbano em regime de propriedade horizontal, no período entre 18 de Janeiro de 2013 e 31 de Março de 2015, do qual o autor é condómino e onde reside.
Fundamenta a presente acção no instituto da responsabilidade civil extracontratual e no disposto na Lei nº 46/2006, de 28.08, que “Proíbe e pune a discriminação em razão da deficiência e da existência de risco agravado de saúde”, que foi regulamentada pelo DL nº 34/2007, de 15.02 e, no que agora interessa, entrou em vigor no dia seguinte ao da publicação no DR, Iª Série de 28.08- artº 17º da referida Lei.
Dispôe esta Lei que:
“Artigo 1.º
Objecto
1 - A presente lei tem por objecto prevenir e proibir a discriminação, directa ou indirecta, em razão da deficiência, sob todas as suas formas, e sancionar a prática de actos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por quaisquer pessoas, em razão de uma qualquer deficiência.
2 - O disposto na presente lei aplica-se igualmente à discriminação de pessoas com risco agravado de saúde.
Artigo 2.º
Âmbito
1 - A presente lei vincula todas as pessoas singulares e colectivas, públicas ou privadas.
2 - O disposto na presente lei não prejudica a vigência e a aplicação das disposições de natureza legislativa, regulamentar ou administrativa que beneficiem as pessoas com deficiência com o objectivo de garantir o exercício, em condições de igualdade, dos direitos nela previstos.
Artigo 3.º
Conceitos
Para efeitos da presente lei, entende-se por:
a) «Discriminação directa» a que ocorre sempre que uma pessoa com deficiência seja objecto de um tratamento menos favorável que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável;
b) «Discriminação indirecta» a que ocorre sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra seja susceptível de colocar pessoas com deficiência numa posição de desvantagem comparativamente com outras pessoas, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objectivamente justificado por um fim legítimo e que os meios utilizados para o alcançar sejam adequados e necessários;
c) «Pessoas com risco agravado de saúde» pessoas que sofrem de toda e qualquer patologia que determine uma alteração orgânica ou funcional irreversível, de longa duração, evolutiva, potencialmente incapacitante, sem perspectiva de remissão completa e que altere a qualidade de vida do portador a nível físico, mental, emocional, social e económico e seja causa potencial de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida;
d) «Discriminação positiva» medidas destinadas a garantir às pessoas com deficiência o exercício ou o gozo, em condições de igualdade, dos seus direitos.
Artigo 4.º
Práticas discriminatórias
Consideram-se práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência as acções ou omissões, dolosas ou negligentes, que, em razão da deficiência, violem o princípio da igualdade, designadamente:
a) A recusa de fornecimento ou o impedimento de fruição de bens ou serviços;
b) O impedimento ou a limitação ao acesso e exercício normal de uma actividade económica;
c) A recusa ou o condicionamento de venda, arrendamento ou subarrendamento de imóveis, bem como o acesso ao crédito bancário para compra de habitação, assim como a recusa ou penalização na celebração de contratos de seguros;
d) A recusa ou o impedimento da utilização e divulgação da língua gestual;
e) A recusa ou a limitação de acesso ao meio edificado ou a locais públicos ou abertos ao público;
f) A recusa ou a limitação de acesso aos transportes públicos, quer sejam aéreos, terrestres ou marítimos;
g) A recusa ou a limitação de acesso aos cuidados de saúde prestados em estabelecimentos de saúde públicos ou privados;
h) A recusa ou a limitação de acesso a estabelecimentos de ensino, públicos ou privados, assim como a qualquer meio de compensação/apoio adequado às necessidades específicas dos alunos com deficiência;
i) A constituição de turmas ou a adopção de outras medidas de organização interna nos estabelecimentos de ensino público ou privado, segundo critérios de discriminação em razão da deficiência, salvo se tais critérios forem justificados pelos objectivos referidos no n.º 2 do artigo 2.º;
j) A adopção de prática ou medida por parte de qualquer empresa, entidade, órgão, serviço, funcionário ou agente da administração directa ou indirecta do Estado, das Regiões Autónomas ou das autarquias locais, que condicione ou limite a prática do exercício de qualquer direito;
l) A adopção de acto em que, publicamente ou com intenção de ampla divulgação, pessoa singular ou colectiva, pública ou privada, emita uma declaração ou transmita uma informação em virtude da qual um grupo de pessoas seja ameaçado, insultado ou aviltado por motivos de discriminação em razão da deficiência;
m) A adopção de medidas que limitem o acesso às novas tecnologias.
Artigo 5.º
Discriminação no trabalho e no emprego
1 - Consideram-se práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência, para além do disposto no Código do Trabalho:
a) A adopção de procedimento, medida ou critério, directamente pelo empregador ou através de instruções dadas aos seus trabalhadores ou a agência de emprego, que subordine a factores de natureza física, sensorial ou mental a oferta de emprego, a cessação de contrato de trabalho ou a recusa de contratação;
b) A produção ou difusão de anúncios de ofertas de emprego, ou outras formas de publicidade ligada à pré-selecção ou ao recrutamento, que contenham, directa ou indirectamente, qualquer especificação ou preferência baseada em factores de discriminação em razão da deficiência;
c) A adopção pelo empregador de prática ou medida que no âmbito da relação laboral discrimine um trabalhador ao seu serviço.
2 - É proibido despedir, aplicar sanções ou prejudicar por qualquer outro meio o trabalhador com deficiência por motivo do exercício de direito ou de acção judicial contra prática discriminatória.
3 - As práticas discriminatórias definidas no n.º 1 não constituirão discriminação se, em virtude da natureza da actividade profissional em causa ou do contexto da sua execução, a situação de deficiência afecte níveis e áreas de funcionalidade que constituam requisitos essenciais e determinantes para o exercício dessa actividade, na condição de o objectivo ser legítimo e o requisito proporcional.
4 - Para efeitos de aplicação do disposto no número anterior deverá ser analisada a viabilidade de a entidade empregadora levar a cabo as medidas adequadas, em função das necessidades de uma situação concreta, para que a pessoa portadora de deficiência tenha acesso a um emprego, ou que possa nele progredir, ou para que lhe seja ministrada formação, excepto se essas medidas implicarem encargos desproporcionados para a entidade empregadora.
5 - Os encargos não são considerados desproporcionados quando forem suficientemente compensados por medidas promovidas pelo Estado em matéria de integração profissional de cidadãos com deficiência.
6 - A decisão da entidade empregadora relativa à alínea a) do n.º 1 e a aferição do disposto nos n.os 4 e 5 do presente artigo carecem sempre de parecer prévio do Secretariado Nacional para a Reabilitação e Integração das Pessoas com Deficiência (SNRIPD).
Artigo 6.º
Ónus da prova
1 - Cabe a quem alegar a discriminação em razão da deficiência fundamentá-la, apresentando elementos de facto susceptíveis de a indiciarem, incumbindo à outra parte provar que as diferenças de tratamento não assentam em nenhum dos factores indicados nos artigos 4.º e 5.º
2 - O disposto no número anterior não se aplica aos processos de natureza penal e contra - ordenacional.
Artigo 7.º
Indemnização
1 - A prática de qualquer acto discriminatório contra pessoa com deficiência confere-lhe o direito a uma indemnização, por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais.
2 - Na fixação da indemnização o tribunal deve atender ao grau de violação dos interesses em causa, ao poder económico dos autores das infracções e às condições da pessoa alvo da prática discriminatória.
3 - As sentenças condenatórias proferidas em sede de responsabilidade civil são, após trânsito em julgado, obrigatoriamente publicadas, a expensas dos responsáveis, numa das publicações periódicas diárias de maior circulação do país, por extracto, do qual devem constar apenas os factos comprovativos da prática discriminatória em razão da deficiência, a identidade dos ofendidos e dos condenados e as indemnizações fixadas.
4 - A publicação da identidade dos ofendidos depende do consentimento expresso destes manifestado até ao final da audiência de julgamento.
5 - A publicação tem lugar no prazo de cinco dias a contar da notificação judicial”.
Desde logo, face à relação jurídica invocada na causa de pedir da acção está afastada uma relação de trabalho ou emprego entre o autor e o réu, pelo que o disposto no artº 5º da referida Lei não é aqui aplicável.
Pela sua clareza argumentativa na decisão de direito transcrevemos a sentença recorrida:
Nos termos do artigo 483.º, n.º 1 do Código Civil «Aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação». A leitura do artigo 483.º do Código Civil mostra os vários pressupostos que condicionam a obrigação de indemnizar imposta ao lesante. É necessário que haja um facto voluntário do agente, que esse facto seja ilícito, que haja um nexo de imputação do facto ao lesante, que à violação do direito subjetivo ou da lei sobrevenha um dano, e, por fim, que haja um nexo de causalidade entre o facto praticado pelo agente e o dano sofrido pela vítima (cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Volume I, 4.º Edição, pág. 471 e Antunes Varela, Das Obrigações em Geral, Volume I, 7.ª Edição, página 516).
Prescreve o artigo 486.º do Código Civil que as «simples omissões dão lugar à obrigação de reparar os danos, quando independentemente dos outros requisitos legais, havia por força da lei ou do negócio jurídico, o dever de praticar o ato omitido».
Nos termos do artigo 487.º do Código Civil é ao lesado que incumbe provar a culpa do lesante, salvo os casos de presunção legal de culpa.
No caso vertente, as ações ou omissões imputadas ao réu não podem deixar de ser relacionadas com o regime previsto na lei para a administração de condomínio, mormente os deveres do administrador de condomínio e, bem assim, com o princípio da não discriminação em razão da deficiência.
O… identifica os seguintes deveres do administrador do condomínio: acessibilidade, diligência, imparcialidade e informação (v. A assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal, Almedina, pág. 300). No que tange, em particular, ao dever de informação refere aquela autora que o administrador tem um dever de dar informação verdadeira, completa e elucidativa, a todo o tempo, sobre qualquer assunto respeitante à administração das partes comuns do edifício, quer perante a assembleia de condóminos, quer perante cada condómino individualmente considerado. Este dever de informação, a que pode corresponder um direito de consulta por parte dos condóminos, não se confunde com o dever de prestar contas ou com o dever de responder pelo cumprimento das suas funções, pois estes são obrigações do administrador só para com a assembleia de condóminos.
As funções do administrador estão ainda elencadas no artigo 1436.º do Código Civil. A convocação da assembleia obedece aos requisitos previstos no artigo 1432.º do Código Civil, sendo que as deliberações têm de ser comunicadas a todos os condóminos ausentes, por carta registada com aviso de receção, no prazo de 30 dias.
No que se refere ao princípio da igualdade ou da não discriminação. Com a publicação da Lei n.º 46/2006, de 28 de Agosto, o legislador pretendeu «prevenir e proibir a discriminação, direta ou indireta, em razão da deficiência, sob todas as suas formas, e sancionar a prática de atos que se traduzam na violação de quaisquer direitos fundamentais, ou na recusa ou condicionamento do exercício de quaisquer direitos económicos, sociais, culturais ou outros, por quaisquer pessoas, em razão de uma qualquer deficiência», regime que é aplicável «à discriminação de pessoas com risco agravado de saúde» – seu art.º 1.º.
Por sua vez, o seu art.º 3.º define esses conceitos nos seguintes termos:
a) «Discriminação direta» a que ocorre sempre que uma pessoa com deficiência seja objeto de um tratamento menos favorável que aquele que é, tenha sido ou venha a ser dado a outra pessoa em situação comparável;
b) «Discriminação indireta» a que ocorre sempre que uma disposição, critério ou prática aparentemente neutra seja suscetível de colocar pessoas com deficiência numa posição de desvantagem comparativamente com outras pessoas, a não ser que essa disposição, critério ou prática seja objetivamente justificado por um fim legítimo e que os meios utilizados para o alcançar sejam adequados e necessários;
c) «Pessoas com risco agravado de saúde» pessoas que sofrem de toda e qualquer patologia que determine uma alteração orgânica ou funcional irreversível, de longa duração, evolutiva, potencialmente incapacitante, sem perspetiva de remissão completa e que altere a qualidade de vida do portador a nível físico, mental, emocional, social e económico e seja causa potencial de invalidez precoce ou de significativa redução de esperança de vida.
No seu artigo 4.º são elencadas, a título meramente exemplificativo, algumas dessas práticas discriminatórias contra pessoas com deficiência.
Prevê no seu artigo 7.º o direito à indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais, por parte da pessoa que foi vítima do ato discriminatório, devendo o tribunal, na fixação do seu montante, atender ao grau de violação dos interesses em causa, ao poder económico dos autores das infrações e às condições da pessoa alvo da prática discriminatória – n.ºs 1 e 2.
Finalmente, de acordo com o seu artigo 6.º, compete ao autor da prática do ato discriminatório provar que as diferenças de tratamento não assentam em nenhum dos fatores mencionados nos artigos 4.º e 5.º, cabendo a quem alegar a discriminação em razão da deficiência fundamentá-la, apresentando elementos de facto suscetíveis de a indiciarem (cfr. Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23-02-2016, www.dgsi.pt, que aqui sigo de perto).
Trata-se de uma densificação, ao nível do direito ordinário, do princípio da não discriminação, consagrado, pela positiva, enquanto princípio da igualdade, na Constituição da República Portuguesa – no artigo 13.º é estabelecido tal princípio de forma geral e no artigo 71.º é ele reafirmado no que respeita aos cidadãos portadores de deficiência.
Este princípio da igualdade consagrado na nossa Constituição ‘tem de ser interpretado, não como uma igualdade meramente formal, mas sim como um princípio dinâmico, em que devem ser tratadas de forma desigual as situações que são desiguais, sendo a igualdade um objetivo a atingir e não um ponto de partida.
É que o princípio da igualdade, como escreve Gomes Canotilho e Vital Moreira in Constituição da República Portuguesa Anotada, Vol. I, 4ª ed., Coimbra Editora, 2007, págs. 336-337, «é um dos estruturantes do sistema constitucional global, conjugando dialeticamente as dimensões liberais, democráticas e sociais inerentes ao conceito de Estado de direito democrático e social (artigo 2.º).».
«Na sua dimensão liberal, consubstancia a ideia da igual posição de todas as pessoas, independentemente do seu nascimento e do seu status, perante a lei, geral e abstrata, considerada subjetivamente universal em virtude da sua impessoalidade e da indefinida repetibilidade na aplicação.».
Sobre o sentido e alcance constitucional do princípio da igualdade, escreve António Cortês, in Jurisprudência dos Princípios, Ensaio sobre os Fundamentos da Decisão Jurisdicional, Universidade Católica Portuguesa, págs. 266 e segs: «Entre os princípios primeiros da juridicidade encontramos o princípio da igualdade. O princípio da igualdade determina que "o que é igual seja tratado de forma igual e o que é diferente seja tratado de forma diferente na medida da diferença". E, “(… O princípio surge aqui como uma expressão imediata dos princípios da não contradição e da razão suficiente. Ele exige que o sistema jurídico seja congruente e que as diferenciações sejam materialmente justificadas. Quem defenda, num determinado contexto, um certo efeito jurídico para uma determinada situação deve estar disposto a aplicar o mesmo efeito a todas as situações semelhantes sob todos os aspetos relevantes que surjam num contexto análogo. O princípio exige pois que o que é igual seja tratado de forma igual, salvo se houver uma razão materialmente justificada (mérito, necessidade, tempo, etc.) para não o fazer”.
No caso vertente, desde logo se verifica que o autor é um cidadão portador de deficiência física. Assim, perante a factualidade apurada resta analisar, de entre as ações e omissões do réu, aquelas que poderão constituir tratamento discriminatório.
Do teor da alínea H) não é possível concluir ter havido tratamento discriminatório no exercício das funções de administrador. Desde logo, não se relaciona com qualquer dever de informação a que estivesse obrigado o réu perante o autor/condómino. Acresce que, foi invocada uma explicação pelo réu que ficou exarada em ata de assembleia de condóminos. Por último, nada permite concluir que tal atitude, ainda que tivesse sido deliberada, tivesse sido tomada “em razão da deficiência”, como o exige a citada Lei n.º 46/2006.
No que se refere à alínea I), importa salientar que desconhecendo-se a data de tal facto, também se desconhece se foi posterior ou anterior ao pedido do autor de envio dos documentos por correio electrónico.
O teor das alíneas P) a T) também não configuram qualquer tratamento discriminatório em razão da deficiência.
Importa, antes, analisar o teor dos factos apurados e vertidos nas alíneas L) a O), U), e C)’. No que se refere ao não envio por mail das “autorizações para festas”, que foi afixada no placard de entrada do prédio, trata-se de uma omissão, relativamente à qual não poderá deixar de ser alheia a circunstância de o réu só a partir de Julho ter internet sua, sendo que a administração do condomínio nunca teve, tendo até então usado o computador de uma cunhada a título de favor. Poderão estas omissões ser consideradas práticas discriminatórias “em razão da deficiência”? É certo que no plano dos princípios, seria desejável ter um administrador mais diligente, designadamente que procedesse ao envio por mail, e no formato acessível ao autor, portador de deficiência, de todos os documentos com pertinência para a vida do condomínio. Mesmo que o não fizesse habitualmente para os demais condóminos, posto que não seriam portadores de deficiência visual. Contudo, afigura-se que as omissões referidas nas alíneas M) e O) consubstanciam, quando muito, a não adoção de medidas de discriminação positiva, mas não qualquer prática discriminatória em razão da deficiência, que possa fundar qualquer obrigação de indemnização por danos morais.
O mesmo se refira quanto ao vertido nas alíneas U) e C)’, ou seja, ao envio incompleto das atas das assembleias, as quais foram enviadas por mail, mas sem “anexos”. Mais uma vez é de concluir que não estamos perante uma prática discriminatória em razão da deficiência, tanto mais, que os anexos das atas não eram enviados aos demais condóminos (alínea R)’), sendo ainda certo que tal comportamento se insere num conjunto de irregularidades que o réu terá cometido no âmbito da administração de condomínio (v. O’) e que atingiu também outros condóminos”.
Concordamos com a sentença recorrida na fundamentação de direito transcrita.
Como referem Pires de Lima, Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol.I, p.443 ss, Coimbra Editora, 1982, são cinco os pressupostos que se encontram por detrás da eclosão da responsabilidade aquiliana, cuja verificação é cumulativa, pelo que, consequentemente, se um deles falha, queda-se por completo a aplicação deste instituto, a saber: a existência de um facto voluntário do agente; que esse facto seja ilícito; que exista um nexo de imputação do facto ao lesante; que se produza um dano e ainda que se verifique um nexo de causalidade entre esse dano e o facto praticado pelo agente.
Quando se alude a facto voluntário do agente não se pretende restringir os factos humanos relevantes em matéria de responsabilidade civil aos atos queridos, isto é, aos casos em que o agente tenha prefigurado mentalmente os efeitos da sua conduta e agido em função deles (não é, pois, necessário ser intencional, uma vez que só quanto a factos dessa índole tem cabimento a ideia de ilicitude e o requisito da culpa), bem pelo contrário, porquanto muitos são os casos em que não existe qualquer representação mental, mas que, todavia, ninguém contesta a obrigação de indemnizar.
Deste modo, facto voluntário significará somente facto objetivamente controlável ou dominável pela vontade (quer por ação, quer por omissão), ficando apenas fora do domínio da responsabilidade civil os factos causados por causas de força maior, vis absoluta ou pela atuação irresistível de circunstâncias fortuitas.
Por seu turno, a ilicitude traduz a reprovação da conduta do agente “(…) no plano geral e abstrato em que a lei se coloca, numa primeira aproximação da realidade”[1], podendo revestir duas formas: na violação do direito de outrem ou de qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, sem que se verifique uma causa justificativa.
Naquela primeira forma incluem-se, especialmente, as ofensas de direitos absolutos, de que constituem exemplo os direitos reais (artigos 1251.º e seguintes, do Código Civil) e os direitos de personalidade (artigo 70.º, do Código Civil).
Na segunda forma de ilicitude, trata-se da infração de leis que, embora protejam interesses particulares, não conferem aos respetivos titulares um direito subjetivo a essa tutela, bem como das leis que, tendo também ou até principalmente em vista a proteção de interesses coletivos, não deixam de atender aos interesses particulares subjacentes (de indivíduos ou de classes ou de grupos de pessoas), incluindo-se aqui, portanto, as normas que visam estabelecer limites socialmente adequados àquelas atividades que, sendo socialmente toleráveis e, até, necessárias, são, pela sua natureza intrínseca, potenciadoras de situações de perigo de lesão de bens jurídicos10, não havendo dúvidas de que uma dessas atividades é precisamente a circulação rodoviária, tendo o legislador gizado normas que, mediante a criação de proibições de perigo abstrato, têm por função fixar um limite de risco permitido.
São, pois, três os requisitos da ilicitude por violação de disposição legal, a saber: que à lesão dos interesses do particular corresponda a violação de uma norma legal; que a tutela dos interesses particulares figure, de facto, entre os fins da norma violada; e, que o dano se tenha registado no círculo de interesses privados que a lei tutelar.
De igual forma, quanto à imputação dos factos ao agente, é necessário que este seja imputável (cfr. artigo 488.º, do Código Civil) e, para além disso, que tal facto lhe possa ser subjetivamente imputado a título de dolo ou de mera culpa.
Na verdade, agir com culpa significa atuar em termos de a conduta merecer a reprovação e a censura do direito, o que significa que só haverá lugar à obrigação de indemnizar quando, em face das circunstâncias do caso, se conclua que o agente podia e devia ter agido de outro modo.
São duas as modalidades da culpa: o dolo, em que o agente representa o resultado danoso, praticando o ato com a intenção de produzi-lo (sendo o ato praticado com a intenção malévola de produzi-lo), ou apenas aceitando reflexamente esse efeito ou ainda correndo o risco de ele se produzir; e a negligência ou mera culpa, em que o resultado danoso se deve à falta de cuidado, ao simples desleixo, imprudência ou inaptidão (falta de cuidado ou imperícia).
Em regra, a responsabilidade civil assenta na culpa do agente, sendo certo que só nos casos expressamente previstos na lei (ou seja, excecionalmente), é que tal se efetiva independentemente da culpa do agente. In casu, não há lei que preveja a responsabilidade objectiva do réu perante o autor atenta a relação jurídica invocada.
A culpa é apreciada, na falta de outro critério legal, pela diligência de um bónus pater familiae (bom pai de família), em face das circunstâncias de cada caso, como determina o artigo 487.º, n.º 2, do Código Civil, devendo o grau de diligência exigível ao agente ser aferido de acordo com a diligência de um homem normal, medianamente sagaz, prudente, avisado e cuidadoso.
Sublinhe-se que a referência às “circunstâncias de cada caso” significa que o próprio padrão a ter em conta varia em função do condicionalismo da hipótese e designadamente do tipo de atividade em causa, logo, para se concluir se houve ou não culpa, deve conjeturar-se como o homem padrão teria agido dentro do condicionalismo concreto da hipótese.
É ainda conditio sine qua non da responsabilidade civil, a verificação de um dano juridicamente entendido como a diminuição duma situação favorável que estava protegida pelo Direito.
Dever-se-á tratar-se, assim, de um facto tenha causado prejuízo a alguém, prejuízo esse que pode ser patrimonial ou não patrimonial, consoante seja, ou não, passível de quantificação ou avaliação pecuniária e indemnizável ou apenas compensável.
Por último, há que referir o nexo de causalidade entre o facto e o dano, relativamente ao qual é necessário recorrer ao critério definido no artigo 563.º, do Código Civil, que consagra a teoria da causalidade adequada, nos termos da qual a obrigação de indemnizar só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão, isto é, se não fosse a intervenção do lesante.
Por esse motivo, podemos afirmar que uma dada conduta é causa adequada de um dano sempre que este, em geral e abstrato, surja como uma consequência normal e previsível daquela, ou seja, exige-se uma ligação estreita entre a conduta do agente e o dano, de modo a afirmar perentoriamente ter sido aquela causa adequada da produção deste.
O autor não demonstrou, com factualidade suficiente que tivesse sido alvo de práticas discriminatórias por parte do réu a título de culpa deste no relacionamento administrador/condómino que fundamentem a obrigação de indemnizar por danos não patrimoniais.
As provadas e apontadas omissões por banda do réu, enquanto administrador do Condomínio e para com ao autor não configuram práticas discriminatórias em razão da deficiência deste (deficiência visual), que importem obrigação de indemnizar o autor por danos não patrimoniais.
Finalmente, sempre se dirá que falece o nexo de causalidade adequada entre os comportamentos omissivos do réu e os danos que resultaram provados sob as alíneas E)`a J)`.
Com efeito não resultou provado que a instabilidade, ansiedade e agravamento da saúde psíquica do autor decorresse directa e necessariamente das referidas omissões do réu no âmbito dessa relação condómino/administrador do Condomínio, de acordo com o disposto no artº 563º CC[2], na interpretação adoptada pela nossa lei da formulação negativa da teoria da causalidade adequada, segundo a qual o facto que actuou como condição do dano deixa de ser considerado como causa adequada, quando para a sua produção tiverem contribuído decisivamente circunstâncias anormais, atípicas, excepcionais, extraordinárias ou anómalas, que intercederam no caso concreto[3].
Como se refere na fundamentação do AcUJ nº 3/16, a respeito da problemática anunciada do dano e do nexo de causalidade:
“ Está consensualizado que, ali, naquele dispositivo (art. 563º do CC), se adoptou a teoria da causalidade adequada, segundo a qual, não é suficiente que o facto do agente tenha sido, em determinado caso concreto, condição sine qua non do dano. É ainda necessário que, em abstracto ou em geral, isto é, segundo o curso natural das coisas, o facto seja causa adequada desse mesmo dano. O que quer dizer que é necessário que o dano seja uma consequência normal ou típica do facto, isto é, sempre que verificado este, se possa prever o dano como consequência natural ou como efeito provável dessa verificação”.
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III - DECISÃO:
Nestes termos, ACORDAM os juízes nesta Relação em julgar improcedente a apelação e confirmar a sentença recorrida.
Custas pelo apelante.

Porto, 23.11.2017
Madeira Pinto
Carlos Portela
José Manuel Araújo de Barros
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[1] In ANTUNES VARELA cit., página 562.
[2] vide Pires de Lima, Antunes Varela, Código Civil Anotado, vol.I, p.547, Coimbra Editora, 1982.
[3] Vide Acórdãos do STJ de 01.07.2013 (Azevedo Ramos) e de 02.11.2010 (Sebastião Póvoas).