Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5741/13.0YYPRT-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ IGREJA DE MATOS
Descritores: PROPRIEDADE HORIZONTAL
DESPESAS DE CONDOMÍNIO
RESPONSABILIDADE
ADQUIRENTE DE BEM
FRACÇÃO AUTÓNOMA
Nº do Documento: RP201607075741/13.0YYPRT-A.P1
Data do Acordão: 07/07/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 726, FLS.71-76)
Área Temática: .
Sumário: I – Nos termos do art. 1424 n.º 1, do Código Civil, “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”.
II – Esta obrigação de pagamento constitui uma obrigação “propter rem”, inerente à coisa em si e não à pessoa do seu proprietário pelo que a mesma se transmite necessariamente para o adquirente do direito real.
III – Esta característica de “ambulatoriedade”, porém, não ocorre designadamente quando estejam em causa prestações destinadas a custear despesas habituais originadas pela utilização de serviços ou pelo consumo de bens necessários a assegurar a funcionalidade normal do condomínio.
IV – Assim quando o condómino vende a sua fracção autónoma, estando em atraso no pagamento das contribuições devidas ao condomínio, não se deve onerar o adquirente da fracção autónoma com uma despesa que não corresponde a nenhuma vantagem real para si.
V – Relativamente ao pagamento de despesas extraordinárias – reparação de elevadores ou reabilitação do prédio – em que ocorreu no momento que mediou entre a deliberação de realizar essas obras e a conclusão da respectiva empreitada uma transmissão de uma fracção por um determinado condómino, aqueles custos, salvo acordo em contrário, devem ser suportados, na proporção correspondente, pelo novo condómino tendo em conta que será este a retirar proveito do gozo do bem ao qual foi incorporada aquela beneficiação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: 5741/13.0YYPRT-A.P1
Acordam no Tribunal da Relação do Porto

Recorrente(s): B…;
Recorrido(s): Condomínio do Edifício ….
Comarca do Porto - Porto - Instância Central – 1ª Secção de Execução

I - Relatório
Por apenso aos autos de execução instaurados pelo exequente Condomínio do Edifício …, deduziu o executado B…, oposição à execução, alegando, em resumo, não ser responsável pelo pagamento das obras de reabilitação aprovadas em assembleia geral realizada em 23/05/2011, dado ter adquirido a fração “B” em data posterior (01/06/2011); não ter sido convocado para as assembleias de condóminos posteriores a essa data e as atas nunca lhe foram enviadas, pelo que não tomou conhecimento dos orçamentos aprovados.
Alega ainda ser credor do condomínio em montante ainda não apurado tendo reclamado tais pagamentos em processo judicial pendente, devendo os presentes autos ser suspensos nos termos do artigo 272º, do Código de Processo Civil, até que seja proferida decisão no referido processo.
O exequente contestou, pugnando pela manutenção dos títulos dados à execução, sustentando, também em resumo e no essencial, que a quota extraordinária aprovada na assembleia de condóminos realizada em 23/05/2011 só se venceu 30 dias após o envio da cópia da ata, pelo que, tendo esta sido remetida ao condómino em 15/06/2011, a responsabilidade pelo seu pagamento pertence ao executado; todas as convocatórias e cópias das atas foram enviadas para o domicílio do embargante (na fração) por carta registada com aviso de receção, não tendo o mesmo indicado outro domicílio. Manifestou ainda oposição à requerida suspensão.
Terminados os articulados foi dispensada a audiência prévia e procedeu-se ao saneamento da causa, no âmbito do qual foi indeferida a requerida suspensão da instância.
Tramitado o processo, após audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença a qual, na parte dispositiva, ora se transcreve na íntegra:
Assim, em face de todo o exposto, decide-se julgar improcedentes, por não provados, os embargos de executado deduzidos pelo embargante B…, determinando-se, em consequência, o prosseguimento da ação executiva intentada pelo embargado Condomínio do Edifício ….
Custas pelo embargante (artigo 527º, nº 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo do que foi decidido em sede de apoio judiciário.
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Inconformado com este despacho, dele recorreu B…, apresentando as respectivas alegações e formulando as conclusões que agora se indicam:
1. A decisão proferida não faz a mais correta interpretação e aplicação das regras jurídicas pertinentes e aplicáveis a este caso concreto.
2. Em face desta decisão, o Meretíssimo Juiz entendeu serem da responsabilidade do Recorrente quotas extraordinárias de obras de cobertura, escadas e terraço e de reparação de elevadores deliberadas e aprovadas na Assembleia Geral de 23/05/2011, altura em que o Recorrente ainda não era proprietário.
3. O Recorrente adquiriu a fracção autónoma no dia 01/06/2011, pelo que não é responsável pelo pagamento das quotas extraordinárias aprovadas em momento anterior à sua aquisição (Assembleia Geral de 23/05/2011).
4. A deliberação foi tomada em tempo em que eram proprietários da fracção - os Srs. C… e D… – e não o aqui Recorrente, pelo que são aqueles os responsáveis pelo pagamento das quotas extraordinárias.
5. Conforme estabelece o douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 24/10/2011, “…naquela altura quem era condómino era o alienante da fracção. Ora, representando tais despesas a contrapartida de um uso ou fruição das partes comuns do edifício que lhe couberam, é, por conseguinte, de considerar que só a este deva competir o respectivo pagamento.“
6. E estabelece o mesmo Acórdão que “No caso das despesas resultantes da conservação de fachadas ou conservação de elevadores seria injusto fazê-las recair sobre o adquirente da fracção…”
7. O título executivo dado à execução não pode vincular o Recorrente, atual proprietário da fracção, já que quando ocorreu tal assembleia e por via dela “nasceu” aquele título – o qual identifica o credor e o devedor, como decorre do disposto no art.º 53.º nº 1 do CPC – quem eram os condóminos titulares da fracção eram os alienantes, Srs. C… e D,,, e não o Recorrente.
8. A obrigação dos condóminos vence-se no momento da formação da vontade coletiva ocorrida em Assembleia Geral.
9. É de reconhecer que o executado/recorrente não consta como obrigado no título dado à execução consubstanciado pela ata da assembleia de condóminos de 23/05/2011, motivo pelo qual é de reconhecer a sua ilegitimidade para ser demandado com base no mesmo (art. 53º nº1 do CPC).
10. Devem pois as conclusões constantes das alegações de recurso proceder totalmente, revogando-se, em consequência a decisão ora recorrida.
Termina peticionando que o presente recurso seja julgado totalmente procedente, por provado, em função das conclusões em que se alicerça, ordenando-se assim a revogação da decisão recorrida.
Contra-alegou o Condomínio exequente, terminando por requerer a confirmação da sentença apelada.
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II – Questões a Apreciar
A única questão a apreciar nos autos diz respeito ao apuramento do condómino responsável pelo pagamento de despesas extraordinárias aprovadas pelo Condomínio de um dado prédio em caso de transmissão de propriedade dessa fracção em momento posterior à aprovação dessa despesa pela Assembleia-Geral do Condomínio.

III - Factos provados
Os factos provados são os seguintes:
1 – O exequente Condomínio do Edifício …, intentou, em 03/10/2013, contra o executado B…, a ação executiva de que estes autos são apenso, dando à execução as atas de assembleias de condóminos e os documentos apresentados com o requerimento executivo, dos quais existem cópias digitalizadas no histórico eletrónico do processo executivo, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido;
2 – Na parte destinada à exposição dos factos do respetivo requerimento executivo, para além dos juros moratórios, o exequente peticionou o pagamento pelo referido executado, na qualidade de proprietário da fração “B” do prédio sito na Travessa …, nº…, no Porto, das seguintes quantias:
- 2011: € 746,71 (quotas condomínio de 01/06/2011 até final do ano);
- 2011: € 525,27 (quotas extra reparação elevadores);
- 2011: € 3.475,76 (quotas extra para obras de reabilitação);
- 2012: € 1.109,56 (quotas condomínio);
- 2012: € 847,63 (quotas extra para obras - canalização);
- 2012: € 853,26 (quota extra para obras - telhado 3º andar);
3 – O executado B… adquiriu a C… e mulher D…, por título de compra e venda outorgado, em 01/06/2011, na 1ª Conservatória do Registo Predial da Maia, a propriedade da fração autónoma designada pela letra “B” do prédio descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob 1352/20080410 (freguesia de …), referente a uma habitação no rés-do-chão esquerdo, lugar de garagem para um automóvel e arrumo na cave, com entrada pelo nº … da Travessa …, no Porto, a que corresponde a permilagem de 117 (cfr. documentos de fls. 5 a 12 do processo executivo, cujo conteúdo aqui se dão por integralmente reproduzidos);
4 – Em assembleia de condóminos realizada em 23/05/2011 (ata nº 6/2011), foi deliberado, para além do mais, aprovar o orçamento do condomínio para o ano de 2011, no montante de € 10.010,92, valor que se mantém desde a ata nº 3/2009, cabendo ao proprietário da fração “B” o pagamento da quantia de € 320,02 (€ 281,12 quota + € 38,90 fundo comum de reserva);
5 – Na mesma assembleia de condóminos (ata nº 6/2011), foi ainda aprovado o orçamento para as obras de reabilitação da cobertura, incluindo caixa de escadas/casa das máquinas, terraço do 4ºandar, e respetivo murete, deliberando-se ainda incluir nestas obras o terraço do 3º esquerdo, bem como o orçamento para a reparação dos elevadores e fiscalização das referidas obras, cabendo ao proprietário da fração “B” o pagamento global de € 4.001,03, a pagar no prazo máximo de 30 dias a contar do envio da referida ata (cfr. ata de fls. 24 a 25, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
6 – A cópia da referida ata nº 6/2011, foi remetida a C…, através de carta registada com aviso de receção expedida em 15/06/2011, tendo sido recebida pelo próprio em 16/06/2011 (cfr. documentos de fls. 26 e 26v, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
7 – Em 21/07/2011, o executado remeteu ao exequente a carta registada com aviso de receção nos termos constantes de fls. 27, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido, através da qual, para além do mais, comunicou que, a partir do dia 01/06/2011, passou a ser o proprietário da fração “B” e solicitando ainda diversas informações sobre a administração do condomínio, a distribuição do orçamento pelos condóminos e a ocupação das partes comuns do edifício;
8 – Em 07/12/2011, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção com o teor de fls. 28 a 29, à qual anexou cópia da ata nº 6/2011, não tendo a mesma sido recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 28 a 32, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
9 – Em 09/12/2011, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção convocando-o para a assembleia de condóminos a realizar no dia 20/12/2011, a qual não foi pelo mesmo recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 33 a 34, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
10 – Em assembleia de condóminos realizada em 20/12/2011 (ata nº 7/2011), foi deliberado, para além do mais, aprovar o orçamento destinado à reparação da coluna geral de abastecimento de água, cabendo ao proprietário da fração “B” o pagamento da quantia de € 847,63, devendo o mesmo ser efetuado até ao final do mês de fevereiro de 2012;
11 – Na mesma assembleia de condóminos foi ainda deliberado que “os pagamentos trimestrais, constituídos pela quota do condomínio e parcela para o Fundo Comum de Reserva, sejam pagos até ao dia 10 dos meses de Janeiro, Abril, Julho e Outubro de cada ano (…) Que seja aplicada uma pena pecuniária para pagamentos fora do prazo, no montante de 1/3 da quota trimestral para pagamentos com atraso até 1 mês, de 2/3 para atrasos até 2 meses e igual ao valor da prestação trimestral para pagamentos com atrasos superiores a 2 meses” (cfr. ata de fls. 17 a 19, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
12 – Em 17/01/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada contendo cópia da ata nº 7/2011 (cfr. documentos de fls. 35 a 36, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
13 - Em 28/03/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção convocando-o para a assembleia de condóminos a realizar no dia 09/04/2012, a qual foi recebida por terceira pessoa em 11/04/2012 (cfr. documentos de fls. 37 a 38, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
14 - Em assembleia de condóminos realizada em 09/04/2012 (ata nº 1/2012), foi deliberado, para além do mais, aprovar o orçamento do condomínio para o ano de 2012, no montante de € 10.010,92, valor que se mantém desde a ata nº 3/2009, cabendo ao proprietário da fração “B” o pagamento da quantia de € 277,39 (€ 241,21 quota + € 36,18 fundo comum de reserva);
15 – Da referida ata foi ainda feito constar que a administração do condomínio havia sido contactada pelo gabinete de mediação da Junta de Freguesia de … a pedido de B…, para tratar de assuntos relacionados com o R/C esquerdo e o Condomínio, tendo-se realizado uma reunião no dia 7 de março, onde foram esclarecidas várias questões, tendo sido ainda abordada a eventualidade de um acordo de pagamento dos valores em dívida pelo referido condómino, tendo a administração respondido que muito dificilmente os condóminos o aceitariam; como posteriormente não foi recebido qualquer pedido formal de acordo, foi o assunto considerado esclarecido e encerrado (cfr. ata de fls. 20 a 23, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
16 - Em 03/05/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção contendo cópia da ata nº 1/2012, não tendo a mesma sido recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 38v a 41v, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
17 - Em 10/05/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção convocando-o para a assembleia de condóminos a realizar no dia 23/05/2012, a qual não foi recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 42 a 43, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
18 – Na assembleia de condóminos realizada em 23/05/2012 (ata nº 2/2012), mantendo-se as obras que foram aprovadas nas atas nºs 6 e 7 de 2011, atendendo à insolvência da empresa E…, foi deliberado transferir os respetivos contratos para a empresa F… (cfr. documentos de fls. 43v a 44, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
19 - Em 19/06/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção contendo cópia da ata nº 2/2012, não tendo a mesma sido recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 45 a 46, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
20 - Em 25/06/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção convocando-o para a assembleia de condóminos a realizar no dia 06/07/2012, a qual não foi recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 46v a 47v, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
21 - Na assembleia de condóminos realizada em 06/07/2012 (ata nº 3/2012), foi aprovado o orçamento para a realização das obras de reabilitação do telhado da cobertura do 3º andar, cabendo ao proprietário da fração “B” o pagamento de € 853,26, a pagar no prazo máximo de duas semanas a contar do envio da referida ata (cfr. ata de fls. 48 a 49, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
22 - Em 26/07/2012, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção contendo cópia da ata nº 3/2012, não tendo a mesma sido recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 49v a 50v, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
23 - Em 21/03/2013, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção convocando-o para a assembleia de condóminos a realizar no dia 03/04/2013, a qual não foi recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 51 a 52v, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
24 - Em assembleia de condóminos realizada em 03/04/2013 (ata nº 1/2013), foi deliberado, para além do mais, alterar o período de pagamento para mensal até ao dia 10 de cada mês e aprovar o orçamento do condomínio para o ano de 2013, no montante de €10.972,20, cabendo ao proprietário da fração “B” o pagamento mensal da quantia de € 117,68 (€106,98 quota + € 10,70 fundo comum de reserva);
25 – Na referida ata de assembleia de condóminos nº 1/2013, foi feito consignar o débito dos condóminos, registando-se em relação à fração “B” os seguintes valores:
- 2011: € 746,71 (quotas de condomínio);
- 2011: € 525,27 (quotas extra reparação de elevadores);
- 2011: € 3.475,76 (quotas extra para obras – reabilitação do prédio);
- 2012: € 1.109,56 (quotas condomínio);
- 2012: € 847,63 (quotas extra para obras - canalização);
- 2012: € 853,26 (quota extra para obras - telhado 3º andar) (cfr. documento de fls. 53 a 54, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
26 - Em 02/05/2013, o exequente remeteu ao executado carta registada com aviso de receção contendo cópia da ata nº 1/2013, não tendo a mesma sido recebida por não ter sido reclamada (cfr. documentos de fls. 54v a 55v, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
27 – G… intentou contra a Administração do Condomínio do Prédio Sito À …, nº …, Porto, a ação com processo comum nº 1686/13.1TJPRT, que correu os seus termos pela Secção Cível da Instância Local do Porto, J2, tendo a referida demandada sido absolvida da instância por decisão proferida em 05/12/2014, com fundamento na exceção dilatória de ilegitimidade da autora (cfr. documento de fls. 56 a 58, cujo conteúdo aqui se dá por integralmente reproduzido);
28 – A referida fração autónoma designada pela letra “B” desde 1999 foi sempre habitada, ininterruptamente, por G… e pelo executado, seu filho, tendo este estado ausente durante os últimos 2/3 anos por se encontrar no estrangeiro.

IV - Fundamentação de direito
O presente recurso encontra-se, naturalmente, delimitado no seu objecto pelas alegações e conclusões do apelante.
Deste modo, como bem se recorda em sede de contra-alegações, está em causa tão-somente a condenação do embargante na quantia de €4.001,03 para pagamento de obras de reparação da cobertura, escadarias, terraço e elevadores, aprovada na Assembleia de Condóminos que teve lugar em 23.05.20111, sabendo-se que o demandante comprou a sua respectiva fração apenas em 01.06.2011.
Na alegação deduzida, invoca o recorrente que, não sendo proprietário da fração na data da Assembleia de Condóminos, não aprovou as obras e o seu custo, cabendo o pagamento desta despesa extraordinária aos anteriores condóminos, proprietários à data da deliberação.
Em termos de enquadramento legal, dispõe o art. 1424 n.º 1, do Código Civil que “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”.
Por sua vez, conceptualmente importa realçar que esta obrigação de pagamento constitui uma obrigação “propter rem”, inerente à coisa em si e não à pessoa do seu proprietário. Por isso, entende a doutrina que a obrigação “propter rem” se transmite necessariamente para o sub-adquirente do direito real (vide Henrique Mesquita em “Obrigações Reais e Ónus Reais, Almedina, 1990, página 316).
Porém, como todos entendem, nem sempre será assim: “tratando-se de prestações destinadas a custear despesas habituais originadas pela utilização de serviços ou pelo consumo de bens necessários a assegurar a funcionalidade normal do condomínio, seria injusto fazê-las recair sobre o adquirente da fracção. Por um lado, este não disporia (…) de quaisquer elementos objectivos que revelassem ou indiciassem a existência de dívidas. Por outro lado, tais prestações representam, em regra, na economia do instituto, a contrapartida de um uso ou fruição (das partes comuns do edifício) que couberam ao alienante e, por conseguinte, só a este deve competir o respectivo pagamento” (obra citada, pg. 321).
Naturalmente que, ao longo dos meses, o anterior proprietário foi fruindo da fracção no período temporal em que se iam originando as despesas a pagar (electricidade, água, limpeza, etc.) pelo que deve ser dele a responsabilidade pelo seu pagamento. Como escreve Sandra Passinhas, “Assembleia de Condóminos e o Administrador na Propriedade Horizontal”, Almedina, pág. 310: “Coloca-se uma questão importante quando o condómino vende a sua fracção autónoma, estando em atraso no pagamento das contribuições devidas ao condomínio. Parece-nos que não se deve onerar o adquirente da fracção autónoma com uma despesa que ele muitas vezes desconhece, e que não corresponde a nenhuma vantagem real para si.”
Contudo, a situação em concreto em apreço é bem outra.
Como se fundamenta na decisão sob escrutínio estas despesas extraordinárias foram destinadas à realização de obras, “as quais foram efetuadas em data posterior à aquisição da fração, pelo que só o património do executado ficou enriquecido com a execução das mesmas”.
Ou seja, importa proceder a uma distinção que não se atenha apenas ao momento temporal em que uma dada despesa foi aprovada mas que, em concreto, apure quem aproveita pelos benefícios que, sinalagmaticamente, resultam desse custo.
No momento que mediou entre a deliberação de realizar as obras e a conclusão da respectiva empreitada, houve a transmissão de uma fracção por um determinado condómino. Se assim suceder, e salvo acordo em contrário, será o novo condómino o responsável pela liquidação da parte do preço imputado à fracção de que é titular. Isto porque se considera, em linha com o expendido nas doutas contra-alegações, que esta obrigação “propter rem”, tem como característica, em casos como este, a “ambulatoriedade”; entender de outro modo seria imputar um custo a alguém que não tira proveito do gozo do bem, entretanto por si já alienado, relativamente a um benefício que entretanto ao mesmo foi incorporado.
Poderá contrapor-se que as despesas em apreço resultam da própria degradação do imóvel as quais demandam obras que reponham funcionalidades entretanto diminuídas, reabilitando o prédio e reparando os elevadores. Mas, sopesando este argumento, a que aludem as alegações, dúvidas não restam que, no final, quem mais aproveita dessas obras é aquele que for proprietário aquando da conclusão das mesmas; dir-se-á que só a ele, aliás, as mesmas servem e que, presumivelmente, ele e demais condóminos sempre as teriam de realizar.
Pelo exposto, conclui-se pela improcedência do recurso, confirmando-se integralmente a douta sentença apelada.
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Sumariando o decidido (art. 663.º, nº7 do Código do Processo Civil):
I – Nos termos do art. 1424 n.º 1, do Código Civil, “salvo disposição em contrário, as despesas necessárias à conservação e fruição das partes comuns do edifício e ao pagamento de serviços de interesse comum são pagas pelos condóminos em proporção do valor das suas fracções”.
II – Esta obrigação de pagamento constitui uma obrigação “propter rem”, inerente à coisa em si e não à pessoa do seu proprietário pelo que a mesma se transmite necessariamente para o adquirente do direito real.
III – Esta característica de “ambulatoriedade”, porém, não ocorre designadamente quando estejam em causa prestações destinadas a custear despesas habituais originadas pela utilização de serviços ou pelo consumo de bens necessários a assegurar a funcionalidade normal do condomínio.
IV – Assim quando o condómino vende a sua fracção autónoma, estando em atraso no pagamento das contribuições devidas ao condomínio, não se deve onerar o adquirente da fracção autónoma com uma despesa que não corresponde a nenhuma vantagem real para si.
V – Relativamente ao pagamento de despesas extraordinárias – reparação de elevadores ou reabilitação do prédio – em que ocorreu no momento que mediou entre a deliberação de realizar essas obras e a conclusão da respectiva empreitada uma transmissão de uma fracção por um determinado condómino, aqueles custos, salvo acordo em contrário, devem ser suportados, na proporção correspondente, pelo novo condómino tendo em conta que será este a retirar proveito do gozo do bem ao qual foi incorporada aquela beneficiação.

V – Decisão
Nestes termos, decide-se julgar improcedente o recurso deduzido, confirmando-se integralmente a sentença sob escrutínio.
Custas pelo recorrente.

Porto, 7 de Julho de 2016
José Igreja Matos
Rui Moreira
Tomé Ramião