Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
167/16.6GAVGS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MOREIRA RAMOS
Descritores: CRIME DE CONDUÇÃO DO VEÍCULO EM ESTADO DE EMBRIAGUEZ
CRIME DE DESOBEDIÊNCIA
Nº do Documento: RP20170125167/16.6GAVGS.P1
Data do Acordão: 01/25/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIMENTO PARCIAL
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 706, FLS. 164)
Área Temática: .
Sumário: Comete apenas o crime de desobediência o condutor que conduz com TAS superior a 1.20 g/l o veículo automóvel, antes do decurso do período de 12 hora em inobservância da advertência/ proibição imposta pelo artº 154º2 CE.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 167/16.6 GAVGS.P1

Tribunal da Relação do Porto
(2ª Secção Criminal – 4ª Secção Judicial)

Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:
I – RELATÓRIO:

No processo supra identificado, por sentença datada de 06/07/2016, depositada na mesma data, ulteriormente retificada por despacho datado de 29/09/2016, e no que ora importa salientar, decidiu-se condenar o arguido B…:

• pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, na pena de sete meses de prisão e na pena acessória de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de dez meses;

• pela prática de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292º, nº 1, do Código Penal, na pena de oito meses de prisão e na pena acessória de conduzir veículos motorizados de qualquer categoria pelo período de onze meses;

• pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348º, nºs. 1 e 2, do Código Penal, com referência ao artigo 154º, nºs 1 a 3, do Código da Estrada, na pena de cinco meses de prisão;

• e, em cúmulo jurídico das sobreditas penas principais, condená-lo na pena única de quinze meses de prisão, efetiva.

Inconformado com a sobredita decisão, veio o arguido interpor recurso da mesma nos termos constantes de fls. 49 a 52 (via fax, endereçado por correio eletrónico e junto a fls. 57 a 60 e com original a fls. 66 a 72), aqui tidos como integralmente especificados, tendo formulado, a final, as seguintes conclusões (transcrição):

1- Violou a sentença recorrida o artº 348 nº 1 do Código Penal.

2- Diz aquela norma que “quem faltar à obediência devida á ordem ou mandado legítimo, regularmente comunicado…”

3- No caso dos autos a ordem dada ao recorrente não foi clara nem regularmente comunicada.

4- Não se pode considerar regularmente comunicada a ordem em causa quando o agente, o militar da GNR diz. “você não agarre no carro enquanto nós aqui estivermos”.

5- A prova junto aos autos não é suficiente para consubstanciar o tipo legal de crime previsto no artº 348 do Código Penal.

6- Não assenta a douta sentença recorrida em prova irrefutável capaz de afastar qualquer dúvida acerca da sua justeza/legalidade.

7- O principio in dubio pro reo aplica-se em processo penal sem qualquer limitação, estabelecendo-se que, na decisão de factos incertos a dúvida favorece sempre o arguido.

8- Deve pois o recorrente ser absolvido do crime de desobediência.

9- Violou a sentença recorrida, também o artº 71 do Código Penal ao aplicar aos dois crimes de condução de veículo sob o efeito do álcool a mais gravosa das penas, em cerca de ¾ da sua moldura, o que se revela excessivo atendendo aos critérios definidos na norma acabada de referir, devendo o recorrente ser condenado em cada um destes crimes abaixo do meio da respetiva moldura.

10- O tribunal ordenou a realização de relatório social para determinação da sanção e tendo este ido no sentido da aplicação de medida com execução na comunidade, a Mmª Juiz “a quo” não lhe fazendo qualquer referencia também não deu acolhimento a esta indicação.

11- Violou a sentença recorrida o artº 44 nº 2 al - e) do Código Penal ao não permitir que o recorrente possa cumprir a sua pena em regime de permanência na habitação uma vez que tem a seu cargo o pai, pessoa com mais de 90 anos.

12- Deve ao recorrente ser permitido cumprir a sua pena em regime de permanência na habitação, pelas razões supra expostas.

O recurso foi regularmente admitido (cfr. fls. 77).

O Ministério Público respondeu nos termos constantes de fls. 84 a 91, aqui tidos como reproduzidos, tendo concluído que o recurso deveria ser julgado improcedente e mantida a sentença recorrida.

Nesta instância, a Ex.ma Procuradora-Geral Adjunta emitiu o parecer junto a fls. 98, aqui tido como renovado, através do qual subscreveu a posição contida na resposta e, em consonância, preconizou também a improcedência do recurso e a confirmação da decisão impugnada.

No cumprimento do artigo 417º, nº 2, do Código de Processo Penal, nada mais foi aduzido.

Após exame preliminar, colhidos os vistos e realizada a conferência, cumpre decidir, nada obstando a tal.
II – FUNDAMENTAÇÃO:

a) a decisão recorrida:

No que ora importa destacar, a sentença recorrida é do teor seguinte (transcrição):

Na audiência de julgamento, com interesse para a causa, provaram-se os seguintes factos:

1. No dia 14-05-2016, cerca das 01h 42m, B… conduzia o veículo automóvel ligeiro de passageiros com a matrícula ..-..-CC na EN …, Vagos.

2. Nas circunstâncias de tempo, modo e lugar referidos em 1, B… foi submetido a exame de pesquisa de álcool no sangue através do método do ar expirado, tendo-se verificado que conduzia com uma taxa de álcool no sangue registada de 1,67g/l, a que corresponde a taxa de álcool no sangue apurada de 1,58g/l, descontado o erro máximo admissível.

3. Nesse seguimento, B… foi advertido pelo militar da GNR que não podia conduzir veículos a motor pelo período de 12 horas e, que se o fizesse, incorria na prática de um crime de desobediência, advertência que compreendeu e de que ficou ciente.

4. Não obstante tal advertência, B…, naquele mesmo dia, pelas 03h 15m, na Estrada …, …, Vagos, conduziu o mencionado veículo.

5. Submetido a exame de pesquisa de álcool no sangue através do método do ar expirado, tendo-se verificado que conduzia com uma taxa de álcool no sangue registada de 1,58g/l, a que corresponde a taxa de álcool no sangue apurada de 1,50g/l, descontado o erro máximo admissível.

6. O arguido conhecia as características do veículo que conduzia e a natureza pública da via onde circulava, mais sabendo que tinha ingerido bebidas alcoólicas antes de ter iniciado a condução, o que fez por duas vezes, pelo que, admitiu ser portador daquelas taxas de alcoolémia no sangue, não se abstendo, ainda assim, de conduzir nessas circunstâncias.

7. Mais sabia que estava proibido de conduzir veículos pelo período de 12 horas e, não obstante, decidiu proceder à condução na via pública, incumprindo a ordem que lhe havia sido comunicada por autoridade competente e com legitimidade para o fazer, e da qual ficou bem ciente.

8. Agiu o arguido sempre de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que as suas condutas eram proibidas e que, por isso, incorria em responsabilidade criminal.

9. O arguido é divorciado e tem um filho maior de idade com o qual não mantém contactos desde o ano de 2006.

10. O arguido frequentou a escolaridade em Portugal até completar o 4º ano de escolaridade, tendo iniciado percurso laboral com 11 anos de idade como ajudante de pedreiro.

11. Com 14 anos de idade emigrou com a mãe e as irmãs para França, reagrupando o agregado familiar com o pai, tendo frequentado a escola até ao 12º ano e concluído um curso técnico de mecânica, após o que reintegrou o mercado de trabalho numa oficina de automóveis, situação que se manteve até ao ano de 1985.

12. Aos 18 anos de idade contraiu matrimónio que se manteve até ao ano de 1985, e, após o divórcio entrou em fase de dependência alcoólica que perdurou até data não concretamente apurada, seguida de abstinência com recaída em agosto de 2015.

13. O arguido encontra-se sem atividade laboral regular há cerca de 15 anos, subsistindo de trabalhos esporádicos na área da mecânica de automóveis e tratores, auferindo quantia mensal variável e não concretamente apurada.

14. O arguido beneficia de rendimento social de inserção no montante mensal de €83,63.

15. O arguido pernoita em anexos pertencentes à casa do pai, sendo que faz as refeições em casa do pai.

16. O arguido despende mensalmente entre €14,00 e €17,00 em medicação.

17. O arguido já foi condenado na pena de:

a) 100 dias de multa, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º79/99.8GAVGS, da secção única do Tribunal Judicial de Vagos, pela prática, em 19-02-1999, de um crime de ameaça;

b) 70 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 5 meses, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º431/02.1GAVGS, da secção única do Tribunal Judicial de Vagos, pela prática, em 25-08-2002, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez;

c) 70 dias de multa, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º461/00.8GACGS, da secção única do Tribunal Judicial de Vagos, pela prática, em 14-04-2002, de um crime de desobediência;

d) 220 dias de multa, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º150/08.5GAVGS, da secção única do Tribunal Judicial de Vagos, pela prática, em 25-03-2008, de um crime de detenção de arma proibida;

e) 90 dias de multa e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 5 meses, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º302/09.0GAILH, da Comarca do Baixo Vouga, Juízo de Pequena Instância Criminal de Ílhavo, pela prática, em 23-06-2009, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez;

f) 6 meses de prisão, suspensa na execução pelo período de um ano com regime de prova e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 9 meses, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º662/10.0GAVGS, da Comarca do Baixo Vouga, Juízo de Média Instância Criminal de Vagos, pela prática, em 15-09-2010, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez;

g) 1 ano e 2 meses de prisão, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º205/12.1GAVGS, da Comarca do Baixo Vouga, Juízo de Pequena Instância Criminal de Ílhavo, pela prática, em 20-04-2012, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições;

h) 10 meses de prisão, substituída por 300 horas de trabalho a favor da comunidade, por sentença transitada em julgado, proferida no âmbito do processo n.º82/12.2GAVGS, da Comarca do Baixo Vouga, Juízo de Pequena Instância Criminal de Ílhavo, pela prática, em 17-02-2012, de um crime de violação de imposições, proibições ou interdições.
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Factos não provados

Não existem outros factos dados como provados que tenham interesse para a decisão da causa ou que se mostrem em contradição com os dados como provados.
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Fundamentação da matéria de facto

O Tribunal formou a sua convicção sobre o objeto dos presentes autos com base na prova produzida em julgamento, analisada com recurso a juízos de experiência comum.
O arguido prestou declarações em que assumiu integralmente a prática dos factos que lhe eram imputados verbalizando arrependimento pelas suas condutas. De igual modo esclareceu as respetivas condições pessoais, sociais e económicas, nada tendo levantado reservas ao Tribunal.
Por outro prisma, foi relevante o teor do relatório social elaborado e junto aos autos a fls. 33 e seguintes, o qual veio sedimentar o percurso de vida do arguido e as suas atuais condições de vida (muito embora seja omisso quanto aos montante auferidos mensalmente pelo arguido, tanto no âmbito dos trabalhos esporádicos que presta como do recebimento de RSI).
Para além da supra referida, o Tribunal fundamentou-se ainda no teor:
- dos documentos de fls. 4 dos autos principais e de fls 3 dos autos apensos, dos quais constam os resultados dos testes quantitativos de pesquisa de álcool no sangue realizados pelo método do ar expirado nos aparelhos Dräger 7110 MKIII P, sendo que haverá que referir que nem a veracidade dos documentos nem a veracidade das assinaturas neles apostas foram impugnadas.
Porem, não desconsidera o Tribunal que, em 01-01-2014 entraram em vigor alterações ao Código da Estrada, passando a constar do artigo 170º, n.º1, alínea b) que, no auto de notícia deve ser feito constar “o valor registado e o valor apurado após dedução do erro máximo admissível previsto no regulamento de controlo metrológico dos métodos e instrumentos de medição, quando exista, prevalecendo o valor apurado, quando a infração for aferida por aparelhos ou instrumentos devidamente aprovados nos termos legais e regulamentares”.
Assim, seguindo jurisprudência que se vem firmando genericamente nos Tribunais e concretamente nos acórdãos do Tribunal da Relação do Porto, de 15-01-2014, relatados pelos senhores Desembargadores Neto de Moura, Alves Duarte e Donas Botto e o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 21-01-2014, relatado pelo senhor Desembargador Jorge Gonçalves, e que decidiram que:
Nos termos do disposto no artigo 153.º, n.º 1, do Código da Estrada, o exame de pesquisa de álcool no ar expirado é realizado mediante a utilização de aparelho aprovado para o efeito e o controlo metrológico dos analisadores quantitativos, já o sabemos, é regulado pela Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro.
Por outro lado, embora se refira, como é natural, apenas, às contraordenações (uma vez que o Código da Estrada não prevê crimes), não se descortina nenhuma razão válida para não aplicar o disposto na alínea b) aos casos em que a condução de veículo na via pública com uma taxa de álcool no sangue acima de determinado limite constitui crime.
Desconhecemos as razões da opção efetuada de fazer prevalecer (sobre o valor registado pelo aparelho) o valor apurado após dedução do erro máximo admissível, mas não pode haver dúvidas de que o legislador quis pôr termo à controvérsia atualmente existente, a que já nos referimos, procedendo a uma interpretação autêntica. (…)
O tipo objetivo do crime de condução de veículo em estado de embriaguez (artigo 292.º, n.º 1, do Código Penal) exige que o condutor tenha uma taxa de álcool no sangue igual ou superior a 1,2 g/l.
A prova da verificação desse elemento objetivo do tipo de ilícito em causa exige um exame e na realização deste tem de ser utilizado um analisador quantitativo do teor de álcool no sangue, o designado alcoolímetro, que não é um meio de prova, como, por vezes, se diz, mas simplesmente um instrumento utilizado na realização de um exame, que é um meio de obtenção de prova. O meio de prova (ou, se assim se preferir, a prova) é o talão emitido pelo aparelho, no qual é registada, além do mais, a taxa de álcool acusada pelo condutor fiscalizado.
Por razões óbvias, esse meio técnico de aferição da quantidade de álcool no sangue tem de ser fiável e por isso, previamente à sua utilização, passa por um processo, que se pretende rigoroso, de aprovação e verificação.
(…) Reconhecido que a qualquer resultado de medição está sempre associada uma incerteza de medição, uma vez que não existem instrumentos de medição absolutamente exatos, tal incerteza é avaliada e devidamente ponderada no ato da aprovação (do modelo) de instrumento a utilizar e na sua verificação, nomeadamente mediante a consideração de erros máximos admissíveis, legalmente previstos (em consonância com a já referida Recomendação 126 da OIML).
Com efeito, estabelece o artigo 8.º da Portaria n.º 1556/2007, de 10 de dezembro, que: “Os erros máximos admissíveis (EMA), variáveis em função do teor de álcool no ar expirado (TAE), são o constante do quadro que figura no quadro anexo ao presente diploma e que dele faz parte integrante”.
A controvérsia que se instalou está em saber qual a função desses erros máximos admissíveis.
A tese que aqui defendemos considera que o EMA é uma variável que integra o controlo metrológico no momento da aprovação e/ou verificação do(s) modelo(s) de alcoolímetro(s), não sendo dedutível após cada uma das utilizações desse modelo.
Para a tese adversa, essa variável tem, também, como função superar a dúvida sobre a correção do resultado apresentado pelo aparelho, dúvida com que o julgador, forçosamente, se há de defrontar dada a reconhecida incerteza inerente a qualquer medição, pelo que ao resultado do exame casuisticamente efetuado por cada alcoolímetro, mesmo que em condições regulares de funcionamento, impõe-se a dedução do valor do EMA.
Foi esta a solução que o legislador decidiu adotar, consagrando-a no artigo 170.º, n.º 1, al. b), do Código da Estrada, ao determinar que o valor apurado após dedução do erro máximo admissível prevalece sobre o valor registado.
É pacífico que a lei interpretativa não constitui uma nova e distinta manifestação da vontade do legislador. Por isso que, como se dispõe no artigo 13.º do Código Civil, a lei interpretativa considera-se, para efeitos da sua aplicação, integrada na lei interpretada, do que resulta o reconhecimento àquela (lei interpretativa) de eficácia retroativa.
Assim, aderindo a esta tese, no caso dos autos, verifica-se dos documentos constantes de fls. 5 dos autos principais e 4 dos autos apensos que os alcoolímetros foram objeto de primeira verificação, e, tendo em consideração o erro máximo admissível de 5%, o “valor apurado” da alcoolémia com que o arguido conduzia, nas referidas circunstância de tempo e lugar, o seu veículo automóvel será de 1,50g/l e de 1,58, respetivamente.
- do Certificado do Registo Criminal junto a fls. 10 e seguintes dos autos apensos;
Fundamentou-se ainda o Tribunal nas regras da experiência comum, as quais permitem inferir, com base nos factos objetivos dados como provados, a intenção subjetiva do arguido, na medida em que se trata de uma presunção natural que:
- quem conduz um veículo automóvel em via pública após ter ingerido quantidade indeterminada de bebidas alcoólicas suficiente para apresentar taxas de álcool no sangue como as que se registaram e vieram a apurar após desconto do erro máximo admissível, sabe que o que está a fazer é crime e tem vontade de praticar tal facto;
- quem desrespeita este tipo de ordens sabe o que está a fazer, quer praticar tais factos, sendo que as ordens emanadas de autoridades policiais e decorrentes da lei são para cumprir.
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De Direito

Enquadramento jurídico penal dos factos

(…)

- Do crime de desobediência

O ilícito criminal em referência encontra-se tipificado no artigo 348º, n.º1, alínea a) e 2 do Código Penal, por referência ao artigo 154º, n.º1 e 2 do Código da Estrada.
Dispõe o artigo 348º, n.º1, alínea a) e 2 do Código Penal que “quem faltar à obediência devida a ordem ou a mandado legítimos, regularmente comunicados e emanados de autoridade ou funcionário competente, é punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias se uma disposição legal cominar, no caso, a punição da desobediência simples. A pena é de prisão até dois anos ou de multa até 240 dias nos casos em que uma disposição legal cominar a punição da desobediência qualificada”.
Por seu turno o artigo 154º do Código da Estrada preceitua que:
1. Quem apresentar resultado positivo no exame previsto no n.º1 do artigo anterior ou recusar ou não puder submeter-se a tal exame, fica impedido de conduzir pelo período de doze horas, a menos que comprove, antes de decorrido esse período, que não está influenciado pelo álcool, através de exame por si requerido.
2. Quem conduzir com inobservância do impedimento referido no número anterior é punido por crime de desobediência qualificada.
3. O agente de autoridade notifica o condutor ou a pessoa que se propuser iniciar a condução nas circunstâncias previstas no n.º1 de que fica impedido de conduzir durante o período estabelecido no mesmo número, sob pena de crime de desobediência qualificada”.
No que respeita ao bem jurídico protegido pela norma incriminadora do crime de desobediência, tutela-se a autonomia intencional do Estado, impondo-se assim ao cidadão uma forma particular de não colocação de entraves à atividade do ente público no exercício das suas funções, dirigidas ao bom andamento da vida comunitária (neste sentido, vide, Cristina Líbano Monteiro, in Comentário Conimbricense do Código Penal”, Coimbra Editora, 1999, Tomo III, pág. 350).
Com este tipo de ilícito criminal, como escreve Cristina Líbano Monteiro (ob. cit., pág. 349), pune-se “a pura desobediência, a desobediência em si, desligada de quaisquer consequências; a desobediência sem violência, sem distúrbio da ordem e tranquilidade públicas, sem propósito de subversão da ordem democrática constituída”.
Segundo a doutrina dominante, estamos em face de um crime que integra a categoria dos crimes de dano, exigindo a lei a lesão efetiva dos bens jurídicos protegidos.
No que concerne ao tipo objetivo de ilícito, para que este se mostre preenchido é necessário que:
a) exista um comando emanado de uma entidade/autoridade, sob a forma de ordem ou mandado, impondo uma determinada conduta, ou seja, impondo uma ação ou uma abstenção;
b) que essa ordem seja formal e materialmente legítima, ou seja, tem de existir uma disposição legal que autorize a sua emissão;
c) que tenha sido emitida por uma entidade/autoridade competente, o que significa que a ordem tem de ser abrangida pelas atribuições funcionais do emitente;
d) que tenha sido regularmente comunicada ao seu destinatário, exigindo-se que aquilo que lhe é imposto chegue efetivamente ao seu conhecimento (por forma a fundar-se o respetivo dolo) e que a comunicação se efetue pelas vias normalmente utilizadas; e
e) que tenha existido a violação, por ação ou omissão, do dever concretamente emergente dessa ordem ou mandado, dever esse que pode emergir de norma legal ou de cominação expressa nesse sentido por parte da autoridade competente.
Não basta, porém, que o agente falte à obediência devida para que a sua conduta seja criminalmente relevante, o dever de desobediência tem que decorrer de cominação prévia, legal ou expressa pelo emitente.
Ora, em situações como a que está em apreço nos presentes autos, em que a fonte do que se desrespeitou é uma disposição legal que comina a punição da desobediência, a imposição da norma de conduta é feita por lei geral e abstrata, anterior à prática do facto (neste sentido, vide, Cristina Líbano Monteiro, in, Comentário Conimbricense do Código Penal, Tomo III, anotação ao artigo 348º, Coimbra Editora, 2001, pág. 351).
Revertendo para o caso dos autos, o tipo objetivo de ilícito mostra-se integralmente preenchido já que resulta inequívoca a existência de uma ordem dirigida ao arguido para que este se inibisse de conduzir pelo período de 12 horas, a qual decorre da lei (código da Estrada), sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, emitida por uma autoridade (órgão de policia criminal).
Por sua vez, a ordem para que se inibisse de conduzir durante aquele período de tempo foi regular e pessoalmente notificada no decurso do ato de fiscalização que se pretendia efetivar, subsequente à verificação do exercício da condução, mais concretamente após proceder-se ao teste para determinação da quantidade de álcool no sangue, sendo que o militar da GNR estava a atuar no âmbito das suas funções de fiscalização da circulação rodoviária. Aliás, refira-se que a comunicação da inibição de conduzir ocorreu verbalmente e por escrito.
Por último, inequívoco é também que o arguido desrespeitou a ordem que lhe havia sido regularmente transmitida pois que iniciou a condução do veículo automóvel durante aquele período de 12 horas em que estava inibido de o fazer.
Assim sendo, perante os factos que resultaram provados em sede de audiência de discussão e julgamento, dúvidas não restam de que o arguido praticou os factos de que vinha acusado, verificando-se, por conseguinte, o preenchimento de todos os elementos objetivos do tipo legal de crime de desobediência.
No que respeita ao tipo subjetivo de ilícito, este é um crime punível apenas a título de dolo (artigo 13º do Código Penal), não sendo exigindo pela lei qualquer intenção específica.
Analisado o artigo 348º, n.º1, alínea a) e 2 do Código Penal, neste seu momento subjetivo, verifica-se que o tipo de ilícito se basta com o dolo genérico.
Da matéria de facto apurada e dada como provada, resulta que o arguido, desrespeitou a inibição de conduzir, desobedecendo a determinação legal e a ordem que lhe foi regularmente transmitida. E fê-lo de forma voluntária, sabendo qual a consequência do seu ato, já que havia sido previamente advertido pelas autoridades policiais intervenientes na fiscalização e no decurso desta (diga-se que o arguido “arriscou”, pensando que não iria ser novamente intercetado pelas autoridades policiais).
Do supra exposto, conclui-se que se encontra igualmente preenchido o tipo subjetivo de ilícito, podendo imputar-se tal conduta ao arguido a título de dolo direto.
Não se verificam, in casu, quaisquer causas de exclusão da ilicitude ou da culpa.
Praticou, deste modo, o arguido, em autoria material, um crime de desobediência p. e p. pelo artigo 348º, n.º1, alínea a) do Código Penal, por referência ao disposto pelo artigo 154º, n.º1, 2 e 3 do Código da Estrada.
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IV. Escolha e determinação das medidas concretas das penas

Tendo-se concluído pela prática pelo arguido dos crimes que lhe eram imputados, cumpre agora determinar quais as penas que lhe serão aplicadas.
Ambos os crimes praticados pelo arguido são abstratamente puníveis com pena de prisão ou com pena de multa, o de condução de veículo em estado de embriaguez com pena de um mês a um ano de prisão ou de multa de 10 a 120 dias e ainda, com a pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de três meses a três anos, de harmonia com o disposto no n.º 1, alínea a) do artigo 69º do Código Penal; e o de desobediência com pena de um mês a dois anos de prisão ou de 10 a 240 dias de multa.
Por sua vez, o artigo 70º do Código Penal prevê que “se ao crime forem aplicáveis, em alternativa, pena privativa e pena não privativa da liberdade, o tribunal dá preferência à segunda sempre que esta realizar de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Acrescenta ainda o artigo 40º, n.º 1, do mesmo diploma legal que “a aplicação das penas visa a proteção dos bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”.
Serão então as necessidades de prevenção geral e especial que determinarão a natureza da pena a aplicar.
Prementes são as necessidades de prevenção geral, relativamente a ambos os tipos legais de crime em referência, não só tendo por base a elevada frequência da sua prática, mas igualmente o aumento da sinistralidade rodoviária em que o álcool tem tido um papel relevante, apresentando-se como potenciador de outros ilícitos criminais de maior gravidade, como seja o homicídio por negligência.
No caso dos autos, o arguido tem antecedentes criminais, sendo variados os tipos legais de crime pelos quais já foi condenado. Porém, verifica-se maior preponderância para o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, relativamente ao qual já sofreu condenações em penas de multa e em pena de prisão suspensa na execução com regime de prova; e para o crime de violação de proibições, relativamente ao qual já sofreu condenações em pena de prisão substituída por prestação de trabalho a favor da comunidade e de pena de prisão efetiva.
Os últimos factos de que há conhecimento relacionados com a condução de veículo em estado de embriaguez datam do ano de 2010, mas não se poderá desconsiderar, pela análise do Certificado de Registo Criminal, que o arguido denota falta de capacidade em acatar e respeitar as regras do Direito e, bem assim, dificuldade em responder afirmativamente a anteriores condenações (inclusivamente com penas de prisão), o que faz antever que a pena de multa, relativamente a ambos os ilícitos criminais, tenderá a ser comunitariamente entendida como uma prova de fraqueza e indulgência contra o crime, para além de não cumprir suficiente e adequadamente a proteção dos bens jurídicos em apreço, surgindo, assim, a pena de prisão como a mais recomendável do ponto de vista das exigências especiais da prevenção.
Deste modo, decide-se optar pela aplicação ao arguido da pena de prisão relativamente aos crimes de condução de veículo em estado de embriaguez e de desobediência.
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Posto isto, importa determinar as medidas concretas das penas a aplicar ao arguido, penas essas limitadas pela sua culpa revelada nos factos (artigo 40º, n.º 2 do Código Penal), e que terão de se mostrar adequadas a assegurar as exigências de prevenção geral e especial, nos termos do disposto nos artigos 40º, n.º 1 e 71º, n.º 1 ambos do Código Penal, havendo que ponderar na determinação daquela medida, todas as circunstâncias que não fazendo parte do tipo de crime deponham a favor ou contra o arguido, nomeadamente, as enumeradas no n.º 2 do citado artigo 71º do Código Penal.
Assim, dando-se por reproduzidos os fatores ponderados para a escolha da pena e acrescentando que:
- a modalidade de dolo com que o arguido atuou foi direto, em todas as situações em apreço nos autos, pois que sabia que a ingestão prévia de bebidas alcoólicas, em quantidade indeterminada, seria suficiente para que registasse teor alcoólico no sangue e que tal lhe era vedado por lei e que não podia conduzir quaisquer veículos a motor enquanto se mantivesse a proibição decretada por lei e, mesmo assim, não se inibiu do comportamento;
- o grau da ilicitude do facto situa-se em patamar elevado, tendo em consideração as taxas de álcool no sangue verificadas e apuradas (sendo esta última a prevalecente) e o período horário que mediou entre a prática dos ilícitos criminais em referência (menos de duas horas);
- não foi interveniente em acidente de viação;
- não está integrado em termos laborais, face a situação de desemprego, embora preste serviços esporádicos na sua área de atividade;
- está integrado familiarmente, embora se tenha conseguido aferir que não existe verdadeira consistência em alguns laços familiares;
- não existem indícios de que o arguido não esteja integrado em termos sociais;
- tem um grau de escolaridade mediano, atentando ao grau de escolaridade do homem médio residente na área da Comarca (conclusão que se retira por análise da escolaridade das pessoas que têm vindo a ser julgadas por este Tribunal), o que lhe confere maior exigência nos comportamentos estradais;
- a admissão da prática dos factos;
Tudo visto e ponderado, entende-se que o grau de culpa, relativamente ao crime de:
a) condução de veículo em estado de embriaguez, praticado pelas 01h 42m, é acima da média e surge como adequada e suficiente a pena de sete meses de prisão a aplicar ao arguido;
b) condução de veículo em estado de embriaguez, praticado pelas 03h 15m, é acima da média e surge como adequada e suficiente a pena de oito meses de prisão a aplicar ao arguido;
c) desobediência é mediano e surge como adequada e suficiente a pena de cinco meses de prisão a aplicar ao arguido (considerando que relativamente a este ilícito criminal não ocorreu até à data condenação em pena de prisão).
*
V. Do cúmulo jurídico de penas

Os dois crimes que são imputados ao arguido estão entre si numa relação de concurso efetivo pois, correspondendo a três resoluções criminosas distintas, inexistem quaisquer relações de especialidade, consumpção ou subsidiariedade, pelo que será o arguido condenado numa pena única (artigo 77º do Código Penal).
A previsão legal vertida na segunda parte do artigo 77º, n.º1 do Código Penal esclarece que a determinação de tal pena deverá resultar da consideração, em conjunto dos factos e da personalidade do agente.
Por seu turno o n.º3 desta norma preceitua que “se as penas aplicadas aos crimes em concurso forem umas de prisão e outras de multa, a diferente natureza destas mantém-se na pena única resultante da aplicação dos critérios estabelecidos nos números anteriores”.
Assim sendo, numa moldura abstrata entre 8 (oito) e 20 (vinte) meses de prisão, dando-se por reproduzidos os fatores ponderados para escolha e determinação das medidas concretas das penas, fixa-se a pena única em 15 (quinze) meses de prisão.
*
A suspensão da execução da pena de prisão

Atendendo ao determinado pelo artigo 50º do Código Penal no sentido de que “o Tribunal suspende a execução da pena de prisão aplicada em medida não superior a cinco anos se, atendendo à personalidade do agente, às circunstâncias da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição”.
Haverá que dar por reproduzido o que acima se expôs quanto à escolha e determinação da medida concreta da pena.
Não se poderá esquecer que o arguido já foi condenado em penas de prisão, suspensas na execução ou substituídas por outra não privativa da liberdade e que não tem integração laboral, sendo que a familiar e social não permite ao Tribunal firmar um juízo de prognose favorável do ponto de vista do apoio e “coadjuvação” no afastamento da prática de ilícitos criminais da natureza que está em apreço nos autos.
Por outro lado, não é de descurar a distância temporal que mediou entre os factos pelos quais veio a ser punido na última condenação registada e aqueles que estão agora em apreço (cerca de quatro anos), e que corresponde a pena que ainda se encontra a cumprir, o que redunda na conclusão de que, mesmo perante a pendência de pena de prisão “suspensa” (já que pela aplicação do artigo 59º, n.º2, alínea c) do Código Penal poderá vir a ser revogada a substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade) quando praticou os factos agora em causa, leva a concluir que o arguido não interiorizou a oportunidade que lhe foi dada com a substituição da execução da pena de prisão por prestação de trabalho a favor da comunidade, nem a gravidade dos factos cometidos, e que a mera ameaça de cumprimento da pena ou a possibilidade de o arguido prestar trabalho a favor da comunidade sejam aptas a preencher as finalidades da punição.
Neste sentido, decide-se não suspender a execução da pena de prisão imposta ao arguido.
*
O que supra se exarou quanto à ponderação da suspensão da execução da pena de prisão, dá-se por integralmente reproduzido por questões de economia processual no que tange à substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade, à possibilidade de cumprimento da pena em regime de permanência na habitação, de dias livre ou de semidetenção, pois que o arguido tem baixos proventos económicos (o que previsivelmente não lhe permitirá proceder às apresentações voluntárias junto do EP), não tem qualquer apoio da comunidade, nem desempenha qualquer atividade laboral com caráter regular. Isto para além de se considerar que nenhuma destas formas de cumprimento da pena serviriam ao efetivo preenchimento e satisfação das finalidades das penas.
(…)
*
De tudo isto resulta que a pena de prisão será efetiva.
(…)
*
b) apreciação do mérito:

Antes de mais, convirá recordar que, conforme jurisprudência pacífica[1], de resto, na melhor interpretação do artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, o objeto do recurso deve ater-se às conclusões apresentadas pelo recorrente, sem prejuízo, obviamente, e apenas relativamente às sentenças/acórdãos, da eventual necessidade de conhecer oficiosamente da ocorrência de qualquer dos vícios a que alude o artigo 410º, do Código de Processo Penal[2].
Sublinhe-se, em sede de conclusões, que importa apreciar apenas as questões concretas que resultem das conclusões trazidas à discussão, o que não significa que cada destacada conclusão encerre uma individualizada questão a tratar, tal como sucede no caso vertente.
Antes disso, impõe-se tratar a seguinte

questão prévia.

O Ministério Público foi notificado do recurso instaurado pelo arguido em 29/09/2016, já que é essa a data em que o processo lhe foi apresentado para o efeito, conforme decorre de fls. 79, pois que o “artifício” criado pela Magistrada do Ministério Público, de apor a data de 10/10/2016 ao lado da sua rubrica referente a tal notificação, não pode ser aqui validado, sob pena de total subversão do regime atinente aos prazos processuais.
De resto, e se assim fosse, estava descoberta a forma de cada um ser notificado quando muito bem entendesse ou lhe desse mais jeito.
Não pode ser, restando apenas ao Ministério Público a benesse dos três dias úteis subsequentes ao prazo sem sequer apresentar justificação alguma, conforme jurisprudência fixada nesse sentido. O que, diga-se de passagem já não é pouco, embora seja defensável que tal nos afasta de uma desejável igualdade de armas.
Ora, tendo em conta que a resposta deu entrada em juízo apenas em 14/11/2016, e que o prazo para o efeito era de trinta dias a contar da sobredita notificação, conforme resulta da disciplina contida no artigo 413º, nº 1, do Código de Processo Penal, constata-se que tal resposta é claramente extemporânea, mesmo considerando a mencionada benesse.
Assim sendo, resta apenas determinar o seu desentranhamento e ulterior entrega, em 1ª instância, a quem a apresentou.
Decorre do exposto que a posição do Ministério Público em ambas as instâncias não será apreciada, já que a Ex.ma PGA limitou-se a remeter para a resposta e esta não poderá ser aqui considerada.
*
No mais, e em face daquilo que se apreende das efetivas conclusões trazidas à discussão pelo recorrente, importa saber:

1 – se não se mostram verificados os requisitos que integram o imputado crime de desobediência, impondo-se a sua concomitante absolvição de um tal ilícito, ao menos por via da incerteza de factos, a coberto do princípio “in dubio pro reo”;

2 – se as penas aplicadas no tocante aos dois crimes de condução em estado de embriaguez são excessivas e se era de ponderar a possibilidade de execução da pena na comunidade, além de que, e quando menos, o tribunal deveria ter permitido que a pena aplicada fosse cumprida em regime de permanência na habitação.

Vejamos, pois.

1 – do crime de desobediência e associado princípio.

O recorrente começa por afirmar que o recurso baseia-se na insuficiência para a decisão em matéria de facto, em erro notório na apreciação da prova e na errónea apreciação e enquadramento jurídico-penal dos factos dados por provados, tudo no que concerne ao crime de desobediência, após o que, socorrendo-se de transcrição das suas declarações, a única prova produzida em audiência, sustenta que mal se percebe a clareza da ordem emanada pela autoridade, podendo ainda inferir-se que os agentes estavam a alertá-lo da existência de outras brigadas e que ele podia vir a ser autuado novamente por conduzir veículo sob a influência do álcool, o que veio a acontecer, enquanto eles ali estivessem é que não.
Adianta depois que pode ter havido também notificação escrita para esta omissão, mas a haver, foi à 1h 42m, noite escura, na berma da Estrada Nacional nº … e no meio da sobredita conversa que relatou, sendo certo que nem mesmo as perguntas sugestivas da Mmª Juiz obtiveram resposta convincente da sua parte.
Mais alega que entende que não estão reunidos todos os pressupostos que integram o tipo legal do crime de desobediência e que estamos perante uma condenação que implica a privação da liberdade, quando é certo que a prova produzida não se lhe afigura suficiente para o sancionar, além de que nos autos não existem outras provas que contrariem a sua versão, não podendo sequer dizer-se que confessou quando lhe perguntam se confessava todos os factos de que vinha acusado, uma vez que devia ser questionado especificadamente pelos respetivos factos.

Apreciando.

Cremos evidente que, quanto ao crime de desobediência, o recorrente refere-se à insuficiência para a decisão em matéria de facto, ao erro notório na apreciação da prova e a uma errónea apreciação e enquadramento jurídico-penal dos factos dados por provados, quando, do que se apreende, o que mesmo pretendia era apenas impugnar a correspondente decisão em sede de facto, alicerçado nas suas próprias declarações.
Na verdade, ao falar em insuficiência, o mesmo pretende significar apenas uma alegada insuficiência da prova, que não da factualidade apurada, sendo que, é consabido, só esta configuraria o vício a que alude o artigo 410º, nº 2, al. a), do Código de Processo Penal, e ao apelar à existência de erro notório na apreciação da prova, pretende apenas questionar a convicção firmada pelo tribunal recorrido, atentas as suas declarações, a única prova existente, coisa bem diversa do vício vertido na al. c), do nº 2, do supra mencionado normativo.
De qualquer modo, cautelarmente, e porque estamos perante vícios de conhecimento oficioso, conforme antes se explicitou, relembrar-se-á que o erro notório na apreciação da prova “… existirá, assim, sempre que se revelem distorções de ordem entre os factos provados e não provados, ou que estes traduzam uma apreciação manifestamente ilógica, arbitrária, fora de qualquer contexto racional, e por isso incorreta, e que, em si mesma, não passe despercebida imediatamente à observação e verificação comum do homem médio”[3] e o vício da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada só ocorre “… quando a matéria de facto provada é insuficiente para a decisão de direito, porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar relativamente a factos relevantes para a decisão da causa, alegados pela acusação ou pela defesa, ou que resultaram da audiência ou nela deveriam ter sido apurados por força da referida relevância para a decisão”[4].
Convirá recordar também que é igualmente pacífico, que os vícios a que aludem as várias alíneas do nº 2, do artigo 410º, do Código de Processo Penal, hão de resultar apenas do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum[5].
De tudo isso cientes, dir-se-á que, analisado o texto da sentença recorrida, não se descortina a presença de algum desses vícios, nada podendo concretizar-se nesta análise, já que inexiste uma qualquer argumentação a um tal propósito e, obviamente, não é possível apreciar o que pura e simplesmente não existe.
Restaria, por isso, a questão do erro de julgamento, afinal, a única verdadeira questão aqui trazida à discussão.
Sucede, porém, que, nesta matéria, o tribunal de recurso não realiza um segundo julgamento da matéria de facto, incumbindo-lhe apenas emitir juízos de censura crítica a propósito dos pontos concretos que as partes especifiquem e indiquem como não corretamente julgados ou se as provas sindicadas impunham decisão diversa[6].
Uma tal tarefa vai de encontro à disciplina contida no artigo 412º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Penal, a única forma válida para, afora os ditos vícios, poder impugnar-se a decisão proferida em sede de facto.
Ora, o recorrente não cumpriu, minimamente, os requisitos aqui exigíveis e plasmados naquele preceito, pois que não indicou quais os pontos de facto que, em concreto, pretendia ver mudados e em que sentido, bem como as concretas provas que tal o impunham, embora se depreenda que só poderiam ser as suas próprias declarações, já que ninguém mais foi inquirido, embora o tribunal tenha estribado a matéria de facto fixada também em prova documental.
Simplesmente, a mera transcrição de parte do declarado, sem mais, é insuficiente para cumprir o referido formalismo aqui exigível, falência que ocorre, não só na motivação, mas também nas aportadas conclusões, que, neste particular primam até por um estrondoso silêncio, o que, logicamente nos afasta de um qualquer convite ao aperfeiçoamento do recurso e, por via disso, impede-nos de apreciar um tal aspeto.
De resto, a mera discussão da convicção firmada pelo tribunal recorrido nos moldes aqui trazidos pelo recorrente não é nada compaginável com a confissão integral e sem reservas que se mostra documentada na ata da audiência, cuja falsidade não foi invocada, e que gerou a decisão de não inquirição da testemunha da acusação, sendo certo que a notificação de fls. 5 do apenso 303/16.2 é bem clara quanto à questão de não poder conduzir e associado crime de desobediência, e, fosse assinada na berma da estrada ou noutro local, a mesma só vem reforçar aquilo que os guardas verbalmente lhe comunicaram.
Seja como for, mercê da total míngua do formalismo exigível nos moldes sobreditos, a factualidade firmada não poderá ser questionada e, posto que também não padece de qualquer vício que a inquine, mormente os dois acima referidos, está devidamente sedimentada, restando acrescentar que do texto da sentença recorrida, o único aqui possível de sindicar, não emerge que o tribunal, tendo ficado num estado de dúvida, inultrapassável, tenha decidido contra o arguido, ou seja, em violação do invocado princípio “in dubio pro reo”.
Nada a alterar, portanto.
No mais, sempre com respeito ao mesmo crime, e apesar de nada resultar da argumentação do recurso, a não ser a singela afirmação de que existiria uma errónea apreciação e enquadramento jurídico-penal dos factos dados por provados, sem que nada fosse concretizado, deverá anotar-se, ainda assim, que a linear leitura da decisão recorrida, no tocante à subsunção dos factos ao artigo 348º, nºs 1 e 2, do Código Penal, com referência ao artigo 154º, nºs 1 a 3, este do Código da Estrada, elucida devidamente, e com pormenor, quais os requisitos aqui exigíveis e todos presentes, o que sendo mais que evidente, nos dispensa outros desenvolvimentos, a não ser remeter para a sua leitura, por economia, já que nos permitimos aderir a uma tal assertiva fundamentação.
Naufraga, pois, este capítulo do recurso, manifestamente.

2 – das penas aplicadas e questões conexas.

O recorrente alega que em ambos os crimes de condução sob o efeito do álcool apresentava uma taxa de álcool no sangue na casa dos 1,5 g/l, pouco acima do limiar daquilo que é tipificado como crime, percorreu escassos 5 Km através de uma estrada florestal entre a primeira e a segunda fiscalização e foi-lhe aplicada em cada um dos casos a pena mais gravosa, em cerca de 3/4 da sua moldura, o que se revela excessivo atendendo aos critérios definidos no artigo 71º do Código Penal.
Alega depois que, embora tenha antecedentes criminais, tendo já sido condenado por condução de veículo em estado de embriaguez, o certo é que, já na posse de todas as provas e depois de ter verificado o seu certificado de registo criminal, o tribunal, tendo em consideração o teor deste certificado e a previsibilidade de a pena a aplicar poder ser a de prisão, determinou a realização de relatório social para determinação da sanção, de cujo teor resulta como favorável a eventual aplicação de medida com execução na comunidade, ainda que acompanhada de tratamento para a dependência alcoólica, a par da consciencialização para os perigos e consequências da condução sob o efeito do álcool e estratégias de prevenção da reincidência, conclusões que acabaram por não ser tidas em conta na sentença recorrida, ao ponto de a elas não se fazer a mínima referencia, ao que acresce o facto de constar de tal relatório que reside com o pai (pessoa com mais de 90 anos) e que no seu meio de residência é tido como uma pessoa humilde e pacífica.
Mais alega que, ao fundamentar a decisão de não possibilitar o cumprimento da pena em regime de permanência na habitação ou prestação de trabalho a favor da comunidade, a sentença recorrida acrescenta o facto de ter baixos proventos económicos e não ter qualquer apoio da comunidade, para além de não desempenhar qualquer atividade laboral, mas, no entanto, ter baixos recursos económicos torna mais penoso o cumprimento de uma sanção em regime de permanência na habitação, sendo certo que tem apoio da comunidade, pois está a ser acompanhado no Centro C… do distrito de Aveiro (tal como refere o relatório social) e tem avaliação positiva no cumprimento de trabalho a favor da comunidade na Junta de Freguesia ….
Sustenta, por último, que as finalidades das penas sempre podiam ser alcançadas com o seu cumprimento em regime de permanência na habitação, dando assim acolhimento ao estabelecido no artigo 44º, nº 2, al e), do Código Penal, ou substituídas por prestação de trabalho a favor da comunidade.

Apreciando.

Começando pelas penas parcelares aqui questionadas (o recorrente não discute que o tribunal tivesse enveredado pela pena de prisão em detrimento da possível pena de multa), e para nos situarmos em termos interpretativos, embora nos pareça existir total sintonia nos autos nesta matéria, relembraremos que “As finalidades da aplicação de uma pena residem primordialmente na tutela dos bens jurídicos e, na medida do possível, na reinserção do agente na comunidade”, e que “Por outro lado, a pena não pode ultrapassar, em caso algum, a medida da culpa”[7]. De resto, a culpa e a prevenção são os dois parâmetros que norteiam a indagação da medida da pena, conforme resulta claro da previsão do artigo 71º, nº 1, do Código Penal.
Claro está que uma tal tarefa há de partir, logicamente, da análise dos factos, no seu cotejo com a também apurada personalidade do seu agente, o que equivale por dizer que “… o substrato da culpa, e portanto também o da medida da pena, não reside apenas nas qualidades do caráter do agente, ético-juridicamente relevantes, que se exprimem no facto, na sua totalidade todavia cindível…” mas reside, isso sim, “…na totalidade da personalidade do agente, ético-juridicamente relevante, que fundamenta o facto, e portanto também na liberdade pessoal e no uso que dela se fez, exteriorizada naquilo que chamamos a atitude da pessoa perante as exigências do dever-ser.”[8]
Feito o necessário enquadramento, impõe-se recordar que o recorrente limita-se a “queixar-se” da excessividade das penas de prisão aplicadas aos dois crimes de condução sob o efeito do álcool, atenta a TAS encontrada e o facto de, no segundo, ter percorrido uns escassos 5 Km, através de uma estrada florestal, isto atendendo aos critérios definidos no artigo 71º do Código Penal.
É apenas isto.
Anote-se, desde já, que o alegado trajeto pelo mesmo percorrido entre a primeira e a segunda fiscalização não faz parte do elenco de factos provados, pelo que, logicamente, não poderá ter aqui uma qualquer interferência.
Independentemente disso, e apesar de o recorrente questionar simplesmente as duas referidas penas parcelares aplicadas, o tribunal não poderá deixar de apreciar o contexto em que o mesmo foi submetido ao segundo exame de pesquisa de álcool no sangue, já que se entende que deverá ser revogada a respetiva decisão sobre a própria culpabilidade.
Na verdade, o mesmo realizou um primeiro teste cerca da 01 hora e 42 minutos e o segundo pelas 03 horas e 15 minutos, ou seja, menos de duas horas depois, tendo acusado agora uma taxa inferior à primeira.
Ora, o mesmo havia sido advertido para não conduzir nas doze horas seguintes à primeira infração, conforme decorre do estatuído no artigo 154º, nº 2, do Código da Estrada, o que, não tendo o mesmo cumprido, gerou a sua condenação, e bem, pela prática de um crime de desobediência.
E isto porque na origem deste crime está o facto de o legislador saber, já que há elementos científicos que tal comprovam, que os efeitos do álcool prolongam-se no tempo, pelo que estabeleceu aquele período temporal como razoável para que possa haver uma completa eliminação pelo organismo dos efeitos do álcool.
Daqui decorre até que a ordem para realizar o segundo teste, adentro do aludido período de doze horas, carece até de legitimidade.
Assim sendo, não poderá o mesmo voltar a ser julgado, muito menos condenado, com base na mesma fonte geradora de responsabilidade criminal, ou seja, o mesmo consumo excessivo de álcool já sindicado no primeiro teste realizado, sob pena de violação do princípio “ne bis in idem”[9].
Daqui flui, naturalmente que o mesmo deverá ser absolvido do crime de condução de veículo em estado de embriaguez realizado em segundo lugar.
No mais, cremos que não lhe assistirá razão alguma.
Na verdade, e embora tenha aqui um especial relevo, naturalmente, o certo é que a TAS não é o único parâmetro que importa ponderar, tendo sido precisamente isso que o tribunal explicou ao anotar, em suma, que as necessidades de prevenção geral eram prementes, que os antecedentes criminais do recorrente eram variados, verificando-se, contudo, uma maior preponderância para o crime de condução de veículo em estado de embriaguez, com penalizações diversas, e que atuou com dolo direto, ao que acresceram os aspetos de ordem pessoal e a valoração da confissão.
Assim sendo, tendo presente a moldura abstrata aqui em apreço, respeitados que foram os sobreditos critérios que norteiam a aplicação das penas, e relembrando-se que nesta matéria existe sempre alguma margem de subjetividade do julgador, pelo que as penas só poderão ser alteradas nos casos em que, apesar de respeitados os subjacentes critérios legais, é ostensivo o seu exagero ou desproporção, tal como decorre do elucidativo Acórdão deste Tribunal da Relação do Porto, datado de 02/6/2010[10], e ao qual, modestamente, se adere, desrespeito que aqui não sucedeu, não se vislumbra que a pena parcelar aqui questionada, a única que subsiste quanto ao crime em questão, no referido espectro possível, seja exagerada, desproporcionada e/ou injusta, pelo que deverá manter-se.
Claro está que, e independentemente de o recorrente não a colocar em crise (nem a ela se referiu sequer), o desaparecimento daquele segundo crime, além de fazer desaparecer também a respetiva pena acessória aplicada, implica a correspondente “afinação” da pena única de prisão.
Assim sendo, e mantendo-se os critérios e a fundamentação a esse propósito inserta na decisão recorrida, fixa-se a pena única em nove meses de prisão.

Adiante.

No que respeita à questão de o tribunal não se ter pronunciado sobre a aplicação de medida com execução na comunidade, esquecendo as propostas que constavam do relatório social, dir-se-á que não se pronunciou porque optou pela aplicação de uma pena única de prisão efetiva, o que, logicamente, torna inútil uma tal ponderação, devendo anotar-se que as propostas ou sugestões vertidas no referido relatório social, embora constituam um precioso auxiliar para a determinação da sanação a aplicar, não são vinculativos.
De resto, o relatório foi solicitado precisamente porque o tribunal já equacionava a possibilidade de aplicar uma pena de prisão, conforme consta do despacho transcrito pelo recorrente.
Nada a censurar, portanto.

Avançando.

Resta a questão do cumprimento da pena em regime de permanência na habitação ou através da prestação de trabalho a favor da comunidade, devendo anotar-se quanto a esta última, que a mesma não é minimamente referenciada nas conclusões, como se impunha. Ainda assim, será igualmente apreciada uma tal pretensão.
Cremos evidente o inêxito deste aspeto do recurso, devendo adiantar-se que, pelas razões a seguir descritas, e embora seja agora também possível a substituição da pena única por pena de multa, em face da disciplina contida no artigo 43º, nº 1, do Código Penal, não deverá proceder-se a tal.
Na verdade, o tribunal recorrido afastou a possível suspensão da execução da pena, o que o recorrente nem discute, pelas razões que antes considerara para a escolha e medida das penas que veio a aplicar, chamando a atenção para os seus registados antecedentes criminais, cujas condenações em penas de prisão foram suspensas na execução ou substituídas por outra não privativa da liberdade e sublinhando ainda a falta de integração laboral do mesmo e a ausência de um suporte capaaz do ponto de vista familiar e social.
Destacou ainda que os factos aqui em apreço, cuja gravidade foi igualmente ponderada, foram praticados no decurso do cumprimento, através de trabalho comunitário, de uma das penas já antes sofridas e associada falta de interiorização de mais essa oportunidade que lhe foi dada.
Tudo razões que, além de sustentarem a não suspensão da execução da pena única aplicada, foram depois estendidas à recusa da sua substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade, à possibilidade de cumprimento da pena em regime de permanência na habitação, de dias livre ou de semidetenção, tendo-se considerado, além do mais, que nenhuma destas formas de cumprimento da pena serviria ao efetivo preenchimento e satisfação das finalidades das penas.
Claro que não será de sufragar a ideia de que os baixos proventos económicos do arguido, “a se”, possam servir de mote para afastar qualquer dessas penas de substituição, mormente por supostamente não lhe permitir proceder às apresentações voluntárias junto do EP.
Contudo, cremos linear que o registado percurso delitual do arguido dá nota de que foi desperdiçando as sucessivas oportunidades que lhe iam sendo facultadas e que, podendo, até porque beneficiou de apoio para tanto, não procurou enveredar por trilhos diversos, v.g, afastando-se de vez dos consumos excessivos de álcool, ou, quando menos, abstendo-se de conduzir nessas circunstâncias, insistindo em tal senda criminosa, que reiterou mesmo estando a cumprir uma das penas antes sofridas.
Neste global contexto, nenhuma censura nos merece o decidido ao enveredar pela aplicação de uma pena de prisão efetiva, já que exigível para salvaguardar as finalidades punitivas que aqui imperam, sendo certo que nada obsta a que no seio do EP seja mantido o necessário acompanhamento com vista ao afastamento dos consumos excessivos de álcool, desiderato que será até desejável, se o recorrente nisso consentir.
Naufraga, pois, também este capítulo do recurso, o que gera a sua total improcedência.
*
III – DISPOSITIVO:

Nos termos e pelos fundamentos expostos, e ainda que algo diversos do alegado, os juízes nesta Relação acordam em conceder provimento parcial ao recurso interposto pelo arguido B… e, em consequência, decidem absolvê-lo do segundo crime de condução de veículo em estado de embriaguez (referente ao teste realizado às 03 h e 15 mn) e, por inerência, fixar a pena única em nove meses de prisão, efectiva, e, no mais, na parte aqui questionada, decidem confirmar a sentença recorrida.

Sem tributação (cfr. artigo 513º, nº 1, “a contrario” do Código de Processo Penal.

Notifique.
*
Porto, 25/01/2017[11].
Moreira Ramos
Maria Deolinda Dionísio
________________
[1] Vide, entre outros no mesmo e pacífico sentido, o Ac. do STJ, datado de 15/04/2010, in http://www.dgsi.pt, no qual se sustenta que “Como decorre do art. 412.º do CPP, é pelas conclusões extraídas pelo recorrente na motivação apresentada, em que resume as razões do pedido que se define o âmbito do recurso. É à luz das conclusões da motivação do recurso que este terá de apreciar-se, donde resulta que o essencial e o limite de todas as questões a apreciar e a decidir no recurso, estão contidos nas conclusões, excetuadas as questões de conhecimento oficioso”.
[2] Conhecimento oficioso que resulta da jurisprudência fixada no Acórdão nº 7/95, do STJ, in DR, I série-A, de 28/12/95.
[3] Citação do Ac. do STJ, datado de 18/10/06, relatado por Santos Cabral, apud Vinício Ribeiro, Código de Processo Penal, Notas e Comentários, Coimbra Editora, 2008, pág. 917.
[4] Vide Ac. do STJ, de 03/07/02, relatado por Armando Leandro, apud Vinício Ribeiro, Ob. Cit., pág. 914.
[5] Vide, a título meramente ilustrativo, o Ac. do STJ datado de 23/09/2010, proferido por Souto Moura, aqui citado, a consultar in http://www.dgsi.pt.
[6] Vide, entre muitos outros, o Ac. do STJ, datado de 26/01/00, in http://www.dgsi.pt.
[7] Vide, Figueiredo Dias, in “Direito Penal Português, As Consequências Jurídicas do Crime”, Aequitas, Editorial Notícias, 1993, pág. 227.
[8] Vide, Figueiredo Dias, in “Liberdade, Culpa, Direito Penal”, Biblioteca Jurídica Coimbra Editora, 1983, págs. 183 e 184.
[9] Neste mesmo sentido, e tendo sustentado até a nulidade do julgamento em processo sumário, vide o acórdão deste TRP datado de 11/11/2009, proferido no processo nº 516/09.3 PTPRT.P1, relatado por Deolinda Dionísio e que o ora relator então subscreveu.
[10] Aresto proferido no âmbito do processo nº 60/09.9 GNPRT.P1, relatado por Joaquim Gomes, a consultar in www.dgsi.pt, onde se sustentou que “Observados que se mostrem os critérios de dosimetria concreta da pena, sobra uma margem de atuação do julgador dificilmente sindicável”.
[11] Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico, convertido pelo Lince Composto e revisto pelo relator (artigo 94º, nº2, do Código de Processo Penal).