Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6811/11.4YYPRT-I.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RUI MOREIRA
Descritores: SUSPENSÃO DA EXECUÇÃO
Nº do Documento: RP202206216811/11.4YYPRT-I.P1
Data do Acordão: 06/21/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 2. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O regime de suspensão da execução estabelecido no art. 818º do CPC, na versão do D.L. 226/2008, dispõe que se tiver havido citação prévia, suspende-se a execução desde que o executado preste caução; se não tiver havido citação prévia, o que pressupõe ter havido penhora de bens antes da citação, o recebimento da oposição suspende a execução.
II - A suspensão da execução tem por contrapartida estar assegurado o pagamento do crédito exequendo: se não tiver havido penhora, por ter sido prévia a citação, a prestação de caução garante a satisfação do crédito; se tiver havido penhora, os bens penhorados garantem essa mesma satisfação, podendo suspender-se a execução com o recebimento da oposição.
III - Na circunstância de a execução exigir a citação prévia do executado, mas tendo sido efectivadas penhoras antes do termo do prazo de oposição, que se mantêm activas, deve suspender-se a execução, aplicando-se por analogia a regra do nº 2 do art. 818º do CPC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: PROC. 6811/11.4YYPRT-D.P1

Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo de Execução do Porto -Juiz 1

REL. N.º 690
Relator: Rui Moreira
Adjuntos: João Diogo Rodrigues
Anabela Andrade Miranda
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ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

1- RELATÓRIO

Por apenso à execução que lhe move o Banco 1..., veio AA deduzir oposição, pretendendo a suspensão da própria execução, arguindo a incompetência do tribunal, a declaração de nulidade do requerimento executivo e da citação, a ineptidão desse mesmo requerimento, a inexistência de título executivo e, subsidiariamente, a inexigibilidade do título por falta de protesto, a nulidade ou anulabilidade do aval por si prestado, a nulidade da relação causal e a sua absolvição do pedido exequendo, pelo menos parcial.
Alegou que, por ter pedido apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, cuja decisão negativa impugnou, deveria ter-se por suspensa a execução, até que pudesse deduzir oposição. Porém, a execução acabou por prosseguir, tendo sido citado para se opor à penhora.
Realizaram-se penhoras, que arguiu de nulas, afirmando ainda que, nessa hipótese, os bens penhorados poderão servir de caução para efeitos de suspensão da execução, nos termos do art. 818º, nº 1 do CPC (na versão anterior do CPC), uma vez que o seu valor comercial é superior a 16 milhões de euros, sendo que é dono de metade dos mesmos.
Alegou também outra matéria, a propósito dos demais fundamentos da sua oposição, que ao caso não interessa.
Nos autos de execução, teve, depois, lugar um despacho que afirmou que o apoio judiciário havia sido indeferido, não tendo havido impugnação nem sido formulado novo pedido de apoio judiciário, pelo que não poderiam considerar-se suspensos os termos da execução.
O executado veio interpor recurso desse despacho, naqueles autos, em 3/6/2013, requerendo, a final: “… deve ser dado provimento ao presente recurso e, por via dele, ser revogada a douta decisão recorrida, sendo substituída por outra que ordene o levantamento da penhora por ter sido feita durante o decurso do prazo de defesa do Executado que se mantêm interrompido, nos termos do n.° 4 e 5 do art. 24° da Lei 34/2004, em face de ter sido apresentada impugnação judicial do indeferimento do pedido de apoio judiciário que não se encontra decidida, tudo com as legais consequências.”
Depois de algumas incidências processuais, nestes autos de oposição, que incluíram a decisão pela extemporaneidade da própria oposição, o recurso de apelação desta decisão, a respectiva revogação por acórdão deste TRP e o subsequente processamento dos autos, em 25/1/2022, realizou-se audiência preliminar onde se decidiu que, atentando no facto de as penhoras a que se refere o recurso referido terem sido declaradas nulas por decisão transitada em julgado, nada mais haveria que resolver a esse propósito.
Sucessivamente, sobre o pedido de suspensão da execução, foi proferido o seguinte despacho:
“Dispunha o art.° 818 n.° 1 do CPC (Código do CPC aplicável a estes autos) que:
1 - Havendo lugar à citação prévia do executado, o recebimento da oposição só suspende o processo de execução quando o opoente preste caução ou quando, tendo o opoente impugnado a assinatura do documento particular e apresentado documento que constitua princípio de prova, o juiz, ouvido o exequente, entenda que sejustfica a suspensão.
Tendo em consideração que o opoente na oposição à execução deduzida, não requereu a prestação de caução, não impugnou a genuinidade da letra e assinatura aposta no titulo, sendo que os demais argumentos defensivos o não justificam, atenta a natureza da obrigação exequenda e a factualidade em discussão no âmbito da presente oposição à execução, indefiro a suspensão dos autos principais de execução sem a prestação de caução por parte do executado/embargante.
Por todo o exposto, não suspendo a execução dos autos principais, nos termos do 818.° do CPC,
Notifique.
Dê conhecimento de imediato ao senhor AE, para que prossiga ulteriores termos na execução.”
De seguida, foi proferido despacho saneador, foi conhecida e julgada improcedente a excepção de inexistência de título executivo e a da inexigibilidade por falta de protesto das livranças dadas à execução, foi seleccionada a matéria assente e organizada a base instrutória.
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É desta decisão que vem interposto recurso, pelo opoente, que lhe imputa a nulidade por omissão de pronúncia (apesar de referir que isso ocorre em relação a um acórdão da Relação), além de impugnar a decisão que indeferiu a sua pretensão de suspensão da execução.
Afirma: “A Sentença limitou-se a fazer uma apreciação linear de um pedido de suspensão.
Não se manifestou quanto ao enquadramento do pedido de suspensão no número 2 do artigo 818°.
Acresce que se limitou a referir que o Opoente não requereu a prestação de caução, não se pronunciando quanto a ter sido requerido que na eventualidade de se entender que houve citação prévia do Executado, os bens dos Exequentes já penhorados nos autos, fossem considerados caução bastante para efeitos do previsto no art. 818° n° 1 do C.P.C.
Não tendo o Tribunal a Quo se pronunciado quanto a estas questões, é, nessa medida a sentença nula nos termos do artigo 668° n° 1 al. d), do C.P.C.”
Termina o seu recurso formulando as seguintes conclusões:
A) Em sede de Oposição o Recorrente requereu a suspensão do processo
B) No dia 28 de Novembro de 2011 o Opoente foi citado para se opor à execução.
C) Tal citação foi feita nos termos do artigo 818° n° 1 do C.P.C., ou seja, houve citação prévia do Executado.
D) Tendo o Opoente apresentado, em tempo, pedido de apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e nomeação e pagamento da compensação ao patrono, interrompeu-se o prazo de oposição que se encontrava em curso.
E) No entanto, por notificação datada de 03.04.2013, o Opoente foi notificado para deduzir oposição à penhora.
F) Tal penhora foi intempestiva e ilegal, e mesmo violadora dos direitos constitucionais de defesa do Opoente.
G) O Opoente alegou a ilegalidade de tal penhora mas não lhe foi dada razão. Por esse motivo juntou procuração aos autos, tendo apresentado recurso de tal despacho, bem como Oposição.
H) A Oposição foi inicialmente considerada intempestiva, decisão essa revogada pelo Tribunal da Relação.
I) O Recurso apresentado relativamente à penhora foi apresentado fora de prazo, pelo que a decisão de primeira instância apesar de citada (o que respeitosamente tem de se referir) se consolidou.
J) Ou seja: houve citação, que se pretendia prévia, e antes do decurso do prazo para apresentação da oposição, houve penhoras.
K) De facto, e mesmo de direito, a citação não foi prévia.
L) Nos termos do n° 2 do art° 818° do C.P.C. não havendo lugar à citação prévia, o recebimento da oposição suspende o processo de execução,
M) Com esse fundamento requereu o Opoente a suspensão da execução.
N) Subsidiariamente, e para a eventualidade de se entender que houve citação prévia do Executado, requereu que os bens dos Exequentes já penhorados nos autos, fossem considerados caução bastante para efeitos do previsto no art. 818° n° 1 do C.P.C.
O) Alegou que o valor comercial dos bens (indevidamente) penhorados é superior a 16.000.000,00€, tendo-se disponibilizado a juntar avaliação idónea comprovativa do alegado, caso fosse entendido relevante
P) Assim sendo, mesmo sendo o Exequente proprietário só de metade dos prédios, tal quota parte seria bastante para caucionar a execução e assegurar a sua suspensão.
Q) Nesses termos, quer se considerasse ser aplicável o 818° n° 2 ou o 818 n° 1, o recebimento da oposição sempre teria como efeito a suspensão do processo de execução, o que foi requerido.
R) Em sede de despacho saneador, o Tribunal a Quo manifestou-se quanto à suspensão requerida nos seguintes termos: Dispunha o art.° 818 n.° 1 do CPC (Código do CPC aplicável a estes autos) que: 1 -Havendo lugar à citação prévia do executado, o recebimento da oposição só suspende o processo de execução quando o opoente preste caução ou quando, tendo o opoente impugnado a assinatura do documento particular e apresentado documento que constitua princípio de prova, o juiz, ouvido o exequente, entenda que se justifica a suspensão.
Tendo em consideração que o opoente na oposição à execução deduzida, não requereu a prestação de caução, não impugnou a genuinidade da letra e assinatura aposta no titulo, sendo que os demais argumentos defensivos o não justificam, atenta a natureza da obrigação exequenda e a factualidade em discussão no âmbito da presente oposição à execução, indefiro a suspensão dos autos principais de execução sem a prestação de caução por parte do executado/embargante. Por todo o exposto, não suspendo a execução dos autos principais, nos termos do 818.° do CPC.
S) Perante isto o Recorrente invoca nulidade da Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação por omissão de pronúncia nos termos do 668° n° 1 al. d), do C.P.C.
T) A Sentença limitou-se a fazer uma apreciação linear de um pedido de suspensão.
U) Não se manifestou quanto ao enquadramento do pedido de suspensão no número 2 do artigo 818°.
V)Acresce que se limitou a referir que o Opoente não requereu a prestação de caução, não se pronunciando quanto a ter sido requerido que na eventualidade de se entender que houve citação prévia do Executado, os bens dos Exequentes já penhorados nos autos, fossem considerados caução bastante para efeitos do previsto no art. 818° n° i do C.P.C.
W) Não tendo o Tribunal a Quo se pronunciado quanto a estas questões, é, nessa medida a sentença nula nos termos do artigo 668° n° 1 al. d), do C.P.C.
X) Pelos motivos acima expostos deverá a decisão quanto à não suspensão da execução dos autos principais ser revogada, proferindo-se decisão em sentido oposto:
- Quer se entenda que a presente situação cabe na previsão do artigo 818 n° 1 do C.P.C. devendo, nessa hipótese a quota dos prédios do Exequente penhorados previamente à Oposição ser considerados caução bastante
- Quer se entenda que a presente situação cabe na previsão do artigo 818 n° 2 do C.P.C., porquanto de facto, e mesmo de direito, a citação não foi prévia, e nos termos da referida disposição legal não havendo lugar à citação prévia, o recebimento da oposição suspende o processo de execução,
Decidindo deste modo, farão Vas. Exas., aliás como sempre, um acto de INTEIRA E SÃ JUSTIÇA.”
O exequente Banco 1..., opoído e agora apelado, respondeu, pronunciando-se pela falta de fundamento do recurso e pela confirmação da decisão recorrida.
O recurso foi admitido como apelação, com subida em separado e efeito devolutivo.
Cumpre decidi-lo.
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2- FUNDAMENTAÇÃO:

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - arts. 635º, nº 4 e 639º, nºs 1 e 3 do CPC.
Assim, cumprirá decidir se deveria ter sido determinada a suspensão da execução, ou por se considerar que não deveria haver citação prévia, o que determinaria a suspensão como efeito do recebimento da oposição; ou por se considerar que, tendo havido citação prévia, o executado se disponibilizou para prestar caução, oferecendo o seu direito sobre os bens entretanto penhorados. E, neste caso, se a decisão recorrida é nula, por ter omitido a pronúncia sobre uma tal questão.
É, porém, oportuno referir que as afirmações do apelante sobre uma alegada nulidade do acórdão do TRP, por não ter apreciado essa mesma questão (cfr. al. S) das conclusões acima transcritas), são absolutamente impertinentes no âmbito deste recurso.
Com efeito, quer no corpo das alegações de recurso, quer na referida conclusão S), o apelante refere “…o Recorrente invoca nulidade da Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação por omissão de pronúncia nos termos do 668° n° 1 al. d), do C.P.C.”. O único acórdão a que o apelante parece poder referir-se é aquele que, depois de rejeitada a oposição à execução por extemporaneidade, revogou essa decisão e determinou o recebimento da oposição. Porém, como é óbvio, não poderá ser no âmbito do presente recurso que se poderá conhecer de uma nulidade apontada àquele acórdão, há muito transitado em julgado.
Em qualquer caso, certo é que no âmbito deste recurso não pode integrar-se a apreciação de qualquer nulidade que pretendesse ser imputada àquele outro acórdão, pois que o objecto a apreciar é, aqui, exclusivamente composto pelas questões suscitadas em relação ao despacho do tribunal a quo que indeferiu a pretensão de suspensão da execução.
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Nos termos do art. 6º, nº 3 da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, que aprovou o novo Código de Processo Civil, à presente execução e à oposição que lhe foi oferecida deve aplicar-se o regime processual anterior, tal como bem o entenderam as partes e o tribunal recorrido.
Com relevo para a questão a decidir, que é, na essência, se a execução deve ser ou não suspensa, nas concretas circunstâncias do caso, dispõe o art. 818º, nos seus nºs 1 e 2, do CPC anterior:
1 - Havendo lugar à citação prévia do executado, o recebimento da oposição só suspende o processo de execução quando o opoente preste caução ou quando, tendo o opoente impugnado a assinatura do documento particular e apresentado documento que constitua princípio de prova, o juiz, ouvido o exequente, entenda que se justifica a suspensão.
2 - Não havendo lugar à citação prévia, o recebimento da oposição suspende o processo de execução, sem prejuízo do reforço ou da substituição da penhora.
Foi à luz deste regime que o tribunal, no despacho recorrido, considerou que a presente execução estava sujeita a citação prévia, bem como que, não tendo o executado oferecido caução, deveria prosseguir a execução, indeferindo a suspensão por este requerida.
O conteúdo desta decisão exclui, ab initio, a ocorrência da nulidade que lhe é apontada.
Com efeito, a questão colocada pelo executado/requerente foi expressamente conhecida. O tribunal considerou que a execução em questão é uma execução sujeita a citação prévia, o que excluiu a aplicação do nº 2 do art. 818º. Para a sua decisão ser completa, não carecia de justificar o afastamento desta norma, pois que tal resulta necessariamente da conclusão pela aplicabilidade da regra do nº 1.
Além disso, o tribunal afirmou expressamente que o opoente não se ofereceu para prestar caução, bem como que não se verificava qualquer das outras hipóteses previstas pelo nº 1 do art. 818º. Por isso, não ignorou a questão referente à prestação de caução. Simplesmente assumiu não ter efeito, enquanto requerimento tendente à prestação de caução, a declaração do exequente, oferecendo como caução o seu direito em relação aos bens penhorados (de 1/2 ou 1/6 da propriedade de cada um deles, consoante os casos).
Caberá discutir o mérito destas conclusões contidas na decisão em crise. Porém, certo é que inexistiu omissão de pronúncia quanto às questões correspondentes. Pelo contrário, o tribunal decidiu-as claramente.
Assim, rejeita-se que a decisão recorrida padeça do vício de omissão de pronúncia, que resultaria na sua nulidade, nos termos da al. d) do nº 1 do art. 668º do CPC (na versão aplicável, como já se referiu).
Haverá, assim, de discutir-se do respectivo mérito.
Para este efeito, importa ter presentes alguns elementos que resultam do próprio processo executivo, bem como destes autos, a saber:
1 – O processo executivo a que estes autos respeitam iniciou-se em 18/10/2011, tendo sido dadas à execução duas livranças avalizadas pelo executado ora apelante e outro, as quais serviam de garantia de contratos de mútuo celebrados com N..., S.A., previamente declarada insolvente.
2 - No dia 28 de Novembro de 2011, o opoente foi citado para se opor à execução.
3 – Em 22/02/2012 foram penhorados direitos do ora apelante sobre diversos prédios.
4 – Em 30/3/2012 foi proferido o seguinte despacho: “Por força do pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, devidamente comprovado nos autos, os prazos em curso interromperam-se (…). Nos termos do artº 832º nº 1 do CPC as diligências para penhora só se iniciam mediante notificação da secretaria ao solicitador de execução, depois de proferido despacho que dispense a citação prévia ou de decorrido, sem oposição do executado previamente citado ou com oposição que não suspenda a execução, o prazo estabelecido no nº 6 do artº 812º. Resulta do supra exposto que a penhora não deveria ter sido efectuada (…)”
5 – Em 19/6/2012, foi proferido o seguinte despacho: “(…) A fls. 241, junção efectuada em 12 de Abril p.p., foi junta aos autos a decisão da Segurança Social a comunicar o indeferimento do pedido de apoio judiciário. Significa o supra exposto que as penhoras efectuadas o foram durante o período de suspensão do prazo para dedução da oposição, em violação do preceituado no artº 832º nº 1 b) do CPC. (…) A realização da penhora durante o decurso do prazo de oposição precludiu a possibilidade de, por exemplo, os opoentes pedirem a prestação de caução, obstativa da penhora. A notificação efectuada para dedução de oposição à penhora, ainda a decorrer o prazo de oposição, sem que estivesse definido o pedido de apoio judiciário, impediu-os, além mais de, por exemplo, lançarem mão da faculdade conferida pelo artº 834º nº 3 a) e nº 5 do CPC. (…) Assim, determino a nulidade das penhoras efectuadas no decurso do prazo de dedução de oposição (incluindo as subsequentes notificações para dedução de oposição à penhora) e determino o levantamento das mesmas após trânsito em julgado deste despacho.
(…) Por força das comunicações da Segurança Social juntas a fls. 241 e 245 verifica-se que o prazo para eventual dedução de oposição à execução reiniciou-se (artº 24º nº 5 b) da Lei nº 34/2004 de 29 de Julho) e está já esgotado. Notifique-se o senhor agente de execução em conformidade.”
6 – Em 16/1/2013 foi efectuada nova penhora dos direitos do executado sobre os imóveis antes referidos.
7 – Em 3/6/2013, o ora apelante apresentou a presente oposição à execução, que foi indeferida por extemporaneidade.
8 – Após recurso, decidido em 17/12/2014, foi determinada a admissão da oposição; em 23/1/2015 foi apresentada contestação; realizou-se audiência preliminar em 25/1/2022, onde foi proferida a decisão recorrida.
9 – A execução encontra-se em curso, na fase de venda dos bens penhorados.
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O regime de suspensão da execução estabelecido no art. 818º do CPC tem uma lógica facilmente apreensível:
- Se tiver havido citação prévia, suspende-se a execução desde que o executado preste caução (sem prejuízo das hipóteses em que o executado vem lançar dúvidas fundadas sobre o título executivo constituído por documento particular);
- Se não tiver havido citação prévia, o que pressupõe ter havido penhora de bens antes da citação, o recebimento da oposição suspende a execução.
Vê-se, assim, que a suspensão da execução tem por contrapartida ter sido assegurado o pagamento do crédito exequendo: se não tiver havido penhora, por ter sido prévia a citação, a prestação de caução assegura o crédito exequendo; se tiver havido penhora, os bens penhorados garantem o pagamento do crédito exequendo, podendo suspender-se a execução com o recebimento da oposição. Em qualquer das hipóteses, não advém prejuízo irrazoável para o exequente com a demora decorrente da suspensão da execução, pois que a satisfação do seu crédito se mostra garantida, ora por via da caução, ora por via da penhora.
No caso em apreço, atentos os títulos exequendos e o disposto no art. 812º-C e no art. 832º, nº 1, al. b) do CPC, o processo executivo haveria de se iniciar com a citação dos executados, designadamente do ora apelante.
Foi precisamente isso que determinou a declaração de nulidade das penhoras de direitos sobre imóveis que o solicitador de execução efectivou em 22/2/2012: terem sido tais penhoras executadas depois de citados os executados, mas enquanto ainda estava em aberto a possibilidade de deduzirem oposição, bem como a de prestarem caução, pois que o prazo para o efeito havia sido suspenso por efeito da formulação de pedidos de apoio judiciário, na modalidade de nomeação de patrono.
Foi, também, isso que foi tido por assente na decisão sob recurso: a presente execução exige a citação prévia (prévia em relação à penhora, obviamente) do executado.
Neste pressuposto, a penhora, precedida pelas diligências e consultas necessárias, só poderia iniciar-se no prazo de cinco dias contados do termo do prazo para a oposição, sem que esta tenha sido deduzida, ou da notificação do despacho que tenha recebido a oposição e não tenha suspendido a execução nos termos do art. 818º. É o que dispõem as als. b) e c) do nº 1 do art. 832º do CPC.
No caso, todavia, algo de incongruente aconteceu: estando afastada a hipótese prevista no nº 2 do art. 818º, de haver penhora antes da citação e, portanto, de os bens penhorados garantirem o crédito exequendo, permitindo que a apresentação de oposição determinasse a suspensão da execução, a rejeição da oposição, por extemporaneidade, veio facultar a concretização das penhoras; mas a ulterior revogação dessa decisão pelo TRP conduziu a que a oposição viesse a ser apresentada depois da penhora.
Assim, na perspectiva da aplicação das soluções prescritas nos nºs 1 e 2 do art. 818º do CPC, cumpre constatar que, tendo sido admitida a oposição (por efeito do acórdão do TRP), quando isso ocorreu já havia direitos penhorados nos autos que garantiam o pagamento do crédito exequendo. O que não deveria acontecer, atento o disposto no art. 832º.
É isto que torna compreensível a pretensão do executado/opoente, de que tais direitos fossem considerados a título de caução, em ordem à suspensão da execução, como exigido por essa regra do nº 1; ou, em alternativa, que se reconheça que a citação não foi prévia, pelo que do recebimento da oposição deve decorrer a suspensão, segundo o nº 2.
Acresce que, exigir a prestação de caução para suspender o prosseguimento da execução, em ordem a garantir a satisfação do crédito exequendo durante a tramitação da oposição, conduziria a duplicar essa garantia, pois que a tal já estão destinados os bens que anteriormente haviam sido penhorados. Anteriormente, recorde-se, entre o momento da penhora e o da decisão que determinou que deveria ter-se por eficaz a oposição entretanto apresentada, pois que foi tida por tempestiva, em função do processamento de um incidente de apoio judiciário.
Temos, pois, que concluir que, embora a presente execução seja subsumível ao regime de tramitação com citação prévia, segundo o qual a penhora só deveria ocorrer depois do termo do prazo da oposição e sem que esta tenha sido oferecida, ou depois da notificação ao agente de execução do despacho que não suspenda a execução [als. b) e c) do nº 1 do art. 832º], o facto é que, nestes autos, as penhoras tidas por necessárias foram concretizadas antes de terminado o prazo para o oferecimento de oposição. E mantêm-se activas. Portanto, tudo se passou como se não tivesse ocorrido citação prévia.
Então, por tal ser uma situação análoga à prevista no nº 2 do art. 818º do CPC, deve ser-lhe atribuído o efeito previsto nesta norma, isto é, deve suspender-se a execução como efeito do recebimento da oposição. E, como acima se referiu, bem se compreende este efeito, na medida em que a permanência das penhoras efectuadas nos autos são adequadas à garantia de satisfação do crédito exequendo, sem prejuízo do seu reforço ou substituição, como previsto nessa mesma norma.
Procederá, nestes termos, a presente apelação, revogando-se, nessa medida, a decisão recorrida, que se substitui por outra que determina a suspensão dos termos da execução.
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Sumariando:
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3 - DECISÃO

Pelo exposto, acordam os juízes que integram esta secção do Tribunal da Relação do Porto em revogar a decisão recorrida, que se substitui por outra que, deferindo a pretensão do opoente, determina a suspensão dos termos da execução.

Custas pelo apelado.

Registe e notifique.

Porto, 21/06/2022
Rui Moreira
João Diogo Rodrigues
Anabela Miranda