Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
8950/20.1T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO DAMIÃO E CUNHA
Descritores: DIREITO DE PREFERÊNCIA
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
ARRENDATÁRIO
Nº do Documento: RP202104128950/20.1T8PRT.P1
Data do Acordão: 04/12/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A lei reguladora do direito de preferência do arrendatário é a vigente na data em que se concretizou o acto de transmissão.
II - Em face do art. 1091º do CC, na versão introduzida pela Lei nº 6/2006 de 27-02, aplicável ao caso dos autos, o arrendatário habitacional de uma parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal não goza do direito legal de preferência na compra e venda do prédio, direito apenas reconhecido ao arrendatário de todo o prédio urbano ou de fracção autónoma do mesmo prédio.
III - A circunstância de o local arrendado em parte do prédio não constituído em propriedade horizontal ser passível de autonomização material ou mostrar-se inscrito na matriz como realidade fiscal autónoma é irrelevante para o exercício do direito de preferência, porque, enquanto não se proceder à constituição da propriedade horizontal, a autonomia material dos espaços arrendados não têm qualquer significado jurídico, não podendo estes, nessas circunstâncias, ser objecto de negócio jurídico.
IV - Isso resulta bem evidente do próprio funcionamento do exercício do direito de preferência, pois que, por força desse exercício, o preferente substitui-se na posição do comprador na compra e venda, objecto da preferência. Ora, isso só pode suceder se o aludido objecto da preferência estiver legalmente autonomizado, não podendo ser objecto de compra e venda um espaço materialmente dividido de um prédio que não tenha individualização jurídica - cfr. arts. 202º, 203º e 408º, nº 2 do CC”.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO Nº 8950/20.1T8PRT.P1
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Sumário (elaborado pelo Relator- art. 663º, nº 7 do CPC):
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Comarca do Porto - Juízo Local Cível – J4
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Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto.
I. RELATÓRIO.
Recorrente(s): - B… e C… (Autores);
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B… e C… intentaram a presente acção declarativa contra D…, Lda., e contra E…, com os seguintes pedidos:
A) Reconhecer-se o direito de preferência dos autores na venda efectuada por escritura pública, pelo preço de €10 000,00, do prédio urbano locado situado na …, n.º.., freguesia …, concelho do Porto, composto de casa de rés-do-chão com logradouro com a área coberta de 38,50m2 e com a área descoberta de 38,5m2, inscrito na matriz sob o artigo 5349 da freguesia … do Concelho do Porto e actualmente descrito na Conservatória de Registo Predial do Porto sob o n.º10859 da mesma freguesia … e o direito dos autores de haverem para si esse prédio alienado, mediante o depósito do respectivo preço de €10 000,00, ou se assim não se entender, mediante tal depósito e ainda o das despesas de €1 243,78;
B) Declarar-se que os autores são titulares do direito de propriedade sobre esse prédio, ordenando-se o registo da sua aquisição a favor dos autores e o cancelamento do registo da sua aquisição a favor do réu E… e eventuais registos de aquisição posteriores a favor de outras pessoas que não os autores.
Alegaram, para tal e em suma, que por contrato de arrendamento celebrado em 1 de Janeiro de 1966 entre F… e o autor B… aquela deu de arrendamento ao autor o prédio urbano sito na …, n.º.., freguesia …, Porto, inscrito na matriz sob o artigo 5349 composto de casa de habitação de rés-do-chão com logradouro, contrato que se manteve em vigor. Mais alegaram que foi comunicado ao inquilino/autor por carta datada de 9 de Março de 2006, registada, que a então proprietária iria constituir uma sociedade imobiliária e transferir os seus imóveis para tal sociedade, pelo valor correspondente ao valor patrimonial e desde então o autor passou a depositar o valor da renda mensal na conta indicada na comunicação.
Mais alegaram que em 7 de Novembro de 2019 tomaram conhecimento que a D… por escritura pública vendeu pelo preço de €30.000,00 o prédio urbano composto por três casas, duas de rés-do-chão e uma de rés-do-chão e andar, com quintal, inscritos na matriz predial sob os artigos 5349, 5350 e 7865, descrito na Conservatória de Registo Predial do Porto sob o n.º5184, constando arquivado no Cartório os extractos da declaração para liquidação de imposto municipal, constando como o valor aí declarado como sendo o valor de transmissão o de €10.000,00 para cada artigo matricial.
Mais alegaram que os réus não comunicaram aos autores o projecto da venda e a cláusulas do respectivo contrato, pelo que só tomaram conhecimento da mesma em 19/11/2019.
Por fim, alegaram que os prédios por serem de construção anterior a 1973 não estavam sujeitos a loteamento, podendo por isso ser prédios autónomos e aliás o comprador requereu a desanexação do prédio que passou a estar autonomamente descrito na CRP sob o n.º 10859, tendo assim o prédio à data da escritura condições para ser um prédio autónomo.
Procederam a dois depósitos autónomos, um no montante de €10.000,00 e outro de €1.243,78.
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A acção foi registada.
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Os réus foram citados, com a advertência de que a falta de contestação importa a confissão dos factos articulados pelos autores.
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Decorrido o prazo legal para contestar, não foi deduzida contestação por parte dos réus, pelo que foram declarados confessados os factos alegados na petição inicial.
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De seguida, foi proferida a sentença que julgou totalmente improcedente as pretensões dos AA.
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É justamente desta decisão que os recorrentes vieram interpor o presente Recurso, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Corridos os vistos legais, cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do(s) recorrente(s), não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do CPC.
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No seguimento desta orientação, os Recorrentes colocam a seguinte questão que importa apreciar:
- Saber se têm direito a exercer direito de preferência quanto ao local arrendado tendo em conta a alegada natureza autónoma do mesmo em relação às demais partes do prédio alienado (o local arrendado correspondente a parte do imóvel vendido).
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A) - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
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III- Fundamentação:
A-Fundamentação de Facto: Factos Assentes:
1- Em 1 Janeiro de 1966 F… cedeu ao autor B…, por contrato verbal, o uso e fruição do prédio urbano sito na …, nº .., freguesia …, Porto, inscrito na matriz sob o artigo 5349 composto de casa de habitação de rés do chão com logradouro.
2- Pelo prazo de um ano renovável, com destino a habitação, mediante a renda anual de seis mil escudos a pagar em duodécimos de quinhentos escudos, no primeiro dia do mês anterior ao que disser respeito.
3- Contrato que se mantem em vigor.
4- Por carta datada de 9 de Março de 2006 e registada no dia 13 desse mês, pela então proprietária e senhoria F… foi comunicado ao autor: “ Por razões de ordem pessoal e por necessidade de gerir o meu património imobiliário convenientemente, constitui uma sociedade imobiliária designada por D…, Lda., pelo que irei transferir os meus imóveis para essa sociedade, pelo valor correspondente ao respectivo valor patrimonial, assim, informo V. Exª que no próximo mês os recibos de renda serão emitidos por aquela sociedade, devendo o depósito da renda passar a ser realizada na conta do G… com o NIB …………………(...).”
5- Desde então o autor passou a depositar na conta com o NIB aí indicado a renda mensal, presentemente no valor de € 28,00.
6- Os autores vieram a saber em 7 de Novembro de 2019 na CRP (Conservatória do Registo Predial) do Porto através da fotocópia não certificada o registo de aquisição do locado com base em compra do réu (casado em regime de separação de bens) à dita sociedade D…, Lda. e a sua descrição na Conservatória sob o nº 10859 da freguesia …, desanexado do nº5184/20050926.
7- E em 19 de Novembro de 2019 os AA. viriam a obter cópia da escritura a que respeita a dita compra, cópia emitida em 20 de Janeiro de 2020.
8- Nessa escritura outorgada em 17 de Agosto de 2016 em que figura como primeira outorgante G…, na qualidade de gerente e em representação da dita D… e como segundo outorgante o aqui réu E… ficou a constar que aquela, na referida qualidade, “pelo preço de TRINTA MIL EUROS, que já recebeu, vende ao segundo outorgante o prédio urbano composto por três casas, duas de rés do chão e uma de rés do chão e andar, com quintal, sito na …, números .., .., .., .., .. e Rua …, número …, freguesia …, concelho do Porto, inscrito na matriz sob os artigos 5349, 5350 e 7865, com o valor patrimonial tributário de 75.648,77€, descrito na Conservatória do Registo Predial do Porto sob o número cinco mil cento e oitenta e quatro, com aquisição registada a favor da sua representada pela inscrição com apresentação mil e cinquenta e oito, de vinte e quatro de Março de dois mil e quinze.”
9- Tendo em 16-11-2019 o autor pedido certidão permanente de registo predial online que após pagamento lhe foi disponibilizada em 18-11-2019 e obteve certidão com o teor da informação total no SIRP da descrição e inscrições referentes ao dito prédio descrito sob o nº 5184/20050926 da freguesia … do concelho do Porto.
10- Como consta da dita escritura, ficaram arquivados pela Exma. Notária nomeadamente, extractos da declaração para liquidação do imposto municipal sobre as transmissões onerosas de imóveis (IMT) e para liquidação do imposto de selo, respectivamente, com os nºs ……….......... e ……….........., solicitados em Janeiro de 2020 e enviados à Exma. Notária e remetidos por esta em finais desse mês, primeiro por e-mail e depois por carta registada de dia 30, dos quais se alcança que o valor aí declarado como sendo o valor de transmissão de cada um dos prédios de cada artigo matricial foi de € 10.000,00, ou seja, no total € 30.000,00.
11- Tendo ficado ainda arquivadas as três cadernetas prediais pelas quais a Exma. Notária verificou que o prédio vendido foi inscrito na matriz antes de 7/8/1951, de construção anterior ao ano de 1973
12- Os réus não comunicaram aos autores o projecto da referida venda do locado e as cláusulas do respectivo contrato, nomeadamente a identificação do comprador e o preço de venda e condições do seu pagamento.
13- Das quais os AA. só viriam a tomar conhecimento através da cópia da escritura obtida em 19.11.2019.
14- À data da escritura pública, 17 de Agosto de 2016, o prédio descrito na Conservatória sob o nº 5184 da freguesia …, Porto era composto por três casas, duas de rés do chão e uma de rés do chão e andar, com quintal, sito na …, números .., .., .., .., .. e Rua …, número …, freguesia …, concelho do Porto, e estava inscrito na matriz sob os artigos 5349, 5350 e 7865.
15- Em 20 de Agosto de 2019 o réu E… viria a requerer a desanexação do prédio locado com a indicação da composição que o mesmo já tinha “: 1) Prédio urbano situado na …, nº .., composto de casa de habitação de rés do chão com logradouro, com a SC de 38,50m2 e a SD de 38,50m2, num total de 77m2 inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 5349”.
16- Na sequência do que o prédio locado foi desanexado do prédio descrito na CRP do Porto sob o nº 5184 da freguesia … e passou a estar autonomamente descrito nessa CRP sob o nº 10859 da mesma Freguesia”.
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Está também provado que:
“que os autores comprovaram em 17-06-2020, com base nos documentos juntos com o seu requerimento dessa data, que depositaram as quantias de € 10.000,00 do preço da venda do prédio locado e de € 1.243,78 de despesas discriminadas no artigo 30º da p. i.” – facto que decorre dos autos (atendendo-se à impugnação deduzida pelos recorrente, sem necessidade de mais alongadas considerações)
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B) - FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Já se referiu em cima qual é a questão que importa aqui decidir.
Como bem salientou o tribunal recorrido, tal questão deve ser apreciada em relação à data em que a compra e venda concretizada pelos RR. foi efectivada, ou seja, em 17 de Agosto de 2016.
Com efeito, constitui entendimento unânime do Supremo Tribunal de Justiça que a lei reguladora do direito de preferência é a vigente na data em que se concretizou o acto de transmissão, por o direito legal de preferência configurar uma factualidade que integra o conteúdo do direito do arrendatário que apenas se transforma em direito potestativo quando o senhorio não lhe ofereceu a preferência[1].
Nesta conformidade, o reconhecimento do direito de preferência peticionado pelos recorrentes (que foi exercido apenas em função do arrendado e não do imóvel global) deve partir da análise da natureza juridicamente autónoma (ou não autónoma) do arrendado em relação ao bem imóvel em que se integrava à data em que foi realizada a compra e venda do imóvel na sua totalidade.
O tribunal recorrido concluiu que, na referida data, o arrendado não detinha aquela autonomia, considerando que:
“… os autores não alegaram, nem tal resultou assente, que o prédio na data da alienação estivesse constituído em propriedade horizontal. E, nesta conformidade, seguindo o entendimento maioritário da jurisprudência dos nossos tribunais superiores já citada, a que acresce, ainda, a do douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 23/3/2020 (relator senhor Desembargador Carlos Gil – será Márcia Portela) «No caso de venda de imóvel composto por diversas habitações em andares não constituído em propriedade horizontal, antes da alteração do artigo 1091.º do Código Civil introduzida pela Lei 64/2018 de 29 de Outubro, o arrendatário de apenas um dos andares integrantes do imóvel não goza do direito de preferência». Assim, no caso dos autos, não pretendendo os autores exercer o direito de preferência sobre a totalidade do prédio vendido, mas somente do rés-do-chão e logradouro do qual são arrendatários, e não estando, na data da alienação, o prédio sujeito a propriedade horizontal não assiste aos autores o direito de preferência que pretendem fazer por via da presente acção. (…)
O que é certo é que na data da alienação o local arrendado não tinha autonomia jurídica para efeitos de preferência, apesar de inscrito em matriz predial (o que apenas releva para efeitos fiscais), e foi vendido como um único prédio (era essa a sua realidade jurídica na data da alienação) não constituído em propriedade horizontal, não assistindo aos autores o direito de preferência sobre o concreto local arrendado. Com efeito, atenta a data da celebração do negócio de compra e venda, a lei aplicável e a realidade jurídico do prédio alienado, imóvel composto de diversas habitações, mas não constituído em propriedade horizontal, o arrendatário só gozava de direito de preferência no caso da coincidência entre o bem arrendado e o bem vendido, o que não sucede nos autos, porquanto os autores apenas pretendem exercer o direito de preferência pelo preço de €10-000,00 quanto ao locado e não quanto à totalidade do prédio (que na data da alienação era um único prédio e foi vendido pelo preço de €30.000,00)”
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Os recorrentes insistem, no entanto, que o arrendado assumia essa natureza autónoma, fazendo apelo:
- à descrição do prédio que, em 2015 (Ap. 1058 de 2015/03/24) e à data da escritura de compra e venda mencionada na p. i., tinha a seguinte composição:
“a) casa de rés-do-chão, com 38,50 m2 e quintal de 38,50m2 – artº 5349;
b) casa de rés-do-chão, com 38,50 m2 e quintal de 38,50m2 – artº 5350;
c) casa de rés-do-chão e andar, com 41,50 m2 e quintal de 5 m2 – artº 7865;”
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- defendem que apesar de englobados numa única descrição predial tais prédios tinham autonomia em termos de inscrição matricial, autonomia essa que consta, inclusive, da própria descrição que agrega os artigos 5349, 5350 e 7865 sendo três inscrições matriciais, perfeitamente identificadas, e dessas inscrições constam os elementos fundamentais à caracterização de cada um dos prédios – vide v.g. docs. 13, 14 e 15 da p. i., tanto mais que tinham números de polícia individualizados, independentes, dois deles sitos na …, respectivamente nos nºs .. e .., e o outro sito na Rua …, nº … – vide v.g. documentos nºs 4, 9, 10, 13, 14 e 15 da p. i.
- alegam ainda que nada impedia que os mesmos pudessem ser autonomizados (não era necessária licença de utilização, nem estavam sujeitos a operações de loteamento); por isso, em 20.08.2019, o réu E… viria a requerer a desanexação do prédio locado com a indicação da composição que o mesmo já tinha, tendo o prédio locado sido desanexado do prédio descrito na CRP do Porto sob o nº 5184 da freguesia … e passou a estar autonomamente descrito nessa CRP sob o nº 10859 da mesma Freguesia.
Concluem que o prédio locado detinha em 2016 e, nomeadamente, à data da citada escritura, condições para ser, e era, um prédio autónomo e tanto assim que reunia então as referidas condições para a citada desanexação e para ter uma descrição predial individualizada, tal como veio a suceder e sucede actualmente.
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Julga-se que não têm razão, sendo de acolher a fundamentação do tribunal recorrido que rebateu já a argumentação dos recorrentes, com absoluta pertinência.
Senão vejamos.
O direito português conferiu desde cedo ao arrendatário urbano um direito de preferência, isto é, permitiu-lhe, em igualdade de condições, adquirir o local arrendado caso o senhorio o pretendesse alienar a terceiro.
Assim, e pela primeira vez, a preferência na venda por parte do arrendatário foi consagrada pela Lei nº 1662, de 04 de Setembro de 1924, embora então limitada ao arrendamento para comércio de indústria.
Posteriormente, seria publicada a Lei nº 2030, de 22 de Junho de 1948, que continuou a consagrar idêntico direito para os arrendamentos comerciais, e a exigir que o exercício da actividade no local arrendado o tivesse sido por um período mínimo de um ano; mas estendeu o direito de preferência em causa aos arrendamentos para o exercício de profissão liberal, bem como às situações de dação em pagamento.
As soluções referidas passariam integralmente para a redacção inicial do CC de 1966: no seu art. 1117º, nº 1, estabeleceu-se que, na venda, dação em cumprimento ou aforamento do prédio arrendado, os arrendatários que nele exercessem o comércio ou indústria há mais de um ano tinham direito de preferência, sucessivamente e por ordem decrescente das rendas; e no seu art. 1119º estabeleceu-se idêntico regime relativamente ao arrendamento para o exercício de profissão liberal.
Foi só com a Lei n.º 63/77, de 25 de Agosto, que se veio a consagrar o direito de preferência no arrendamento para habitação, lendo-se nomeadamente na mesma que: «O locatário habitacional de imóvel urbano tem o direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento do mesmo» (art. 1º, nº 1); «O locatário habitacional de fracção autónoma de imóvel urbano goza do direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento da respectiva fracção» (art. 1º, nº 2); e «Quando mais de um locatário habitacional exercer o direito de preferência, abrir-se-á entre eles licitação, revertendo o excesso para o alienante» (art. 2º, nº 1).
Posteriormente, o Regime do Arrendamento Urbano (R.A.U.). (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro), reafirmou o já então irrestrito direito legal de preferência do arrendatário urbano - para habitação, comércio e indústria, ou exercício de profissão liberal -, procedendo assim à harmonização dos antes dois desconformes regimes.
Passou-se a dispor, no seu art. 47º, que: «O arrendatário de prédio urbano ou de sua fracção autónoma tem o direito de preferência na compra e venda ou na dação em cumprimento do local arrendado há mais de um ano» (nº1); «Sendo dois ou mais os preferentes, abre-se entre eles licitação, revertendo o excesso para o alienante» (nº 2).
Logo, e de forma maioritária na doutrina[2] e na jurisprudência, entendia-se que:
- se o prédio estivesse constituído em propriedade horizontal, o direito de preferência do arrendatário só seria passível de ser exercido em relação à fracção autónoma de que fosse locatário, ainda que a concreta alienação ou dação em cumprimento envolvesse o prédio inteiro[3];
- já se o prédio não estivesse submetido àquele regime, o direito de preferência do arrendatário de parte dele (económica - mas não juridicamente - autonomizada) teria que ser exercido sobre todo o imóvel, assim se compreendendo que pudesse ter que haver licitação entre os eventuais vários arrendatários preferentes.
“Os argumentos subjacentes a este entendimento eram: (1) o alargamento do direito de preferência a todos os arrendamentos urbanos vinculísticos (que não apenas os destinados a comércio, indústria, profissões liberais ou habitação) e a consagração de novos direitos de preferência, designadamente a favor dos titulares de novo arrendamento e do senhorio em caso de trespasse; (2) a manutenção das designações de “prédio urbano” e “fracção autónoma”, o que implicaria que a limitação ao local arrendado apenas diria respeito aos casos de venda de prédio já constituído em propriedade horizontal; (3) a manutenção da norma que mandava proceder à licitação em caso de concurso de preferente, que ficaria sem campo de aplicação caso não se perfilhasse o entendimento de que estes poderiam preferir na totalidade do prédio; e, (4) o preâmbulo do diploma”[4].
Eram, assim, minoritária a posição daqueles[5] que entendiam que, face ao regime consagrado no R.A.U., nomeadamente face à expressão «local arrendado», o legislador teria pretendido a coincidência entre o objecto da preferência e o da habitação, pelo que não sendo esta juridicamente autonomizável, aquele não poderia ser exercido, nomeadamente sobre a totalidade do prédio.
O Novo Regime do Arrendamento Urbano (N.R.A.U.) - aprovado pela Lei nº 6/2006, de 27 de Fevereiro, e cujo art. 60º revogou o diploma anterior -, veio novamente reafirmar o direito legal de preferência do arrendatário urbano, consagrando-o no art. 1091º do CC - então aditado a este diploma fundamental -, dispondo-se no mesmo que:
“O arrendatário tem direito de preferência na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos” (nº 1, al. a)) [6].
Ora, como se pode ver, do citado art. 1091º do CC (na redacção anterior à reforma de 2018), face ao anterior art. 47º do R.A.U., deixou de fazer referência a «prédio urbano» e a «fracção autónoma» (substituindo-as por «local arrendado»), tendo ainda eliminado qualquer disposição prevendo a licitação entre plúrimos arrendatários interessados em exercer concorrentes direitos de preferência.
Veio, por isso, defender-se que o arrendatário do prédio não constituído em propriedade horizontal deixou de poder exercer o direito de preferência em relação a todo o imóvel (ao contrário do que anteriormente lhe seria reconhecido)[7].
Nesta conformidade, no âmbito deste último regime jurídico, teremos as seguintes hipóteses:
- se o prédio estiver constituído em propriedade horizontal, o direito de preferência do arrendatário só seria passível de ser exercido em relação à fracção autónoma de que fosse locatário, ainda que a concreta alienação ou dação em cumprimento envolvesse o prédio inteiro;
- já se o prédio não estiver submetido àquele regime, o arrendatário de parte dele (económica - mas não juridicamente - autonomizada) não tem direito de preferência sobre a parte arrendada, nem sobre a totalidade do prédio[8].
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Tem sido este o entendimento da jurisprudência, como decorre dos seguintes arestos (disponíveis em Dgsi.pt):
- Ac. do STJ de 21.01.2016 (relator: Tavares de Paiva):
“Na vigência do artigo 1091.º do CC, introduzido pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não tem direito de preferência, sobre a parte arrendada ou a totalidade, na compra e venda ou na dação em cumprimento desse mesmo prédio”[9].
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Ac. do STJ de 24.5.18 (relatora: Maria do Rosário Morgado):
“I – Atento o teor do artigo 1091.º, n.º 1, al. a), do CC, o direito de preferência conferido ao arrendatário está confinado ao andar ou à parte do prédio que constitui o objecto concreto do contrato de arrendamento, o qual, para ser transaccionável, deve estar juridicamente autonomizado;
II - O arrendatário de parte do prédio não constituído em propriedade horizontal, não tem direito de preferência sobre a totalidade do prédio, nem sobre a parte arrendada;
III – A interpretação da norma ínsita no art. 1091º, nº 1, al. a), do CC, no sentido atrás mencionado, não viola os princípios constitucionais consagrados nos arts. 13º e 65º, da Constituição da República Portuguesa”.
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Ac. do STJ de 18.10.2018 (relator: Abrantes Geraldes)
“I. Em face do art. 1091º do CC, na versão vigente em 2015, o arrendatário comercial de uma parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal não goza do direito legal de preferência na venda do prédio, direito apenas reconhecido ao arrendatário de todo o prédio urbano ou fracção autónoma do mesmo prédio objecto de venda ou de dação em cumprimento.
II. O facto de a proprietária do imóvel ter comunicado ao arrendatário o projecto de venda para efeitos de exercício do direito de preferência não é suficiente para constituir na esfera jurídica deste um direito de preferência com eficácia real que seja oponível ao terceiro adquirente”.
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- Ac. do STJ de 11.7.2019 (relatora: Maria do Rosário Morgado – revista excepcional)
“I – Atento o teor do artigo 1091.º, n.º 1, al. a), do CC, na redacção da Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, o direito de preferência conferido ao arrendatário está confinado ao andar ou à parte do prédio que constitui o objecto concreto do contrato de arrendamento, o qual, para ser transaccionável, deve estar juridicamente autonomizado;
II - O arrendatário de parte do prédio não constituído em propriedade horizontal, não tem direito de preferência sobre a totalidade do prédio, nem sobre a parte arrendada;
III – A interpretação da norma ínsita no art. 1091º, nº1, al. a), do CC, no sentido atrás mencionado, não viola o princípio constitucional consagrado no art. 13º, da Constituição da República Portuguesa”.
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Neste acórdão desenvolvem-se ainda as seguintes considerações, tendo em conta as recentes alterações introduzidas neste âmbito:
“Diremos, finalmente, que a interpretação normativa que acolhemos vai buscar ainda contributos ao disposto no art. 7º, nº 3, da Lei nº 42/17, de 14 de Junho, no qual se estabelece que “os arrendatários de imóvel em que esteja situado estabelecimento ou entidade reconhecidos como de interesse histórico e cultural ou social local gozam de direito de preferência nas transmissões onerosas de imóveis, ou partes de imóveis, nos quais se encontrem instalados, nos termos da legislação em vigor”.
Na verdade, como se referiu no já mencionado acórdão deste STJ de 18.10.2018, a referida estatuição legal “deixa bem evidente a necessidade que foi sentida de assegurar uma tutela específica para os arrendamentos que apresentam as especificidades previstas na citada norma, diferenciando-a da tutela geral que é alcançada pelo regime do direito legal de preferência regulado no art. 1091º do CC.
Com tal medida o legislador procurou prosseguir o objectivo de tutelar especificamente as chamadas “lojas históricas” que naturalmente, na maior parte dos casos, estão instaladas em edifícios situados nos grandes centros urbanos sobre os quais ainda não incide ou não pode incidir (por falta dos requisitos legais mínimos) o regime da propriedade horizontal.”.
De igual forma, a alteração introduzida pela Lei nº 64/2018, de 29 de Outubro, consagrando em novos moldes o direito de preferência do arrendatário, demonstra inequivocamente que a lei pretérita não conferia ao arrendatário de parte de prédio não submetido ao regime da propriedade horizontal o direito de preferir em caso de venda ou dação em cumprimento do mesmo … “.
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Ac. do STJ de 11.7.2019 (relator: Tomé Gomes):
“I. O artigo 1091.º, n.º 1, alínea a), do CC, na redacção dada pela Lei n.º 6/2006, de 27-02, não atribui o direito de preferência legal ao arrendatário de parte específica de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal.
II. A interpretação daquele normativo nesse sentido decorre do recorte textual que lhe foi dado pela referida Lei, divergente do dantes configurado no artigo 47.º, n.º 1, do RAU, e da eliminação do n.º 2 deste artigo, apoiando-se ainda no propósito do legislador de 2006, corroborado pelas ulteriores medidas legislativas adoptadas pelas Leis n.º 42/2017, de 14-06, e n.º 64/2018, de 29/10.
III. Tal interpretação não viola os princípios constitucionais da confiança, da segurança jurídica e da primazia material postulados pelo princípio do Estado de direito democrático, nem os princípios da igualdade, da proporcionalidade ou o conteúdo essencial dos direitos de propriedade privada e de acesso à habitação própria, consagrados, respectivamente, nos artigos 2.º, 3.º, 13.º, n.º 1, 17.º, 18.º, n.ºs 2 e 3, 62.º, n.º 1, e 65.º, n.ºs 1 e 3, da Constituição.
IV. As alterações introduzidas ao artigo 1091.º do CC pela Lei n.º 64/2018, de 29/10, têm carácter inovatório, não sendo, por isso, aplicáveis a situações, como o caso dos autos, ocorridas em data anterior ao início da sua vigência, em 30/10/ 2018”.
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Ac. da RL de 15.11.2018 (relatora: Cristina Neves):
“I- Somente com a Lei 63/77 de 25 de Agosto, é que foi expressamente consagrado o direito de preferência do arrendatário para habitação, nos casos de compra e venda ou dação em cumprimento do imóvel arrendado, tendo em vista a defesa dos interesses do arrendatário, resultante das alterações políticas e ideológicas que se seguiram ao 25 de Abril de 1974.
II- Este diploma foi revogado pelo artº 3º, nº 1 d) do Decreto-Lei n.º 321-B/90, de 15 de Outubro, prevendo-se no seu artº 47º, nº 1 que o arrendatário de prédio urbano ou de sua fracção autónoma, tinha o direito de preferência na compra e venda ou na dação em cumprimento do local arrendado há mais de um ano, sendo posição maioritária da jurisprudência e doutrina que, não tendo sido constituída a propriedade horizontal, ao arrendatário assistia o direito de preferência na venda da totalidade do imóvel em que o locado se integrava, uma vez que a parcela locada, mas não autónoma não poderia ser objecto de venda; se a propriedade horizontal estivesse constituída, o direito de preferência limitar-se-ia à fracção respectiva.
III-Com a entrada em vigor da Lei 06/2006 de 27/02, que aprovou o NRAU, passou a dispor-se no artº 1091º, nº 1 a) do C.C. o direito de preferência do arrendatário na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos, eliminando-se neste artigo a referência a prédio urbano ou fracção autónoma, bem como a possibilidade de licitação entre dois ou mais locatários preferentes.
IV-Face à redacção deste preceito legal, apenas o locatário de fracção autónoma em propriedade horizontal, tem direito de preferência na venda da sua fracção e não sobre a totalidade do prédio.
V- Aos tribunais judiciais, enquanto órgãos de soberania (artº 110 nº1 da CRP), incumbe “administrar a justiça em nome do povo” assegurando “a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos, reprimir a violação da legalidade democrática e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.” (artº 202 da CRP), aplicando a lei, excepto, “normas que infrinjam o disposto na Constituição ou os princípios nela consignados.” (artº 204 da CRP), devendo ainda na sua aplicação, interpretá-las, nos termos e com os limites definidos no artº 9 do C.C.
VI- Não viola o princípio da igualdade, a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do Código Civil, na redacção introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio”.
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Ac. da RP de 21.3.2019 (relatora: Francisca Mota Vieira):
“Em face do art. 1091º do CC, na versão introduzida pela Lei nº 6/2006 de 27-02, aplicável ao caso dos autos, arrendatário comercial de uma parte de um prédio urbano não constituído em propriedade horizontal não goza do direito legal de preferência na venda do prédio, direito apenas reconhecido ao arrendatário de todo o prédio urbano ou fracção autónoma do mesmo prédio objecto de venda”.
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- Ac. da RP de 10.12.2019 (relator: Paulo Dias da Silva):
“I - Com a entrada em vigor da Lei 06/2006 de 27/02, que aprovou o NRAU, passou a dispor-se no art.º 1091º, nº 1, a) do C.C. o direito de preferência do arrendatário na compra e venda ou dação em cumprimento do local arrendado há mais de três anos, eliminando-se neste artigo a referência a prédio urbano ou fracção autónoma, bem como a possibilidade de licitação entre dois ou mais locatários preferentes.
II - Actualmente, o direito de preferência do arrendatário circunscreve-se ao caso de prédio constituído em propriedade horizontal, dispondo o arrendatário de uma das fracções autónomas do direito de preferência em caso de venda ou dação em cumprimento dessa mesma fracção.
III - A norma do art.º. 1091.º, n.º 1, al. a), do CC, na interpretação adoptada, não viola o princípio constitucional da igualdade, nem quaisquer outros, tendo essa conformidade constitucional sido já confirmada pela jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça e do Tribunal Constitucional.”.
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- Ac. da RP de 8.9.2020 (relatora: Márcia Portela)
I - A lei reguladora do direito de preferência é a vigente na data em que se concretizou o acto de transmissão.
II - Não estando o prédio onde se insere o locado constituído em propriedade horizontal, o direito de preferência incide sobre a totalidade do prédio, com recurso ao mecanismo de licitações em caso de pluralidade de interessados.
III - O artigo 47.º RAU reconhece o direito de preferência na venda do imóvel ou de fracção autónoma, mas não de uma parte alíquota.
IV - A circunstância de as partes de um prédio indiviso serem passíveis de autonomização é irrelevante para o exercício do direito de preferência porque enquanto não se proceder à constituição da propriedade horizontal a autonomia dos espaços não têm qualquer significado jurídico, não podendo ser objecto de negócio jurídico.
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- Ac. da RL de 18.6.2020 (relatora: Teresa Pais)
“- Nos termos do art. 1091° n° 1 a) do Código Civil, na redacção dada pelo NRAU, em caso de venda de prédio não constituído em propriedade horizontal, não assiste ao arrendatário de um fogo de tal prédio qualquer direito de preferência, quer em relação à totalidade do prédio quer em relação à parte locada.
– Actualmente, o direito de preferência do arrendatário circunscreve-se ao caso de prédio constituído em propriedade horizontal, dispondo o arrendatário de uma das fracções autónomas do direito de preferência em caso de venda ou dação em cumprimento dessa mesma fracção”[10].
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Como já referimos, é pacífico o entendimento que a lei reguladora do direito de preferência é a vigente na data em que se concretizou o acto de transmissão, uma vez que, sendo o direito legal de preferência uma faculdade que integra o conteúdo do direito do arrendatário, só a prática do negócio translativo da propriedade, sem que o senhorio lhe tenha oferecido a preferência, o transforma em direito potestativo.
Assim, tendo a compra e venda (global) do prédio, onde se integra o local arrendado, sido celebrada em 2016, será à luz da então vigente redacção do art. 1091º, nº 1, al. a) do CC (introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, que aprovou o Novo Regime de Arrendamento Urbano (NRAU), ou seja, na redacção anterior à reforma de 2018) que terá de ser apreciado o direito de preferir que invocaram quanto àquele negócio (aplicável ex vi também do disposto no art. 59º, nº 1, do NRAU).
Ora, como decorre do exposto, neste regime jurídico, o arrendatário só gozaria do direito de preferência nos casos em que o prédio estivesse constituído em propriedade horizontal (e o arrendado estivesse autonomizado juridicamente), sendo que nessas situações o direito de preferência do arrendatário só seria passível de ser exercido em relação à fracção autónoma de que fosse locatário.
Já se o prédio não estiver constituído em propriedade horizontal, o arrendatário de parte dele (económica - mas não juridicamente - autonomizada) não tem direito de preferência sobre a parte arrendada, nem sobre a totalidade do prédio (ainda que esta última parte não seja pacífica, como se viu – discussão que, no entanto, é irrelevante no caso concreto, pois que os recorrentes não pretendem exercer o direito de preferência em função da totalidade do prédio).
No caso concreto, é inequívoco, em face da factualidade considerada provada, que o prédio aqui em discussão não se mostra constituído em propriedade horizontal, pelo que, em princípio, nunca o arrendatário poderia gozar de direito de preferência em relação à parte do prédio “ocupada” pelo arrendado (e também sobre a totalidade do prédio).
Aliás, o mesmo sucederia no regime anterior previsto no art. 47º do R. A. U., pois que mesmo neste regime, os recorrentes, enquanto arrendatários de parte do prédio, só poderiam gozar de direito de preferência do arrendatário sobre todo o imóvel (e não só sobre a parte do prédio correspondente ao local arrendado que é o pedido que aqui peticionam).
Os recorrentes levantam, no entanto, a questão de saber se, apesar do prédio não estar constituído sob o regime da propriedade horizontal, mesmo assim se poderá considerar que o arrendado teria a autonomia jurídica que seria exigível para que pudessem gozar do direito de preferência que invocam.
Sucede que, tal como já ficou dito, de uma forma exemplar, pelo Tribunal Recorrido, a verdade é que, à data em que o acto de transmissão foi concretizado (2016) e tendo em conta os factos provados, não se pode reconhecer ao arrendado a autonomia jurídica exigida pelo legislador para que pudesse ser reconhecido o direito de preferência peticionado.
E, como bem referiu também o tribunal recorrido, para a ponderação dessa alegada autonomização jurídica é perfeitamente irrelevante a alegação de que o arrendado era susceptível de ser autonomizado (embora não o fosse na data em que foi concretizada a compra e venda) - como decorre, aliás, do facto de ter acabado por ser (autonomizado juridicamente) em 2019, por iniciativa do Réu E… (que veio a requerer a sua desanexação, passando o prédio a estar autonomamente descrito na Conservatória de Registo Predial sob o n.º 10859 da mesma freguesia).
Como decorre do exposto, o que é relevante para este efeito é que, na data em que o acto de transmissão foi concretizado (2016), o arrendado fosse já um prédio (fracção autónoma) autonomizado juridicamente (não interessando saber que o podia ser ou que atingiu esse estatuto jurídico mais tarde).
Nessa medida, para este efeito, também não tem qualquer interesse alegar (e discutir) se o local arrendado tinha autonomia material em relação ao prédio global (“tinham números de polícia individualizados, independentes, dois deles sitos na …, respectivamente nos nºs .. e .., e o outro sito na Rua …, nº …”) ou que tinha autonomia em termos fiscais (a descrição predial do (único) prédio agrega os artigos 5349, 5350 e 7865 das inscrições matriciais).
Na verdade, o que interessa, para este efeito, saber é apenas se o local arrendado na data em que a compra e venda se efectivou era um prédio autónomo em termos jurídicos (permitindo, por exemplo, que pudesse ser vendido autonomamente).
Ora, é patente que isso não sucede no caso concreto, independentemente de o local arrendado poder ter a referida autonomia física ou material ou fiscal.
Assim, como se refere no ac. do STJ de 21.01.2016 (relator: Tavares de Paiva) já citado “… ainda que existisse autonomia física do andar arrendado, inserido nesse mesmo prédio urbano, ele não tinha autonomia jurídica ante o conceito de coisa definido pelos artigos 202.º e 203.º, ambos do CC. A autonomia jurídica só seria alcançada se o prédio fosse constituído em propriedade horizontal – artigos 1414.º e 1415.º, ambos do CC”.
Neste mesmo sentido se pronunciou o ac. da RP de 8.10.2020 (relatora Márcia Portela) também já citado nos seguintes termos:
“A circunstância de as partes de um prédio indiviso serem passíveis de autonomização em nada releva para o exercício do direito de preferência - significa apenas a possibilidade de divisão de coisa comum e constituição da propriedade horizontal.
Enquanto não se proceder à constituição da propriedade horizontal, a autonomia dos espaços não tem qualquer significado jurídico, não podendo ser objecto de negócio jurídico.
Como se refere no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 299/2020[11], se o local arrendado não for passível de individualização jurídica, sobre ele não pode incidir jus in re (artigo 408.º, n.º 2, do Código Civil), uma vez que só após a constituição da propriedade horizontal (que não existe enquanto não houver apartamento) é que o arrendatário pode tornar-se proprietário exclusivo do local arrendado.
Daí que seja despicienda a discussão sobre se o arrendado é ou não autonomizável do prédio em que se insere (…).
Reiteramos que nunca se defendeu que a preferência pudesse recair especificamente sobre o arrendado não autonomizado do ponto de vista jurídico[12].
Por o local arrendado não ter autonomia jurídica relativamente ao prédio em que se insere, não cabe aqui a invocação do artigo 417.º CC, relativo à venda de coisas conjuntamente com outras.
A tal não obsta que ao local arrendado corresponda um artigo matricial (que, no entanto, não se esgota nele), nem de no contrato de arrendamento esse local apareça “autonomizado” ao ser identificado como o rés-do-chão (…) quando a descrição total do prédio é: prédio urbano sito na …, Porto, n.ºs. a ... e ... a ..., e …, n.º ..., da União das freguesias …, no Porto, composto por diversos edifícios, descrito na Conservatória do Registo Predial sob o n.º …/…, inscrito na matriz predial sob os artigos 2906.º, 2912.º, 2918.º, 2924.º, 2930.º, 2936.º, 2942.º, 2948.º, 2954.º, 2960.º, 2966.º, 2972.º, 2979.º, 4984.º, 4988.º e 4992.º.
A referência sincopada ao prédio em que se insere o locado justifica-se por razões de comodidade, em nada alterando a natureza jurídica do imóvel.
Ainda que possa vir a constituir uma unidade predial autónoma se e quando vier a ser instituída a propriedade horizontal, o local arrendado carece de autonomia que lhe permita ser objecto de relações jurídicas.
O local arrendado não tem autonomia jurídica para efeitos de preferência, de nada valendo o conceito fiscal, utilizado apenas para efeitos de tributação”.
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Como decorre do exposto, essa autonomia jurídica decorrerá da constituição do prédio em propriedade horizontal, surgindo o local arrendado como uma das fracções autónomas nele constituídas, só dessa forma se podendo afirmar que o mesmo assume autonomia jurídica para este efeito do gozo do direito de preferência por parte do arrendatário.
Isso, aliás, resulta bem evidente do próprio funcionamento do exercício do direito de preferência, pois que, por força desse exercício, o preferente substitui-se na posição do comprador na compra e venda objecto da preferência.
Ora, isso só pode suceder se o aludido objecto da preferência estiver legalmente autonomizado, não podendo ser objecto de compra e venda um espaço materialmente dividido de um prédio que não tenha individualização jurídica - cfr. arts. 202º, 203º e 408º, nº 2 do CC[13].
Não sendo este espaço materialmente dividido (ainda que fiscalmente identificado) uma fracção autónoma (na sequência da constituição do prédio em propriedade horizontal), não pode aquele espaço (objecto do arrendamento) ser objecto de um acto de transmissão separadamente do restante imóvel, pelo que o direito de preferência, à luz do regime aplicável, nunca poderia ser exercido em função dessa parte do prédio não autonomizada em termos jurídicos (quando muito, seria admissível que fosse permitido esse gozo do direito de preferência abrangendo todo o prédio – o que, como já dissemos, não terá sido a opção do legislador no citado art. 1091º do CC, contrariamente àquilo que sucedia no regime anteriormente vigente no art. 47º do R. A. U. [14] – mas também não foi essa a opção dos recorrentes).
Nunca tal posição – que é a dos recorrentes – de que a preferência pudesse recair especificamente sobre o arrendado não autonomizado do ponto de vista jurídico, foi defendida pelo legislador (sem prejuízo do que já ficou dito quanto à interpretação da nova redacção que resultou da reforma de 2018 – v. nota 12 – entretanto já declarada inconstitucional).
Decidiu, pois, correctamente o Tribunal Recorrido quando concluiu que:
“… na data da alienação o local arrendado não tinha autonomia jurídica para efeitos de preferência, apesar de inscrito em matriz predial (o que apenas releva para efeitos fiscais), e foi vendido como um único prédio (era essa a sua realidade jurídica na data da alienação) não constituído em propriedade horizontal, não assistindo aos autores o direito de preferência sobre o concreto local arrendado”.
Improcedem, pois, os fundamentos invocados pelos recorrentes, para a pretendida alteração da sentença de mérito proferida.
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III-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta improcedente, e, em consequência, manter a decisão recorrida.
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Custas pelos recorrentes (art. 527º do CPC).
Notifique.
*
Porto, 12 de Abril de 2021
(assinado digitalmente)
Pedro Damião e Cunha
Fátima Andrade
Eugénia Cunha
______________
[1] Cfr. acs. do STJ de 14.07.2016 e de 21.01.2016 (relator: Tavares Paiva), e o ac. da RP de 8.9 2020 (relatora: Márcia Portela), in dgsi.pt.
[2] Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, Vol. II, pág. 568; Pinto Furtado, in “Manual de Arrendamento Urbano”, págs. 639 e 640 e Pedro Romano Soares Martinez, in “Direito das Obrigações (Parte Especial), Contratos, Compra e venda, locação, empreitada”, pág. 266, nota 2.
[3] V. por exemplo, o ac. do STJ de 22.3.1984 (relator: Abel Campos), in dgsi.pt com o seguinte sumário: “O arrendatário de fracção autónoma de prédio constituído em propriedade horizontal pelo seu único proprietário pode, na venda da totalidade do prédio, preferir em relação a fracção arrendada pelo preço que, proporcionalmente, lhe for atribuído”.
[4] Ac. do STJ, de 21.01.2016 (relator: Tavares de Paiva), in dgsi.pt.
[5] Por exemplo, Oliveira Ascensão, in “Direito de Preferência do Arrendatário” (Estudo em Homenagem ao Professor Doutor Inocêncio Galvão Telles, Vol. III), pág. 254 e 255 e Januário Gomes, in “Arrendamentos Comerciais”, pág. 204).
[6] A redacção deste preceito legal foi, entretanto, alterada pela Lei nº 64/2018 de 29/10, tendo-se reduzido o prazo da al. a) para dois anos, alterado o nº 4 (quanto à comunicação da preferência) e acrescentado os nºs 5 a 9; nesta nova redacção passou-se a reger “os contratos de arrendamento para fins habitacionais relativo a parte do prédio não constituído em propriedade horizontal” – v. em especial, a nova redacção dada aos nºs 8 e 9 do art. 1091 do CC (sendo que o nº 8 deste preceito legal já foi julgado inconstitucional com força obrigatória geral pelo Tribunal Constitucional – ac. 299/2020, disponível no respectivo site).
[7] V., sobre esta evolução legislativa, Pinto Furtado, in “Comentário ao regime do arrendamento urbano”, págs. 510 e ss.; na Jurisprudência, v., por ex., o ac. da RG de 19 de Outubro de 2017 (relatora: Maria João Matos), in dgsi.pt.
[8] Além destes regimes jurídicos explanados, não podemos deixar de fazer referência ao novo regime jurídico decorrente da reforma de 2018 – que não é aplicável ao caso concreto (e que, de resto, como já referimos, foi julgado inconstitucional com força obrigatória geral pelo Tribunal Constitucional – ac. 299/2020) – em que o legislador passou também a reger “os contratos de arrendamento para fins habitacionais relativo a parte do prédio não constituído em propriedade horizontal” atribuindo a esse arrendatário “um novo direito … que já não é uma preferência, passando a ser um direito à constituição de uma compropriedade sobre o imóvel em caso de ocorrer a sua alienação” como refere Menezes Leitão, in ”Arrendamento urbano” (9ª edição), pág. 88; v. em especial, a nova redacção dada aos nºs 8 e 9 do art. 1091 do CC onde se estabelece o seguinte: “8 - No caso de contrato de arrendamento para fins habitacionais relativo a parte de prédio não constituído em propriedade horizontal, o arrendatário tem direito de preferência nos mesmos termos previstos para o arrendatário de fracção autónoma, a exercer nas seguintes condições: a) O direito é relativo à quota-parte do prédio correspondente à permilagem do locado pelo valor proporcional dessa quota-parte face ao valor total da transmissão; b) A comunicação prevista no n.º 1 do artigo 416.º deve indicar os valores referidos na alínea anterior; c) A aquisição pelo preferente é efectuada com afectação do uso exclusivo da quota-parte do prédio a que corresponde o locado. 9 - Caso o obrigado à preferência pretenda vender um imóvel não sujeito ao regime da propriedade horizontal, podem os arrendatários do mesmo, que assim o pretendam, exercer os seus direitos de preferência em conjunto, adquirindo, na proporção, a totalidade do imóvel em compropriedade” – v. sobre esta nova solução legal, de uma forma critica, Menezes Leitão, in ”Arrendamento urbano” (9ª edição- 2019), págs. 87 e 88. Por força desta reforma de 2018, como concluiu Pinto Furtado, in “Comentário ao regime do arrendamento urbano”, págs. 513 e 514 “temos, portanto, hoje em dia, três distintas preferências de arrendatário: a) o do arrendatário habitacional ou não habitacional na celebração do novo contrato (…); b) a do arrendatário não habitacional ou habitacional na compra e venda ou na dação em cumprimento da mera fracção arrendada; c) a do arrendatário habitacional na compra e venda ou dação em cumprimento de prédio não constituído em propriedade horizontal”; também este autor critica a nova solução legal: “Que interesse pode ter um arrendatário em comprar certa porção da superfície de um prédio que não está constituído em propriedade horizontal e em cuja administração não tem cabimento nem voz?” (pág. 514).
[9] Este acórdão mereceu a concordância de Pinto Furtado in “Comentário ao regime do arrendamento urbano”, pág. 527.
[10] V., no entanto, a posição de Elsa Sequeira Santos, nota 4 ao artigo 1091.º CC, in “Código Civil Anotado” (Coord. Ana Prata), Vol. II, págs. 1334-5 que defende que o arrendatário de parte do prédio (não autonomizado) pode preferir na alienação da totalidade do prédio (mas não o pode fazer por referência à aludida parte do prédio, pois que “não sendo esta parte autonomizável e passível de alienação, não há nada sobre que preferir”).
[11] Disponível no site do Tribunal Constitucional onde o Tribunal Constitucional declarou, “com força obrigatória geral, a inconstitucionalidade da norma constante do n.º 8 do artigo 1091.º do Código Civil, na redacção dada pela Lei n.º 64/2018, de 29 de Outubro, por violação do n.º 1 do artigo 62.º, em conjugação com o n.º 2 do artigo 18.º, da Constituição”. Sobre a redacção anterior, o T. Constitucional no seu acórdãos nº 583/2016 (relator: Telles Pereira) concluiu, por outro lado, que: “não é inconstitucional a norma extraída da alínea a) do n.º 1 do artigo 1091.º do CC, na redacção introduzida pela Lei n.º 6/2006, de 27 de Fevereiro, interpretada no sentido de o arrendatário, há mais de três anos, de parte de prédio urbano não constituído em propriedade horizontal, não ter direito de preferência sobre a totalidade do prédio, na compra e venda desse mesmo prédio.”
[12] V., no entanto, a nova redacção resultante da reforma de 2018 (que já foi declarada inconstitucional).
[13] Como se refere no ac. do T. Constitucional nº 299/2020 “a identidade dos dois tipos de preferência - a do arrendatário de fracção autónoma e a do arrendatário de parte de prédio indiviso – não traduz a exigência de que o prédio onde se situa o «local arrendado» reúna, de forma cumulativa, todos os requisitos impostos no artigo 1415.º do Código Civil e nas leis administrativas para poder ser constituído em propriedade horizontal. Na verdade, se a ratio da preferência se prende com a protecção do acesso à habitação própria, a circunstância de o prédio se encontrar em condições de ser juridicamente autonomizado, ou seja, composto por unidades independentes e isoladas entre si, com saída própria para parte comum do prédio ou para a via pública, é factor determinativo da forma como o arrendatário pode adquirir a propriedade plena da habitação através do exercício do direito de preferência. É que, se o local arrendado não for passível de individualização jurídica, sobre ele não pode incidir jus in re (artigo 408.º, n.º 2, do Código Civil), uma vez que só após a constituição da propriedade horizontal (que não existe enquanto não houver apartamento) é que o arrendatário pode tornar-se proprietário exclusivo do local arrendado (…). Como o “local arrendado” está integrado num prédio não constituído em propriedade horizontal, sobre esse local não pode incidir um direito de propriedade autónomo, cindível daquele outro, mais abrangente, que tem por objecto o prédio na sua globalidade (…)”.
[14] Ou, como, entretanto, ficou previsto na reforma de 2018 (já declarada inconstitucional quanto ao nº 8 do art. 1091º do CC): quando muito seria permitido o exercício de “um direito à constituição de uma compropriedade sobre o imóvel em caso de ocorrer a sua alienação” (como defende Menezes Leitão, in “Arrendamento Urbano”, págs.87/88) relativo à quota-parte do prédio correspondente à permilagem do locado pelo valor proporcional dessa quota-parte face ao valor total da transmissão” – cfr. prevê o nº 8 do art. 1091º do CC na sua redacção actual. Neste sentido, também parece apontar o aludido ac. do Tribunal Constitucional nº 299/2020 que conclui que: “no caso de alienação de prédio não constituído em propriedade horizontal que esteja parcialmente arrendado, o objecto da venda deixa de ser a totalidade do imóvel arrendado para passar a ser uma quota-parte do mesmo. Assim, a alteração do objecto da venda, imposta pela norma da alínea a) do n.º 8 do artigo 1091.º, implica que o arrendatário não pode adquirir através da preferência a propriedade do local arrendado, mas apenas uma parte alíquota do imóvel. Diferentemente do que ocorre na preferência do arrendatário de fracção autónoma, em que se adquire a propriedade plena do local arrendado, na preferência do arrendatário de parte de prédio não constituído em propriedade horizontal constitui-se uma compropriedade sobre o imóvel. Em rigor, o alcance do direito de preferência previsto naquela norma não é o de conferir ao arrendatário um meio para aceder, de imediato, à propriedade plena do local arrendado, mas apenas a atribuição ao arrendatário habitacional de um direito à constituição de compropriedade sobre o imóvel. Em sentido diferente, v. no entanto, Pinto Furtado in “Comentário ao regime do arrendamento urbano”, págs. 538 e ss. que defende outra interpretação quanto à natureza do direito que resultaria do exercício da preferência nestas situações: “Não se impôs, como seria essencial (se é que isso seria legitimo) a prévia conversão do prédio em propriedade horizontal e, assim, o arrendatário habitacional que exerça a preferência sobre a sua quota-parte deixa de ser arrendatário para tornar-se proprietária dela, formando-se deste modo uma área predial encravada no edifício, sem participação na parte relativa à serventia exterior pelos arrendatários habitacionais… Dizemos titulares e não contitulares nem, muito menos, comproprietários porque os direitos de propriedade dos antigos arrendatários não incidirão em comum sobre o prédio, mas unicamente sobre parte especificada deste, “nos mesmos termos previstos para os arrendatários de fracção autónoma”.