Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6083/21.2T8PRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TERESA SÁ LOPES
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
MOTIVO JUSTIFICATIVO
EXTINÇÃO DE POSTO DE TRABALHO
CRITÉRIO LEGAL
Nº do Documento: RP202306056083/21.2T8PRT.P1
Data do Acordão: 06/05/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - “Para que se possa afirmar a validade do termo resolutivo aposto ao contrato é necessário que se explicitem no seu texto os factos que possam reconduzir ao motivo justificativo indicado e que tais factos tenham correspondência com a realidade.”
II - A possibilidade de externalização, não torna incerta a duração da atividade de uma empresa municipal a ponto de justificar o termo clausulado.
III - Não é a eventualidade de poder ser requerida a sua insolvência que torna incerta a duração da atividade a ponto de justificar o termo clausulado.
IV - Do facto público e notório das enormes dificuldades surgidas com a pandemia por Covid-19, evidenciarem a suscetibilidade de alterações supervenientes de circunstâncias e terem implicado, no caso, uma mudança na forma como a nova atividade da mesma empresa se desenvolvia, não resulta um risco da mesma que justificasse, sem mais, o termo clausulado, aquando da celebração do contrato de trabalho a termo certo, em 16 de Setembro de 2019.
V - “o primeiro critério legal para a extinção dum posto de trabalho é sempre o de dar preferência aos contratos de trabalho em vigor há mais tempo”.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 6083/21.2T8PRT.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, juízo do Trabalho da Maia – Juiz 2
Apelante: EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ..., EM
Recorrido: AA
4ª secção
Relatora: Teresa Sá Lopes
1º Adjunto: Des. António Luís Carvalhão
2ª Adjunta: Des. Paula Leal de Carvalho

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

1.Relatório (com base no relatório efetuado na sentença):
Nos presentes autos veio AA intentar ação emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum contra EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ..., EM, peticionando a declaração de nulidade da cláusula 12ª do seu contrato de trabalho a termo celebrado em 16/09/2019, convertendo-se o mesmo em contrato de trabalho por tempo indeterminado e a consequente declaração de invalidade da caducidade invocada para a sua cessação, com a condenação da Ré na reintegração do Autor no seu posto de trabalho, com a mesma categoria profissional, bem como no pagamento das retribuições vencidas desde a data da cessação do seu vínculo laboral e das vincendas até ao trânsito em julgado da decisão final aqui a proferir ou subsidiariamente declarar-se a nulidade da cláusula 12ª do contrato de trabalho a termo outorgado entre as partes em 16/09/2020, com os subsequentes pedidos idênticos relativos ao mesmo.
Para o efeito, invocou o aqui demandante ter sido admitido ao serviço da Ré para exercer funções de fiscalização, ao abrigo do contrato de trabalho a termo certo, mediante o pagamento da retribuição mensal de € 650,00, cumprindo um horário diário de 6 horas e 40 minutos, num total de 40 horas semanais, cumprido em regime de turnos; iniciando-se este contrato em 16/09/2019 com termo em 15/03/2020. Sucede que no final da sua vigência este contrato foi renovado, o mesmo sucedendo em Setembro de 2020, tendo a demandada contratado pelo menos mais 3 agentes de fiscalização em Março de 2020 e novamente outros 3 trabalhadores em Novembro de 2020, contudo, a Ré comunicou por carta datada de 15/02/2021 a sua intenção de não renovar o seu contrato de trabalho a termo, com efeitos a partir de 15/03/2021.
O Autor discorda, no entanto, dos motivos invocados pela Ré para a cessação do seu vínculo laboral, pretendendo que se reconheça que a mesma é inválida e que o demandante possui, assim, vínculo sem termo à aqui demandada.
Nestes termos, pede o Autor que seja a ação julgada procedente e condenando-se a Ré nos termos supra expostos.
Regularmente notificada a Ré veio deduzir oposição ao peticionado invocando que os motivos consignados nos contratos a termo celebrados entre os aqui intervenientes correspondem a justificações válidas que devem ser reconhecidos como tal, atenta a natureza da atividade desenvolvida pela aqui demandada, não tendo sido ultrapassados os prazos legais de duração destes mesmos contratos. Mais invoca que não corresponde à verdade que tenham sido contratados outros trabalhadores para substituir o aqui A., sendo que os contratos mais recentes não serão renovados, sendo notória a diminuição da atividade de fiscalização face ao encerramento forçado da restauração atenta a situação de pandemia que atravessamos.
Conclui, no sentido de que a ação deverá ser julgada improcedente e a R. absolvida dos pedidos formulados pelo A.
Foi elaborado despacho saneador.
Realizou-se audiência de discussão e julgamento.
Em 16.05.2022, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
‘Tudo visto e nos termos expostos, julga-se a presente ação procedente por provada e em consequência condena-se a R. a reintegrar o A. no seu posto de trabalho, sem perda de antiguidade, reportada a 16/09/2019 e ainda no montante correspondente às retribuições que o A. deixou de auferir, desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da presente decisão, deduzido do valor respeitante às importâncias obtidas pelo trabalhador em função do despedimento, mormente, as relativas ao subsídio de desemprego ou de retribuição pelo exercício de atividade profissional remunerada, cuja liquidação se relega para momento incidente posterior.
Custas pela R.’

Deste despacho interpôs a Ré o presente recurso, o qual finalizou com as seguintes conclusões que se transcrevem:
‘1) O presente recurso tem por objeto a sentença do Tribunal Judicial da Comarca do Porto que condenou a Ré a reintegrar o Autor no seu posto de trabalho, sem perda de antiguidade, reportada a 16/06/2019 e ainda no montante correspondente às retribuições que o Autor deixou de auferir, desde a data do despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão, deduzindo do valor respeitante às importâncias obtidas pelo trabalhador em função do despedimento, mormente, as relativas ao subsídio de desemprego ou de retribuição pelo exercício de atividade profissional remunerada, cuja liquidação foi relegada para momento posterior.
2) Com efeito, por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar, tendo mesmo a presente decisão vindo surpreender sobremaneira a aqui Recorrente, pois que, considerando o Tribunal Recorrido a presente ação procedente, não julgou corretamente. Ressalvado o devido respeito, que é o maior, a Mm.a Juiz recorrida decidiu mal, julgando a questão de forma simplista, abstendo-se, assim, de avaliar convenientemente a situação sub judice.
3) Nesta medida, foram erroneamente desconsiderados aspetos determinantes oferecidos quer pela prova documental, quer pela prova testemunhal, e que, sob uma análise atenta e justa, sempre imporiam decisão diversa daquela que foi proferida e da qual aqui se recorre.
4) O primeiro contrato de trabalho a termo certo, celebrado em 16 de setembro de 2019, pelo período de seis meses, se encontra perfeitamente justificado nos termos do art. 140.°, n.° 4, alínea a) do CT, sendo que é o próprio Recorrido que confessa na sua p.i. que:
- Em Janeiro de 2019 foi constituída a Unidade Orgânica de Fiscalização e Actividade não Regulada (adiante UOF).
- E que o mesmo foi integrado na Unidade Orgânica de Fiscalização e Actividade não Regulada (UOF).
Tais factos foram dados como provados na sentença, veja-se o ponto 2 da pág. 5 da e o ponto 2 da pág. 7 da sentença.
5) Ora, o A./Recorrido foi efetivamente contratado a termo certo para o início de laboração da unidade orgânica de fiscalização (que constitui um novo estabelecimento) da EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ....
6) No ano de 2019 verificou-se a publicação de dois instrumentos regulamentares essenciais à atividade da Recorrente: o "Regulamento de Serviço - Gestão de Resíduos Urbanos e Limpeza do Espaço Público no Município" e o "Regulamento de Fiscalização dos Serviços de Gestão de Resíduos Urbanos e Limpeza do Espaço Público no Município ...", respetivamente, os quais foram aprovados e publicados no Diário da República, o primeiro deles na 2a. Série, n°. 4, de 7 de Janeiro de 2019, e o segundo na 2a. Série, n°. 2, de 3 de Janeiro de 2019 (cf. does. 6 e 7 da p.i.).
7) Acontece que A Mm.a Juiz considera inválido tal contrato a termo certo justificado pelo art. 140.°, n.° 4, al. a) do CT, através de uma falácia de que a o lançamento da atividade da Recorrente não comporta risco e não tem duração incerta, o que discordamos veementemente.
8) É falso que no lançamento de nova atividade — ainda que numa empresa municipal — não exista um risco empresarial ou incerteza.
9) Com efeito, existe sempre o risco organizacional de a Recorrente ou o Município ... concluírem que tal atividade não é relevante e/ou que não se justifica manter tal atividade.
10) A nova atividade de fiscalização ainda teria de ser consolidada e o Município ... pode sempre perder o interesse na mesma, daí a duração pode ser incerta.
11) E não se pode argumentar com os instrumentos de gestão previsionais, como discorre largamente a p.i. e a sentença discorrida pois o adjetivo "previsional" vem precisamente de uma previsão que é por natureza incerta!
12) Não passam de uma conjuntura com fundamento incerto ou não verificado que sempre permitiriam a utilização da solução usada no primeiro contrato a termo certo que foi celebrado.
13) Em segundo lugar, existe igualmente a possibilidade de o Município ... poder entregar tal serviço a entidade terceira através de concessão, retirando o mesmo à Recorrente e externalizando-o, como foi alegado na contestação.
14) Existem vários Municípios do país que têm os serviços de gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público do seu território, bem como os serviços de fiscalização num modelo de gestão do sector privado, através da concessão.
15) A recorrente EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ... corre sempre esse risco e incerteza.
16) Acresce ainda que outra prova do risco ou incerteza do lançamento de uma atividade, é o facto de que as empresas municipais poderem mesmo requerer a sua insolvência, como já aconteceu com a A... por parte do Município 1..., entre outras.
17) Veja-se, a título de exemplo, o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, proferido no processo n.° 169/15.0T8AMT-C.P1, de 23 de junho de 2015, confirmou que as empresas municipais podem ser objeto de processos de revitalização ou ser declaradas insolventes.
18) Se existe risco de insolvência, existe sempre risco da atividade comercial desenvolvida pela Recorrente EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ....
19) É igualmente facto público e notório as enormes dificuldades que surgiram com a pandemia por Covid-19 que levou ao confinamento em casa, ao encerramento de estabelecimentos comerciais e à mudança de rotinas e também mudou a forma como a nova atividade da Recorrente se desenvolvia, mostrando o risco da mesma que como qualquer outra está sujeita a alterações supervenientes de circunstâncias.
20) A Covid-19 constitui um exemplo claro de alteração de circunstâncias geral e totalmente alheia a condutas das partes, e a cujo domínio e controlo escapam completamente.
21) Trata-se de argumento que reflete igualmente o risco do lançamento desta nova unidade orgânica de fiscalização.
22) As razões justificativas da contratação a termo assentam em considerações de política de emprego e de incentivo ao investimento, pela diminuição dos riscos do investimento inerente ao lançamento de uma nova atividade de duração incerta ou ao início de laboração de uma empresa ou estabelecimento, que a contratação a prazo permite.
23) Sendo que o que conta é apenas o lançamento de nova atividade, como é o caso da Unidade Orgânica de Fiscalização e Atividade não Regulada (UOF), por parte da R./Recorrente e, ao contrário do que a sentença refere, foram juntos todos os contratos celebrados por esse novo serviço e o mesmo tem menos de 250 trabalhadores.
24) Ainda que assim não fosse, como é, a redação anterior do art. 140.°, n.° 4, al. a) dispunha "empresa com menos de 750 trabalhadores", a atual redação foi dada pela Lei n.° 93/2019, de 4 de setembro, com entrada em vigor no primeiro dia útil do mês seguinte ao da sua publicação.
25) Assim sendo, no momento de celebração do contrato ainda se aplicava a redação anterior do art. 140, n.° 4, al. a), tendo a Recorrente menos de 750 trabalhadores e ainda que assim não fosse, a Unidade Orgânica de Fiscalização tem menos de 250 trabalhadores.
26) Tal é do conhecimento público, consta dos Relatórios & Contas anuais que a Recorrente EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ... publica, sendo facto público e notório e que foi invocado na contestação apresentada, o Tribunal Recorrido é que ignorou todas as alegações que aqui são novamente aduzidas de forma mais desenvolvida e prova junta, decidindo de forma simplista.
27) Nestes termos, ficou cabalmente provado no caso em apreço que o primeiro contrato a termo foi fundado em lançamento de nova atividade, e a Recorrente enquanto empregador provou todos os factos demonstrativos de que à data da contratação do trabalhador se lançava numa nova atividade de fiscalização e que a atividade laboral para que o trabalhador foi contratado se inscreve nessa nova atividade a que passou a dedicar-se e para a qual teve formação.
28) Nestes termos, o contrato de trabalho a termo celebrado entre Recorrente e Recorrido foi mesmo motivado pelo lançamento de nova atividade de duração incerta, nos termos do art. 140.°, n.° 4, al. a) do Código do Trabalho.
Por outro lado,
29) Salvo o devido respeito, relativamente à renovação do contrato a termo certo com motivo diferente do apontado para o primeiro contrato, o Tribunal recorrido fez também uma errada aplicação do art. 143.° do C.T. que diz respeito à sucessão de contratos a termo certo, quando o que ficou provado não foi tal contratação sucessiva para satisfazer necessidades permanentes da empresa, mas sim uma sobreposição de contratos a termo certo.
30) O que tal disposição legal visa arredar é a celebração sucessiva de contratos precários para o mesmo posto de trabalho. Do CT/2009 resulta que a proibição prevista no art. 143°, n° 1, se estende não apenas à contratação do mesmo trabalhador, como também à de outro trabalhador, parece ser o que decorre da utilização, no n.° 1 do art. 143°, da conjugação "de trabalhador" e não "do trabalhador" e da exclusão, que constava do CT/2003, do segmento em que se dizia "celebrado entre as mesmas partes".
31) Não obstante, as admissões de 3 trabalhadores referidas na sentença recorrida ocorreram em novembro de 2020 e a cessação do contrato do Recorrido verificou-se a 15 de março de 2021, não se aplicando o n.° 1 do art. 143.° invocado pela sentença recorrida.
32) A senhora Juiz a quo dá como provado, que a cessação do contrato do Recorrido ocorreu em 15 de março de 2021.
33) Dá-se igualmente como provado na sentença recorrida que a Recorrente contratou ao seu serviço outros três trabalhadores remetendo para os documentos juntos aos autos com o requerimento Ref.a 41328161.
34) Acontece que quer esses documentos, quer os depoimentos das testemunhas referentes a tais contratos (BB e CC), transcritos na sentença ora impugnada, provam que os mesmos foram admitidos em novembro de 2020
35) Como supracitado a proibição do art. 143.°, n.° 1 refere-se a nova admissão após a cessação de um primeiro contrato a termo, o que não acontece no caso sub judice.
36) A cessação do contrato do Recorrido ocorre meses depois das novas admissões, pelo que não pode a ação proceder pela aplicação deste artigo.
37) Na verdade, a Recorrente é uma empresa com responsabilidade social, que é constantemente auditada, cumprindo todas as disposições legais e regulamentares.
38) E nunca quis iludir ou defraudar as disposições que regulam a contratação a termo, crendo que atuou no cumprimento da lei relativamente ao Recorrido.
39) No caso em apreço mostram-se satisfeitas a exigência da indicação e concretização dos motivos da contratação no texto dos contratos de trabalho celebrados entre Recorrente e Recorrido.
40) Acresce que o Tribunal recorrido decide mal, pois não existiram novas admissões através de contrato de trabalho a termo ou de trabalho temporário cuja execução se concretize no mesmo posto de trabalho, ou ainda de contrato de prestação de serviços para o mesmo objeto.
41) Isso não resulta de nenhum dos factos provados e nunca aconteceu.
42) Outrossim, ainda que assim não fosse, sempre seria aplicável a exceção do art. 143.°, n.° 2, alínea b) do C.T.
43) Concluindo, a sentença traduziu-se num resultado ética e juridicamente injusto, pelo que se pede aos Venerandos Desembargadores que apreciem a matéria de facto e de direito do aresto em crise, elegendo, interpretando e aplicando a lei, julgando procedente o presente recurso.”
Em remate, referiu que deve ser revogada a sentença recorrida, que deve ser substituída por outra que julgue a ação totalmente improcedente.

O Apelado apresentou contra-alegações, as quais finalizou com as seguintes conclusões:
“1- A Recorrente é uma empresa formada integralmente por capital público, destinada à gestão e prestação de serviços públicos de interesse geral, por cedência do Município ... (entidade pública), em regime de monopólio legal e em exclusividade territorial.
2- A Ré rege a sua atividade de acordo com as disposições previstas no regime jurídico da atividade empresarial local, aprovado pela Lei n°. 50/2012, de 31 de Agosto, bem como pelo regime jurídico dos serviços municipais de abastecimento público de água, de saneamento de águas residuais e de gestão de resíduos urbanos, por seu turno aprovado pelo Decreto-lei n°. 194/2009, de 20 de Agosto.
3- A gestão de resíduos urbanos e a limpeza do espaço público constituem serviços públicos de carácter estrutural, que devem ser assegurados com regularidade e continuidade e qualidade do serviço, em estrita obediência aos princípios da universalidade no acesso, protecção de saúde pública e do ambiente, e demais princípios consagrados no regime jurídico dos serviços municipais de gestão dos resíduos urbanos, consagrado sob o Decreto-lei n°. 194/2009, de 20 de Agosto.
4- Sendo uma competência dos Municípios (inclusive do Município ...) promover e prestar os serviços de gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público do seu território, de acordo com o n°. 2º, art°. 6º do Decreto-lei n°. 194/2009, de 20 de Agosto.
5- Pelo que tal atividade se encontra legalmente vedada a outras entidades, tais como empresas privadas e outras da mesma natureza, salvo por intermédio do regime de concessão ou constituição de empresa municipal.
6- Ora, se o Município concedeu à Recorrente a exploração e gestão dos respetivos sistemas municipais, em regime de exclusividade territorial no concelho ..., pelo prazo de quinze anos, bem como delegou as competências de fiscalização respetivas, isso significa que até 05 de Julho de 2032, a Recorrente beneficia dos direitos exclusivos de fiscalização e prestação desses serviços no território do Município ....
7- Trata-se, portanto, de um verdadeiro monopólio legal ou, melhor, de um direito exclusivo dos municípios, nos termos definidos no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 148/2003, de 11 de Julho.
8- Num mercado de monopólio legal de um serviço público essencial fica suprimido o grau de incerteza quanto ao funcionamento do mercado em causa, por consequência da ausência de concorrência entre empresas.
9- E em qualquer caso, também não se trata de uma atividade de duração incerta, mas de uma atividade com duração previamente fixada, cuja subsistência duradoura é altamente provável.
10- Em consonância com o entendimento sufragado pelo Tribunal Constitucional, no Acórdão n°. 581/95, que se debruçou sobre o pedido de declaração de inconstitucionalidade de todas as normas da Lei n.° 107/88, de 17 de Setembro, que autorizava o Governo a rever o regime jurídico do contrato de trabalho a termo, a contratação a termo para cobrir necessidades permanentes apenas se justifica nas situações em que a entidade patronal se propõe a uma nova atividade por tempo incerto ou quando a empresa se abre, pela primeira vez, aos riscos do mercado, não tendo base segura de calculabilidade quanto aos recursos humanos.
11- O referido recurso a empregos precários, embora não resulte de necessidade transitória, fundamenta-se na situação incerta e precária da empresa que inicia a sua laboração ou lança nova atividade, e que se presume que seja de dois anos a partir do evento que lhe dá origem.
12- Daí que seja o especial "risco empresarial" ou a "incerteza do mercado" o fundamento material que justifica a exceção ao princípio constitucional da segurança no emprego (art°. 53°), pelo menos no que se refere à norma da alínea a), n°. 4 do art°. 140° do Código do Trabalho.
13- A atividade da Recorrente trata-se de atividade monopolista (imposta legalmente), sem concorrência, que beneficia de direitos exclusivos de prestação de serviços públicos e sua fiscalização, da competência do Município ..., no seu território, por um prazo de 15 anos (até 2032), e que é sustentada financeiramente por subsídios públicos, através da celebração de contratos-programa, usufruindo de garantias públicas, através da transferência direta de financiamento, em casos de perdas anuais (resultados líquidos negativos) ou impactos financeiros por motivos de força maior, como sucedeu com os efeitos provocados pela epidemia Covid-19.
14- A constituição da Recorrente esteve sujeita à fiscalização prévia do Tribunal de Contas, obrigatória por lei, em que fora assegurada a sustentabilidade económica da sua atividade por um período duradouro, através da demonstração de níveis sustentáveis de procura atual e futura dos serviços prestados pela Recorrente.
15- Daí que a natureza e atividade da Ré não se equipare à de uma qualquer empresa privada, em regime de concorrência, cujos objetivos visam essencialmente a busca do lucro e, consequentemente, sujeita aos riscos e à incerteza do mercado.
16- De realçar que a fiscalização em matéria de gestão dos resíduos urbanos e limpeza do espaço público decorre igualmente da lei aplicável - art°. 62, do Decreto-lei n°. 194/2009, de 20 de Agosto - que determina que as regras dos serviços prestados pela Entidade Gestora (Recorrente) aos utilizadores constam de um regulamento de serviço, competindo à mesma entidade fiscalizar o cumprimento das normas nele previstas e instruir os eventuais processos de contra-ordenação aí previstos.
17- Ou seja, a atividade de fiscalização da Recorrente, quer seja prestada por esta, pelo Município ou em regime de concessão, sempre terá de ser prestada pela entidade responsável pela gestão dos resíduos urbanos e não poderá ser suprimida.
18- A possível resolução do contrato ou resgate por parte do Município ... - único acionista da Recorrente - pode ser justificada por incumprimentos contratuais, razões de interesse público ou meramente políticas, que em nada alteram a natureza da atividade da Recorrente, pois os efeitos de uma possível resolução ou resgate seria a internalização da atividade ou a sua concessão a terceiro, em idênticas condições de exclusividade e monopólio legal.
19- Assim, a atividade da Ré, de acordo com a sua natureza, objetivos e compromissos contratuais, é incompatível com as situações visadas pelo n°. 4, art°. 140° do Código do Trabalho, tendo por base o especial "risco empresarial" em situações de incerteza quanto aos recursos humanos necessários para prossecução da sua atividade.
20- Quer à data da constituição da unidade orgânica de fiscalização, quer à data da contratação do Recorrido, quer à data da renovação do seu contrato de trabalho (Setembro de 2020) ou da sua cessação (15/03/2021), a Recorrente dispunha de uma base segura de calculabilidade dos recursos humanos, conforme resulta documentos por si subscritos e aprovados, que fixou em 14 agentes de fiscalização (2 por freguesia), entre 2019 e 2023.
21- A Recorrente está obrigada, a garantir a continuidade dos serviços contratados, a sua prestação ininterrupta, bem como a assegurar a fiscalização dos mesmos, por um prazo de 15 anos, o que obriga à manutenção de uma estrutura de pessoal permanente e estável, conforme resulta dos documentos por si subscritos e aprovados.
22- Alegar uma situação perfeitamente anormal, excecional e temporária, como aquela decorrente das medidas adotadas em virtude da epidemia COVID-19, para demonstrar o especial "risco empresarial" ou a "incerteza" da atividade da Recorrente, carece de qualquer sentido.
23- Na hipótese de ser entendido que a relação contratual celebrada entre a Recorrente e o Recorrido podia assumir a forma de contrato a termo certo, tendo por base o motivo invocado, o que apenas por hipótese se concebe, sempre são falsas as razões que justificam a aposição do termo ou não são passíveis de serem integradas para efeito da contratação a termo com base no início de laboração ou lançamento de nova atividade, o que acarreta a sua nulidade.
24- Sem prejuízo do entendimento de que nunca esteve em causa a subsistência da Recorrente ou da sua atividade, o certo é que o designado período ou fase de lançamento (período de garantia) já há muito se encontrava ultrapassado aquando da celebração do contrato de trabalho, tanto mais que este foi celebrado mais de dois anos e seis meses depois do início da atividade da Recorrente.
25- Ainda que se entenda que o motivo inscrito no contrato dizia respeito ao início da unidade orgânica de fiscalização, o que apenas por hipótese se concebe, sempre se verificaria uma total imprecisão na precisão dos factos, pois o contrato de trabalho é totalmente omisso em relação à celebração dos contratos-programa com o Município ..., o exercício da atividade de fiscalização, a aprovação do regulamento da fiscalização ou a constituição da UOF.
26- Na hipótese de ser entendido que o motivo justificativo é suficiente e que diz respeito à constituição da UOF ou à aprovação do regulamento de fiscalização, o que apenas por hipótese se concebe, sempre tratar-se ia de uma verdadeira fraude à lei.
27- No que respeita ao lançamento de uma atividade de duração incerta, importa recordar que o Município ... delegou na Recorrente, por intermédio do contrato de gestão delegada celebrado em 05 de Julho de 2017, os poderes de fiscalização respeitantes ao cumprimento das disposições do Código Regulamentar do Município ..., bem como da legislação vigente conexa, em matéria de gestão dos resíduos urbanos e limpeza do espaço público.
28- De que o exercício de atividades de fiscalização e de verificação de infrações no âmbito da atividade desenvolvida pela Recorrente integra o acervo dos seus objetivos estatutários desde a data da sua constituição.
29- A constituição de uma unidade orgânica, a atividade de fiscalização traduziu-se numa continuação ou, quando muito, de uma simples ampliação quantitativa das atividades que a Recorrente vinha realizando.
30- Pelo que, à data da celebração do contrato de trabalho com o Recorrido (Setembro de 2019), a constituição da referida unidade orgânica não pode ser considerada como lançamento de uma atividade, ainda para mais de duração incerta, tendo em conta a obrigação de assegurar a fiscalização dos serviços prestados por um prazo de 15 anos (até 2032).
31- Na hipótese de não procederem os argumentos acima aduzidos, o que apenas por hipótese se concebe, sempre será inválido o motivo justificativo da renovação do contrato de trabalho celebrada em Setembro de 2020.
32- As funções desempenhadas pelo A., que integram a atividade de fiscalização da Ré, correspondem a uma atividade estável e duradoura, obrigatória de acordo com a lei aplicável, com as obrigações estatutárias e contratuais da Ré, enquanto durar o regime de delegação dos serviços de gestão de resíduos urbanos e de limpeza do espaço público, pelo que não integram o conceito de execução de tarefa ocasional ou serviço determinado precisamente definido e não duradouro.
33- A decisão quanto à matéria de facto não merece qualquer censura.
34- A Mtma. Juiz valorou corretamente toda a prova produzida, quer a prova testemunhal, quer a prova documental.
35- 0 direito foi corretamente aplicado aos factos.”
*
Em 03.10.2022, foi proferido o seguinte despacho:
“Defere-se a prestação de caução pelo aqui recorrente, de forma a ser atribuído efeito suspensivo ao recurso interposto, a qual deverá ser efetuada por qualquer meio idóneo (depósito, seguro, etc.) no valor fixado para a presente lide e no respetivo prazo legal.”
Deste despacho foi interposto recurso, a ser objeto de acórdão nesta mesma sessão, no translado organizado para o efeito.

Em 08.11.2022, foi proferido despacho de admissão do recurso da sentença, como apelação, com efeito devolutivo, sem prejuízo da decisão que vier a ser proferida no traslado:
“No seu requerimento de interposição de recurso a aqui demandada veio requerer a prestação de caução de forma a permitir a fixação de efeito suspensivo ao referido recurso de apelação.
Foi então proferido despacho que admitiu a prestação de caução pelo valor fixada à presente ação, tendo a recorrente vindo manifestar a discordância do valor fixado nos termos constantes do requerimento que antecede.
Ora, de acordo com o preceituado no art. 650° ex vi do art. 647° ambos do C.P.C. na eventualidade da caução não ser prestada no prazo de 10 dias extrai-se traslado para que se processe o respetivo incidente, pelo que o recurso da decisão que fixou o valor a caucionar deverá seguir os seus termos neste mesmo traslado.
Deste modo, por ter legitimidade, estar em tempo e tratar-se de decisão recorrível admite-se o recurso interposto pela R. o qual é de apelação, com subida imediata, nos próprios autos e efeito meramente devolutivo, sem prejuízo da decisão que vier a ser proferida no traslado acima ordenado - cfr. artigos 79°A e seguintes do C.P.T.
Proceda-se á organização do traslado acima referido o qual deverá ser instruído com as certidões da sentença, do requerimento de interposição do recurso, das contra-alegações apresentadas pelo A., com o despacho que deferiu a prestação de caução e com o requerimento de interposição do recurso em apreço.
Notifique e oportunamente subam os autos ao Venerando Tribunal da Relação do Porto.”

Em 06.02.2023, no translado que constitui o Apenso A, foi emitido parecer pelo Exm.º Procurador Geral Adjunto, no qual, nomeadamente se lê:
(…)
3. Quanto ao mais entende-se que também o recurso da Recorrente não merece provimento. Para além da resposta ao recurso do Autor que acompanhamos na íntegra, e para a qual remetemos, diga-se, apenas, que como refere o Prof. Pedro Romano Martinez (Código do Trabalho, anotado, em anotação ao art.º140º, 13ª edição, Almedina, Coimbra), “nos casos do n.º 4, os motivos que justificam a contratação a termo não fornecem prazo para esta. Com efeito, subjacentes a estas possibilidades de contratação a termo estão os referidos motivos de diminuição do risco empresarial e de politica de emprego, pelo que a limitação temporal da contratação decorre não da natureza dos motivos, mas de juízo do legislador quanto à duração máxima de um vinculo precário, no caso, dois anos”…
“Mesmo no caso de lançamento de nova atividade, está em causa não a necessidade transitória de trabalho correspondente ao período em que é incerta a viabilidade da nova iniciativa empresarial, mas um critério temporal genérico o qual apenas exige que ao lançamento de nova atividade corresponda risco empresarial.”
Ora o risco neste caso como é referido não podia já ter-se em conta uma vez que a Recorrente havia já iniciado esta nova atividade havia mais de dois anos, havia contratado a realização desta atividade pelo prazo de quinze anos, contrato que tinha de cumprir, exercia esta atividade em situação de exclusividade, sem concorrência, nesta data e enquanto o contrato durar, mas sobretudo porque o período inicial de verificação de risco havia já sido ultrapassado.
Assim sendo, não merece censura a douta sentença em recurso, que deve, salvo melhor opinião, ser confirmada.
*
4. Nestes termos, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, emite-se parecer nesse sentido, devendo improceder o recurso.”

Já nos presentes autos, em 03.02.2023, foi emitido parecer pelo Exm.º Procurador Geral Adjunto, no qual, nomeadamente se lê:
“No recurso em apreço não se imputa à sentença “sub iudice” concreto vício que haja de ser conhecido, bem com se desconhece que norma processual foi violada, o que constitui um modo inadequado de impugnar. O recurso está despido de objeto e o que afasta vontade de impugnar a sentença. Não se vê motivo para intervenção oficiosa, conforme o artº. 662º. Nº. 2 do CPC.
Ressalvado o respeito devido por melhor opinião em contrário, nenhum reparo ou censura há que ser feito à douta sentença recorrida, a qual deverá ser confirmada, atenta a factualidade dada como provada, que teve em consideração a prova que foi produzida – cfr. artº. 607.º, nº 5 do CPC. A subsunção ao direito aplicável não merece reparo.
Como resulta da matéria de facto dada como provada, que não foi impugnada e da fundamentação da sentença, bem andou a Mma. Juíza “a quo” na aplicação do regime aplicável ao recorrido, nos termos dos artº.s 143º., 147º. e 389º. e segs, do Código do Trabalho, que a recorrente tem de observar, independentemente do seu estatuto jurídico e objeto social.
A ilustre julgadora estava habilitada no modo como decidiu, pelo que, nenhumas das “conclusões” das alegações podem subsistir perante a argumentação que foi por si expendida.
Improcedem as conclusões formuladas.
A sentença recorrida merece, pois, ser mantida na ordem jurídica.”
*
O objeto do recurso, delimitado pelas conclusões das alegações (artigo 635º, nº4 e 639º, nº1 do Código de Processo Civil), consubstancia-se em:
- aferir da validade do termo do contrato.

2. Fundamentação:
2.1. Fundamentação de facto:
Na decisão recorrida considerou-se:
Os factos provados, com interesse para a decisão da causa, são os seguintes (enumeram-se o que temos como indispensável):
1.A Ré é uma empresa local, de âmbito municipal, com capitais totalmente públicos, constituída por escritura pública realizada no dia 27 de Janeiro de 2017, no seguimento das deliberações da Câmara Municipal e Assembleia Municipal ..., tomadas nas reuniões de 19 e 21 de Julho de 2016, respetivamente.
2. Por delegação do Município ..., a Ré tem por objeto social a gestão de resíduos urbanos e a limpeza do espaço público (doc. 2).
3.Tendo iniciado a sua atividade em 2 de Fevereiro de 2017.
4.Em 05 de Julho de 2017, o Município ..., como entidade delegante, e a Ré, como entidade delegatária, celebraram contrato de gestão delegada.
5. O Município concedeu à Ré a exploração e gestão dos respetivos sistemas municipais, em regime de exclusividade territorial no concelho ..., pelo prazo de quinze anos, ou seja, até 05 de Julho de 2032, a Ré beneficia dos direitos exclusivos de prestação dos serviços de recolha e gestão dos resíduos urbanos e limpeza do espaço público no território do Município ....
6.Não obstante a delegação das competências, continuava a caber à Câmara Municipal ... aprovar e emitir, em Assembleia Geral, as orientações, os objetivos e as metas de promoção do desenvolvimento local a observar pela Ré, nos termos da legislação em vigor.
7.Em 05 de Julho de 2017, o Município ... celebrou igualmente com a Ré, dois contratos-programa, em que foram determinados e concretizados os objetos imediatos e mediatos da delegação de poderes operada, assim como as condições de colaboração entre ambas as entidades, nos domínios respeitantes à gestão dos resíduos urbanos e à limpeza pública, sendo fixados os montantes de financiamento por recurso a subsídios à exploração.
8.O contrato de gestão delegada e os contratos-programa celebrados com o Município ... determinam que a Ré, enquanto entidade gestora, está obrigada a assegurar a regularidade e a continuidade da prestação dos serviços de gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público na área territorial do Município ..., em regime de exclusividade, em estrita obediência aos princípios da universalidade no acesso, continuidade e qualidade do serviço, proteção de saúde pública e do ambiente, e demais princípios consagrados no regime jurídico dos serviços municipais de gestão dos resíduos urbanos, consagrado sob o Decreto-lei nº. 194/2009, de 20 de Agosto.
9. Sublinha-se que a Ré deve assegurar de forma regular, contínua e eficiente:
a) A recolha dos resíduos recicláveis integrados no sistema municipal ou que o venham a integrar por força da expansão da rede de recolha seletiva, e o transporte, tratamento, triagem e valorização dos resíduos urbanos provenientes da recolha seletiva;
b) A recolha seletiva de resíduos orgânicos;
c) A recolha de resíduos urbanos indiferenciados, ou equiparados;
d) O transporte dos resíduos urbanos indiferenciados ou equiparados, recolhidos/produzidos no Município;
e) A limpeza do espaço público: i) Varredura Manual; ii) Varredura Mecânica; iii) Limpeza Pública iv) Varredura de ruas;
10.Por intermédio ainda do referido contrato de gestão delegada, o Município ... delegou na Ré os poderes de fiscalização respeitantes ao cumprimento das disposições do Código Regulamentar do Município ..., bem como da legislação vigente conexa, em matéria de gestão dos resíduos urbanos e limpeza do espaço público.
11.Delegou, ainda, os poderes de fiscalização e instrução de processos de contra-ordenação por uso indevido ou dano em qualquer obra ou equipamento do sistema municipal para a recolha e transporte dos resíduos urbanos no Município ....
12.O exercício de atividades de fiscalização e de verificação de infrações no âmbito da atividade por si desenvolvida integra o acervo de objetivos estatutários da Ré (cfr. alínea h), nº. 2, artº. 3. do doc. 2 – Estatutos da Ré).
13.Para os efeitos previstos, a Ré elaborou o “Regulamento de Serviço – Gestão de Resíduos Urbanos e Limpeza do Espaço Público no Município” e o “Regulamento de Fiscalização dos Serviços de Gestão de Resíduos Urbanos e Limpeza do Espaço Público no Município ...”, respetivamente, os quais foram aprovados e publicados no Diário da República, o primeiro deles na 2ª. Série, nº. 4, de 7 de Janeiro de 2019, e o segundo na 2ª. Série, nº. 2, de 3 de Janeiro de 2019.
14.O regulamento de serviço, por ser um instrumento jurídico com eficácia externa, constitui o principal instrumento que regula os direitos e obrigações da Entidade Gestora (Ré) e dos utilizadores.
15.Já o regulamento de fiscalização, igualmente com eficácia externa, visa condensar o conjunto de normas relevantes atinentes à fiscalização do cumprimento do regulamento de serviço, incluindo disposições relativas às entidades competentes no âmbito dos procedimentos de contra-ordenações, às regras de tramitação, às infracções tipificadas, ou aos direitos e deveres dos utilizadores que sejam alvo da aplicação de coima ou de sanções acessórias, incluindo em matéria de direito de defesa e de acesso aos tribunais.
16.De forma a reorganizar os serviços de fiscalização/sensibilização e a atividade não regulada, em Janeiro de 2019 foi constituída a Unidade Orgânica de Fiscalização e Atividade não Regulada (adiante UOF), que tem como principal objetivo divulgar o Regulamento de Serviço acima mencionado junto dos utilizadores do sistema e fazer cumprir as disposições nele previstas, através de ações de sensibilização e, quando estas não sejam suficientes, penalizando os utilizadores que pratiquem alguma infração a que seja subsumível a instauração de um procedimento de contra-ordenação.
17.Aos serviços de sensibilização/fiscalização da unidade orgânica compete:
a) Zelar pelo contínuo e adequado funcionamento do serviço de gestão de resíduos urbanos e de limpeza do espaço público;
b) Garantir o cumprimento do Regulamento de Serviços assim como da legislação aplicável prevista no artigo 4.º do referido documento e da demais normativa atinente à gestão de resíduos urbanos e à limpeza do espaço público;
c) Promover a revisão e atualização das normas previstas no Regulamento de Serviços e no Regulamento de Fiscalização, em especial no que respeita ao quadro de contra-ordenações e ao montante das respetivas coimas, nos termos legalmente previstos;
d) Divulgar o Regulamento de Serviços junto dos utilizadores do sistema, essencialmente no âmbito da fiscalização preventiva;
e) Consciencializar/sensibilizar os utilizadores do sistema para a sua responsabilidade no ciclo da gestão de resíduos urbanos e na limpeza do espaço público;
f) Elaborar autos de notícia sobre as infrações detetadas ou denunciadas junto da ...;
g) Proceder à investigação dos factos relatados nas denúncias apresentadas ou nas detetadas pelos serviços, no âmbito da instauração dos competentes procedimentos contra-ordenacionais;
h) Propor à Câmara Municipal ... (CM...) a aplicação de coimas e sanções acessórias e apresentar a respetiva fundamentação, nos termos previstos no Regulamento de Serviços e no Regulamento de Fiscalização;
i) Comunicar às autoridades administrativas e policiais competentes quaisquer factos de que tenha conhecimento cuja investigação ou sancionamento seja competência daquelas, nos termos legais aplicáveis;
j) Assegurar a reposição da legalidade quando se verifique a existência de alguma infração;
k) Colaborar com a Direcção de Operações (DO) na implementação de projetos específicos realizados no âmbito da gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público, bem como de campanhas de sensibilização.
18.Em Agosto de 2019, a Ré publicou o documento denominado por Instrumentos de Gestão Previsional (IGP), que agrega os planos de atividade e orçamento, anuais e plurianuais, incluindo os planos de investimento e as fontes de financiamento para o período de 2019 a 2022.
19.Em 16 de Setembro de 2019, o A., como trabalhador e a Ré, como entidade patronal, celebraram contrato de trabalho a termo certo – cfr. doc. nº 10 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
20.Ao A. foram atribuídas funções de Fiscalização, tendo sido acordado o salário mensal base de 650,00 euros.
21.O A. cumpria o período normal diário de trabalho de 6 horas e 40 minutos, com um período de descanso de 30 minutos, em regime de jornada contínua, o que totalizava 40 horas de trabalho semanal e gozava de um dia de descanso semanal.
22.O A. prestava o trabalho em regime de turnos.
23.O referido contrato foi celebrado a termo certo, vigorando a partir de 16 de Setembro de 2019, com termo a 15 de Março de 2020.
24.O A. foi integrado na Unidade Orgânica de Fiscalização e Actividade não Regulada (UOF).
25.E desempenhou, ininterruptamente, as funções adstritas aos agentes de fiscalização, a saber:
a) Realização de ações de sensibilização/fiscalização no seguimento da prática de infrações na área de intervenção que lhe foi atribuída;
b) Realização de ações de fiscalização com vista à verificação da existência de eventuais infrações e à identificação dos respetivos autores no âmbito de denúncias/reclamações recebidas;
c) Realização de ações de sensibilização em áreas mais suscetíveis à ocorrência/reincidência de infrações;
d) Realização de ações de monitorização da utilização do sistema de gestão de resíduos urbanos;
e) Monitorização da utilização dos equipamentos de deposição de resíduos urbanos;
f) Divulgação do Regulamento de Serviços no âmbito da sua atividade, em particular as normas suscetíveis de gerar uma contra-ordenação em caso de infração e a aplicação das coimas e demais sanções aplicáveis;
g) Identificação dos locais/áreas mais suscetíveis à ocorrência/reincidência de infrações;
h) Identificação das reincidências nas infrações praticadas e respetivo infrator;
i) Elaboração de autos de notícia e investigação das situações reportadas no auto de notícia, comunicando-as ao Coordenador de Fiscalização (CF);
j) Registo de todas as ocorrências no âmbito da sua atividade e manutenção desse registo devidamente atualizado;
k) Identificação da necessidade de reposição da legalidade decorrente da ocorrência de infrações e promoção, quando aplicável;
l) Colaboração com a Polícia Municipal, sempre que solicitado.
26.No desempenho das funções acima referidas, o A. seguia as regras e orientações inscritas no Manual de Procedimentos de Sensibilização e Fiscalização Ambiental, em vigor na Ré – cfr. doc. nº 11 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
27.O contrato de trabalho a termo certo foi renovado, conservando os seus termos anteriores.
28.Em 16 de Setembro de 2020, o contrato de trabalho do A. foi sujeito a nova renovação, embora com alteração do motivo justificativo de aposição do termo, passando a constar no seu lugar que a Ré “se encontrava a efetuar uma reavaliação da atividade das equipas de fiscalização, atendendo ao decréscimo acentuado na produção de resíduos e de estabelecimentos comerciais a ser alvo de fiscalização/sensibilização, em consequência da atual crise económica resultante da pandemia Covid-19, pelo que seria necessária a avaliação da manutenção ou não, da atividade destas equipas de fiscalização, pelo período de duração do contrato” – cfr. doc. nº 12 junto com a p.i. cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
29.No mês seguinte (Outubro de 2020), a Ré publicou o documento denominado por Instrumentos de Gestão Previsional (adiante IGP), que agrega os planos de atividade e orçamento, anuais e plurianuais, incluindo os planos de investimento e as fontes de financiamento para o período de 2020 a 2023 – cfr. doc. nº 13 junto a p.i. cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
30. De acordo com o Relatório e Contas de 2019, aprovado em Fevereiro de 2020, a Ré tinha no seu quadro 12 agentes de fiscalização (fiscais) no final de 2018 cfr. doc. nº 14 junto a p.i. cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
31. Segundo dados da Ré, em Outubro de 2020, a Unidade Orgânica em que estava inserido o A. contava com a presença de 46 trabalhadores, distribuídos da seguinte forma:
• 1 Coordenador
• 1 Responsável pela Fiscalização
• 1 Responsável pelo Contrato de Limpeza do Espaço Público
• 2 Técnicos Superiores
• 1 Técnico de tratamento de dados • 1 Assistente Administrativo
• 14 Agentes de fiscalização
• 12 Agentes de monitorização do contrato de limpeza do espaço público • 13 Operacionais para lavagem de fachadas
32. Todos os trabalhadores da Ré contratados em 2019 e 2020, integrados na categoria profissional de agente de fiscalização, celebraram contratos de trabalho a termo certo.
33. No decorrer da situação excepcional que actualmente vivemos, em que vigoram sucessivos estados de emergência/contingência/calamidade, que levaram, entre outras medidas, ao encerramento temporário de muitos estabelecimentos comerciais do Município ..., as operações de recolha de resíduos urbanos e limpeza do espaço público mantiveram-se operacionais.
34. A R. notificou o A. por carta datada de 15/02/2021 de que o seu contrato e trabalho iria cessar com efeitos a partir de 15/03/2021.
35. Em 24 de Fevereiro de 2021, por intermédio do seu mandatário, o A. apresentou a sua oposição à referida cessação do contrato de trabalho.
36. À data em que foi constituída a Ré, a gestão dos resíduos urbanos e a limpeza do espaço público no Município ... era assegurada pela Divisão Municipal de Limpeza Urbana e Transportes da Câmara Municipal ....
37.A R. tem de assegurar, para além da prestação dos serviços, também a atividade de fiscalização, de forma regular e contínua.
38. Para a prossecução das suas atividades, foi determinado que a Unidade Orgânica devia ser composta por 46 trabalhadores, a saber:
• 1 Coordenador
• 1 Responsável pela Fiscalização
• 1 Responsável pelo Contrato de Limpeza do Espaço Público • 2 Técnicos Superiores
• 1 Técnico de tratamento de dados
• 1 Assistente Administrativo
• 14 Agentes de fiscalização
• 12 Agentes de monitorização do contrato de limpeza do espaço público
• 13 Operacionais para lavagem de fachadas.
39.De acordo com o documento denominado “Instrumentos de Gestão Previsional” para fazer face aos seus compromissos no quadriénio de 2019-2022, a Ré previa a necessidade de assegurar a continuidade dos postos de trabalho com a categoria profissional de agentes de fiscalização (fiscais) abaixo indicados:
a) 2019: 14
b) 2020: 12
c) 2021: 12
d) 2022: 12
40.No documento denominado “Instrumentos de Gestão Previsional” vêm inscritas previsões sobre a estrutura de recursos humanos necessária para fazer face aos seus compromissos no quadriénio de 2020-2023, prevendo a Ré a continuidade de postos de trabalhos da categoria profissional de agentes de fiscalização (fiscais) abaixo indicado:
a) 2020: 14
b) 2021: 14
c) 2022: 14
d) 2023: 14
40.Sendo certo que tal previsão foi feita em plena epidemia Covid-19, cujos efeitos já eram, entretanto, conhecidos.
41.A previsão do número de agentes de fiscalização aumentou, comparativamente ao IGP anterior, fixando-se no número previsto à data da constituição da UOF, não obstante os efeitos da epidemia; sendo que a Ré continua obrigada a prestar os serviços contratados, assim como a fiscalizar o cumprimento do regulamento de serviço, pelo menos até 2032.
42.Para cumprir as suas obrigações em matéria de fiscalização, a Ré reconhecia ser fundamental ter 2 agentes de fiscalização por freguesia (7 freguesias), dado que o serviço era prestado em regime de turnos.
43.No decorrer da situação excecional que atualmente vivemos, em que vigoram sucessivos estados de emergência/contingência/calamidade, que levaram, entre outras medidas, ao encerramento temporário de muitos estabelecimentos comerciais do Município ..., as operações de recolha de resíduos urbanos e limpeza do espaço público mantiveram-se operacionais, tendo o mesmo sucedido relativamente à actividade de fiscalização, embora em menor escala.
44.Após serem decretadas novas medidas de emergência, em Janeiro de 2021, designadamente o encerramento compulsivo de muitos estabelecimentos, bem como a imposição de um dever de confinamento geral, os agentes de fiscalização passaram a exercer as suas funções presenciais em regime de rotatividade semanal.
45.Não obstante os deveres gerais de confinamento, o A. continuou a prestar as suas funções, em regime de rotatividade, tal como os restantes colegas, realizando ações de sensibilização/fiscalização, ações de monitorização de equipamentos e utilização dos mesmos com elaboração do respetivo relatório, identificação das áreas problemáticas e comunicação aos superiores, elaboração de autos de contra-ordenação, registos de necessidades de manutenção de equipamentos durante os períodos de confinamento.
46.Apresentando-se sempre disponível para desempenhar as suas funções durante o horário de trabalho.
47. A gestão de resíduos urbanos e a limpeza do espaço público constituem serviços públicos de carácter estrutural, essenciais ao bem-estar geral, à saúde pública e à segurança coletiva das populações, às atividades económicas e à proteção do ambiente e, em geral, à melhoria da qualidade de vida dos cidadãos, incluindo especialmente os residentes da área territorial do Município ....
48. Esta atividade encontra-se vedada a outras entidades, tais como empresas privadas e outras da mesma natureza, salvo por intermédio do regime de concessão.
49. À data em que foi constituída a Ré, a gestão dos resíduos urbanos e a limpeza do espaço público no Município ... era assegurada pela Divisão Municipal de Limpeza Urbana e Transportes da Câmara Municipal ..., mas alegadamente por se entender que melhor servia o interesse público, o Município ... decidiu optar pelo modelo de empresarialização dos sistemas municipais, criando uma empresa local, a aqui Ré, a quem delegou a prestação desses serviços por um prazo de 15 anos.
50. A constituição de nova unidade orgânica não obrigou à abertura de um qualquer estabelecimento nem à ampliação do mesmo, nem a qualquer deslocalização territorial, permanecendo a prestação de serviços a ocorrer de forma exclusiva no Município ....
51. A Ré é uma empresa formada integralmente por capital público, destinada à gestão e prestação de serviços públicos de interesse geral, no caso específico da limpeza do espaço público, de um serviço gratuito, da competência do Município ... (ente público), em regime de monopólio legal.
52. De modo a não comprometer o regular funcionamento e existência da atividade da Ré, o Município ... efetuou uma transferência direta no valor global de 700.000,00€ (setecentos mil euros), além do monopólio legal da Ré, em razão da sua atividade, esta é financiada em grande parte por recursos públicos, provenientes do Município ..., a quem cabe também realizar as transferências financeiras necessárias para regularização dos resultados anuais ou para fazer face aos impactos financeiros em casos de força maior, como sucede atualmente com os efeitos provocados pela epidemia Covid-19, sendo ainda que, o volume de recursos próprios da Ré (tarifário dos resíduos sólidos urbanos) está subordinado ás deliberações do Município ....
53. Por força da constituição da Ré, e da ulterior celebração do contrato de gestão delegada com o Município ..., por um prazo de quinze anos, aquela tornou-se a Entidade Gestora, e este, através da Câmara Municipal, a Entidade Titular, dos serviços de gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público, ficando obrigada, por força da delegação de competências, a prestar os referidos serviços aos utilizadores finais e, consequentemente, a promover a elaboração e a divulgação de um regulamento de serviço e a fiscalizar o cumprimento das suas normas por parte dos utentes, se necessário através da abertura e instrução dos competentes procedimentos de contra-ordenação.
54. Por um período de 15 anos (até 2032), a Ré está obrigada, quer legalmente, estatutariamente ou contratualmente, a assegurar de forma regular, contínua e eficiente a prestação de serviços de gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público, bem como a exercer atividades de fiscalização e de verificação de infrações no âmbito da atividade por si desenvolvida, encontrando-se investida, bem como os trabalhadores ao seu serviço, dos poderes para o exercício destas atividades, daí que para a prossecução dos seus objetivos a Ré necessite de uma estrutura de recursos humanos permanente e estável, como a própria reconhece, dispondo, desde o início, dos dados necessários para conhecer a sua dimensão necessária.
55. Quanto aos serviços de fiscalização, a necessidade de uma estrutura de pessoal permanente e estável decorre expressamente dos IGF apresentados pela Ré para os quadriénios 2019-2022 e 2020-2023, elaborados em Agosto de 2019 e Outubro de 2020, em que a Ré prevê serem necessários entre 12 e 14 agentes de fiscalização, respetivamente, entre 2019 e 2023 (inclusive).
56. Quer à data da sua constituição, quer em Agosto de 2019 ou Outubro de 2020, a Ré dispunha de uma base segura de calculabilidade quanto aos recursos humanos, como comprovam as previsões por si feitas.
57. De acordo as suas previsões de Outubro de 2020, em plena pandemia e um mês após a renovação do referido contrato, a Ré previa a permanência de 14 agentes de fiscalização entre 2020 e 2023, ou seja, os mesmos fiscais que dizia ter no seu quadro à data de Outubro de 2020.
58. Após a celebração do contrato de trabalho a termo com o aqui demandante a R. admitiu ao seu serviço outros três trabalhadores (DD, CC e BB) para exercerem funções de Fiscalização, igualmente com contratos de trabalho a termo – cfr. documentos juntos aos autos com o requerimento refª 41328161 – cujo teor se dá aqui integralmente por reproduzido.
*
b) Factos Não Provados.
Após a discussão da causa, os factos que se consideram como não provados são os seguintes:
- Apesar da aprovação e publicação do Regulamento de Fiscalização ter ocorrido em Janeiro de 2019, a atividade de fiscalização já era executada pela R. desde o início de 2018.
- Segundo dados da Câmara Municipal ..., dos 46 trabalhadores referidos para integrar a UOF, 27 já faziam parte do quadro da Ré, e 16 já estavam (orçamentalmente) previstos a ser admitidos durante o mês de Outubro de 2018.
- Em Janeiro de 2019, para preencher todo o quadro desta UOF, apenas seria necessário admitir 3 trabalhadores, os quais não estavam previstos no orçamento de gastos com pessoal para 2019.
- Em Março de 2020, a Ré contratou, pelo menos, mais três agentes de fiscalização.
- Em Novembro de 2020, a Ré contratou, pelo menos, mais três trabalhadores para exercer as funções de agente de fiscalização., sendo que todos os trabalhadores da Ré contratados em 2019 e 2020, integrados na categoria profissional de agente de fiscalização, celebraram contratos de trabalho a termo certo, sendo tais trabalhadores contratados para substituir outros, assistindo-se a uma rotatividade de vínculos precários sucessivos.
- Não obstante a constituição de uma unidade orgânica, a atividade de fiscalização traduziu-se numa continuação ou, quanto muito, de uma simples ampliação quantitativa das atividades que a Ré vinha realizando, pelo que não pode ser considerada como lançamento de uma atividade.
- Acresce que, em Novembro de 2020, a Ré contratou, pelo menos, mais três trabalhadores para exercer funções de agente de fiscalização, pelo que, tal motivo tinha como único fim promover uma rotatividade de trabalhadores, em regime precário, de modo a manter um baixo nível de custos salariais, evitando a celebração de contratos de trabalho sem termo.
- O alegado decréscimo acentuado na produção de resíduos de estabelecimentos comerciais, que alegadamente motivou a diminuição das atividades de sensibilização/fiscalização, é resultado de uma situação excecional e temporária, em virtude das medidas implementadas durante o estado de emergência, as quais foram levantadas nos meses que se seguiram.
- Não obstante a cessação do contrato de trabalho do A., a Ré continua a manter ao serviço uma equipa de agentes de fiscalização, muitos dos quais com menor antiguidade que o A., sendo certo que tais trabalhadores têm garantida a sua continuidade ao serviço da Ré.

Foi esta a motivação da decisão de facto:
‘O Tribunal baseou a sua convicção em toda a prova documental designadamente na certidão online da aqui R. e no seu contrato social, que atestam a respectiva data de constituição; no contrato de gestão delegada celebrado entre a R. e o Município ...; nos contratos-programa celebrados entre estas duas mesmas entidades e nos instrumentos de gestão previsional de 2019 a 2022 e demonstrações financeiras da demandada relativas aos mesmo período temporal, determinantes na fixação do mapa de pessoa necessário à actividade da R. e enquadramento da sua actividade e encargos financeiros; nos contratos de trabalho a termo celebrados com o ora A. em 16/09/2019 e em 16/09/2020; no manual de procedimentos da R. e na respectiva proposta de constituição desta Empresa Municipal de 11/11/2019; nos aditamentos aos acima referidos contratos-programa e nas medidas de apoio excepcionais levadas a cabo pela aqui R.; na comunicação de denúncia do contrato de trabalho do demandante de 15/02/2021 e ainda nos contratos de trabalho celebrados entre a R. e os trabalhadores acima indicados na factualidade dada como assente.
No mais consideraram-se também os seguintes depoimentos:
- EE, disse ter sido colega do A. exercendo funções na aqui R. desde Agosto de 2019 e acrescentou que as suas funções, como as do demandante, só começaram efetivamente no terreno entre 2020 e 2021, cumprindo atualmente turnos de 2ª feira a sábado num total de 40 horas/semana; disse ainda que com a pandemia passaram de 11 fiscais para 4, trabalhando em semanas alternadas, porque houve uma acentuada diminuição dos resíduos dado que quase todos os estabelecimento comerciais estavam encerrados e depois regressaram ao horário normal; disse também que apesar de estar previsto que os fiscais deveriam fazer as suas rondas aos pares, andam sempre sozinhos, porque são poucos a exercer estas funções;
- FF, disse ser fiscal exercendo funções na aqui demandada desde Março de 2020, confirmou o modo como foram cumprindo as suas tarefas ao longo do período de tempo em que vigoraram as restrições impostas pela pandemia e como, entretanto, já regressaram à normalidade, sendo atualmente 4 funcionários a exercer estas funções idênticas às que o demandante ali exercia; disse ainda que após a saída do A. foram admitidos três trabalhadores para esta área de actividade da R.;
- BB disse que foi funcionário da R. entre Novembro de 2020 e Novembro de 2021, tendo cessado o seu vínculo laboral por caducidade do seu contrato de trabalho a termo, tendo também uma ação judicial pendente contra a ora demandada visando impugnar essa caducidade; descreveu a testemunha como exerciam as suas funções de forma a completar as 40 horas/semana; confirmou que na mesma altura da sua admissão foram admitidos outros dois colegas, a CC e o GG e que suspenderam as suas tarefas por via da pandemia, mas depois retomaram a normalidade dos procedimentos;
- HH disse ter sido admitida ao serviço da R. em Novembro de 2020 e confirmou que o A. ainda lhe deu formação no início da sua prestação laboral; confirmou o modo como exerciam as suas funções e que quando iniciou as mesmas eram 9 trabalhadores como fiscais ao serviço da R. para um total de 15 zonas diferentes de intervenção;
- II, disse ser diretor dos recursos humanos da R. desde 2017 e descreveu o que são os instrumentos de gestão previsional, que se traduzem em instrumentos financeiros que visam prever a 4 anos a atividade da R., sendo revisto todos os anos para acertarem de acordo com as necessidades reais; acrescentou também que os primeiros fiscais, como o aqui R., foram admitidos em Agosto de 2018, de forma a permitir que assim que se iniciasse a fiscalização houvesse trabalhadores aptos a desempenhar estas funções; quando renovaram o contrato de trabalho do A. pretendiam manter a equipa mas por causa da pandemia alteraram os termos da justificação da cláusula do termo aposto no referido contrato, tendo optado por fazer cessar os contratos de trabalho que se encontravam a atingir o final do prazo fixado, por se terem tornado desnecessários, ao invés de fazerem cessar os contratos de trabalho celebrados mais recentemente e que ainda vigoravam; esclareceu ainda que a categoria profissional de assistente técnico é a mesma quer para a área da fiscalização, quer para a área comercial;
- Em sede de depoimento de parte o legal representante da R. descreveu a atividade de fiscalização levada a cabo pela mesma empresa e descreveu os instrumentos previsionais como uma mera estimativa de custos (previsão orçamental), bem como a circunstância da diminuição da atividade comercial exercida na cidade do Porto determinou uma diminuição da necessidade da fiscalização levada a cabo pela R., confirmando o contrato celebrado com o Município ... que garante a atividade da mesma demandada até 2032;
- Por seu turno o aqui demandante, em sede de declarações de parte afirmou que foi admitido ao serviço da R. e iniciou as suas funções com ações de sensibilização junto dos comerciantes numa determinada área que lhe era atribuída; disse também que depois da sua entrada forma admitidos outros 5 trabalhadores para as mesmas funções, sendo que quando cessou o seu contrato de trabalho estavam em funções 6 fiscais, já que outros colaboradores foram transferidos para outras funções.’
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2.2. Fundamentação de direito:
Sobre a posição seguida nesta secção, a respeito da natureza do contrato e sua validade, transcrevemos a fundamentação constante do acórdão proferido no processo nº 4061/20.8T8MTS.P1 de 04-04-2022, (Relator Desembargador Nelson Fernandes, com intervenção da aqui relatora como 2ª adjunta):
“Tendo sido o contrato objeto dos autos celebrado no âmbito da sua vigência, é aplicável o Código do Trabalho de 2009 (doravante CT), assim o regime nesse estabelecido, no que ao caso importa a respeito dos requisitos de validade fornal para a celebração de contrato de trabalho a termo – que, diga-se, são no essencial similares ao que já constava do CT/2003.
Como aliás resulta da decisão recorrida, a contratação a termo tem no nosso ordenamento jurídico natureza excecional – como tinha anteriormente, seja no âmbito do pretérito DL 64-A/89 (LCCT), seja no âmbito do Código do Trabalho de 2003 –, apenas sendo admissível desde que, cumulativamente, se verifiquem os seguintes requisitos: um primeiro, de natureza formal, nos termos do qual o contrato terá de ser celebrado por escrito, dele devendo constar as indicações previstas no artigo 141.º, n.º 1, do CT, entre as quais, no que aqui poderá interessar, a indicação do termo estipulado e do respetivo motivo justificativo [nº 1, al. e)], dispondo ainda o nº 3 que para efeitos da alínea e) do nº 1, a indicação do motivo justificativo do termo deve ser feita com menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado; um segundo requisito, este de natureza material, nos termos do qual apenas é admissível a sua celebração se verificada alguma das situações previstas no artigo 140.º do CT/2009, entre as quais se conta, no que ao caso importa, o “Acréscimo excecional de atividade da empresa” (alínea f), do seu n.º 1).
Também como é consabido, a lei atribui à inobservância dos requisitos de forma, bem como a celebração de contrato de trabalho a termo fora das situações legalmente previstas, a consequência de que o contrato de trabalho celebrado a termo seja considerado como sem termo (artigo 147.º, n.º 1, als. b) e c), do CT/2009), sendo que, a propósito, importa também salientar que a fundamentação formal do contrato se constitui como formalidade de natureza ad substantiam, o que é reconhecido face a ratio que a ela preside, assim a de permitir que possam ser sindicadas as razões invocadas pela empregadora para justificar a contratação a termo(1).
A respeito da exigida menção do motivo justificativo no contrato, porque melhor não o faríamos, socorrendo-nos do que a esse respeito se fez constar do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22 de fevereiro de 2017(2), pelo que diremos também, seguindo esse Aresto, que essa menção do motivo deve ser feita “com a menção expressa dos factos que o integram, por forma a estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, conforme estabelece o artigo 141º, nº 1, alínea e), e nº 3”, visando-se como este requisito “um duplo objetivo: a verificação externa da conformidade da situação concreta com a hipótese legal ao abrigo da qual se contratou, por um lado; e por outro, a averiguação acerca da realidade e adequação da justificação invocada face à duração estipulada, porquanto o contrato a termo – nas palavras de Monteiro Fernandes[1] – …só pode ser (validamente) celebrado para certos (tipos de) fins e na medida em que estes o justifiquem”. Daí que, como mais uma vez se refere no citado Acórdão, ocorra “a invalidade do termo se o documento escrito omite ou transcreve de forma insuficiente as referências respeitantes ao termo e ao seu motivo justificativo, face à prescrição do artigo 147º, nº 1, alínea c)”, para depois aí se concluir, no que ao caso importa, como veremos mais tarde, “que as fórmulas genéricas constantes das várias alíneas do nº 2 do art. 140º do Código do Trabalho têm de ser concretizadas em factos que permitam estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, por forma a permitir a verificação externa da conformidade da situação concreta com a tipologia legal e que é real a justificação invocada e adequada à duração convencionada para o contrato” – “Por isso, tal indicação deve ser feita de forma suficientemente circunstanciada para permitir o controlo da existência da necessidade temporária invocada pela empresa no contrato, possibilitando também, quanto àquelas necessidades temporárias, que se comprove que o contrato a termo é celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades[3], cabendo ao empregador a prova dos factos que justificam a celebração de contrato de trabalho a termo, conforme prescreve o n.º 5 do mencionado artigo 140º”.
Do exposto decorre que qualquer contrato a termo em que não seja mencionado o motivo que o justifica, do modo antes indicado para dar cumprimento aos termos prescritos na lei, deva ser considerado sem termo – sendo absolutamente irrelevantes, avance-se desde já também, os fundamentos que a entidade empregadora possa vir a invocar na ação judicial, assim como irrelevante será, do ponto de vista material, que pudesse ocorrer justificação bastante para a contratação a termo –, pelo que, ainda em conformidade, apenas o motivo justificativo que é invocado no contrato, e só ele, poderá ser considerado, sendo também irrelevante que, caso ele não se prove, outro motivo possa existir, ainda que substantivamente pudesse justificar a contratação – ainda que fosse esse o caso, não se poderia igualmente atender a esse motivo, havendo que concluir-se pela inexistência do fundamento que consta do contrato, com a consequente conversão do contrato a termo em contrato sem termo.”
Lê-se na fundamentação do Tribunal a quo:
“Com base na factualidade que resultou assente e acima transcrita, incumbe, deste modo, apreciar os pedidos formulados pelo A.
Em primeiro lugar há que apreciar a validade da cláusula do termo aposta no primeiro contrato de trabalho celebrado entre as partes e que vigorou a partir de 16/09/2019. A este propósito o referido contrato dispõe na sua cláusula 12ª:
“O presente contrato de trabalho é celebrado ao abrigo do disposto na alínea a) do nº 4 do art. 140º do Cód. do Trabalho justificando-se a aposição do termo resolutivo pelo facto da EMPRESA MUNICIPAL DE AMBIENTE ... se encontrar a iniciar a sua atividade”.
O preceito legal a que o contrato recorre na redação acima transcrita prevê os casos de admissibilidade de outorga de contrato de trabalho a termo certo, os quais são concedidos em manifesto regime de exceção, já que a legislação portuguesa consagra constitucionalmente (cfr. art. 53º do Texto Fundamental) o princípio de estabilidade do trabalho. No âmbito desta norma legal, do art. 140º do Cód. do Trabalho prevê-se o estabelecimento de um vínculo laboral a termo quando a empresa o justifique com a existência de necessidade temporária. Entre as situações ali enumeradas, a título exemplificativo, consta as descritas no nº 4 do mesmo preceito legal que estatui “a) Lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início do funcionamento de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 250 trabalhadores, nos dois anos posteriores a qualquer um desses factos;”. Ora, se atentarmos na factualidade acima dada como assente, não se pode deixar de concluir que a R. não demonstrou estar em condições de preencher este requisito legal, dado que não só não estamos perante uma atividade de duração incerta, como não se alegou sequer que estamos perante empresa com menos de 250 trabalhadores.
Senão, vejamos.
A empresa municipal em causa visa exercer uma atividade que lhe foi delegada pelo Município ..., e que diz respeito ao tratamento dos resíduos sólidos, entre outras componentes, mas, apenas na área de fiscalização a que estava adstrito o aqui demandante, não se pode deixar de verificar pela continuidade deste serviço até aos dias de hoje que estamos perante uma atividade indispensável ao núcleo de atuação da R. dado que a fiscalização dos procedimentos a adotar pelos comerciantes e particulares na eliminação dos resíduos e outros desperdícios é essencial para assegurar não só o asseio e higiene dos espaços públicos, como para assegurar o cumprimento das regras relativas à reciclagem e outras referentes a este tipo de situações. A atividade levada a cabo pela R. não é ainda transitória, como consta da factualidade supra dada como assente (cfr. os seguintes factos ali descritos: “À data em que foi constituída a Ré, a gestão dos resíduos urbanos e a limpeza do espaço público no Município ... era assegurada pela Divisão Municipal de Limpeza Urbana e Transportes da Câmara Municipal ..., mas alegadamente por se entender que melhor servia o interesse público, o Município ... decidiu optar pelo modelo de empresarialização dos sistemas municipais, criando uma empresa local, a aqui Ré, a quem delegou a prestação desses serviços por um prazo de 15 anos. A constituição de nova unidade orgânica não obrigou à abertura de um qualquer estabelecimento nem à ampliação do mesmo, nem a qualquer deslocalização territorial, permanecendo a prestação de serviços a ocorrer de forma exclusiva no Município ...), dado que o compromisso celebrado com o município se prolonga, pelo menos, até 2032, ou seja, pelo menos mais 10 anos, o que é de todo incompatível, em nosso entender, com a celebração de contratos a termo com os seus trabalhadores com fundamento na circunstância vertida no contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes.
A este propósito sufraga-se o entendimento expresso na maioria da jurisprudência e de que é paradigmático o Ac. do STJ de 23/09/1999, In, CJ/STJ, 1999, 3º-246 quando refere “1-A forma escrita do contrato de trabalho a termo e a explicitação dos seus motivos destinam-se a proteger os interesses dos trabalhadores da existência excecional desse tipo de contrato. II – Os motivos do contrato a termo devem ser objetivos, não bastando a simples referência aos termos da lei. III – O motivo «acréscimo temporário ou excecional da atividade da empresa» pode revelar-se com expressões mais ou menos pormenorizadas e de acordo com a atividade da entidade patronal e das funções do trabalhador. IV – Se no contrato figuram dados que, no seu conjunto, expressem a razão de ser do mesmo revelando de modo suficientemente apreensível e objetivado e se eles preenchem um dos motivos do contrato a termo, considera-se satisfeita a exigência legal.”.
Não podemos, assim, deixar de considerar que a R. não demonstrou a justificação do termo relativamente ao primeiro contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes, pelo que se terá de considerar que estamos perante um contrato de trabalho a termo incerto, (…)”.
Não tendo sido impugnada a matéria de facto, é apenas nos factos que se consideraram assentes a que importa atender.
Quanto ao segmento da decisão recorrida que se deixou transcrito, começa a Apelante por concluir em suma que:
- O primeiro contrato de trabalho a termo certo, celebrado em 16 de setembro de 2019, pelo período de seis meses, encontra-se justificado nos termos do artigo, 140º, n°4, alínea a) do CT;
- Em Janeiro de 2019 foi constituída a Unidade Orgânica de Fiscalização, uma nova atividade que ainda teria de ser consolidada, podendo o Município ... perder o interesse na mesma, daí a sua duração poder ser incerta.
- O Autor/Recorrido foi contratado a termo certo para o início de laboração da UOF.
Tem razão a Apelante quando refere que a redação anterior, aplicável, do artigo 140º, nº 4, alínea a) do Código do Trabalho dispunha que pode ser celebrado contrato de trabalho a termo certo para lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores.
Porém, também nós aferimos não resultar da factualidade que resultou provada tratar-se de atividade de duração incerta.
Ficou mesmo provado que por um período de 15 anos (até 2032), a Ré está obrigada, quer legalmente, estatutariamente ou contratualmente, a assegurar de forma regular, contínua e eficiente a prestação de serviços de gestão de resíduos urbanos e limpeza do espaço público, bem como a exercer atividades de fiscalização e de verificação de infrações no âmbito da atividade por si desenvolvida, encontrando-se investida, bem como os trabalhadores ao seu serviço, dos poderes para o exercício destas atividades, daí que para a prossecução dos seus objetivos a Ré necessite de uma estrutura de recursos humanos permanente e estável, dispondo, desde o início, dos dados necessários para conhecer a sua dimensão necessária.
Temos pois como assertiva a conclusão do Apelado no sentido de estar suprimido o grau de incerteza na atividade da Recorrente, já que sem concorrência e bem assim pelo prazo de 15 anos (até 2032) fixado.
Ou seja, aferimos nós também, ainda que o Autor fosse contratado para o começo da atividade da UOF, tal não bastaria para se aferir a assunção de um risco que por si só justificasse o termo, desde logo por não ser incerta a duração daquela.
Acresce que o contrato de trabalho foi celebrado mais de dois anos e seis meses depois do início da atividade da Recorrente.
Não temos, pois, como concluir que o contrato de trabalho a termo celebrado entre Recorrente e Recorrido foi mesmo motivado pelo lançamento de nova atividade.
Ao invés, como refere o Exm.º Procurador Geral Adjunto “o período inicial de verificação de risco havia já sido ultrapassado.”
Como concluiu também o Autor/Apelado, à data da celebração do contrato de trabalho com o Recorrido (Setembro de 2019), a constituição da referida unidade orgânica não pode ser considerada como lançamento de uma atividade - a atividade de fiscalização - quando muito, de uma simples ampliação quantitativa das atividades que a Recorrente vinha realizando.
Tal como não concluímos tendo em conta a obrigação de assegurar a fiscalização dos serviços prestados por um prazo de 15 anos (até 2032), tratar-se de uma atividade de duração incerta, a da Ré, como tal que se mostra verificado este último pressuposto previsto no artigo 140º, nº 4, al. a) do Código do Trabalho (redação aplicável).
Igualmente não somos sensíveis à afirmada possibilidade de o Município ... poder entregar os serviços de fiscalização a entidade terceira através de concessão.
Não é essa possibilidade de externalização, a concessão dos serviços de fiscalização ao sector privado que tornaria incerta a duração da atividade a ponto de justificar o termo clausulado.
Igualmente não temos como determinante o facto de as empresas municipais poderem requerer a sua insolvência. Ou seja, não é essa eventualidade -traduzindo um risco empresarial- que tornaria incerta a duração da atividade a ponto de justificar o termo clausulado.
Já quanto ao alegado facto público e notório das enormes dificuldades surgidas com a pandemia por Covid-19, evidenciarem a suscetibilidade de alterações supervenientes de circunstâncias implicarem uma mudança na forma como a nova atividade da Recorrente se desenvolvia, outrossim em nosso entender daí não resulta um risco a que da mesma se justificasse sem mais o termo clausulado.
Aliás, nada resultou provado no sentido de se aferir qualquer relevância daquela pandemia, aquando da celebração do contrato de trabalho a termo certo, em 16 de Setembro de 2019, não sendo possível aferir-se que por si só a mesma reflete o risco do lançamento da nova unidade orgânica de fiscalização.
Como concluiu o Autor/Recorrido, alegar uma situação perfeitamente anormal, excecional e temporária, como aquela decorrente das medidas adotadas em virtude da epidemia COVID-19, para demonstrar o especial "risco empresarial" ou a "incerteza" da atividade da Ré/Recorrente, carece de qualquer sentido.
Mais concluiu a Apelante que o que ficou provado não foi uma contratação sucessiva para satisfazer necessidades permanentes da empresa, mas sim uma sobreposição de contratos a termo certo.
Ajuizou-se na sentença ser “(…) igualmente inválida a celebração duma renovação daquele contrato de trabalho a termo em que a justificação passou a ser que a Ré “se encontrava a efetuar uma reavaliação da atividade das equipas de fiscalização, atendendo ao decréscimo acentuado na produção de resíduos e de estabelecimentos comerciais a ser alvo de fiscalização/sensibilização, em consequência da atual crise económica resultante da pandemia Covid-19, pelo que seria necessária a avaliação da manutenção ou não, da atividade destas equipas de fiscalização, pelo período de duração do contrato”.
Antes de mais salienta-se que a própria demandada não caracteriza este novo vínculo como uma novo contrato de trabalho a termo, mas antes como uma renovação (aqui pela segunda vez, sendo certo que tendo sido celebrado com prazo de 6 meses a primeira das suas renovações ocorreu em Março de 2020) ocorrida no termo da vigência da segunda renovação do primeiro contrato de trabalho celebrado pelas partes o que é aqui extremamente relevante dado que se poderia considerar que mesmo que o primeiro dos contratos de trabalho em análise passasse a ser considerado como contrato de trabalho sem termo, a celebração dum segundo contrato de trabalho a termo colocaria um ponto final na vigência do primeiro vínculo passando a vigorar o segundo contrato. Mas, tal como alega a própria R. o segundo contrato de trabalho, celebrado em 16/09/2020 foi considerado como uma renovação do primeiro contrato, apenas com a inclusão de novo fundamento para o termo, o qual nos parece de forma evidente igualmente desprovido de legitimidade.
Na verdade, a reavaliação da atividade determinada pelo impacto da pandemia de Covi-19 não só já deveria ter sido efetuada, enquanto vigorou o primeiro contrato, é necessário não esquecer que o primeiro confinamento foi imposto em Março de 2020, pelo que já haviam decorrido cerca de 6 meses entre esta circunstância e a renovação do contrato que vigorava com o ora A., como ainda esta reavaliação da atividade de fiscalização não traduz qualquer circunstância atendível que justifique a precariedade do vínculo existente com o A., já que não só a fiscalização ainda que diminuída manteria sempre a sua existência, mesmo que limitada temporariamente a um mínimo, ou levada a cabo de forma adaptada às regras sanitárias em vigor e à diminuição da atividade comercial desenvolvida na zona de intervenção da R.”, (realce e sublinhado nossos).
Temos como acertada tal ponderação, a qual afasta a suficiência da justificação traduzida na ‘reavaliação da atividade’, ainda que de uma sobreposição de contratos se tratasse.
Ainda a este respeito, acompanhamos o desiderato da decisão recorrida, “A circunstância de estarmos perante uma renovação do primeiro contrato de trabalho a termo celebrado entre as partes determina também, em nosso entender, que a invalidade da primeira justificação aposta na cláusula 12ª do primitivo contrato celebrado entre as partes em 16/09/2019 não foi suprimida com a celebração desta renovação, que apenas agravou a sua ilicitude, pelo que os efeitos da ilicitude decorrentes da inexistência de justificação para o termo introduzido no vínculo laboral outorgado entre as partes deverão retroagir até ao primeiro contrato de trabalho.”
A Apelante concluiu ainda que:
- As admissões de 3 trabalhadores referidas na sentença recorrida ocorreram em novembro de 2020 e a cessação do contrato do Recorrido verificou-se a 15 de março de 2021, não se aplicando o nº1 do artigo 143º do Código do Trabalho, cuja proibição se refere a nova admissão após a cessação de um primeiro contrato a termo, o que não acontece no caso sub judice.
- Não existiram novas admissões através de contrato de trabalho a termo ou de trabalho temporário cuja execução se concretize no mesmo posto de trabalho, ou ainda de contrato de prestação de serviços para o mesmo objeto.
- Sempre seria aplicável a exceção do artigo 143º, nº 2, alínea b) do Código do Trabalho, ou seja, a verificação de um acréscimo excecional da atividade da empresa após a cessação do contrato.
Não merece reparo o ponderado na decisão recorrida, considerando as admissões mais recentes relativamente à admissão do Autor - no sentido de “(…) não colhendo a explicação avançada pelo responsável pelos recursos humanos da R. de que teria sido opção fazer cessar contratos de trabalho que já vigoravam porque o seu termo se aproximava ao invés de fazerem cessar os mais recentes, porque o primeiro critério legal para a extinção dum posto de trabalho é sempre o de dar preferência aos contratos de trabalho em vigor há mais tempo, o que nos parece tão lógico que dispensa qualquer outra explicação.”
De resto, da factualidade provada não se afere o invocado acréscimo excecional da atividade da empresa, sendo questão nova, suscitada apenas em sede de recurso e como tal excluída do respetivo âmbito.
Em conformidade, improcede, sem mais, o recurso interposto pela Apelante.

3. Decisão:
Em conformidade, acordam os Juízes desta Relação em julgar improcedente a apelação da Ré.
Custas da apelação a cargo da Ré.

Porto, 5 de Junho de 2023
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão
Paula Leal de Carvalho