Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
661/18.4T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANTÓNIO LUÍS CARVALHÃO
Descritores: ART.º10/1
LAT
ÂMBITO DA PRESUNÇÃO
ACIDENTE DE TRABALHO
ÓNUS DE PROVA
Nº do Documento: RP20230605661/18.4T8PNF.P1
Data do Acordão: 06/05/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Não se encontra estabelecida no art.º 10º, nº 1, da LAT, qualquer presunção da existência do acidente, mas antes uma presunção de que existe nexo causal entre o acidente e a lesão ocorrida, sendo que, sabendo-se que a reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho exige a demonstração de um duplo nexo causal, entre o acidente e o dano físico ou psíquico, e entre este e o dano laboral, a mesma presunção também não abrange esta segunda relação de causalidade, incumbindo ao sinistrado a sua demonstração.
II - Por se tratar de factos constitutivos do direito invocado (art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil), os requisitos ou pressupostos de um acidente de trabalho deverão ser alegados e provados por quem reclama a respetiva reparação (sendo esta a regra), sem prejuízo de a lei facilitar essa tarefa, criando presunções a seu favor.
III - Em face do conceito de acidente de trabalho, é de concluir que esse não se provou num caso em que se provou que o sinistrado sofreu um episódio hemorragia intracerebral espontânea (AVC), não se provando que o AVC foi subsequente a traumatismo decorrente de queda, não sendo bastante para se poder concluir em sentido diverso a circunstância de ser pacífico ter ocorrido quando no local e no tempo de trabalho.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso de apelação n.º 661/18.4T8PNF.P1
Origem: Comarca do Porto Este, Juízo do Trabalho de Penafiel – J4

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO
Depois de frustrada a tentativa de conciliação, AA (Autor/Sinistrado) apresentou petição inicial para impulso da fase contenciosa deste processo para a efetivação de direitos resultantes de acidente de trabalho (conforme art.º 117º, nº 1, al. a) do Código de Processo do Trabalho), contra “A..., Lda.” (1ª Ré/Empregadora) e “B... – Companhia de Seguros, S.A.” (2ª Ré/Seguradora), pedindo a condenação das Rés a reconhecer a existência do acidente de trabalho descrito na petição inicial, bem como todas as lesões e sequelas descritas como consequência direta e necessária do mesmo, e ainda a pagar-lhe todas as quantias que vierem a ser fixadas em incidente de liquidação relativas à incapacidade que lhe for fixada, às despesas médicas e medicamentosas, ao subsídio de elevada incapacidade e às obras de adaptação da sua casa, permitindo assim a efetivação dos direitos do Autor resultantes do relatado acidente de trabalho.
Fundou o seu pedido alegando, em síntese, que estava ao serviço da sua empregadora, a 1ª Ré, quando, ao tomar duche, caiu e bateu com a cabeça, tendo-lhe sido diagnosticado AVC, sendo submetido a intervenção cirúrgica a que se seguiu reabilitação; a queda e consequente AVC foram desencadeados por patologia pré-existente, que era conhecida da Empregadora, e por violenta discussão dias antes com o representante da Empregadora, que o levaram a sentir-se muito ansioso, nervoso, instável; no certificado multiuso foi-lhe atribuída IPP de 83%, e por médico perito na avaliação do dano corporal IPP de 84,7%; atualmente encontra-se a receber pensão da Segurança Social; demanda a Empregadora porque a mesma na tentativa de conciliação não aceitou a retribuição por si alegada.

Citadas as Rés, cada uma apresentou contestação, alegando, em resumo:
− a 1ª Ré/Empregadora, que o valor da retribuição mensal não corresponde ao alegado (as ajudas de custo no estrangeiro) não entram para o seu cálculo); daquilo que apurou o Autor não sofreu acidente de trabalho, estando em causa doença natural (não caiu e sofreu AVC, sofreu AVC e caiu), impugnando o alegado pelo Autor; o Autor foi reformado por invalidez; concluiu dever ser decidido que o Autor não sofreu acidente de trabalho.
− a 2ª Ré/Seguradora, por um lado que se verifica a caducidade do direito de ação do Autor, e por outro lado impugnando o alegado, dizendo que o Autor não sofreu acidente de trabalho; concluiu dever ser declarada a caducidade do direito do Autor, ou, caso assim não se entenda, deve a ação ser julgada improcedente.

Citado o Instituto da Segurança Social, I.P., nos termos e para os efeitos do disposto no art.º 1º, nº 2 do Decreto-lei nº 59/89, de 22 de fevereiro, foi apresentado “pedido de reembolso” pedindo a condenação das Rés a pagar-lhe a quantia de € 29.365,85, acrescida de juros de mora à taxa legal, correspondente aos valores pagos ao Autor a título de subsídio de doença, prestação compensatória de subsídio de férias de 2014 e 2015, e prestação compensatória de subsídio de natal de 2014 e 2015.

As Rés apresentaram contestação ao pedido de reembolso.

Foi realizada «audiência prévia», na qual, depois de frustrada a tentativa de conciliação, proferido despacho a convidar o Autor a suprir a alegação de factos na petição inicial.

Depois de o Autor apresentar requerimento em resposta ao convite formulado, e as Rés exercerem o contraditório, foi proferido despacho saneador, no qual foi afirmada a regularidade e validade da instância, consignando-se os factos assentes e elaborando-se base instrutória.
Foi determinada a abertura de apenso para fixação de incapacidade, nos termos do art.º 131º, nº 1, al. e) do Código de Processo do Trabalho.

Nesse apenso [com a letra A], foi, depois de realizado exame por junta médica, proferida despacho com o seguinte teor: mostrando-se controvertida a existência de acidente de trabalho nestes autos, aquando do julgamento dos autos principais, proceder-se-á ao julgamento do presente incidente.

Realizada audiência de discussão e julgamento, em 16/01/2023 foi proferida sentença[1] decidindo julgar a ação totalmente improcedente, absolvendo as Rés dos pedidos deduzidos pelo Autor, bem como do pedido de reembolso apresentado pelo Instituto da Segurança Social, I.P..
Foi fixado o valor da ação em € 376.189,73.

O Autor solicitou cópia das gravações de todas as sessões de «audiência de discussão e julgamento», que lhe foi disponibilizada.

Em 03/02/2023 foi apresentado, pelo Autor, requerimento (dirigido ao juiz de 1ª instância) arguindo “nulidade por falta e deficiência da gravação”, que concluiu requerendo:
a) a anulação dos depoimentos deficientemente gravados, que deverão ser repetidos e novamente gravados em audiência de julgamento.
E, em consequência:
b) a anulação da sentença proferida;
sem prescindir, caso assim não se entenda:
a) seja remetida ao ora Signatário a gravação de todas as sessões de Audiência de Discussão e Julgamento e em boas condições de audição, conforme anteriormente requerido;
b) seja concedido um acréscimo de 10 dias ao prazo para interposição de recurso.

Depois, em 14/02/2023, veio o Autor interpor recurso da sentença proferida, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem[2]:
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CXXII. In casu, deveria o Tribunal a quo ter procedido à consideração da existência de um acidente de trabalho e condenado os Recorridos ao pagamento das quantias a apurar, razão pela qual deve a decisão proferida ser substituída em consonância.
Termina dizendo dever o recurso ser julgado procedente.

A 1ª Ré/Empregadora apresentou resposta, formulando as seguintes CONCLUSÕES, que se transcrevem:
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23. Dever-se-á manter a douta decisão recorrida, na parte posta em crise pelo Autor recorrente, pelas razões de facto e de direito que dela constam e que, com a devida vénia se subscrevem.
Termina dizendo dever ser negado provimento ao recurso interposto pelo Autor, e a sentença recorrida ser mantida na parte posta em crise pelo Apelante.

A 2ª Ré/Seguradora apresentou resposta, sem formular conclusões, mas concluindo dever o recurso do Apelante ser rejeitado ou, caso assim não se entenda, deve julgar-se que não ode já invocar qualquer nulidade processual ou da decisão em crise mais devendo, em todo o caso, ser o presente recurso julgado totalmente improcedente por não ter qualquer suporte fáctico ou jurídico, mantendo-se a decisão da matéria de facto e a decisão de mérito nos exatos moldes doutamente fixados na decisão em crise, que deve ser confirmada.

Em 16/03/2023, foi proferido despacho a considerar que a falta ou deficiência da gravação foi invocada (pelo Autor) muito para lá do prazo de 10 dias a que alude o art.º 155º, nos 3 e 4 CPC, aplicável ex vi art.º 1º, n.º 2, al. a), CPT, sendo manifestamente extemporânea.
Foi mandado subir o recurso de apelação, imediatamente, nos próprios autos, e com efeito meramente devolutivo.

O Sr. Procurador-Geral-Adjunto, neste Tribunal da Relação, emitiu parecer (art.º 87º, nº 3 do Código de Processo do Trabalho), pronunciando-se no sentido de ser rejeitado o recurso, sendo referido essencialmente o seguinte:
Quanto à invocada nulidade da sentença merecem a nossa inteira concordância a resposta da Mmª. Juíza a quo e da Recorrida Seguradora, que a afastam e a cujas teses se adere, pelos seus rigores argumentativos e pela preclusão de a suscitar.
Consequentemente, naufragam as XXVI a XXIX conclusões – cfr. Acs do STJ de 12/10/2022, e deste TRPorto, de 17 de dezembro de 2014, consultáveis in www.dgsi.pt.
Quanto ao juízo de inconstitucionalidade, também terão de soçobrar as XXX. a XXXII. conclusões, uma vez que o Recorrente não suscitou tal questão de forma processualmente adequada por não ter observado o ónus previsto no art.º 72º da Lei nº 28/82, de 15/11 – cfr. Acórdão do Tribunal Constitucional nº 560/94, in http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/.
No mais, ressalvado o respeito devido por melhor opinião em contrário, nenhum reparo ou censura há que ser feito à douta sentença recorrida, pelo que não assiste qualquer razão ao Recorrente, face ao teor da sua argumentação e como as Recorridas claramente o demonstram.
Começaremos por observar que das alegações e conclusões que o Recorrente apresenta não se invoca a violação de norma processual em clara violação do disposto no art.º 639º nº 2 do CPC e o que constitui um modo impróprio de impugnar.
As conclusões formuladas, tal como a Recorrida Seguradora o expressa, são prolixas, a ponto de reproduzirem a bem dizer ipsis verbis o teor do corpo da alegação. Daí que o recurso haja de ser rejeitado – cfr. al. b) do nº 2 do art.º 641º CPC; tb. Amâncio Ferreira, Manual dos recursos em Processo Civil, pág. 167 e Aveiro Pereira, O ónus de concluir nas alegações de recurso em processo civil, pág. 31, in www.trl.mj.pt/PDF/Joao%20Aveiro.pdf. Diz este ilustre autor, que “as conclusões têm, pois, necessária e legalmente de ser curtas, claras e objetivas, para que não deixem dúvidas quanto às questões que o tribunal ad quem deve e pode conhecer”.
Interposto recurso de uma decisão, é esta que constitui o objeto daquele, ficando o recorrente sujeito a «… submeter expressamente à consideração do tribunal superior as razões da sua discordância para com o julgado, ou melhor, os fundamentos por que o recorrente acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que o tribunal tome conhecimento delas e as aprecie …» - cfr. Prof. Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, vol. V, p. 357, conforme entendimento doutrinal e jurisprudencial pacífico.
Pelas alegações, a parte há de expor as razões da sua divergência quanto à decisão recorrida - ónus de alegar. Pelas conclusões, há de fazer a anotação sintetizada das razões por que implora a alteração ou a anulação da decisão recorrida – ónus de formular conclusões.
Nos termos do art.º 627º nº. 1, do Código de Processo Civil, as decisões judiciais são atacadas por meio de recursos, determinando o seu art.º 639º nº 2, que o Recorrente deve o observar o ónus que lhe é imposto quanto às normas jurídicas violadas.
Este normativo tem por finalidade levar o Recorrente a sujeitar expressamente à ponderação do tribunal superior as razões do seu desacordo para com o decidido, dando a conhecer os motivos por que acha que a decisão deve ser anulada ou alterada, para que aquele delas tome conhecimento e as aprecie em conformidade.
Das conclusões, apesar de terem sido formuladas termos formais e sem observância das sobreditas imposições legais, não se pode retirar qual a pretensão do Recorrente, que não logrou demonstrar o concreto desacerto do julgado.
Este terá, pois, de ser dado como estabilizado. Com efeito e na ótica do Recorrente, o que está em causa, no que aqui releva, seria saber se a decisão recorrida deu adequada resposta à qualificação do acidente sofrido pelo Recorrente como sendo de trabalho.
O recurso está, necessariamente, votado ao insucesso.
Daí que a sentença sub iudice haja de ser mantida na ordem jurídica.

Não houve resposta ao parecer.

Procedeu-se a exame preliminar[3], foram colhidos os vistos, após o que o processo foi submetido à conferência.
Cumpre apreciar e decidir.
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FUNDAMENTAÇÃO
Conforme vem sendo entendimento uniforme, e como se extrai do nº 3 do art.º 635º do Código de Processo Civil (cfr. também os art.ºs 637º, nº 2, 1ª parte, 639º, nºs 1 a 3, e 635º, nº 4 do Código de Processo Civil – todos aplicáveis por força do art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho), o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação apresentada[4], sem prejuízo, naturalmente, das questões de conhecimento oficioso.
Assim, aquilo que importa apreciar e decidir neste caso[5] é saber se:
● a sentença recorrida é nula?
● houve erro de julgamento sobre a matéria de facto?
● o Autor sofreu acidente que é de considerar como de trabalho (conforme prevê a LAT[6])?
*
Porque tem interesse para a decisão do recurso, consignam-se desde já os factos dados como provados e como não provados na sentença de 1ª instância, objeto de recurso.
Quanto a factos PROVADOS, foram considerados os seguintes, que se reproduzem:
0.[7] A Ré Patronal nunca participou à Ré Seguradora o acidente de trabalho sofrido pelo Autor.
1. No dia 16 de maio de 2013 o Autor sofreu um AVC, em Basileia, na Suíça.
2. A Ré Entidade Patronal teve conhecimento do referido em 1), no próprio dia e previamente ao conhecimento dos familiares do Autor.
3. Os colegas do Autor relataram à Entidade Patronal o sucedido e esta passou a acompanhar de perto a situação do Autor.
4. A mulher do Autor teve conhecimento do acidente através de um telefonema da própria Ré Entidade Patronal, nessa mesma quinta-feira do dia do dia 16 de maio de 2013.
5. O Autor nasceu em 28/10/1972.
6. O Instituto da Segurança Social pagou ao Autor a quantia de € 27.366,65 (vinte e sete mil, trezentos e sessenta e seis euros e sessenta e cinco cêntimos), a título de Subsídio de Doença, no período decorrido de 16/05/2013 a 14/05/2016, a quantia de € 621,60 (seiscentos e vinte e um euros e sessenta cêntimos) a título de Prestação Compensatória de Subsídio de Férias de 2014, a quantia de € 621,60 (seiscentos e vinte e um euros e sessenta cêntimos) a título de Prestação Compensatória de Subsídio de Férias de 2015, a quantia de € 378,00 (trezentos e setenta e oito euros) a título de Prestação Compensatória de Subsídio de Natal de 2014 e a quantia de € 378,00 (trezentos e setenta e oito euros) a título de Prestação Compensatória de Subsídio de Natal de 2015.
7. Através do contrato de seguro n.º AT29111435 a aqui Ré Patronal transferiu a sua responsabilidade infortunístico-laboral para a Ré Seguradora, pela retribuição base de € 600,00 x 14, acrescida do subsídio de alimentação de € 50 x 11 e de ajudas de custo de € 1.050,00 x 12, num total anual de € 21.550,00.
8. O Autor esteve impedido de se expressar quanto ao total circunstancialismo da ocorrência do acidente até março de 2018, designadamente quanto ao acidente traumático ao nível da cabeça e que favoreceu a rotura de vaso com malformação e paulatinamente foi conseguindo expressar-se em moldes mais percetíveis.
9. Há cerca de 8 anos, o Requerente celebrou com a empresa “A..., Lda.”, com sede no Lugar ..., ..., (...) Leiria, um contrato de trabalho, para desempenhar as funções de motorista de pesados de mercadorias de longo curso para toda a Europa, sob as ordens da sobredita empresa.
10. Mediante uma retribuição anual total de (€ 600,00 x 14) + (€ 30,00 x 12) + (€ 285,90 x 11) + (€ 120,00 x 11) + € 50,00.
11. O Autor auferia ainda a retribuição média de € 890,00 x 12 correspondente a ajudas de custo relativas ao facto de ser motorista de transporte internacional.
12. No dia 15 de maio de 2013, o Requerente (Autor) chegou ao Estado de Basileia, Suíça, depois de fazer um transporte de mercadorias.
13. O Autor deslocou-se à alfândega para tratar da documentação da mercadoria.
14. No dia 16 de maio de 2013, da parte da tarde, o Autor pretendia proceder à descarga do veículo com a mercadoria que havia de transportar para Portugal, para depois poder proceder à carga.
15. Em momento não concretamente apurado, mas seguramente entre as 10.30 h e as 11.50 h – fuso horário da Europa Central – do dia 16 de maio de 2013, o Autor estava no balneário das instalações da C..., Suiça e aí sentiu-se mal.
16. Caminhou para o exterior para pedir socorro.
17. Pediu auxílio e, seguidamente, foi conduzido de urgência para o Hospital ....
18. Diagnosticaram-lhe um AVC, tendo sido operado de urgência nesse estabelecimento hospitalar.
19. Aí permaneceu desde o dia 16 de maio até ao dia 06 de junho.
20. De seguida foi transferido para um centro de reabilitação neurológico, denominado “Rehab Basel Klinic Fur Neurtotehabilitathion und Paraplegiologie”, sito em ..., ..., ..., Basileia, Suíça.
21. Aí permaneceu, de 06 de junho a 09 de setembro, com o propósito de readquirir as capacidades necessárias à vida, tal como alimentação, fala e movimentos no braço e na perna.
22. Neste período de tempo, é conduzido de novo ao Hospital, a fim de se sujeitar a intervenção cirúrgica para revestimento ósseo do couro cabeludo.
23. No dia 15 de setembro seguinte, regressa a Portugal, tendo ingressado no Hospital 1... no Porto, onde se manteve até ao final do ano, tendo sido sujeito a recuperação de fala e movimento.
24. De janeiro a março de 2014 esteve internado no Centro de Reabilitação ..., Vila Nova de Gaia, com o mesmo fim de recuperação.
25. A partir daí passou a fazer a mesma terapia em regime ambulatório no Hospital 2....
26. O Autor, antes do acidente, sofria de fibrilação auricular paroxística e HTA, motivo pelo qual o Autor se encontrava a ser medicado com Varfin, ASS, Concore e Cordarone.
27. Encontrando-se hipocoagulado, medicado e equilibrado.
28. O Autor passou a ter necessidade de nova medicação, de apoio de fisioterapia constante e de terapia da fala, bem como ajuda de terceira pessoa constantemente, e obras de adaptação da sua habitação.
29. O Autor sofreu uma doença natural.
30. O Autor sofreu um episódio hemorragia intracerebral espontânea, AVC.
31. A hemorragia intracerebral espontânea ou acidente vascular cerebral hemorrágico (AVCH) é o sangramento espontâneo resultante da rutura de pequenas artérias cerebrais penetrantes em diferentes localizações do tronco cerebral, cerebelo, tálamo, gânglios da base e lobos cerebrais).
32. As principais etiologias associadas ao AVCH são hipertensão arterial que corresponde a 50% dos casos, a angiopatia amilóide 30% e entre 15% a 20% estão os aneurismas intracranianos, mal formação artério venosa (MAV), coagulopatia, vasculite, neoplasia primária e secundaria, trombose de seio venoso e transformações hemorrágica de acidente vascular cerebral isquémico.
33. A hemorragia cerebral espontânea, também chamada de hematoma intracraniano não traumático, é a ocorrência de sangramentos intracranianos gerando coágulos sanguíneos não decorrentes de traumatismo craniano.
34. Os hematomas espontâneos geralmente estão associados à fragilidade vascular e a fatores de risco, entre os quais se destacam hipertensão arterial, tabagismo, dislipidemias e uso de medicamentos antiagregantes e/ou anticoagulantes.
35. Os sangramentos podem ocorrer em qualquer lugar do cérebro, tendo preferência por regiões profundas, como núcleos da base e cerebelo, podendo causar desde sintomas discretos até déficits neurológicos graves e coma.
36. O Autor sofreu esta alteração do seu estado de saúde por causas naturais, determinada pela sua condição física.
37. O Autor era doente cardíaco e que fazia hipocoagulação.
38. O Autor sofria de fibrilação auricular paroxística e HTA, ou seja, Hipertensão Arterial.
39. A fibrilação auricular é uma doença em que o ritmo cardíaco é anormal, caracterizado por batimentos rápidos e irregulares, em que os episódios têm muitas vezes início com breves períodos de batimentos anormais que, com o passar do tempo se tornam estáveis e a intervalos maiores.
40. Muitos episódios são assintomáticos e, em alguns podem-se manifestar sintomas como palpitações, desmaio, falta de ar ou dor no peito.
41. A doença está associada a um risco acrescido de insuficiência cardíaca, demência e acidente vascular cerebral (AVC).
42. A Hipertensão Arterial é uma doença crónica em que a pressão sanguínea nas artérias se encontra constantemente elevada.
43. A doença geralmente não causa sintomas.
44. A longo prazo é um dos principais fatores de risco para uma série de doenças graves como a doença arterial coronária, o acidente vascular cerebral, insuficiência cardíaca, doença arterial periférica, incapacidade visual, doença renal crónica e demência.
45. O Autor tomava:
− o VARFINE é utilizado como anti coagulante oral, na prevenção e no tratamento de tromboses das veias profundas e do tromboembolismo pulmonar e na prevenção do tromboembolismo em doentes com fibrilação auricular ou submetidos a cirurgia das válvulas cardíacas. Em linguagem coloquial, torna o sangue mais líquido, ou seja, provoca hipocoagulação, conhecido fator de risco para a hemorragia intracerebral espontânea;
− o Concor é um medicamento cuja substância ativa é o bisoprolol. O bisoprolol pertence a um grupo de medicamentos denominados bloqueadores beta. Estes medicamentos funcionam afetando a resposta do organismo a determinados impulsos nervosos, principalmente no coração. Como resultado, o bisoprolol diminui a frequência cardíaca e faz com que o coração seja mais eficiente a bombear o sangue para todo o organismo.
− o Cordarone pertence ao grupo de medicamentos chamado de antiarrítmicos. Este medicamento controla o batimento irregular do coração (a chamada “arritmia”). A toma destes comprimidos ajuda o ritmo do coração a voltar ao normal. O Cordarone 200 mg é usado para tratar batimentos cardíacos irregulares quando outros medicamentos não funcionaram ou não podem ser utilizados.
46. As doenças do Autor – fibrilação auricular paroxística e HTA –, a medicação que tomava por causa das mesmas e o seu estado de hipocoagulado, são fatores de risco para uma hemorragia intracerebral espontânea ou AVCH, a qual, em tais circunstâncias, pode surgir a qualquer momento, sem necessidade de qualquer fator externo – físico ou psicológico – que a desencadeie.
47. O Autor tem certificado multiusos de 28/02/2014, com IPP de 83%, estando incapaz para o trabalho desde essa altura.

E quanto a factos NÃO PROVADOS, foi consignado que, com interesse para a decisão da causa, não resultaram provados quaisquer outros factos, designadamente os seguintes:
i. Aquando do referido em 14) dos factos provados, quando o Autor se encontrava no duche, caiu e bateu com a cabeça.
ii. Apesar de terem passado duas pessoas, nenhuma a ajudou, tendo conseguido pedir auxílio a uma terceira.
iii. O referido em 25) e 26) dos factos provados era do conhecimento dos representantes da sua empregadora.
iv. Nos dias anteriores ao sinistro acima descrito, o Autor andava muito nervoso e especialmente tenso, uma vez que sentia que o tratamento que recebia por parte da sua Empregadora era diferente.
v. No dia em que lhe foi transmitido o transporte que iria efetuar, o Autor esteve 2 horas sentado numa sala sozinho, à espera, até lhe ser dito que deveria realizar o próximo transporte para a Suíça.
vi. Ocorreu discussão entre o Autor e o representante da sua empregadora, fazendo o Autor sentir-se especialmente tenso e nervoso.
vii. Tais fatores, aliados à patologia pré-existente do Autor, fizeram o Autor sentir-se ansioso, nervoso, instável, desencadeando o sinistro, nomeadamente a queda e o consequente AVC.
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Da nulidade da sentença recorrida:
Alega o Recorrente ser nula a sentença recorrida, porquanto, da audição das gravações constantes do CD remetido prelo tribunal a quo, se deparou com falta e deficiência de gravações.
Ora, está claro que aquilo que está em causa é um vício procedimental, alegadamente cometido durante a audiência (na sua gravação) ou na disponibilização da gravação ao Recorrente, nada tendo a ver com a sentença proferida.
Ou seja, não estamos aqui perante nulidade da sentença proferida – casos que constituem fundamento de recurso (art.º 615º, nº 4 do Código de Processo Civil) – antes perante eventual nulidade processual, ainda que, a verificar-se, por arrastamento a sentença venha a ser anulada.
Sendo assim, estando em causa nulidade processual, cabe argui-la perante o tribunal onde alegadamente se verificou a falta (cfr. art.ºs 186º a 202º do Código de Processo Civil) [8], só conhecendo o tribunal de 2ª instância em caso de recurso sobre o decidido.
Com efeito, ainda que a nulidade processual afete a sentença, deve ser objeto de prévia “reclamação” que permite ao próprio juiz reparar o vício[9], ainda que com prejuízo da sentença proferida, ficando a decisão do tribunal de 1ª instância submetida às regras gerais de recorribilidade [10] [cumprindo lembrar que cabe recurso de apelação da decisão que seja proferida depois da decisão final – art.º 79º-A, nº 2, al. j) do Código de Processo do Trabalho].
No caso da situação alegada pelo Recorrente, o nº 3 do art.º 155º do Código de Processo Civil dispõe que a gravação deve ser disponibilizada às partes no prazo de 2 dias a contar do respetivo ato, estabelecendo o nº 4 do mesmo artigo um prazo de 10 dias, a contar do momento em que a gravação é disponibilizada, para a parte invocar a falta ou deficiência da gravação.
Quer isto dizer que se impõe que as partes interessadas acedam à gravação da audiência de julgamento com brevidade, de modo a invocar a falta ou deficiência da gravação se for o caso, tendo o legislador criado as condições para um regime eficaz e célere de suprimento de eventuais vícios que se verifiquem na documentação das declarações orais.
Caso a parte não faça o controlo da gravação nos prazos estabelecidos, adota um procedimento negligente que não é merecedor de qualquer proteção legal, sanando-se eventual nulidade.
Ora, no caso sub jucide, em consonância com o acima referido, o Autor apresentou requerimento junto do tribunal de 1ª instância em que invocou a nulidade decorrente da falta e deficiência de gravações, e o tribunal a quo apreciou esse requerimento apresentado pelo Autor, tendo indeferido a sua pretensão, considerando o requerimento extemporâneo, concluindo da seguinte forma:
Face à referida matéria de facto, teremos de concluir que a entrega da gravação/registo da prova da audiência de julgamento foi requerida pelo Autor em 03/02/2023 e que o mesmo invoca agora a nulidade de registos de sessões de audiência de julgamento de 19 de maio de 2019 e de 09 de junho de 2021, pelo que a falta ou deficiência da gravação foi invocada muito para lá do prazo de 10 dias a que alude o art.º 155º, nos 3 e 4 CPC, aplicável “ex vi” art.º 1º, n.º 2, al. a) CPT, sendo manifestamente extemporânea.
Encontrando-se sanada a invocada nulidade, julga-se improcedente o incidente suscitado pelo Autor a fls. 436 e ss, julgando-se igualmente improcedente a invocada nulidade do processado e a da sentença, indeferindo-se também a concessão de prazo adicional para recurso.
Não consta que o Autor tenha interposto recurso desse despacho, o que quer dizer que não pode estar agora a questão em apreciação.
Na verdade, dispõe o nº 1 do art.º 620º do Código de Processo Civil, com a epígrafe «caso julgado formal», que as sentenças e os despachos que recaiam unicamente sobre a relação processual têm força obrigatória dentro do processo.
É que, proferida uma decisão fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz quanto à matéria nela apreciada (art.º 613º do Código de Processo Civil), o que implica que o juiz já não pode alterar a decisão proferida por seu puro critério, apenas podendo, durante algum tempo, haver alteração através dos meios previstos nos art.os 614º a 617º do Código de Processo Civil (aplicáveis aos despachos por via do nº 3 do art.º 613º), ou por via de recurso, se for interposto (caso se verifiquem os respetivos pressupostos).
Podemos dizer que o “despacho que recaia unicamente sobre a relação processual” é todo aquele que, em qualquer momento do processo, aprecia e decide uma questão que não seja de mérito[11].
Em suma, ao não ser interposto recurso do despacho que indeferiu a pretensão do Autor de ver declarada a nulidade decorrente de alegada omissão/deficiência na gravação, a questão ficou decidida em definitivo no processo.
Alega, ainda, o Recorrente que caso não se entenda estarmos perante a invocada nulidade da sentença, o que não se concede, e por mero dever de patrocínio se contempla, tal decisão deverá ser considerada inconstitucional, pois tendo ocorrido a omissão da formalidade obrigatória prevista no n.º 4 do artigo 155.º do Código de Processo Civil, incorre na violação dos artigos 18º, nº 1, 20º, n.º 4, 204.º, todos da Constituição da República Portuguesa, na medida em que obsta à possibilidade do ora Recorrente ter direito a um processo equitativo e a uma tutela jurisdicional efetiva, vendo-se coartado na defesa dos seus direitos em sede de recurso para tribunal superior (cfr. conclusões XXIX a XXXII).
Como se vê, fala o Recorrente de inconstitucionalidade da decisão proferida pelo tribunal a quo (conclusão XXXI), parecendo referir-se à decisão que apreciou o requerimento em que solicitou ao tribunal a quo “a anulação dos depoimentos deficientemente gravados” e consequente “anulação da sentença proferida” [decisão que aquando da apresentação do recurso ainda não tinha sido proferida, donde referir o Recorrente “caso não se entenda… tal decisão deverá ser considerada”; porém, depois de proferida, dela não recorreu], mais parecendo, uma vez que invoca o nº 2 do art.º 72º da Lei nº 28/82, de 15 de novembro (Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional), entender que assim passará a ter legitimidade para apresentar eventual recurso junto do Tribunal Constitucional.
Ora, a inconstitucionalidade não seria da decisão em si, mas antes dum juízo sobre determinada norma (que o Recorrente não identifica).
Se dúvidas houver, tal é esclarecido por Carlos Lopes do Rego[12], dizendo que no nosso sistema jurídico, o controlo da constitucionalidade tem natureza estritamente normativa, constituindo afirmação corrente, expressa em numerosa jurisprudência, uniforme e reiterada, a de que a fiscalização da constitucionalidade e da legalidade da competência do Tribunal Constitucional incide necessariamente sobre “normas”, não se configurando nunca o processo constitucional como um contencioso de “decisões”, seja qual for a sua natureza (política, administrativa ou judicial).
De todo o modo, como já se deixou expresso, não está agora em apreciação a decisão do tribunal a quo sobre o referido requerimento do Autor, mas a reapreciação da sentença recorrida, podendo, porém, dizer-se que não se vislumbra que, na apreciação que se fez das normas aplicáveis ao caso, para se concluir não estar em causa a nulidade da sentença, mas nulidade processual que poderia afetar a sentença, qualquer juízo que contrarie a CRP[13].
Note-se que se o Recorrente viu afetado direito de recorrer foi porque, segundo a decisão proferida, que não impugnou, apresentou fora de prazo o requerimento a arguir a falta/deficiência da gravação.
Concluímos, então, não se verificar a nulidade da sentença recorrida.
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Do erro no julgamento sobre matéria de facto:
Alega o Recorrente ter ocorrido erro no julgamento da matéria de facto, o que se impõe apreciar, não obstante ter improcedido a alegada falta/deficiência na gravação.
Para essa apreciação, importa ter desde logo presente em que termos tem lugar a impugnação da decisão sobre a matéria de facto, e sua apreciação pelo Tribunal da Relação, pelo que começamos por referir brevemente esses termos.
No caso de impugnação da decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento, é necessário que se indiquem elementos de prova que não tenham sido tomados em conta pelo tribunal a quo quando deveriam tê-lo sido; ou assinalar que não deveriam ter sido considerados certos meios de prova por haver alguma proibição a esse respeito; ou ainda que se ponha em causa a avaliação da prova feita pelo tribunal a quo, assinalando as deficiências de raciocínio que levaram a determinadas conclusões ou assinalando a insuficiência dos elementos considerados para as conclusões tiradas.
É que, a reapreciação pelo Tribunal da Relação da decisão da matéria de facto proferida em 1ª instância não corresponde a um segundo (novo) julgamento da matéria de facto, apenas reapreciando o Tribunal da Relação os pontos de facto enunciados pelo interessado (que circunscrevem o objeto do recurso).
No entanto, ainda que a modificação da decisão da matéria de facto se deva limitar aos pontos de facto especificamente indicados, cumprindo os requisitos estabelecidos pelo legislador, o Tribunal da Relação não está limitado à reapreciação dos meios de prova indicados por quem recorre, devendo atender a todos os que constem do processo[14].
É que, embora não se trate de um novo julgamento, tendo presente o disposto no art.º 662º do Código de Processo Civil, vem-se entendendo que o Tribunal da Relação na apreciação da impugnação da decisão sobre matéria de facto usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (art.º 607º, nº 5, do Código de Processo Civil), em ordem ao controlo efetivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efetiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto (porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece)[15].
Daí referir o nº 1 do art.º 662º do Código de Processo Civil que “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa” (sublinhou-se), ou seja, não basta que os meios de prova admitam, permitam ou consintam uma decisão diversa da recorrida.
Assim, a parte recorrente não pode simplesmente invocar um generalizado erro de julgamento tendente a uma reapreciação global dos meios de prova, não podendo a censura do recorrente quanto ao modo de formação da convicção do tribunal a quo assentar, de forma simplista, no ataque da fase final da formação de tal convicção, isto é, simplesmente em defender que a sua valoração da prova deve substituir a valoração feita pelo julgador; antes tal censura tem que assentar na violação de qualquer dos passos para a formação de tal convicção, designadamente por não existirem os dados objetivos que se apontam na motivação ou por se terem violado os princípios para a aquisição desses dados objetivos ou ainda por não ter existido liberdade de formação da convicção[16].
Em conformidade, o legislador impõe à parte recorrente, que pretenda impugnar a decisão de facto, um ónus de impugnação, devendo o recorrente expor os argumentos que, extraídos de uma apreciação crítica dos meios de prova, determinem, em seu entender, um resultado diverso do decidido pelo tribunal a quo.
Com efeito, o art.º 640º, nº 1 do Código de Processo Civil, impõe ao recorrente, na impugnação da matéria de facto, a obrigação de especificar, sob pena de rejeição, o seguinte:
a) os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados (tem que haver indicação clara dos segmentos da decisão que considera afetados por erro de julgamento);
b) os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida (tem que fundamentar as razões da sua discordância, concretizando e apreciando criticamente os meios de prova constantes dos autos ou da gravação que, no seu entender, implicam uma decisão diversa); e
c) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
Quanto ao ónus referido na alínea b), manda o legislador (nº 2 do art.º 640º do Código de Processo Civil) que se observe o seguinte:
a) quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
Feitas estas considerações, vejamos a impugnação apresentada pelo Recorrente, tendo presente que é pacífico que a apreciação a fazer é da questão posta, de saber se houve erro de julgamento sobre a matéria de facto, sem que haja o dever de responder, ponto por ponto, a cada argumento que seja apresentado pela parte recorrente[17].

Lendo o recurso apresentado, constatamos que quanto a concretos pontos de facto que o Recorrente considera incorretamente julgados, relativamente aos quais indica a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre eles, temos os pontos 29), 36) e 46) dos factos provados (que diz o Recorrente deverem ser considerados não provados), e os pontos i), iv), v), vi) e vii) dos factos não provados (que diz o Recorrente deverem ser considerados provados), pelo que é em relação a esses pontos que temos que centrar a apreciação.

● dos pontos 29., 36. e 46. dos factos provados:
Comecemos por recordar a redação destes pontos [acima transcritos], que é a seguinte [recordando-se, também, a redação do ponto 30., ainda que não impugnado, por estar encadeado]:
29. O Autor sofreu uma doença natural.
30. O Autor sofreu um episódio (de) hemorragia intracerebral espontânea, AVC.
36. O Autor sofreu esta alteração do seu estado de saúde por causas naturais, determinada pela sua condição física.
46. As doenças do Autor – fibrilação auricular paroxística e HTA –, a medicação que tomava por causa das mesmas e o seu estado de hipocoagulado, são fatores de risco para uma hemorragia intracerebral espontânea ou AVCH, a qual, em tais circunstâncias, pode surgir a qualquer momento, sem necessidade de qualquer fator externo – físico ou psicológico – que a desencadeie.
Como concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa, indica o Recorrente excertos do depoimento da testemunha BB, médico neurologista que atendeu o Autor em consulta médica, que transcreve, e o Relatório Médico do Prof. CC junto com a petição inicial.
A propósito destes pontos, o tribunal a quo escreveu na motivação da decisão sobre matéria de facto o seguinte:
No que respeita à dinâmica do infeliz evento que vitimou o Autor – factos provados 15) a 25) e não provados i) e ii) – e ao facto de o Autor padecer de doença e suas consequências – pontos 28) a 47), teve-se em conta os elementos clínicos do Autor juntos aos autos – em especial os documentos recebidos do Hospital ... – fls. 242 e ss do Apenso A –, aí constando relatório do socorro prestado ao Autor – traduzido a fls 457 e ss –, do qual se alcança que o mesmo foi encontrado sentado nas escadas do prédio, em estado agitado e angustiado, sem movimentos corporais do lado direito, falando, com diagnóstico efetuado no local de doença – quadricula assinalada, não tendo sido assinalada a quadricula “acidente” nem “outra”, ataque cardíaco - fls. 458, pelas 11.51 h e com indicação do evento ter ocorrido cerca de 30 m antes disso – e a fls. 457 vs, pelas 13.05 h já com o diagnóstico de hemorragia intracraniana maciça do lado esquerdo. Também dos relatórios e registos clínicos do Autor feitos pelas entidades hospitalares suíças consta que o Autor sofreu “hemorragia intracerebral abundante da região dos gânglios da base esquerdos, na sequência de uma malformação arteriovenosa” – fls. 444 e ss. Sendo assim evidente que o Autor não tinha, à data, qualquer sinal de contusão.
Ora, como concluíram os Exmos Senhores Peritos na Junta Médica dos autos, por maioria da Exm.ª Sr.ª Perita Médica do Tribunal e da Seguradora, e também nos esclarecimentos por estes senhores peritos médicos em audiência, que o Autor sofreu uma hemorragia intracerebral espontânea, não sendo possível cientificamente que o Autor tivesse tido uma queda que lesionasse o cérebro e despoletasse o AVC de que o Autor foi vítima.
Neste mesmo sentido se pronunciou a testemunha Dr. DD, médico neurocirurgião, que explicou que a rutura das veias sofrida pelo Autor se deveu sem margem para dúvida espontaneamente: há malformação das artérias que se ramificam em capilares e depois dão origem a veias, estas vão-se dilatando e rompem pela mera pressão sanguínea, pois que as artérias normalmente resistem a uma pressão cerca de 20 vezes superior à das veias. Mais explicou que a rutura artério venosa que o Autor sofreu ocorreu numa zona profunda do cérebro que não se situa próxima da calote craniana. Um trauma para despoletar esta rutura teria que ser violentíssimo, danificando o crânio, “dura mater”, couro cabeludo e encéfalo, originando morte imediata, nem se chegando a dar a rutura artério venosa. Tudo isto era possível concluir sem consultar clinicamente o A, pois que é inferível dos seus registos clínicos juntos aos autos.
O Sr. Perito Médico EE, que subscreveu o relatório singular dos autos e prestou igualmente esclarecimentos a fls. 196 e em audiência, também conclui que o Autor sofreu uma alteração de estado de saúde, inexistindo elementos clínicos que permitam sustentar a ocorrência de um evento traumático que pudesse despoletar essa alteração de estado de saúde – cfr. fls. 44 e ss.
Por outro lado, também o Sr. Professor Doutor FF no parecer que proferiu nestes autos – fls. 129 e ss – concluiu da mesma forma.
Já a testemunha BB, neurologista que o Autor consultou nos anos de 2016 (em abril e junho) e 2020, esclareceu que o Autor tinha dificuldade em falar, mas que se percebia o que ele pretendia dizer, referindo a testemunha que analisou os documentos clínicos de que o Autor dispunha e que trouxe da Suíça, sendo, nas palavras da testemunha, difícil saber se o Autor sofreu primeiro a queda ou o AVC. Referiu ainda que de 2016 a 2020 a situação do Autor quanto à afasia foi estável. Referiu ainda e espontaneamente não se recordar se foi o Autor ou a esposa deste – a testemunha GG – que o acompanhava que lhe descreveram o evento.
O perito médico indicado pelo Autor que também prestou esclarecimentos em audiência, concluiu que o Autor terá caído primeiramente e isso terá despoletado o AVC, por essa versão do acidente lhe ter sido relatada pelo Autor e sua esposa, afirmando que na sua opinião é cientificamente possível este AVC ter sido despoletado por uma queda, o que fez constar do parecer que emitiu nos autos a fls. 71 vs e ss.
Teve-se ainda em conta as declarações da testemunha HH que viu o sinistrado ainda caído na sala de reuniões próxima do balneário, como atrás já se expos, explicando que o viu em tronco nu, com calças de ganga vestidas, aparentando ter feito a barba, afirmando ter-lhe tirado as chaves do camião do bolso das calças, para ir buscar os documentos do Autor ao camião, que entregou aos socorristas, e como foi também buscar os pertences do Autor ao balneário – estojo da barba e a camisa pendurada – concluindo a testemunha ter-lhe parecido que ele tinha feito a barba e preparava-se para tomar banho quando se sentiu mal e procurou ajuda. Esta testemunha foi perentória ao afirmar que o Autor não tinha qualquer sinal de traumatismo na cabeça, nem sangue, nem nódoas negras, nem hematoma. Sendo que as informações que recolheu no hospital na Suíça também foram que o Autor sofreu um AVC fulminante, o que transmitiu à Ré Patronal e à esposa do Autor, sendo que esta testemunha permaneceu na Suíça à espera que a esposa do Autor ali chegasse para passar a acompanhar o Autor e até lhe entregou os pertences do marido.
Por seu turno, a testemunha II afirmou que conversou com os motoristas da Ré e também com a testemunha HH e todos sempre disseram que o Autor tinha sofrido um AVC.
JJ, motorista também ao serviço da Ré à data dos factos, nada presenciou pois não estava na Suíça, apenas relatando que outros colegas lhe disseram que o Autor caiu no duche quando estava a tomar banho, tendo sido encontrado por um espanhol nas escadas a pedir ajuda, embora não soubesse dizer se o Autor teve ou não um AVC.
A testemunha KK, que também foi motorista da Ré e é amiga do Autor, também não tinha nenhum conhecimento direto do acidente, esclarecendo apenas que o Autor lhe tinha dito estar descontente com a política salarial da empresa, por ter havido um corte no rendimento do Autor, na medida em que a Ré lhe dava rotas até à Suíça e daí para Espanha, voltando de Espanha para a Suíça, sem passar por Portugal, o que lhe causava stress. Mais referiu que a testemunha falou também por causa disso com o chefe de tráfego, Sr. LL, que já faleceu, e que o Autor lhe disse ter feito o mesmo, mas que o Sr. LL não maltratou a testemunha nem o Autor lhe referiu tal ter sucedido consigo. Esta testemunha estava convencida que a Ré Patronal tinha conhecimento da condição clínica do Autor por a Ré ter contratado serviços de medicina no Trabalho.
A testemunha MM, terapeuta da fala do Autor, desde 2017 a 2019, afirmou que o Autor nunca lhe contou o que sucedeu e descreveu os progressos que este fez ao nível da fala, melhorando da situação de afasia, embora perceba tudo quanto lhe é explicado.
Nas declarações que prestou ao Tribunal e também nas declarações em sede de junta médica – declarações que prestou em ambas as situações sozinho e sem intervenção da esposa, sendo que esta não presenciou o sinistro e prestou declarações no sentido do marido lhe ter dito que primeiro caiu e só depois teve o AVC – foi possível perceber que o Autor entende tudo quanto se lhe diz, mas tem notórias dificuldades de expressão, o que prejudicou a espontaneidade das suas declarações e até o entendimento do seu cabal alcance.
Conjugando todos estes elementos e tendo presente que foi esclarecido pelos Exmos Senhores Peritos Médicos do Tribunal e da Seguradora e também pelo Dr. DD que, dando-se uma AVC da natureza daquele que afetou o Autor, ocorre perda da consciência gradual e de faculdades motoras e com o decurso do tempo, factos que são do conhecimento comum, igualmente, pelo que não é possível afirmar que o Autor sofreu uma queda e só depois disso sofreu um AVC. Aliás, sempre se dirá que o Autor e a sua esposa – que o afirmam – não têm conhecimentos científicos que lhe permitam sustentar tais afirmações, pelo que o Tribunal não pode ter como provada tal versão dos infelizes eventos. Pelo exposto, não sendo possível concluir que o Autor sofreu um acidente, não se pode concluir que padeça de IPP por força de acidente.
O Recorrente defende que sofreu uma queda e por esse motivo sofreu AVC, e não o contrário, isto é, que sofreu AVC e por isso caiu.
Antes de entrar na apreciação do dito pelo Recorrente, ressalta que o ponto 29. dos factos provados não pode permanecer como tal pois trata-se de matéria conclusiva, ou até com cariz jurídico.
É que, estando em causa neste processo saber se o Autor sofreu “acidente de trabalho”, ou dito de outra forma, se o acontecido se enquadra no conceito legal de “acidente de trabalho”, de modo a ter lugar a reparação nos termos da legislação específica que a prevê (a LAT), consignar que “o Autor sofreu uma doença natural” traduz-se em consignar um conceito (conclusivo) que traduz o contrário de ter sofrido “acidente de trabalho”.
Ou seja, assim como não se decide a questão subjacente ao processo na factualidade, consignando, por exemplo, “o Autor sofreu acidente de trabalho”[18], também não se pode consignar que o “o Autor sofreu doença natural”, pois equivale a dizer “o Autor não sofreu acidente de trabalho” [e o Autor pode ter sofrido acidente, mas não a qualificar como de trabalho].
É que, ao falar-se em natural (doença natural), está-se a excluir a doença de que o art.º 8º da LAT fala, e a afirmar que aquilo que o Autor apresenta não tem qualquer ligação com a atividade por si exercida,
No fundo, como resulta do DL nº 28/2004, de 04 de fevereiro (estabelece o novo regime jurídico de proteção social na eventualidade de doença, no âmbito do subsistema previdencial de segurança social), a doença natural contrapõe-se à doença profissional (cfr. art.º 2º).
Ora, como se escreveu no acórdão desta Secção Social do TRP de 09/03/2020[19], “as afirmações de natureza conclusiva devem ser excluídas do elenco factual a considerar, se integrarem o thema decidendum, entendendo-se como tal o conjunto de questões de natureza jurídica que integram o objeto do processo a decidir, no fundo, a componente jurídica que suporta a decisão”.
Ou seja, os factos concretos/objetivos (sem coloração jurídica) não podem ser substituídos por conceitos de direito e/ou factos vagos/genéricos e/ou conclusivos[20].
Sendo assim, sendo o thema decidendum deste processo saber se o Ator sofreu acidente que seja de integrar no conceito de “acidente de trabalho” não pode constar dos factos provados o que consta do ponto 29. dos factos provados.
E o acabado de expor vale também para o ponto 36. dos factos provados, na parte em que no mesmo está atribuída a alteração do estado de saúde a “causas naturais” (ou seja, está decidido que se atribui a “causas naturais”), pelo que se impõe a alteração da sua redação de modo a deixar de referir as “causas naturais”, permanecendo segmento final, ou seja que sofreu a alteração do seu estado de saúde por causas determinadas pela sua condição física.
Assim, decide-se eliminar o ponto 29. dos factos provados, bem como alterar a redação do ponto 36. dos factos provados, de modo que este passa a ter a seguinte redação:
36. O Autor sofreu esta alteração do seu estado de saúde por causas determinadas pela sua condição física.

Resta-nos, então, neste momento apreciar o ponto 46. dos factos provados.
Como é sabido, e acima já se fez referência, a generalidade das provas produzidas em audiência de julgamento estão sujeitas à livre apreciação do tribunal, dispondo o nº 5 do art.º 607º do Código de Processo Civil que o juiz aprecia livremente as provas segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, ou seja, a apreciação da prova pelo juiz é pautada por regras da ciência e do raciocínio e em máximas de experiência, sendo a estas conforme [o que não se confunde com uma apreciação arbitrária – consiste numa conscienciosa ponderação dos elementos probatórios e circunstâncias que os envolvem][21].
Nessa apreciação, o julgador conjugará todos os elementos de prova produzidos sobre a matéria a provar, sendo o que refere o acórdão desta Secção Social do TRP de 04/05/2022[22]: a prova dum facto há de resultar da conjugação de todos os meios de prova produzidos sobre um mesmo facto, ponderando-se a coerência que exista num determinado sentido e aferindo-se esse resultado convergente em termos de razoabilidade e lógica.
Ora, como se vê do excerto acima transcrito foi o que o tribunal a quo fez, uma apreciação conjugada dos elementos de prova.
O Recorrente, começa por manifestar discordância da apreciação que a julgadora a quo fez da prova [conclusões XXXIII a LXVI], para depois referir os excertos do depoimento de testemunha e Relatório Médico que sustentam, na sua opinião, a não prova do facto [conclusões LXIX a LXXVIII].
Todavia, os excertos do depoimento da testemunha não impõem a não prova deste facto, pois referem-se àquilo que o Autor disse à testemunha (médico), mais propriamente que estava no chuveiro e caiu, não sendo a testemunha a afirmá-lo, ao que acresce que a testemunha, com base nesse pressuposto (mesmo que se aceitasse), o que diz é que aparentemente a hemorragia foi despoletada pela queda.
E também o excerto do Relatório Médico que o Recorrente transcreve, parte do pressuposto que o Autor “se encontrava a tomar duche, escorregou, perdeu o equilíbrio e sofreu embate com o crânio”, mas esse pressuposto não está provado, e nem se alcança que esteja evidenciado.
Ou seja, os meios de prova que o Recorrente cita dependem da referida conjugação com outros meios de prova, não impondo, por si, de todo a alteração do decidido quanto ao ponto 46. dos factos provados, não nos levando a formar convicção diferente da formada em 1ª instância.
De resto, é de realçar que a maioria dos peritos médicos que tiveram intervenção no exame por junta médica, analisando os elementos clínicos que constam dos autos, referem não haver evento traumático descrito que justificasse a ocorrência do AVC sofrido (ocorrendo a queda pela hipotonia subsequente à hemorragia cerebral – cfr Autos de 19/09/2019 e 25/06/2020, no apenso com a letra A), o outro perito médico para discordar suporta-se no facto de o sinistrado referir queda no banho (cfr. Auto de 19/09/2019, no apenso com a letra A), ou seja, este último parte dum pressuposto que não está demonstrado.
Acresce que os elementos remetidos pelo Hospital ... (Suíça) – cuja tradução foi junta em 26/02/2020 no apenso com a letra A –, como refere a maioria dos peritos, não falam em qualquer sinal de traumatismo passível de desencadear a hemorragia cerebral sofrida.
Queremos com isto dizer que o tribunal a quo fundamentou a decisão sobre a matéria de facto, e como se vêm, a mesma tem suporte na prova.
Sendo assim, sem necessidade de considerações mais desenvolvidas, concluímos que o ponto 46. dos factos provados se mantém.

● dos pontos i., iv., v., vi. e vii. dos factos não provados:
A redação destes pontos [acima transcritos], recordemos, é a seguinte:
i. Aquando do referido em 14) dos factos provados, quando o Autor se encontrava no duche, caiu e bateu com a cabeça.
iv. Nos dias anteriores ao sinistro acima descrito, o Autor andava muito nervoso e especialmente tenso, uma vez que sentia que o tratamento que recebia por parte da sua Empregadora era diferente.
v. No dia em que lhe foi transmitido o transporte que iria efetuar, o Autor esteve 2 horas sentado numa sala sozinho, à espera, até lhe ser dito que deveria realizar o próximo transporte para a Suíça.
vi. Ocorreu discussão entre o Autor e o representante da sua empregadora, fazendo o Autor sentir-se especialmente tenso e nervoso.
vii. Tais fatores, aliados à patologia pré-existente do Autor, fizeram o Autor sentir-se ansioso, nervoso, instável, desencadeando o sinistro, nomeadamente a queda e o consequente AVC.
Quanto a estes pontos, o Recorrente não indica concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão diversa, justificando essa omissão com a “falta deficiência de gravação”.
Já acima se viu que tal questão foi suscitada pelo Recorrente junto do tribunal a quo, como se impunha, o qual indeferiu a arguição de nulidade, não tendo havido recurso desse despacho.
Ora, sem serem indicados concretos meios probatórios que impusessem decisão diversa da tomada pela julgadora a quo, fica este tribunal ad quem impedido de apreciar a pretensão do Recorrente de alterar a decisão sobre matéria de facto, impondo-se a sua rejeição por não terem sido observados os ónus impostos pelo legislador (que acima se referiram).
Pelo exposto, rejeita-se o recurso de impugnação da decisão sobre matéria de facto quantos aos pontos i., iv., v., vi. e vii. dos factos não provados.

Em suma, a factualidade a considerar na apreciação do recurso é a fixada em 1ª instância, com exclusão dos pontos 29. e 36. dos factos assentes, que se decidiu excluir.
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Da ocorrência de acidente caracterizável como de trabalho:
O tribunal a quo considerou que o Autor não demonstrou factos que levem a concluir ter sofrido acidente de trabalho (reparável nos termos da legislação específica, a LAT), discordando o Recorrente, defendendo que ocorreu acidente de trabalho.
As Recorridas pronunciaram-se no sentido de não estar demonstrada a ocorrência de acidente de trabalho.
Ora, a argumentação do Recorrente suporta-se em que o acidente consistiu em queda, por si sofrida, que originou AVC [conclusões CI e CII, mas realce-se que o Recorrente refere “terá originado AVC”, ou seja, utiliza o futuro no modo indicativo, o que denota incerteza].
Mais propriamente pretendia o Recorrente que ficasse provado que sofreu queda por sentir-se ansioso, nervoso, instável (ponto vii. dos factos não provados), o que sucedeu por ter havido discussão entre o Autor e o representante da sua empregadora (ponto vi. dos factos não provados), e como consequência da queda sofreu AVC.
Ou seja, a argumentação do Recorrente pressupunha a alteração da matéria de facto que pretendia [em especial passar o ponto i. dos factos não provados a provado, de modo a ficar a constar que a hemorragia intracerebral decorreu de traumatismo], mas, como se viu, improcedeu/foi rejeitada.
Ainda assim, vejamos se os factos provados nos levam a dizer que estamos perante acidente de trabalho, como defende o Recorrente, em contrário do que considerou o tribunal a quo.
O art.º 8º, nº 1 da LAT contém a definição genérica de acidente de trabalho, dizendo ser acidente de trabalho aquele que se verifique no local e tempo de trabalho e produza direta ou indiretamente lesão corporal, perturbação funcional ou doença de que resulte redução na capacidade de trabalho ou de ganho ou a morte.
Deste modo, pode definir-se (de modo sucinto, simples e genérico) o acidente de trabalho como o evento súbito e exterior, ocorrido no local e tempo de trabalho (ou em situação equiparável por lei) que cause direta ou indiretamente uma lesão, perturbação ou doença que conduzam adequadamente à diminuição da capacidade de trabalho ou de ganho ou à morte.
São, pois, elementos do acidente de trabalho: existência de relação jurídico-laboral entre o trabalhador e o dador de trabalho; ocorrência de um evento em sentido naturalístico; lesão, perturbação funcional ou doença; morte ou redução da capacidade de ganho ou de trabalho; nexo de causalidade entre o evento e as lesões; nexo de causalidade entre as lesões e a morte ou a incapacidade.
No caso sub judice, não se questionando o “tempo e lugar de trabalho” [está em causa motorista de serviço internacional, que como tal, se pode dizer que apenas tem um local onde iniciar e terminar funções[23]], tudo está antes, em saber se está demonstrado um evento súbito e exterior, sofrido por trabalhador.
Sucede que nos factos provados temos que o Autor se sentiu mal, foi conduzido ao hospital e foi-lhe diagnosticado AVC [pontos 15. a 18. dos factos provados], tendo sofrido um episódio de hemorragia intracerebral espontânea (logo, não hemorragia traumática) [pontos 30. e 36. dos factos provados], o que manifestamente é escasso para se dizer ter sido demonstrada a ocorrência de acidente de trabalho.
É que o sofrer hemorragia intracerebral espontânea (AVC), sem nada mais, não nos leva a dizer configurar-se um esse evento súbito e exterior, sendo claro que não será qualquer ato que acontece no local de trabalho que vem a determinar se considere existir acidente de trabalho, exigindo-se nexo de causalidade com a relação laboral, excluindo-se o que por mera coincidência ocorre no local de trabalho[24]
Importa também deixar expresso, em face do referido pelo Recorrente na conclusão CXI, que se impunha ter sido feita prova do evento causador das lesões/sequelas [v.g. uma queda (mas queda como evento causador delas não queda subsequente a AVC)], decorrendo do art.º 10º, nº 1 da LAT apenas a presunção do nexo entre o evento e as lesões, ou seja, sem a prova da ocorrência daquele evento não há que fazer apelo a esta norma legal.
É o entendimento que esta Secção Social do TRP vem seguindo, e não se vê motivo para o alterar, citando-se a título de exemplo o acórdão de 17/01/2022[25], cujo sumário é (no que agora importa), dispensando-nos de mais considerações:
I) Por se tratar de factos constitutivos do direito invocado (art.º 342º, nº 1 do Código Civil), os requisitos ou pressupostos de um acidente de trabalho deverão ser alegados e provados por quem reclama a respetiva reparação (sendo esta a regra), sem prejuízo de a lei facilitar essa tarefa, criando presunções a seu favor.
II) Não se encontra estabelecida no artigo 10º, nº 1, da Lei nº 98/2009, de 04 de setembro, qualquer presunção da existência do acidente, mas antes uma presunção de que existe nexo causal entre o acidente e a lesão ocorrida, sendo que, sabendo-se que a reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho exige a demonstração de um duplo nexo causal, entre o acidente e o dano físico ou psíquico (a lesão, a perturbação funcional, a doença ou a morte) e entre este e o dano laboral (a redução ou a exclusão da capacidade de trabalho ou de ganho do trabalhador), a mesma presunção também não abrange esta segunda relação de causalidade, incumbindo ao sinistrado ou seus beneficiários a sua demonstração[26].
Ou seja, o Autor não estava dispensado, no caso em apreço, de demonstrar a existência de próprio evento causador das lesões/sequelas, como por exemplo a ocorrência de queda enquanto toma duche.
Por outro lado, de referir que só depois de demonstrado esse evento causador das lesões/sequelas se poderia apelar, eventualmente, ao disposto no art.º 11º da LAT, ou seja, discutir, eventualmente, a não exclusão do direito à reparação do acidente por existir “predisposição patológica” para AVC, o mesmo é dizer se esse evento foi ou não apenas o fator motriz desencadeador de uma situação que não ocorreria se não existisse tal predisposição[27], pelo que não relevam as considerações do Recorrente de que cabia às Rés demonstrar que o AVC não resultou da queda [queda que, relembra-se, não está demonstrado ter ocorrido, como evento causador de lesões/sequelas] [28].
Em suma, em face dos factos provados, uma vez que apenas temos como certo que o Autor sofreu um episódio hemorragia intracerebral espontânea (AVC) – ponto 30. dos factos provados –, não tendo sido provada a existência de evento causador desse episódio [no fundo que esse episódio, em vez de espontâneo, resultasse de traumatismo/queda; independentemente das dificuldades da sua prova, certo é que não foram vencidas], é cristalino que não se pode afirmar que estejamos perante a ocorrência de acidente de trabalho, reparável nos termos da LAT, improcedendo todos os argumentos do Recorrente.
Improcede, então, o recurso.
*
Quanto a custas, havendo improcedência do recurso [apesar da alteração da decisão sobre matéria de facto, a improcedência da ação mantém-se], as custas do mesmo ficam a cargo do Recorrente (art.º 527º do Código de Processo Civil).
***
DECISÃO
Pelo exposto, acordam os juízes desembargadores da Secção Social do Tribunal da Relação do Porto em decidir o seguinte:
A) Eliminar o ponto 29. dos factos provados, e alterar a redação do ponto 36. dos factos provados, de modo que este passa a ter a seguinte redação:
36. O Autor sofreu esta alteração do seu estado de saúde por causas determinadas pela sua condição física.
B) Confirmar, no mais, o decidido na sentença recorrida.
Custas pelo Recorrente, com taxa de justiça conforme tabela I-B anexa ao RCP (cfr. art.º 7º, nº 2 do RCP).
Valor do recurso: o da ação (art.º 12º, nº 2 do RCP).
Notifique e registe.
(texto processado e revisto pelo relator, assinado eletronicamente)

Porto, 05 de junho de 2023
António Luís Carvalhão
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
_______________
[1] Considerando a sentença inserida no Citius em 2º lugar (versão com correção de lapso).
[2] As transcrições efetuadas respeitam o respetivo original, salvo correção de gralhas evidentes e realces/sublinhados que no geral não se mantêm (porque interessa o texto em si), consignando-se que quanto à ortografia utilizada se adota o Novo Acordo Ortográfico.
[3] Tendo o relator proferido despacho (art.º 652º, nº 1 do Código de Processo Civil), no qual considerou que a situação em que as “conclusões” reproduzem, seja ipsis verbis seja com algumas ligeiras diferenças, não equivale à não apresentação de conclusões, e como tal não conduz à rejeição do recurso, havendo lugar a despacho a reparar o vício, mas que no caso em apreço, não obstante o Recorrente naquilo que apelidou de “conclusões”, reproduzir a quase totalidade dos pontos da alegação/motivação, não se justificar formular convite, porquanto se conseguem retirar as questões suscitadas com relativa facilidade.
[4] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 156 e págs. 545/546 (estas no apêndice I: “recursos no processo do trabalho”).
[5] Seguindo a ordem da precedência lógica, sendo que a solução de alguma pode prejudicar o conhecimento de outra(s) – artos 608º e 663º, nº 2 do Código de Processo Civil (cfr. art.º 87º, nº 1 do Código de Processo do Trabalho).
[6] Lei dos Acidentes de Trabalho, o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais aprovado pela Lei nº 98/2009, de 04 de setembro.
[7] Este parágrafo não foi numerado em 1ª instância, estando antes do ponto 1.; a fim de não alterar a numeração atribuída em 1ª instância, para não gerar confusão na referência aos pontos de facto provados, atribui-se-lhe a numeração 0.
[8] António Santos Abrantes Geraldes – in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 25/26 – sublinha a importância da destrinça entre nulidades de procedimento e nulidades de julgamento: estas devem ser invocadas em sede de recurso; aquelas devem ser arguidas nos termos previstos nos artigos 195º, 196º e 199º do Código de Processo Civil.
[9] Como refere António Santos Abrantes Geraldes – in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 178 –, tratando-se de nulidade processual, terá de ser arguida autonomamente, sendo submetida a posterior decisão do juiz a quo, não sendo admitida a sua inserção imediata nas alegações de recurso.
[10] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, in “Código de Processo Civil Anotado – vol. I, Parte Geral e Processo de Declaração”, 3ª edição - 2022, Almedina, pág. 807 (anotação 2 ao art.º 627º).
[11] Vd. Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. II, Almedina, 4ª edição, pág. 753
[12] In “Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional”, Almedina, 2010, pág. 26 (em anotação ao art.º 70º da Lei nº 28/82).
[13] Em processo penal, o acórdão do STJ nº 13/2014 de 03 de julho de 2014 [publicado no DR, I série, nº 183, de 23 de setembro de 2014] fixou jurisprudência da seguinte forma: a nulidade prevista no art.º 363.º do Código de Processo Penal deve ser arguida perante o tribunal da 1.ª instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias (art.º 105º, nº 1 do Código de Processo Penal), a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, acrescido do período de tempo que mediar entre o requerimento da cópia da gravação, acompanhado do necessário suporte técnico, e a efetiva satisfação desse pedido pelo funcionário, nos termos do n.º 3 do artigo 101.º do mesmo diploma, sob pena de dever considerar-se sanada.
O Tribunal Constitucional, no Acórdão nº 118/2017, de 17 de março de 2017 [consultável em www.tribunalconstitucional.pt, processo nº 636/2016], decidiu não julgar inconstitucional a norma resultante da conjugação dos artigos 363.º, 364.º, n.º 1, e 105.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual a nulidade prevista no artigo 363.º do Código de Processo Penal deve ser arguida perante o tribunal de 1.ª instância, em requerimento autónomo, no prazo geral de 10 dias a contar da data da sessão da audiência em que tiver ocorrido a omissão da documentação ou a deficiente documentação das declarações orais, sob pena de dever considerar-se sanada; considerando que a norma assim interpretada não é arbitrária, servindo interesses de economia processual, eficiência e, em geral, de racionalidade na utilização dos recursos dos tribunais.
[14] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, págs. 292/293.
[15] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 286.
[16] É que, de outra forma, ocorreria uma inversão da posição dos intervenientes no processo, mediante a substituição da convicção de quem tem de julgar pela convicção de quem espera a decisão.
[17] Vd. António Santos Abrantes Geraldes, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 5ª edição, pág. 116.
[18] Exceto se for pacífica a ocorrência de “acidente de trabalho”, só estando em aberto outras questões, mas que não é o caso dos autos.
[19] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 3789/15.9T8VFR.P1.
Vd. também o acórdão desta Secção Social do TRP de 19/04/2021, consultável igualmente em www.dgsi.pt, processo nº 2907/16.4T8AGD-A.P1.
[20] Ainda que possa haver alguma flexibilidade no caso de serem eles uma consequência lógica de factos objetivos, simples e apreensíveis, também constantes dos assentes ou estar devidamente justificado na motivação.
[21] Vd. Miguel Teixeira de Sousa, “Estudos Sobre o Novo Processo Civil”, Lex, 2ª edição (Lisboa, 1997), pág. 347, e o acórdão desta Secção Social do TRP de 27/04/2020, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1740/18.3T8VNG.P1.
[22] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1166/20.9T8MTS.P1.
[23] Vd. a propósito, José Andrade Mesquita, “Direito do Trabalho”, AAFDL, 2ª edição, 2004, pág. 574.
[24] Vd. a propósito Carlos Alegre, “Acidentes de Trabalho e Doenças Profissionais, Regime Jurídico Anotado” – 2ª ed., Almedina, págs. 45 ss.
[25] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 2157/17.2T8MTS.P1.
[26] Vd. também os acórdãos desta Secção Social do TRP de 18/02/2019 e de 08/05/2023, consultáveis em www.dgsi.pt, processo nº 6875/16.4T8VNG.P1 e nº 1162/18.6T8PNF.P1, respetivamente.
[27] Vd. a propósito Vítor Melo, “Algumas Breves Considerações sobre a Avaliação da Incapacidade face ao disposto no art.º 9º da LAT, in “Prontuário de Direito do Trabalho”, CEJ-Coimbra Editora, nº 72, págs. 161 ss (sendo o art.º 9º da LAT aprovada pela Lei nº 100/97, de 13 de setembro, o equivalente ao art.º 11º da atual LAT que se mencionou).
[28] Tem pertinência transcrever parte do sumário do recente acórdão desta Secção Social do TRP de 08/05/2023 [acima referido, consultável em www.dgsi.pt, processo nº 1162/18.6T8PNF.P1, subscrito pelo agora relator como 1º adjunto], que espelha o entendimento que agora seguimos:
II- Não se encontra estabelecida no artigo 10.º, n.º 1, da Lei n.º 98/2009, de 04 de setembro, qualquer presunção da existência do acidente, mas antes uma presunção de que existe nexo causal entre o acidente e a lesão ocorrida, sendo que, sabendo-se que a reparação dos danos emergentes dos acidentes de trabalho exige a demonstração de um duplo nexo causal, entre o acidente e o dano físico ou psíquico (a lesão, a perturbação funcional, a doença ou a morte) e entre este e o dano laboral (a redução ou a exclusão da capacidade de trabalho ou de ganho do trabalhador), a mesma presunção também não abrange esta segunda relação de causalidade, incumbindo ao sinistrado ou seus beneficiários a sua demonstração.
III- Por se tratar de factos constitutivos do direito invocado (art.º 342.º, n.º 1 do Código Civil), os requisitos ou pressupostos de um acidente de trabalho deverão ser alegados e provados por quem reclama a respetiva reparação (sendo esta a regra), sem prejuízo de a lei facilitar essa tarefa, criando presunções a seu favor.
IV- Em face do conceito de acidente de trabalho, é de concluir que esse não se provou num caso em que se provou que o sinistrado caiu, batendo com a cabeça e corpo no chão, do que resultou traumatismo crânio-encefálico e hemorragia subdural, se tal queda tiver tido na sua génese um desmaio que decorreu de doença natural de que aquele padece, pois que esse desmaio, tendo a queda na sua génese o que antes se mencionou, não se traduz em causa exterior, estranha à constituição orgânica da vítima, e súbita, não bastando para se poder concluir em sentido diverso a circunstância de a queda ter ocorrido no local de no tempo de trabalho, quando se encontrava ao serviço da entidade patronal em viagem para o local de trabalho.
V- A predisposição patológica a que se alude no n.º 1 do art.º 11º da LAT não é, em si, uma doença ou patogenia, sendo antes uma causa patente ou oculta que prepara o organismo para, em prazo mais ou menos longo e segundo graus de várias intensidades, poder vir a sofrer determinadas doenças, funcionando nestes casos o acidente de trabalho como agente ou causa próxima desencadeadora da doença ou lesão.