Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1556/14.6T8LOU-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CORREIA PINTO
Descritores: OPOSIÇÃO À EXECUÇÃO
EXECUÇÃO PARA ENTREGA DE COISA CERTA
DIREITO A BENFEITORIAS
NULIDADES DE SENTENÇA
Nº do Documento: RP201605021556/14.6T8LOU-A.P1
Data do Acordão: 05/02/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º624, FLS.227-237)
Área Temática: .
Sumário: I - A nulidade da sentença decorrente dos fundamentos estarem em oposição com a decisão verifica-se quando a fundamentação aponta num certo sentido que é contraditório com o que vem a decidir-se e, enquanto vício de natureza processual, não se confunde com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide mal – ou porque decide contrariamente aos factos apurados ou contra lei que lhe impõe uma solução jurídica diferente.
II - Em execução de sentença condenatória para entrega de coisa certa e perante o disposto no artigo 929.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, na redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho (artigo 860.º, n.º 3, na redação atual), não são admissíveis os embargos baseados na invocação do direito a benfeitorias quando o executado não haja, no processo declarativo, feito valer o seu direito a elas, o que se verifica, nomeadamente, quando aí foi julgado improcedente pedido reconvencional.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 1556/14.6T8LOU-A.P1
5.ª Secção (3.ª Cível) do Tribunal da Relação do Porto

Sumário (artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):
I - A nulidade da sentença decorrente dos fundamentos estarem em oposição com a decisão verifica-se quando a fundamentação aponta num certo sentido que é contraditório com o que vem a decidir-se e, enquanto vício de natureza processual, não se confunde com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide mal – ou porque decide contrariamente aos factos apurados ou contra lei que lhe impõe uma solução jurídica diferente.
II - Em execução de sentença condenatória para entrega de coisa certa e perante o disposto no artigo 929.º, n.º 3, do Código de Processo Civil, na redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho (artigo 860.º, n.º 3, na redação atual), não são admissíveis os embargos baseados na invocação do direito a benfeitorias quando o executado não haja, no processo declarativo, feito valer o seu direito a elas, o que se verifica, nomeadamente, quando aí foi julgado improcedente pedido reconvencional.
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
1) Relatório
B…, por apenso à ação executiva para entrega de coisa certa que lhe foi instaurada pela exequente, C…, S.A., ambas melhor identificadas nos presentes autos, veio através destes deduzir oposição à execução.
1.1 A execução tem como título executivo sentença judicial, proferida em ação declarativa que a C…, S.A., instaurou contra B….
Nesse processo – que correu termos sob o n.º 1081/06.9TBMCN – a autora formulou os seguintes pedidos:
A condenação da ré a restituir-lhe, imediatamente, as habitações e garagem que identifica, livres de pessoas e bens, em virtude do contrato validamente celebrado entre autora e ré ter sido já, válida e tempestivamente, denunciado pela autora, encontrando-se a ré em manifesto incumprimento contratual; a indemnizar a autora em quantia que vier a ser apurada em execução de sentença pelos prejuízos que com tal ocupação ilegítima, ilegal e insubsistente lhe vem causando; a pagar sanção pecuniária compulsória de 50,00 euros por cada dia de atraso que tiver em proceder à entrega/desocupação das já aludidas habitações 4 e 5 do bloco de habitações denominada BE 2.13 e garagem n.º 4 livre de pessoas e bens.
A ré contestou, impugnando parte da matéria de facto alegada pela autora e arguindo várias exceções, concluindo pela improcedência da ação.
Em reconvenção e para o caso de assim não ser entendido, pediu a condenação da autora/reconvinda a pagar-lhe a quantia de 40.000,00 euros relativa a trabalhos de reparação, conservação e beneficiação desenvolvidos no prédio urbano e a declaração do seu direito de propriedade sobre o imóvel. Alegou para o efeito ter procedido a obras de construção civil de reparação, conservação e beneficiação dos imóveis, desde meados de 1966 procedeu à pintura das paredes interiores e exteriores da moradia, a expensas suas, no que despendeu 10.000,00 euros, procedeu a obras de conservação e reparação do telhado e teto e respetivo isolamento térmico, no que despendeu 10.000,00 euros e, uma vez que a área envolvente do prédio urbano se apresenta em declive, conseguiu com a construção de um muro, suportar as terras contíguas ao mesmo, atenta a iminência de ruína, no que despendeu 20.000,00 euros.
Realizado julgamento, foi proferida sentença em primeira instância que julgou a ação integralmente improcedente por não provada e, em consequência, absolveu a ré B… do pedido formulado pela autora, C…, S.A.; não foi apreciada a reconvenção por se considerar prejudicado o seu conhecimento, dado ter sido deduzido a título subsidiário, para o caso da ação proceder (cópia certificada a fls. 152 e seguintes).
Interposto recurso pela autora para este Tribunal da Relação do Porto, foi proferido acórdão que, dando parcial provimento ao recurso, condenou a ré a restituir à autora, livre de pessoas e bens, as habitações 4 e 5 do Bloco BE 2-13 e a garagem n.º 4, melhor identificadas nos autos, e a indemnizar a autora pelos prejuízos que lhe vem causando com a ocupação daquelas casas e garagem, em quantia a liquidar ulteriormente, absolvendo a ré dos demais pedidos contra si deduzidos. O mesmo acórdão julgou improcedente a reconvenção deduzida pela ré e absolveu a autora dos pedidos reconvencionais contra si formulados (cópia certificada a fls. 174 e seguintes dos presentes autos).
O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão proferido em apreciação de recurso interposto pela ré, B…, decidiu negar a revista (cópia certificada a fls. 242 e seguintes).
Na execução a que se reportam os presentes embargos, a autora/exequente pretende executar a decisão proferida na aludida ação e transitada em julgado, afirmando que a ré/executada, apesar de repetidamente interpelada, não procedeu à entrega das referidas habitações e garagem.
1.2 Na oposição à execução, a executada refuta ter sido interpelada para entregar as habitações aqui em causa.
Alega que vive nas habitações em causa há, pelo menos, 46 anos, não sendo arrendatária nem proprietária de outro prédio urbano, em qualquer outro lugar do país e tendo, atualmente, setenta e seis anos e como única casa, as habitações aqui em causa, onde fixou residência, com exclusão de outra, com o restante agregado familiar – cônjuge e dois filhos menores, na altura; tem aí a sua residência, assim como, o seu domicílio fiscal, tem cartão de eleitor da freguesia dessas habitações, onde exerceu e exerce o seu direito de voto, tendo como única residência essas habitações, pagando mensalmente o consumo de eletricidade das mesmas e aí chegando a ter na sua companhia dois netos cujo pai faleceu.
A exequente pagou compensações pecuniárias para outros agregados familiares desocuparem livre de pessoas e bens outras moradias, entre 40.000,00 e 50.000,00 euros, por cada um dos prédios urbanos, infringindo o princípio constitucional da igualdade.
Alega ainda que, caso não procedam as razões enunciadas, tem direito a ser indemnizada das benfeitorias necessárias que fez, reiterando a este propósito que procedeu a obras de construção civil de reparação, conservação e beneficiação dos imóveis, a expensas suas, no que despendeu 10.000,00 euros, procedeu a obras de conservação e reparação do telhado e teto e respetivo isolamento térmico, no que despendeu 10.000,00 euros e, uma vez que a área envolvente do prédio urbano se apresenta em declive, conseguiu com a construção de um muro, suportar as terras contíguas ao mesmo, atenta a iminência de ruína, no que despendeu 20.000,00 euros.
Termina afirmando que a oposição deve ser julgada procedente e, em consequência, ser julgada extinta a execução, e requerendo que, recebida a oposição, seja ordenada a suspensão da execução nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 279.º e 929.º,n.º 2, a contrario, do Código de Processo Civil, na redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho; sem prescindir, pede a condenação da exequente a pagar-lhe o valor total de € 40.000,00, a título de benfeitorias necessárias.
1.3 A oposição foi liminarmente indeferida, nos seguintes termos (transcrição integral do despacho recorrido):
«Baseando-se a execução a que a presente oposição corre por apenso, em decisão judicial proferida e já devidamente transitada em julgado (concretamente o Acórdão da 2.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto datado de 11 de Outubro de 2011, que veio a ser confirmado pela douta decisão da 6.ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça em 06 de Março de 2012), a oposição apenas poderá fundar-se nas situações previstas nas alíneas do art.º 814.º do Código de Processo Civil, as quais são taxativas.
Ora, da análise dos fundamentos ora invocados pela opoente verifica-se não se integrarem os mesmos em qualquer uma das referidas alíneas, sendo que a opoente pretende é vir novamente discutir os fundamentos da ação declarativa, deduzindo os mesmos factos por si já oportunamente alegados na ação declarativa e no recurso então interposto do mencionado acórdão da Relação do Porto que ora se executa, o qual foi julgado improcedente.
Não cabe em sede de oposição à execução proferir qualquer decisão diferente daquela que constitui o título da execução a que agora se opõe.
Assim, ponderando igualmente o douto acórdão proferido e que constitui o título dado à execução apensa e os pedidos formulados, conclui-se ser igualmente manifesta a improcedência da oposição deduzida, já que não pode a opoente por via da oposição à execução pretender uma nova apreciação de mérito sobre a mesma matéria com a consequente “alteração” de uma decisão já transitada em julgado.
Face ao exposto e ao amparo do disposto nos art.º 817.º, n.º 1, al. b) e c) e 814.º do Código de Processo Civil indefiro liminarmente a presente oposição à execução.
Custas a cargo da opoente.
Notifique, incluindo o Sr. AE.
Dê baixa estatística dos autos (F7).»
2.1 A executada, inconformada com a decisão proferida, veio interpor o recurso que aqui se aprecia, concluindo nos seguintes termos:
«1. O presente recurso tem por objeto o douto despacho proferido a fls. nos autos de processo de oposição à execução à margem referenciados, no qual a Ilustre Magistrada “a quo” decidiu pelo indeferimento liminar da oposição à execução, ao amparo do disposto nos artigos 817.º, n.º 1, alínea b) e c) e 814.º, do CPC.
2. Mas, a aqui Recorrente alegou na sua petição inicial de oposição à execução factos extintivos aos quais não houve qualquer decisão.
3. Alegou, entre outros factos, a violação do Princípio da Igualdade, um dos direitos fundamentais expressos na Constituição da República Portuguesa, consagrado no artigo 13.º da CRP.
4. Princípio esse que reclama tratamento igual para o que for essencialmente igual e tratamento diferente para o que, na sua essência, diferente for.
5. Quanto à tal matéria alegada nos artigos 25.º a 38.º do articulado de oposição à execução, não houve qualquer pronúncia em instâncias anteriores.
6. Tais factos alegados na oposição constituem fundamento previsto no n.º 1, do artigo 814.º, do CPC e merecem a apreciação do Tribunal a quo.
7. O Juiz não pode deixar de se pronunciar sobre o peticionado, sem fundamentação.
8. Com a referida omissão e sempre com o devido respeito, o Tribunal “a quo” não fundamentou a sua decisão e deixou de se pronunciar sobre os factos que foram alegados.
9. Tal constitui uma nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, alíneas b) e d), do CPC.
10. Ofende o disposto nos artigos 814.º, n.º 1, 158.º, n.º 1 e 659.º, n.º 3, do CPC e artigo 13.º, da CRP.
11. O douto Despacho é nulo por não especificar a fundamentação de facto e de direito que justificou a sua decisão, ou quando o Juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar quando suscitadas no articulado próprio e idóneo.
12. Vício de nulidade que se invoca para os devidos e legais efeitos.
SEM PRESCINDIR,
13. A execução aqui em causa é uma execução com vista à entrega de coisa certa.
14. Tem como título uma sentença.
15. É facto incontroverso e incontrovertível que os fundamentos da oposição à execução baseada em sentença só podem ser os taxativamente previstos no artigo 814.º, do CPC.
16. Contudo também é verdade que, numa execução para entrega de coisa certa, a oposição à execução pode ter por fundamento as benfeitorias a que tenha direito, como dispõe o artigo 929.º, do CPC.
17. O n.º 3, daquele preceito legal, impõe que a oposição com fundamento nas benfeitorias só é admitida quando, tratando-se de uma execução com base em sentença condenatória, o executado haja oportunamente feito valer o seu direito a elas.
18. Nos artigos 39.º a 62.º da oposição, foram alegadas as benfeitorias que já tinham sido invocadas em reconvenção, na contestação da ação declarativa.
19. Entende-se, salvo sempre douta opinião contrária, que estão preenchidos os requisitos previstos no artigo 929.º, n.ºs 1 e 3, do CPC.
20. Acórdão da Relação de Évora, de 17.03.2011, in www.dgsi.pt que: “O que o art.º 929.º, n.º 3, do CPC pretende é impedir que, perante o título executivo «sentença condenatória», seja invocado um direito a benfeitorias, sempre que esse direito não tiver sido previamente invocado, na própria ação em que foi proferida a sentença que constitui título executivo – ou seja, a invocação de benfeitorias deve ter lugar na ação declarativa (a título de reconvenção), estando vedado invocá-lo na execução se não houve essa prévia invocação na ação. É este o sentido da expressão «oportunamente» – i.e., reporta-se à ação declarativa em que foi proferida a sentença que constitui título executivo”.
21. No âmbito de um processo de oposição à execução de uma decisão judicial (execução de sentença), a oposição à execução constitui uma verdadeira ação declarativa, que corre por apenso ao processo de execução.
22. Nela é possível ao executado, não só levantar questões de conhecimento oficioso, mas também alegar factos novos, apresentar novos meios de prova e levantar questões de direito que estejam na sua disponibilidade, em conformidade com os meios ou fundamentos taxativamente previstos no art.º 814.º, al.s a) a h), do Código de Processo Civil.
23. Na execução para entrega de coisa certa, o art.º 929.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, prevê expressamente que o executado pode deduzir oposição à execução com fundamento em benfeitorias a que tenha direito.
24. É na ação declarativa que o executado deve fazer valer o seu direito às benfeitorias.
25. A oponente cumpriu aquele pressuposto ao invocar o direito a benfeitorias na ação declarativa, deduzindo contra a A. um pedido reconvencional pelo respetivo valor.
26. Tais benfeitorias alegadas na ação declarativa e, agora, na oposição merecem a apreciação do Tribunal “a quo”.
27. O Mm.º Juiz não pode deixar de se pronunciar sobre as benfeitorias.
28. O Tribunal “a quo” não fundamentou a sua decisão e deixou de se pronunciar sobre tais factos.
29. Assim, entende-se, sempre salvo douta opinião contrária, que o douto Despacho é nulo por não especificar a fundamentação de facto e de direito que justificou a sua decisão, ou quando o Juiz deixe de se pronunciar sobre questões que devesse apreciar quando suscitadas no articulado próprio e idóneo.
30. Tal ofende o disposto nos artigos 158.º, n.º 1, 659.º, n.º 3, 814.º, n.º 1 e 929.º, do CPC.
31. Constitui uma nulidade prevista no artigo 668.º, n.º 1, alíneas b) e d), do CPC.
32. Por todo o exposto, não se encontram verificados nenhuns dos fundamentos previstos no artigo 817.º, n.º 1, do CPC para o indeferimento liminar da oposição.
33. Pelo que, deverá o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser revogado o despacho de indeferimento liminar da oposição à execução e substituído por outro que a receba, prosseguindo os termos processuais da oposição.
34. O demais em douto suprimento.»
2.2 A exequente respondeu, formulando conclusões nos seguintes termos:
«1 - A interposição do presente recurso pela Apelante visa fatigar a Apelada e, por arrastamento, inevitavelmente, este Ilustre Tribunal da Relação do Porto, com uma desnecessária e injusta soma de trabalhos e de despesas, claro está, atenta a absoluta falta de fundamentação em que estriba o seu recurso e, bem assim, dilatar, no maior tempo possível e de forma totalmente inaceitável, a entrega à Autora ora Apelada, devoluta de pessoas e bens, das habitações 4 e 5 do Bloco BE – 2 13 e garagem nº 4, ambas melhor identificadas no artigo 21º da Petição Inicial;
2 - A interposição do presente recurso, consubstancia um já velho, agastado e esfarrapado expediente processual a que a Apelada lançou mão mas que não serve, nem os superiores interesses da Justiça nem respeita, também, os direitos declarados e estatuídos no Acórdão do Venerando Tribunal da Relação em questão, ulteriormente confirmado, como supra dito, pela supra mencionada decisão do Supremo Tribunal de Justiça, expediente esse que não poderá deixar ser severamente sancionada por este Ilustre Tribunal da Relação do Porto;
3 - A Apelante recorre de uma excelsa decisão, isto é, do douto despacho de fls. …, datado de 04 de Fevereiro de 2013, dos autos de processo de oposição à execução à margem referenciados que decidiu, de forma sábia, legal, clara, exemplar e bem fundamentada, pelo indeferimento liminar da oposição à execução com base no consignado nos artigos 817º, nº 1, alínea b) e c) e 814º, ambos do CPC;
4 - O despacho recorrido não padece de qualquer vício legal (substantivo ou adjetivo/processual), sendo uma decisão judicial absolutamente clara, inequívoca, exemplarmente fundamentada, quer de facto quer de direito, inexistindo nele, como, na verdade, inexiste, quer omissão de pronúncia quer nulidade por violação dos artigos 929º, 158º nº 1, 659º, nº 3 do CPC em virtude da Mmª. Juiz “a quo” não se ter pronunciado quanto à admissão da oposição com fundamento nas benfeitorias a que a recorrente afirma ter direito, mas que, em boa verdade, não tem;
5 - As razões ou fundamentos invocados pela Recorrente nas suas alegações de recurso não se reconduzem ou subsumem em qualquer uma das situações tipificadas nas alíneas do artigo 814º do Código de Processo Civil;
6 - A oposição deduzida pela opoente para poder ser aceite (recebida/admitida) como válida pelo Tribunal “a quo” teria de respeitar, observar, o disposto no normativo legal referido em antecedente, o que não sucede, sendo que tal normativo legal apresenta natureza taxativa;
7 - Aquilo que a Recorrente pretende é, apenas e tão só, agora em fase de execução, solicitar ao 2º Juízo do Tribunal Judicial do Marco de Canaveses que analise, aprecie, mais uma vez, de novo, a factualidade por si alegada em sede de ação declarativa;
8 - A Recorrente, no seu articulado de oposição à execução, limitou-se, uma vez mais, a verter, precisamente, os mesmos factos que invocou/afirmou quer no seu articulado de contestação quer no recurso então por si interposto do supra assinalado Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto e que foi julgado improcedente;
9 - Como bem se salienta no despacho recorrido “ não cabe em sede de oposição à execução proferir qualquer decisão diferente que constitui o título da execução a que agora se opõe”;
10 - Tomando em devida consideração o teor do imaculado e exemplar Acórdão da 2ª Secção do Venerando Tribunal da Relação do Porto, datado de 11 de Outubro de 2011, que veio a ser confirmado pela douta decisão da 6ª secção do Supremo Tribunal de Justiça, em 06 de Março de 2012, que constitui o título dado à execução (apensa) pela exequente e aqui Recorrida/Apelada e os pedidos formulados, sobre a oposição deduzida pela opoente/Apelante sempre teria de recair, como, efetivamente, veio a incidir, um despacho, aliás, douto, que indeferisse, como de facto, indeferiu, liminarmente, a oposição apresentada pela opoente, nos termos do preceituado no artigo 817º, nº 1, alíneas b) e c) e 814º, ambos do CPC;
11 - Como, sapientemente, se extrai do despacho recorrido “… não pode a opoente por via da oposição à execução pretender uma nova apreciação de mérito sobre a mesma matéria com a consequente “alteração” de uma decisão já transitada em julgado”.
12 - A Recorrida não pode deixar de chamar à atenção deste Venerando Tribunal da Relação do Porto para aquilo que vem, exemplarmente, afirmado no ponto 4.5, folhas 63 e 64, do supra mencionado Acórdão do Venerando Tribunal da Relação do Porto, datado de 11 de Outubro de 2011, que veio a ser confirmado pela douta decisão da 6ª secção do Supremo Tribunal de Justiça, em 06 de Março de 2012, no que concerne às alegadas benfeitorias, cuja argumentação jurídica, atenta a bondade da mesma e o seu rigor, faz improceder toda e qualquer invocação a este título produzida, gratuitamente, pela Recorrente com as suas alegações de Recurso.
13 - À Recorrente não lhe foi reconhecido qualquer direito a benfeitorias, conforme melhor resulta da decisão supra aludida já transitada em julgado e, bem assim, daquilo que vimos de afirmar no parágrafo antecedente;
14 - A Recorrente não reúne as condições indispensáveis à invocação, de novo, desse seu direito na oposição à execução;
15 - Não é possível afirmar que a Recorrente tenha feito valer o direito a benfeitorias na ação declarativa onde foi proferida a decisão que se executa; noutros termos, é na ação declarativa que a executada deve fazer valer o seu direito a benfeitorias em matéria da sua existência, qualificação e valor, o que, revertendo ao concreto caso sob apreciação, não ocorreu, o que o mesmo é dizer, a recorrente não observou tal pressuposto legal.
16 - O Tribunal a quo não cometeu qualquer violação/ofensa do consignado no artigo 929º, nºs 1 e 3, do CPC;
17 - No concreto caso de que curam os presentes autos, a jurisprudência invocada pela Recorrente e, bem assim, todas as considerações, juízos e afirmações deduzidas por ela são impertinentes e infundadas, face à realidade objetiva que os aqueles mesmos autos espelham;
18 - O douto despacho proferido pelo Ilustre Tribunal recorrido pronunciou-se sobre todas as questões que tinha, por dever de ofício, de pronunciar-se, encontrando-se, repete-se, bem fundamentado, quer de facto quer de direito, não enfermando, em caso algum, do pretenso vício da nulidade prevista no artigo 668º, nº 1, alíneas b) e c) do CPC, assim como inexiste qualquer ofensa dos preceitos 158º, nº 1, 659º, nºs 3 e 4, 814º, nº 1 e 929º, todos do CPC, encontrando-se totalmente preenchidos ou verificados os fundamentos constantes do artigo 817º, nºs 1 alíneas b) e c) do CPC;
19 - O despacho recorrido nos termos e pelas razões acima enunciadas deve ser mantido na integra, com todas as legais consequências, desta forma se julgando totalmente improcedente o recurso deduzido por B…, Executada, Opoente nos autos em mérito acima melhor especificados, por tal se revelar em conformidade com a Lei, com o Direito e ser, ainda, da mais elementar e pura Justiça.»
Termina afirmando que o presente recurso deve ser julgado totalmente improcedente por não provado, mantendo-se, na íntegra, o despacho recorrido que indeferiu, liminarmente, a oposição à execução então formulada pela opoente, nos termos e pelas razões supra narradas, com todas as legais consequências.
3. Colhidos os vistos legais e na ausência de fundamento que obste ao conhecimento do recurso, cumpre apreciar e decidir.
As conclusões formuladas pelos recorrentes definem a matéria que é objecto de recurso e que cabe aqui apreciar, o que, no caso dos autos, se traduz nas seguintes questões:
• A alegada nulidade da decisão recorrida.
• O alegado direito à dedução de oposição e respetivos fundamentos, incluindo benfeitorias.
II)
Fundamentação
1. Na decisão a proferir importa considerar os factos que se deixaram sumariamente enunciados no relatório que antecede.
2. A alegada nulidade da decisão recorrida.
2.1 A recorrente, ao invocar a nulidade da decisão recorrida, pretende que houve violação do dever de fundamentação e do princípio do contraditório, ocorrendo também a nulidade por alegada oposição dos fundamentos com a decisão proferida e ambiguidade que a torna ininteligível, reportando-se aos artigos 158.º e 668.º, n.º 1, alíneas b) e c), do Código de Processo Civil na redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho, vigente na data em que foram deduzidos os embargos, com correspondência aos artigos 154.º e 615.º, n.º 1, alíneas b) e c), do referido Código, na sua redação atual.
Nos termos das disposições conjugadas dos artigos 613.º, n.º 3, e 615.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil, é nulo o despacho quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão proferida.
O dever de fundamentação decorre do princípio enunciado no artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República, nos termos do qual as decisões dos tribunais que não sejam de mero expediente são fundamentadas na forma prevista na lei, reiterando-se o referido princípio no artigo 154.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, onde se diz que as decisões proferidas sobre qualquer pedido controvertido ou sobre alguma dúvida suscitada no processo são sempre fundamentadas.
As normas processuais constavam nos artigos 158.º e 668.º do Código de Processo Civil, na anterior redação, em termos essencialmente idênticos.
A nulidade por falta de especificação dos fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão não se basta com a existência de uma fundamentação abreviada ou que seja incompleta ou deficiente ou que, por qualquer modo, não seja convincente, casos em que se poderá questionar o mérito da própria decisão e a procedência dos seus argumentos, mas não afirmar a sua nulidade.
A exigência de fundamentação vem desde o início do referido diploma e é óbvia a sua razão de ser: a apreciação do acerto ou do desacerto da decisão proferida e a sua eventual impugnação por via de recurso só é possível com o conhecimento dos seus fundamentos de facto e de direito. No ensinamento –ainda atual, apesar do tempo decorrido e das alterações legislativas que entretanto se verificaram – de Alberto dos Reis, «desde que o nosso sistema é o de legalidade, o juiz tem de demonstrar que decidiu em conformidade com a lei» (“Código do Processo Civil Anotado”, volume I, Coimbra Editora, página 284); mas o mesmo autor salientava, relativamente à nulidade: «Há que distinguir cuidadosamente a falta absoluta de motivação da motivação deficiente, medíocre ou errada. O que a lei considera nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou mediocridade da motivação é espécie diferente, afeta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade» (obra citada, volume V, página 140).
O artigo 615.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Civil, na redação atual, resultante da Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho, mantendo a norma do artigo 668.º, n.º 1, alínea c), na redação anterior, dispõe que o despacho é também nulo quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Retornando a Alberto dos Reis, esta nulidade verifica-se «quando a sentença enferma de vício lógico que a compromete (…)», quando «a construção da sentença é viciosa, pois os fundamentos invocados pelo juiz conduziriam logicamente, não ao resultado expresso na decisão, mas a resultado oposto» –“Código de Processo Civil Anotado”, Coimbra Editora, 1984, volume V, página 141.
A lei refere-se aqui «à contradição real entre os fundamentos e a decisão e não às hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão. (…) Nos casos abrangidos pelo artigo 668.º, 1, c) [correspondendo, na redação atual, ao artigo 615.º, 1, c)], há um vício real de raciocínio do julgador (e não um simples lapsus calami do autor da sentença): a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente» – Antunes Varela, Miguel Bezerra e Sampaio e Nora, “Manual de Processo Civil”, Coimbra Editora, 1.ª edição, página 689.
A nulidade em questão verifica-se quando a fundamentação do despacho aponta num certo sentido que é contraditório com o que vem a decidir-se e, enquanto vício de natureza processual, não se confunde com o erro de julgamento, que se verifica quando o juiz decide mal – ou porque decide contrariamente aos factos apurados ou contra lei que lhe impõe uma solução jurídica diferente.
2.2 Para a apreciação da alegada nulidade, em ambas as vertentes suscitadas, relevam os factos que acima se deixaram transcritos e as razões enunciadas no despacho que é objeto de recurso, em confronto com a decisão aí proferida no final.
Analisados os fundamentos da decisão recorrida que se deixou integralmente transcrita verifica-se a total compreensão das razões que determinaram a decisão proferida, sem que possa afirmar-se a inexistência da especificação dos fundamentos de facto e de direito.
Considera-se aí que, podendo a oposição fundar-se apenas nas situações taxativas previstas nas alíneas do artigo 814.º do Código de Processo Civil, a análise dos concretos fundamentos invocados pela opoente evidencia que não se integram em qualquer uma dessas situações, sendo que a opoente pretende é vir novamente discutir em sede de embargos os fundamentos da ação declarativa, deduzindo os mesmos factos por si já oportunamente alegados na ação declarativa e no recurso então interposto do acórdão do Tribunal da Relação do Porto que constitui o título executivo, o qual foi julgado improcedente. Observa-se que não pode a opoente por via da oposição à execução pretender uma nova apreciação de mérito sobre a mesma matéria com a consequente “alteração” de uma decisão já transitada em julgado.
Mas também se evidencia a improcedência da pretensão da recorrente na parte em que pretende haver oposição entre a decisão e respetivos fundamentos, ambiguidade ou obscuridade que a tornem ininteligível, na medida em que a ponderação dos elementos antes enunciados não revela que a fundamentação do despacho afirme uma solução que não vem a ter correspondência na decisão final ou, mais do que isso, seja com ela contraditória.
Por outro lado, não se regista que a fundamentação do despacho seja ambígua, tornando a decisão ininteligível
Apesar dos termos sucintos do despacho e sem prejuízo da discordância da recorrente quanto à procedência dos fundamentos invocados, não se vê que haja vício consubstanciado em violação dos artigos 659.º, 201.º e 668.º do Código de Processo Civil, na redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho (artigos 607.º, 195.º e 615.º, na redação atual) e do artigo 205.º, n.º 1, da Constituição da República e que determine a pretendida nulidade.
A conclusão quanto à inexistência de nulidade não se altera mesmo perante a argumentação de que a recorrente suscita agora questões novas em relação aos fundamentos da ação declarativa, nomeadamente quando menciona compensações pecuniárias para outros agregados familiares desocuparem livres de pessoas e bens outras moradias, em infração ao princípio constitucional da igualdade, ou quando questiona o direito a benfeitorias. É pacífico que se rejeita a apreciação desta matéria no despacho recorrido por se entender que não se integra em qualquer uma das situações taxativas previstas no artigo 814.º do Código de Processo Civil, onde constam os fundamentos de oposição à execução baseada em sentença. A manifesta discordância da recorrente não se traduz em falta de fundamentação ou ambiguidade ou obscuridade que tornem a decisão ininteligível.
Improcede nesta parte o recurso, dado que não se verifica qualquer nulidade que afete a decisão recorrida.
3. O alegado direito à dedução de oposição e respetivos fundamentos, incluindo benfeitorias.
A este propósito o recorrente afirma que, no âmbito de um processo de oposição à execução de uma decisão judicial (execução de sentença), a oposição à execução constitui uma verdadeira ação declarativa, que corre por apenso ao processo de execução, sendo nela possível ao executado, não só levantar questões de conhecimento oficioso, mas também alegar factos novos, apresentar novos meios de prova e levantar questões de direito que estejam na sua disponibilidade, em conformidade com os meios ou fundamentos taxativamente previstos no artigo 814.º, alíneas a) a h), do Código de Processo Civil.
Acresce que na execução para entrega de coisa certa, o artigo 929.º, n.º 1, do mesmo diploma prevê expressamente que o executado pode deduzir oposição à execução com fundamento em benfeitorias a que tenha direito; é na ação declarativa que o executado deve fazer valer o seu direito às benfeitorias; a oponente cumpriu aquele pressuposto ao invocar o direito a benfeitorias na ação declarativa, deduzindo contra a autora um pedido reconvencional pelo respetivo valor; tais benfeitorias alegadas na ação declarativa e, agora, na oposição merecem a apreciação do Tribunal “a quo”.
3.1 Na data em que foi instaurada a ação executiva e em que a recorrente apresentou os embargos vigorava, em relação ao Código de Processo Civil, a redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.
Neste quadro legal, instaurada execução, o executado podia opor-se à mesma no prazo de 20 dias a contar da citação (artigo 813.º), na certeza de que, nos termos do artigo 814.º, n.º 1, fundando-se a execução em sentença, a oposição só podia ter algum dos fundamentos seguintes: inexistência ou inexequibilidade do título [alínea a)]; falsidade do processo ou do traslado ou infidelidade deste, quando uma ou outra influa nos termos da execução [alínea b)]; falta de qualquer pressuposto processual de que dependa a regularidade da instância executiva, sem prejuízo do seu suprimento [alínea c)]; falta ou nulidade da citação para a ação declarativa quando o réu não tenha intervindo no processo [alínea d)]; incerteza, inexigibilidade ou iliquidez da obrigação exequenda, não supridas na fase introdutória da execução [alínea e)]; caso julgado anterior à sentença que se executa [alínea f)]; qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação, desde que seja posterior ao encerramento da discussão no processo de declaração e se prove por documento, podendo ser provada por qualquer meio a prescrição do direito ou da obrigação [alínea g)].
Os artigos 815.º e 816.º do Código de Processo Civil, na redação que aqui se considera, continham os fundamentos de oposição à execução baseada em decisão arbitral (“São fundamentos de oposição à execução baseada em sentença arbitral não só os previstos no artigo anterior mas também aqueles em que pode basear-se a anulação judicial da mesma decisão”) e os fundamentos de oposição à execução baseada noutro título (“Não se baseando a execução em sentença ou em requerimento de injunção ao qual tenha sido aposta fórmula executória, além dos fundamentos de oposição especificados no n.º 1 do artigo 814.º, na parte em que sejam aplicáveis, podem ser alegados quaisquer outros que possam ser invocados no processo de declaração”).
Nos termos do artigo 817.º, n.º 1, a oposição à execução corre por apenso, sendo indeferida liminarmente quando: tiver sido deduzida fora do prazo [alínea a)]; o fundamento não se ajustar ao disposto nos artigos 814.º a 816.º [alínea b)]; for manifestamente improcedente [alínea c)].
No caso específico da execução para entrega de coisa certa, o executado é citado para, no prazo de 20 dias, fazer a entrega ou opor-se à execução; neste caso, pode deduzir oposição à execução pelos motivos especificados nos artigos 814.º, 815.º e 816.º, na parte aplicável, e com fundamento em benfeitorias a que tenha direito (artigos 928.º e 929.º do Código de Processo Civil, na redação anterior à Lei n.º 41/2013, de 26 de junho). Contudo, a oposição com fundamento em benfeitorias não é admitida quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas (artigo 929.º, n.º 3).
Este quadro legal mantém-se, em termos idênticos, nos artigos 728.º a 732.º e 860.º do Código de Processo Civil, na redação atual, resultante da Lei n.º 41/2013, de 26 de junho.
3.2 Reportando-nos ao caso dos autos, a recorrente cita, a propósito das benfeitorias, acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 17 de março de 2011, disponível na base de dados do IGFEJ (www.dgsi.pt), em cujo sumário consta: «O que o art.º 929.º, n.º 3, do CPC pretende é impedir que, perante o título executivo «sentença condenatória», seja invocado um direito a benfeitorias, sempre que esse direito não tiver sido previamente invocado, na própria ação em que foi proferida a sentença que constitui título executivo – ou seja, a invocação de benfeitorias deve ter lugar na ação declarativa (a título de reconvenção), estando vedado invocá-lo na execução se não houve essa prévia invocação na ação. É este o sentido da expressão «oportunamente» – i.e., reporta-se à ação declarativa em que foi proferida a sentença que constitui título executivo» (acórdão proferido no processo 449/06.5TBEVR-B.E1).
Sem questionar o entendimento que é afirmado nesse acórdão, importa no entanto salientar que não tem a abrangência que é afirmada pela recorrente, que pretende ter cumprido aquele pressuposto pelo simples facto de ter invocado o direito a benfeitorias na ação declarativa, deduzindo aí contra a autora um pedido reconvencional pelo respetivo valor, pretendendo que tais benfeitorias alegadas na ação declarativa merecem agora, na oposição, a apreciação do Tribunal “a quo”, sem qualquer referência ao resultado dessa invocação em sede de ação declarativa.
Relativamente à norma em referência (artigo 929.º do Código de Processo Civil), Lopes do Rego anotava que «O n.º 3 (…) vem estabelecer que – fundando-se a execução em sentença condenatória – não são admissíveis os embargos baseados na invocação do direito a benfeitorias quando o executado não haja, no processo declarativo, feito valer o seu direito a elas.
Na verdade, tal meio de defesa deve considerar-se precludido em consequência do trânsito em julgado que condena na restituição da coisa, já que cumpria ao réu ter deduzido reconvenção (…).
E, desde que tenha tido oportunidade processual para o fazer – “máxime” porque tal direito não é de considerar superveniente, relativamente ao momento em que era oportuno deduzi-lo na ação declaratória – considera-se o mesmo precludido – não podendo ser invocado no âmbito da execução» - “Comentários ao Código de Processo Civil”, Almedina, 1999, página 620.
Esta leitura mantém-se atual perante o disposto no artigo 860.º do Código de Processo Civil, na redação agora vigente.
No caso dos autos, a executada/recorrente reclama da exequente, no âmbito dos embargos e a título de direito que resulta de benfeitorias, o reembolso de valores que diz ter despendido, totalizando € 40.000,00 – sendo € 10.000,00 relativos a obras de construção civil de reparação, conservação e beneficiação dos imóveis, a expensas suas, € 10.000,00 relativos a obras de conservação e de reparação do telhado e teto e respetivo isolamento térmico e € 20.000,00 relativos à construção de um muro de suporte as terras contíguas ao mesmo, atenta a iminência de ruína.
No confronto desta pretensão com o que consta na ação declarativa evidencia-se que a pretensão agora formulada reproduz a que já havia sido aí deduzida em reconvenção, não se reportando, nomeadamente, a quaisquer factos que sejam posteriores à ação declarativa. Como anteriormente se deixou mencionado, a reconvenção foi aí julgada improcedente, com a consequente absolvição do pedido, relativamente à autora (cf. acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto).
Em tais circunstâncias, tendo esta decisão transitado em julgado (confirmada por acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, igualmente mencionado), fica necessariamente precludida a possibilidade da ré/executada fazer prevalecer essa pretensão.
Como se afirmava explicitamente no artigo 929.º, n.º 3, do Código de Processo Civil e se mantém no artigo 860.º, n.º 3, na redação vigente do mesmo diploma, a oposição com fundamento em benfeitorias não é admitida quando, baseando-se a execução em sentença condenatória, o executado não haja oportunamente feito valer o seu direito a elas. É o que se verifica perante a improcedência da reconvenção em sede de ação declarativa e a consequente absolvição do pedido.
Nas circunstâncias descritas, não se enquadrando os fundamentos em nenhum dos pressupostos que legitimam a dedução de oposição, nos termos do disposto nos artigos 814.º e 929.º do Código de Processo Civil, na redação então vigente (artigos 729.º e 860.º na redação atual), não há censura a fazer à decisão recorrida.
Não releva a invocação de novos argumentos na oposição à execução, relativamente ao que havia sido suscitado na contestação à ação declarativa, na medida em que não integrem qualquer um dos casos previstos nestas normas.
Conclui-se por isso que improcede totalmente o recurso interposto pela executada.
III)
Decisão:
Pelas razões expostas, nega-se provimento ao recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
Custas a cargo da recorrente.
*
Porto, 2 de maio de 2016.
Correia Pinto
Ana Paula Amorim
Manuel Domingos Fernandes