Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
361/22.0T8GDAM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA
Descritores: EMPREITADA DE CONSUMO
RESOLUÇÃO DO CONTRATO
INDEMNIZAÇÃO
INTERESSE CONTRATUAL POSITIVO
Nº do Documento: RP20230309361/22.0T8GDM.P1
Data do Acordão: 03/09/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 3. ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Da decisão proferida no despacho saneador sobre o mérito sobre um pedido ou parte dele cabe recurso de apelação autónomo, não podendo tal decisão ser impugnada apenas no recurso da sentença.
II - Querendo impugnar a decisão sobre a matéria de facto o recorrente tem de indicar, nas conclusões das alegações de recurso, pelo menos, os concretos pontos da matéria de facto cuja decisão pretende ver modificada e o sentido da decisão que deve ser proferida (os restantes requisitos podem ser cumpridos apenas no corpo das alegações), sob pena de rejeição dessa impugnação.
III - O contrato pelo qual um casal contrata uma empresa de construção civil para executar obras para edificar aquela que vai ser a sua casa de morada de família está sujeito ao regime específico das empreitadas de consumo.
IV - A doutrina e a jurisprudência vêm consolidando o entendimento de que a resolução do contrato por incumprimento da parte contrária é, em regra, cumulável com a indemnização do interesse contratual positivo, podendo a parte lesada reclamar indemnização que a coloque na posição em que estaria se o contrato tivesse sido inteiramente cumprido.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Recurso de Apelação
ECLI:PT:TRP:2023:361.22.0T8GDM.P1
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Sumário:
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Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
AA, titular do cartão de cidadão n.º ... e contribuinte fiscal n.º ..., e mulher BB, titular do cartão de cidadão n.º ..., contribuinte fiscal n.º ..., residentes em Gondomar, instauraram acção declarativa com processo comum contra a A... Unipessoal, Lda., pessoa colectiva com identificação e contribuinte fiscal n.º ..., com sede em ..., Gondomar, pedindo a condenação da ré a (1) «reconhecer o abandono da obra e a consequente perda de interesse dos autores na manutenção do contrato com aquela», (2) «proceder à restituição das verbas recebidas por conta dos trabalhos adjudicados na empreitada e não realizados que se consubstanciam no montante de €7.250,00», (3) pagar «os prejuízos causados aos autores, mormente, nos valores pagos a terceiro para a realização dos trabalhos da responsabilidade da ré, que se computa no montante de €14.145,00», (4) pagar «a título de indemnização pelo incumprimento do contrato na quantia, nunca inferior a €2.500,00», (5) pagar «juros de mora desde a data da interpelação admonitória, até efectivo e integral pagamento».
Para fundamentar o seu pedido alegaram, em súmula, que celebraram com a ré um contrato de empreitada para execução das obras da especialidade de pedreiro para edificação de uma moradia, por conta de cujo preço e nos termos estabelecidos pagaram à ré €63.625,00, apesar do que a ré não executou parte dos trabalhos contratados (caixa de saneamento, escadaria frontal e coretes, entre outros) e em meados de Março de 2021 deixou de enviar trabalhadores para a obra e retirou desta ferramentas e utensílios, nomeadamente, betoneira, andaimes, martelos, pás, picaretas, etc., tendo sido interpelada pelos autores para retomar os trabalhos, sob pena de abandono da obra, mas não os retomou. Os autores tinham pago à ré €7.250,00 por trabalhos que esta não realizou e tiveram de contratar com terceiros a sua execução, no que despenderam o montante global de €14.145,00.
A ré foi citada e apresentou contestação, impugnando grande parte dos factos alegados, negando a versão da autora de ter havido abandono da obra, sustentando que apenas estavam por concluir uma parte do chão da garagem, a escadaria frontal, a rampa de acesso e uma corete, defendendo a improcedência da acção.
No despacho saneador conheceu-se parcialmente do mérito da causa, tendo-se julgado improcedentes «os pedidos de condenação da ré no pagamento das quantias de €4.920,00 (parte do terceiro pedido) e de €2.500,00 (quarto pedido)» deles se absolvendo a ré, determinando-se o prosseguimento da lide «para o conhecimento do primeiro pedido (eficácia da resolução), do segundo pedido (restituição de quantias pagas por trabalhos não realizados) de parte do terceiro pedido (no valor de €9.225,00) e do quinto pedido (juros de mora)».
Realizado julgamento, foi proferida sentença, tendo a acção sido julgada parcialmente procedente «declarando-se eficazmente extinto por resolução o contrato de empreitada celebrado entre a ré e os autores» e «condenando-se a ré a pagar aos autores a quantia de €4.175,00, acrescida de juros desde a citação».
Do assim decidido, os autores interpuseram recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões:
I. A douta sentença de que ora se recorre não considerou a totalidade dos valores pagos pelos recorrentes a terceiros para as obras que deveriam ter sido realizadas e foram pagas à recorrida, bem como não considerou qualquer valor a título de indemnização pelo incumprimento contratual e danos.
II. A referida douta sentença apenas condenou a recorrida no pagamento da quantia de € 4.175,00 acrescidos de juros contados desde a data da citação até efectivo e integral pagamento.
III. Para tanto, a douta sentença fundamenta que estando provada a falta de apenas quatro trabalhos, o custo destes será de cerca de €6.150,00 (IVA incluído). Do preço dos trabalhos (excluído muros e anexos), isto é, €65.600,00 os autores pagaram €63.625,00. O mesmo é dizer que, estando apenas em falta os trabalhos referidos (no valor de €6.150,00), a quantia de €1.975 (65.600,00 – 63.625,00) não foi paga (antecipadamente). Já o valor restante €4.175,00 (6.150,00 – 1.975,00) foi pago, proporcionalmente, nos diversos pagamentos parcelares efectuados.
IV. Ainda que apenas no caso de se considerar que os recorrentes tiveram de pagar a terceiro mais do que teriam de pagar à recorrida, poder-se-á encontrar na diferença um dano indemnizável. No entanto, tal valor pago a terceiro foi usado para apurar o valor que seria devido à ré.
V. A conclusão vertida na douta sentença não teve em consideração o valor da obra no seu todo, mas apenas em parte da obra.
VI. É de senso comum que o valor por uma obra da envergadura da aqui em crise, é totalmente diferente do valor de apenas meros trabalhos a serem realizados - que em geral é sempre mais oneroso.
VII. Neste sentido, a douta sentença de que ora se recorre, não teve em consideração o valor que os recorrentes tiveram efectivamente de despender para terminar a referida obra (não só do que ficou por fazer e que foi confessado, mas toda a demais obra),
VIII. Os quais, foram muito superiores aos valores consignados aquando da elaboração do orçamento, bem como, na data em que os mesmos tiveram de ser (re)contratados (em face da crise em que vivemos face à pandemia e face a guerra na Ucrânia, com os inerentes aumentos dos materiais e custo de mão de obra).
IX. A douta sentença, não teve em consideração os documentos juntos aos autos, mormente as facturas dos trabalhos realizados por terceiros, com as quais poderia e deveria ter aferido a justa indemnização a atribuir aos recorrentes,
X. Bem como, não teve em consideração aos depoimentos prestados pelas testemunhas dos recorrentes, mormente, as declarações do Sr. CC, pessoa que teve de terminar o que foi deixado ao abandono pela recorrida.
XI. Já para não referir os custos que tiveram de suportar para a edificação de muros e anexos.
XII. A recorrida abandou a obra sem qualquer justificação.
XIII. Os recorrentes procederam ao pagamento dos trabalhos, incluindo trabalhos que não foram realizados pela recorrida.
XIV. A recorrida teve uma conduta reveladora de uma intenção firme e definitiva no sentido de não cumprir a obrigação contratual de concluir a respectiva obra, porquanto, verificou que o orçamento dado ficava aquém do que era expectável e que perdera dinheiro, conforme referiu o legal representante da recorrida.
XV. A paragem dos trabalhos e o subsequente abandono da obra por parte do empreiteiro ora recorrida, podem e devem, inequivocamente, ser interpretados como manifestação da sua intenção firme e definitiva de não cumprir a sua obrigação contratual de concluir a obra.
XVI. Por força da resolução do contrato de empreitada, ficou a recorrida automaticamente constituída na obrigação de indemnizar o dono da obra/recorrentes dos prejuízos que lhes causou, conforme decorre do disposto nos artigos 801º número 2 e 1223º do Código Civil.
XVII. Os recorrentes, por força do abandono da obra perpetrado pela recorrida, tiveram de contratar empresa terceira, para que concluísse as obras da responsabilidade daquela, tendo para o efeito, pago a quantia de €7.500,00 (sete mil e quinhentos euros) acrescidos de IVA, para a realização dos trabalhos de construção de escadaria, edificação de divisórias, edificação de coretes, chaminés, chão da garagem e floreira;
XVIII. Ainda, com o referido abandono de obra pela recorrida, tiveram ainda os recorrentes de contratar empresa terceira para a realização da rampa da garagem, o qual teve um custo de €4.000,00 (quatro mil euros) acrescidos de IVA, e não obstante saber a recorrida que a realização daquele trabalho era da sua responsabilidade e que se encontrava orçamentado e adjudicado.
XIX. Bem como, com o já referido abandono da obra, tiveram os recorrentes de contratar empresa terceira para proceder à edificação dos muros e dos anexos.
XX. Com as adjudicações referidas nos números XVIII e XIX, e conforme referido, tiveram os recorrentes prejuízos nos valores referidos, pois reitere-se, estavam estes valores incluídos na obra adjudicada.
XXI. O imóvel aqui em causa é para habitação própria e permanente dos recorrentes, sendo que para a edificação da mesma, tiveram, estes de recorrer a financiamento.
XXII. Em face do abandono da obra, viram-se os recorrentes na iminência de perder a última tranche do financiamento no valor de €30.000,00, o qual apenas não se verificou em face de os recorrentes terem conseguido novo empreiteiro para terminar a obra que havia sido adjudicada à recorrida.
XXIII. Sendo certo que a recorrida tinha conhecimento daquele “timing”.
XXIV. Em face do referido, deveria a sentença de que ora se recorre, ter condenado a recorrida no pagamento do montante de €7.250,00, (acrescidos de IVA) valor este pago pelos recorrentes a empresa terceira conforme factura junto aos autos, em face dos trabalhos e construção de escadaria, edificação de divisórias, edificação de coretes, chaminés, chão da garagem e floreira;
XXV. Deveria a recorrida ser condenada a pagar aos recorrentes a quantia de €4.000,00 (quatro mil euros) acrescidos de IVA, referente à construção da rampa da garagem, realizado por terceiro e que era da responsabilidade da recorrida.
XXVI. Pois que, se os pagamentos realizados para a obra eram de forma parcelar, os montantes recebidos pela recorrida, também se teriam por incluídos para a realização destas.
XXVII. Deveria a recorrida ser igualmente condenada a pagar aos recorrentes indemnização pelo incumprimento contratual por si perpetrado, cujo montante não deveria ser em quantia inferior a €2.500,00.
XXVIII. Pois a assim se não entender, para além de a recorrida reter para si um valor por obra não realizada, estará a mesma numa situação de enriquecimento sem causa.
XXIX. Para além disso, a assim não ser condenada, vê a recorrida uma “janela” para num futuro próximo, poder encetar novos contratos de empreitada, atribuindo um valor até inferior aos demais concorrentes, a fim de ganhar a obra, e a meio da empreitada, abandonar a obra retendo verbas que não são suas, prejudicando os donos de obra que terão de contratar empresas terceiras para terminarem as mesmas, com custos muito superiores aos inicialmente acordados, ou negociados em face de um trabalho maior/completo.
Termos em que, e nos de direito doutamente supridos, deve o recurso merecer provimento, revogando-se a sentença recorrida, condenando-se a recorrida conforme peticionado.

A recorrida respondeu a estas alegações defendendo a falta de razão dos fundamentos do recurso e pugnando pela manutenção do julgado.

Após os vistos legais, cumpre decidir.

II. Questões a decidir:
As conclusões das alegações de recurso demandam desta Relação que decida as seguintes questões:
A] Qual é o objecto do recurso.
B] Se esta Relação pode reapreciar a decisão sobre a matéria de facto.
C] Quais os direitos de indemnização que assistem à dona da obra em caso de resolução do contrato de empreitada por incumprimento do empreiteiro, como se calcula o dano e se os autos contêm os elementos necessários para a quantificação dos valores indemnizatórios.

III. Os factos:
Ficaram provados os seguintes factos:
A. Celebração do contrato de empreitada
1 - Os autores são donos do prédio rustico sito na Estrada ..., ..., Gondomar.
2 - Em meados de 2019, os autores solicitaram à ré orçamento para a especialidade de pedreiro para execução de uma moradia no prédio referido, de acordo com o projecto de estabilidade, muretes na placa de cobertura, muros de vedação em bloco, pavimento exterior em betonilha, caixas de saneamento e águas pluviais, ranhuras para electricista e picheleiro, rampa da garagem, chão de garagem, escadaria frontal e coretes.
3 - Para a realização das referidas obras apresentou a ré verbalmente o preço de €75.000,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, tendo este valor sido verbalmente aceite pelos autores.
4 - As partes declararam acordar que o pagamento do valor orçamentado se procederia faseadamente, no momento da adjudicação e o restante através de autos de medição, nas seguintes fases referidas no documento junto a fls. 18 (anexo documental):

B. Execução do contrato de empreitada
5 - Em 12 de Novembro de 2019, com a adjudicação da obra à ré os autores pagaram àquela o montante de €10.000,00 e o montante de €2.300,00, sendo o segundo correspondente ao valor do IVA sobre o primeiro.
6 - Para além dos dois pagamentos iniciais realizados com a adjudicação, com o desenrolar da obra foram realizados diversos pagamentos, assim resultando o seguinte total de pagamentos:

7- Dos trabalhos adjudicados, a ré não executou a escadaria da entrada, chaminés, parte das coretes e chão da garagem.
8 - Os trabalhos referidos no ponto 7 - factos provados - foram pagos pelos autores, parcial e proporcionalmente, com os pagamentos efectuados nos termos descritos no ponto 6 - factos provados.
9 - Os autores pagaram a terceiro as quantias de: a) €9.225,00 para a execução da escadaria da entrada, caixas de saneamento e águas pluviais, chaminés, coretes e ainda as paredes divisórias da garagem, coretes, floreira, chão da garagem; b) €4.920,00 para a realização da rampa de acesso à garagem.
C. Extinção do contrato de empreitada.
10 - Em 14 de Junho de 2021, por intermédio de mandatário, o autor remeteu à ré a carta, por esta recebida em 17 de Junho de 2021, junta a fls. 10, onde consta, além do mais que aqui se dá por transcrito:
Assunto: Obras construção sito na Estrada ...
Incumbiu-nos o n/Representado Sr. AA de vir a presença de V/Exa. no sentido de interpelar para a realização e término da obra/empreitada contratada com V/Exa. na morada referida em assunto, a qual se encontra por terminar, mormente, o chão da garagem, caixas de saneamento, escadaria frontal e coretes, obras estas que pese embora não estejam realizados, já foram pagas; bem como, a construção dos anexos e dos muros, sendo certo que estas últimas ainda não foram pagas.
Isto posto, requer-se a V/Exa. se digne a promover pela realização das referidas obras até ao dia 23 do corrente mês e ano, sob pena, de não fazendo, considerar-se abandono de obra e bem assim, levar o m/ Representado a, com justa causa, poder resolver o contrato de empreitada por incumprimento contratual, com assine dentes consequências que daí advém.
11 - Em 28 de Junho de 2021, por intermédio de mandatário, o autor remeteu à ré a carta, por esta recebida em 5 de Julho de 2021, junta a fls. 11 v., onde consta, além do mais que aqui se dá por transcrito:
Assunto: Obras construção sito na Estrada ...
No seguimento da n/ missiva anterior, datada de 14 de Junho do corrente, recebido por V/Exas. a 17.06.2021 e face a V/inércia, quer pela ausência da concretização do estipulado naquela, bem como, tão pouco, se dignaram a prestar uma qualquer informação ao n/Constituinte, tal conduta, acrescida dos actos já praticados, são claros e demonstrativos do abandono de obra perpetrado por V/ Exa.. Assim, servimo-nos da presente para denunciar, com efeitos imediatos, o contrato de empreitada celebrado, com fundamento na perda de interesse do credor, previsto nos termos do número 1.º do artigo 808.º do Código Civil.
Aproveitamos ainda o ensejo para solicitar a restituição do valor antecipadamente pago, no montante de € 7250,00 (...), cujos trabalhos não foram efectuados, nomeadamente, chão, escadarias, caixas de saneamento e águas e ainda coretes (...).
A não verificação do referido no parágrafo anterior, consubstanciará na desistência da resolução da presente querela pela via extrajudicial, pelo que nos veremos a lançar mãos dos meios legais e judiciais ao nosso dispor com os inerentes custos daí decorrentes.

IV. O mérito do recurso:
Antes de entrarmos na apreciação do recurso é imperioso esclarecer aspectos sobre os quais se formaram equívocos e que, sob a capa de uma aparente simplicidade, só complicam a determinação do objecto do recurso e do que cumpre decidir.
Primeiro esclarecimento:
Os pedidos de condenação da ré a pagar aos autores 4.920,00€, a título de valor pago a terceiro para a execução de trabalhos compreendidos no contrato celebrado com a ré, e 2.500€, a título de indemnização pelo incumprimento deste contrato, foram decididos em desfavor dos autores no despacho saneador.
Essa decisão de mérito sobre um dos pedidos e sobre parte de outro pedido era passível de ser impugnada através de recurso de apelação, nos termos da alínea b) do n.º 1 do artigo 644.º do Código de Proc. Civil. Segundo se retira do n.º 3 da norma, à contrário sensu, tal recurso era autónomo da decisão final, não podendo a parte vencida relegar a impugnação dessa decisão no saneador para o recurso da sentença final do processo, nem sendo a mera reclamação do despacho saneador meio idóneo para impugnar a decisão.
O prazo de recurso dessa parte do despacho saneador iniciou-se com a notificação do despacho saneador aos autores (n.º 1 do artigo 638.º do Código de Processo Civil) e concluiu-se antes da apresentação das alegações de recurso da sentença final, sendo certo que no requerimento de interposição de recurso se assinalou expressamente que o mesmo era apresentado «da douta sentença proferida em 23/11/2022».
Encontra-se, assim, transitada em julgado a decisão proferida no despacho saneador sobre os pedidos mencionados, sendo certo que o vício da falta de convite ao aperfeiçoamento da petição inicial que, para além de ser obrigatório, teria permitido sanar as insuficiências apontadas à alegação que fundamentava esses pedidos teria de ser arguido no recurso da correspondente decisão. Por essa razão não se vislumbra fundamento para os recorrentes tornarem a essa questão nas alegações de recurso, nem esta Relação irá ou poderá tomar posição sobre tais decisões.
Por conseguinte, uma vez que o primeiro segmento da decisão (pretensamente atinente ao primeiro pedido) é favorável aos autores, o objecto do recurso é constituído exclusivamente pela decisão relativa aos segundo e terceiro (mas este somente na parte relativa à despesa de 9.225,00€) pedidos.
Segundo esclarecimento:
Embora no requerimento da interposição do recurso os recorrentes mencionem que o recurso visa também a «reapreciação da prova gravada» e depois no corpo das alegações de recurso se refiram demoradamente aos depoimentos prestados em audiência e transcrevam mesmo partes do seu conteúdo, a verdade é que esta Relação não pode reapreciar a decisão sobre a matéria de facto por não se mostrarem cumpridos os requisitos específicos da impugnação dessa decisão.
Com efeito, não obstante a “intenção” de impugnar a decisão proferida sobre a matéria de facto, os recorrentes não formulam uma única conclusão sobre essa impugnação, não havendo nas conclusões das alegações nenhum item que especifique os factos cuja decisão é impugnada, concretize a decisão que esta Relação deverá proferir em relação a tais factos ou que especifique os meios de prova que deverão conduzir a essa diferente decisão, o que determina, de imediato, a rejeição desta impugnação.
Constitui posição sólida, reiterada e amplamente conhecida da jurisprudência que o thema decidendum do recurso é estabelecido pelas conclusões das respectivas alegações (cf. artigos 608.º, n.º 2, 609.º, n.º 1, 635.º, n.º 4, e 639.º, do Código de Proc. Civil). Uma vez que a função das conclusões de recurso é sintetizar as questões que se pretende que o tribunal ad quem aprecie e o sentido com que as deverá decidir, nos casos em que uma dessas questões é a impugnação da decisão da matéria de facto, deverão fazer parte das conclusões itens especificando essa pretensão e cumprindo os requisitos de que depende a validade da impugnação.
Para impugnar a decisão da matéria de facto o recorrente tem de especificar, obrigatoriamente e sob pena de imediata rejeição do recurso nessa parte, os seguintes aspectos: os concretos pontos de facto considerados incorrectamente julgados, os concretos meios probatórios que na óptica dos recorrentes impunham decisão diversa e o sentido da decisão que deve ser proferida, sendo que no tocante aos depoimentos gravados carece de indicar as passagens da gravação em que se funda o seu recurso (artigo 640.º do Código de Proc. Civil).
Nas conclusões alegações de recurso apresentadas não se encontra sequer a indicação dos concretos pontos de facto cuja decisão o tribunal ad quem deve reapreciar ou a indicação do sentido da decisão a proferir sobre eles. Por isso, nas conclusões das alegações de recurso os recorrentes não cumpriram os requisitos obrigatórios da indicação dos concretos pontos da matéria de facto cuja decisão impugna e pretende ver modificada, e da indicação do sentido ou conteúdo da decisão a proferir pela Relação em relação a esses factos.
Refira-se que o Supremo Tribunal de Justiça tem uma posição clara e firme quanto a quais e qual ao local onde os requisitos específicos da impugnação da decisão sobre a matéria de facto devem ser cumpridos para que se possa falar em cumprimento válido (nas conclusões das alegações) e quanto à consequência do seu incumprimento (a imediata rejeição do recurso, nessa parte, sem qualquer convite ao aperfeiçoamento) – cf., entre muitos outros, os Acórdãos de 11.02.2016, proc. n.º 157/12.8TUGMR.G1.S1, de 18.02.2016, proc. n.º 558/12.1TTCBR.C1.S1, de 03.03.2016, proc. n.º 861/13.3TTVIS.C1.S1, de 12.05.2016, proc. n.º 324/10.9TTALM.L1.S1, de 07.07.2016, proc. n.º 220/13.8TTBCL.G1.S1, de 27.10.2016, proc. n.º 110/08.6TTGDM.P2.S1, de 13.10.2016, proc. n.º 98/12.9TTGMR.G1.S1, de 22.02.2017, proc. n.º 1512/07.0TB CSC.L1.S1, de 22.03.2018, proc. n.º 290/12.6TCFUN.L1.S1, de 16.05.2018, proc. nº 2833/16.7T8VFX.L1.S1, de 05.09.2018, proc. n.º 15787/15.8T8PRT.P1.S2, de 31.10.2018, proc. n.º 2820/15.2T8LRS.L1.S1, de 22.11.2018, proc. n.º 2337/06.6TBTVD.L1.S2, de 19.12.2018, proc. n.º 271/14.5TTMTS.P1.S1, de 13.01.2022, proc. n.º 417/18.4T8PNF.P1.S1, de 18.01.2022, proc. n.º 243/18.0T8PFR.P1.S1, todos in www.dgsi.pt –.
A posição do Supremo Tribunal de Justiça, que é igualmente a nossa, é a de que para cumprir minimamente os requisitos específicos da impugnação da decisão sobre a matéria de facto e permitir que essa seja uma das questões a apreciar pelo tribunal de recurso, o recorrente tem de indicar nas conclusões das alegações de recurso, pelo menos, quais os concretos pontos da matéria de facto cuja decisão pretende ver modificada e qual o sentido da decisão que deve ser proferida sobre eles (os restantes requisitos podem estar cumpridos apenas no corpo das alegações). A ausência dessas indicações nas conclusões das alegações é motivo de rejeição imediata da impugnação da decisão sobre a matéria de facto.
Por esse motivo, ao abrigo do disposto no artigo 640.º do Código de Proc. Civil, na parte em que o mesmo teria por objecto a impugnação da decisão da matéria de facto, o recurso é rejeitado.
Terceiro esclarecimento:
A redacção dos pontos 5 e 6 enferma de obscuridade.
No ponto 5 dá-se conta de dois pagamentos efectuados em 12.11.2019 (€10.000,00 e €2.300,00); no ponto 6 começa-se por dizer que «para além dos dois pagamentos iniciais realizados com a adjudicação», os mencionados no ponto 5, «com o desenrolar da obra foram realizados diversos pagamentos», acrescentando-se uma lista de pagamentos; sucede que entre estes se contam dois pagamentos efectuados em 12.11.2019.
Levando em conta o que se alega na petição inicial e mais especificamente a circunstância de nesta apenas se alegar terem sido realizados nesta data dois pagamentos e não quatro, os pontos 5 e 6 devem ser lidos no sentido de que o elenco de pagamentos do ponto 6 representa a totalidade dos pagamentos realizados pelos autores (sendo o ponto 5 inútil).
Quarto esclarecimento:
Os direitos dos autores decorrentes do incumprimento definitivo do contrato pela ré emergem naturalmente desse incumprimento, mas a sua expressão depende em boa medida da posição que os autores tomaram em relação à manutenção do contrato com fundamento no incumprimento da ré.
Por referência ao primeiro pedido dos autores foi decidido (fazendo o tribunal a sua própria interpretação do que efectivamente os autores pretendiam, sem lhes dar oportunidade de esclarecerem eles mesmos, mediante aperfeiçoamento da petição inicial, esse aspecto) considerar o contrato «eficazmente resolvido».
Desse segmento da decisão não foi interposto recurso, pelo que a decisão é incontornável para esta Relação e constitui um pressuposto da análise jurídica sobre o pedido de indemnização formulado que de seguida se fará, sendo certo, recorde-se, que nessa análise já não pode caber a decisão de julgar improcedente os pedidos relativos aos montantes de €2.500,00 e de €4.920,00.
Isto dito, entremos na apreciação do objecto do recurso.
A questão jurídica colocada no recurso consiste em determinar o conteúdo do direito de indemnização que os autores podem reclamar da ré em virtude de esta ter incumprido definitivamente o contrato, levando aqueles a operar a resolução do contrato.
A resolução dessa questão reclama antes de mais a qualificação jurídica do contrato celebrado entre as partes e a determinação do respectivo regime jurídico.
No que concerne à qualificação não há dúvidas de que estamos perante um contrato de empreitada por essa ser a qualificação que se ajusta ao acordo contratual aqui presente pelo qual uma das partes – a ré – se obrigou perante a outra – os autores – a executar uma obra de construção civil da especialidade de pedreiro, com vista à construção de um edifício urbano, destinado a casa de habitação, mediante um preço a suportar pelos beneficiários desses trabalhos.
Na definição legal constante do artigo 1207.º do Código Civil o contrato de empreitada é «o contrato pelo qual uma das partes se obriga em relação à outra a realizar certa obra, mediante um preço». A empreitada é uma modalidade do contrato de prestação de serviços cuja definição se encontra no artigo 1154.º do mesmo diploma e consiste no contrato «em que uma das partes se obriga a proporcionar à outra certo resultado do seu trabalho intelectual ou manual, com ou sem retribuição».
A empreitada é assim o contrato pela qual o empreiteiro se obriga perante o dono da obra a prestar um serviço consistente na realização de uma obra, sendo que esta consiste numa realização humana que surge como resultado do trabalho, independentemente do seu suporte – material, digital, etc. – ou da sua natureza – material ou intelectual –.
A obrigação do empreiteiro é essencialmente uma obrigação de resultado, ele vincula-se a realizar para o dono da obra a obra convencionada, nos termos acordados e segundo os usos e as leges artis, sob pena de falhar ao cumprimento da sua obrigação. A obra que constitui elemento constitutivo do contrato de empreitada tanto pode consistir na realização de uma coisa (corpórea) nova, como na modificação de uma coisa existente, e, mesmo na fabricação de qualquer outro produto, mediante prestação de trabalho ou de serviços.
Todavia, na empreitada o trabalho não é devido enquanto tal, mas apenas como meio de realização da obra ou da produção do resultado que constitui o objecto nuclear da prestação obrigacional. Por essa razão, aliás, o trabalho não tem de ser prestado pelo próprio empreiteiro a título pessoal - salvo tratando-se de obra caracterizada como infungível: v.g. um quadro de um determinado pintor -, o qual intervém no contrato como agente económico autónomo, não subordinado, independente de ordens e instruções do dono da obra.
A construção de paredes, placas, alicerces, fundações de um edifício é uma obra, mais especificamente uma obra de construção de uma coisa imóvel, logo estamos perante um contrato de empreitada.
Questão distinta é a de saber se esse contrato é regido pelo regime jurídico comum do contrato de empreitada consagrado nos artigos 1207.º e seguintes do Código Civil ou lhe são aplicáveis as disposições específicas das relações com os consumidores consagradas à data da celebração do contrato no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, com as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio (presentemente revogado e substituído pelas disposições do Decreto-Lei n.º 84/2021, de 18 de Outubro, que regulou os direitos do consumidor na compra e venda de bens, conteúdos e serviços digitais, transpondo as Directivas (UE) 2019/771 e (UE) 2019/770, o qual se encontra em vigor desde 1 de Janeiro de 2022, aplicando-se apenas aos contratos celebrados após a sua entrada em vigor – cf. artigos 53.º a 55.º).
Este diploma contém um regime para certos aspectos da venda de bens de consumo e respectivas garantias, com vista a assegurar a protecção dos interesses dos consumidores, tendo operado a transposição para o direito interno da Directiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de Maio.
Esse regime aplica-se primacialmente aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores. Todavia, nos termos do n.º 2 do artigo 1.º-A, aditado pelo artigo 2.º do Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio, aplica-se ainda «com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada ou de outra prestação de serviços, bem como à locação de bens de consumo».
Para que este regime particular seja aplicável é mister que estejamos perante uma relação contratual entre um consumidor (o dono da obra) e um profissional (o empreiteiro) - relação de consumo quanto aos sujeitos - e perante um tipo de contrato compreendido no âmbito do diploma - relação de consumo quanto ao objecto -.
Para efeitos do diploma, do ponto de vista dos sujeitos, existe uma relação de consumo quando o contrato é celebrado entre uma pessoa «a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho». É, pois, necessário que de um lado tenhamos alguém que adquire - em sentido amplo, para incluir a empreitada ou a prestação de serviços e não apenas a venda - os bens para uso pessoal, isto é, não profissional, e do outro lado, alguém que, com vista à obtenção de benefícios económicos, faz profissão dessa actividade de fornecimento de bens.
No caso, pese embora este aspecto não tenha sido abordado pelas partes nem pelo tribunal a quo, resulta da petição inicial que a obra contratada à ré consistiu na execução de trabalhos de construção civil para edificação de uma casa de habitação para os autores (cf. artigo 2.º da petição inicial, aceite especificadamente na contestação: «pretendem os Autores construir uma habitação unifamiliar, destinada a habitação própria permanente»). Nessa medida, para efeitos desta norma os autores são consumidores: destinam o bem objecto da obra contratada a fins pessoais, não profissionais. A ré, por sua vez, é uma sociedade comercial que se dedica à actividade comercial da construção civil. Logo, o contrato que celebrou com os autores está compreendido no âmbito do exercício do seu escopo social, no âmbito da actividade que desenvolve para obtenção de lucros. Subjectivamente não há, pois, dúvidas de que estamos perante uma relação de consumo.
Sendo assim, o caso dos autos está sujeito ao regime específico das empreitadas de consumo, melhor dizendo, ao regime legal do sub-tipo contratual do contrato de empreitada, consagrado na Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (Lei de Defesa dos Consumidores) e no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril. Supletivamente e com as devidas adaptações, na parte que não contrarie aquele regime, aplicar-se-ão as regras do regime comum da empreitada, previstas nos artigos 1207.º do Código Civil.
Em conformidade com o princípio geral da pontualidade dos contratos (artigo 406º do Código Civil), o empreiteiro obriga-se a executar a obra nos termos convencionados, sem vícios que excluam ou reduzam o valor dela ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (artigo 1208º do Código Civil).
Para Cura Mariano, in Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 2ª ed. revista e aumentada, pág. 56, «a obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, em que este assume a obrigação de realização de uma determinada obra, de acordo com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (art.º 1208.º do C.C.), não sendo responsável pela não obtenção deste resultado, quando esse fracasso é imputável a causas que não possa dominar».
Para Baptista Machado, in Resolução por Incumprimento, Estudos de Homenagem ao Professor Doutor J. J. Teixeira Ribeiro, 2º, pág. 386, o cumprimento defeituoso ou inexacto ocorre quando a prestação efectuada não tem os requisitos idóneos para corresponder ao conteúdo do programa obrigacional, tal como este resulta do contrato e do princípio geral da correcção e boa fé. Essa desconformidade pode ser quantitativa ou qualitativa. É quantitativa quando representa um minus em relação ao objecto da prestação contratada. É qualitativa quando existe uma diversidade da prestação, uma deformidade, um vício ou falta de qualidade da mesma ou sobre o seu objecto recaem direitos de terceiro.
No caso do contrato de empreitada, as desconformidades são desvios em relação às características projectadas contratualmente, estejam elas estipuladas expressa ou tacitamente, originando uma diminuição da aptidão da coisa para o uso e finalidade pretendidas com o contrato.
As características projectadas no contrato englobam não só as características típicas da obra em causa e as características afirmadas pelo empreiteiro por qualquer meio, como também todas aquelas que especificamente foram acordadas, tácita ou expressamente. Se o empreiteiro sabe ou tem obrigação de saber que o dono da obra quer que a obra executada apresente determinadas qualidades ou características e que as mesmas são possíveis de obter, como maior ou menor diligência, pelo empreiteiro, cabe-lhe a obrigação de executar a obra com essas qualidades ou características, sob pena de cumprimento defeituoso da sua prestação.
No regime da empreitada celebrada por consumidores, consagrado na Lei n.º 24/96, de 31 de Julho (Lei de Defesa dos Consumidores) e no Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, a noção de defeitos é substituída pela noção de desconformidade: para gerar os direitos previstos no regime basta que o resultado da prestação do profissional não seja conforme com a que era suposto existir e que as partes tiveram como objectivo com a celebração do contrato. Como escrevem Pinto Monteiro e Morais de Carvalho1, na anotação ao Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17.12.2015, in Revista de Legislação e Jurisprudência, Ano 145.º, n.º 3997, págs. 239-240, a «noção de conformidade (ou de desconformidade) tem a vantagem de, através de uma fórmula simples (..), conseguir reunir-se num mesmo grupo (o do incumprimento da obrigação) uma série de situações com um tratamento distinto: o vício ou defeito, a falta de qualidade do bem, a diferença de identidade e a diferença de quantidade (..). A noção de desconformidade, num sentido amplo, abrange quer os vícios na própria coisa objecto do contrato, quer os vícios de direito (..). A lei não faz qualquer distinção, pelo que pode dizer-se só ser conforme com o contrato o objecto que seja entregue ao consumidor sem qualquer limitação, física ou jurídica». É o que sucede quando se constata que a colocação da peça no veículo não conduziu ao resultado almejado com a celebração do contrato e espectável de permitir a deslocação do veículo e este se imobilizou de novo por razões relativas à peça colocada pela ré em execução do contrato a que se vinculou.
Nos termos do artigo 3.º da Lei 67/2003, norma aplicável aos contratos de empreitada com as necessárias adaptações (nos termos do n.º 2 do artigo 1.º-A do diploma as suas disposições são aplicáveis «com as necessárias adaptações, aos bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada ou de outra prestação de serviços, bem como à locação de bens de consumo»), o vendedor responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue.
Segundo o artigo 4.º, n.º 1 do mesmo diploma, em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato. O n.º 5 do citado artigo 4.º estatui que o consumidor pode exercer qualquer dos direitos referidos nos números anteriores, salvo se tal se manifestar impossível ou constituir abuso de direito, nos termos gerais».
Finalmente, segundo o artigo 12.º da Lei 24/96, de 31 de Julho (Lei de Defesa do Consumidor), o consumidor tem direito à reparação de danos que lhe sejam causados pelo empreiteiro e que o exercício dos outros direitos não tenha ressarcido, podendo exigir indemnização dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do fornecimento de bens ou prestações de serviços defeituosos.
Entre os direitos previstos no n.º 5 do artigo 4.º do Decreto-Lei 67/2003 não existe qualquer tipo de hierarquia podendo o consumidor exercer qualquer dos direitos (reparação, substituição, redução do preço ou resolução) indiscriminadamente e de acordo com o que entenda ser-lhe mais favorável. O único limite a essa discricionariedade de escolha é o abuso de direito – e por isso mesmo é discricionariedade, não é arbitrariedade –.
Isso mesmo afirma Cura Mariano, in loc. cit., pág. 259, ao escrever: «se, relativamente ao conteúdo dos direitos do dono da obra, o regime da empreitada de consumo não apresenta significativas especialidades, já quanto ao modo de articulação dos diferentes direitos no seu exercício existe uma diferença substancial. Enquanto no regime do C.C. vigoram regras rígidas que estabelecem várias relações de precedência e subsidiariedades entre aqueles direitos, que condicionam severamente o seu exercício, no âmbito do D.L. n.º 67/2003 os direitos do dono da obra consumidor são independentes uns dos outros, estando a sua utilização apenas restringida pelos limites impostos pela proibição geral do abuso do direito (artigoº 4.º, n.º 5, do D.L. n.º 67/2003). Em princípio, perante a existência de faltas de conformidade na obra realizada, o dono desta pode exercer livremente qualquer um dos direitos conferidos pelo art.º 4.º n.º 1, do D.L. n.º 67/2003. Essa liberdade de opção pelo direito que melhor satisfaça os seus interesses deve, contudo, respeitar os princípios da boa fé, dos bons costumes e a finalidade económico-social do direito escolhido (art.º 334.º do C.C.), assim como tem como limite natural os casos de impossibilidade de efectivação do direito.»
No caso apenas se discute o direito de indemnização, rectius a extensão dos danos passíveis de indemnização. Pedindo os autores a condenação da ré, por um lado, a restituir-lhes o valor que pagaram por trabalhos que a ré não realizou e, por outro lado, a pagar-lhes o valor que, na sequência da recusa de cumprimento integral do contrato por parte da ré, tiveram de pagar a terceiros para estes realizarem trabalhos que no contrato a ré se obrigou a executar, suscita-se a controvérsia jurídica conhecida de saber se a parte que procede à resolução do contrato com fundamento no incumprimento da contraparte apenas pode exigir desta uma indemnização que a coloque na situação em que estaria se não tivesse celebrado o contrato (indemnização dos danos correspondentes ao interesse contratual negativo) ou, ao invés, pode reclamar uma indemnização que a coloque na situação em que estaria se o contrato tivesse sido cumprido (indemnização dos danos correspondentes ao interesse contratual positivo).
Não se justificam no caso grandes considerações doutrinárias sobre essa controvérsia uma vez que a evolução da jurisprudência nos últimos anos, acompanhando a mais recente doutrina, vem consolidando o entendimento de que a resolução do contrato por incumprimento da parte contrária é, em regra, cumulável com a indemnização do interesse contratual positivo, isto é, que não obstante haver decidido extinguir o contrato a parte lesada pelo incumprimento da outra pode reclamar desta ser colocada na posição em que estaria se o contrato tivesse sido inteiramente cumprido.
Expressam este entendimento, por exemplo, os Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 21.10.2010, proc. n.º 1285/07, de 10.12.2020, proc. n.º 15940/16.7T8LSB.L1.S1, de 28.10.2021, proc. n.º 1778/15.2T8CSC.L1.S1, e de 18.01.2022, proc. n.º 3609/17.0T8AVR.P1.S1, todos in ww.dgsi.pt. No citado Acórdão de 10.12.2020 que parece ter estabilizado o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça nesta questão, lê-se o seguinte:
«23. Os argumentos em favor de que a indemnização cumulável com a resolução do contrato é - sempre e só - uma indemnização pelo interesse contratual negativo devem considerar-se definitivamente - ou quase definitivamente – superados.
24. O art. 562.º do Código Civil consagra o princípio de que “quem estiver obrigado a reparar um dano há-de reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”; ora, o evento que obriga à reparação consiste no não cumprimento de uma obrigação; logo, quem estiver obrigado a reparar o dano há-de reconstituir a situação que existiria se a obrigação tivesse sido cumprida [.].
25. Em favor do cúmulo, depõem dois desenvolvimentos recentes:
26. Em 23 de Julho de 2020, foi aprovada para adesão a Convenção das Nações Unidas sobre a venda internacional de mercadorias de 11 de Abril de 1980 - e, de acordo com os arts. 75.º e 76.º da Convenção, a indemnização cumulável com a resolução do contrato é uma indemnização pelo interesse contratual positivo [.].
27. Em 20 de Maio de 2019, foi publicada a Directiva 2019/771/UE, sobre a venda de bens de consumo - e, de acordo com o considerando 61 da Directiva, a indemnização “deveraì repor a situação em que o consumidor se encontraria se o bem estivesse em conformidade” [.]. Os termos em que está redigido o considerando 61 aplicam-se a toda a indemnização, incluindo à indemnização cumulável com a resolução do contrato de compra e venda.
28. O Supremo Tribunal de Justiça, desde o acórdão de 12 de Fevereiro de 2009 - processo n.º 08B4052 -, admite que a indemnização cumulável com a resolução do contrato seja uma indemnização pelo interesse contratual positivo, ainda que hesitando sobre se a indemnização pelo interesse contratual positivo deverá ser a regra [.] ou, tão-só, a excepção [.].
29. Os acórdãos de 15 de Fevereiro de 2018 - processo n.º 7461/11.0TBCSC.L1.S1 - e de 17 de Maio de 2018 - processo n.º 567/11.8TVLSB.L1.S2 - sugerem que o problema deverá resolver-se caso a caso, a partir de uma apreciação ou de uma ponderação que não esteja condicionada, “de forma apriorística, a um critério abstracto de regra-excepção” [.]. Como se diz no sumário do acórdão de 17 de Maio de 2018, V. A resolução do contrato é compatível com a indemnização pelo interesse contratual positivo, que só não será admitida quando revele desequilíbrio grave na relação de liquidação ou se traduza em benefício injustificado para o credor, ponderado à luz do princípio da boa fé, hipótese em que se indemnizará antes pelo interesse contratual negativo. VI. Contudo, a indemnização pelo interesse contratual positivo não é cumulável com a indemnização pelo interesse contratual negativo: a primeira visa colocar o credor/lesado na situação em que estaria se o contrato tivesse sido pontualmente cumprido; ao passo que a segunda visa antes colocá-lo na situação em que estaria se o contrato não tivesse sido celebrado. VII. Indemnizar pelo interesse contratual positivo, traduz-se, na prática, em reconhecer ‘o primado do princípio geral da obrigação de indemnizar o credor lesado, consagrado no artigo 562.º do Código Civil, segundo o método da teoria da diferença acolhido pelo artigo 566.º, n.º 2, do mesmo diploma, como escopo fundamental reintegrador dos interesses atingidos pelo incumprimento do contrato’ […]».
Comentando com entusiasmo o aludido Acórdão, Paulo Mota Pinto, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 150.º, n.º 4029, Julho –Agosto de 2021, afirma que se trata de uma «orientação generalizadamente aceite nas outras ordens jurídicas», e que «a orientação que dominou durante muito tempo na doutrina e na jurisprudência portuguesas» era «uma verdadeira singularidade» no panorama internacional. Para este autor, in Revista de Legislação e de Jurisprudência, Ano 140.º, n.º 3968, Maio-Junho de 2011, «a solução que, em caso de não cumprimento imputável ao devedor, dá expressão ao acordo contratual, nas suas dimensões qualitativa e quantitativa, é, justamente, a da possibilidade de cumulação da resolução do contrato com uma indemnização pelo interesse no cumprimento. Pois só ela impede que o credor tenha de efectuar (ou deixar estar já efectuada) a sua contraprestação junto do devedor inadimplente, para receber uma indemnização pelo lucro que o contrato lhe proporcionaria. E só ela evita que a resolução, pela qual o credor pretende ficar livre para celebrar outro contrato, se transforme numa verdadeira ‘armadilha ou num “erro de técnica jurídica” por parte do credor (..), fazendo-o perder a sua pretensão indemnizatória com fundamento no não cumprimento que dá origem à resolução».
Feito este enquadramento teórico, vejamos a que conclusões ele nos conduz na sua aplicação ao caso concreto.
Conforme resulta do que se começou por escrever o contrato de empreitada foi considerado eficazmente resolvido por incumprimento definitivo da empreiteira. Esta realizou uma obra em desconformidade com o plano contratual, mais concretamente não realizou parte dos trabalhos que se havia obrigado a executar, tendo os autores recebido uma obra apenas executada parcialmente por comparação com aquela cuja execução foi contratada.
Nos termos do artigo 433.º do Código Civil na falta de disposição especial, a resolução é equiparada, quanto aos seus efeitos, à nulidade ou anulabilidade do negócio jurídico, com ressalva do disposto nos artigos seguintes.
A remissão é para o artigo 289.º, segundo o qual a declaração de nulidade e a anulação do negócio têm efeito retroactivo, devendo ser restituído tudo o que tiver sido prestado ou, se a restituição em espécie não for possível, o valor correspondente.
Por outro lado, nos termos do artigo 434.º resolução tem efeito retroactivo, salvo se a retroactividade contrariar a vontade das partes ou a finalidade da resolução.
Por aplicação destas normas, em caso de desconformidade parcial do bem, decidindo o lesado apesar da desconformidade conservar o bem ou não havendo possibilidades de o restituir, a resolução não tem eficácia retroactiva relativamente à parte do bem entregue e aceite. Por conseguinte, no caso, os autores tinham de pagar à ré o preço (contratual) das obras executadas por esta e aceites por eles, não tendo o direito de exigir da ré a restituição desse preço já pago.
Já no tocante aos trabalhos não executados, os autores, após a resolução, tinham o direito de recusar a sua execução pela ré e o direito de recusar o pagamento do respectivo preço ou, tendo-o já pago (total ou parcialmente), o direito de exigir a sua restituição, não a título de indemnização, mas como efeito da extinção do contrato por resolução e subsequente extinção das obrigações comutativas e sinalagmáticas.
Esse direito não se confunde com o direito de indemnização - que, no entendimento ora estabilizado pelo Supremo Tribunal de Justiça, deve colocar o contraente não inadimplente na posição em que estaria se o contrato fosse cumprido, como era finalidade do contrato -, decorre do direito do contraente ao cumprimento e corresponde à posição em que o próprio inadimplente estaria se honrasse a sua palavra contratual e respeitasse os seus deveres jurídicos de fonte voluntária.
O contraente lesado pode por isso, sem incorrer em abuso do direito ou ser alcandorado a mais do que aquilo que o contrato lhe proporcionaria, exigir uma indemnização pelo interesse contratual negativo (v.g. o ressarcimento das despesas com a celebração do contrato ou com a execução do mesmo) ou pelo interesse contratual positivo (v.g. o ressarcimento das despesas suportadas para se obter por outro meio alternativo a prestação que constituía o objecto do contrato), só não pode é cumular as duas perspectivas. No caso, os autores optaram pela segunda hipótese alternativa.
Como se calculam então aquele direito à restituição e este direito de indemnização?
A dificuldade que o caso oferece advém da circunstância de o contrato de empreitada ter sido celebrado por valor global e não por valor unitário para cada trabalho específico, aspecto em que se concorda com a sentença recorrida. Pese embora o pagamento do preço tenha sido faseado e as prestações indexadas à evolução da execução dos trabalhos, daí não resulta que o valor de cada prestação corresponda ao preço de trabalhos específicos executados até esse momento (até porque o plano não concretiza a totalidade dos trabalhos) mas somente que a nova prestação é devida quando um certo trabalho esteja concluído.
A outra dificuldade advém do facto de haver trabalhos que não foram executados e entre estes trabalhos que foram pagos apesar de não executados, sendo que esse pagamento, segundo se julgou provado, também não foi integral.
Na sentença recorrida resolveu-se essa dificuldade usando como critério, supostamente com base na equidade, o valor que os autores pagaram a terceiro para executar esses trabalhos e dividindo esse valor pelo número de trabalhos mencionados na factura do terceiro. Com todo o devido respeito, trata-se de um critério inaproveitável e absolutamente discricionário, o que nada tem a ver com a equidade, bem pelo contrário. Com efeito, estamos a falar de trabalhos de construção civil cujos preços, pela própria natureza daqueles, dependem da dimensão ou volume dos trabalhos e da quantidade de materiais e mão-de-obra necessários à sua execução, razão pela qual em circunstância alguma se pode dividir o preço de um conjunto de trabalhos pelo número de trabalhos em que esse conjunto foi inventariado, desconsiderando em absoluto a especificidade e o volume de cada um deles.
O único critério passível de ser usado é o do próprio contrato. Para o efeito, deve partir-se do preço global fixado para a totalidade dos trabalhos e com base nas qualidades e volumes de cada um dos trabalhos aí compreendidos determinar-se a parte desse preço que corresponde aos trabalhos não executados: a escadaria da entrada, chaminés, parte das coretes e chão da garagem.
A seguir devemos aplicar ao preço desses trabalhos assim apurado a proporção em que se mostra pago o preço global fixado para o conjunto dos trabalhos.
Aqui também existe uma especificidade que foi erradamente considerada na sentença. O que os autores têm a pagar à ré é o preço acordado: €75.000,00; o imposto sobre o valor acrescentado que recai sobre esse preço uma vez emitida a correspondente factura é devido ao Estado. Por isso, das duas uma: ou se leva em consideração os valores do preço mais IVA ou apenas os valores do preço, sem IVA; não pode é levar-se em conta valores que já incluíram IVA e valores que não incluíram ainda o IVA porque foram liquidados em dinheiro sem a emissão da factura.
Sendo assim, como nos parece, o preço fixado foi de €75.000,00 e deste montante os autores apenas pagaram €55.000,00 (além disso pagaram €8.625,00, mas a título de IVA, sendo certo que ainda deverão pagar o IVA correspondente aos pagamentos em numerário que fizeram assim que a ré emita a correspondente factura), ou seja, foi paga a percentagem de 73,33% do preço global fixado no contrato. É essa percentagem que depois deve ser aplicada ao valor apurado nos termos do anterior parágrafo, alcançando-se então o valor a restituir pela ré aos autores a título de valor recebido por trabalhos não executados.
No que concerne ao valor da indemnização pelo interesse contratual positivo, os autores têm o direito de serem colocados na posição em que estariam se o contrato tivesse sido cumprido e por isso está em causa apurar quanto tiveram os autores de despender pela execução da totalidade dos trabalhos contratados com a ré e calcular a diferença em relação ao que pagariam à ré pela sua execução nos termos contratados, condenando-se a ré a pagar-lhes o valor da diferença (que corresponde ao dano emergente – despesas a mais – que teve como causa adequada o incumprimento da ré).
Como proceder?
Em primeiro lugar é necessário usar o critério atrás assinalado e a partir do preço global fixado para a totalidade dos trabalhos, com base nas qualidades e volumes de cada um dos trabalhos aí compreendidos, determinar-se a parte desse preço que corresponde aos trabalhos não executados e que os autores alegam nos autos terem mandado executar por terceiros uma vez verificado o incumprimento definitivo do contrato.
Aqui é necessário levar em conta que estão fora desta equação os trabalhos de realização da rampa de acesso à garagem por cuja execução os autores pagaram o valor de €4.920,00, uma vez que como já referido esse segmento do pedido foi objecto de decisão anterior e esta não impugnada. Por outras palavras, esse cálculo recai somente sobre a execução da escadaria da entrada, caixas de saneamento e águas pluviais, chaminés, coretes e ainda as paredes divisórias da garagem, coretes, floreira e chão da garagem, pela qual os autores pagaram €9.225,00.
De seguida é necessário calcular a diferença entre o que os autores pagariam à ré (sem IVA) nos termos assinalados em primeiro lugar e o que pagaram a terceiros (sem IVA) pela execução desses trabalhos, diferença que constitui a medida da indemnização que a ré pagará aos autores.
Uma vez que o processo não fornece elementos para realizar estes cálculos da indemnização, e que constitui ónus dos autores a promoção das diligências de prova que o permitirão (v.g. junção dos projectos que permitam apurar o volume e as quantidades de trabalhos contratados e promoção da elaboração de relatório pericial por engenheiro ou técnico orçamentista que com base nesses volumes e quantidades distribua o preço global do contrato pelos diversos trabalhos específicos), a fixação do quantum indemnizatório deve ser relegado para liquidação posterior.
Procede assim e nessa medida o recurso.

V. Dispositivo:
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência, alteram a sentença recorrida na parte relativa ao pedido de indemnização, condenando a ré a pagar aos autores o valor a liquidar posteriormente nos termos e limites acima especificados.

Custas do recurso por autores e ré em igual proporção, atento o desconhecimento exacto da medida do vencimento/decaimento.
*
Porto, 9 de Março de 2023.
*
Os Juízes Desembargadores
Aristides Rodrigues de Almeida (R.to 735)
Francisca Mota Vieira
Paulo Dias da Silva



[a presente peça processual foi produzida pelo Relator com o uso de meios informáticos e tem assinaturas electrónicas qualificadas]