Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1805/15.3T8AVR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: LEONEL SERÔDIO
Descritores: DESERÇÃO DA INSTÂNCIA
Nº do Documento: RP201802211805/15.3T8AVR.P1
Data do Acordão: 02/21/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 125, FLS 95-98)
Área Temática: .
Sumário: I - Nos termos dos art.6º n.º1 do CPC, a partir da propositura da ação cabe ao juiz providenciar pelo andamento do processo e apenas quando preceito especial impuser ao demandante o ónus de impulso subsequente, mediante a prática de determinados ato cuja omissão impeça o prosseguimento da causa, é que há fundamento para lhe ser imputada culpa no não prosseguimento do processo, conducente à deserção da instância.
II - A não indicação pelo demandante do objeto da perícia, apesar de notificado com a advertência que os autos ficavam a aguardar nos termos do art. 281º do CPC, tem apenas por consequência legal, a rejeição da perícia, nos termos do art. 475º n.º 1 do CPC, não podendo essa omissão, que não obstava a que o juiz promovesse o andamento do processo, fundamentar a deserção da instância, nos termos do art. 281º n.º 1 do CPC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 1805/15.3T8AVR.P1
Relator - Leonel Serôdio (652)
Adjuntos – Amaral Ferreira
- Deolinda Varão

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

B..., S.A intentou a presente ação declarativa com processo comum contra C..., Lda e D..., Lda pedindo:
“A -1) Ser a 1ª R. condenada a pagar à A. uma indemnização sob a forma de reconstituição natural através da entrega à A., em prazo não superior a 30 dias, de uma máquina de injecção nova, e paga, da marca Negri Bossi, modelo ..., com os componentes alegados no artigo 4º deste articulado, ou a pagar à A. uma indemnização de valor igual ao preço desta máquina, num mínimo de 300.000€ (trezentos mil euros), acrescidos dos respectivos impostos;
2) Em caso de improcedência do artigo anterior, deverá a 1ªR. ser condenada a pagar à A. o valor correspondente à reparação da máquina acidentada, referida no artigo 4º deste articulado, e demais custos envolvidos, que se calculam num mínimo de 197.144,40€ (cento e noventa e sete mil cento e quarenta e quatro euros e quarenta cêntimos), conforme resulta dos documentos 5 e 6 juntos com este articulado, e foi alegado nos artigos 25º a 34º deste articulado, e também a ser condenada a pagar à A. uma indemnização no valor mínimo de 70.000€ (setenta mil euros), a titulo de ressarcimento pela desvalorização comercial da referida máquina acidentada máquina.
B -1) A entender-se que a 2ªR. também é responsável pelos danos emergentes do acidente descrito neste articulado, deverão a 1ª e a 2ªR.R. serem condenadas, solidariamente, a pagar uma indemnização à A. sob a forma de reconstituição natural através da entrega à A., em prazo não superior a 30 dias, de uma máquina de injecção nova, e paga, da marca Negri Bossi, modelo ..., com os componentes alegados no artigo 4º deste articulado, ou a pagar à A. uma indemnização de valor igual ao preço desta máquina, num mínimo de 300.000€ (trezentos mil euros), acrescidos dos respectivos impostos;
2) Ou, em caso de improcedência do artigo anterior, deverá a 1ªR. e a 2ªR. serem condenadas, solidariamente, a pagar à A. o valor correspondente à reparação da máquina acidentada, referida no artigo 4º deste articulado, e demais custos envolvidos, que se calculam num mínimo de 197.144,40€ (cento e noventa e sete mil cento e quarenta e quatro euros e quarenta cêntimos), conforme resulta dos documentos 5 e 6 juntos com este articulado, e foi alegado nos artigos 25º a 34º deste articulado, e também a serem condenadas, solidariamente, a pagar à A. uma indemnização no valor mínimo de 70.000€ (setenta mil euros), a titulo de ressarcimento pela desvalorização comercial da referida máquina acidentada.
C) Ser a 1ªR., ou ambas as R.R., condenada(s) no pagamento dos juros de mora que se vencerem, à taxa legal, sobre as quantias referidas nos pedidos anteriores, desde a data da citação até à data do integral pagamento.”

Alega, em síntese, o cumprimento defeituoso de um contrato celebrado com a 1ª Ré em que esta se obrigou a descarregar nas instalações da A uma máquina dela, que ficou danificada nessa descarga, por se ter partido o cabo da grua fornecido pela 2ª Ré.

A Ré C..., Lda contestou, sustentando a sua não responsabilidade pelos danos na máquina do A. Conclui pela improcedência da ação e suscitou o incidente de intervenção principal provocado da sua Seguradora E..., Companhia de Seguros SA

A Ré D..., Lda. contestou, impugnando por desconhecimento o alegado na petição e defendendo a sua não responsabilização pelo sinistro. Suscitou o incidente de intervenção acessória da E..., Companhia de Seguros SA.

Foi admitida a intervenção principal provocada da Companhia de Seguros E..., SA, que contestou.

Em 20. 02.2017 realizou-se a audiência prévia, no final da qual a A requereu “a realização de uma peritagem, antes da prolação de despacho saneador, em consonância com os princípios da agilização e adequação do processo consagrados nos arts. 6º, nº1 e 547º, do CPC requerendo para esse efeito, que lhe fosse concedido o prazo de 15 dias para vir aos autos indicar o objecto da perícia, bem assim entidade que realizará a mesma.”

As RR e Interveniente declararam nada ter a opor.
De seguida, foi proferido o seguinte despacho: “Face aos motivos ponderosos invocados pelo Autor e a concordância das restantes partes, e em consonância com os princípios da agilização e adequação do processo consagrados nos arts. 6º, nº1 e 547º, do CPC, defere-se a requerida realização imediata da peritagem antes da prolação do saneador, concedendo-se à Autora o requerido prazo de 15 dias para os efeitos pretendidos.”

A A nada disse no referido prazo.

Em 23.03.2017 foi ordenada a notificação da A. para, no prazo de 10 dias, “indicar o objeto da perícia, bem assim entidade que realizará a mesma, nos termos por si requeridos, em sede de audiência prévia, ou então, informar/requerer o que tiver por conveniente, sob pena dos autos ficarem a aguardar nos termos previstos no art. 281º, nº1, do CPC.”

Perante o silêncio da A, em 10.10.2017, foi proferido o seguinte despacho:
“De uma leitura dos autos, mostra-se claro que decorrido o prazo de 10 dias (ou seja, 06/04/2017) sobre a data da notificação à Autora do despacho sob Refª Citius nº 96712283, de 23/03/2017, e apesar de aí advertida de que os presentes autos ficariam a aguardar nos termos previstos no art. 281º, nº1, do CPC, o certo é que a Autora não impulsionou os presentes autos até à presente data.
Diz o art. 281º, nº1, do CPC, que:
“1-(…)”
Face ao ora exposto, é notório que a presente instância se encontra deserta, por negligência da Autora.
Pelo exposto, decido:
i)Julgar deserta a presente instância.
ii)Custas a suportar pela Autora – cf. art. 527º, nºs 1 e 2, do CPC.”

A Apelou e terminou a sua alegação com as seguintes conclusões que se transcrevem (no essencial):

1. A recorrente não concorda, nem se conforma, com a decisão constante do despacho recorrido que decidiu julgar deserta a instância.
(….)
5. Nos termos da aplicação conjunta do disposto nos artigos 281º/1 e 6º/1, ambos do CPC, a instância só deverá ser considerada deserta quando a paragem do processo seja resultado da omissão de um ato que só ao demandante cabe praticar.
6. O princípio do inquisitório é da responsabilidade do juiz. Só excecionalmente cabe às partes o ónus de impulso processual, ligado ao princípio do dispositivo. E a exigência de necessidade de uma previsão legal que imponha esse ónus (cfr. art. 6º/1 do CPC) existe para afastar a ideia, anteriormente difundida na prática dos tribunais, de que o autor tinha constantemente de impulsionar o desenvolvimento do processo.
7. No presente caso concreto não se verifica uma omissão negligente de qualquer ónus de impulso processual, imputável à A., causadora da paragem do processo por um período de seis meses.
8. No presente caso concreto, por força da lei (art. 6º/1 do CPC), uma vez verificada a ultrapassagem dos prazos para indicar o perito e o objeto da perícia, o Sr. Juiz a quo deveria ter proferido uma decisão a rejeitar a perícia requerida pela A., dando cumprimento ao disposto no art. 475º/1 do CPC, e seguidamente deveria ter proferido o despacho saneador, conforme impõem o art. 591º/1, alínea d) do CPC e o art. 595º do CPC.
9. O esclarecimento solicitado pelo Sr. Juiz, no despacho de 24.03.2017, não corresponde a um ónus de impulso processual, e muito menos a um que seja “especialmente imposto pela lei às partes”, como se ressalva no art. 6º, nº1, do CPC.
10. Designadamente, a A. não tinha que requerer ao Sr. Juiz que rejeitasse a prova pericial, nem tinha que requerer que o Sr. Juiz a quo elaborasse o despacho saneador, uma vez que a prática destes atos é imposta pela lei ao Juiz, não estando dependente do requerimento das partes.
11. No presente caso concreto, não estão verificados os pressupostos legais da declaração de extinção da instância por deserção (art. 281º/1 do CPC), porque a paragem do processo não é imputável à A., uma vez que o Sr. Juiz podia e deveria ter promovido o seu andamento.
12. A decisão recorrida violou o disposto nos artigos 6º/1, 277/c, 281/1, 475/1, 591/1/d, 595/1, todos do Código de Processo Civil.
13. O presente recurso fundamenta-se na lei e na interpretação do art. 281º/1 do CPC que foi sufragada pelo Acórdão da Relação de Lisboa de 27.04.2017 (www.dgsi.pt).
Nestes termos e nos melhores de direito deverá ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida, devendo esta ser substituída por outra que ordene o normal prosseguimento dos presentes autos, designadamente, com a rejeição da prova pericial e com o proferimento do despacho saneador.”

A Ré C..., Lda contra-alegou, pugnando pela improcedência do recurso e pela confirmação da decisão recorrida.

Fundamentação:

A factualidade a atender é a referida no relatório.

A questão a decidir é apenas a de saber se há ou não fundamento para julgar deserta a instância.

Sobre a questão importa ter presente o estipulado nos artigos 285º e 291º do pretérito CPC.
O art. 291º n.º1 (na redação conferida pelo DL n.º 303/2007, de 24.08), estipulava: “Considera-se deserta a instância, independentemente de qualquer decisão judicial, quando esteja interrompida durante dois anos.”
Por outro lado, o artigo 285º do CPC, na redação da reforma de 96, estipulava: “a instância interrompe-se quando o processo estiver parado durante mais de um ano por negligência das partes em promover os seus termos ou os de algum incidente do qual dependa o seu andamento”.

Assim, quanto aos pressupostos da deserção era pacífico que a instância se considerava deserta automaticamente ou ope legis, sem necessidade de qualquer decisão judicial nesse sentido, pelo decurso de dois anos contados do início da interrupção da instância.
Subjacente à deserção da instância tinha necessariamente de existir um anterior despacho a declarar que a instância estava interrompida, pois, a deserção ocorria automaticamente quando a instância estivesse interrompida durante dois anos.
Esse despacho a declarar a interrupção da instância, se bem que com efeitos meramente declarativos, tinha de ser proferido e dele notificado a parte (cuja conduta negligente lhe deu causa) para que pudesse obviar à permanência nessa situação de inércia, evitando que viesse a ser sancionada a sua inatividade com a deserção (cf. neste sentido Acs. do STJ, de 13/05/2003, 17/06/2004, 28/02/2008 e 12/02/2009 - todos em www.dgsi.pt, procs. 03A584, 04B1472, 08B509 e 09A0150, respetivamente).

Entretanto, o novo CPC aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26.06, sobre a deserção da instância passou a estabelecer:
art. 281º
“1- Sem prejuízo do disposto no n.º 5, considera-se deserta a instância quando, por negligência das partes, o processo se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.
2 -(…)
3 – Tendo surgido algum incidente com efeito suspensivo, a instância ou o recurso consideram-se desertos quando, por negligência das partes, o incidente se encontre a aguardar impulso processual há mais de seis meses.
4 – A deserção é julgada no tribunal onde se verifica a falta, por simples despacho do juiz ou do relator.
5- (…)”

No novo Código Processo Civil deixou de existir a figura da interrupção da instância, que, como se referiu, pressupunha a prolação de um despacho a declarar essa interrupção.
Para colmatar essa supressão o novo Código nas ações declarativas passou a exigir a prolação de despacho a declarar a deserção, que antes operava automaticamente decorridos 2 anos após o despacho a declarar interrompida a instância.
Por outro lado, no novo CPC o art. 281º nos seus vários números, mesmo na ação executiva, estabelece que a deserção tem como requisito a negligência das partes.
Assim sendo, a deserção não ocorre automaticamente pelo decurso do prazo de 6 meses, só opera quando resultar do processo que este esteve parado por esse período por culpa da parte, sobre que recai o ónus do impulso processual, em regra, o A.
A deserção da instância declarativa tem, pois, por pressuposto não só o decurso do prazo de seis meses e um dia mas também um juízo sobre a negligência da parte onerada com o impulso processual em promover os termos do processo ou incidente durante tal período.
Em suma, é atualmente entendimento pacífico que o art. 281º do CPCivil exige, para que a instância seja julgada deserta, que exista negligência da parte onerada com o ónus do impulso processual.
Deste modo, no despacho que julga deserta a instância nas ações declarativas, o julgador tem de apreciar se a falta de impulso processual se ficou a dever à negligência da parte, o que pressupõe a existência de um nexo entre a paragem do processo e a não atuação do ónus de impulso processual que recaí sobre a parte.

No caso, antes de ter proferido o despacho a declarar deserta a instância, o Tribunal recorrido ordenou a notificação da A para indicar o objeto da perícia e a entidade que a ia realizar, “sob pena dos autos ficarem a aguardar nos termos previstos no art. 281º, nº1, do CPC.”
No entanto, como decidiu o acórdão desta Relação do Porto, de 26.01 2016, processo 376/13.0T2ILH.P1, relator Fernando Samões, publicado no sítio da CJ e na revista, Tomo I/2016, com o sumário: “II - A existência de negligência das partes na falta de impulso processual deve ser apreciada no despacho que declare a deserção da instância de ação declarativa. III - A mera prolação de despacho prévio a mandar aguardar o impulso processual, em face da falta de uma anunciada transacção, não é bastante para ser julgada deserta a instância.”
O despacho impugnado quanto à apreciação da negligência da A limita-se a fazer referência ao decurso do prazo do art. 281º nº 1 do CPC e à falta de impulso processual.
Ora, a questão essencial, no caso, está em saber se o prosseguimento do processo estava ou não dependente do impulso processual do A.
Importa ter presente, que o art. 6º n.º 1 do CPC, impõe ao juiz “ sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação (…)”.
Como escrevem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre em anotação ao citado artigo, no CPC Anotado, 3ª edição, pág. 22, “O princípio do inquisitório, há muito consagrado no campo da instrução do processo e com enunciação geral no art. 411 (idêntico ao n.º 3 do artigo 265 do C.P.C. de 1961), aponta já para uma conceção do processo civil, diversa da primitiva conceção liberal, em que a investigação da verdade é da responsabilidade do juiz. Mas, para além desse campo, assim como do da discussão de direito (cf. art. 7-2), ao juiz cabe, em geral, a direção formal do processo, nos seus aspetos técnicos e de estrutura interna. Esta direção implica a concessão de poderes tendentes a assegurar a regularidade da instância e o normal andamento do processo, só excecionalmente cabendo às partes o ónus de impulso processual subsequente, ligado ao princípio do dispositivo.”
Assim, como defende a Apelante, estando a natureza do atual processo civil caracterizada por um impulso oficioso do juiz (art.6º n.º 1 do CPC), a partir da propositura da ação cabe ao juiz providenciar pelo andamento do processo. Por conseguinte, apenas quando preceitos especiais impuseram às partes o ónus de impulso subsequente, mediante a prática de determinados atos cuja omissão impeça o prosseguimento da causa, é que há fundamento para lhes ser imputada culpa no não prosseguimento do processo, conducente à deserção da instância.
Ou seja, só perante algum incidente com efeito suspensivo ou ato que tenha obrigatoriamente se ser da iniciativa das partes, designadamente a suspensão da instância por falecimento de uma das partes, é que há fundamento para se julgar deserta a instância por falta de impulso processual.
Nos demais casos, em que a falta de colaboração da parte, não impeça o prosseguimento dos autos, sem prejuízo da parte faltosa ser sancionada, designadamente nos termos do art. 417º n.º1 do CPC, o Tribunal não tem fundamento legal para decretar a deserção da instância por o A nada ter requerido, apesar de notificado com a advertência que os autos ficavam a aguardar nos termos do art. 281º do CPC.
Neste sentido, o acórdão da Relação de Lisboa, de 27.04.2017, processo n.º 239/13.9TBPDL-2, relator Ezaguy Martins, publicado no sítio do ITIJ, decidiu: “I-Com a extinção da figura da interrupção da instância, o requisito da negligência das partes em promover o impulso processual transitou para a deserção, devendo aquela ser verificada, quanto ao processo declarativo e aos recursos, no despacho previsto no art.º 281º, n.º 4, do Código de Processo Civil. II–O artigo 281º, n.º 1, do Código de Processo Civil, não consagra nenhuma presunção de negligência da parte a propósito. III–Do dever de gestão processual decorre que ao juiz cabe, em geral, a direção formal do processo, nos seus aspetos técnicos e de estrutura interna. IV-Essa direção implica a concessão de poderes tendentes a assegurar a regularidade da instância e o normal andamento do processo, só excecionalmente cabendo às partes o ónus de impulso processual subsequente, ligado ao princípio do dispositivo”.
No mesmo sentido, acórdão da Relação de Lisboa, de 16.11.2017, processo n.º 67/12.1TBVFX.L1-2, relator Arlindo Crua, no sitio do ITIJ, com o sumário (na parte relevante): “– no âmbito do dever de gestão processual – cf., artº. 6º, do Cód. de Processo Civil – e do poder de direcção ou condução processual – cf., artº. 7º, do Cód. de Processo Civil -, deve o Juiz adoptar um comportamento processual activo, pugnando pela célere tramitação processual, determinando oficiosamente a prática de actos que impeçam qualquer embaraço processual e adoptando mecanismos que facilitem o desenrolar ágil do iter conducente à obtenção de uma decisão; –donde decorre que o juízo de extinção da instância, por deserção, apenas deverá funcionar nas situações em que as partes, alheando-se da sorte da acção, adoptam uma atitude de desleixo, desinteresse e incúria, não adoptando o comportamento processual a que legalmente estão vinculadas.”

No caso, a A depois de ter requerido prazo para apresentar o objeto da perícia e a entidade que a ia realizar, nada disse nem requereu.
No entanto, a consequência legal para a A não ter apresentado o objeto da perícia no prazo que lhe foi concedido, era como resulta do art. 475º n.º 1 do CPC, a rejeição da perícia.
Por outro lado, se o Tribunal entendia ser imprescindível para a descoberta da verdade a realização da perícia, ordenava-a oficiosamente nos termos dos art. 411º, 467º n.º 1 e 477º do CPC.
Assim, do referido dever de gestão processual e especificamente dos citados arts. 475º n.º 1 e 467º n.º e 477º, é inquestionável que o Sr. Juiz a quo tinha os necessários poderes para assegurar o andamento do processo, sem necessitar do impulso da A.
Apesar do comportamento da A não se pautar pelo rigoroso cumprimento do dever de colaboração, não havia fundamento legal para o Tribunal não prosseguir o andamento do processo e ordenar que o processo ficasse a aguardar o impulso processual do A e depois de decorrido o prazo de 6 meses decretar a deserção da instância.

Tem, pois, razão a Apelante quando defende que no caso concreto, não estão verificados os pressupostos legais da declaração de extinção da instância por deserção, previstos no art. 281º n.º1 do CPC, porque a paragem do processo não lhe é imputável, dado que o Sr. Juiz a quo podia e devia ter promovido o seu andamento.

Decisão

Julga-se procedente a apelação e revoga-se o despacho recorrido, que declarou deserta a instância, ordenando-se o prosseguimento da ação.
Custas pela Apelada C..., Lda

Porto, 21.02.2018
Leonel Serôdio
Amaral Ferreira
Deolinda Varão