Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0434423
Nº Convencional: JTRP00037214
Relator: FERNANDO BAPTISTA
Descritores: SENTENÇA ESTRANGEIRA
DECLARAÇÃO
EXEQUIBILIDADE
Nº do Documento: RP200409300434423
Data do Acordão: 09/30/2004
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO.
Decisão: CONFIRMADA A SENTENÇA.
Área Temática: .
Sumário: I- Estando em causa a mera declaração de exequibilidade da sentença dum Tribunal dum Estado-Membro, ao abrigo do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22 de Dezembro de 2000, não cabe no âmbito do recurso tomar conhecimento, designadamente, de eventuais débitos ou créditos das partes, sendo em sede de execução da sentença que se pode, por via de oposição à execução, suscitar o que por bem se entenda, designadamente a invocação dos motivos de impugnação previstos no artigo 813 do Código de Processo Civil.
II- A vontade do juiz nacional quanto ao fundo da matéria, não pode ser substituída pela vontade do juiz estrangeiro, já que a confiança recíproca entre as jurisdições dos Estados-Membros é a pedra angular que justifica a livre circulação das decisões judiciais, no espaço de liberdade, de segurança e de justiça, como se tratasse de um único território estadual, ou espaço judiciário único
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto

I. RELATÓRIO:
No ....º Juízo Cível, ....ª Secção, da Comarca do Porto, veio A....................S.A., sociedade comercial com sede em ......., ............, ...../...., Itália, ao abrigo do disposto no Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22.12.2000, requerer contra
B............................ & FILHOS, LDA, e C....................., melhor identificados na petição inicial,
a DECLARAÇÃO DE EXEQUIBILIDADE da sentença proferida em 7.05.2003, pelo Tribunal de Prado, em Itália, que condenou os requeridos a pagar à requerente as quantias na sentença descriminadas, sentença essa de que as partes foram devidamente notificadas.
Junta certidão daquela decisão condenatória e respectiva tradução, bem assim procuração forense.

Conclusos os autos, foi proferida a sentença de fls. 24 a 25, com a rectificação de fls. 30 a 31, pela qual foi decidido declarar que a sentença do aludido Tribunal de Itália “possui força executiva na Ordem jurídica Portuguesa, nos precisos termos dela constantes”.

Inconformados com o sentenciado, vieram os requeridos interpor recurso, de apelação, apresentando alegações que terminam com as seguintes

“CONCLUSÕES:
A) - A recorrente "B................. & Filhos, Limitada" é uma pessoa colectiva com personalidade jurídica própria, nada tendo a ver com a sociedade denominada "D........................, Lda", que não conhece.
B) - Se o que efectivamente a recorrida pretendia era a condenação da recorrente, e considera que esta não foi correctamente identificada na sentença cujo reconhecimento nestes autos veio pedir, (vd. Artº 2º do seu requerimento inicial), deveria ter promovido no tempo e lugar próprios a rectificação do erro ou lapso de escrita que ela mesma diz que existe, e que, de forma alguma, não é a qualquer título imputável à recorrente.
C) - Conceder força executiva à decisão que não foi proferida contra a recorrente é contrário à ordem pública e ao ordenamento jurídico portuguesa
D) - Em Portugal não é admissível a condenação em processo civil de uma pessoa, singular ou colectiva, por analogia ou semelhança de nomes.
E) - O que face, ao disposto no nº 1 do artigo 34º do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho de 22/12/2000 é fundamento bastante para que a decisão do Tribunal de Prato, Itália, não seja reconhecida quanto à aqui recorrente B.......................... & Filhos, Limitada.
F) - Ao pedir o reconhecimento da decisão sem manifestar o valor real, e actual, do seu crédito, a recorrida deduz pretensão que bem sabe ser infundada.
G) - Prevalecendo-se de uma dada situação processual, já desactualizada, como se fosse a vigente, em detrimento da realidade actual por si consabida, a recorrida age frontalmente contra a proibição do abuso de direito,
H) - e faz um uso censurável do meio processual de que lançou mão, litigando com manifesta má-fé.
1) - O abuso de direito e a litigância de má-fé são claramente contrários à ordem pública portuguesa.
K) - O que, também é fundamento bastante para que a decisão do Tribunal de Prato, Itália, não seja reconhecida face ao disposto no nº 1 do artigo 34º do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho de 22/12/2000.

Termos em que, e nos mais de direito que doutamente serão supridos, deverá o presente recurso ter provimento, e, em consequência, substituir-se a decisão do Mmo Juiz a quo, por outra que nega o reconhecimento da sentença do Tribunal de Prato, Itália, como é de inteira
J U S T IÇA.

A apelada contra-alegou, pugnando negação de provimento ao recurso.

Foram colhidos os vistos.
Cumpre apreciar e decidir.

II. FUNDAMENTAÇÃO

II. 1. AS QUESTÕES:
Tendo presente que:
- O objecto dos recursos é balizado pelas conclusões das alegações dos recorrentes, não podendo este Tribunal conhecer de matérias não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (arts. 684º, nº3 e 690º, nºs 1 e 3, do C. P. Civil);
- Nos recursos se apreciam questões e não razões;
- Os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido,

as questões suscitadas pelos apelantes reconduzem-se a saber se havia razões para ser negado o reconhecimento da sentença do Tribunal de Prado, Itália, conferindo-lhe força executiva.

II. 2. FACTOS PROVADOS:
Os supra relatados, sem prejuízo de um ou outra referência factual que se venha a entender ter alguma relevância para apreciação de mérito do recurso.

III. O DIREITO:

Com o Regulamento (CE) nº 44/2001, do Conselho, de 22.12.2000, relativo à competência judiciária, ao reconhecimento e à execução de decisões, em matéria civil e comercial (publicado no J.O.C. , nº L 12, de 16.01.2001), criou-se um instrumento normativo de direito comunitário que permitiu a unificação, no âmbito da sua aplicação, das normas de conflito de jurisdição em matéria civil e comercial, bem assim a simplificação das formalidades com vista ao reconhecimento e execução, rápidos e simples, das decisões proferidas sobre essas matérias.

Em causa, no caso sub judice, está a exequibilidade de uma sentença proferida por um Estado-Membro - um “decisão” desse tribunal, na noção que nos é fornecida pelo artº 32º do Reg.

Distingue a lei o reconhecimento da exequibilidade da “decisão”.
Assim, no que tange ao reconhecimento da “decisão”, dispõe o artº 33º, do mesmo Reg. nº 44/2001 do Conselho de 22 de Dezembro de 2000, que "As decisões proferidas num Estado-Membro são reconhecidas nos outros Estados-Membros, sem necessidade de recurso a qualquer processo".
Trata-se de um preceito que parte do princípio da confiança mútua entre jurisdições dos Estados-Membros, possibilitando a livre circulação das decisões judiciais-- a chamada 5ª liberdade (as outras são as liberdades económicas dos Tratados: circulação das mercadorias, dos trabalhadores, dos serviços e dos capitais).
Nesta sede, cremos ser, em primeira linha, relevante salientar os considerandos 16º e 17º do mesmo regulamento, do seguinte teor:
«A confiança recíproca na administração da justiça no seio da Comunidade justifica que as decisões judiciais proferidas num Estado-Membro sejam automaticamente reconhecidas, sem necessidade de recorrer a qualquer procedimento, excepto em caso de impugnação».
«A mesma confiança recíproca implica a eficácia e a rapidez do processo para tornar executória num Estado-Membro uma decisão proferida noutro Estado-Membro. Para este fim, a declaração de executoriedade de uma decisão deve ser dada de forma quase automática, após um simples controlo formal dos documentos fornecidos, sem a possibilidade de o tribunal invocar por sua iniciativa qualquer dos fundamentos previstos pelo presente regulamento para uma decisão não ser executada» --sublinhado nosso.
Aceitou-se, assim, um sistema de inversão do contencioso, para possibilitar a celeridade de circulação do título - em estudo está, como se sabe, a instauração do chamado título executivo europeu.

Já no que tange à exequibilidade da decisão (in casu, da sentença do tribunal Italiano), rege o artº 38º do mesmo Regulamento44/2001, nos seguinte termos:
“1. As decisões proferidas num Estado-Membro e que nesse Estado tenham força executiva podem ser executadas noutro Estado-Membro depois de nele terem sido declaradas executórias, a requerimento de qualquer parte interessada.
2. [............................]”.
É tal executoriedade que, como vimos, se pretende no processo em apreciação: reconhecer a exequibilidade da sentença proferida em 7.5.2003 pelo Tribunal de Prado, Itália, com certidão junta aos autos.

Quanto à competência territorial, não há dúvida que pertence ao tribunal cível do Porto, atento o facto de aí serem domiciliadas as partes contra as quais a execução vem promovida (artº 39º, Reg.).

Por outro lado, o artº 41º do mesmo Reg. dispõe que “A decisão será imediatamente declarada executória quando estiverem cumpridos os trâmites previstos no artº 53º” - isto é, estando junta a cópia da decisão que satisfaça os necessários requisitos de autenticidade, bem assim a “certidão” referida no artº 54º-- documentação que se encontra junta aos autos - “sem verificação dos motivos referidos nos artigos 34º e 35º. [.........]”.

Ora - até porque, como dispõe o nº 2 do mesmo artº 41º, “A parte contra a qual a execução é promovida não pode apresentar observações nesta fase do processo”--, é precisamente na fase de recurso da decisão sobre o pedido de declaração de executoriedade (e só nesta fase)-- recurso esse admissível para o tribunal da Relação, independentemente do valor (cfr. artº 43º do Reg. e Anexo III)--, que a parte contra a qual a execução é promovida terá ocasião de alegar motivos de recusa da declaração de execução, previstos nos arts. 34º e 35º, do mesmo Reg.
Assim, “O tribunal onde foi interposto o recurso ao abrigo dos arts. 43º e 44º apenas recusará ou revogará a declaração de executoriedade por um dos motivos especificados nos artigos 34º e 35º...”- artº 45º do Reg.

Elemento a ter sempre em conta é que “As decisões estrangeiras não podem, em caso algum, ser objecto de revisão de mérito” (nº 2 do cit. artº 45º-- também o artº 36º) - o que traduz uma regra estruturante do sistema do regulamento, baseada no reconhecimento da mútua confiança entre as jurisdições dos Estados-Membros; a vontade do juiz nacional quanto ao fundo da matéria, não pode ser substituída pela vontade do juiz estrangeiro. É que a confiança recíproca entre as jurisdições dos Estados-Membros é a pedra angular que justifica a livre circulação das decisões judiciais, no espaço de liberdade, de segurança e de justiça, como se tratasse de um único território estadual, ou espaço judiciário único.

Como dissemos supra, é na fase de recurso da decisão sobre o pedido de declaração de executoriedade que a parte contra a qual a execução é promovida terá ocasião de alegar motivos de recusa da declaração de execução, previstos nos arts. 34º e 35º, do mesmo Reg.
É precisamente o que tentam fazer as apelantes.

Os motivos de recusa estão indicados no artº 45º, nº1, do Reg. e na remissão para as normas nele referidas.
Assim, dispõe aquele artº 45º, nº1 que “O Tribunal onde foi interposto o recurso, ao abrigo dos artsº 43º e 44º, apenas recusará ou revogará a declaração de executoriedade, por um dos motivos especificados nos artigos 34º e 35º-- sublinhado nosso.

Que motivos de recusa da declaração de execução da sentença do Tribunal de Prado, Itália, invocam os apelantes?
Como apodicticamente resulta das conclusões das suas alegações (cfr. C) e I)), limitam-se a invocar a previsão do nº 1 do citado artº 34º: "1. Se o reconhecimento for manifestamente contrário à ordem pública do Estado-Membro requerido.”
Efectivamente, prevê o citado Regulamento, para que não seja conferida a exequibilidade da sentença, entre outros motivos, o caso de tal declaração de exequibiliddae ser manifestamente contrária à ordem pública local - portuguesa, in casu, portanto.
Trata-se de ideia que se foi buscar ao artº 16º da Convenção de Roma relativa à lei aplicável às obrigações contratuais e se repetiu no artº 26º do regulamento nº 1346 (regulamento relativo aos processos de insolvência).

Pergunta-se, então: quando é que se pode dizer que há violação da ordem pública portuguesa?
Antes de mais, é bom dizer-se que parece que ordem pública - para efeitos do aludido normativo-- pode ser de natureza processual (lesão grave do contraditório, da imparcialidade do juiz, falta de fundamentação da decisão), ou natureza material (ordem púbica material - lesão grave de regras de concorrência).
Como quer que seja, é manifesto que, em bom rigor, a noção de ordem pública é muito ampla, sendo definida por Mota Pinto, (Teoria Geral Dir. Civil, 4ª ed., reimpressão, 1980, 434) como “o conjunto dos princípios fundamentais, subjacentes ao sistema jurídico, que o Estado e a sociedade estão substancialmente interessados em que prevaleçam e que têm uma acuidade tão forte que devem prevalecer sobre as convenções privadas”.
Galvão Telles (Dir. das Obrigações, 3ª ed., 34) diz que a ordem pública é representada pelos superiores interesses da comunidade. Já Manuel de Andrade (Teoria Geral da Relação Jurídica, 334,335) diz que, pela dificuldade em definir tal noção, se faz apelo aos interesses fundamentais que o nosso sistema jurídico procura tutelar e aos princípios correspondentes que constituem como que um substrato desse sistema.
Não se pode, porém, esquecer que - como muito bem ensinava Vaz Serra, Bol. M. J., 74, Separata, pág. 127--, é sempre muito difícil definir o conceito de “ordem pública”, uma vez que o mesmo varia com os tempos. Exemplificativamente são as leis que têm por fim garantir a segurança do comércio jurídico e proteger terceiros, bem como as regras fundamentais da organização económica.

Mas será que a sentença proferida pelo Tribunal de Prado, Itália, é contrária à ordem pública e ao ordenamento jurídico portugueses?
Adiantando solução, diremos que não alvejamos que o sejam.

Vejamos os argumentos dos apelantes.
Em primeiro lugar, alegam que “não foi contra si proferida qualquer decisão que em Portugal, [....], possa ser executada”. Isto pelo facto de a sentença italiana condenar, não a sociedade recorrente, mas uma outra entidade com a firma “D..................., Lda”-- que, segundo os apelantes, nada tem a ver com a sociedade apelante que roda sob a firma “B................... & Filhos, Lda”.
Portanto, entendem os apelantes que dar-se força executiva à sentença italiana contra os apelantes, seria aceitar uma condenação por “analogia”, ou “semelhança” de nomes.
Não lhes assista qualquer razão, salvo o devido respeito.

Efectivamente, parece fora de dúvida que, quer do texto da própria sentença italiana, quer da demais documentação junta aos autos e da conduta processual da própria sociedade apelante que os mesmos autos patenteiam, resulta, de forma inequívoca, que a condenada no Tribunal de Prado, Itália, foi precisamente a firma apelada, e não qualquer outra.
Efectivamente, na sentença Italiana vê-se que a apelante vem aí identificada, umas vezes como “D.................. , Lda” (ver fls. 7), outras como “ E........................., Lda” (cfr. ainda fls. 7), outras ainda como “B................... & Filhos, Lda” (fls. 8 e 9)!
Por outro lado, dúvidas não há de que sempre aí se refere tal firma como sendo a que tem a sede na Avenida da ......, nº ......, Porto, Portugal - onde, igualmente, tiveram lugar as notificações do tribunal italiano, designadamente da sentença (por carta registrada com AR --cfr. fls. 10 verso e 10-A), as quais a firma apelante sempre aceitou como válidas, não vindo demonstrado, nem, sequer, alegado que tal firma tivesse por qualquer forma ou em qualquer altura reagido a tais notificações, designadamente negando que a sentença condenatória lhe não dissesse respeito, tudo mostrando, à saciedade, e de forma inequívoca, que a firma apelante sempre soube que os autos italianos lhe diziam respeito.
Por outro lado, ainda, - como bem observa a apelada--, é a própria apelante que, no documento que junta a fls. 80 (sob o nº3), trás aos autos prova inequívoca de que a sentença italiana foi contra si proferida. É que nesse documento, que a própria apelante trás aos autos em abono do por si alegado “plano de pagamento” da quantia em dívida e pagamentos já efectuados, identifica-se como “F........................... & Fos, Lda, Av. da ....... nº ......, ...Porto” - sublinhado nosso.
É patente, assim, que a apelante pretende lançar nítida confusão, ora alegando se identificar como “F................... & fos, Lda”, ora se identificando como “B.................. & Filhos, Lda.”, pelo que é perfeitamente aceitável que, sobretudo para um estrangeiro, se confunda “Fos” com “Flor” - lapso de escrita manifesto para o qual a apelante não foi alheia, antes pelo contrário.
Não temos, assim, quaisquer dúvidas em afirmar que nada indicia que a firma condenada não foi a ora apelante, bem assim que os apelantes não estivessem sempre convencidos de que os autos italianos a eles, e só a eles, respeitavam.
Pelo que não se vislumbra a mais pequena razão para se afirmar que, a dar-se força executiva à sentença estrangeira, se está a aceitar uma condenação por analogia ou semelhança, como pretendem os apelantes.

Em segundo lugar, não alvejamos onde esteja a requerente/apelada a abusar de direito ou a litigar de má fé com a instauração do presente processo, ao não indicar na petição inicial o valor actual do seu crédito por falta de consideração dos pagamentos eventualmente já feitos pela apelante na sequência de um plano de pagamento que terá existido entre as partes litigantes sobre a quantia em dívida.
Efectivamente, independentemente da existência de tal plano de pagamento - e, já agora, do valor dos documentos juntos, sendo mesmo de realçar que o nº 1 parece até violar o segredo profissional de advogado, o que não permite fazer prova em juízo (cfr. artº 81º do Estatuto da Ordem dos Advogados, em especial o seu nº 5) --, parecem esquecer os apelantes que o que está em causa nestes autos é a mera declaração de exequibilidade à sentença italiana, e nada mais. Pelo que não cabe no âmbito deste Tribunal da Relação, designadamente, tomar conhecimento de eventuais débitos ou créditos das partes, sendo em sede de execução da sentença que podem os ora apelantes, por via de oposição à execução, suscitar o que bem entenderem, designadamente invocando os motivos de impugnação previstos no artº 813º do CPC.
Lembra-se aos apelantes todo o supra explanado, designadamente que “As decisões estrangeiras não podem, em caso algum, ser objecto de revisão de mérito” (nº 2 do artº 45º do Regulamento 44/2001 em referência nestes autos).

Da mesma forma, não alvejamos onde esteja a requerente/apelada a litigar de má fé.
Efectivamente, a apelada limita-se a fazer valer os seus direitos, na leitura que faz do dito Regulamento44/2001 - leitura, aliás, que se nos afigura correcta.
Aliás tal como, sobre outra questão, se escreveu no Ac. do STJ, de 27.02.2003, in Cadernos de Direito Privado, nº3, pág. 55, sempre seríamos levados a concluir que nunca procederia esta pretensão dos apelantes, “sob pena de se coarctar o legítimo direito de as partes discutirem e interpretarem livremente os factos e o regime jurídico que os enquadram , por mais minoritárias (em termos) jurisprudenciais ou pouco consistentes que se apresentem as teses defendidas”.

Em suma, não vemos razão para não confirmar a decisão recorrida, não só porque a declaração de exequibilidade à sentença do Tribunal de Prado, Itália, não é contrária à ordem pública do Estado-Membro (Portugal) requerido - repete-se, único fundamento da apelação vertido na conclusões das alegações (cfr. als. C) e I))--, como porque se não verifica qualquer dos demais motivos especificados nos arts. 34º e 35º para a recusa ou revogação de tal executoriedade.

CONCLUINDO:
Estando em causa a mera declaração de exequibilidade da sentença dum Tribunal dum Estado-Membro, ao abrigo do Regulamento (CE) nº 44/2001 do Conselho, de 22.12.2000, não cabe no âmbito do recurso tomar conhecimento, designadamente, de eventuais débitos ou créditos das partes, sendo em sede de execução da sentença que se pode, por via de oposição à execução, suscitar o que por bem se entenda, designadamente a invocação dos motivos de impugnação previstos no artº 813º do CPC.
A vontade do juiz nacional quanto ao fundo da matéria, não pode ser substituída pela vontade do juiz estrangeiro, já que a confiança recíproca entre as jurisdições dos Estados-Membros é a pedra angular que justifica a livre circulação das decisões judiciais, no espaço de liberdade, de segurança e de justiça, como se tratasse de um único território estadual, ou espaço judiciário único

IV. DECISÃO:

Termos em que acordam os Juizes da Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto em julgar improcedente a apelação, confirmando a decisão recorrida.

Custas pelos apelantes.

Porto, 30 de Setembro de 2004
Fernando Baptista Oliveira
António Domingos Ribeiro Coelho da Rocha
Estevão Vaz Saleiro de Abreu