Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
0445672
Nº Convencional: JTRP00037573
Relator: COELHO VIEIRA
Descritores: REINCIDÊNCIA
LIBERDADE CONDICIONAL
Nº do Documento: RP200501190445672
Data do Acordão: 01/19/2005
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL.
Decisão: PROVIDO.
Área Temática: .
Sumário: Para efeitos de reincidência não conta como cumprimento de pena o período de liberdade condicional.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO

O Ministério Público junto das Varas Criminais do Porto (...... Vara), deduziu acusação, em processo comum perante Tribunal Colectivo contra:
B..................... nascido a ../../56, natural de Miragaia-Porto, filho de C............... e de D.................,
e
E......................, nascida a ../../56, natural de Massarelos-Porto, filha de F................. e de G..................,
com actual residência de casal (casados entre si) no Bairro do Cerco do Porto, bloco ..., entrada ....., casa ..... no Porto (após realojamento desde o Bairro S. João de Deus, bloco ........);
estando o co-arguido B............. preso preventivamente á ordem do presente processo.
imputando-lhes co-autoria em crime de tráfico de estupefacientes agravado p. e p. pelos art.s 21 nº 1 e 24 b) e j) do DL 15/93 de 22/1 com referência ás tabelas I-A e I-B do mesmo diploma, o arguido B.............. como reincidente os termos dos art.s 75 e 76 do CP.

O Ministério Público mais acusou H............ de co-autoria do crime referido (com seus pais, ora julgados); dado desconhecer-se o seu paradeiro, só oportunamente será julgado (cf. acta de julg. a fls. 1016 e seg).
Não foram oferecidas contestações nem róis de testemunhas.
Realizou-se audiência de julgamento com observância do legal formalismo. Mantêm-se os pressupostos de validade e regularidade da instância, nada obstando ao conhecimento do mérito da causa.
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Foi elaborado ACÓRDÃO, dele constando o seguinte:

III---DISPOSITIVO

Atento o exposto, acordam os juizes que constituem este Tribunal Colectivo pela parcial procedência da acusação, por assim provada e a consequentes:

A- Absolvição da E................. do crime imputado, por não provada a sua co-autoria.

B- Condenação do B..................... pela autoria de um crime de tráfico de estupefacientes p. e p. pelos art.s 21 do Dl 15/93 de 22/1 com referência ás tabelas I-A e I-B do mesmo diploma, 75 e 76 do CPenal, na pena de 6 (seis) anos e 6 (seis) meses de prisão efectiva.

Vai o arguido B............. obrigado ao pagamento das custas do processo, fixando-se a taxa de justiça em 4 Ucs, de 1/4 de procuradoria (cf. art.s 85 nº 1 a) e 95 do CCJ) e acréscimo de 1% nos termos do art. 13 nº 3 do Dec lei 423/91 de 30/10. --Honorários, se devidos, legais. DN.

Oportunamente, quando já também julgado o arguido H............, será dado destino, conforme acórdãos-conjugados, ás quantias e objectos, substâncias aprendidos nos autos.

--- Comunique ao EP, que o arguido continuará detido; com cópia deste acordão.

--- Oportuna vista ao M. Público.
--- Oportuno boletim á DSIC.
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Inconformado com o decidido, o arguido B................. veio interpor recurso, o qual motivou, aduzindo as seguintes CONCLUSÕES:

I –
A - Entende o Recorrente não lhe poder ser atribuído o casaco de pele apreendido na busca domiciliária de 26 de Setembro de 2002, uma vez que não se fez prova em audiência de julgamento de que este fosse sua pertença. De facto, dos testemunhos recolhidos apenas se conclui que alguns destes envolvidos nas buscas domiciliárias, declararam presumir que o casaco fosse do Recorrente; outros, como o agente I................. declararam não poder afirmar a quem pertencia efectivamente o casaco.
E não o poderiam afirmar de todo; o Recorrente encontrava-se na sala na companhia do seu filho, o casaco encontrava-se pendurado nas costas de uma cadeira, nessa mesma sala encontravam-se várias pessoas dentro da casa, pelo que o casaco podia ser pertença de qualquer pessoa que habitava naquela casa.
Inclusivamente, afirma a testemunha J................ que o casaco, bem como as doses de droga nele guardadas, eram sua pertença. Ora nada aponta para que possamos dizer claramente que o casaco era pertença do Recorrente, a suposição de alguns agentes da PSP não é prova suficiente para considerar que o casaco era pertença do Recorrente. Perante tamanha dúvida suscitada, nunca poderia o casaco e a droga nele contida ter sido atribuída ao Recorrente.
Estamos perante uma violação crassa do princípio do “In dubio pro reo” que não pode ser admitida na nossa ordem jurídica.

B - Também nunca poderia ser dado como provado que às substâncias estupefacientes encontradas em casa do Recorrente iriam ser acrescentadas outras substâncias destinadas a aumentar as quantidades e, em consequência, os lucros, uma vez que em casa do Recorrente nunca foram encontradas as tais substâncias destinadas a aumentar as quantidades.
Tais substâncias foram apreendidas em casa do L............, mas tal como ficou provado nos autos, não havia qualquer relação estabelecida entre o Recorrente e o L..........., no que concerne à actividade de tráfico.
Uma qualquer confusão deve ter sido feita, se não foram encontradas em casa do Recorrente tais substâncias, como é que se dá como provado que estas iam ser utilizadas para aumentar as quantidades a vender?
Aliás, todo o estupefaciente encontrado em casa do Recorrente já estava preparado, para venda, em doses. Não se entende portanto, como é que se dá como provado que tais substâncias iam ser utilizadas para aumentar as quantidades para venda e, consequentemente, os lucros.

C - Também não se encontra fundamentação para se ter dado como provado que as quantidades apreendidas em dinheiro eram resultado da actividade de venda de estupefacientes.
Tal como é dado como provado, a filha do Recorrente fazia pequenos trabalhos domésticos, como lavar e passar roupa para fora.
Bem como o próprio Recorrente tinha uma pequena empresa de pintura, tal como indiciam os materiais de trabalho apreendidos.
As quantias em dinheiro eram pequenas, é perfeitamente viável que fossem resultantes dos biscates que iam sendo feitos pelos elementos do agregado familiar. Falamos de 260,92 euros na primeira busca e de 405,00, na segunda.
Não são, de todo, montantes avultados.
Ainda menos se entende que se dê como provado que o dinheiro era resultante da actividade de tráfico, quando se dá como provado que todos os restantes objectos apreendidos, inclusive carros, um televisor Sony, ouro, não foram adquiridos com dinheiro resultante da actividade de tráfico.
Não se encontra fundamentação para que tal se dê como provado.
Desta forma, estamos perante a violação do art. 374º nº 2, do CPP.

II -
Entende o Recorrente, atendendo aos factos e circunstancialismo apurados em sede de audiência de julgamento que a qualificação jurídica dos mesmos se deveria enquadrar na previsão do art. 25º do DL n.º 15/93, de 22/01, estabelecido que foi este normativo como “válvulas de segurança” do sistema, em vista a acautelar que situações efectivas de menor gravidade: não sejam tratadas com penas desproporcionadas, privilegiando o tipo dela do art. 21º, quando a ilicitude do facto é consideravelmente diminuída.
Considerada a globalidade da actuação dolosa apurada e olhando à personalidade do arguido que resulta da ponderação do conjunto de factos provados, entende o Recorrente que se pode concluir no sentido de que a ilicitude do facto, para efeito de integração da conduta no tráfico de menor gravidade, está consideravelmente diminuida.
No caso “sub judice”, dos factos apurados resulta, atendendo às pequenas quantidades dos produtos apreendidos, ao tempo de provada actividade, ao modo provado de actuação, a actividade de venda era irregular, os lucros diminutos, a existência de outra actividade profissional; tudo demonstra que o Recorrente não fazia da actividade de venda de estupefaciente o seu modo de vida e que estamos perante um pequeno traficante.
Assim pelo motivos expostos, deve a conduta do Recorrente ser subsumida ao art. 25º do DL 15/93, por que o mesmo deve ser condenado.

III -
Entende a defesa terem sido mal avaliados os pressupostos que levariam à aplicação dos arts. 75º e 76º, do CP e que levaram à condenação do Recorrente, como reincidente.
Parecem-nos mal avaliados em dois aspectos:

A) Ao contrário do que vem expresso no douto Acórdão, o Recorrente não deixou de cumprir a pena privativa de liberdade a 10 de Outubro de 1998, mas sim em data incerta do ano de 1995, uma vez que este saiu em liberdade condicional. Dado que o art. 75º n.º 2, “in fine” é claro ao preceituar que não é tido em conta o período em que o agente se encontra a cumprir pena privativa de liberdade, e só pena privativa de liberdade; a data a ter em conta para o cálculo da possível reincidência terá que ser o ano de 1995, uma vez que foi nesse ano que o Recorrente deixou de cumprir uma pena privativa de liberdade.
B) Ainda que assim não se entendesse, nunca poderia, como se referiu, o casaco de pele contendo 379 doses, ter sido atribuído ao recorrente. Não podendo tal ilícito ser-lhe imputado, a prática do 1º crime seria datado de 26 de Setembro de 2002, mas sim, de 30 Abril de 2003. Assim, ainda que tivéssemos em conta o dia 10 de Outubro de 1998, os 5 anos já teriam sido cumpridos.

É ainda referido pela Mertª Juiz que não houve da parte do Recorrente a tentativa de mudar de estilo de vida, ainda que tivesse as condições para tal.
O Recorrente tinha o seu trabalho, tinha outro modo de vida. Os baixos lucros retirados da actividade de tráfico demonstram que nunca poderia o Recorrente viver exclusivamente do tráfico de estupefacientes.

IV -
Entende a defesa que, apesar das elevadas exigências de prevenção, particularmente ao nível da prevenção geral de integração, o quantum da pena aplicada é desajustado e viola os critérios do art. 71º do CP, devendo ser-lhe reduzida a pena, próxima do mínimo legal, por se afigurar mais justa e face às condições pessoais e personalidade do arguido.
Estas constituem circunstâncias que devem ser valoradas como atenuantes das respectivas condutas, já que revelam alguma sensibilidade positiva à pena a aplicar, com reflexo favorável no juízo de prognose sobre a probabilidade da sua integração social, até porque conta com apoio familiar, conforme consta do seu relatório social, sem que com esta redução dique descurada a necessidade de prevenção geral de integração, assegurando as finalidades essenciais, punitivas e ressocializadoras da pena.
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Recebido o recurso, a ele veio responder, na 1ª instância, o Digno Magistrado do MP, pugnado, em suma, pela rejeição do recurso à matéria de facto, por falta de cumprimento dos ónus atinentes ao recurso em matéria de facto (ns. 3 e 4, do art. 412º, do CPP), bem como pela improcedência do recurso quanto à matéria de direito.

Nesta Relação, o Ilustre Procurador-Geral Adjunto entende ser deficiente o cumprimentos daqueles ónus, quanto à matéria de facto, passíveis de aperfeiçoamento.
No que concerne à matéria de direito, defende que o recurso apenas deverá proceder, ... “quanto à não verificação da reincidência, devendo, por força disso, reduzir-se a pena imposta...”.

Cumprido que se mostra o disposto no art. 417º n.º 2, do CPP verifica-se que não foi deduzida qualquer resposta.
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COLHIDOS OS VISTOS LEGAIS, CUMPRE DECIDIR

Do Acórdão recorrido consta a seguinte:

II---FUNDAMENTAÇÃO

DOS FACTOS PROVADOS

--- Considerando os factos constantes da acusação, apenas fixam provados, os seguintes, esclarecidos que foram em audiência de julgamento:

I--- No dia 26 de Setembro de 2002, pelas 7 horas, na então residência dos arguidos no bloco ....., casa ......, do Bairro S. João de Deus, em busca domiciliária, foram apreendidos:
--- um casaco em pele, de cor preta, que estava na sala, junto do B............, que se preparava para o vestir e sair de casa;
-- dois sacos plásticos, que estavam no bolso esquerdo do referido casaco, contendo, para venda:
- 150 embalagens de plástico contendo um produto em pó com o peso bruto de 36,050 g e líquido de 18,925 g, laboratorialmente identificado como heroína;
- 229 embalagens de plástico contendo um produto sólido com o peso bruto de 29,880 g e liquido de 11,255 g, laboratorialmente como cocaína;
--- um tacho de metal com resíduos de cocaína;
-- um moinho da marca “Vata”, com resíduos de heroína;
--- a quantia de 150,00 EUR em notas, dentro de uma caixa de madeira;
--- a quantia de 110,92 EUR em notas e moedas que se encontrava dentro de
um avental;
--- vários sacos plásticos;
-- objectos, com ouro, relacionados a fls. 250 e 252 dos autos, sendo: - anéis de homem
um com pedra branca no valor de 40,50 Eur; um de duas cores com pedra branca no valor de 55,40 Eur; um com pedra vermelha no valor de 41,25 Eur; outro também com pedra vermelha no valor de 42,75 Eur; outro com pedra azul no valor de 31,80 Eur; um com o símbolo SLF no valor de 25,356 Eur; outro com a gravação PJ no valor de 43,55 Eur; um amassado com pedra branca no valor de 23,40 Eur,
- anéis de mulher
um com pedra branca no valor de 32,50 Eur; um partido no valor de 11,70 Eur; um com granadas no valor de 6,50 Eur.
- uma aliança com pedras brancas no valor de 14,95 Eur;
- um par de argolas no valor de 5,85 Eur;
- duas argolas desmanadas no valor total de 5,20 Eur;
- uma cruz no valor de 5,25 Eur;
- uma pulseira com corações no valor de 14,95 Eur;
- uma pulseira em ouro 2+1 com duas medalhas e gravações CS Lça Tios e Lemb. Avós”, no valor de 20,15 Eur;
- uma medalha de esmalte Nª Sra da Conceição no valor de 6,00 Eur;
- uma figa no valor de 2,50 Eur;
- uma libra Victória no valor de 70,00 Eur;
--- objectos em prata dourada, sendo um fio 3+1 no valor de 1,50 Eur e um anel com pedras brancas no valor de 0,25 Eur;
--- um crucifixo e um par de brincos de fantasia;
-- um televisor de marca “Sony”, modelo “KXSE”;
-- um carregador metálico próprio para armas de alarme de calibre 8 mm, em razoável estado de conservação;
-- uma faca;
-- uma tesoura;
--- vinhetas médicas, sendo:
- 8 do C. Saúde de Campanha;
- 136 da Dra M..............;
- 28 do C. Saúde de Sta Maria da Feira-Fiães;
- 6 da Dra N.................;
- 8 da Dra O...........;
- 3 do Dr. P.............;
- 16 da Dra. Q................;
- 4 do C. Saúde -Materno- de Sta Maria da Feira;
- 14 do C. Saúde -Planeamento Familiar- de Sta Maria da Feira;
- 19 do C. Saúde -Infantil- de Sta Maria da Feira;
- 14 receitas em branco da Sub-Região de Saúde deAveiro;
- 5 receitas em branco com vinheta da Dra. R..............;
- 5 receitas em branco com vinheta da Dra. O...............;
--- 7 berbequins;
--- 2 aparafusadoras;
--- 2 serras-eléctricas;
--- uma rebarbadeira;
--- um secador;
--- 2 pares de binóculos;
--- 5 máquinas fotográficas;
--- uma mira telescópica, marca “Kassnar” para carabinas de pressão de ar, em bom estado
--- 4 telemóveis, sendo
- um “Nókia-331 0”;
- dois “Motorola- Takbut e V”
- um “Siemens C35”
--- um carregador de telemóvel
--- um relógio;
--- uma caixa de chumbos de calibre 35;
--- uma navalha;
--- uma agenda com uma placa de metal;
--- 2 armas de pressão;
--- uma chave de veículo automóvel de marca Ford;
--- Vários documentos e papéis manuscritos constantes alguns de fls. 73 a 79, 80 e 81, 84 a 87.

II--- Na mesma ocasião, elementos da PSP apreenderam á pessoa do B..............:
--- dois veículos automóveis ligeiros de passageiros, sendo um de marca Ford Focus, com matrícula ..-..-PT e outro de marca Mercedes-190 D, com matrícula ..-..-CC (entretanto já entregues ao Stand S....................... Ldª), a chave do Ford em causa e os vários documentos dos referidos veículos.

III--- Na mesma ocasião, no bloco ....., casa ....., do Bairro S. João de Deus, residência de L.............., em busca domiciliária, foram apreendidos:
--- um saco de plástico acondicionando 28 embalagens de plástico, contendo um produto sólido com o peso bruto de 3,990 gr e liquido de 1,240 gr, laboratorialmente identificado como cocaína;
--- um plástico contendo um produto em pó, com o peso bruto de 74,980 gr, laboratorialmente identificado como bicarbonato de sódio;
-- 36 comprimidos “Nozinan” c/ “Levorneprozina”.
--- 8 comprimidos “metadinol” c/ “Diazepam”.
--- vários plásticos próprios para acondicionar estupefacientes;
--- um moinho;
--- duas espingardas depressão de ar:
--- um telemóvel “Motorola-CD920”
--- a quantia de 54,00 Eur em notas e moedas;
--- vários documentos manuscritos constantes de fls. 91 a 96.

IV--- Na mesma ocasião, na casa ...., do bloco ...., do Bairro S. João de Deus, residência de E..............., em busca domiciliária foram apreendidos:
--- 3 embalagens de plástico contendo um produto em pó, com o peso bruto de 530 mg e líquido de 190 mg, laboratorialmente identificado como heroína;
--- uma balança de precisão, de marca “Tanita”, com resíduos de cocaína, que estava escondida atrás do cilindro na casa de banho;

V--- No dia 30 de Abril de 2003, pelas 8 horas, na rua, junto ao bloco ..... do Bairro S. João de Deus, o B............. segurou na sua mão, uma embalagem de cartão, com um saco de plástico no interior, contendo:
--- 78 embalagens de plástico contendo um produto sólido com o peso bruto de 10,650 gr e liquido de 4,488 gr, laboratorialmente identificado como cocaína.
--- 55 embalagens de plástico contendo um produto em pó com o peso bruto de 11,070 gr e liquido de 4,800 gr, laboratorialmente identificado como heroína.
Ao aperceber-se da chegada de elementos da PSP, lançou a referida embalagem e conteúdo descrito para debaixo das escadas de tal bloco.
Foram-lhe então, ainda apreendidos:
--- no bolso interior esquerdo do blusão, a quantia de 10,00 Eur, composta por duas notas iguais.
--- o veículo Ford com matrícula ..-..-PT e respectiva chave.

VI--- Na mesma ocasião, em busca domiciliária na casa ...., do bloco ...., do Bairro S. João de Deus, então, residência dos arguidos, foram apreendidos:
-- 40 embalagens de plástico contendo um produto sólido com o peso bruto de 4,920 gr e líquido de 1,360 gr, laboratorialmente identificado como cocaína, escondidas sob a roupa lavada no tambor da máquina de lavar roupa, envoltas num canto de jornal,
--- 8 embalagens de plástico contendo um produto em pó com o peso bruto de 1,690 gr e líquido de 410 mg, laboratorialmente identificado como heroína;
--- a quantia de 405,00 Eur em notas;
--- uma cautela de penhor com o nº 86890 da Companhia União de Crédito Popular SA em nome da arguida E.............;
--- um telemóvel de marca “Bosch” com a respectiva bateria;
--- uma folha quadriculada manuscrita com nomes e quantias relativas á actividade de venda de estupefacientes constante de fls. 387.
--- 21 cartuchos metálicos, carregados com carga propulsora, escorva e projéctil metálico-bala, calibre 6,35 mm, de percussão central, próprios para armas de defesa, em bom estado de conservação;
--- objectos, em ouro, relacionados a fls. 460 e seg. sendo:
anéis
- um de criança, com três pedras brancas, no valor de 6,00 Eur;
- um com cinco pedras brancas no valor de 16,80 Eur;
- um com uma pedra branca no valor de 15,00 Eur;
- um com cinco pedras brancas no valor de 7,20 Eur;
- um com várias pedras brancas, faltando uma, no valor de 12,60 Eur;
- um com várias pedras brancas no valor de 10,20 Eur;
- um com três pedras brancas no valor de 22,20 Eur;
- um brinco, tipo nó, no valor de 4,80 Eur;
- um brinco no valor de 4,20 Eur;
- um coração no valor de 1,80 Eur;
- uma pulseira com 6 bolas azuis e de outras cores, sem valor comercial.

VII--- Na mesma ocasião, em busca na casa ..., do bloco .... do referido Bairro, então residência do L..............., em busca domiciliária, foram apreendidos:
--- 8 embalagens de plástico contendo um produto sólido com o peso bruto de 3,680 gr e liquido de 3,030 gr, laboratorialmente identificado como cocaína, que se encontravam na mesinha de cabeceira do quarto
--- 3 sacos plásticos contendo produto em pó com o peso bruto de 126,635 gr e liquido de 261,232 gr, laboratorialmente identificado como bicarbonato de sódio;
--- 2 balanças digitais da marca “Tanita”, com resíduos de heroína e cocaína;
--- três colheres de sopa com resíduos de cocaína;
--- uma faca de cozinha com resíduos de cocaína;
--- um moinho eléctrico com resíduos de heroína;
--- uma escova de dentes com resíduos de heroína;
--- uma caixa plástica com resíduos de cocaína;
--- uma panela com resíduos de cocaína;
--- duas canecas com resíduos de cocaína,
--- vários sacos de plástico;
--- três cantos plásticos próprios para acondicionar estupefaciente;
--- um telemóvel de marca “Samsung” com o Imei nº ......................., e cartão Optimus;
--- duas espingardas de pressão de ar, calibre 4,5 mm, sendo uma da marca “Norica-56” nº H46578 e a outra com a inscrição “Made in Shanghat China”, nº 1676036.
--- um papel manuscrito com nomes e contactos telefónicos a fls. 399;
As substâncias estupefacientes apreendidas na residência do B.............. e á pessoa deste, eram destinadas á venda pelo mesmo, com substâncias destinadas a serem misturadas nas estupefacientes, para aumentar a quantidade destas a transaccionar e consequentemente elevar os lucros a obter.
As quantias em dinheiro assim também apreendidas foram provenientes das vendas de substâncias estupefacientes.
O arguido B............ tinha conhecimento da natureza e características das substâncias que destinava á venda.
Agiu com conhecimento e consciência de que a detenção, transporte, distribuição e venda das substâncias estupefacientes eram proibidos e punidos por Lei.
No processo Comum Colectivo nº ../93 da .... Vara Criminal do Porto, por acórdão de 8 de Julho de 1993, transitado, o B............. foi condenado na pena única de 7 anos e 4 meses de prisão, pela prática, em 10 de Agosto de 1992, de um crime de tráfico de estupefacientes e de um crime de detenção de arma proibida, tendo estado em cumprimento desta pena desde tal dia 10 até 30 de Outubro de 1998.
Apesar de agregado familiar constituído, condições habitacionais propiciadas pela Câmara e capacidade para desenvolver trabalho licito, veio a praticar os factos ora provados pelo que a condenação não constituiu suficiente prevenção ou advertência para o afastar de criminalidade.

--- Mais se fixam provados, factos que apurados em audiência, têm interesse nos autos, a saber:
A arguida E............. cresceu no seio do agregado da avó materna sentindo-se rejeitada pela progenitora e vivenciando carência económica.
Concluiu o 4º ano de escolaridade aos 12 anos de idade, já trabalhando, tendo-se ocupado em fabrica de flores e depois, na venda ambulante de fruta e peixe.
Esteve já presa preventivamente por indiciado tráfico mas acabou absolvida. Realojada desde o Verão de 2003 do Bairro S. João de Deus para o Bairro do Cerco do Porto, tem suficientes condições de habitabilidade.
Dado que um filho casou, o filho H........... está sem paradeiro conhecido, e outro filho e o marido B.............. estão detidos em EP's, tem actualmente em casa apenas, uma filha deficiente e a filha mais nova, que jovem-mãe, levou o respectivo companheiro para casa, cuidando por isso, a arguida, da filha deficiente e do neto a par de trabalhos domésticos para fora como lavar e passar roupa a ferro.
Aufere rendimento de reinserção social.
Goza de boa imagem no seu novo meio.

O arguido B............ provem de família economicamente desfavorecida. Concluiu o 4º ano de escolaridade.
Começou a trabalhar aos 11 anos de idade como servente na construção civil. Casou com a E................ aos 19 anos de idade, tendo ambos cinco filhos (cf. supra).
No EP vem revelando comportamento adequado, sendo elemento estabilizador para filho também detido e com problemas de toxicodependência.
Recebe visitas da mulher E............. e de uma filha.

DOS F ACTOS NÃO-PROVADOS

Não se provou:

--- que o arguido B.............. haja recrutado pessoas que conjunta e concertadamente com ele, sob as suas ordens e instruções, enquanto líder, levassem a cabo as várias tarefas próprias do circuito de tráfico, tais como o transporte, armazenamento, preparação, doseamento, embalagem e venda, objectivo que logrou atingir, tendo assim, celebrado acordos com vários indivíduos, entre os quais os seus familiares - mulher E.............., filho H.............. (já supra identificados) e irmão L................. ---, os quais hajam passado a actuar conjunta e concertadamente entre si, desempenhando as funções atribuídas pelo B........., que também haja conseguido que vários indivíduos aceitassem vender as embalagens de estupefacientes que lhes entregasse, pagando-lhes com doses de estupefacientes, entre os quais T................... Que também haja recrutado indivíduos que tivessem as funções de angariarem consumidores e informarem de possíveis intervenções policiais, também a troco de embalagens de estupefacientes.
--- que assim, actividade de tráfico de substâncias estupefacientes desenvolvida pelos arguidos e pelo mencionado L........., sob a liderança do B............., haja decorrido desde o início do mês de Maio de 2001 até ao dia 30 de Abril de 2003, no referido bairro, onde diariamente se lhes dirigissem inúmeros consumidores, adquirindo-lhes tais substâncias (em média, diariamente, 250 embalagens de heroína e igual número de cocaína), entre os quais, a referida T..................., U......................., V............................ e X....................., competindo-lhes as seguintes funções, ao B.........., a obtenção das substâncias estupefacientes, o seu transporte para a sua residência ou para a do seu irmão L............., a preparação, o doseamento, embalagem e a venda aos consumidores; ao L.........., o armazenamento na sua residência, preparação, doseamento, embalagem e venda aos consumidores das substâncias estupefacientes; ao H........., no período entre 9/7/02 até 30/4/03, a preparação, doseamento, embalagem e venda aos consumidores; á E..............., a preparação, doseamento, embalagem e armazenagem das substâncias estupefacientes.
--- que a referida T............. haja recebido estupefacientes do B.............., para lhos vender, com a contrapartida, entregue por este, de embalagens de produto estupefaciente, para consumo próprio, assim custeando a sua toxicodependência e assim, nomeadamente no dia 15 de Maio de 2001, cerca das 10 h 20 m, na Rua dos ............. no Porto, frente ao bloco ...do Bairro S. João de Deus, a T................. se propusesse vender oito pequenas embalagens de plástico, contendo um produto em pó com o peso bruto de 1,900 g e liquido de 810 mg, laboratorialmente identificado como heroína e a quantia de 915$00 em moeda do Banco de Portugal.
-- que todas as substâncias estupefacientes apreendidas nos autos, todas elas, fossem destinadas á venda pelo arguido B............, pela E............, pelo H.......... e ainda pelo L.........., por forma conjunta e concertada, sob a liderança do B............., desempenhando, cada um deles, papel previamente acordado para o efeito.
--- que a arguida E.............. haja agido de comum acordo, em conjugação de esforços, sob a liderança do B............., com conhecimento da natureza e características das substâncias deste, para venda.
--- que os objectos apreendidos nos autos hajam sido adquiridos com dinheiro proveniente da venda de estupefacientes ou troca por estes e o veículo do B............. utilizado no transporte das substâncias estupefacientes, com pagamento das respectivas prestações, pagas, com dinheiro obtido com a venda dos mesmos.

DA CONVICÇÃO

O Tribunal fez análise crítica dos documentos dos autos, a saber, a fls. 9, 10, 25, 32 a 36, 47 a 52, 62 a 72, 145, 152 a 154, 155 a 159, 210 a 216, 220 a 226, 229 a 248, 279 a 296, 332 a 351, 360, 363 a 367, 371, 372 a 378, 382, 390 e seg. 400 a 405, 495, 496 e 703 a 705; a fls. 1 a 44 do Inq. Nº 4881102.5TDPRT-0103 apenso ainda, 250 a 252, 315, 460 e seg. 481, 583 e 626 (exames); 37 a 40, 41 e seg. 43 e seg. 53, 73 a 116, 183 a 203, 370, 380 e seg. 383 e seg. 387 a 389, 392 e seg. 398 e seg. (revistas, buscas e apreensões) e também dos depoimentos colhidos dos elementos policiais que participaram nas buscas e apreensões assentes, sendo certo que confirmaram os teores dos respectivos autos, subscritos ou testemunhados, revelando lembrança viva dos factos.”...
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PODERES DE COGNIÇÃO E OBJECTO DO RECURSO

No caso em apreço é pacifico que esta Relação tem poderes de cognição de facto e de direito (art. 428º nº 1, do CPP).
Com efeito, mostram-se gravadas magnetofonicamente e transcritas, as declarações, bem como os depoimentos prestados oralmente, em audiência.

Certo é, também que em caso de recurso quanto à matéria de facto, (não vindo requerida renovação da prova), o recorrente tem o ónus de especificar, nos termos do art. 412º nsº 3 e 4, do CPP:
- os pontos de facto considerados incorrectamente julgados;
- as provas que impõem decisão diversa;
- a referência aos suportes técnicos, tendo em vista aquelas especificações.

Não olvidamos, obviamente, a Jurisprudência do Tribunal Constitucional, aliás a propósito citada pelo Ilustre Procurador nesta Relação, v. g., (entre outros e por todos), o Ac. de 31/10/03 - DR II s., de 17/12/03), o qual declarou a inconstitucionalidade do citado preceito, quando interpretada no sentido de que a falta de cumprimento daqueles ónus, nas conclusões da motivação, acarreta a rejeição do recurso, sem que ao Recorrente seja dada a oportunidade de suprir tais faltas.

Entendemos, no entanto que mau grado as conclusões do recurso não primarem, salvo o devido respeito, por exemplares quanto à matéria, entendemos que podemos lançar mão da motivação do recurso para aferir com suficiência, o objecto do mesmo, quanto à matéria de facto.

Com efeito e perspectivando o direito o recurso, como um direito disponível, é suficientemente clara a delimitação daquele objecto, quanto à matéria de facto, ali vindo referida a fundamentação de facto que o Recorrente sindica, as provas que no entender do mesmo, levam a conclusões de facto diversas das decididas, bem como a referência aos suportes técnicos da gravação magnetofónica, cuja transcrição foi ordenada na 1ª instância.

Com efeito, ali defende o Recorrente (sintetizando tal fundamentação nas conclusões) que nenhuma das testemunhas referiu que o casaco apreendido na busca domiciliária, referido na fundamentação de facto, era do recorrente; especifica os testemunhos de I.................... e J................., referenciando os suportes técnicos da gravação; mais defende que se deu erradamente como provado (sobremaneira face à ausência de relações de tráfico entre o recorrente e a testemunha L.........) que às substâncias estupefacientes encontradas em casa do recorrente iam ser acrescentadas outras, destinadas a aumentar as quantidades e os lucros; ainda que os bens e dinheiro apreendidos fossem produto da venda de estupefacientes, melhor se coadunando que tais bens e valores, aliás diminutos, fossem produto do trabalho do recorrente, esta apenas, um pequeno traficante.

A nosso ver resulta claro, fazendo apelo àquela motivação, qual o alcance e sentido da impugnação da matéria de facto feita pelo recorrente.

Importa, pois, dela conhecer, em primeiro lugar.
Vejamos:
Em sede de convicção quanto à fundamentação de facto, exarou-se o seguinte:

“DA CONVICÇÃO

O Tribunal fez análise crítica dos documentos dos autos, a saber, a fls. 9, 10, 25, 32 a 36, 47 a 52, 62 a 72, 145, 152 a 154, 155 a 159, 210 a 216, 220 a 226, 229 a 248, 279 a 296, 332 a 351, 360, 363 a 367, 371, 372 a 378, 382, 390 e seg. 400 a 405, 495, 496 e 703 a 705; a fls. 1 a 44 do Inq. Nº 4881102.5TDPRT-0103 apenso ainda, 250 a 252, 315, 460 e seg. 481, 583 e 626 (exames); 37 a 40, 41 e seg. 43 e seg. 53, 73 a 116, 183 a 203, 370, 380 e seg. 383 e seg. 387 a 389, 392 e seg. 398 e seg. (revistas, buscas e apreensões) e também dos depoimentos colhidos dos elementos policiais que participaram nas buscas e apreensões assentes, sendo certo que confirmaram os teores dos respectivos autos, subscritos ou testemunhados, revelando lembrança viva dos factos.”...
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Embora de forma sucinta (aliás como manda a lei - art. 374º n.º 2, do CPP), decorre que Tribunal Colectivo valorou, de forma global os depoimentos dos elementos policiais que participaram nas buscas e apreensões assentes, confirmando os teores dos respectivos autos, subscritos ou testemunhados, revelando lembrança viva dos factos, em conjugação com os exames, revistas, buscas e apreensões devidamente referenciadas na fundamentação.
É suficientemente explicita a fundamentação da convicção, por conjugação de todos os referenciados meios de prova.

O Recorrente pretende por em crise, a referida matéria de facto por via da relevância que empresta a dois depoimentos que referencia devidamente, para além de fazer apenas vaga, inócua e conclusiva referência a “todas as testemunhas”.

Ora, temos sempre defendido (e é jurisprudência pacífica desta Relação) que o recurso quanto à matéria de facto (fora os casos de renovação de prova a que ora não há lugar) não se destina a um novo julgamento, mas um remédio para os vícios do julgamento em 1ª instância; do que a 2ª instância vai à procura é, não de uma nova convicção, mas de saber se a convicção expressa pela 1ª instância tem suporte razoável, nos meios de prova “sub judice”.

No caso em preço, o Recorrente pretende por em causa a convicção do Tribunal Colectivo “a quo” esgrimindo com uma interpretação e valoração de prova testemunhal que diverge da deste.

Ora, a prova testemunhal é uma prova de livre apreciação, nos termos do disposto no art. 127º, do CPP, isto é, o Tribunal valora tal prova de forma livre, mas sempre fundamentada.
E tal prova foi valorada de forma crítica e em conjugação com os abundantes meios de prova em que o Acórdão bem se fundamenta: os exames, as revistas, as buscas e apreensões, para além dos princípios da imediação e oralidade de que apenas a 1ª instância se encontra enriquecida e que não podem ser sindicados pela relação, por mais fiel que seja a gravação das provas e sua transcrição.
Por outro lado, conjugou-se o conjunto destes meios de prova com as regras da experiência comum, regras cuja utilização não nos oferece censura, v. g., quanto à questão da “imputação” ao recorrente, do casaco em causa, e não, como pretende o recorrente, na análise, apenas parcial e angular das provas, negligenciando a necessária visão global de todas as provas.

Esta argumentação aplica-se mutatis mutandis às questões suscitadas - o acrescento às substâncias estupefacientes de outras substâncias, com vista a aumentar as quantidades e os lucros; ainda que as quantias apreendidas eram produto de venda de estupefacientes.

Em suma lendo a fundamentação de facto, a “convicção”, repassando, sumária, mas atentamente, as transcrições das provas e demais elementos de prova manifestamente relevantes dos autos, documentais e periciais, (buscas, revistas e apreensões corroboradas pelos elementos policiais que às mesmas procederam” revelando lembrança viva dos factos” (sic do Acórdão), afigura-se-nos perfeitamente razoável e plausível o estabelecimento da matéria de facto, tal como foi alcançada na 1ª instância.

Face aos termos em que se delimita o recurso, uma avaliação sumária, se bem que atenta das provas produzidas, conduz à conclusão de que é manifesta a falta de razão do Recorrente.

Fazendo apelo a essas transcrições basta rever, o que referiu quanto à questão da “imputação” do casaco, o depoimento da testemunha, Z................, elemento policial que interveio na busca domiciliária do dia 26/09/02; ao referir que:
O J............ não estava em casa (“de certeza absoluta”); apenas estavam em casa, o recorrente, seu filho H......., a esposa do recorrente e duas filhas do casal; “o casaco era bem da fisionomia do B............ ...”; o B............ estava mesma a sair e tinha ... um casaco que estava pendurado numa cadeira.
Este testemunho tem a aferição parcial de outros elementos policiais arrolados como testemunhas.
Quanto à questão das substâncias destinadas a serem acrescentadas às estupefacientes, basta rever o testemunho constante da transcrição (fls. 113), para “não estranhar a sua prova positiva:
Para além da provada apreensão de tais substâncias em casa do L......... (irmão do recorrente) ali se refere:
Test. Z....................: ...( ...) ...” É assim, o L........... é o irmão do B.............. Inicialmente o B............. vendia, morava no bloco ...., casa ... ... à posteriori, o B............ vai para o bloco .... casa ....e o L.......... fica na casa ...., bloco ... ...”.

A prova negativa da relação de tráfico entre os dois irmãos é irrelevante, para o efeito de se atribuir a detenção, para tráfico, pelo recorrente, daquelas substâncias, tal sendo coadjuvado, credivelmente, pela explicação dada pela testemunha, quanto à mudança de locais de residência do recorrente e seu irmão, também perspectivadas as coisas à luz das regras da experiência normal de vida.

Já quanto ao dinheiro, as provas aludidas no Acórdão, as circunstâncias da sua apreensão (juntamente com as drogas apreendidas “assumidamente embaladas”), aliadas às regras da experiência comum, levam à conclusão que foram produto do tráfico dos referenciados estupefacientes.

Importa, de todo o modo, referir que salvo o devido respeito, pretender sindicar a matéria de facto esgrimindo com provas de simples apreciação, “olvidando” todo o demais acervo probatório que alicerçou o decidido, redunda em manifesta improcedência, não já por razões formais, mas por via de fundamento eminentemente substantivo.

Entendemos assim que o recurso quanto à matéria de facto é manifestamente improcedente, tal como o mesmo o delimita.

No entanto e como adiante se dirá, o Acórdão, em sede de facto, padece de um vício - o da insuficiência da matéria de facto, para a decisão - o qual se suprirá, por os autos fornecerem elementos suficientes para tal.

Como é sabido os vícios da decisão enumerados nas als. a), b) e c), do nº 2, do art. 410º, do CPP (no caso, o da al. a) hão-de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou por apelo às regras da experiência comum e são de conhecimento oficioso - Ac. do STJ n.º 7/95, DR I-A de 28/12/95, em interpretação obrigatória.
Esta questão interpenetra-se com a questão que vem sistematizada pelo recorrente quanto à matéria de direito, em sede da reincidência e será adiante devidamente ponderada e decidida.
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VÍCIO DA DECISÃO e MATÉRIA DE DIREITO

Qualificação Jurídica:

Nesta matéria defende o Recorrente que:

Entende o Recorrente, atendendo aos factos e circunstancialismo apurados em sede de audiência de julgamento que a qualificação jurídica dos mesmos se deveria enquadrar na previsão do art. 25º do DL n.º 15/93, de 22/01, estabelecido que foi este normativo como “válvulas de segurança” do sistema, em vista a acautelar que situações efectivas de menor gravidade não sejam tratadas com penas desproporcionadas, privilegiando o tipo dela do art. 21º, quando a ilicitude do facto é consideravelmente diminuída.
Considerada a globalidade da actuação dolosa apurada e olhando à personalidade do arguido que resulta da ponderação do conjunto de factos provados, entende o Recorrente que se pode concluir no sentido de que a ilicitude do facto, para efeito de integração da conduta no tráfico de menor gravidade, está consideravelmente diminuída.
No caso “sub judice”, dos factos apurados resulta, atendendo às pequenas quantidades dos produtos apreendidos, ao tempo de provada actividade, ao modo provado de actuação, a actividade de venda era irregular, os lucros diminutos, a existência de outra actividade profissional; tudo demonstra que o Recorrente não fazia da actividade de venda de estupefaciente o seu modo de vida e que estamos perante um pequeno traficante.
Assim pelo motivos expostos, deve a conduta do Recorrente ser subsumida ao art. 25º do DL 15/93, por que o mesmo deve ser condenado.

Vejamos:

Do acervo factual PROVADO importa reter os seguintes elementos de facto, relevantes para decidir da questão suscitada se subsunção jurídica dos factos:

- Foram apreendidas ao recorrente as quantidades de 23,725 gramas de heroína e 15,743 gramas de cocaína (peso líquido);
- Os estupefacientes referidos, apreendidos nas duas ocasiões, encontravam-se divididos em 150+55 doses de heroína e em 299+78 doses de cocaína, encontradas num tacho contendo resíduos de cocaína e um moinho, o que indica que o recorrente procedia à divisão de tais doses;
- Os estupefacientes apreendidos a comercializar pelo recorrente, são considerados “drogas duras” sendo notória a danosidade em termos da saúde pública, bem como a sua abstinência como “motor motivador” da prática de outros crimes, designadamente, contra o património e contra as pessoas, ainda que com concomitância patrimonial (maxime, roubo) para aplacar aquela abstinência.
- O período de tempo que medeou entre as duas apreensões (26/09/02 e 30/04/03);
- A anterior condenação do Recorrente, em pena de prisão efectiva, por prática de crime de tráfico de estupefacientes.
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A aplicação da convolação para o crime tipificado no art. 25º, do DL nº 15/93, de 22/01, tendo como referência os elementos típicos do art. 21º do mesmo diploma, pressupõe, sempre que a ilicitude do facto se mostre consideravelmente diminuída, tendo em conta, nomeadamente, os meios utilizados, a modalidade e as circunstâncias da acção, a qualidade ou a quantidade das plantas, substâncias ou preparações.

Ora, do que vem provado importa concluir que o arguido comercializava drogas duras, de forma que se não pode considerar, de modo algum, ocasional, ao que não são alheais as circunstâncias da acção, modos de preparação e embalamento, e também, as circunstâncias temporais, bem como o passado criminal do recorrente, precisamente ligado ao tráfico de drogas.

Tanto basta para afastar a aplicação do invocado preceito legal.

Conclui-se assim, como se alcançou no Acórdão recorrido que o Recorrente praticou o crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/01, com referência às tabelas I-A e I-B, do mesmo diploma legal.
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QUESTÃO DA REINCIDÊNCIA (Perspectivando o aludido vício da decisão)

Nesta Matéria defende o Recorrente que:

Entende a defesa terem sido mal avaliados os pressupostos que levariam à aplicação dos arts. 75º e 76º, do CP e que levaram à condenação do Recorrente, como reincidente.
Parecem-nos mal avaliados em dois aspectos:

A) Ao contrário do que vem expresso no douto Acórdão, o Recorrente não deixou de cumprir a pena privativa de liberdade a 10 de Outubro de 1998, mas sim em data incerta do ano de 1995, uma vez que este saiu em liberdade condicional. Dado que o art. 75º nº 2, “in fine” é claro ao preceituar que não é tido em conta o período em que o agente se encontra a cumprir pena privativa de liberdade, e só pena privativa de liberdade; a data a ter em conta para o cálculo da possível reincidência terá que ser o ano de 1995, uma vez que foi nesse ano que o Recorrente deixou de cumprir uma pena privativa de liberdade.
B) Ainda que assim não se entendesse, nunca poderia, como se referiu, o casaco de pele contendo 379 doses, ter sido atribuído ao recorrente. Não podendo tal ilícito ser-lhe imputado, a prática do 1º crime seria datado de 26 de Setembro de 2002, mas sim, de 30 Abril de 2003. Assim, ainda que tivéssemos em conta o dia 10 de Outubro de 1998, os 5 anos já teriam sido cumpridos.

Vejamos:
Como preceitua o art. 75º do C. Penal, quanto à reincidência e aos seus pressupostos, o seguinte:
“I - É punido como reincidente quem, por si só ou sob qualquer forma de comparticipação, cometer um crime doloso que deva ser punido com prisão efectiva superior a 6 meses, depois de ter sido condenado por sentença transitada em julgado em pena de prisão efectiva superior a 6 meses por outro crime doloso, se, de acordo com as circunstâncias do caso, o agente for de censurar por a condenação ou as condenações anteriores não lhe terem servido de suficiente advertência contra o crime.
2 - O crime anterior por que o agente tenha sido condenado não releva para a reincidência se entre a sua prática e a do crime seguinte tiverem decorrido mais de 5 anos; neste prazo não é computado o tempo durante o qual o agente tenha cumprido medida processual, pema ou medida de segurança privativas de liberdade”.

Para sustentar a não aplicação da reincidência no caso “sub judice”, o Recorrente desdobra a sua argumentação em duas vertentes:

- defende que terminou o cumprimento da pena privativa de liberdade, não no ano de 1998, mas sim no ano de 1995, uma vez que saiu nesse mesmo ano em liberdade condicional;
- defende ainda (já argumentando quanto à matéria de facto) uma vez que a posse do casaco nunca poderia ter sido atribuída ao recorrente, pelas razões já referidas, a data da prática do segundo crime não é de 26/09/02, mas sim 30/04/03, assim já tendo decorrido o prazo de 5 anos.

Como decorre do acima exposto, o argumentado com base na matéria de facto pretendida não provada redunda em manifesta improcedência, uma vez que quanto a tal matéria o recurso mereceu igual sorte; fixada a matéria de facto, (quanto à matéria) não se pode pois, esgrimir com a prática do ilícito apenas em 30/04/03.

Já a primeira de tais argumentações merece mais profunda ponderação.

Lendo as posições tomadas em ambas as instâncias pelos Ilustres Magistrados do MP são diversas e, até, antagónicas as suas posições processuais, defendendo-se na 1ª instância a justeza da reincidência e o contrário nesta Relação, por via de suprimento de insuficiência da matéria de facto, para a decisão (art. 410º n.º 2 al. c), do CPP).

Como acima se referiu, tal decorrendo da letra da lei, naquele prazo de 5 anos não é computado o tempo durante o qual o agente tenha cumprido medida processual, pena ou medida de segurança privativas da liberdade.

Ora, como bem anota o Ilustre Procurador-Geral Adjunto, ... “a razão de ser desta disposição é que estando o agente preso, não pode, em princípio, cometer novos crimes, por isso, esse tempo não deve contar para aquele efeito.
Sendo assim, tal impedimento deixa de acontecer, logo que o agente seja colocado em liberdade condicional.
A partir daquele momento, ainda que a pena só venha a ser declarada extinta posteriormente, ele deixa de estar privado da liberdade”.

É também este o nosso entendimento.

Ora, dos autos consta (fls. 292/294 ) que ao recorrente foi concedida a liberdade condicional em 8/11/95 (decisão que concedeu a liberdade condicional).

O Recorrente veio invocar na 1ª instância ter-lhe sido concedida a liberdade condicional em data imprecisa de 1995, facto que devia ter sido discutido na audiência de julgamento e devidamente valorado de facto; não o tendo sido, como, por omissão se alcança da matéria de facto constante do Acórdão, este enferma do vício da insuficiência da matéria d facto, para a decisão, manifestamente suprível, atento o elemento de facto, comprovado a fls. 293/294, quanto à data da concessão da liberdade condicional.

Assim sendo, adita-se à matéria de facto provada o seguinte:-

Em 81/11/95 foi concedida a liberdade condicional ao recorrente, no PC Col. n.º 45/93, 2ª Vara Criminal, referenciado na matéria de facto provada.

Correspectivamente, deve ser suprimida a matéria de facto integradora da reincidência.

Face ao expendido e de acordo com o entendimento expresso, situando as datas da prática dos factos, no caso, em 26/09/02 e 30/04/03, bem como a data de concessão da liberdade condicional (8/11/95) é de concluir que não se verifica a agravante qualificativa da reincidência.

A medida da pena a aplicar deverá, obviamente, a tal atender.
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MEDIDA DA PENA

Sendo agora líquida a subsunção jurídica dos factos ao disposto no art. 21º nº 1, do DL nº 15/93, de 22/01, segue-se que a moldura pena abstracta aplicável, vai de 4 a 12 anos de prisão.
Como dispõe o art. 71º, n.º 1. do C. Penal, a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos pela lei, é feita em função da culpa do agente e da exigências de prevenção.

Mais estabelece o n.º 2 do preceito que na determinação concreta da pena o tribunal atende a todas as circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuserem a favor ou contra o agente, enumerando tais circunstâncias exemplificativamente.

Ora, para a boa dosimetria da pena a aplicar importa ponderar nas seguintes circunstâncias:
- as exigências de prevenção, atenta a danosidade social do tráfico de estupefacientes;
- o dolo directo (intenso) do recorrente;
- a quantidade de modo algum diminuta e a qualidade dos estupefacientes, “drogas duras” e o sei modo de comercialização.
- o comprovado passado criminal do arguido ligado ao tráfico de estupefacientes, embora sem a relevância da agravante qualificativa das reincidência.

Tudo visto e ponderado, entendemos que a pena justa a aplicar se situa nos 5 anos de prisão.

Nesta matéria, procede, pois, em parte, o recurso do arguido B.................
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Pelo exposto, acordam os juizes desta Relação em:

- Julgar prefigurado o vício da insuficiência da matéria de facto para a decisão, quanto à questão da concessão da liberdade condicional e sua data, mas supri-lo, nos termos acima referidos, com o acima determinado aditamento à matéria de facto dada como provada e supressão da matéria de facto provada, atinente à reincidência;
- No mais, julgar manifestamente improcedente o recurso, quanto à matéria de facto;
- Julgar parcialmente procedente o recurso do arguido quanto à questão da reincidência, a qual não ocorre, revogando, nessa parte, o acórdão recorrido, condenando o recorrente, pela prática do crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21º n.º 1, do DL n.º 15/93, de 22/01, na pena de 5 (cinco) anos de prisão.
- No mais, julgar improcedente o recurso do arguido.
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O Recorrente pagará 5 Ucs de taxa de justiça.
Honorários: Legais

PORTO, 19/01/05
José João Teixeira Coelho Vieira
Maria da Conceição Simão Gomes
Francisco José Brízida Martins
Arlindo Manuel Teixeira Pinto