Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1530/15.5T8PNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FILIPE CAROÇO
Descritores: IMPUGNAÇÃO DE FACTO
CONTRATO DE EMPREITADA
DIVERSOS EMPREITEIROS
Nº do Documento: RP201612151530/15.5T8PNF.P1
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 86, FLS.167-169)
Área Temática: .
Sumário: I - A discordância da decisão em matéria de facto e da decisão em matéria de Direito não justifica a nulidade da sentença.
II - Da não impugnação pelo réu de um documento particular que não lhe é atribuído não se segue a confissão da sua materialidade.
III - Ainda que os réus não provem a autenticidade dos documentos cuja letra, assinatura e respetivo teor tenham sido postos em crise pelo autor, não ficam aqueles impedidos de provar os factos deles constantes por qualquer outro meio de prova que seja legalmente admissível.
IV - Na empreitada, se o dono da obra contrata com um empreiteiro a remoção e a posterior reposição da caixa de transferência de um veículo automóvel e, autonomamente, com um segundo empreiteiro a respetiva desmontagem (desintegração) e reparação, surgindo um defeito de funcionamento daquele órgão depois da intervenção de ambos, demandado apenas o primeiro, só lhe é exigível que ilida a presunção de culpa que sobre ele recai (art.º 799º, nº 1, do Código Civil) depois de o dono da obra provar que o vício se inclui no âmbito do contrato que com ele celebrou. Se assim não fosse, estaria a fazer incidir sobre um dos empreiteiros --- porventura o menos interveniente --- o risco próprio de um negócio que lhe é de todo estranho.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 1530/15.5T8PNF.P1 (apelação)
Comarca do Porto Este – Penafiel – Inst. Local – Secção Cível

Relator Filipe Caroço
Adj. Desemb. Judite Pires
Adj. Desemb. Aristides de Almeida

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I.
B…, divorciado, residente na Rua …, …, fração ., …, Penafiel, instaurou ação declarativa com processo comum contra C… e mulher, D…, residentes na Rua …, .., …, Penafiel, alegando essencialmente que contratou com o Ricardo Gomes, mecânico profissional, a reparação de um veículo automóvel; meses depois da reparação e do respetivo pagamento, notou problemas nos mecanismos intervencionados pelo R.; denunciados tais defeitos, o R., apesar de reconhecer a sua existência e de ter desmontado e enviado a caixa de transferência para a empresa da especialidade, recusou, quanto a tudo o mais, qualquer outra intervenção no veículo no sentido de os reparar, assim fazendo cessar o contrato.
Face a tal recusa, ao A. não restou outra solução que não fosse a de proceder à reparação por terceiro, pois que não podia ficar impossibilitado de se fazer transportar no seu veículo.
Com efeito, gastou na reparação dos defeitos a quantia de € 3.967,72, a que acresce a quantia de € 240,00 pelo transporte do seu veículo de Penafiel até Cascais, onde foi reparado, e regresso, e ainda € 1.500,00 de danos não patrimoniais que substancia em “sentimento de grande tristeza, desconsolo e revolta por ter sido privado de gozar de forma plena do seu veículo, mas também por verificar que o R. sem razão se negava a reparar os defeitos, levando o A. a ter que contratar a empresa “E…” com oficina em Cascais para reparar o que o R. marido era responsável”.
Fez o A. culminar o seu articulado com o seguinte pedido:
«NESTES TERMOS E DEMAIS DE DIREITO APLICÁVEL, DEVE A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE E PROVADA E, EM CONSEQUÊNCIA, SEREM OS RÉUS CONDENADOS A:
A) PAGAR AO A., NOS TERMOS ALEGADOS A QUANTIA DE € 1.500,00 (MIL E QUINHENTOS EUROS) A TÍTULO DE DANOS NÃO PATRIMONIAIS;
B) PAGAR AO A., NOS TERMOS ALEGADOS A QUANTIA DE € 4.207,72 (QUATRO MIL DUZENTOS E SETE EUROS E SETENTA E DOIS CÊNTIMOS), A TÍTULO DE DANO PATRIMONIAL.
C) A PAGAR AO A., O MONTANTE CORRESPONDENTE AOS JUROS DE MORA, À TAXA LEGAL PARA OS JUROS CIVIS A CADA MOMENTO FIXADOS POR LEI, A CONTABILIZAR SOBRE O MONTANTE TOTAL A QUE VENHAM A SER CONDENADOS, A CALCULAR DESDE A DATA DE CITAÇÃO ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO.
D) SEREM CONDENADOS EM CUSTAS, PROCURADORIA E DEMAIS ENCARGOS LEGAIS.» (sic)
Citados, os RR. contestaram a ação impugnando parcialmente os factos alegados na petição inicial. Alegaram que o R. marido não desmontou nem reparou a caixa de direção, a caixa de transferência e o amortecedor central, tendo-se limitado a retirá-los da viatura e a entregar ao A. a caixa de transferência que a enviou para reparar noutra empresa. Posteriormente, o A. entregou ao R. a caixa de transferência que a montou na viatura, sem a abrir ou desmontar, bem como a caixa de velocidades, com a colocação de óleo correto nas mesmas, conforme indicações do A.
Após a reclamação do A., verificou que havia problemas com a caixa de transferência, retirou-a sem a desmontar, a pedido do A. e informou-o de que deveria reclamar junto da empresa que efetuara a sua reparação.
A reclamação do A. respeitou exclusivamente à caixa de transferência e, na verdade, comunicou ao A. que não lhe prestava mais serviços, sendo falso o alegado de que o R. reconhecia as reclamações e de que tivesse efetuado a montagem e desmontagem das peças.
Nunca desmontou a caixa de transferência, caixa de direção e velocidades, nem o amortecedor traseiro. O seu serviço foi apenas de mão-de-obra de retirar a caixa de transferência e de aplicação de óleo lubrificante adequado, tendo cumprido todas as regras de boa conduta mecânica. A eventual avaria da caixa de velocidades não é consequência de qualquer omissão ou serviço defeituoso por ele prestado.
A reparação dos defeitos cabe a quem lhes deu causa, que não foi o R., mas sim terceiros dos quais desconhece a identidade. Por essa razão também não está obrigado a indemnizar o A. pela imobilização do veículo nem pelos alegados danos não patrimoniais que não têm razão de ser e são exagerados, nem ainda pelo custo do transporte para reparação, em Cascais.
Acrescentam os RR. que a R. mulher é parte ilegítima, devendo ser “absolvida do pedido” (sic), devendo ser também julgada não provada e improcedente a ação, com absolvição dos RR. do pedido.
A petição inicial foi aperfeiçoada, a convite do tribunal, tendo o A. exercido o contraditório quanto àquela modificação.
Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, a que se seguiu a definição do objeto do litígio --- “apurar se se verificam os requisitos de responsabilidade civil contratual e se os Réus devem ser condenados a pagar ao Autor o montante indemnizatório que este peticiona pelo cumprimento defeituoso do contrato que alega ter celebrado com o Réu” --- e a fixação dos temas de prova.
Teve depois lugar a audiência final e foi proferida a sentença, que culminou com o seguinte dispositivo, ipsis verbis:
«Em face do exposto, julgo a presente ação improcedente, por não provada, e, em consequência, absolvo os Réus C… e esposa D… dos pedidos contra eles formulados.
Custas do processo a cargo do Autor.»

É desta decisão que recorre o A., tendo produzido alegações com as seguintes CONCLUSÕES:
«A. Ao se decidir como se decidiu, salvo sempre melhor opinião, violou-se o disposto nos art.ºs 342.º, n.º 2, 344.º, n.º 1, 350.º, n.º 1, 363.º, n.º 3, 376.º, 393.º, n.º 2, 487.º, 562.º, 563.º, 564.º, 566.º, 762.º, 768.º, n.º 2, 798.º, 799.º, 801.º, 1207.º, 1208.º, 1220.º, 1223.º, todos do Código Civil (CC), a Lei do Consumidor e a Lei n.º 84/2008, e o disposto nos art.ºs 5.º, 414.º, 448.º, n.º 2, 607.º, n.ºs 3, 4, 5, todos do Código de Processo Civil (CPC).
B. Padecendo a douta sentença, aqui em crise, de nulidade, por força do disposto nas alíneas b), c), e d), todas do n.º 1 do art.º 615.º CPC.
C. É entendimento do aqui Recorrente que, salvo melhor opinião, o douto Tribunal a quo, violou os normativos supra indicados, errou na interpretação e aplicação da lei, bem como errou na apreciação da matéria de facto constante dos autos.
D. Impugna-se a sentença relativamente à decisão de facto, tendo sido incorrectamente julgado o ponto 15) de facto dos Factos Provados.
E. Impugna-se a decisão no que respeita aos pontos 35), 37), 42), 43), 44), 46), 47), 48), 49) e 50) da matéria dada como não provada.
F. De acordo com a análise da prova testemunhal que supra se alegou e indicou com exactidão as passagens que suportam o recurso do aqui A., e de acordo com a prova documental analisada, associado às regras do ónus da prova e às regras da experiência comum, a resposta aos pontos de facto impugnados deverá ser diferente daquela dada pelo Tribunal.
G. Quanto ao facto 15), deveria ser dado como provado «15) Em resposta o Réu marido afirma que terá tudo preparado e emitiu uma factura no valor de € 60,00 pelo trabalho de desmontar as peças, mas erradamente não descrimina todos os trabalhos. (art.º 10.º)».
H. Já no que respeita aos pontos dados como não provados e impugnados.
I. Os mesmos, na sua totalidade, deverão passar a ser julgados como “provados”.
J. Como refere o Tribunal a quo na sentença e o afirma mesma durante a inquirição do Réu marido, o cerne do contrato celebrado entre o A. e o R. marido, em Maio de 2014, foi que este último na prossecução da sua actividade profissional procedesse às reparações relatadas nos autos e a acoplagem de peças no jipe, que o R. aceitou tal incumbência e aceitou mesmo acoplar no jipe peças que o A. ia mandar reparar a um terceiro, e o R. marido aceitou que tais peças (aquelas que foram reparadas num terceiro) fossem por si montadas ou acopladas no jipe prontas a funcionar, assim como, por maioria de razão, as peças que o próprio Réu ia reparar (por exemplo a caixa de direcção).
K. O próprio Tribunal a quo durante o depoimento do Réu considerou ser um facto incontestado tendo mesmo dado por provado que o Réu estava obrigado a desempenhar de forma irrepreensível a sua actividade e montar ou colocar as peças em causa nos autos de forma a poderem funcionar sem qualquer problema e de forma a não se estragar (cfr. facto provado ponto 25) da sentença).
L. Como resulta da nossa alegação, o Tribunal a quo não faz uma análise crítica do depoimento das testemunhas, não diferenciando porque as credibiliza num momento e noutro não. Deixando assim de se pronunciar quanto a matéria que tem de se pronunciar.
M. Importa concluir que na sua fundamentação o Tribunal a quo não indica como chega ao juízo de não provado que consubstancia este 42).
N. Tal falta de pronúncia resulta na nulidade da sentença por falta de fundamentação, e por haver assim uma clara falta de pronúncia sobre matéria que o Tribunal tem de conhecer, a qual desde já se argui nos termos do art.º 615.º al. b) e d) do CPC.
O. Podendo o Tribunal ad quem dar a devida resposta de “provado” a este facto.
P. Por outro lado, quanto ao ponto 43) o Tribunal a quo dá como não provado que o Réu tenha usado o óleo ATF que devia ter usado (ponto 55) dos factos dados por não provados), e que não havia como saber qual o óleo usado porque na própria factura o Réu não colocou o tipo de óleo que usou.
Q. Pelo que ao dar aquele facto como não provado o Tribunal a quo recaí em contradição entre a fundamentação e a decisão.
R. A contradição entre a fundamentação e a decisão é mesmo uma nulidade da sentença, art.º 615.º do CPC, que desde já se argui, devendo e podendo a resposta a este ponto ser alterada pelo Tribunal ad quem de não provado para “provado”.
S. Relativamente ao juízo do Tribunal a quo quanto ao ponto 46), resulta que o Tribunal a quo não faz uma análise crítica da prova que apreciou, limitando-se a fazer conclusões sem expressar qual o raciocínio que efectuou para obter a sua conclusão, o que se mostra ser uma nulidade nos termos do art.º 615.º, al. b) do CPC que desde já se argui.
T. Importa também concluir que quanto ao ponto 49), da forma como foi julgado pelo Tribunal a quo, refere que a viagem seria Penafiel – Cascais e o recibo (doc.º n.º 15) diz Porto, sucede que tal não inviabiliza que o jipe tenha prosseguido viagem para Cascais, como de facto seguiu.
U. Por último, refere o Tribunal a quo que não foi feita prova que o arranjo do jipe não pudesse ser feita numa oficina mais perto da residência, sucede que nenhuma das partes alegou tal facto ou possibilidade pelo que não é facto sujeito a prova, nem estando sequer alegado, pelo que o Tribunal a quo nem pode referir tal facto para fundamentar a sua decisão, o que consubstancia uma nulidade nos termos do art.º 615.º do CPC, violando o art.º 5.º do CPC, uma vez que o Tribunal a quo para fundamentar a sua decisão considerou factos que não podia considerar, nulidade que desde já se argui.
V. Desta forma, o Réu em Maio de 2014 não cumpriu com a sua obrigação de após reparar a peça que se comprometeu a reparar (caixa de direcção) a mesma tenha ficado de facto reparada, pois apresentou defeito em finais de Setembro de 2014 que levou a ter que ser novamente reparada, e falhou com a sua obrigação de montar no jipe as peças que foram reparadas noutro local de forma a que as mesmas funcionassem devidamente (a caixa de transferência) o que levou à avaria desta peça mas também à avaria da caixa de velocidades.
W. Neste sentido além dos documentos já referidos veja-se que o próprio Réu confessa que não sabia que a caixa de direcção tinha um amortecedor no seu interior e que era essa peça que necessitava de arranjo, quanto à caixa de transferência o Réu não conseguiu provar que inseriu o óleo correcto.
X. Perante a presunção legal de culpa, quer por força do art.º 799.º do CC quer por força do regime legal da Lei n.º 84/2008, o Réu ao não ter feito prova do facto que alegou e que incumbia por força das presunções legais que lhe recaíam, é nossa convicção que o Tribunal ad quem tem o necessário para considerar nula a resposta à matéria de facto dada pelo Tribunal a quo e aqui impugnada, por violação do art.º 615.º, als. b) e c) do CPC, e alterar a mesma da forma defendida pelo Autor.
Y. Tendo havido assim uma clara má interpretação e aplicação das normas relativas à prova e à repartição do ónus da prova – art.º 342.º e 344.º do CC.
Z. O Tribunal a quo tomou em consideração documentos que estavam impugnados e cuja falsidade foi alegada e sobre os quais os Réus não pediram prova para demonstrar a veracidade, pelo que assim excedeu o Tribunal a quo o que lhe era permitido conhecer.
AA. Por outro lado, embora seja livre a apreciação do Tribunal no que respeita à prova testemunhal, também é obrigatório que o Tribunal a quo demonstre na sentença qual o seu raciocínio e juízo para credibilizar as testemunhas e os documentos, principalmente, como foi o caso, quando em certas matérias a testemunha relevou credibilidade e noutras não.
BB. O que não fez e consubstancia uma violação ao art.º 607.º, 3, 4, 5 do CPC, sendo uma omissão de pronúncia que leva à nulidade da sentença o que desde já se argui (art.º 615.º, al. d) do CPC).
CC. O art.º 607.º, n.º 4 e 5 do CPC é muito claro e não se basta com a mera indicação do meio de prova, tem de haver na sentença uma clara indicação de quais foram as razões para o julgador afastar determinado meio de prova e porque o valorou perante certas questões e noutras não.
DD. Mais o julgador deve pronunciar-se quanto àqueles factos que estando provados por documento não admitem prova testemunhal contrária – cfr. art.º 363, n.º 3, e 376.º, n.º 2 ambos do CC porque nestes autos os Réus não impugnaram os documentos apresentados pelo Autor – assim como deve pronunciar-se sobre os factos que não podiam ser provados por testemunhas, ou sobre os quais as testemunhas nada disseram – art.ºs 393.º, n.º 2 do CC – e ainda pronunciar-se sobre as presunções que são admitidas – art.ºs 350.º e 351.º do CC.
EE. Houve errada interpretação e aplicação destes normativos, que deviam ser aplicadas nos termos defendidos neste recurso e consubstanciados na nossa defesa da resposta à matéria de facto.
FF. Assim, se a prova obtida e as respostas dadas à matéria de direito e as respostas dadas à matéria de facto violarem a regra imposta pelo art.º 607.º, n.ºs 3, 4 e 5 do CPC, tem de se considerar que o Tribunal a quo não se pronunciou sobre questão que tem de conhecer, o que importa a nulidade da sentença como já supra se arguiu, sem prejuízo de se considerar que a sentença não está devidamente fundamentada e como tal a resposta à matéria de facto deve ser reapreciada, nomeadamente pelo Tribunal ad quem.
GG. O que no caso dos presentes autos acontece, como atrás se deixa evidenciado.
HH. Na verdade, ao contrário do que Tribunal a quo decidiu na sua sentença, não cabe ao Autor requerer prova para mostrar a falsidade de documentos (veja-se pág. 2 da sentença quando o Tribunal a quo se refere à resposta apresentada pelo Autor), cabe precisamente aos Réus requerer prova para mostrar a veracidade dos documentos que juntam (art.º 448.º do CPC).
II. Foi assim mal interpretado e aplicado este art.º 448.º do CPC pelo Tribunal a quo, e devia ter sido aplicado como supra se defende.
JJ. Mais ainda há nulidade da decisão pois o Tribunal a quo, ao arrepio do constante no n.º 2 do art.º 448.º do CPC, tomou conhecimento de matéria sobre a qual não podia conhecer e sobre a qual fundamentar a sua decisão – art.º 615.º, al. d) do CPC.
KK. No nosso entendimento, e mediante os factos alegados pelas partes, o depoimento de parte do Réu (confissão), a prova documental e a prova testemunhal (na parte que pode ser admitida como prova) a resposta à matéria de facto deverá ser aquela que aqui supra se defende nos pontos impugnados – nos termos da al. c) do n.º 1 do art.º 640.º do CPC.
LL. O que desde já se requer (art.º 662.º do CPC), ou caso se entenda que existem dúvidas perante a prova produzida ou que faltam elementos ou que não está devidamente fundamentada a decisão para o julgamento que fez sobre os factos, então deverá ser ordenado julgamento, nos termos e para os efeitos do disposto nas als. b), c) e d) do n.º 2 do art.º 662.º do CPC, o que pode sempre ser efectuado oficiosamente mas que aqui, por cautela de patrocínio sempre se requer caso não se dê as resposta defendidas pelo A. aos concretos pontos de facto supra impugnados, quer quanto ao que foi dado como provado quer quanto aos que foram dados como não provados e deviam ter sido dados com provados, como supra se defendeu.
MM. Cumpre alegar que, na nossa humilde opinião, a sentença nunca poderia ser de improcedência do pedido, mesmo até perante o que o Tribunal a quo escreve na sentença.
NN. Mas perante a matéria de facto que se defende deve ser dada como provada, então ainda mais ganha força a nossa convicção de que a decisão deveria ter sido de total procedência do pedido.
OO. Entre A. e R. foi celebrado um contrato misto de prestação de serviços (reparação pelo Réu da caixa de direcção) e de empreitada (montagem no jipe das peças fornecidas pelo A. prontas a funcionar devidamente, como a caixa de transferência, onde deveria colocar o óleo correcto).
PP. A este contrato aplica-se na nossa opinião o regime da Lei n.º 84/2008 (na parte dos serviços) e o regime da empreitada (nomeadamente os art.ºs 1220.º e ss).
QQ. E o Tribunal a quo claramente entende que estamos no âmbito da responsabilidade contratual e que a causa de pedir e o pedido do A. tem por base a relação contratual que se criou entre A. e R. marido – cfr. pág. 11 e 12 da sentença.
RR. Inicialmente na sentença o Tribunal a quo refere que sobre o Réu existe a presunção de culpa, mas depois acaba por considerar que cabia ao Autor provar a culpa do Réu.
SS. O que obviamente resulta numa ambiguidade da sentença e mesmo numa contradição.
TT. Sendo assim nula a decisão nos termos do art.º 615.º, al. c) do CPC, a qual desde já se argui para todos os devidos efeitos legais e está ao alcance do Tribunal ad quem alterar a decisão em conformidade com o ora alegado e aqui defendido.
UU. Havendo assim uma errada (ou pelo menos contraditória ou ambígua) interpretação e aplicação do disposto no art.º 799.º, n.º 1 do CC, e dos art.º 342.º e 344.º do CC.
VV. Mas, mais, é que depois o Tribunal a quo considera que o Autor não provou todos os demais requisitos da responsabilidade contratual.
WW. Ora, como resulta claramente do disposto nos art.ºs 798.º e 799.º do CC, o Autor não está obrigado a provar a culpa, pois a mesma presume-se legalmente.
XX. Cabia ao Réu ilidir a presunção o que não faz.
YY. Aliás na motivação da matéria de facto (pág. 9) o Tribunal a quo claramente refere que não foi feita prova que foi colocado o óleo ATF na caixa de transferência.
ZZ. Quem alegou que colocou o óleo correcto foi o Réu, e por lei existe a presunção de culpa sobre o Réu – ou seja existe o juízo de que o Réu teve culpa no cumprimento defeituoso da sua parte no contrato – cabe ao Réu demonstrar que não agiu com culpa e que tudo fez correctamente, cabia ao Réu provar que o óleo ATF foi de facto por si instalado na caixa de transferência.
AAA. Da mesma forma competia ao Réu provar que tinha reparado devidamente a caixa de direcção – aqui já está em causa não só o disposto no art.ºs 798.º e 799.º do CC, mas também o que dispõe o Decreto-Lei n.º 84/2008 que protege o consumidor pelos serviços prestados pelo Réu e que estabelece a presunção legal de que o Réu não cumpriu com a sua obrigação.
BBB. Existe uma clara ambiguidade e contradição na fundamentação da decisão.
CCC. Se o Tribunal a quo afirma que existe a presunção de culpa sobre o Réu, como depois decide que cabia ao Autor provar a culpa?
DDD. Mas além da presunção de culpa, existe também a prova e a presunção legal de que o Réu não cumpriu com o que lhe competia.
EEE. E assim o requisito do facto ilícito (neste caso por omissão do zelo exigível ao Réu está preenchido.
FFF. O Réu deveria ter cumprido com a sua parte do contrato celebrado e dessa forma deveria ter colocado a caixa de transferência no jipe de forma a poder funcionar devidamente, porém a mesma avariou porque não foi colocado o óleo correcto, óleo este que deveria ter sido colocado pelo Réu. Devido à avaria da caixa de transferência avariou a caixa de velocidade. O Réu reparou a caixa de direcção. No entanto, tanto num caso, como no outro, dentro do prazo de garantia as caixas avariaram, demonstrando-se mais tarde que foram mal reparadas pelo Réu.
GGG. Houve assim omissão do zelo exigível.
HHH. O Autor, como ficou provado, denunciou em tempo os defeitos, mas, e como ficou provado, o Réu recusou-se a mexer no jipe do Autor e efectuar qualquer reparação.
III. O art.º 3.º do DL n.º 67/2003, alterado pelo DL n.º 84/2008, diz-nos que, neste caso o Réu responde perante o consumidor por qualquer falta de conformidade que exista no momento em que o bem lhe é entregue, e que as faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois anos a contar da data de entrega de coisa móvel, presumem-se existentes já nessa data.
JJJ. O Réu não ilidiu esta presunção.
KKK. O tribunal a quo não aplicou esta presunção, embora o A. tenha invocado tal diploma.
LLL. Tendo havido uma errada interpretação e aplicação deste normativo, que devia ter sido aplicado da forma como aqui se apresenta.
MMM. Mas acresce ainda que neste ponto teremos que ter atenção ao disposto no art.º 801.º e ss. do CC., mais uma presunção.
NNN. É que o Réu, em Setembro de 2014, recusou-se a cumprir com a sua obrigação de reparar e não quis mais tocar no jipe do A., nem tão pouco no que respeita à caixa de direcção, ou seja o Réu não quis eliminar os defeitos que o A. reclamou, tornando-se assim impossível cumprir com a prestação por facto imputável ao Réu, sendo o mesmo responsável como se faltasse culposamente ao cumprimento da obrigação (art.º 801.º e art.º 1220.º a 1223.º do CC).
OOO. Estes normativos também não foram aplicados pelo Tribunal a quo, havendo assim erro na interpretação e aplicação destes normativos, que deveriam ter sido aplicados da forma como supra se defende.
PPP. Ora de acordo como art.º 4.º do DL n.º 67/2003, alterado pelo DL n.º 84/2008, o consumidor tem direito à reparação ou à substituição ou redução do preço ou resolução do contrato, e o consumidor por optar por qualquer uma dessas vias, o Autor pediu a reparação mas o Réu recusou a mesma, agindo de forma ilícita, razão pela qual além das regras gerais o A. pode pedir o pagamento de indemnização por danos causados - art.º 12.º do DL n.º 67/2003, alterado pelo DL n.º 84/2008.
QQQ. O Autor provou os danos que se consubstanciam na avaria das peças identificadas nos autos e na factura junta como doc.º n.º 14 com a p.i., e os quais se presumem existir nos termos dos art.ºs 1220.º e ss. do CC e nos termos do art.º 4.º do DL n.º 67/2003, alterado pelo DL n.º 84/2008, como supra se alegou.
RRR. Assim como o A. provou que sofreu danos emocionais com todo o circunstancialismo que ocorreu entre Setembro e dezembro de 2014, nomeadamente a privação, e o que daí adveio, de usar o jipe, o que é um facto objectivo, a tristeza, desconsolo e revolta por não ter gozado de forma plena e como era habitual do seu veículo, mas também pelo facto de o Réu se recusar sem razão a reparar o veículo.
SSS. O Autor provou o nexo causal entre o facto e o dano, pois não fosse o defeituoso incumprimento por parte do Réu da sua parte no contrato as peças não teriam avariado.
TTT. Se as peças não tivessem avariado não teriam sofrido os danos que sofreram e que levaram a que fossem reparadas e consequentemente não teria sido necessário ao A. gastar a quantia que necessita de gastar por ter mandado compor as peças.
UUU. Por outro lado, não tivesse o jipe ficado imobilizado desde Setembro a dezembro de 2014, não teria o A. sofrido os danos emocionais que sofreu.
VVV. Pelo que dúvidas não restam que há nexo causal entre o facto e os danos alegados.
WWW. Desta forma, e perante o exposto, resulta que não cabia ao Autor a prova de todos os requisitos da responsabilidade contratual, até porque beneficia de presunções legais.
XXX. Mas como se vem de alegar e demonstrar, consegui-o fazer.
YYY. Pelo que, nestes autos, sempre se deveria ter dado por procedente o pedido formulado pelo A., o que pode ser efectuado, assim se respeitando a Lei, pelo Tribunal ad quem, não só devido ás nulidades arguidas e que levam à nulidade da sentença que pode ser suprida pelo Tribunal ad quem, mas também pelo correcto julgamento de todas as questão de facto e de direito que se vem de alegar e que o Tribunal ad quem, tomando conhecimento, e dando provimento, deverá anular a decisão ora impugnada e substituir a mesma por outra que seja de total procedência do pedido, condenando os Réus nos termos pedidos pelo A..» (sic)

Os RR. responderam em contra-alegações que sintetizaram assim:
«A) A douta sentença recorrida não informa de qualquer erro na apreciação da prova.
B) A prova terá que ser apreciada no seu conjunto e não por pequenos extratos da mesma, porque é livremente apreciada pelo Juiz, e no caso dos autos não merece qualquer reparo.
C) O Autor pretende dar interpretação que não existiu à prova produzida em Tribunal.
D) O Autor não conseguiu provar, como não o fez, que os problemas do automóvel se deveram a uma deficiente reparação do mesmo.
E) O Réu não conseguiu provar que houve um comprimento defeituoso e portanto o nexo de causalidade entre a atuação do Réu e o dano invocado pelo Autor.
F) Ao contrário do invocado pelo Autor, não existiu qualquer contrato da empreitada entre o Autor e o Réu, pelo que não se aplica o disposto nos artigos 1207º e seguintes do CC.» (sic)
*
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
*
II.
As questões a apreciar --- exceção feita para o que for do conhecimento oficioso --- estão delimitadas pelas conclusões da apelação do A. (art.ºs 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º do Código de Processo Civil[1]), cumprindo-nos decidir:
1- Nulidade da sentença, com fundamento nas al.s b), c) e d) do nº 1 do art.º 615º;
2- Erro de julgamento na decisão em matéria de facto;
3- A aplicação do Direito e a sorte da ação.
*
III.
É a seguinte a matéria de facto considerada provada na 1ª instância:
Da Petição Inicial
1) O Réu é empresário em nome individual e tem a profissão de mecânico, sendo, por isso, profissional de reparação de veículos automóveis, com oficina de reparação automóvel aberta ao público na freguesia …, concelho de Penafiel; (artigo 1.º)
2) No âmbito dessa atividade, o Autor solicitou ao Réu que procedesse, entre o mais, à desacoplagem e acoplagem de caixa de transferências pronta a funcionar, e à reparação da caixa de direção, bem como do amortecedor central e semieixo dianteiro, tudo do veículo de marca Land Rover, de matrícula ..-..-CL, de que o Autor era proprietário. (artigo 1.º)
3) O Réu aceitou e procedeu à reparação da caixa de direção. (artigo 2.º)
4) A caixa de transferência, após ter sido desacoplada pelo Réu, foi enviada para uma entidade terceira ao Réu para ser recondicionada; (artigo 2.º)
5) Após o regresso desta peça o Réu colocou óleo e acoplou todas as peças no veículo e, em 06 de junho de 2014, entregou-o ao Autor. Em contrapartida, o Autor pagou ao Réu, nesse mesmo dia, por cheque, o preço convencionado pela obra ou trabalhos feitos no valor de € 1.350,00 (mil trezentos e cinquenta euros); (artigo 2.º)
6) Em contrapartida, o Autor pagou ao Réu, nesse mesmo dia, por cheque, o preço convencionado pela obra ou trabalhos feitos no valor de € 1.350,00 (mil trezentos e cinquenta euros). (artigo 2.º)
7) Em finais de Setembro de 2014, a caixa de transferências começou a fazer um barulho ensurdecedor, como se estivesse a bater a seco e a manete pulava; (artigo 3.º)
8) Sentiu ainda o Autor que a caixa de velocidades tornou-se dura e de difícil manuseamento, ao engrenar as velocidades e em andamento saltava e desengrenava e que o volante, quando em andamento mesmo em baixa velocidade, trepidava e não obedecia completamente ao que era ordenado com o seu manuseamento e ouvia-se barulho da caixa de direção à medida que era acionado o volante. (artigo 3.º)
9) Ainda em finais de Setembro de 2014 o Autor dirigiu-se à oficina de reparação automóvel do Réu e denunciou os problemas sentidos, reclamando a reparação dos mesmos, o que levou o Réu a comunicar ao Autor que teria de retirar aquelas peças a fim de averiguar qual o problema, informando ainda que a caixa de transferência estaria avariada, mas que estava dentro da garantia da empresa que havida recondicionado a mesma. (artigo 4.º)
10) O Autor pediu ao Réu a emissão da fatura dos trabalhos prestados em Maio/Junho de 2014, ...; (artigo 5.º)
11) O Réu emitiu as duas faturas que constituem os documentos juntos a fls. 13/4 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido no valor total de € 1.350,61, coincidente com o cheque recebido. (artigo 6.º)
12) A caixa de transferência foi, então, retirada do jipe pelo Réu e enviada à empresa “E…, Lda.”; (artigo 7.º)
13) Surge um desentendimento entre Autor e Réu devido à necessidade de acondicionar a caixa de transferência para ser enviada por transportador à referida “E…”, e o Réu comunicou ao Autor que não efetuaria qualquer outro trabalho ao Autor, incluindo qualquer reparação ou montagem das peças acima referidas. (artigo 8.º)
14) Perante a posição do Réu, o Autor não mais quis que o seu veículo estivesse à guarda daquele, pelo que lhe enviou a carta que constitui o documento junto a fls. 16 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e que o Réu recebeu. (artigo 9.º)
15) Em resposta o Réu enviou ao Autor, que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 19 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e emitiu uma fatura no valor de € 60,00, pelo trabalho de desmontar as peças, cfr. o documento junto a fls. 20 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 10.º)
16) O Autor, ao receber a dita factura, enviou ao Réu, que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 21 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 11.º)
17) Em resposta o Réu enviou ao Autor, que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 24 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 12.º)
18) A caixa de transferências no jipe não podia vir da oficina que fez o recondicionamento com óleo, devendo este ser colocado pelo profissional, mecânico, que acopla a caixa ao veículo. (artigos 15.º e 16.º)
19) O Autor enviou ao Réu, que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 25 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e devolve a fatura acima identificada, que por lapso não havia ainda devolvido. (artigo 17.º)
20) Em Novembro de 2014 o Autor recebe da empresa “E…, Lda.”, a comunicação datada de 29-10-2014, que consta a fls. 28 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pela qual faz saber que não é aceite a reclamação de cobertura da garantia para a caixa de transferência, porque o mecânico que efetuou a montagem e acoplagem da caixa de transferência, ou seja o Réu, introduziu óleo valvulina 75W80 ou 75W90, quando devia ter introduzido o óleo ATF, o que causou a avaria da caixa de transferência e, consequentemente, causou a avaria da caixa de velocidades, pelo que a reparação da caixa de velocidades ao abrigo da garantia da caixa de transferência também não foi aceite. (artigo 18.º)
21)) O Autor enviou ao Réu, que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 29 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 21.º)
22) O Autor ficou impossibilitado de se fazer transportar no veículo em causa, o qual era usado por si para a sua vida pessoal e profissional; (artigo 26.º)
23) O Autor obteve da referida empresa o valor total a pagar, o qual ascende ao montante de € 3.967,72 (três mil, novecentos e sessenta e sete euros e setenta e dois cêntimos). (artigo 29.º)
24) O Autor, através do seu Mandatário e por meio da carta que consta a fls. 36 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, interpelou o Réu para que procedesse ao pagamento da dita quantia, sendo certo que o Réu não respondeu por escrito, mas também não procedeu a qualquer pagamento. (artigo 30.º)
25) O Réu estava obrigado a desempenhar de forma irrepreensível a sua atividade e montar ou colocar as peças supra identificadas, de forma a poderem funcionar sem qualquer problema e de forma a não se estragarem. (artigo 34.º)
26) O Réu, à data do contrato celebrado com o Autor, era empresário em nome individual, dedicando-se à prossecução da atividade de exploração de oficina de reparação automóvel, mudança de filtros, óleo, serviço de inspeção, reparação de peças mecânicas de veículos automóveis; (artigo 35.º)
27) Os rendimentos que o Réu obtinha com a sua atividade tinham em vista beneficiarem a sua vida atual e futura e a do casal, nomeadamente para suportar as despesas com eletricidade, água, compras de mercearia, despesas médicas e demais gastos familiares. (artigo 36.º)
Da Contestação
28) Foi também montado o amortecedor central do veículo que foi fornecido pelo autor, em virtude de o anterior estar a verter óleo. (artigo 3.º)
29) Como o semieixo se encontrava partido também foi substituído pelo Réu. (artigo 4.º)
30) A caixa de direção foi retirada para substituição de um vedante exterior, face à existência de uma fuga de óleo, sem ser aberta, e posta novamente no lugar. (artigo 5.º)
31) A caixa de transferência, depois de retirada do veículo, foi enviada pelo autor para outra empresa, cuja identificação o Réu desconhece, para ser reparada/recondicionada. (artigo 7.º)
32) Posteriormente, o autor entregou ao réu a caixa de transferência que a colocou na viatura, sem a abrir ou desmontar, bem como a caixa de velocidades, com a colocação de óleo nas mesmas …; (artigo 8.º)
33) Em finais de Setembro de 2014, o autor deslocou-se novamente à oficina do réu porque, eventualmente, teria problemas na viatura, tendo o réu verificado que a caixa de transferência estaria avariada, pelo que, a solicitação do autor, a retirou, sem a desmontar e o informou que deveria reclamar junto da empresa que efetuou a sua reparação; (artigo 12.º)
34) O autor tem outros veículos de sua propriedade, ou das empresas de que é proprietário, em que se pode transportar, designadamente, veículos similares e da mesma marca. (artigo 52.º)
B) FACTOS NÃO PROVADOS
Da Petição Inicial
35) …desmontagem e montagem da caixa de transferência… desmontagem, e montagem e acoplagem pronta a funcionar da caixa de direção… de amortecedores traseiros. (artigo 1.º)
36) O Réu procedeu à desmontagem, entre o mais, dessas peças. (artigo 2.º)
37) A caixa de transferência, após ter sido desmontada pelo Réu, foi enviada para a empresa “E…, Lda.” para ser recondicionada… montou as peças acima indicadas,…; (artigo 2.º)
38) Em finais de Setembro de 2014, o Autor começou a sentir que os amortecedores traseiros provocavam trepidação anormal, mesmo em estradas em bom estado, provocavam um barulho seco e ensurdecedor, e a traseira do veículo parecia solta com tendência a derrapar; (artigo 3.º)
39) Devido à reclamação do Autor da avaria das peças,…, que nunca havia sido emitida e ainda uma declaração do Réu a atestar que trabalhos havia efetuado no veículo para reclamação da garantia; (artigo 5.º)
40) … mas que não discriminam todos os trabalhos prestados… para a reclamação da garantia… e entregou ao Autor o documento junto a fls. 15 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido); (artigo 6.º)
41) …, a fim de reclamar a cobertura de garantia; (artigo 7.º)
42) … procedeu à desmontagem das peças e reconhecia as reclamações… por este ser muito mesquinho; (artigo 8.º)
43) …, sendo totalmente desconhecido para o Autor o tipo de óleo que o Réu havia usado, não lhe sendo possível saber que o óleo usado era o errado; (artigo 16.º)
44) Foi ainda o Autor informado de que a caixa de direção havia sido mal reparada pelo Réu, o que levou à sua avaria, o que, de resto, o Autor já havia denunciado ao Réu em finais de Setembro de 2014, e reconhecido por este último, mas que o Réu se havia recusado a reparar. (artigo 20.º)
45) Em resposta o Réu envia uma carta ao Autor, que a recebeu, datada de 04-12-2014, pela qual, em suma diz não ter responsabilidade. (artigo 22.º)
46) …, não tendo, na altura, disponibilidade de outro com o qual se pudesse transportar com a mesma liberdade e autonomia. (artigo 26.º)
47) Esta situação causou no Autor um sentimento de grande tristeza, desconsolo e revolta por ter sido privado de gozar de forma plena do seu veículo, mas também por verificar que o Réu, sem razão, se negava a reparar os defeitos, levando o Autor a ter que contratar a empresa “E…” com oficina em Cascais para reparar aquilo por que o Réu era responsável. (artigo 27.º)
48) … pela reparação dos defeitos, efetuada…; (artigo 29.º)
49) O Autor teve de pagar a quantia de € 240,00 (duzentos e quarenta euros) pelo transporte do seu veículo de Penafiel até Cascais e regresso; (artigo 31.º)
50) …, o que não fez; (artigo 34.º)
51) … pintura com fins lucrativos, entre o mais, à reparação de chaparia, rede elétrica e eletrónica de veículos…; (artigo 35.º)
Da Contestação
52) …correto…, conforme indicações do autor; (artigo 8.º)
53) A fatura de fls. 13/4 foi emitida posteriormente porque o autor não forneceu ao réu os seus dados de identificação, designadamente número de contribuinte, necessários para emissão da mesma; (artigo 9.º)
54) Posteriormente, o autor solicitou ao réu que retirasse novamente a caixa de direção do veículo para a levar a outra oficina, de que desconhece a identificação, para verificar o amortecedor que tinha dentro da mesma, a conselho de um amigo, o que foi feito; (artigo 10.º)
55) Na referida caixa de transferências foi colocado o óleo indicado pelo Autor e é o referido “ATF” e não o óleo valvulina “75W80” ou “75W90”, conforme indicação da empresa que reparou a caixa de transferência; (artigos 28.º e 35.º)
56) O réu tem conhecimento que o autor, no período de Maio a Outubro de 2014, efetuou diversas reparações do veículo noutras oficinas, desconhecendo se o óleo da caixa de transferência terá sido mudado e se a mesma foi desmontada, como aconteceu com a caixa de transmissão. (artigo 37.º)
*
IV.
1. Nulidade da sentença, com fundamento nas al.s b), c) e d) do nº 1 do art.º 615º do Código de Processo Civil
Dispõe o referido normativo[3]:
«1 – É nula a sentença quando:
a) (…)
b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão;
c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível;
d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento;
e) (…).»
São taxativas as causas de nulidade da sentença, previstas naquele art.º 615º.
Percorrendo as alegações de recurso e as conclusões respetivas, vejamos o essencial dos argumentos utilizados pelo recorrente para justificar a arguição da nulidade da sentença.
1º- O tribunal não faz uma análise crítica dos depoimentos das testemunhas, não diferenciando o crédito que lhes concede em cada momento, e não indica como chegou à falta de prova quanto ao ponto 42 da sentença --- aponta nulidade por falta de fundamentação e omissão de pronúncia, nos termos das al.s b) e d) do nº 1 do art.º 615º;
2º- Contradição entre a fundamentação e a decisão relativamente ao ponto 43 dos factos não provados, ao dar como não provado que o R. tenha usado óleo ATF que devia ter usado e que não havia como saber qual o óleo usado --- aponta a nulidade da al. c) do nº 1 do art.º 615º;
3º- Falta de análise crítica da prova relativamente ao ponto 46º, limitando-se a fazer conclusões, sem expressar o raciocínio que efetuou para as obter --- aponta nulidade da al. b) do nº 1 do art.º 615º;
4º- O tribunal considerou um facto não alegado por qualquer das partes, pelo que não estava sequer sujeito a prova e não podia ser utilizado para fundamentar a decisão, por violar o disposto no art.º 5º, quando recaía sobre o R. a obrigação de ilidir --- e não ilidiu --- uma presunção legal de culpa em sentido contrário --- nulidades do art.º 615º, nº 1, al.s b) e c);
5º- O Tribunal considerou documentos impugnados e prova testemunhal sem que tivesse demonstrado na sentença o raciocínio seguido para credibilizar as testemunhas e os documentos quando, na realidade, a testemunha se revelou credível numa matéria e noutra não, sendo ónus do R. provar a veracidade dos documentos impugnados pelo A. --- nulidade da al. d) do nº 1 do art.º 615º;
6º- O tribunal entendeu que se trata de responsabilidade contratual, que a causa de pedir e o pedido do A. tem por base uma relação contratual e que recai sobre o R. uma presunção de culpa, mas acaba por considerar que deve ser o A. a provar a culpa do R., dando assim origem a uma ambiguidade da sentença, mesmo uma contradição --- aponta a nulidade prevista na al. c) do nº 1 do art.º 615º.
Analisemos a questão, fundamento a fundamento legal, começando pela nulidade por falta de fundamentação da sentença.
Como escrevemos já, dispõe o art.º 615º, nº 1, al. b), que a sentença é nula quando “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
Tem-se entendido, de modo praticamente uniforme, que só a falta absoluta de fundamentação determina a nulidade da sentença, não padecendo desse vício a sentença que contém uma fundamentação deficiente, medíocre ou mesmo errada[4].
Como escreve o Professor Alberto dos Reis[5], «o que a lei considera causa de nulidade é a falta absoluta de motivação; a insuficiência ou a mediocridade da motivação é espécie diferente, afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz a nulidade. Por falta absoluta de motivação deve entender-se a ausência total de fundamentos de direito e de facto”.
A falta de fundamentação da decisão, seja ela um mero despacho ou uma sentença, há de revelar-se por ininteligibilidade do discurso decisório, por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira.
É pela fundamentação que a decisão se revela um ato não arbitrário, a concretização da vontade abstrata da lei ao caso particular submetido à apreciação jurisdicional. É por ela que as partes ficam a saber da razão ou razões do decaimento nas suas pretensões, designadamente para ajuizarem da viabilidade da utilização dos meios de impugnação legalmente admitidos. Como escreve Lebre de Freitas[6], a fundamentação exerce a dupla função de facilitar o reexame da causa pelo tribunal superior e de reforçar o autocontrolo do julgador, sendo um elemento fundamental na transparência da justiça, inerente ao ato jurisdicional.
O dever de fundamentação de facto e de Direito da sentença, previsto no art.º 607°, nº 4, apenas se aplica ao conhecimento das questões decididas naquela peça processual, entendendo-se por estas os pontos essenciais de facto ou de Direito em que as partes basearam as suas pretensões; não se aplica também aos meros argumentos usados no conhecimento das mesmas.
Só aquela ausência de motivação torna a peça imprestável ou impercetível. Uma errada, insuficiente ou incompleta fundamentação não afeta o valor legal da decisão qua tale[7].
A motivação probatória essencial da matéria de facto pode, aliás, ser objeto de revisão nos termos do art.º 662º, nº 2, oficiosamente ou a pedido das partes, devendo então o tribunal de 1ª instância fundamentá-la, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados (nº 2, al. d)).
Mas se o facto dado como provado ou não provado, sem fundamentação, não se revelar concretamente essencial para a decisão da causa, a exigência a posteriori da fundamentação, em via de recurso, é inútil, sendo a falta de fundamentação irrelevante, ainda que da questão principal se trate.
Em qualquer caso, a motivação das respostas aos quesitos não tem que conter uma exteriorização integral de todo o percurso lógico que conduziu à formação da convicção do julgador[8], basta uma explicação sucinta do iter lógico-dedutivo que levou à conclusão encontrada, embora deva deixar à vista o «itinerário cognoscitivo», a razão de ser da exigência de fundamentação; pretende-se que o julgador se pronuncie quanto à relevância deste ou daquele depoimento, quanto ao valor dos depoimentos testemunhais, referindo-se à sua maior ou menor isenção, credibilidade, clareza e razão de ciência, deixando transparecer sensatez e prudência na apreciação livre da prova e afastando qualquer laivo de suspeição de arbitrariedade.
Com refere Abrantes Geraldes[9], é de afastar a fundamentação que, simplesmente, indique os meios de prova, do tipo “os depoimentos prestados pelas testemunhas e a inspecção ao local”, sendo legalmente exigível que, de acordo com as circunstâncias do caso concreto, se estabeleça o fio condutor entre a decisão da matéria de facto (resultado) e os meios de prova que foram usados na aquisição da convicção (fundamentos), fazendo a respetiva apreciação crítica, nos seus aspetos mais relevantes.
Mas nada impõe que a fundamentação da decisão seja feita separadamente para cada facto.
O cumprimento da determinação legal em vigor constitui tarefa cuja execução se não revela fácil, uma vez que na formação da convicção dos juízes que integram o tribunal não intervêm apenas fatores racionalmente demonstráveis.
O tribunal recorrido motivou a decisão em matéria de facto ao longo de cerca de duas páginas da sentença, e não se pode dizer que não efetuou uma análise crítica das provas. Começou por discriminar os factos que considerou provados com base na sua admissão por acordo dos RR. na contestação, passou depois a especificar também os factos que foram confessados em Juízo pelo A. e pelo R. em sede de depoimento de parte. Depois discriminou outros factos como tendo resultado assentes a partir de dois documentos que indicou e, bem assim, de um depoimento testemunhal, informando da qualidade da testemunha face ao objeto do processo. Quanto aos restantes factos, discriminando alguns deles, o tribunal deu suficiente explicação sobre a formação da sua convicção, disse que, quanto a alguns deles não foi produzida prova (se se não foi, como considerá-los provados?) e pormenorizou excertos de referências testemunhais identificando cada testemunha.
Poderia, é certo, o tribunal ter desenvolvido com mais pormenor a formação da sua convicção, mas é suficiente a motivação da decisão da matéria de facto exposta na sentença.
Por mera hipótese, admitindo que se justificasse a fundamentação sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, ao abrigo da al. d) do nº 2 do art.º 662º, nem por isso estaríamos face a uma nulidade da sentença por falta de fundamentação, porque, como observámos já, esta sempre dependeria de uma sua falta absoluta, o que, com toda a evidência, não ocorre no caso sub judice.
Não se verifica, pois, a nulidade da al. b) do nº 1 do art.º 615º relativamente aos itens 1º e 3º acima enunciados.
Quanto ao item 4º, a consideração abusiva de um facto não alegado nem provado pode levar à sua desconsideração à luz da conjugação do art.º 5º com o art.º 607º, nº 4, mas só por si não é fonte de nulidade da sentença por falta de especificação da fundamentação da decisão em matéria de facto.
O problema da distribuição do ónus da prova coloca-se normalmente na fase da aplicação do Direito e não em sede de matéria de facto. É então que se verifica se aquele sobre quem recaía o ónus de evidenciar determinados factos inerentes ao seu direito logrou obter a sua prova.
De resto, a sentença está fundamentada com factos provados (e indicação da matéria não provada) e subsunção jurídica; não padece do vício de falta de fundamentação, seja em matéria de facto, seja em matéria de Direito.

À al. c) do nº 1 do art.º 615º referem-se os itens 2º, 4º e 6º.
Constitui causa de nulidade da sentença --- extensível aos próprios despachos (qualquer decisão, seja qual for a forma que assuma) --- a oposição entre os fundamentos e a decisão (art.ºs 613º, nº 3 e 615º, nº 1, al. c)). É um vício lógico que compromete a decisão desde logo na sua construção. A decisão perde a sua justificação ao apoiar-se ostensivamente numa base que, na realidade, não a sustenta. Os fundamentos dela constantes conduziriam, logicamente, não ao resultado expresso e querido pelo juiz subscritor, mas a um resultado oposto ou, pelo menos, bastante diferente, de tal modo que a decisão não é um ato considerado racionalmente sustentado, antes revela uma distorção do raciocínio lógico que se impõe entre as premissas de facto e de Direito e a conclusão. A fundamentação há de apontar num sentido enquanto o segmento decisório segue caminho oposto ou, pelo menos, uma direção claramente diferente.
Deste modo, a nulidade da oposição entre os fundamentos e a decisão está relacionada, por um lado, com a obrigação imposta pelos art.ºs 154° e 607°, n.ºs 3 e 4, de fundamentar as decisões e, por outro, pelo facto de a sentença dever constituir um silogismo lógico-jurídico, em que a decisão deverá ser a consequência ou conclusão lógica da norma legal (premissa maior) com os factos (premissa menor).
A previsão da norma contempla as situações de contradição real entre os fundamentos e a decisão e não as hipóteses de contradição aparente, resultantes de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.
Como é por demais evidente, no item 2º não está em causa qualquer viciação de raciocínio lógico entre os fundamentos e a decisão que arrisque a sua própria construção e valor enquanto ato decisório processual, mas tão-só discordância do recorrente relativa a um facto dado como provado e, nos itens 4º e 6º, a discordância do recorrente quanto à consideração (alegadamente indevida) de um facto como provado e a violação das regras do ónus da prova, o que está longe de poder constituir uma qualquer oposição entre os fundamentos e a decisão da sentença ou a sua ininteligibilidade (por ambiguidade ou obscuridade).
Mesmo que assista razão ao recorrente e que a decisão deva ser corrigida ou revogada, não ocorre esta alegada nulidade da sentença.

Resta a análise dos itens 1º e 5º, para os quais se invocou, além do mais, a nulidade da al. d) do nº 1 do art.º 615º, segundo o qual, a sentença é nula se o juiz deixa de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
Entende-se por questões os problemas concretos a decidir e não simples argumentos, opiniões ou doutrinas expendidos pelas partes na defesa das teses em presença.
Não temos dúvida alguma que esta nulidade estaria cometida se, por exemplo, o tribunal tivesse reconhecido o direito à indemnização invocado pelo A. a um qualquer terceiro estranho à ação ou a quem não a pediu. Estaria então a reconhecer o direito de alguém que não é parte na causa ou que, sendo-o, não integra a causa de pedir, enquanto facto de onde procede o pedido da ação, assim, a pronunciar-se sobre uma questão de que não devia conhecer por não ter sido suscitada pelas partes nem ser do conhecimento oficioso (art.º 608º, nº 2).
De igual modo, o tribunal estaria a pronunciar-se sobre questão externa ao objeto do processo se neste não estivesse a ser discutido o direito do A. à indemnização.
A verdade é que tal questão integra a causa de pedir e o pedido da ação e, como tal, foi decidida no dispositivo da sentença, no sentido da absolvição dos RR. do pedido.
Se determinados documentos tinham ou não tinham força probatória bastante e se a prova deles emergente podia ser reforçada pela prova testemunhal e se esta foi suficiente ou não para a demonstração de determinado facto, não é conhecer de uma questão de que não se poderia conhecer, nem deixar de conhecer de uma questão de que se deveria ter tomado conhecimento, atenta a causa de pedir, o pedido ou qualquer exceção invocada pelos RR. na contestação (ou reconvenção, se ela tivesse sido deduzida).
De outro passo, também já observámos que a motivação da decisão em matéria de facto não tem que ser feita ponto por ponto, sob pena de se tornar uma missão quase impossível. O que importa é que o conjunto dos factos provados, por um lado, e os factos não provados, por outro lado, encontrem na motivação uma apreciação crítica traduzida na razão da decisão, que esta tenha respaldo justificativo naquela fundamentação.
Do que verdadeiramente o A. parece discordar é da decisão em matéria de facto e da aplicação do Direito aos factos dados como provados. Estas decisões podem estar erradas --- adiante o veremos --- mas não encerram nenhuma das nulidades invocadas pelo apelante.
A sentença, em si mesma, é um ato válido.
Improcede, assim, a primeira questão do recurso.
*
2. Erro de julgamento na decisão em matéria de facto
O Recorrente deu cumprimento ao ónus de impugnação da decisão em matéria de facto previsto no art.º 640º, nº, nº 1, al.s a), b) e c) e nº 2, al. a), indicando a matéria que entende dever ser alterada, a versão que considera dever vingar em face da prova produzida e as provas que, na sua perspetiva relevam para efeito da modificação que propõe.
Segundo o recorrente:
- O ponto 15 dos factos provados deve passar a ter o seguinte teor:
15- Em resposta o Réu marido afirma que terá tudo preparado e emitiu uma factura no valor de € 60,00 pelo trabalho de desmontar as peças, mas erradamente não discrimina todos os trabalhos. (artigo 10º da petição inicial)
- Os pontos 35, 37, 42, 43, 44, 46, 47, 48, 49 e 50 da matéria dada como não provada, devem transitar para os factos provados.
São eles:
35) …desmontagem e montagem da caixa de transferência… desmontagem, e montagem e acoplagem pronta a funcionar da caixa de direção… de amortecedores traseiros. (artigo 1.º)
37) A caixa de transferência, após ter sido desmontada pelo Réu, foi enviada para a empresa “E…, Lda.” para ser recondicionada… montou as peças acima indicadas,…; (artigo 2.º)
42) … procedeu à desmontagem das peças e reconhecia as reclamações… por este ser muito mesquinho; (artigo 8.º)
43) …, sendo totalmente desconhecido para o Autor o tipo de óleo que o Réu havia usado, não lhe sendo possível saber que o óleo usado era o errado; (artigo 16.º)
44) Foi ainda o Autor informado de que a caixa de direção havia sido mal reparada pelo Réu, o que levou à sua avaria, o que, de resto, o Autor já havia denunciado ao Réu em finais de Setembro de 2014, e reconhecido por este último, mas que o Réu se havia recusado a reparar. (artigo 20.º)
46) …, não tendo, na altura, disponibilidade de outro com o qual se pudesse transportar com a mesma liberdade e autonomia. (artigo 26.º)
47) Esta situação causou no Autor um sentimento de grande tristeza, desconsolo e revolta por ter sido privado de gozar de forma plena do seu veículo, mas também por verificar que o Réu, sem razão, se negava a reparar os defeitos, levando o Autor a ter que contratar a empresa “E…” com oficina em Cascais para reparar aquilo por que o Réu era responsável. (artigo 27.º)
48) … pela reparação dos defeitos, efetuada…; (artigo 29.º)
49) O Autor teve de pagar a quantia de € 240,00 (duzentos e quarenta euros) pelo transporte do seu veículo de Penafiel até Cascais e regresso; (artigo 31.º)
50) …, o que não fez; (artigo 34.º)

Entende-se atualmente, de uma forma que se vinha já generalizando nos tribunais superiores, hoje largamente acolhida no art.º 662º do Código de Processo Civil, que no seu julgamento, a Relação, enquanto tribunal de instância, usa do princípio da livre apreciação da prova com a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância (art.º 655º do anterior Código de Processo Civil e art.º 607º, nº 5, do código atual), em ordem ao controlo efetivo da decisão recorrida, devendo sindicar a formação da convicção do juiz, ou seja, o processo lógico da decisão, recorrendo com a mesma amplitude de poderes às regras de experiência e da lógica jurídica na análise das provas, como garantia efetiva de um segundo grau de jurisdição em matéria de facto; porém, sem prejuízo do reconhecimento da vantagem em que se encontra o julgador na 1ª instância em razão da imediação da prova e da observação de sinais diversos e comportamentos que só a imagem fornece.
Como refere A. Abrantes Geraldes[10], “a Relação deve alterar a decisão da matéria de facto sempre que, no seu juízo autónomo, os elementos de prova que se mostrem acessíveis determinem uma solução diversa, designadamente em resultado da reponderação dos documentos, depoimentos e relatórios periciais, complementados ou não pelas regras de experiência”… “afastando definitivamente o argumento de que a modificação da decisão da matéria de facto deveria ser reservada para casos de erro manifesto” ou de que “não é permitido à Relação contrariar o juízo formulado pela 1ª instância relativamente a meios de prova que foram objecto de livre apreciação”, acrescentando que este tribunal “deve assumir-se como verdadeiro tribunal de instância e, por isso, desde que, dentro dos seus poderes de livre apreciação dos meios de prova, encontre motivo para tal, deve introduzir as modificações que se justificarem”.
Importa, pois, por regra, reexaminar as provas indicadas pelo recorrente e, se necessário, outras provas, maxime as indicadas pelo recorrido nas contra-alegações e as referenciadas na fundamentação da decisão em matéria de facto e que, deste modo, serviram para formar a convicção do Ex.mo Julgador em ordem a manter ou a alterar a referida materialidade, exercendo-se um controlo efetivo dessa decisão e evitando, na medida do possível, a anulação do julgamento, antes corrigindo, por substituição, a decisão em matéria de facto.
Citando Antunes Varela, escreve Baltazar Coelho[11] que “a prova jurídica de determinado facto … não visa obter a certeza absoluta, irremovível da (sua) verificação, antes se reporta apenas a certeza subjectiva, a convicção positiva do julgador ou, o que vale por dizer, apenas aponta para a certeza relativa dos factos pretéritos da vida social e não para a certeza absoluta do fenómeno de carácter científico”.
Na mesma linha, ensina Vaz Serra[12] que “as provas não têm forçosamente que criar no espírito do juiz uma absoluta certeza acerca dos factos a provar, certeza essa que seria impossível ou geralmente impossível: o que elas devem é determinar um grau de probabilidade tão elevado que baste para as necessidades da vida”. É a afirmação da corrente probabilística, seguida pela maior parte da doutrina que, opondo-se à corrente dogmática, considera não exigível mais do que um elevado grau de probabilidade para que se considere provado o facto.
Terá que haver sempre um grau de convicção indispensável e suficiente que justifique a decisão, que não pode ser, de modo algum, arbitrária, funcionando aquela como base de compreensão do processo lógico e convincente da sua formação.
Sempre se dirá ainda que a decisão só deverá ser alterada perante uma situação probatória de imposição de decisão diversa, como resulta expresso no nº 1 do art.º 662º, ou seja, quando se verifique, relativamente a cada facto impugnado, uma prova impositiva, determinante, que torne imperiosa a fixação do facto diferente.
Vejamos então!
Uma consideração se impõe à cabeça. Diz o A. que os RR. não impugnaram os documentos (particulares) por ele apresentados, deixando a ideia de que, assim, os factos neles relatados devem ser considerados provados, ao abrigo do art.º 376º, nº 2, do Código Civil, sem que sobre o assunto se possa produzir prova testemunhal.
A apresentação do documento contém em si, expressa ou implicitamente, a afirmação de que provém da pessoa a quem é imputado. Se a parte contrária, confrontada com a apresentação, expressamente reconhecer a assinatura do documento como verdadeira, ou não a impugnar, esta confissão (no primeiro caso) ou admissão (no segundo) da verdade da afirmação feita pelo apresentante tem como consequência a prova da autoria do documento, sem a ulterior possibilidade de prova em contrário (art.º 374º, nº 1 Código Civil).[13]

Dispõe o nº 1 do art.º 376º do Código Civil que “o documento particular cuja autoria seja reconhecida nos termos dos artigos antecedentes faz prova plena quanto às declarações atribuídas ao seu autor, sem prejuízo da arguição e prova da falsidade do documento”. E o nº 2 determina que “os factos compreendidos na declaração consideram-se provados na medida em que forem contrários aos interesses do declarante; (…)”.

Uma vez estabelecida a veracidade da subscrição do documento particular pela pessoa a quem é atribuído, dela resulta a veracidade do respetivo conteúdo: o documento particular faz prova plena das declarações atribuídas ao seu autor, na medida em que forem contrários aos interesses, sem prejuízo da arguição e prova de falsidade das mesmas.
Nas situações em que o R. não seja o autor do documento, o reconhecimento da sua autenticidade não implica qualquer confissão de factos. O documento (particular) não abrange os factos que nele sejam narrados como praticados pelo subscritor do documento ou como objeto da sua perceção direta: apenas as declarações, de ciência ou de vontade, nele constantes ficam documentalmente provadas. Por conseguinte, a autenticidade desses documentos e a sua força probatória não obstam a que reverta prova testemunhal sobre o seu conteúdo, decidindo os factos segundo a regra da livre apreciação da prova. O documento particular não impugnado só prova a veracidade da declaração quando esta seja contrária aos interesses de quem a emitiu, nas relações entre declarante e declaratário. A força ou eficácia probatória plena atribuída pelo n° l do art.º 376º do Código Civil às declarações documentadas limita-se à materialidade, isto é, à existência dessas declarações, não abrangendo a exatidão das mesmas. Ainda que um documento particular goze de força probatória plena, tal valor reporta-se tão só às declarações documentadas, ficando por demonstrar que tais declarações correspondiam à realidade dos respetivos factos materiais e, sobretudo, não se excluindo a possibilidade de o seu autor demonstrar a inveracidade daqueles factos por qualquer meio de prova.
Como provados --- plenamente provados --- apenas se consideram os factos que forem desfavoráveis ao declarante (confissão); quanto aos restantes o documento é livremente apreciado pelo tribunal.[14]
Noutro passo do recurso, o A. invoca a posição que tomou no processo relativamente aos documentos juntos pelo R. na contestação: arguiu a falsidade e impugnou os teores, as letras, as assinaturas, e as reproduções mecânicas de todos esses documentos.
A doutrina dominante defende que os casos de falsidade são apenas os indicados expressamente na lei, ou seja, que a enumeração legal é taxativa.[15]
Em relação a documentos particulares apenas se poderá arguir a falsidade se se tratar de uma das situações previstas na lei:
a) Da falsidade do reconhecimento (notarial) presencial da letra e da assinatura, ou só da assinatura (art.ºs 375º, n.º 2, e 376º, n.º 1, do Código Civil);
b) Da subscrição de documento particular por pessoa que não sabia ou não podia ler sem a intervenção notarial (art.º 446º, n.º 1, do Código de Processo Civil);
c) Da subtração de documento particular assinado em branco e a inserção nele de declarações divergentes do ajustado com o signatário (artigo 446º, n.º l, do Código de Processo Civil).[16]
Assim, a referida posição do A. face aos documentos particulares apresentados pelo R. é apenas de negação da sua autenticidade e de oposição ao respetivo teor, incumbindo ao R. a prova da sua veracidade (art.º 374º do Código Civil), seguindo-se os termos dos art.ºs 444º e seg.s do Código de Processo Civil.
Dada a posição que o A. tomou face ao documento nº 2 junto pelo R. com a contestação (“Declaração Auto Sócios”), incumbia ao último comprovar a sua autenticidade juntando o respetivo original.
Em qualquer caso, ainda que os RR. não provem a autenticidade dos documentos cuja letra, assinatura e respetivo teor, tenham sido postos em crise pelo A., não ficam aqueles impedidos de provar os factos deles constantes por qualquer outro meio de prova que seja legalmente admissível[17].
A audição da totalidade da prova oralmente produzida e registada (depoimentos de parte do A. e dos RR. e depoimentos testemunhais) facilitou a compreensão global pela Relação da situação em causa e a formação de uma convicção mais segura sobre a matéria controvertida.
Grosso modo, temos, de um lado, a posição do A. --- apoiada sobretudo no seu depoimento e nas prestações das testemunhas F… (dono de uma oficina onde o A. costuma levar os seus veículos para realizar pequenas reparações e fazer manutenção), G… (sua companheira desde 2011 e colaboradora na sua atividade de oculista, na zona de Penafiel) e H… (o chefe da oficina, na zona de Cascais, que recondicionou as peças do veículo do A.) ---, segundo a qual o R. não usou o óleo adequado na caixa de transferência, motivando sobreaquecimento na viagem efetuada de Lisboa a Penafiel, por ser grande, e, com efeito, danificação daquele órgão do motor, assim como de órgãos próximos como é o caso da caixa de velocidades e da caixa de direção; por outro lado, a tese dos RR. --- essencialmente sustentada no seu depoimento de parte e nos depoimentos testemunhais de I… (vendedor de automóveis em stand situado em frente à oficina do R., que o ajudou a colocar[18] a caixa de transferência), J… (mecânico profissional e proprietário de oficina que também auxiliou o A. naquela colocação), ambos das suas relações de amizade, K… (proprietário de dois veículos Range Rover e frequentador da oficina do R. para a sua manutenção e reparação, frequentando-a há mais de 10 anos) --- que deixa a ideia de que o R. marido introduziu o óleo correto e adequado, ATF (e não valvulina) na caixa de transmissão logo que terminou a sua colocação no veículo do A.
Tendo sido este o cerne da discussão desenvolvida em audiência e tendo ficado absolutamente demonstrado que o R. nunca desmontou a caixa de transferência, no sentido de que a decompôs ou lhe retirou peças para as colocar de novo (com ou sem reparação), importa agora decidir sobre os factos que foram concretamente impugnados pelo recorrente, seguindo a ordem pela qual foram consignados na sentença, por referência aos articulados da ação.
O Ponto 15 dos factos provados resulta do artigo 10º da petição inicial e surge na sequência do ponto 14 segundo o qual o A. não mais quis que o seu veículo estivesse à guarda daquele, pelo que lhe enviou a carta que constitui o documento nº 6 junto com a petição inicial.
Assim, o ponto 15 respeita à resposta do R. que consta documentada sob o nº 7, que o tribunal deu como reproduzida e como tendo sido emitida pelo R. e recebida pelo A., ficando igualmente provado que o R. emitiu uma fatura no valor de € 60,00 pelo trabalho de desmontar as peças, conforme o documento nº 8 junto com o mesmo articulado.
Entende o recorrente que deveria ter ficado provado ainda que em resposta o R. marido afirma que terá tudo preparado e ainda que, “erradamente”, a referida fatura “não discrimina todos os trabalhos”.
O próprio R. reconheceu no seu depoimento de parte que a fatura nº 821 (doc. nº 8) respeitou aos trabalhos de mão-de-obra para retirar a caixa de transferência e a caixa de direção (embora só aquela tivesse sido reenviada pelo A. para reclamação). Este facto é, em larga medida, descrito nos documentos nºs 7, 9 e 10. No documento 7 é o R. que afirma que tudo está pronto para ser levantado.
O ponto 15 pode e deve ser completado e mais bem concretizado, com exclusão do termo “erradamente” utilizado no artigo 10º da petição inicial.
Passa a ter o seguinte teor:
«15. Em resposta, o R. enviou ao A., que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 19 (doc. 7), aqui dado por reproduzido, pela qual afirma que terá as peças prontas para serem levantadas, e emitiu uma fatura no valor de € 60,00 (mais IVA) pelo trabalho de retirar a caixa de direção e a caixa de transferência, ali só parcialmente discriminado».

Prosseguindo agora com os pontos dados como não provados…
Ponto 35
Ficou bem patente na melhor prova produzida, incluindo no depoimento de parte do A., sem que restasse dúvida alguma, que o A. procurou a oficina do R. para desacoplar a caixa de transferência para que o próprio A. a enviasse para uma oficina situada na zona de Cascais para, aí sim, ser desmontada, no sentido de desintegrada, para deteção e reparação da avaria ou eventual substituição. Ficou claro até que tal serviço é muito especializado, poucas oficinas estão habilitadas a realizá-lo, sendo uma delas aquela que efetivamente recebeu a caixa de transferência, a desmontou e reconstruiu (recondicionou, para utilizar o termo usado pelas partes e algumas testemunhas nos seus depoimentos), identificada no documento nº 12.
A caixa de direção seria para reparar diretamente pelo R. na sua oficina, tal como o amortecedor central (ou traseiro) e o semieixo, mas não se provou que estes houvessem de ser também desmontados, no sentido de decompostos. Independentemente disso, o R. assumiu o dever de reparar estes órgãos do veículo deixando-os prontos a funcionar. O próprio o reconheceu, embora tivesse afirmado que não foi necessário desmontar a caixa da direção, tendo-se limitado a utilizar vedantes pelo exterior.
Qualquer das caixas deveriam ser aplicadas no veículo prontas a funcionar, tanto a que foi retirada para ser reparada na zona de Cascais como a caixa da direção que o R. se obrigou a reparar. Assim foi combinado entre as partes.
Com efeito, parte da matéria do ponto 35 passa para o ponto 2 dos factos provados, ficando este com a seguinte redação:
«2. No âmbito dessa atividade, o A. solicitou ao R. que procedesse, entre o mais, à desacoplagem e acoplagem de caixa de transferência pronta a funcionar, e à reparação da caixa de direção, bem como do amortecedor central e semieixo dianteiro, deixando-os também prontos a funcionar, tudo do veículo de marca Land Rover, de matrícula ..-..-CL, de que o A. era proprietário.»

Ponto 37
Não houve qualquer oposição ao facto largamente testemunhado e documentado (documentos juntos com a petição inicial) de que foi a empresa E…, Lda. que recebeu e reparou ou recondicionou a caixa de transferência do veículo, tendo depois sido remetida à oficina do R. para que a instalasse (acoplasse) no lugar próprio. Mas, seguro é também afirmar que o R. não desmontou a caixa de transferência (só a retirou para fora do veículo, recolocando-a mais tarde, depois de ter sido reparada pela E…).
Logo, o ponto 37 deve manter-se como está, transitando apenas para o ponto 4 a identificação da empresa que procedeu à reparação. O facto de os outros órgãos terem sido também acoplados pelo R. consta já provado do ponto 5.
«4. A caixa de transferência, após ter sido desacoplada pelo R., foi enviada para outra empresa, a E…, Lda., uma entidade terceira ao R., para ser recondicionada).»

Ponto 42
Grande parte do que o recorrente pretende que fique demonstrado já assim consta do ponto 13 da sentença.
O R. nunca assumiu junto do A. ou de outrem a responsabilidade por qualquer defeito surgido nos órgãos do veículo sobre os quais interveio.
Embora tal facto não tenha relevância, o R. considerou o A. desconfiado do seu trabalho, mesquinho ou picuinhas (predicado que, de alguma forma, foi reconhecida pela própria companheira do A. G… no seu depoimento). Reconheceu o ruído estranho da caixa de transferência, mas considerou que o defeito provinha de vício de reparação da empresa terceira para onde fora enviada pelo A., dizendo sempre que se limitou a acoplar a caixa no veículo. Quanto aos outros órgãos, sempre considerou que tudo ficou bem.
Sempre disse que não desmontou nem a caixa de direção nem a caixa de transferência, o que, aliás, como dissemos já, não oferece dúvidas à luz da generalidade da prova produzida, incluindo os documentos juntos com a petição inicial.
Mantém-se o ponto 42, com exceção de que o R. considerava o A. mesquinho, parte que completa o ponto 13, com o seguinte texto:
«13. Surge um desentendimento entre A. e R. devido à necessidade de acondicionar a caixa de transferência para ser enviada por transportador à referida “E…”, e o R. comunicou ao A. que não efetuaria qualquer outro trabalho para ele, incluindo qualquer reparação ou montagem das peças acima referidas, considerando-o pessoa mesquinha.»

Ponto 43
O A. nega que conhecesse o óleo usado pelo A. na caixa de transferência. O R. afirma que o A. conhecia o óleo que ele estava a usar e até que era esse óleo que devia aplicar.
Por esta via não se faz luz quanto ao facto em crise, já que cada um deles apela ao facto que lhe é favorável, sem que melhor prova permita concluir por qualquer uma das versões.
Do facto de o tribunal dar como não provado que o R. tenha usado óleo ATF (o óleo adequado) não se segue a prova do facto contrário, tal como não é por a fatura não discriminar o óleo usado que se deve concluir que o A. o desconhecia, já que frequentava a oficina do R. durante a reparação e estava também em contacto com a oficina de Cascais, sendo, aliás, pessoa muito interventiva na reparação, dando sugestões e mantendo-se vigilante do trabalho do R.
Não há prova suficiente que permita, com razoabilidade, dar como provado que o A. desconhecia o tipo de óleo que o R. havia usado e que não lhe era possível saber se era ou não era errado.
Mantém-se, assim, tal facto como não provado.

Ponto 44
Diz o A. na carta de 5.11.2014 que enviou ao R. que este também desmontou a caixa de direção para verificar qual seria o problema, mas o R. recusou-se a prestar qualquer outro serviço para ele.
Na carta do R. enviada ao A. que serviu de resposta àquela e à carta de 27 de outubro, aquele refere que só por o A. o ter solicitado desmontou também a caixa de direção, considerando não ter qualquer responsabilidade com eventuais problemas da mesma.
No seu depoimento de parte, o R. afirmou que aquela caixa foi montada e ficou a funcionar na perfeição, continuando a não reconhecer qualquer problema relacionado com o seu funcionamento.
O documento nº 12 junto com a petição inicial nada aponta relativamente a este órgão do motor.
É certo que a testemunha H…, o responsável pela reparação da caixa de transferência, em Cascais, referiu no seu depoimento que a caixa de direção teve que ser também toda recondicionada e que o que até então foi feito nela era o mesmo que nada. Todavia isto não significa que o A. tivesse sido informado dessa situação pela oficina de Cascais nas circunstâncias em que esta emitiu a informação que consta do documento nº 12. O que resulta dos documentos de fl.s 9 e 10, por confissão do R., é que, a pedido do A., quando retirou a caixa de transferência para enviar de novo para Cascais, também retirou a caixa de direção, mas nunca reconheceu que tivesse qualquer vício.
A G…, não obstante a segurança do seu depoimento, é a companheira do A. e gerente da ótica que aquele explora. Dizer, como disse, que o R. aceitou verificar a caixa de direção quando retirou a caixa de transmissão para enviar para Cascais é pouco para se poder dar como provada a matéria do ponto 44.
Não há prova suficiente para fazer transitar o artigo 20 da petição inicial (ponto 44 da sentença) da matéria não provada para os factos provados.

Ponto 46
Provado o ponto 22 da sentença, o A. pretende que se considere provado o que resta do artigo 26º da petição inicial, mais concretamente, que o A. não tinha, na altura, disponibilidade de outro com o qual se pudesse transportar com a mesma liberdade e autonomia.
O recorrente chama à colação o depoimento da sua companheira que falou na apreensão de outros veículos (sete) do A. que constituíam bens comuns do casal e que, apesar do divórcio, ainda não estavam partilhados. É matéria que deveria ter sido provada por documentação extraída do respetivo processo, e não foi. Na expressão daquela testemunha seriam vários clássicos, entre outras marcas, Alfa Romeo e Jaguar. Na realidade, não nos fornecem os autos elementos que nos permitam concluir que o A. não podia utilizar aqueles automóveis.
Neste ponto, o próprio A. foi muito parco no seu depoimento, tendo-se limitado a referir que na altura ainda tinha a carrinha da sua empresa e ainda podia usar, como usou, o automóvel da sua companheira (marca Audi, como ela referiu). Acrescentou ainda que o Land Rover não era o carro em que se deslocava diariamente, mas que gostava de andar nele. Estranhamente, a sua companheira acentuou uma falta do Land Rover que o próprio A. relevou superficialmente, sem apelo a transtorno e prejuízo para a sua liberdade e autonomia.
A matéria deste ponto 46 deve permanecer não provada.

Ponto 47
O veículo sofreu uma imobilização, para reparação, de cerca de 3 meses. Não é possível dar como provado que o R., sem razão, se recusava a reparar o Land Rover e que, por isso, o A. sofreu grande tristeza, desconsolo e revolta. Isso seria praticamente decidir a questão. Mas é normal que a situação descrita nos factos provados tenha causado ao A. o transtorno próprio de quem se vê na contingência ali descrita e que, por isso, passou por algum desapontamento e tristeza. Mas nada mais do que isto se provou.
Assim adita-se aos factos provados o seguinte ponto novo (que, nessa medida se retira da matéria não provada):
«22-A. Esta situação causou ao A. transtorno, desapontamento e tristeza.»

Ponto 48
Não ficou dúvida razoável, pela conjugação da troca de correspondência entre A. e R. junta com a petição inicial, com a análise do documento nº 14 e o depoimento testemunhal de H… que a intervenção da E… posterior à reparação inicial (de junho de 2014) da caixa de transferência se destinou a reparar avarias nos órgãos do motor identificados na referida fatura proforma: na caixa de transferência, na caixa de velocidades e na caixa de direção. Não sabemos, porém, se eram, e em que medida, para além do que já foi dado como provado, defeitos resultantes da intervenção do R. ou de terceiro.
Deste modo, complementa-se o ponto 23 da sentença nos seguintes termos (fincando, nessa medida, reduzido o ponto 48:
«23. O A. obteve da referida empresa o valor total a pagar, o qual ascende ao montante de € 3.967,72 relativo a reparação de avarias nos órgãos do motor identificados no documento nº 14 junto com a petição inicial.»

Ponto 49
Não há dúvida que o veículo teve que ser transportado para a zona de Cascais, a partir de Penafiel, pelo menos sem a caixa de transmissão. Dali teve que regressar a Penafiel. Da conjugação dos depoimentos das testemunhas G… e H…, entre si e com os documentos nºs 15 a 17, parece-nos razoável o valor em causa, razão pela qual este facto deve transitar para os factos provados, sendo retirado dos factos não provados.
Não foi feita qualquer prova --- nem a ela foi submetido --- de que aquela reparação pudesse ser feita numa oficina mais próxima, igualmente especializada.
«24-A. O A. teve de pagar a quantia de € 240,00 (duzentos e quarenta euros) pelo transporte do seu veículo de Penafíel até Cascais e regresso.»

Ponto 50
Deste ponto consta a expressão “… o que não fez”, pretendendo o recorrente que seja dada como provada.
Como em si mesma não faz qualquer sentido, vejamos o artigo 34º[19] da petição inicial, de onde foi retirada.
Reza aquele artigo: «O R. marido estava obrigado a desempenhar de forma irrepreensível a sua actividade e montar ou colocar as peças supra identificadas, de forma a poderem funcionar sem qualquer problema e de forma a não se estragarem, o que não fez. A presente acção tem por fundamento legal o disposto, na Lei do Consumidor, no DL nº 67/2003, de 8 de Abril, com as alterações do DL 84/2008, de 21 de Maio, ou caso assim não se entenda, entre o mais, no disposto nos art.°s 1207.° e ss. do Código Civil.»
Dividido por partes, o dito artigo 34º está integrado numa parte da petição inicial que o próprio A. intitulou “DO DIREITO” e que normalmente é destinada à subsunção jurídica, como aconteceu no caso.
Ainda assim podem ali conter-se factos concretos que relevem para efeito de prova e decisão final.
Perguntamos: O que é que o R. marido não fez?
Segundo o artigo, não desempenhou de forma irrepreensível a sua atividade de montar ou colocar as peças de forma a poderem funcionar sem qualquer problema e de forma a não se estragarem.
Como refere Antunes Varela[20], “facto e direito são, na verdade, elementos que continuamente se interpenetram e que reciprocamente se influenciam em diversos pontos do percurso da acção cível, seja na selecção dos factos juridicamente relevantes, seja na qualificação jurídica dos factos verificados, seja na complexa elaboração lógico-emocional da decisão final da causa”, não sendo possível encontrar um critério universal que estabeleça a distinção entre os dois campos. A linha divisória entre a matéria de facto e a matéria de Direito não é fixa, dependendo em larga medida dos termos em que a lide se apresenta.
O que, num caso, se apresenta como facto ou juízo de facto, pode ser Direito ou juízo de direito noutro. Os limites entre um e outro são flutuantes[21].
Acaso o objeto da ação esteja, total ou parcialmente, dependente do significado real das expressões técnico-jurídicas utilizadas, há que concluir que estamos perante matéria de Direito e que tais expressões não devem ser submetidas a prova e não podem integrar a decisão sobre matéria de facto. Se, pelo contrário, o objeto da ação não girar em redor da resposta exata que se dê às afirmações feitas pela parte, as expressões utilizadas, sejam elas de significado jurídico, valorativas ou conclusivas, poderão ser integradas na matéria de facto, passível de apuramento através da produção dos meios de prova e de pronúncia final do tribunal que efetua o julgamento, embora com o significado vulgar e corrente e não com o sentido técnico-jurídico que possa colher-se nos textos legais.
Alberto dos Reis[22] enuncia um interessante princípio geral quanto à distinção entre facto e Direito:
a) É questão de facto tudo o que tende a apurar quaisquer ocorrências da vida real, quaisquer eventos materiais e concretos, quaisquer mudanças operadas no mundo exterior;
b) É questão de direito tudo o que respeita à interpretação e aplicação da lei”.
Simplificando mais, acrescenta:
“a) É questão de facto determinar o que aconteceu;
b) É questão de direito determinar o que quer a lei, ou seja a lei substantiva, ou seja a lei do processo.
Retomando o caso, com toda a evidência, está em causa uma conclusão a que o A. chegou sobre a atuação do R., um juízo de valor sobre factos, não propriamente factos concretos.
No conceito de facto, para efeito do art.º 5° do Código de Processo Civil, cabem não apenas os acontecimentos do mundo exterior (da realidade empírico-sensível) diretamente captável pelas perceções do homem, mas também os eventos do foro interno, da vida psíquica, sensória) ou emocional do indivíduo (v. g., a vontade real do declarante o conhecimento dessa vontade pelo declaratário, as dores físicas ou morais provocadas por uma agressão corporal ou por uma injúria), mas não cabem os juízos de valor, as apreciações críticas e qualificativas dos factos, ainda que em jeito de conclusão.
Com efeito, releva como facto o que o R. marido fez em concreto, ou deixou de fazer, assim como aquilo a que se obrigou a fazer ou deveria fazer. Dizer que o R. não fez o que deveria ter feito de forma irrepreensível de forma a poder funcionar, resolveria, por si só, a questão, é uma conclusão a que o tribunal poderá chegar na aplicação do Direito, mas sempre em função de factos concretos provados que a ação tem que conter.
Ao contrário do que pretende o A., esta matéria não pode ir aos factos provados como destes deve ser retirado o que consta do ponto 25.
A seu tempo se verá se o R. marido fez ou não fez o que devia.

Concluída a revisão da decisão em matéria de facto, por terem expressão significativa as alterações introduzidas, transcrevem-se agora os factos provados definitivamente fixados:[23]
Da Petição Inicial
1) O R. é empresário em nome individual e tem a profissão de mecânico, sendo, por isso, profissional de reparação de veículos automóveis, com oficina de reparação automóvel aberta ao público na freguesia …, concelho de Penafiel. (artigo 1.º)
2) No âmbito dessa atividade, o A. solicitou ao R. que procedesse, entre o mais, à desacoplagem e acoplagem de caixa de transferências pronta a funcionar, e à reparação da caixa de direção, bem como do amortecedor central e semieixo dianteiro, deixando-os também prontos a funcionar, tudo do veículo de marca Land Rover, de matrícula ..-..-CL, de que o A. era proprietário. (artigo 1.º)
3) O R. aceitou e procedeu à reparação da caixa de direção. (artigo 2.º)
4) A caixa de transferência, após ter sido desacoplada pelo R., foi enviada para outra empresa, a E…, Lda., uma entidade terceira ao R., para ser recondicionada. (artigo 2.º)
5) Após o regresso desta peça o R. colocou óleo e acoplou todas as peças no veículo e, em 06 de junho de 2014, entregou-o ao A. (artigo 2.º)
6) Em contrapartida, o A. pagou ao R., nesse mesmo dia, por cheque, o preço convencionado pela obra ou trabalhos feitos no valor de € 1.350,00 (mil trezentos e cinquenta euros). (artigo 2.º)
7) Em finais de setembro de 2014, a caixa de transferências começou a fazer um barulho ensurdecedor, como se estivesse a bater a seco e a manete pulava. (artigo 3.º)
8) Sentiu ainda o A. que a caixa de velocidades tornou-se dura e de difícil manuseamento, ao engrenar as velocidades e em andamento saltava e desengrenava e que o volante, quando em andamento mesmo em baixa velocidade, trepidava e não obedecia completamente ao que era ordenado com o seu manuseamento e ouvia-se barulho da caixa de direção à medida que era acionado o volante. (artigo 3.º)
9) Ainda em finais de setembro de 2014 o A. dirigiu-se à oficina de reparação automóvel do R. e denunciou os problemas sentidos, reclamando a reparação dos mesmos, o que levou o R. a comunicar ao A. que teria de retirar aquelas peças a fim de averiguar qual o problema, informando ainda que a caixa de transferência estaria avariada, mas que estava dentro da garantia da empresa que havida recondicionado a mesma. (artigo 4.º)
10) O A. pediu ao R. a emissão da fatura dos trabalhos prestados em maio/junho de 2014, ... (artigo 5.º)
11) O R. emitiu as duas faturas que constituem os documentos juntos a fls. 13/4, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido no valor total de € 1.350,61, coincidente com o cheque recebido. (artigo 6.º)
12) A caixa de transferência foi, então, retirada do jipe pelo R. e enviada à empresa E…, Lda. (artigo 7.º)
13) Surge um desentendimento entre A. e R. devido à necessidade de acondicionar a caixa de transferência para ser enviada por transportador à referida “E…”, e o R. comunicou ao A. que não efetuaria qualquer outro trabalho para ele, incluindo qualquer reparação ou montagem[24] das peças acima referidas, considerando-o pessoa mesquinha. (artigo 8.º)
14) Perante a posição do R., o A. não mais quis que o seu veículo estivesse à guarda daquele, pelo que lhe enviou a carta que constitui o documento junto a fls. 16 cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, e que o Réu recebeu. (artigo 9.º)
15) Em resposta, o R. enviou ao A., que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 19 (doc. 7), aqui dado por reproduzido, pela qual afirma que terá as peças prontas para serem levantadas, e emitiu uma fatura no valor de € 60,00 (mais IVA) pelo trabalho de retirar a caixa de direção e a caixa de transferência, ali só parcialmente discriminado. (artigo 10.º)
16) O A., ao receber a dita fatura, enviou ao R., que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 21, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 11.º)
17) Em resposta o R. enviou ao A., que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 24, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 12.º)
18) A caixa de transferências no jipe não podia vir da oficina que fez o recondicionamento com óleo, devendo este ser colocado pelo profissional, mecânico, que acopla a caixa ao veículo. (artigos 15.º e 16.º)
19) O A. enviou ao R., que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 25, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido e devolve a fatura acima identificada, que por lapso não havia ainda devolvido. (artigo 17.º)
20) Em novembro de 2014 o A. recebe da empresa “E…, Lda.”, a comunicação datada de 29-10-2014, que consta a fls. 28, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, pela qual faz saber que não é aceite a reclamação de cobertura da garantia para a caixa de transferência, porque o mecânico que efetuou a montagem e acoplagem da caixa de transferência, ou seja o R., introduziu óleo valvulina 75W80 ou 75W90, quando devia ter introduzido o óleo ATF, o que causou a avaria da caixa de transferência e, consequentemente, causou a avaria da caixa de velocidades, pelo que a reparação da caixa de velocidades ao abrigo da garantia da caixa de transferência também não foi aceite. (artigo 18.º)
21)) O A. enviou ao R., que a recebeu, a carta que constitui o documento junto a fls. 29, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido. (artigo 21.º)
22) O A. ficou impossibilitado de se fazer transportar no veículo em causa, o qual era usado por si para a sua vida pessoal e profissional. (artigo 26.º)
22-A) Esta situação causou ao A. transtorno, desapontamento e tristeza. (art.º 27.º)
23) O A. obteve da referida empresa o valor total a pagar, o qual ascende ao montante de € 3.967,72, relativo a reparação de avarias nos órgãos do motor identificados no documento nº 14 junto com a petição inicial. (artigo 29.º)
24) O A., através do seu mandatário e por meio da carta que consta a fls. 36, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido, interpelou o R. para que procedesse ao pagamento da dita quantia, sendo certo que o R. não respondeu por escrito, mas também não procedeu a qualquer pagamento. (artigo 30.º)
24-A) O A. teve de pagar a quantia de € 240,00 (duzentos e quarenta euros) pelo transporte do seu veículo de Penafíel até Cascais e regresso. (artigo 31.º)
25) (…) Eliminado
26) O R., à data do contrato celebrado com o A., era empresário em nome individual, dedicando-se à prossecução da atividade de exploração de oficina de reparação automóvel, mudança de filtros, óleo, serviço de inspeção, reparação de peças mecânicas de veículos automóveis. (artigo 35.º)
27) Os rendimentos que o R. obtinha com a sua atividade tinham em vista beneficiarem a sua vida atual e futura e a do casal, nomeadamente para suportar as despesas com eletricidade, água, compras de mercearia, despesas médicas e demais gastos familiares. (artigo 36.º)
Da Contestação
28) Foi também montado o amortecedor central do veículo que foi fornecido pelo A., em virtude de o anterior estar a verter óleo. (artigo 3.º)
29) Como o semieixo se encontrava partido, também foi substituído pelo R. (artigo 4.º)
30) A caixa de direção foi retirada para substituição de um vedante exterior, face à existência de uma fuga de óleo, sem ser aberta, e posta novamente no lugar. (artigo 5.º)
31) A caixa de transferência, depois de retirada do veículo, foi enviada pelo A. para outra empresa, cuja identificação o R. desconhece, para ser reparada/recondicionada. (artigo 7.º)
32) Posteriormente, o A. entregou ao R. a caixa de transferência que a colocou na viatura, sem a abrir ou desmontar, bem como a caixa de velocidades, com a colocação de óleo nas mesmas … (artigo 8.º)
33) Em finais de setembro de 2014, o A. deslocou-se novamente à oficina do R. porque, eventualmente, teria problemas na viatura, tendo o R. verificado que a caixa de transferência estaria avariada, pelo que, a solicitação do A., a retirou, sem a desmontar e o informou que deveria reclamar junto da empresa que efetuou a sua reparação. (artigo 12.º)
34) O A. tem outros veículos de sua propriedade, ou das empresas de que é proprietário, em que se pode transportar, designadamente, veículos similares e da mesma marca. (artigo 52.º)
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3. A aplicação do Direito e a sorte da ação
No essencial, o apelante defende que, estando em causa responsabilidade contratual e cabendo aos RR. ilidir a presunção de culpa que sobre o R. marido recai, esta não foi ilidida, devendo considerar-se que agiu com omissão do zelo exigível, tanto na reparação do veículo Land Rover do A. como ao recusar eliminar os defeitos encontrados na sequência dessa reparação, atempadamente denunciados. Dali resultaram os prejuízos cuja indemnização, na sua perspetiva, se impõe, quer por danos patrimoniais, quer por danos não patrimoniais.
Nas relações negociais, os contraentes são inteiramente livres, tanto para contratar ou não contratar, como para fixar o conteúdo das relações contratuais que estabeleçam, desde que não violem lei imperativa, nomeadamente baseada em imperativos éticos e sociais, ou mesmo de segurança do comércio jurídico, ditame de ordem pública ou bons costumes que se oponham[25]. A regra é a liberdade de fixação do conteúdo contratual com o alcance de que as partes são livres na configuração interna dos contratos que realizam (art.º 405º do Código Civil).
Acima de quaisquer elementos objetivos, o elemento fundamental a considerar é sempre constituído pela vontade dos contraentes. A qualificação jurídica do negócio há de resultar, em larga medida, do que tiver sido pretendido pelas partes, que não terão deixado, em qualquer caso, de configurar na sua mente o contrato em causa e o seu regime.
Entre o A. e o R. marido foi celebrado um contrato pelo qual o R., na qualidade de empresário mecânico auto em nome individual, assumiu a obrigação de realizar uma obra solicitada pelo A., consistente na execução de determinados trabalhos no veículo deste último, mediante o pagamento do respetivo preço.
Tal acordo enquadra-se perfeitamente nos contratos de prestação de serviços, na modalidade de empreitada, nos termos dos art.ºs 1155º e 1207º e seg.s do Código Civil.
O contrato de empreitada tem como matriz a realização de uma obra. É um contrato sinalagmático, oneroso, comutativo e consensual, porque dele emergem, por um lado, obrigações recíprocas e interdependentes; a obrigação de realizar a obra tem como contrapartida direta o dever de pagar o preço. O esforço económico é suportado pelas duas partes e há vantagens correlativas para ambas. Essas vantagens são delas conhecidas no momento do ajuste e a validade das concernentes declarações negociais depende do seu mero consenso.
Adota-se naquele art.º 1207º o conceito comum e amplo de obra, equivalente à obtenção de um resultado material que abrange a criação ou construção, reparação, modificação ou demolição de coisas móveis ou imóveis[26].
A obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, obrigando-o, não só a efetuar os trabalhos e a fornecer os materiais, como a obter um resultado final: que a obra fique concluída em conformidade com o convencionado e sem vícios que a desvalorizem.
Tanto o empreiteiro como o dono da obra estão adstritos ao princípio da boa fé. Este princípio, em sentido objetivo, acompanha a relação contratual desde o seu início, permanece durante toda a sua vida e subsiste mesmo após se ter extinguido. Está presente, além do mais, na formação do contrato e na sua execução e cumprimento. Como ensina Mota Pinto[27], “do contrato fazem parte não só as obrigações que expressa ou tacitamente decorrem do acordo das partes, mas também, designadamente, todos os deveres que se fundam no princípio da boa fé …Nesta linha, importa sublinhar o papel decisivo deste instituto no enriquecimento do conteúdo do contrato, mormente por constituir a matriz dos denominados deveres laterais, como os deveres de cuidado para com a pessoa e o património da contraparte, os deveres de informação e esclarecimento, etc.”. Acrescenta o mesmo insigne professor[28] que em certos casos, deve relevar juridicamente a confiança justificada de alguém no comportamento de outrem, quando este tiver contribuído para fundar essa confiança e ela se justifique igualmente em face das circunstâncias do caso concreto. Deve ainda ser dada satisfação ao interesse do credor com o menor sacrifício possível do devedor.
O incumprimento ou o cumprimento defeituoso gera responsabilidade contratual, a que são aplicáveis as respetivas regras comuns, previstas nos art.ºs 798º e seg.s do Código Civil, com as especificidades do regime da empreitada para a verificação, denúncia e reparação dos defeitos da obra (art.ºs 1218º e seg.s do mesmo código).
Os elementos da responsabilidade obrigacional não diferem, em grande parte dos seus aspetos, daqueles que dizem respeito à responsabilidade extracontratual ou aquiliana. Numa e noutra formas de responsabilidade é necessário que haja uma ação humana que constitua um ato ilícito, que haja culpa, um prejuízo e nexo causal, assim, uma relação de causa-efeito, entre o facto do incumprimento e o dano.
A responsabilidade contratual distingue-se da responsabilidade por atos ilícitos, sobretudo, pela natureza do ato ilícito que, naquela constitui a violação de uma obrigação, e pelas regras de distribuição do ónus da prova já que ali se presume a culpa e é imposta ao devedor a prova de que agiu sem ela no incumprimento ou no cumprimento defeituoso da obrigação (art.º 799º, nº 1, do Código Civil), enquanto na responsabilidade aquiliana cabe a lesado a prova da culpa do lesante (art.º 487º, nº 1, do Código Civil), sendo a culpa, em qualquer caso, apurada com base num critério abstrato, pela “diligência de um bom pai de família, em face das circunstâncias de cada caso” (nº 2 de uma e outra disposições legais acabadas de citar).[29]
No caso sub judice, compete ao A. a alegação e a prova dos vários elementos constitutivos do contrato (art.º 342º, nº 1, do Código Civil) e, quanto à patologia do seu cumprimento, que a obra não foi cumprida ou foi cumprida de forma viciada, defeituosa, e que dessa violação resultaram, como consequência direta e necessária, determinados prejuízos cuja reparação requereu.
Provados aqueles elementos, designadamente o incumprimento ou os defeitos no cumprimento, aos RR., para se livrarem da responsabilidade, compete demonstrar que o R. marido agiu sem culpa na execução do contrato.
Na culpa, há simples desleixo, imprudência ou inaptidão. O resultado ilícito deve-se somente a falta de cuidado, imprevidência ou imperícia. A negligência pode ser consciente ou inconsciente, ocorrendo a primeira quando o agente prevê como possível a produção do resultado, mas, por leviandade, precipitação, desleixo ou incúria acredita na sua não verificação e não toma as providências necessárias para o evitar, enquanto na segunda, por imprevidência, descuido, imperícia ou inaptidão, não prevê sequer a possibilidade de verificação ou realização do facto, embora pudesse prevê-lo e evitar a sua verificação se usasse da diligência devida.
Noutra classificação, a primeira forma de culpa (grave) traduz-se no facto do agente não fazer o que faz a generalidade das pessoas, em não observar os cuidados que todos, em regra, observam, é uma culpa grosseira, no sentido de que se situa muito abaixo do modo habitual de proceder[30] (non intelligere quod omnes intelligunt), o agente age como uma pessoa extremamente desleixada e por isso se reveste de mais elevado grau de censurabilidade; a segunda (leve) ocorre quando é omitida a diligência normal e a terceira (levíssima) dá-se quando são omitidos cuidados especiais que só as pessoas mais prudentes observam.
A culpa consiste, portanto, basicamente, na imputação da conduta violadora dom dever de cumprimento ao obrigado, num juízo de censura.[31]
Importa ponderar, no caso, a eventual aplicação do Decreto-lei nº 67/2003, de 8 de abril, alterado pelo Decreto-lei nº 84/2008, de 21 de maio, vindicada pelo recorrente, designadamente o respetivo art.º 3º, nº 2, segundo o qual “as faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respectivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade”.
Aquele diploma transpôs para o direito interno a Diretiva n.º 1999/44/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de maio, relativa a certos aspetos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, com vista a assegurar a proteção dos interesses dos consumidores (art.º 1º). É aplicável aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores (art.º 1º-A, nº 1) e ainda, com as necessárias adaptações, aos “bens de consumo fornecidos no âmbito de um contrato de empreitada ou de outra prestação de serviços, bem como à locação de bens de consumo” (nº 2).
Transpôs-se, concretamente, um novo regime jurídico para a conformidade dos bens móveis com o respetivo contrato de compra e venda, celebrado entre profissional e consumidor.
Para efeitos da Diretiva em apreço, são igualmente considerados contratos de compra e venda “os contratos de fornecimento de bens de consumo a fabricar ou a produzir” (respetivo art.º lº, n° 4), abrangendo, por conseguinte, as empreitadas de coisas móveis de consumo a fabricar ou produzir com ou sem materiais do fornecedor-empreiteiro.[32]
Como refere ainda quele professor[33], a falta conformidade resultante de incorreta instalação do bem é equiparada à falta de conformidade do próprio bem, se a instalação faz parte da venda e tiver sido realizada pelo vendedor ou sob sua responsabilidade. A aplicação das regras da compra e venda aos serviços de instalação dos bens de consumo alienados funda-se na ligação estreita e funcionalmente subordinada desta prestação “secundária” ou “acessória” de facere à obrigação principal de entrega do bem conforme ao contrato, evidenciando a complexidade da relação obrigacional vista como processo, e na necessidade de proteger de igual modo o consumidor.
Assim, na empreitada de reparação de um automóvel, aquele regime jurídico só é aplicável se o empreiteiro, na prestação do seu serviço, a título principal, incluiu na obra determinados bens, relativamente à qualidade dessa instalação. Tendo-o feito, deve equiparar-se à falta de conformidade a má instalação da coisa por ele fornecida (vício extrínseco).
Em caso de falta de conformidade do bem com o contrato, o consumidor tem direito a que esta seja reposta sem encargos, por meio de reparação ou de substituição, à redução adequada do preço ou à resolução do contrato (art.º 4º, nº 1, do Decreto-lei nº 67/2003).
Adiante veremos se os factos consentem a responsabilização do R. nos termos daquele regime jurídico da venda de bens de consumo e das garantias a eles relativas, do Decreto-lei nº 67/2003, de 8 de abril.
Para já, vamos retomar o caso concreto para ver o que foi efetivamente contratado e executado, e verificar os pressupostos gerais da responsabilidade contratual.
O A. contratou com o R. a prestação dos serviços de mecânica no seu veículo Land Rover em dois níveis diferentes, a saber:
a) Quanto à caixa de transferências, retirá-la para que o próprio A. a pudesse enviar para uma terceira empresa onde seria reparada e, devolvida à oficina do R., acoplá-la no lugar próprio, colocando-lhe o óleo adequado, assim a deixando pronta a funcionar;
b) Relativamente à caixa de direção, ao amortecedor central e ao semieixo dianteiro, repará-los, deixando-os prontos a funcionar.
Não consta que tivesse surgido qualquer problema com a reparação do amortecedor central e do semieixo dianteiro, sendo que o primeiro vertia óleo e foi simplesmente substituído por outro amortecedor, fornecido A., tendo o R. substituído também o semieixo.
O litígio respeita à matéria da caixa de transferência e da caixa de direção.
Sintetizemos o que se passou com cada um desses órgãos do motor.
A caixa de transferência
Era obrigação contratual do R. retirar aquela caixa (sem a desmontar, ou seja, sem a decompor ou desintegrar), entregá-la ao A., recebê-la, depois de reparada por uma empresa da especialidade, e acoplá-la no lugar próprio, colocando-lhe óleo, deixando-a pronta a funcionar.
Assim aconteceu: o R. retirou a caixa de transferência, entregou-a ao A. que a enviou para a empresa E… para reparar. Após o regresso do órgão, o R., em junho de 2014, colocou-lhe óleo, acoplou-o no Land Rover e entregou-o de seguida ao A., cobrando preço do serviço.
Porém, cerca de três meses depois (no final setembro), a caixa de transferência começou a fazer um “barulho ensurdecedor”, como se estivesse a bater a seco, e a manete da caixa de velocidades pulava, tornando-se esta dura e de difícil manuseamento. Informado sobre a situação, o R. admitiu a existência de avaria na caixa de transferência e recomendou ao A. que reclamasse junto da empresa que procedera à reparação, o que efetivamente aconteceu, com nova retirada da caixa pelo R. com envio para a E…, tendo esta empresa enjeitado qualquer responsabilidade e informado o A. de que a avaria resultava da aplicação de óleo inadequado e impróprio naquela caixa por quem a instalou no veículo (o R.).
Já quando o R. retirou de novo aquela caixa para enviar para a empresa reparadora, se desentendeu com o A. e lhe deu conta de que não efetuaria qualquer outro serviço para ele, incluindo a reinstalação da peça.
Pois bem…
A referida informação fornecida ao A. E… não é mais do que isso mesmo: uma informação prestada por um interessado, a empresa que reparou a caixa de transferência. Não é um resultado pericial e não é facto provado que o R. introduziu na caixa de transferência um óleo inadequado àquele órgão do motor e que a referida avaria resultou da utilização desse óleo.
Fora das situações de origem convencional e legal (como é o caso da obrigação de garantia na legislação de proteção do consumidor), a obrigação do empreiteiro é uma obrigação de resultado, em que este assume o dever de realização duma determinada obra, de acordo com o convencionado e sem vícios que excluam ou reduzam o seu valor, ou a sua aptidão para o uso ordinário ou previsto no contrato (art.° 1208° do Código Civil), não sendo responsável pela não obtenção deste resultado, quando esse fracasso é imputável a causas que não possa dominar.[34]
Assim, relevando a culpa do empreiteiro na realização da obra com defeitos, ela presume-se, como sucede nos casos de responsabilidade contratual por cumprimento defeituoso (art.° 799°, n° l, do Código Civil). Ao credor basta demonstrar a materialidade do incumprimento, cabendo ao devedor provar a ausência do nexo de imputação à sua pessoa desse incumprimento, o qual se presume iuris tantum. O estabelecimento desta presunção resulta do facto de, sendo a culpa, segundo as regras da experiência, normalmente inerente ao incumprimento contratual, deve competir ao devedor provar a verificação da situação anormal de ausência de culpa. Sendo ele que controla e dirige a execução da prestação, tem maior facilidade de conhecer e demonstrar as causas da verificação do incumprimento.
Assim, ao dono da obra bastará provar a existência do defeito[35], presumindo-se a culpa do empreiteiro, o qual, para afastar a sua responsabilidade terá que demonstrar que o cumprimento defeituoso não procede de culpa sua. O empreiteiro tem que provar a causa do defeito, a qual lhe deve ser completamente estranha, o que bem se compreende pelo domínio que este necessariamente teve do processo executivo da prestação. Só assim se exonerará da responsabilidade pelo defeito existente na obra por si realizada.[36]
Segundo Pedro Romano Martinez[37], o empreiteiro, para afastar a presunção e culpa, só pode invocar três causas: força maior, atitude negligente da contraparte e facto de terceiro. A falta de culpa só é invocada para resolver casos extremos, em que seria injusto responsabilizar o devedor.
O caso em análise acolhe uma particularidade que o afasta do caso típico da relação dono da obra/empreiteiro: na reparação do veículo do A. intervieram, como empreiteiros, o R. e a E…, cada um com uma parte da obra, mas no âmbito do mesmo processo de reparação; o que é frequente nas empreitadas de construção civil, em que intervêm na obra diversos empreiteiros, cada um com a sua especialidade ou arte (pedreiros, estucadores, carpinteiros, canalizadores, eletricistas, para referir apenas alguns dos especialistas).
A este propósito, Cura Mariano escreveu na obra já referida[38]: “Há também que ponderar, como circunstância excluidora da culpa do empreiteiro pela verificação dos defeitos, as situações em que a complexidade da construção conduza a uma multiplicidade de sujeitos autónomos, intervenientes na realização da obra, nomeadamente a existência de diversos empreiteiros a quem compete a realização de diferentes partes da obra.
Nestes casos, o empreiteiro pode exonerar-se, se demonstrar que a causa do defeito é imputável a um desses co-intervenientes, desde que a intervenção deste não resulte de sub-contratação sua. (…)”.
Deverá ser assim?
Respeitosamente, entendemos que não, tendo designadamente em consideração o que já referimos ser a causa justificativa da presunção de culpa do devedor prevista no art.º 799º do Código Civil.
Em que situação de vantagem é colocado, pelo contrato, o empreiteiro que realiza uma obra sobre a qual não teve o domínio exclusivo do respetivo processo executivo?
Que facilidade tem o R. em afastar a sua culpa se, por exclusiva iniciativa contratual do A., interveio um terceiro, até desconhecido do R., na realização sucessiva parcial da mesma obra de reparação da caixa de transferência do motor do veículo do A.?
Que domínio poderá o R. ter da obra em causa se, no respetivo processo, tendo em vista o mesmo resultado, o A. fez intervir diretamente um terceiro na sua execução?
Poderá argumentar-se que, não obstante a E… e o R. deverem concorrer para a reparação daquela mesma avaria, ambos com serviços de mecânica, estavam contratualmente obrigadas a realizar tarefas diferentes na obra: a primeira com o dever de abrir e reparar aquele órgão do motor e o segundo com a obrigação de o retirar previamente dali e de o repor no local próprio após a dita reparação.
É verdadeira esta aceção. Cada um deles agiu no âmbito de um contrato diferente celebrado com o A., mas também por isso, antes da questão da culpa se coloca o problema do incumprimento, competindo ao dono da obra demonstrar qual dos intervenientes falhou na execução do respetivo contrato autónomo.
Cada contrato encerra determinado conjunto de direitos e obrigações e o risco próprio do seu incumprimento por cada uma das suas partes contratantes. É inaceitável que aquele que teve a iniciativa de contratar autonomamente os dois interveniente na obra, demandando apenas um deles, faça recair sobre o mesmo o ónus de provar o incumprimento contratual da E…, assim, o risco de incumprimento que resulta de um contrato que lhe é de todo estranho e que não pode dominar.
Nestas circunstâncias, a presunção de culpa do empreiteiro tem que ser mitigada, desde logo pela prévia alegação e prova, pelo A., não apenas de que o defeito existe, mas também que resultou no âmbito da prestação do R., ou seja, que foi o R. que não cumpriu ou que cumpriu de forma deficiente a sua obrigação contratual de desacoplar e acoplar a caixa de transferências no motor do veículo, de acordo com a leges artis de mecânico.
Note-se que até a prova da aplicação do óleo adequado na caixa de transferências já seria uma tarefa, se não impossível, pelo menos muito difícil para o R. que, por ação do A., não mais teve ao seu alcance a caixa de transferência depois de a ter retirado para ser remetida a Cascais onde foi reparada de novo (recondicionada) e aplicada no veículo, por certo, sem deixar vestígios do tipo de óleo que ali fora aplicado pelo demandado.
Pode mesmo questionar-se se a obrigação contratual do terceiro E… não abrangeria o dever de fazer acompanhar o órgão por ele reparado de instrução relativa ao óleo a aplicar no momento da sua reposição no motor, ou seja, se a escolha desse óleo integra o dever de reparação da E… ou se, diferentemente, faz parte do dever de acoplar, de repor, a peça no local próprio do motor (dever do R.).
Por tudo quanto fica exposto, concluímos que não está provado que o defeito detetado na caixa de transferências resultou de incumprimento ou cumprimento defeituoso do contrato celebrado com o R., matéria que está fora e é prévia ao âmbito da presunção de culpa do devedor empreiteiro, sendo do A. o ónus da sua demonstração enquanto pressuposto da responsabilidade (contratual), nos termos do art.º 342º, nº 1, do Código Civil. Daí que não possa ser assacada ao R. e à sua mulher qualquer responsabilidade pelas consequências danosas do defeito detetado na caixa de transferências, no âmbito de aplicação do regime geral da responsabilidade contratual que emana do Código Civil.
O A. apelou à aplicação do regime do Decreto-lei nº 67/2003, de 8 de abril.
Já acima nos referimos à aplicação daquele regime à conformidade dos serviços prestados pelo empreiteiro apenas quando este fornece essencialmente e integra na obra bens de consumo. É o que resulta do nº 4 do art.º 2º.
Mesmo admitindo que o A. é consumidor no negócio em causa --- e parece-nos que os elementos dos autos não são seguros nessa qualificação (art.ºs 1º, 1º-A, 1º-B, al. a) e 2º[39])[40] --- e que está demonstrada alguma falta de conformidade, a presunção a que se refere o nº 2 do art.º 3º do Decreto-lei nº 67/2003[41], só relevaria se o A. tivesse feito prova de que essa desconformidade se situa no âmbito da relação contratual que teve com o R. marido de desacoplar e acoplar a caixa de transferência e que tal serviço sempre respeitaria à instalação de um qualquer bem por ele fornecido --- “vendido”, na expressão da lei (nº 4 do art.º 2º), elementos de que efetivamente não dispomos.

Não ocorre designadamente nenhuma das situações que, nos termos do nº 2 do citado art.º 2º permitem estabelecer a presunção, neste caso, de que o serviço prestado não está conforme com o contrato e que se especificam nas seguintes alíneas:
a) Não serem conformes com a descrição que deles é feita pelo vendedor ou não possuírem as qualidades do bem que o vendedor tenha apresentado ao consumidor como amostra ou modelo;
b) Não serem adequados ao uso específico para o qual o consumidor os destine e do qual tenha informado o vendedor quando celebrou o contrato e que o mesmo tenha aceitado;
c) Não serem adequados às utilizações habitualmente dadas aos bens do mesmo tipo;
d) Não apresentarem as qualidades e o desempenho habituais nos bens do mesmo tipo e que o consumidor pode razoavelmente esperar, atendendo à natureza do bem e, eventualmente, às declarações públicas sobre as suas características concretas feitas pelo vendedor, pelo produtor ou pelo seu representante, nomeadamente na publicidade ou na rotulagem.
Com efeito, nem pelo regime civil do incumprimento da empreitada, nem pelo regime jurídico especial de proteção do consumidor se pode responsabilizar o R. marido pelos defeitos surgidos na caixa de transferência após a sua reparação, por terceiro, e por todos os danos que dali tenham resultado como sua consequência adequada.
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A caixa de direção
No que respeita a este órgão do motor, o compromisso assumido pelo R. não se cingiu à sua retirada e posterior instalação; obrigou-se o R. perante o A. à sua reparação, e a ela procedeu. Considerou, no entanto, que era bastante a substituição de um vedante exterior, face à existência de uma fuga de óleo. Por isso, retirou-a, aplicou o vedante e repô-la no lugar, sem desmontagem[42].
Não obstante, em setembro de 2014, o volante do Land Rover, quando em andamento, mesmo em baixa velocidade, trepidava e não obedecia completamente ao que era ordenado com o seu manuseamento, ouvindo-se o barulho da caixa de direção à medida que era acionado o guiador.
Naquela data, o R. desentendeu-se com o A. e deu-lhe conta de que não efetuaria qualquer outro serviço para ele, incluindo a reinstalação deste órgão do motor.
Sendo uma obrigação de resultado, o R. estava obrigado a reparar a caixa de direção, deixando-a de novo aplicada no veículo, reparada, em perfeito estado de funcionamento.
Não está estabelecida qualquer relação causa-efeito entre o defeito da caixa de transferência e o mau funcionamento da caixa de direção. Só o R. foi contratado para reparar esta última e só ele interveio sobre ela até ao momento em que o seu mau funcionamento foi denunciado pelo A.
Aplicando as regras já atrás enunciadas para o contrato de empreitada, competia ao R. provar que o defeito verificado não era devido a culpa sua, ilidindo a presunção de culpa. Em vez disso, o demandado, desentendendo-se com o A. por causa do modo de acondicionar a caixa transferência para enviar para a E…, “comunicou ao A. que não efetuaria qualquer outro trabalho para ele, incluindo qualquer reparação ou montagem das peças acima referidas[43], considerando-o pessoa mesquinha” (ponto 13 da sentença), o que não constitui, de modo nenhum, justificação aceitável de recusa de cumprimento, que se pretende escrupuloso da sua obrigação, com respeito pelo interesse do A., estando aquele, em princípio, obrigado a eliminar o vício de funcionamento de que aquela caixa ficou a padecer na sequência da reparação (art.º 1221º, nº 1, do Código Civil).
O incumprimento definitivo consiste em se ter tornado impossível a realização da prestação ou por ter perdido o interesse para o credor; o devedor não realiza a obrigação no tempo devido por facto que lhe é imputável, mas já não lhe é permitida a sua realização posterior.
O incumprimento definitivo surge, assim, quando:
a) No momento da prestação, esta não seja acatada pelo devedor, impossibilitando-se de seguida;
b) Por força da sua não realização ou do atraso na prestação, o credor perca o interesse objetivo na sua efetivação;
c) Havendo mora do devedor, este não cumpra no prazo que razoavelmente lhe for fixado pelo credor; e
d) O devedor manifeste que não quer cumprir ou que não cumprirá, podendo esta manifestação resultar de declaração expressa ou de atos concludentes.
O regime especial do cumprimento defeituoso previsto na lei para o contrato de empreitada (art.ºs 1218º e seg.s do Código Civil) não afasta a aplicabilidade do regime geral do incumprimento (art.ºs 790º e seg.sdo Código Civil) quando se verificam os respetivos pressupostos.
A recusa do R., pelos seus próprios termos, é perentória, definitiva e equivale a incumprimento definitivo, abrindo, assim, a possibilidade do A., enquanto dono da obra, mandar reparar o defeito por terceiro, à custa do devedor, o responsável pela reparação.
Foi o que aconteceu. Na sequência da recusa do R., o A. contratou com a E… a reparação dos defeitos da caixa de direção cujo preço ascende a € 475,00 do seu recondicionamento, € 9,47 do óleo aplicado e € 30,00 de montagem e sangria, valores acrescidos de IVA à taxa de 23%, tudo conforme discriminado na fatura proforma que constitui o documento nº 14 junto com a petição inicial.

O R. e também a R. por ser o seu cônjuge e os rendimentos que aquele obtém da sua atividade se destinarem ao proveito comum do casal (cf. concretização do ponto 27 dos factos provados e art.º 1691º, nº 1, al. c), do Código Civil), respondem pelo pagamento das referidas quantias, contra a apresentação da fatura e recibo da E…, a que acrescem os respetivos juros de mora, à taxa legal que em cada momento vigorar, vencidos desde a citação (desde então e atualmente à taxa de 4%), até integral pagamento.
O A. pretende ainda indemnização por danos não patrimoniais.
Dispõe o art.º 496º, nº 1, do Código Civil que “na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.
A inserção sistemática daquele preceito (na subsecção referente à responsabilidade civil por factos ilícitos) e a inexistência de qualquer disposição legal que, de forma expressa, determine a sua aplicabilidade à responsabilidade contratual, gerou controvérsia, na doutrina e na jurisprudência, no que respeita à possibilidade de esse tipo de dano ser indemnizado quando tem a sua origem no incumprimento ou cumprimento defeituoso de um contrato.
Invocando que a ressarcibilidade desse tipo de dano introduziria no capítulo da responsabilidade contratual um fator de séria perturbação da certeza e segurança do comércio jurídico, considera o Prof. Antunes Varela que os danos não patrimoniais não são suscetíveis de indemnização no âmbito da responsabilidade contratual[44].
Em sentido contrário, opinava o Prof. Galvão Telles[45], referindo que, entre a responsabilidade extraobrigacional e a obrigacional não existia uma diferença que justificasse estender a primeira e não a segunda aos prejuízos não patrimoniais.
Certo é, porém, que a nossa jurisprudência tem pendido para admitir a indemnização daqueles danos, no âmbito da responsabilidade contratual[46] e, na verdade, não vislumbramos razões válidas para considerar que os danos morais com gravidade e relevância suficiente para merecer a tutela do direito apenas devam ser considerados quando esteja em causa uma responsabilidade por factos ilícitos e pelo risco, quando é certo que a responsabilidade contratual, emergente do incumprimento (culposo) ou cumprimento defeituoso de um contrato, pode igualmente causar danos daquela natureza com idêntica ou superior gravidade.
Todavia, e como se refere no acórdão da Relação do Porto de 07.07.2005, acima mencionado, a admissão da ressarcibilidade desses danos não preclude que se atente na realidade contratual para efeitos de considerar o mínimo geral do merecimento da tutela do direito aferida a partir da gravidade do dano.
Afigura-se-nos, pois, que, mostrando-se verificados os pressupostos de que depende a obrigação de indemnizar, essa obrigação inclui os danos patrimoniais e não patrimoniais, desde que estes assumam relevância e gravidade bastante para merecer a tutela do direito.
Os danos não patrimoniais associados ao incumprimento de um contrato reconduzem-se, em regra, a meros incómodos, aborrecimentos e frustrações que, como se mencionou, não assumem a relevância e gravidade que seria necessária para conferir ao lesado o direito à respetiva indemnização. Mas, como é óbvio, nem sempre será assim, já que, por vezes e por variadas razões, os danos morais sofridos em consequência desse facto ultrapassam aquilo que devemos ter como razoável e suportável para quem vê desrespeitado o seu direito a obter o integral cumprimento de um contrato que celebrou com outrem.
Porém, o A. sofreu não mais do que desapontamento, transtorno e tristeza, por ter ficado impossibilitado de se fazer transportar no veículo durante cerca de três meses, que era usado por ele para a sua vida pessoal e profissional (sem melhor concretização). O A. dispôs, ainda assim, de outros veículos de sua propriedade ou de empresas de que também é dono, em que se pôde transportar, designadamente, veículos similares e da mesma marca (ponto 34).
Acresce que, pelo menos na sua maior medida, os factos causadores da paralisação do Land Rover têm a ver com a reparação da caixa de transferência, não sendo, por isso, imputáveis aos RR.
Com efeito, no caso em apreço não saímos da regra geral, não se justificando a fixação de indemnização a título de danos não patrimoniais por não serem graves os efeitos da recusa do R. em corrigir os defeitos da reparação da caixa de direção do veículo do A.
Em conclusão, a sentença merece confirmação, exceto na parte em que os RR. devem ser condenados pelos danos patrimoniais diretamente resultantes da recusa do R. em reparar o defeito de funcionamento (dano intrínseco) da caixa de direção do Land Rover do A.
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SUMÁRIO (art.º 663º, nº 7, do Código de Processo Civil):
1. A discordância da decisão em matéria de facto e da decisão em matéria de Direito não justifica a nulidade da sentença.
2. Da não impugnação pelo réu de um documento particular que não lhe é atribuído não se segue a confissão da sua materialidade.
3. Ainda que os réus não provem a autenticidade dos documentos cuja letra, assinatura e respetivo teor tenham sido postos em crise pelo autor, não ficam aqueles impedidos de provar os factos deles constantes por qualquer outro meio de prova que seja legalmente admissível.
4. Na empreitada, se o dono da obra contrata com um empreiteiro a remoção e a posterior reposição da caixa de transferência de um veículo automóvel e, autonomamente, com um segundo empreiteiro a respetiva desmontagem (desintegração) e reparação, surgindo um defeito de funcionamento daquele órgão depois da intervenção de ambos, demandado apenas o primeiro, só lhe é exigível que ilida a presunção de culpa que sobre ele recai (art.º 799º, nº 1, do Código Civil) depois de o dono da obra provar que o vício se inclui no âmbito do contrato que com ele celebrou. Se assim não fosse, estaria a fazer incidir sobre um dos empreiteiros --- porventura o menos interveniente --- o risco próprio de um negócio que lhe é de todo estranho.
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V.
Pelo exposto, acorda-se nesta Relação em julgar a apelação parcialmente procedente e, em consequência, altera-se a sentença recorrida, condenando os RR. a indemnizar o A. na quantia total de € 514,47, acrescida do respetivo IVA à taxa de 23%, contra a apresentação da fatura da E…, Lda. e do respetivo recibo, montante a que acrescem os respetivos juros de mora, à taxa legal em cada momento em vigor, vencidos desde a citação, até integral pagamento.

Custas da ação e da apelação pelo A. e pelos RR., na proporção do decaimento.
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Porto, 15 de dezembro 2016
Filipe Caroço
Judite Pires
Aristides Rodrigues de Almeida
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[1] Diploma a que pertencem todas as disposições legais que se citarem sem menção de origem.
[2] Por transcrição.
[3] Na parte que aqui interessa.
[4] Cf. entre muitos outros, os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 27.4.2004 e de 10.4.2008, in www.dgsi.pt.
[5] Código de Processo Civil anotado, vol. 5º, pág. 140.
[6] A Acção Declarativa Comum, à Luz do Código Revisto, Coimbra Ed. 2010, pág. 281, citando Antunes Varela e Fawcet.
[7] Cf., entre outros, o acórdão da Relação de Lisboa de 17.1.1999, BMJ 489/396 e os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 13.1.2000, de 26.2.2004, de 12.5.2005 e de 10.7.2008, o primeiro in Sumários, 37º, pág. 34 e, os restantes, in www.dgsi.pt e Pais do Amaral, in Direito Processual Civil, 7ª ed., pág. 390.
[8] Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 10.7.2008, in www.dgsi.pt; acórdão da Relação de Lisboa de 10 de Fevereiro de 2004, Colectânea de Jurisprudência, I, 104 e acórdão Relação de Coimbra de 29 de Janeiro de 2004, Colectânea de Jurisprudência, I, 93.
[9] Temas da Reforma do Processo Civil, Almedina , 4ª edição revista e actualizada, II Volume, pág. 249.
[10] Recursos no Novo Código de Processo Civil, 2013, Almedina, pág. 224 e 225.
[11] Sob o título “Os Ónus da Alegação e da Prova, em Geral …”, Colectânea de Jurisprudência, Ano VII, T I, pág. 19.
[12] “Provas – Direito Probatório Material”, BMJ 110/82 e 171.
[13] J. Lebre de Freitas, A Ação declarativa Comum, Coimbra, 3ª edição, pág. 236.
[14] A. Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio e Nota, Manual de Processo Civil, Coimbra, 2ª edição, 1985, pág. 523.
[15] Alberto dos Reis, Código do Processo Civil anotado, vol. I, pág. 535.
[16] Fernando Pereira Rodrigues, Os Meios de Prova em Processo Civil, Almedina, 2016, 2ª edição, pág. 87.
[17] Como é a prova testemunhal fora das situações previstas nos art.ºs 393º e 394º do Código Civil.
[18] Foi sucessivamente usado o termo acopular, para a fastar a ideia de que qualquer daqueles órgão tivesse sido aberto pelo R.
[19] Há dois artigos consecutivos com este número.
[20] RLJ, ano 129º, pág. 209, citado por Abrantes Geraldes, Temas da reforma do processo Civil, Almedina, 2ª edição, pág. 196.
[21] Abel Simões Freire, Matéria de facto-Matéria de Direito, Estudo, in Colectânea de Jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, 2003, Tomo III, pág.s 5 e seg.s., citando jurisprudência e doutrina.
[22] Código de Processo Civil anotado, vol. III pág.s 206 e 207.
[23] Não provada é toda matéria de facto referida na sentença recorrida agora não incluída.
[24] Leia-se acoplagem.
[25] Cf. Almeida Costa, Direito das Obrigações, Almedina, 3ª Edição, pág. 184.
[26] Cf. P. Lima e A. Varela, in “Código Civil anot”, Coimbra Ed., 2ª edição, volume II, pág.s 702 e 703 e acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9/11/2006, in www.dgsi.pt.
[27] Teoria Geral do Direito Civil, 4ª edição, Coimbra Editora, pág. 126.
[28] Idem, fl.s 127.
[29] Neste sentido, Pedro Romano Martinez, Cumprimento Defeituoso Em Especial na Compra e Venda e na Empreitada, Almedina, Teses, 2001, pág. 280.
[30] I. Galvão Telles, Direito das Obrigações, Coimbra, 3ª edição, pág. 304.
[31] João Cura Mariano, Responsabilidade Contratual do Empreiteiro Pelos Defeitos da Obra, Almedina, 3ª edição, 2008, pág. 75.
[32] João Calvão da Silva, Compra e Venda de Coisas Defeituosas, Almedina, 5ª edição, pág. 147.
[33] Ob. cit., pág. 149.
[34] J. Cura Mariano, ob. cit., pág.s 57, 76, 78 e 79.
[35] O cumprimento deste ónus bastar-se-á com a demonstração do simples deficiente funcionamento da obra, não sendo necessária a prova da causa desse mau comportamento.
[36] J. Cura Mariano, ob. cit., pág.s 79 e 80.
[37] Ob. cit., pág.s 281 e 282.
[38] Pág.s 89 e 90.
[39] Segundo esta última norma, só é havido como consumidor “aquele a quem sejam fornecidos bens, prestados serviços ou transmitidos quaisquer direitos, destinados a uso não profissional, por pessoa que exerça com carácter profissional uma actividade económica que vise a obtenção de benefícios, nos termos do n.º 1 do artigo 2.º da Lei n.º 24/96, de 31 de Julho”.
[40] Sobre o tema, cf. Fernando Baptista de Oliveira, O Conceito de Consumidor, Perspetivas Nacional e Comunitária, Almedina 2008, pág.s 67 e 88, com uma interpretação lata do conceito de consumidor. Está provado que o A. usava o veículo na sua vida profissional (ponto 22 da sentença), quando, na realidade, mais facilmente beneficiaria da prova do contrário. Foi produzida prova (embora aqui não possa relevar) que o veículo era utilizado habitualmente pelo A. no exercício da sua atividade comercial de oculista.
[41] “2 - As faltas de conformidade que se manifestem num prazo de dois ou de cinco anos a contar da data de entrega de coisa móvel corpórea ou de coisa imóvel, respectivamente, presumem-se existentes já nessa data, salvo quando tal for incompatível com a natureza da coisa ou com as características da falta de conformidade.
[42] No sentido que lhe vem sendo dado no processo e nesta peça processual.
[43] Referia-se, designadamente à caixa de direção.
[44] Cfr. Das Obrigações em Geral, Vol. II, 7ª ed., pág. 106. No mesmo sentido, Manuel de Andrade, Teoria Geral da Relação Jurídica, vol. I, 1974, págs. 170/171,
[45] Cfr. Direito das Obrigações, 3ª ed., pág. 340, mas também Cunha Gonçalves, Tratado de Direito Civil, Vol. XII, pág. 432, Pinto Monteiro, Sobre a reparação dos danos morais, in Revista Portuguesa do Dano Corporal, Setembro de 1992, nº 1, 1º Ano, pág.s 21 seg.s, Maya de Lucena, Danos não Patrimoniais, O Dano da morte, págs 19 seg.s.
[46] Vejam-se nesse sentido, os acórdãos do STJ de 04.05.2001, proc. 1194/07.0TBBNV.L1.S1, de 24.06.2010, proc. 535/07.4TVLSB.L1.S1 e de 25.03.2010, proc. 2688/07.2TBVCT.G1.S1 e os acórdãos da Relação do Porto de 28.02.2008 e 07.07.2005, com os nºs convencionais JTRP00041158 e JTRP00038283, respetivamente, todos in www.dgsi.pt.