Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
157/13.0GABTC.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: NETO DE MOURA
Descritores: RECONSTITUIÇÃO DO FACTO
DIREITO AO SILÊNCIO
PROVA POR PRESUNÇÕES
INCÊNDIO FLORESTAL
Nº do Documento: RP20141008157/13.0GABTC.P1
Data do Acordão: 10/08/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A reconstituição do facto é um meio de prova autónomo e por isso, estranho à problemática da leitura das declarações prestadas pelo arguido [art. 356º, nº 8 e 357º, nº 2, do CPP].
II - A reconstituição do facto surge da conjugação de informações e declarações instrumentais à recriação do facto e situa-se fora do círculo de proteção do direito ao silêncio de que o arguido, mais tarde, faça uso.
III – A prova indiciária é suficiente para determinar a participação no facto punível se da sentença constarem os factos-base e se os indícios estiverem demonstrados por prova direta, de natureza inequivocamente acusatória, forem plurais, contemporâneos do facto a provar e interrelacionados de modo a que reforcem o juízo de inferência.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 157/13.0 GABTC.P1
Recurso penal
Relator: Neto de Moura

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção (Criminal) do Tribunal da Relação do Porto

I – Relatório
No âmbito do processo comum que, sob o n.º 157/13.0 GABTC, corre termos pelo Tribunal Judicial de Boticas (entretanto extinto), B…, devidamente identificado nos autos, foi submetido a julgamento, pelo tribunal colectivo, acusado pelo Ministério Público da prática, em autoria material, de um crime de incêndio florestal previsto e punível pelo artigo 274.º, n.º 1, do Código Penal.
Realizada a audiência, com documentação da prova nela oralmente produzida, após deliberação do Colectivo, foi proferido o acórdão datado de 04.04.2014 (fls. 134 e segs.) e depositado na mesma data, com o seguinte dispositivo:
“Julgam a acusação procedente, por provada, e, consequentemente condenam o arguido B…, pela prática de um crime de incêndio florestal, na forma dolosa, da previsão do art. 274º, nº 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão efetiva”.
Inconformado, pugnando pela sua absolvição ou, quando menos, pela suspensão da execução da pena de prisão aplicada, veio o arguido interpor recurso do acórdão condenatório para este Tribunal da Relação, com os fundamentos explanados na respectiva motivação, que condensou nas seguintes “conclusões”:
I. O recorrente impugna a decisão proferida quanto à matéria de Facto e de Direito.
II. Nos presentes autos o arguido estava acusado da prática de um crime de incêndio florestal previsto e punido pelo artigo 274.º n.º 1 do Código Penal, sendo que a acusação foi julgada procedente por provada e o arguido condenado como autor de um crime de incêndio florestal, na forma dolosa, da previsão do artigo 274.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 2 (dois) anos de prisão efectiva.
III. Com efeito, o Tribunal a quo deu como provados, entre outros, os seguintes factos:
(transcreve o essencial dos factos considerados provados)
IV. Atenta à prova produzida jamais estes factos poderiam ser dados como provados.
V. O tribunal apoia a sua convicção, nas declarações das testemunhas C… e D… que, conforme refere “…colocam” o arguido no local onde foi ateado o fogo, e precisamente à hora em que o mesmo deflagrou….”, mas esquece declarações importantes das testemunhas.
VI. As testemunhas são unânimes em reconhecer que não podem afirmar que foi o arguido que ateou o fogo.
VII. Resulta claro ainda que, nenhuma das testemunhas arroladas presenciou os factos de ateamento do incêndio.
VIII. Aliás, ambas se aperceberam do incêndio a larga distância do mesmo ou apenas após terem sido alertados por terceiros.
IX. O arguido optou por se remeter ao silêncio e não prestar quaisquer declarações, facto que não o pode prejudicar.
X. Não resulta da prova produzida matéria suficiente para que se possa concluir que foi o arguido que ateou o fogo em causa e assim praticou o crime de que vem acusado, pelo que deve este ser absolvido do mesmo.
XI. Não obstante, e admitindo-se, por mera hipótese, que o arguido praticou o crime de incêndio florestal de que vem acusado, o tribunal a quo, na determinação da natureza e na medida da sanção a aplicar deveria ter tido em conta o artigo 71.º do Código Penal segundo o qual a determinação da pena deve fazer-se dentro dos limites legalmente estabelecidos em função da culpa e das exigências de prevenção.
XII. O legislador penal atribui à pena um conteúdo de reprovação ética, dando tradução à exigência de que a vertente pessoal do crime limita de forma inultrapassável a medida da pena.
XIII. Face ao disposto no nosso ordenamento jurídico, o modelo da determinação da pena mais adequada é aquele que comete à culpa a função de determinar o limite máximo e inultrapassável da pena.
XIV. O quantum da pena depende da necessidade de prevenção que o agente e a gravidade do crime exigem.
XV. E, tal como se disse para a culpa, no nosso ordenamento a prevenção geral deve fornecer uma “moldura de prevenção”, cujo limite máximo é dado pela medida óptima de tutela de bens jurídicos – dentro do que é consentido pela culpa – e cujo limite mínimo é fornecido pelas exigências irrenunciáveis de delegar do ordenamento juridico; e à prevenção especial a função de encontrar o quantum exacto da pena, dentro da referida “ moldura de prevenção” que melhor sirva as exigências de socialização do delinquente. (cfr. Ac. STJ de 9/11/96, BMJ, n.º 411, pág 145).
XVI. Em suma diremos que, o crime e a sua punição são sempre fenómenos sociológicos e antropológicos, sendo a preocupação de prevenir crimes a ideia primordial, donde ganha especial importância a compreensão por parte do agente da pena que lhe foi imposta.
XVII. Estamos de acordo que a conduta do arguido, a provarem-se os factos contantes da acusação, pela sua gravidade não possa ficar impune, mas sempre se dirá que a pena é sempre um castigo, mas o castigo não é só a prisão.
XVIII. A privação da liberdade já por si só é uma punição pelo que, não é a solução mais justa e mais conforme ao espírito do legislador, que fez uma clara aposta nas medidas não detentivas da liberdade, desde que estas realizem de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
XIX. Perante a idade do arguido, ora recorrente, não será benéfico “construir” o seu futuro dentro de uma prisão, deformando o carácter e personalidade que possui.
XX. O tribunal a quo foi excessivo ao condenar o arguido na pena de 2 (dois) anos de prisão efectiva.
XXI. Sendo que, a manter-se a decisão condenatória deverá a pena de prisão aplicada ser suspensa na sua execução, tudo conforme disposto nos artigos 50.º e ss do C. Penal”.
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Admitido o recurso, o Ministério Público na primeira instância apresentou resposta à respectiva motivação, defendendo a sua improcedência e, consequentemente, a confirmação da sentença impugnada.
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Nesta instância, na intervenção a que alude o art.º 416.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, pronunciando-se no sentido de que a prova foi correctamente apreciada e valorada, pelo que não ocorre erro de julgamento em matéria de facto, e que a pena de prisão (efectiva) é imposta pelas “ingentes necessidades de ordem preventiva” (geral e especial).
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Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos, vieram os autos à conferência, cumprindo apreciar e decidir.

II – Fundamentação
É, geralmente, aceite que são as conclusões que o recorrente extrai da motivação, onde sintetiza as razões do pedido, que recortam o thema decidendum (cfr. artigos 412.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal e, entre outros, o acórdão do STJ de 27.05.2010, www.dgsi.pt/jstj)[1] e, portanto, delimitam o objecto do recurso, assim se fixando os limites do horizonte cognitivo do tribunal de recurso.
O recorrente impugna a decisão sobre matéria de facto, invocando o erro de julgamento, pois, em seu entender, “não resulta da prova produzida matéria suficiente para que se possa concluir que foi o arguido que ateou o fogo em causa e assim praticou o crime de que vem acusado” (conclusão X).
Em matéria de direito, não questionando o enquadramento jurídico-penal dos factos provados nem a medida da pena, pugna pela suspensão da execução da pena de prisão.
Embora teça várias considerações sobre a determinação da pena (cfr. conclusões XI a XV) não parece que o recorrente pretenda pôr em causa a medida da pena de prisão que lhe foi cominada. Pretende, isso sim, que se reconheça que está verificado o condicionalismo da suspensão da execução da pena.
São, pois, duas as questões a decidir:
● se o tribunal apreciou e valorou incorrectamente a prova produzida e, por conseguinte, cometeu um erro de julgamento em matéria de facto;
● se é de suspender a execução da pena de prisão.
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Identificadas as questões a apreciar e decidir, e assim delimitado o objecto do recurso, é fundamental conhecer a decisão em matéria de facto, na qual assenta a condenação proferida, e a respectiva motivação.
Factos provados
1. No dia 1 de Setembro de 2013, o arguido B… deslocou-se da sua habitação, sita na localidade de …, Montalegre, para um café, sito na localidade de …, concelho e comarca de Boticas, onde permaneceu durante toda a tarde, aí tendo consumido bebidas alcoólicas.

2. Cerca das 18:30 horas desse mesmo dia, o arguido B… encetou o caminho de regresso à sua residência, utilizando caminhos rurais entre a freguesia de …, Boticas, e a freguesia de …, Montalegre.

3. Porém, cerca das 19:30 horas, quando circulava por um caminho de terra batida, no local de …, na freguesia de …, concelho de Boticas, ateou fogo a ervas secas que se encontravam na berma do caminho, do lado direito, atento o sentido em que seguia.

4. Em consequência do fogo ateado pelo arguido, este alastrou-se aos terrenos circundantes, propriedade de E…, F… e baldios, tendo consumido e destruindo cerca de 2 (dois) hectares de terreno onde existiam pinheiros bravos, carvalhos e vegetação rasteira (giestas e carqueja) e causando estragos de valor não concretamente apurado.

5. Tal incêndio só não logrou atingir maiores proporções devido à pronta intervenção da corporação local dos Bombeiros. E não obstante tal intervenção, ocorreram reacendimentos de focos de fogo nos terrenos atingidos nos dias 2/09/2013 e 3/09/2013, tendo sido consumidos pelo fogo e destruídos mais 0,510 hectares de terreno compostos por vegetação rasteira e pinheiros.

6. O arguido B… agiu de forma livre, voluntária e consciente, com o propósito concretizado de atear fogo e, em consequência, queimar e destruir as árvores e vegetação existentes naquele local, na freguesia de …, bem sabendo que os mesmos não lhe pertenciam e que atuava contra a vontade e em prejuízo dos seus proprietários.

7. Sabia que as ervas a que ateou fogo, por se encontrarem secas, num local com inclinação e rodeadas de outra vegetação também seca, eram um material altamente inflamável e que facilitavam a propagação das chamas, como ocorreu, facto que representou e quis, bem sabendo também das consequências da sua conduta.

8. Apesar de ter perfeita consciência de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei, não se absteve de as prosseguir.

9. O arguido vive em casa dos pais e na dependência económica dos mesmos, uma vez que se encontra desempregado.

É conhecido por provocar diversos problemas familiares e sociais, na localidade onde vive, sendo suspeito de ter ateado já vários incêndios e ter provocado prejuízos a várias pessoas dessa localidade.
Do seu certificado de registo criminal constam as seguintes condenações:
- No processo comum nº 23/03.8GAMTR da comarca de Boticas, foi condenado na pena de 90 dias de multa, pela prática de crime de condução sem habilitação legal, em 29-09-2002, por decisão de 03-03-2004, transitada em julgado em 18-03-2004;

- No processo comum nº 154/04.7GAMTR da comarca de Montalegre, foi condenado na pena de 100 dias de multa, pela prática de crime de violação de domicílio, em 18-08-2004, por decisão de 13-06-2005, transitada em julgado em 13-06-2005;

- No processo comum nº 149/09.4GAMTR da comarca de Montalegre, foi condenado na pena de 2 anos de prisão suspensa na sua execução por igual período, pela prática de crime de furto qualificado, em 12-06-2009, por decisão de 25-03-2010, transitada em julgado em 03-05-2010.

Factos não provados
Não se provaram os factos seguintes:
a) que o estabelecimento comercial onde o arguido esteve em … é denominado “G…”;

b) que o arguido se deslocou para … cerca das 14.00 horas;

c) que no local onde foi ateado o incêndio, os terrenos circundantes apresentam uma forte inclinação e que esse local se chama …;

d) que o arguido usou um isqueiro para atear o fogo e que esse isqueiro era da marca BIC.
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O tribunal motivou assim a sua decisão de facto:
“A convicção sobre os factos descritos como provados e não provados foi formada com base nos seguintes meios de prova produzidos em audiência de julgamento e constantes dos autos:
Desde logo, não houve dúvidas de que ocorreu o incêndio e ardeu a área de floresta referida, o que resulta do teor dos autos de notícia e aditamento de fls. 4 a 5, 7 a 8 e 10 a 11 e foi referido pelas testemunhas E…, C…, H… e D….
A primeira testemunha, E…, referiu ter uma propriedade no local, que essa propriedade ardeu e lhe causou um prejuízo que quantificou.
A testemunha C… disse ser o Presidente da Junta de Freguesia e confirmou, também, que ocorreu o incêndio, que ardeu determinada área de terreno baldio e quantificou o prejuízo sofrido.
As duas outras testemunhas confirmaram também a ocorrência do incêndio e o local onde o mesmo decorreu.
No que diz respeito à autoria dos factos foram considerados, essencialmente, os depoimentos das já referidas testemunhas C… e D….
Efetivamente, a testemunha C… referiu ter visto o arguido, ainda na localidade de …, seguir pelo caminho que passa no local onde ocorreu o incêndio, e que é precisamente o caminho que existe para ir de … para a localidade onde o arguido reside com os seus pais. Esta mesma testemunha disse, ainda, que lhe pareceu que o arguido ia alcoolizado, pela forma como se deslocava, cambaleando. Finalmente, esclareceu que do local onde se cruzou com o arguido até ao local do incêndio existe uma distância de cerca de um quilómetro, que demora cerca de 20 minutos a ser percorrida, sendo que quando se apercebeu de que o incêndio já lavrava, tinham decorrido cerca de 40 minutos, uma vez que tinha já chegado com as vacas ao curral, que tinha ido buscar ao lameiro. Verifica-se, assim, que existe no seu depoimento uma coincidência temporal entre o momento em que o arguido teria que passar no local onde deflagrou o fogo e a deflagração deste.
Desta forma, o arguido passou no local onde o incêndio deflagrou e fê-lo à hora em que isso aconteceu, o que, segundo as mais elementares regras da experiência comum não deixa dúvidas de que foi o mesmo o autor dos factos.
Acresce que, o arguido era fumador, pelo que tinha o meio para atear o incêndio, já que é sabido que os fumadores usam isqueiros ou fósforos. Este facto foi referido pela testemunha D… que esclareceu que na localidade onde vive e onde também vive o arguido, mora muito pouca gente, pelo que todos se conhecem e se apercebem do que se passa, motivo pelo qual sabia que o arguido tinha ido a …, ao café, comprar cigarros, uma vez que na localidade onde reside não existe qualquer estabelecimento desse género.
Deste depoimento resultou também que nessa localidade onde o arguido e também a testemunha vivem, toda a gente atribuiu logo a ocorrência do incêndio ao arguido, até porque, como a testemunha expressamente disse, este já ateou vários fogos, a testemunha falou em onze fogos, naquela localidade, para além de outros problemas que tem causado aos vizinhos.
O depoimento desta testemunha, rigoroso e seguro, afigurou-se isento e a testemunha demonstrou ter conhecimento direto sobre os factos que referiu.
Ora, face ao teor dos dois depoimentos referidos, que “colocam” o arguido no local onde foi ateado o fogo, e precisamente à hora em que o mesmo deflagrou, as regras da experiência comum apontam, de modo claro, no sentido de que foi o arguido o autor dos factos em discussão nos autos.
Acresce, a confirmar a conclusão a que o tribunal chegou, sem ter ficado com qualquer dúvida, que a reportagem fotográfica de fls. 49 a 51 dos autos, na qual o arguido interveio, voluntariamente, já que não invocou, ter sido coagido a intervir na mesma, vem confirmar os factos já apurados, uma vez que revela, por indicação do arguido, o local onde o fogo foi ateado, o que coincide com o que já se havia apurado.
Uma vez que o arguido não quis prestar qualquer tipo de declarações, as suas condições pessoais resultaram da informação fornecida pela GNR e junta a fls. 120 dos autos, tendo também sido tido em conta o certificado de registo criminal.
No que diz respeito aos factos não provados, os mesmos não foram referidos pelas testemunhas nem resultam, com a necessária certeza, de outras provas”.
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A exigência legal de fundamentação das decisões judiciais, em particular das sentenças, só é cabalmente satisfeita se contiverem uma exposição completa, mas concisa, dos motivos de facto e a indicação do elenco de provas que serviram para formar a convicção do tribunal, sendo que a formação dessa convicção há-de decorrer de uma valoração racional e crítica - de acordo com as regras comuns da lógica, da razão, das máximas da experiência e dos conhecimentos científicos, designadamente de psicologia judiciária - das provas, de modo que permita ao julgador objectivar a apreciação dos factos (assim garantindo o controlo crítico da lógica da decisão, permitindo aos sujeitos processuais o recurso da mesma decisão com perfeito conhecimento da situação e ao tribunal de recurso aferir se os juízos de racionalidade, de lógica e de experiência confirmam, ou não, o raciocínio e a avaliação da 1.ª instância sobre o material probatório que teve à sua disposição e os factos cuja veracidade cumpria demonstrar) e promover a sua aceitabilidade, ou seja, “de modo tal que quando confrontados terceiros com o decidido possam estes aderir ou afastar-se, também racionalmente, da valoração feita”[3].
Como se pode ler no acórdão do STJ, de 28.02.2007 (disponível em www.dgsi.pt), satisfaz a exigência legal de fundamentação a sentença que descreve “o iter lógico e racional trilhado pelo colectivo, de modo a poder afirmar-se que a condenação procede de uma apreciação correcta das provas, apresentando-se como uma peça coerente, fundada, convincente e à margem do arbítrio, não enfermando de contradições ou lacunas de pensamento, não violadora das regras da experiência e do bom senso, capaz de se impor quer aos sujeitos processuais quer à comunidade mais vasta dos cidadãos, seus destinatários”.
O tribunal a quo motivou a sua decisão em termos que satisfazem, minimamente, essa exigência legal.
Ora, perante uma sentença fundamentada, para que possa (deva) ser revogada ou alterada, não basta apontar o error in judicando, “impõe-se que sejam rebatidos, com base em razões materiais minimamente persuasivas, os seus fundamentos materiais, o mesmo é dizer, ou a legalidade dos meios de prova utilizados, ou o conteúdo das declarações ou de outros meios de prova valorados pela sentença, ou a inconsistência, á luz dos princípios legais atinentes, da análise crítica e da apreciação em que repousa a decisão” (acórdão da Relação de Coimbra, de 30.03.2010, disponível em www.dgsi.pt/jtrc).
Importa sublinhar que não basta que as provas, simplesmente, permitam ou até sugiram conclusão diversa; exige-se que imponham decisão diversa daquela que o tribunal proferiu.
Quanto se invoca o erro de julgamento em matéria de facto, os n.0s 3 e 4 do artigo 412.º do Cód. Proc. Penal estabelecem directrizes muito precisas e exigentes para o recorrente.
Assim, se o recorrente pretende impugnar a decisão sobre matéria de facto com fundamento em erro de julgamento, tem de especificar (cfr. n.º 3 do citado art.º 412.º):
● os concretos pontos de facto que considera terem sido incorrectamente julgados pelo tribunal recorrido (obrigação que “só se satisfaz com a indicação do facto individualizado que consta da sentença recorrida”[4]);
● as concretas provas que impõem decisão diversa da recorrida (ónus que só fica satisfeito “com a indicação do conteúdo específico do meio de prova ou de obtenção de prova que impõe decisão diversa da recorrida”[5]).
Além disso, o recorrente tem de expor a(s) razão(ões) por que, na sua perspectiva, essas provas impõem decisão diversa da recorrida, constituindo essa explicitação, nas palavras de Paulo Pinto de Albuquerque (Loc. Cit.), “o cerne do dever de especificação”, com o que se visa impor-lhe “que relacione o conteúdo específico do meio de prova que impõe decisão diversa da recorrida com o facto individualizado que considera incorrectamente julgado”.
É com base na citada norma que se tem defendido, sem discrepâncias, que o recurso em matéria de facto não implica uma reapreciação, pelo tribunal de recurso, da globalidade dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida.
Duplo grau de jurisdição em matéria de facto não significa direito a novo (a segundo) julgamento no tribunal de recurso.
O recurso que impugne (amplamente) a decisão sobre a matéria de facto não pressupõe, por conseguinte, a reapreciação total do acervo dos elementos de prova produzidos e que serviram de fundamento à decisão recorrida, mas antes uma reapreciação autónoma sobre a razoabilidade da decisão do tribunal a quo quanto aos “concretos pontos de facto” que o recorrente especifique como incorrectamente julgados. Para tanto, deve o tribunal de recurso verificar se os pontos de facto questionados têm suporte na fundamentação da decisão recorrida, avaliando e comparando especificadamente os meios de prova indicados nessa decisão e os meios de prova indicados pelo recorrente e que este considera imporem decisão diversa (sobre este ponto, cfr. os Acórdãos do S.T.J., de 14 de Março de 2007, Processo 07P21, de 23 de Maio de 2007, Processo 07P1498, de 3 de Julho de 2008, Processo 08P1312, disponíveis em www.dgsi.pt).
Embora o recorrente indique como pontos de facto que considera terem sido erradamente julgados pelo tribunal quase todos os que vêm descritos na sentença e constituem o suporte fáctico da condenação (conclusão III), em boa verdade, ele só põe em causa que tenha sido ele quem ateou o fogo que deu origem ao incêndio ali descrito.
Quanto às provas que, na sua perspectiva, imporiam decisão diversa da recorrida, o recorrente indica os mesmos depoimentos testemunhais em que se baseou o tribunal para o condenar.
Com efeito, o recorrente transcreve as passagens dos depoimentos das testemunhas E…, C…, H… e D… em que estas, unanimemente, afirmam que não sabem se foi ele, arguido, quem ateou o fogo porque não viram fazê-lo.
E a verdade é mesmo essa: nenhuma das referidas testemunhas (e não há outras) presenciou qualquer acto do arguido que tenha provocado o incêndio em causa.
Deverá, então, concluir-se que os pontos de facto questionados não têm suporte probatório?
Antes de mais, importa frisar que os depoimentos das referidas testemunhas não se limitaram àquela afirmação de desconhecimento sobre quem foi o autor daquele facto.
Depois, como bem observa o Ex.mo PGA no seu parecer, não haver testemunhas presenciais do facto, não haver quem tenha visto o incendiário a atear o fogo é o que acontece na grande maioria dos casos porque o agente pratica os factos às escondidas, sorrateiramente, dissimuladamente, não raro, pela calada da noite.
Por isso, a demonstração da realidade dos factos, e, sobretudo, de quem foi o seu autor, tem de fazer-se através de indícios probatórios, de prova indirecta.
Assim aconteceu neste caso, ainda que isso não transpareça da decisão recorrida.
Como temos sublinhado, se apenas a prova directa servisse para a condenação, estar-se-ia a abrir caminho à criação de amplos espaços de impunidade.
Por isso que a chamada prova indirecta tem um papel fundamental e já ninguém lhe nega virtualidade incriminatória para afastar a presunção de inocência.
Com efeito, quer a prova directa, quer a prova indirecta são modos, igualmente legítimos, de chegar ao conhecimento da realidade (ou verdade[6]) do factum probandum: pela primeira via ou método, “a percepção dá imediatamente um juízo sobre um facto principal”, ao passo que na segunda “a percepção é racionalizada numa proposição, prosseguindo silogisticamente para outra proposição, à base de regras gerais que servem de premissas maiores do silogismo, e que podem ser regras jurídicas ou máximas da experiência. A esta sequência de proposição em proposição chama-se presunção” (Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, II, 1993, 79).
Uma vez que em processo penal são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei (artigo 125.º do Código de Processo Penal), delas (das provas admissíveis) não pode ser excluída a prova por presunções (prevista, como noção geral, no artigo 349.º do Código Civil, mas prestável e válida como definição do meio ou processo lógico de aquisição de factos no processo penal) em que se parte de um facto conhecido (o facto base[7] ou facto indiciante, que funciona como indício) para afirmar um facto desconhecido (o factum probandum) recorrendo a um juízo de normalidade[8] (de probabilidade) alicerçado em regras da experiência comum que permite chegar, sem necessidade de uma averiguação casuística, a um resultado verdadeiro.
Com efeito, apesar das reservas e objecções[9] que, ainda, lhe são opostas, está consolidado o entendimento de que, para a prova dos factos em processo penal, é perfeitamente legítimo o recurso à prova indirecta[10], também chamada prova indiciária, por presunções ou circunstancial.
Neste âmbito, importam as presunções simples, naturais ou hominis, simples meios de convicção, que se encontram na base de qualquer juízo probatório. São meios lógicos de apreciação das provas e de formação da convicção, que cedem por simples contraprova, ou seja, prova que origine a dúvida sobre a sua exactidão no caso concreto.
O sistema probatório alicerça-se em grande parte neste tipo de raciocínio (indutivo) e, para certos factos, como sejam os relativos aos elementos subjectivos do tipo (doloso ou negligente), não havendo confissão, a sua comprovação não poderá fazer-se senão por meio de prova indirecta[11].
Como alguém já afirmou, é precisamente nas situações em que não há prova directa, mas existe prova indiciária, que intervêm decisivamente a inteligência e a lógica do juiz. Primeiramente, a inteligência que associa o facto indício a uma máxima da experiência ou a uma regra científica. Depois intervém a lógica através da qual, na valoração do facto, outorgaremos à inferência feita maior ou menor eficácia probatória.
A prova indiciária é suficiente para determinar a participação no facto punível se da sentença constarem os factos-base (requisito de ordem formal) e se os indícios estiverem completamente demonstrados por prova directa (requisito de ordem material), os quais devem ser de natureza inequivocamente acusatória, plurais, contemporâneos do facto a provar e, sendo vários, estar interrelacionados de modo a que reforcem o juízo de inferência.
Importa focar este ponto: o indício não prova o facto, é toda a circunstância conhecida e provada que induz à descoberta de outro(s) facto(s), que tem a virtualidade para dar a conhecer outro(s) facto(s) que com aquela está relacionado. O indício funciona como uma primeira componente da prova indiciária.
Vejamos então os factos que, com essa virtualidade, podemos seleccionar para integrarem a base indiciária sobre a qual há-de repousar o juízo de inferência:
- cerca das 19H:30 do dia 01.09.2013, deflagrou um incêndio na localidade de …, freguesia de …, concelho de Boticas, que consumiu e destruiu cerca de 2 (dois) hectares de vegetação rasteira (giestas e carqueja), pinheiros bravos e carvalhos, causando prejuízos materiais de valor não apurado;
- Nesse dia (1 de Setembro de 2013), o arguido B… deslocou-se da sua casa de habitação, sita na localidade de …, Montalegre, até um estabelecimento de café, sito na localidade de …, concelho e comarca de Boticas, onde permaneceu durante toda a tarde, aí tendo consumido bebidas alcoólicas;
- cerca das 18H:30 horas desse mesmo dia, o arguido B… encetou o caminho de regresso à sua casa de residência e, para o efeito, utilizou caminhos rurais entre a freguesia de … e a localidade de …, designadamente um caminho em terra batida que atravessa a localidade de …, onde ocorreu o incêndio;
- bordejando esse caminho, do lado direito, considerando o sentido que o arguido levava, havia ervas secas.
O facto probandum consiste em saber se o fogo que deu origem ao incêndio foi ateado por alguém, se foi mão humana a provocá-lo e, na afirmativa, se foi o arguido o autor desse facto.
Os factos que constituem a base indiciária estão, inequivocamente, demonstrados, designadamente pelos depoimentos das aludidas testemunhas.
Importante, se não mesmo decisivo na formação da convicção do tribunal, parece ter sido o depoimento da testemunha C… que afirmou ter visto o arguido, ainda na localidade de …, seguir pelo caminho que passa no local onde ocorreu o incêndio e que, entre o ponto onde se cruzou com ele e o local do incêndio vai uma distância de cerca de um quilómetro que demora cerca de 20 minutos a percorrer, sendo que quando se apercebeu de que o incêndio já lavrava, tinham decorrido cerca de 40 minutos.
Também importante, parece ter sido o depoimento da testemunha D…, que informou conhecer bem o arguido porque reside na mesma localidade de … e por isso era do seu conhecimento que ele é fumador e terá sido mesmo com o objectivo de comprar tabaco que se deslocou a ….
Sendo o arguido fumador, teria consigo um isqueiro ou fósforos (como, normalmente, acontece com qualquer fumador de tabaco) e, portanto, tinha o meio necessário para atear o incêndio.
Concluiu, então, o tribunal que “o arguido passou no local onde o incêndio deflagrou e fê-lo à hora em que isso aconteceu, o que, segundo as mais elementares regras da experiência comum não deixa dúvidas de que foi o mesmo o autor dos factos”, conclusão que depois repete por outras palavras: «Ora, face ao teor dos dois depoimentos referidos, que “colocam” o arguido no local onde foi ateado o fogo, e precisamente à hora em que o mesmo deflagrou, as regras da experiência comum apontam, de modo claro, no sentido de que foi o arguido o autor dos factos em discussão nos autos”.
Não podemos concordar com a conclusão probatória do Colectivo de juízes que julgou o caso porque se nos afigura precipitada, não sendo inteiramente razoável o raciocínio explicitado no acórdão recorrido.
Não é demais sublinhar que é a compreensão global dos indícios existentes, através do estabelecimento de correlações intrínsecas e apelando à razão e às regras da lógica, que permite e avaliza a passagem da multiplicidade de probabilidades, mais ou menos adquiridas, para um estado de certeza sobre o facto probando.
O problema está em saber se os factos-base são suficientes para fundamentar o juízo de inferência do facto a provar.
O arguido/recorrente teria demorado cerca de uma hora a percorrer a distância de um quilómetro, que, de acordo com o depoimento da testemunha C…, demora, normalmente, cerca de 20 minutos a ser percorrida. No entanto, isso até nem obstaria à conclusão de que, aproximadamente, na altura em que deflagrou o incêndio, o arguido passou ou esteve no local onde começou, já que aquela testemunha também referiu que lhe pareceu que o arguido estaria embriagado, porque cambaleava, pelo que a sua marcha seria mais lenta que o normal.
Acontece que, neste tipo de prova, a ligação ou conexão entre a base indiciária e o facto-consequência tem de ser directa, precisa, inequívoca, segundo as regras do critério humano, ou seja, o factum probandum deve fluir como conclusão natural, lógica, inelutável dos factos base comprovados.
Ora, é possível que, na mesma altura, tenham passado (ou estado) no local do incêndio outra ou outras pessoas e não seria de afastar, porque perfeitamente plausível, que tivesse sido outra pessoa, que não o arguido, a atear o fogo.
Aliás, mesmo que a hipótese de um incêndio provocado por mão humana se apresentasse como a mais provável, nada permitia afirmar que estava, completamente, arredada a possibilidade de ter sido outra a sua origem[12].
Por isso, afigura-se-nos que, da referida base indiciária, apenas, será possível extrair a conclusão de que, a ter sido um incêndio provocado, o arguido/recorrente se apresenta como um forte suspeito da sua autoria.
No entanto, podemos ir mais longe e afirmar a existência de prova bastante de que foi o arguido quem ateou o fogo.
É aqui que entra a reconstituição do facto, meio de prova de que o tribunal pôde dispor.
Como decorre do disposto no n.º 2 do artigo 150.º do Cód. Proc. Penal, em princípio, só uma autoridade judiciária (durante o inquérito, o Ministério Público e o juiz nas fases de instrução e de julgamento) pode ordenar a reconstituição do facto, mas a diligência também pode ser realizada pelo órgão de polícia criminal em quem a autoridade judiciária tenha delegado competência para o efeito.
No caso, o Ministério Público, por despacho proferido a fls. 15, delegou na Polícia Judiciária “a competência para proceder às diligências de inquérito que se mostrem necessárias”, delegação que, sendo genérica, abrange a reconstituição do facto realizada.
Diferentemente do que acontece com a prova por reconhecimento, sobretudo o reconhecimento de pessoas (previsto no artigo 147.º do Cód. Proc. Penal), que está finalisticamente preordenado ao esclarecimento de situações de incerteza quanto à imputação subjectiva dos factos apurados, a reconstituição visa determinar se um facto poderia ter ocorrido de certa forma e consiste “na reprodução, tão fiel quanto possível, das condições em que se afirma ou se supõe ter ocorrido o facto e na repetição do modo de realização do mesmo” (2.ª parte do n.º 1 do artigo 150.º).
Por isso se diz que a reconstituição “não é mais do que uma encenação cujo guião é aquele que resulta da conjugação de todos os meios de prova existentes”[13], “uma representação da realidade suposta”, uma “teatralización de las seqüências del hecho investigado, según distintas versiones de sus protagonistas”[14] e a sua utilidade como meio de prova “supõe que o facto seja representado, tanto quanto possível, nas mesmas condições em que se afirma ou supõe ter ocorrido e que se possam verificar essas condições”[15].
Neste caso, o “guião” só poderia resultar das indicações fornecidas pelo arguido, uma vez que seria ele o único que se encontrava no “crime scene” (“local do crime”), e só com a participação deste a reconstituição poderia concretizar-se e ter utilidade como meio de prova.
Nessa situação, importa garantir que o arguido se disponha a, livremente, participar na reconstituição e, portanto, que a sua participação “não tenha sido determinada por qualquer forma de condicionamento ou perturbação da vontade, seja por meio de coacção física ou psicológica” (acórdão do STJ, de 05.01.2005, Proc. n.º 04P3276; Cons. Henriques Gaspar)[16].
Previamente a essa participação, o arguido foi, como tal, constituído e informado dos seus direitos e nada permite afirmar, ou sequer suspeitar, que, de algum modo, a vontade manifestada não foi livre e esclarecida, pelo que podemos dizer que o privilégio contra a auto-incriminação (nemo tenetur se ipsum accusare) foi respeitado.
A diligência probatória foi documentada em auto (fls. 47-48) e registada fotograficamente (fls. 49 e segs.) e, embora não haja consentimento expresso, nada indica que o arguido não consentiu nesse registo e, portanto, que tenha sido fotografado sem ou contra a sua vontade[17].
Mas a questão mais importante e que mais controvérsia tem suscitado é a do aproveitamento probatório no julgamento da reconstituição efectuada e, sobretudo, daquela em que tenha participado o arguido e este tenha feito declarações no decurso da diligência.
Para uma corrente, a reconstituição do facto, constituindo um meio de prova legalmente previsto, como tal pode ser valorado autonomamente. A participação do arguido na reconstituição é susceptível de valoração (excepto se tiver sido conseguida por qualquer meio ilícito ou assentar em qualquer meio de prova proibido) porque objectivada num meio de prova autónomo.
No entanto, distingue o acto (de reconstituição dos factos) em si - não questionando o seu valor probatório - das declarações do arguido, que não podem ser tidas em conta pelo tribunal na formação da sua convicção. Melhor dizendo, as informações ou contributos orais prestados pelo arguido no decurso da reconstituição do facto são equiparados às declarações prestadas pelo mesmo arguido noutro âmbito e, portanto, estão sujeitos ao regime previsto nos artigos 355.º, 356.º e 357.º do Cód. Proc. Penal, o que é dizer que, ressalvados os casos em que é permitida a leitura dos autos, não valem em julgamento, nomeadamente para a formação da convicção do tribunal.
Por isso que, se o arguido, em audiência, no exercício do seu direito ao silêncio, se recusar a prestar declarações sobre os factos que lhe são imputados, não se verificando as hipóteses do artigo 356.º, mormente as dos seus nos 3 e 4, e do artigo 357.º, a leitura dos autos que contenham declarações suas prestadas no decurso da reconstituição levada a cabo por órgão de polícia criminal é proibida.
Insere-se nesta corrente de opinião, Paulo Pinto de Albuquerque (“Comentário…”, cit., 419) que discorre assim:
“O aproveitamento em audiência de julgamento de uma reconstituição em que o arguido preste declarações feita no inquérito ou na instrução obedece à regra do artigo 357.º, n.º 2 (agora, n.º 3), conjugado com o artigo 356.º, n.º 8. O legislador teve o propósito claro de pôr cobro a situações de violação do direito ao silêncio e do princípio da imediação conhecidas nos tribunais, em que se aproveitava o registo audiovisual do depoimento de um arguido feito durante uma reconstituição apesar de ele ter recusado prestar declarações no julgamento”.
Para este autor, são as garantias de defesa e o respeito pelo direito ao silêncio que “impõem que as declarações do arguido feitas em reconstituição dirigida pelo Ministério Público ou pelo órgão de polícia criminal não possam ser lidas, visualizadas ou ouvidas em julgamento, salvo solicitação do arguido”.
No entanto, “quer o auto da diligência, quer a gravação fotográfica ou videográfica da diligência feita no inquérito e na instrução podem ser aproveitados no julgamento, desde que não haja registo de declarações do arguido, do assistente, das partes civis ou das testemunhas”.
Na mesma linha de pensamento, mas menos “radical” quanto ao aproveitamento de uma reconstituição em que o arguido presta declarações, temos a posição (expressa, p. ex., no voto de vencido lavrado no acórdão do STJ de 20.04.2006) segundo a qual só poderão ser valorados os factos que resultem da reconstituição e as declarações do arguido indispensáveis à compreensão da reconstituição. Tudo o mais que, no decurso da reconstituição do facto, o arguido tenha afirmado e que esteja para além do âmbito intrínseco da diligência, designadamente porque lhe foi perguntado, excede o âmbito probatório do meio de prova em causa e, logo, não pode ser valorado.
Aponta-se a este entendimento (na sua versão “radical” como na versão “moderada”) o erro de integrar (fundir) a reconstituição feita em inquérito na prova por declarações, acabando por, na realidade, não lhe reconhecer valor autónomo e, assim, por transformá-la (a reconstituição) num acto, se não inútil, pelo menos, com um alcance muito limitado, pois o resultado da diligência probatória ficará subtraído à livre apreciação e valoração do tribunal.
O entendimento que tem prevalecido na jurisprudência, no qual nos revemos[18], centra a questão no âmbito da legalidade da aquisição deste meio de prova e, como prova autónoma que é, na sua utilização na função probatória que lhe couber no contexto de avaliação prudencial dos meios de prova, sendo, pois, estranha à problemática da leitura de declarações anteriormente prestadas pelo arguido, a que se referem os artigos 356.º, n.º 8, e 357.º, n.º 2, do Cód. Proc. Penal, como está bem explícito no já citado acórdão do STJ de 05.01.2005, de que destacamos as seguintes passagens:
“A reconstituição do facto, uma vez realizada no respeito dos pressupostos e procedimentos a que está vinculada, autonomiza-se das contribuições individuais de quem tenha participado e das informações e declarações que tenham co-determinado os termos e o resultado da reconstituição, e as declarações (rectius, as informações) prévias ou contemporâneas que tenham possibilitado ou contribuído para recriar as condições em que se supõe ter ocorrido o facto, diluem-se nos próprios termos da reconstituição, confundindo-se nos seus resultados e no modo como o meio de prova for processualmente adquirido”.
Fazendo notar que o conteúdo do privilégio contra a auto-incriminação (nemo tenetur…), ou direito ao silêncio, “significa que o arguido não pode ser obrigado, nem deve ser condicionado a contribuir para a sua própria incriminação, isto é, tem o direito a não ceder ou fornecer informações ou elementos que o desfavoreçam, ou a não prestar declarações, sem que do silêncio possam resultar quaisquer consequências negativas ou ilações desfavoráveis no plano da valoração probatória”, conclui que estão situadas fora do círculo de protecção deste direito “as contribuições probatórias, sequenciais e autónomas que o arguido tenha disponibilizado ou permitido, ou que informações prestadas tenham permitido adquirir, possibilitando a identificação e a correspondente aquisição probatória, ou a realização e a prática de actos processuais com formato e dimensão própria na enumeração dos meios de prova, como é a reconstituição do facto”.
A alteração introduzida, em 2007, no artigo 355.º do Código de Processo Penal, não põe em crise a validade deste entendimento (assim também, o Sr. Conselheiro Santos Cabral, Loc. Cit., 634).
Como se colhe dos autos, na sequência do seu interrogatório efectuado por um inspector da Polícia Judiciária, o arguido disponibilizou-se para participar na reconstituição dos factos e a diligência realizou-se de imediato, estando documentada no auto de fls. 47-48
A reconstituição foi feita com base em declarações/informações do arguido, mas também integra gestos, fotograficamente registados (fls. 50), com os quais demonstrou como e onde ateou o fogo.
É da conjugação dessas indispensáveis informações, ou declarações - instrumentais em relação à recriação do facto - e desses gestos do arguido que surge um meio de prova – a reconstituição do facto – que se diferencia e autonomiza das simples declarações e a situa fora do círculo de protecção do direito ao silêncio, de que o arguido/recorrente fez uso.
Reconstituição que se ajusta ao facto de, nas mencionadas circunstâncias de tempo e lugar transmitidas pelos depoimentos testemunhais, ter ocorrido o incêndio.
Pode, pois, dizer-se que o tribunal “a quo” não violou nenhuma das regras de aquisição e valoração probatória, nada há a censurar-lhe (para além do reparo supra referido) nas opções efectuadas, já que a fundamentação do acórdão recorrido enuncia os elementos que constituem o núcleo essencial da sua imposição e aceitabilidade face aos seus destinatários directos (os sujeitos processuais) e perante a comunidade, permitindo alcançar que ela não é fruto do arbítrio do julgador e que o arguido só impugna a decisão sobre matéria de facto porque ignorou um meio de prova fundamental, cuja validade nunca pôs em causa.
*
O arguido/recorrente não se insurge contra a medida da pena que lhe foi cominada, mas almeja a suspensão da sua execução.
Tal pretensão é justificada com a sua idade, que fará com que não seja “benéfico” «construir o seu futuro dentro de uma prisão, deformando o carácter e personalidade que possui” (conclusão XIX).
Sendo considerações de prevenção geral e de prevenção especial [de (res)socialização][19] que estão na base da aplicação das penas de substituição, o tribunal só deve recusar essa aplicação “quando a execução da prisão se revele, do ponto de vista da prevenção especial de socialização, necessária ou, em todo o caso, provavelmente mais conveniente” ou, não sendo o caso, a pena de substituição só não deverá ser aplicada “se a execução da pena de prisão se mostrar indispensável para que não sejam postas irremediavelmente em causa a necessária tutela dos bens jurídicos e estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias”[20].
Estando verificado o requisito formal da suspensão da execução da pena, há que indagar se ocorre o respectivo pressuposto material, isto é, se se pode concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, designadamente se bastarão para afastar o arguido da criminalidade, pois é esta a finalidade precípua do instituto da suspensão[21].
O tribunal “a quo” entendeu que não e justificou assim a conclusão a que chegou:
“A lei penal portuguesa mostra-se contrária à execução das penas de prisão efetiva por curtos períodos, de que são exemplos os arts. 44º e 50º do Código Penal, dando acentuada prevalência à orientação da execução da pena segundo o princípio da reintegração social do delinquente, de modo a prepará-lo para conduzir a sua vida de modo socialmente responsável e sem delinquir (arts. 40º, nº 1 e 43º, nº 1 do Código Penal).
Nesse sentido, o art. 50º, nº 1 do Código Penal, determina que o tribunal deve suspender a execução da pena de prisão de medida não superior a 5 anos sempre que, atendendo à personalidade do agente, às condições da sua vida, à sua conduta anterior e posterior ao crime e às circunstâncias deste, concluir que a simples censura do facto e a ameaça da prisão realizam de forma adequada e suficiente as finalidades da punição.
Neste aspeto, contudo, apesar de o dano concreto provocado não ter sido muito relevante, tendo em conta as condições pessoais do arguido, nomeadamente, os problemas a nível familiar e social, e, sobretudo, a sua conduta anterior aos factos revelada pela existência de antecedentes criminais, que incluem uma pena de prisão suspensa na sua execução, a qual não foi suficiente para afastar o arguido da prática de atos ilícitos, levando também em conta as exigências de prevenção quer geral quer especial que se fazem sentir no caso, o Tribunal entende que as finalidades da punição do crime não são, neste caso concreto, compatíveis com a suspensão da execução da pena de prisão, impondo-se que tal pena seja efectiva”.
Se a pena privativa da liberdade surge sempre como a última “ratio” do nosso sistema punitivo[22], tal não significa que não haja casos em que só essa pena é adequada a satisfazer os fins das penas.
É óbvio que, ao aumentar o limite da pena de prisão (dos 3 anos para os 5 anos) dentro do qual é possível a suspensão da execução, o legislador pretendeu alargar o âmbito de aplicação da pena de substituição, mas não tornar menos exigente o pressuposto substantivo da sua aplicação.
O entendimento que tem prevalecido na jurisprudência é o de que, naqueles casos em que o crime coloca em grave perigo bens jurídicos de grande valor, a aplicação da pena de substituição não satisfaz aquele conteúdo mínimo de prevenção de integração indispensável à defesa do ordenamento jurídico.
É o caso do crime de incêndio florestal que, geralmente, não só causa graves prejuízos, nomeadamente porque obriga a mobilizar grandes meios materiais e humanos para o combater, mas também, e sobretudo, porque faz perigar a integridade física e a vida de pessoas humanas.
É o que se pode ler no acórdão do STJ, de 02.10.1991:
“O crime de incêndio é um crime muito grave, daí que, pelas consequências a que normalmente dá lugar para a vida, integridade física dos cidadãos e para os bens patrimoniais dos mesmos, deva ser punido com severidade, motivo pelo qual a punição não se compadece, nos termos do artigo 48.º do Código Penal, com a medida de suspensão da pena”.
Se é certo que se deve privilegiar a socialização em liberdade, não é menos certo que a defesa do ordenamento jurídico não pode ser postergada, sob pena de se sacrificar a função de tutela de bens jurídicos que a pena, irrenunciavelmente, desempenha[23].
Banalizar a suspensão da execução da pena de prisão nestes casos redundará num enfraquecimento da confiança da comunidade na validade das normas jurídicas que a prática do crime veio pôr em crise.
No caso concreto, da conduta criminosa do arguido não resultaram grandes prejuízos materiais (embora tenham sido mobilizados meios de considerável dimensão), mas isso só releva para a medida da culpa e, logo, para a determinação da pena.
Importa referir que o juízo de prognose que cabe ao tribunal efectuar, tem de reportar-se ao momento da decisão, pois na formulação desse prognóstico tem de considerar-se, não só a personalidade do arguido, mas também as suas condições de vida e a sua conduta anterior e posterior ao facto.
Ora, o que se apurou na primeira instância não abona nada a favor do arguido: indivíduo desocupado, conhecido no meio em que está inserido por provocar diversos problemas familiares e sociais e sobre ele recaem suspeitas de ter ateado já vários incêndios e ter provocado prejuízos a várias pessoas dessa localidade.
Já sofreu várias condenações, a última das quais em Março de 2010, pela autoria de crime de furto qualificado, na pena de dois anos de prisão, suspensa na sua execução.
Por tudo isso, o facto de ser jovem (à data da decisão condenatória, o arguido tinha 28 anos de idade) é praticamente irrelevante.
As qualidades desvaliosas da personalidade reveladas pelo arguido/recorrente não permitem um juízo de prognose favorável quanto à sua capacidade para não voltar a delinquir e, por conseguinte, não pode haver “esperança fundada de que a socialização em liberdade possa ser lograda” (Figueiredo Dias, Op. Cit, 344).
Neste caso, porque são muito fortes as exigências de prevenção, quer geral (nomeadamente pelo forte alarme social que provocam as acções incendiárias criminosas como a praticada pelo recorrente), quer especial, é a função de advertência e de inocuização da pena que tem de prevalecer.
Em conclusão, não merece censura a decisão recorrida que denegou a suspensão da execução da pena de prisão.

IIIDispositivo
Em face do exposto, acordam os juízes desta 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso de B… e confirmar o acórdão recorrido.
Por ter decaído, pagará o recorrente as custas do processo, fixando-se em quatro UC´s a taxa de justiça devida (artigos 513.º, n.º 1, do Cód. Proc. Penal, 1.º, n.º 2, e 8.º, n.º 9, do Regulamento das Custas Processuais).
(Processado e revisto pelo primeiro signatário, que rubrica as restantes folhas).

Porto, 08-10-2014
Neto de Moura
Maria Luísa Arantes
_____________
[1] Cfr., ainda, o acórdão do Plenário das Secções Criminais do STJ n.º 7/95, de 19.10.95, DR, I-A, de 28.12.1995.
[2] A numeração dos factos (omitida no acórdão recorrido) é da nossa responsabilidade.
[3] Paulo Saragoça da Matta, “A livre apreciação da prova e a fundamentação da sentença”, in “Jornadas de Direito Processual Penal e Direitos Fundamentais”, 251.
[4] Cfr. Paulo Pinto de Albuquerque, “Comentário do Código de Processo Penal”, UCE, 2.ª edição actualizada, 1131.
[5] Idem
[6] Não a verdade ontológica, mas a verdade possível do passado, na base da avaliação e do julgamento sobre factos, de acordo com procedimentos, princípios e regras estabelecidos, pois que, estando em causa comportamentos humanos da mais diversa natureza, que podem ser motivados por múltiplas razões e comandados pelas mais diversas intenções, não pode haver medição ou certificação segundo regras e princípios cientificamente estabelecidos.
[7] Que pode ser um único, mas, desejavelmente, devem ser factos plurais e estar inter-relacionados, de modo a que se reforcem mutuamente.
[8] O juízo de inferência, que deve ser razoável e fundamentado.
[9] Sobre as razões destas reservas, veja-se o texto de Euclides Dâmaso Simões “Prova Indiciária (Contributos para o seu estudo e desenvolvimento em dez sumários e um apelo premente)”, publicado na revista “Julgar”, n.º 02, 2007, 203 e segs.
[10] Cfr., entre muitos outros, os acórdãos do TRP, de 28.01.2009, do TRC, de 30.03.2010 e do STJ, de 11.07.2007 (todos disponíveis em www.dgsi.pt).
[11] Como ensinava o Professor Cavaleiro Ferreira (“Curso de Processo Penal”, II, 1981, p. 292) «existem elementos do crime que, no caso da falta de confissão, só são susceptíveis de prova indirecta como são todos os elementos de estrutura psicológica».
[12] Repare-se que, no aditamento ao auto de notícia a fls. 10-11, o OPC refere que “tudo indica que o incêndio tenha sido originado por um relâmpago do trovão que se fazia sentir na altura” (sic).
[13] Comentário ao artigo 150.º do Código de Processo Penal do Sr. Conselheiro Santos Cabral in “Código de Processo Penal Comentado”, Almedina, 2014, pág. 630.
[14] CARLOS CREUS Apud HARO, Benito Villanueva in La reconstrucción de los hechos y su valor probatório em el proceso penal (acessível em htpp//:www.derechopenalonline.com
/fevrero.2004/harorecontrucción.htm).
[15] Germano Marques da Silva, “Curso de Processo Penal”, vol. II, Verbo, 5.ª edição revista e actualizada, pág. 260.
[16] No entanto, o Sr. Conselheiro Santos Cabral (Op. e Loc. Cit., 633) considera que “merece (…) inteiro acolhimento o entendimento de que o arguido pode ser forçado a comparecer a esta diligência e até mesmo a participar, de uma forma passiva – sob pena de incorrer em desobediência (…), mas já não a colaborar activamente.
[17] Segundo Paulo Pinto de Albuquerque, “Comentário do Código de Processo Penal”, UCE, 2.ª edição actualizada, 418, os intervenientes na reconstituição só podem ser fotografados ou filmados se nisso consentirem, pois “a regra do artigo 147.º, n.º 4, é aplicável por maioria de razão à reconstituição, uma vez que a intromissão no direito à imagem e à voz do participante numa reconstituição é ainda mais abrangente e prolongada e, portanto, mais intrusiva do que em relação ao participante num reconhecimento", regra que vale para o arguido, “pois ele não tem o dever de participar no esclarecimento dos factos imputados. Assim, qualquer participante na reconstituição pode recusar ser fotografado ou filmado durante a reconstituição”.
Perspectiva oposta tem o Sr. Conselheiro Santos Cabral (Loc. Cit., 631-632) que considera que “a exigência de autorização de testemunhas, ou arguido para a gravação do reconhecimento não só confunde o objecto da diligência, colocando o acento tónico num direito à imagem que só secundariamente pode estar em causa, como chama, também, à colação indevidamente, o artigo 147.º, n.º 4 que se refere especificamente à recolha da imagem. Tal exigência, postergando qualquer consideração sobre a eficiência da investigação criminal, aplica analogicamente um preceito que, na prática, tende a impossibilitar qualquer diligência de reconstituição”.
[18] O que não obsta a que consideremos pertinente o alerta, feito no acórdão da Relação de Coimbra de 25.09.2013, de que não pode ser uma questão de semântica saber se estamos perante prova por reconstituição, tal como a define o artigo 150.º do Cód. Proc. Penal, e que a reconstituição não pode servir a finalidade de obtenção de uma confissão.
Não pode ser valorado como meio de prova o auto que se limita a formalizar declarações prestadas pelo arguido, no decurso do inquérito, perante o órgão de polícia criminal, mesmo que este o tenha designado por “auto de reconstituição”.
[19] Por conseguinte, não são considerações de culpa que devem ser tomadas em conta, mas juízos de prognose sobre o desempenho da personalidade do agente perante as condições da sua vida, o seu comportamento e as circunstâncias do facto, que permitam fazer supor que as expectativas de confiança na prevenção da reincidência são fundadas.
[20] Professor Figueiredo Dias, “Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime”, 1993, 333.
[21] Como afirma o Professor Figueiredo Dias, Op. Cit., 343, é na “prevenção da reincidência” que se traduz o “conteúdo mínimo” da ideia de socialização.
[22] É o que decorre do seguinte trecho do preâmbulo do Dec. Lei n.º 48/95, de 15 de Março (que, recorde-se, operou a primeira grande reforma do Código Penal de 1982): “A pena de prisão – reacção criminal por excelência – apenas deve lograr aplicação quando todas as restantes medidas se revelarem inadequadas, face às necessidades de reprovação e prevenção”.
[23] Uma das dimensões da prevenção geral positiva é o restabelecimento ou revigoramento da confiança da comunidade na efectiva tutela penal dos bens jurídicos fundamentais à vida colectiva e individual e é através da condenação penal, enquanto reafirmação efectiva da validade das normas violadas e, portanto, da importância dos bens jurídicos lesados, que essa mensagem de confiança é dada.