Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
4784/12.5TBSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: ACÇÃO DE REIVINDICAÇÃO
NULIDADE DE SENTENÇA
FALTA DE FUNDAMENTAÇÃO
IMPUGNAÇÃO DA MATÉRIA DE FACTO
RESPONSABILIDADE PRÉ-CONTRATUAL
INDEMNIZAÇÃO POR BENFEITORIAS
DETENÇÃO PRECÁRIA
BENFEITORIAS ÚTEIS
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP201701094784/12.5TBSTS.P1
Data do Acordão: 01/09/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS, N.º640, FLS.356-359)
Área Temática: .
Sumário: I - Só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º.
II - Quando se impugne a matéria de facto, não basta identificar meios de prova e afirmar-se, com base neles, que a aquela deve ser alterada, a parte terá de elaborar e expor uma análise crítica da prova formalmente análoga à realizada pelo juiz e concluir no sentido que pretende.
III - Na aferição da existência de responsabilidade adveniente da culpa in contrahendo, haverá que ter em consideração a disciplina decorrente do artigo 483.º do CCivil e igualmente os princípios gerais reguladores da responsabilidade contratual, designadamente o disposto no artigo 798.º do mesmo diploma legal.
IV - Neste tipo de responsabilidade a indemnização abrange o interesse contratual negativo, podendo, em casos limites e de acordo com as circunstâncias concretas do caso, incluir o interesse contratual positivo, nomeadamente se já existia um acordo global e faltava apenas a formalização do negócio.
V - A qualidade de mero possuidor ou detentor precário, não impede, só por si, a aplicação do regime do citado artigo 1273.º referente às benfeitorias necessárias e úteis.
VI - Segundo o artigo 342.º, nº 1, do CCivil, incumbe a quem invocar o direito a indemnização por realização de benfeitorias o ónus de provar as características das obras efectuadas com vista à respectiva qualificação à luz do disposto no citado artigo 216.º, bem como a possibilidade de remoção das benfeitorias sem detrimento da coisa benfeitorizada, para os efeitos do disposto no artigo 1273.º do CC.
VII - O detrimento a que pode dar lugar o levantamento das benfeitorias úteis refere-se não a estas, mas à coisa benfeitorizada, daí que, independentemente da situação subjectiva do possuidor, seja juridicamente irrelevante que do levantamento das benfeitorias resulte o detrimento destas.
VIII - Não é através da ampliação do âmbito do recurso que a apelada pode promover a reapreciação da decisão que admitiu o incidente de oposição, essa reapreciação só podia ser feita mediante impugnação autónoma ou recurso subordinado (artigos 633.º e 644.º, nº 3 do CPCivil).
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 4784/12.5TBSTS.P1-Apelação
Origem: Comarca do Porto-Póvoa de Varzim-Inst. Central-2ª Secção Cível-J4
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
Sumário:
I- Só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º.
II- Quando se impugne a matéria de facto, não basta identificar meios de prova e afirmar-se, com base neles, que a aquela deve ser alterada, a parte terá de elaborar e expor uma análise crítica da prova formalmente análoga à realizada pelo juiz e concluir no sentido que pretende.
III- Na aferição da existência de responsabilidade adveniente da culpa in contrahendo, haverá que ter em consideração a disciplina decorrente do artigo 483.º do CCivil e igualmente os princípios gerais reguladores da responsabilidade contratual, designadamente o disposto no artigo 798.º do mesmo diploma legal.
IV- Neste tipo de responsabilidade a indemnização abrange o interesse contratual negativo, podendo, em casos limites e de acordo com as circunstâncias concretas do caso, incluir o interesse contratual positivo, nomeadamente se já existia um acordo global e faltava apenas a formalização do negócio.
V- A qualidade de mero possuidor ou detentor precário, não impede, só por si, a aplicação do regime do citado artigo 1273.º referente às benfeitorias necessárias e úteis.
VI- Segundo o artigo 342.º, nº 1, do CCivil, incumbe a quem invocar o direito a indemnização por realização de benfeitorias o ónus de provar as características das obras efectuadas com vista à respectiva qualificação à luz do disposto no citado artigo 216.º, bem como a possibilidade de remoção das benfeitorias sem detrimento da coisa benfeitorizada, para os efeitos do disposto no artigo 1273.º do CC.
VII- O detrimento a que pode dar lugar o levantamento das benfeitorias úteis refere-se não a estas, mas à coisa benfeitorizada, daí que, independentemente da situação subjectiva do possuidor, seja juridicamente irrelevante que do levantamento das benfeitorias resulte o detrimento destas.
VIII- Não é através da ampliação do âmbito do recurso que a apelada pode promover a reapreciação da decisão que admitiu o incidente de oposição, essa reapreciação só podia ser feita mediante impugnação autónoma ou recurso subordinado (artigos 633.º e 644.º, nº 3 do CPCivil).
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I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B…, Lda com sede na Rua …, nº …, 1º, freguesia de …, Trofa, veio intentar a presente acção declarativa, de condenação, com processo comum contra C… e mulher, D…, residentes na Rua …, nº …, Póvoa de Varzim, pedindo que a presente acção seja julgada procedente por provada e, em consequência:
a) seja declarado que a autora é dona e legítima possuidora da fracção “A” do prédio identificado em 3º e 4º da petição inicial;
b) sejam condenados os réus a tal reconhecerem e a entregarem tal fracção à autora livre de pessoas e bens e no estado em que a receberam, ou seja, em grosso;
c) bem como a pagarem-lhe a quantia de 12 mil euros acrescida de mil euros por cada mês de ocupação até efectiva entrega.
Invoca para tal os factos constantes da petição inicial e que, em seu entender, a resultarem provados, levariam à procedência dos pedidos deduzidos.
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Os réus contestaram, invocando a sua ilegitimidade passiva, mais impugnando motivadamente alguns dos factos alegados pela autora e, deduzindo igualmente pedido reconvencional, pedem a condenação da autora a pagar-lhes a quantia de 60 mil euros a título de indemnização por responsabilidade pré-contratual.
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Replicou a autora, pugnando pela improcedência da invocada excepção de ilegitimidade, bem como pela improcedência do pedido reconvencional.
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Por articulado de fls. 91 e ss. veio “E…, Lda”, deduzir incidente de oposição espontânea, pedindo que:
1 – Deve ser recebido o presente articulado de incidente de oposição espontânea e a aqui requerente ser admitida a intervir nos presentes autos na qualidade de opoente, com as legais consequências processuais;
2 – Deve, em consequência, nos termos e com os fundamentos vertidos no presente articulado que aqui se reiteram na íntegra, a autora, “B…, Lda.”, ser condenada a pagar à sociedade ora requerente a quantia de € 171.075,32 (cento e setenta e um mil e setenta e cinco euros e trinta e dois cêntimos), acrescida de juros, calculados à taxa legal desde a data da notificação da presente peça processual até integral pagamento, com as legais consequências;
3 – Sempre deverá a mesma autora ser condenada a pagar à sociedade ora requerente o valor indicado no item precedente, a título indemnizatório e com base no enriquecimento sem causa, o que subsidiariamente se invoca;
4 – Deve, nos termos e com os fundamentos vertidos no presente articulado que aqui se reiteram na íntegra, ser reconhecido o direito de retenção por parte da ora requerente relativamente ao imóvel devidamente identificado no item 3º da p. i., mais tarde designado como fracção autónoma “A” do prédio em propriedade horizontal em questão, enquanto não lhe for paga pela autora a quantia indicada no item anterior;
5 – Como tal, deve ser julgado improcedente o pedido formulado pela autora na sua petição inicial.
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Por despacho de fls. 148 o incidente de oposição espontânea foi admitido liminarmente, sendo ordenada a notificação das partes primitivas para o contestarem.
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A autora contestou, pugnando pela improcedência do pedido deduzido.
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Replicou a opoente, terminando como na petição de oposição.
Foi realizada audiência prévia, onde foi proferido despacho saneador que, tabelarmente, considerou as partes legítimas, admitiu o pedido reconvencional deduzido pelos réus, identificou o objecto do litígio e enunciou os temas da prova.
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A fls. 245 a 248, veio a autora deduzir ampliação do pedido, pedindo que seja admitida a ampliação, designadamente no que diz respeito ao agora, e em alternativa, peticionado na nova al. d) do petitório inicial, o qual deverá passar a ser como segue:
d) condenados os réus, caso não procedam à entrega da fracção autónoma no estado em que a receberam, ou seja, em grosso, a indemnizar a autora pelo custo das obras de demolição do edificado na fracção autónoma, para transformação da mesma em SPA, bem como o transporte dos entulhos para vazadouro próprio, no montante que se liquida em € 15.220,00, acrescido de IVA à taxa legal em vigor no momento do pagamento da demolição e transporte dos entulhos para vazadouro, com todas as devidas e legais consequências.
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A opoente, não se opondo à ampliação, pugnou pela sua improcedência.
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Os réus opuseram-se parcialmente à admissão da ampliação.
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Por despacho de fls. 261, foi admitida parcialmente a ampliação do pedido alternativo, admitindo-se o mesmo, com a seguinte redacção:
“d) condenados os réus, caso não procedam à entrega da fracção autónoma no estado em que a receberam, ou seja, em grosso, a indemnizar a autora pelo custo das obra de demolição do edificado na fracção autónoma, para transformação da mesma em SPA, bem como o transporte dos entulhos para vazadouro próprio”.
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Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.
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A final foi proferida sentença cuja parte dispositiva é do seguinte teor:
a) declara-se que a autora é dona e legítima possuidora da fracção “A” do prédio identificado em 3º e 4º da petição inicial.
b) condenam-se os réus a tal reconhecerem e a entregarem tal fracção à autora livre de pessoas e bens e no estado em que a receberam, ou seja, em grosso.
c) condenam-se os réus a pagar à autora a quantia de € 1.000,00 por cada mês de ocupação, contados desde 23 de Novembro de 2012 (data da citação para a presente acção) até à data da entrega da fracção.
d) condenam-se os réus, caso não tenham procedido à entrega da fracção autónoma no estado em que a receberam, ou seja, em grosso, a indemnizar a autora pelo custo das obras de demolição do edificado na fracção autónoma, para transformação da mesma em SPA, bem como o transporte dos entulhos para vazadouro próprio, em valor a liquidar em ulterior incidente de liquidação.
e) absolvem-se os réus do restante peticionado.
f) absolve-se a autora do pedido reconvencional deduzido.
g) absolve-se a autora dos pedidos deduzidos pela opoente espontânea.
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Não se conformando com o assim decidido vieram os Réus interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
a) Na data da citação para a acção de reivindicação não há qualquer facto que permita concluir que eram os Réus quem detinha a fracção reivindicada;
b) Por maioria de razão (pois que quem não detém não pode ocupar) inexiste fundamento em que possa assentar a conclusão de que essa ocupação se verificava “pelo menos desde a data da citação para a presente acção”.
c) O que se retira da matéria provada é que na fracção se instalou um estabelecimento comercial que a sociedade E… montou e explorou com o consentimento da autora até Agosto de 2012, altura em que esse estabelecimento encerrou.
d) A partir dessa data e até à entrega da fracção à autora, a dita sociedade manteve-se, como até aí se mantinha, na posse das chaves do imóvel.
e) Não consta dos autos, nem da prova gravada, que após o encerramento do estabelecimento comercial (Agosto de 2012), o imóvel tivesse sido entregue, ou sido cedido pela E… aos réus ou, por qualquer forma, posto à disposição dos Réus pela dita sociedade, designadamente entregando-lhes as chaves.
f) Ao invés, como se encontra provado e assente, após o encerramento do estabelecimento apenas a sociedade possuía as chaves (como, de resto até aí só ela as tinha) mantendo assim na sua esfera jurídica a disponibilidade de aceder livremente à fracção e, inclusive, de poder reatar em qualquer altura, a sua actividade comercial, pois lá tinha instalado um estabelecimento comercial completo e pronto a retomar o seu funcionamento.
g) O Tribunal “a quo” tratou esta específica e decisiva matéria sem cuidar de a fundamentar suficiente e consistentemente.
h) De resto, na sentença recorrida, a propósito da ocupação da fracção, os Réus e a Opoente são tratados indistintamente, sem definir qual deles a ocupava (contra a vontade da autora).
i) O Tribunal “a quo” não poderia ter concluído (implicitamente) que, à data da citação para a acção, eram os Réus quem ocupava o imóvel.
j) E dizemos implicitamente, porque conforme resulta da sentença recorrida, o Tribunal não resolveu a questão da ocupação do imóvel, visto que não atribuiu fundadamente a uma das partes (Réus ou Opoente) essa ocupação, limitando-se a condenar os Réus na restituição e na indemnização, no pressuposto de que eram eles quem a ocupava.
k) Nessa parte, portanto, a sentença enferma de nulidade por violação do dever de fundamentação, o que se invoca nos termos e para os efeitos da al. b) do nº 1 e do nº 4 do artº 615º do CPC, dado que não justificou a decisão de imputar aos Réus a ocupação da fracção na data da citação para a acção.
l) Nem poderia o Tribunal “a quo” a sua decisão naqueles factos que, sobre essa matéria, constam da sentença recorrida como provados na audiência final.
m) Pois que, em vista dos extractos dos depoimentos gravados sobre essa matéria (do réu C… – fls. 21 e 22; e da testemunha F… – fls. 88 e 89) (e outros não há que a abordem), não os poderia ter dado como provados, como deu.
n) Desse modo, se impunha, ao invés da condenação, a absolvição dos Réus/Recorrentes do pedido.
o) Pois que é certo que os Réus/Recorrentes, quando citados para a acção, não podiam restituir o que não possuíam e, decorrentemente, não podiam estar a ocupar o que não detinham.
p) Na verdade, quem não possui ou detém também não pode usar ou ocupar e, por maioria de razão, não pode restituir.
q) Ao condenar os RR./Recorrentes na restituição e nas consequentes indemnizações, o Tribunal “a quo” violou o nº 1 do artigo 1311º do Código Civil, visto que, em sede de apreciação do mérito da causa, se apurou factualidade que demonstra a ilegitimidade substantiva dos Réus em face da relação material tal como foi configurada pela autora.
r) Donde decorre que não se verificando os requisitos de procedibilidade da acção de reivindicação, isto é, a posse ou a detenção do bem reivindicado, pelos demandados, deveriam estes (os Réus) ser absolvidos dos pedidos de restituição e de indemnização.
s) Em sede negocial, recorrentes e recorrida geraram uma proposta de compra e não um mero contrato-promessa de compra e venda, seguida de uma aceitação de venda e não uma mera promessa de compra.
t) Só não tendo sido efectivado o contrato de compra e venda, tendo as partes chegado a acordo sobre os termos essenciais do negócio.
u) Da factualidade provada sobre esta matéria, decorre que os réus acordaram comprar à autora a fracção por 220 mil euros; que para efectivar essa compra os réus recorreram a um financiamento bancário, cujas condições foram as aprovadas em 25/02/2010; sendo essas condições as descritas nos itens 23º, 24º e 25º da Contestação dos réus/recorrentes e constam da matéria provada; que a aprovação desse financiamento bancário e o seu respectivo prazo de validade foram dados a conhecer à autora (matéria provada alegada no artº 29º da Contestação).
v) Os réus propuseram-se comprar a fracção, tendo em conta as particulares condições do (daquele) financiamento aprovado, o qual representava para os réus o esforço económico global descrito no artº 25º da Contestação (matéria provada), ou seja, € 215 415,04 (capital e juros) com um spread de 2,150%.
w) Foi, portanto, no pressuposto de que iriam beneficiar desses específicos termos e condições de financiamento (e não de outros mais gravosos), que os réus decidiram, com autorização da autora, ceder a fracção à sociedade E… para que esta aí instalasse um estabelecimento comercial de estética, fisioterapia e spa, com o objectivo de, após a aquisição, a darem de arrendamento comercial a essa sociedade.
x) É da experiência comum que uma proposta de financiamento bancário (como, de resto, propostas comerciais das mais variadas naturezas) são construídas com base em pressupostos variáveis (juros, taxas de esforço, spreads,etc) sendo por isso válidos dentro de períodos específicos e determinados, findos os quais caducam e são considerados de nenhum efeito.
y) Pelo depoimento da testemunha Engº F… se constata que a autora tinha disso pleno conhecimento, tando mais que a dita testemunha é pessoa experimentada nessa matéria.
z) Junto aos autos existe abundante documentação, consistindo em troca de correspondência (emails) entre os réus e a autora, sobre os quais se pronunciaram os aqui recorrentes em requerimento junto aos autos em 08/02/215, e nos quais se demonstra que os réus questionaram por diversas vezes a autora quanto à necessidade de celebrar a escritura de compra e venda dentro do prazo de validade do empréstimo (Dezembro de 2010), manifestando-lhe a preocupação quanto à alteração das condições e termos do financiamento se este viesse a caducar.
aa) Para a celebração da referida escritura de compra e venda era essencial e determinante a respectiva licença de utilização, que só a autora poderia obter junto da competente Câmara Municipal.
bb) Esta documentação, junta aos autos pela própria autora, a ser, como deveria ter sido e não o foi, considerada pelo Tribunal “ a quo”, seria suficiente para provar a existência de um prazo específico (6 meses) dentro do qual deveria ter sido celebrada a escritura de compra e venda da fracção, sob pena de caducidade da proposta de financiamento.
cc) Como decorre da matéria provada sobre as negociações entre a autora e réus, ficou claro, após a aprovação do financiamento bancário, que passou a existir um prazo para a celebração da escritura de compra e venda, justamente o prazo durante o qual esse financiamento permaneceria válido, pois que, ultrapassado esse limite de validade e caducada a proposta de empréstimo, não era já possível os réus pagar o preço estabelecido e efectivar a compra e venda do imóvel.
dd) De resto, quando à autora foi transmitida a necessidade de celebrar a escritura para acautelar a validade do empréstimo (designadamente até finais de 2010) e de, para o efeito, obter a licença de utilização da fracção, em momento algum a autora afirmou que tal não lhe era possível ou que não assumia responsabilidades nessa matéria.
ee) Ao invés, durante o ano de 2010, executou ela própria, diversas obras na fracção para a instalação do estabelecimento comercial da sociedade E….
ff) Não tendo obtido a licença de utilização dentro do prazo de validade do empréstimo bancário que aos réus tinha sido concedido e aprovado, ou seja, até finais do ano de 2010, obtendo-a apenas em 08/08/2011, a autora, por facto que a si é exclusivamente imputável, originou a caducidade do dito empréstimo e a impossibilidade de os réus, pagando o preço estipulado, a adquirirem e posteriormente a arrendarem à mencionada sociedade.
gg) Tanto mais que, tendo os recorrentes pedido a simulação para um novo financiamento, este revelou um agravamento extraordinário (facto provado constante do artº 34º da Contestação) das respectivas condições que os réus não podiam, nem lhes era exigível, suportar.
hh) É patente que houve, da parte dos réus, uma expectativa legítima de que o negócio se realizasse, tendo desse modo os réus, por facto unicamente imputável à autora, ficado objectivamente impossibilitados de celebrar, dada a excessiva onerosidade de um novo empréstimo, a escritura de compra e venda da fracção em causa, com isso frustrando de modo irremediável, o seu interesse criado pela confiança no projecto de contrato;
ii) Os recorrentes viram frustradas as expectativas de ganho que, pelo menos, resultariam do arrendamento da fracção à dita sociedade E…, traduzidos numa renda mensal nunca inferior a Mil Euros e, pelo prazo mínimo de 5 anos, tendo em conta o tempo necessário à recuperação/amortização do valor do investimento efectuado por aquela sociedade, tal representaria, pelo menos, o montante de 60 Mil euros (12meses x 5anos);
jj) Indemnização que reclamam a título de responsabilidade pré-contratual, nos termos do artigo 227º do Código Civil (CC), deveria ter sido concedida aos réus em sede de procedência do pedido reconvencional que deduziram, visto ter verificado a culpa da autora, nos termos dos artigos 483º e 798º, do mesmo diploma legal.
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Também a opoente não se conformando com o sentenciado veio interpor recurso, concluindo da seguinte forma:
1 – Não pode a ora apelante conformar-se com a decisão proferida nestes autos que fez improceder os pedidos formulados pela opoente espontânea, deles absolvendo a A..
2 - Daí o presente recurso de apelação que versa igualmente sobre matéria de facto, requerendo-se a reapreciação da prova gravada.
3 - Ora, afigura-se à opoente que a Mª Juiz “a quo” valorou de forma totalmente incorrecta diversas questões essenciais dos autos e que, a ser tal valoração feita de forma correcta, levaria a uma decisão diferente, aliás, totalmente diferente daquela que foi tomada.
4 – E entende-se que, para além da documentação e prova pericial existente nos autos, em audiência de julgamento foi feita prova bastante para se chegar a tal conclusão.
5 – A aqui recorrente veio nos autos apresentar articulado de incidente de oposição espontânea, alegando, no essencial, os seguintes factos:
a) que o imóvel em questão se destinava a ser-lhe dado de arrendamento pelos RR., logo que deles fossem donos, a fim de aí ser instalada a sua sede e estabelecimento principal de serviços de estética, fisioterapia e spa;
b) que de tal circunstância estava bem ciente a A.;
c) que em 2010 a A. autorizou que a opoente ocupasse o imóvel para aí fazer todas as obras de adaptação necessárias àquele fim indicado em 1º, assim como aí instalasse, para o mesmo fim, diverso equipamento e mobiliário;
d) que a opoente, de facto, entrou na posse do imóvel quando se iniciaram as ditas obras-no mês de Outubro de 2010–e que aí passou a exercer a sua actividade, depois de o imóvel se mostrar totalmente pronto e adaptado para tal a partir de 4 de Junho de 2011;
e) que tudo isso foi do conhecimento e com o consentimento da A.;
f) que em tais obras e com a aquisição de equipamento dispendeu a opoente um montante global de € 171.075,32;
g) que, como percebeu que não se iria realizar a escritura entre A. e RR., acabou por encerrar o estabelecimento em Agosto de 2012, mas manteve a posse do imóvel.
6 – Como tal, vieram pedir, além do mais, a condenação da A. no pagamento a ela, opoente, de um valor indemnizatório, que liquidaram.
7 – Nessa sequência, levaram-se a temas de prova as matérias que deles constam como itens 9º, 10º e 11º.
8–Atreve-se a opoente a vir dizer que a prova documental e pericial existente nos autos e vária da matéria que a Mª Juiz considerou na sentença como provada constitui um passo de gigante para se considerar ter a opoente feito prova do que lhe incumbia: obras de adaptação feitas no imóvel, autorização e colaboração da A. e custo das mesmas, posse do imóvel pela opoente e aumento do valor do imóvel devido a tais obras.
9 – Uma vez que a Mª Juiz “a quo”, apesar de tudo, não o considerou, haverá que se escalpelizar alguns aspectos, de facto e de direito, que vão fazer, certamente, alterar a decisão tomada.
10 – Refira-se que a matéria de facto que a Mª Juiz considerou como provada–tanto, como diz, por acordo das partes, como por prova documental, como na audiência de julgamento (vide tais passagens na sentença de que ora se recorre)–demonstra à saciedade a existência de um papel preponderante da A.–que era a dona do imóvel–no acto de ocupação pela opoente do local em causa, não só pelo conhecimento, como pelo expresso consentimento para que essa ocupação ocorresse, como, ainda, pelo expresso consentimento de que fossem levadas a cabo inúmeras obras–leia-se, todas as obras–indispensáveis à laboração do estabelecimento da opoente, laboração que se foi dando ao longo de período superior a um ano.
11 – A Mª Juiz “a quo” acabou, estranhamente, por fazer irrelevar tal circunstância; parece que entendeu a Ilustre Julgadora “a quo” que como a escritura não se fez entre A. e RR., paciência… O facto de a opoente ter feito as obras nas circunstâncias em que fez deixa, pura e simplesmente de interessar, irrelevando juridicamente.
12 – E tal apesar de a A. delas ter sabido antecipadamente e de as ter autorizado expressamente, bem sabendo que a opoente laborou no local mais de um ano!
13 - Na sentença ora recorrida deu-se uma importância decisiva ao facto de a fracção autónoma ter sido entregue em grosso ou em bruto, ou melhor, ter sido atribuída a sua posse à opoente em grosso ou em bruto! É um facto que assim foi! Mas tão facto como esse–ou mais decisivo ainda–é que ela só deixou de estar em grosso ou em bruto precisamente porque a A. o permitiu, deu para tal autorização expressa.
14 – E essa circunstância não pode deixar de ser considerada. E a Mª Juiz “a quo” desconsiderou-a por completo!
15 – A Mª Juiz “a quo” não podia limitar-se a dar exclusiva importância ao facto de as obras realizadas apenas terem utilidade para o exercício da actividade de spa, retirando daí que isso representou prejuízo e não ganho para a A..
16 – E isto pelo simples facto de que a A. autorizou precisamente que a opoente fizesse as obras para esse efeito de spa e não para qualquer outro!!
17 – À opoente não poderá ser assacada qualquer culpa ou responsabilidade na não celebração da escritura pública de compra e venda entre A. e RR.; logo, imputando-se a alguma daquelas partes o facto de o negócio se ter gorado, essa parte teria de ser responsável pela circunstância de a opoente ter deixado de poder exercer a sua actividade no local e ver perder-se o que gastou nas obras que aí fez, deixando de poder usufruir de tais obras e materiais que aí incorporou.
18 – Apurados os competentes factos no que a isso toca, parece indubitável que foi da exclusiva culpa da A. a não concretização do negócio com os RR., levando em conta a matéria que se provou relativamente ao empréstimo bancário e à emissão da licença camarária.
19 – Como a opoente não tomou o imóvel de assalto, a conduta da A. resultou num evidente prejuízo para a opoente, computando-se esse prejuízo no valor gasto nas obras. Esse é o dano sofrido pela opoente.
20 – Como já se viu que a culpa seria de imputar à A., já que foi por motivo exclusivamente imputável a ela que não se outorgou a escritura referida, temos que facilmente se descortina o nexo de causalidade entre a culpa (a conduta) e o dano.
21 - Isto é: situando-nos no domínio da responsabilidade extra-contratual seria por essa via que a A. teria de indemnizar a opoente pelo dano que lhe causou, em virtude das obras que esta, legitimamente, fez no imóvel.
22 – Considerou, todavia, a Mª Juiz “a quo” que o contrato promessa de compra e venda, porque celebrado entre A. e RR. de forma meramente verbal, era nulo.
23 – Ora, será certamente em situações como estas que haverá que se lançar mão do carácter subsidiário do enriquecimento sem causa.
24 – Dúvidas não restam de que as obras feitas no imóvel pela opoente, porque serviram para melhorar o imóvel, constituíam ou constituíram benfeitorias úteis, sendo que a opoente era possuidora ou, pelo menos, detentora legítima, do imóvel em causa nos autos.
25 – Enquanto tal, levou a cabo as obras elencadas nos autos com conhecimento e autorizadas pela A..
26 – Tais obras foram feitas pela opoente; e pagas pela mesma, não obstante o que deu a Mª Juiz “a quo” como provado e não provado quanto a essa matéria.
27 – A documentação contabilística quanto às mesmas está toda emitida em nome da opoente e existem orçamentos enviados à opoente (até pela própria A.)
28 – Além disso, dos depoimentos acima transcritos do R., C… e da testemunha G… resulta claramente que foi a opoente quem teve de disponibilizar o dinheiro para o pagamento final de tais obras, pelo que se afigura à opoente que não poderia nunca, com tais depoimentos, mal valorados pela Mª Juiz “a quo” e com a documentação constante dos autos, não poderia, dizia-se, aquela mesma magistrada dar como não provada a matéria que refere na sentença como constante dos arts. 9º, 20º, 22º, 27º, 30º, 32º e 36º do articulado de oposição espontânea, que teria, antes, de ser dada como provada, assim como não poderia ter dado como provada, mas antes como não provada, a matéria que consta do artº 41º da contestação à oposição espontânea, pelo que se entende que tais pontos de facto foram incorrectamente julgados pela Ilustre Juiz “a quo”.
29 – As obras foram feitas e atingiram o valor em causa (vide relatório de peritagem); foram-no de boa fé, na sequência da entrega da fracção que foi feita à opoente por parte da A., que lhe permitiu a entrada no local e sua ocupação e utilização efectiva, bem sabendo a A. que era a opoente que iria fazer as obras, tanto que lhe remeteu diversos orçamentos para tais obras.
30 - É essencial perceber-se que a A. permitiu a posse ou detenção legítima por parte da opoente para aquele fim específico e não para qualquer outro ou para um fim que a opoente entendesse por conveniente e que só resolvesse posteriormente à entrega do imóvel; conformou-se, pois, com aquela finalidade de giro comercial.
31 - Todas as obras que a opoente fez no imóvel–e que se deram como provadas–constituem, necessariamente, benfeitorias úteis; foram obras de adaptação do local à actividade da opoente, expressamente para aí autorizada pela A., e que serviram, pois, claramente, para melhorar o imóvel onde foram incorporadas, como, de facto, melhoraram, aumentando o seu valor, até porque a fracção se encontrava em grosso.
32 - Não pode, agora, argumentar-se que não aumentaram o valor da fracção (pelo contrário, até prejudicaram tal valor) porque só dão para um estabelecimento daquele tipo e não para um estabelecimento de padaria, por exemplo; é que a A. não entregou o imóvel à opoente nem a deixou fazer obras para a instalação de uma padaria…
33 - Assim como não pode, obviamente, ter-se o mesmo raciocínio, errado e incongruente (como teve a Mª Juiz “a quo”), precisamente fundamentado no facto de a obra estar em grosso quando se permitiu que a opoente a ocupasse para estética, fisioterapia e spa e dizer-se que, por causa disso, não se pode falar em não haver detrimento do imóvel onde as obras foram feitas.
34 - Assente, pois, teremos que ter que nos encontramos perante benfeitorias úteis; ora tais benfeitorias, feitas de boa-fé, apenas poderão ser levantadas se não ocorrer detrimento para o imóvel onde foram implantadas; caso haja esse detrimento elas terão de ser indemnizadas nos termos do enriquecimento sem causa.
35 – De toda a prova que existe nos autos e da reapreciação de alguns dos depoimentos da audiência de julgamento, resulta que existe, indubitavelmente, tal detrimento do imóvel caso se levantem as benfeitorias levadas a cabo pela opoente (sendo que, caso pudessem ser levantadas sem detrimento, sempre teria a opoente direito a fazê-lo).
36 – E esse detrimento não é jamais colocado em crise pela raciocínio feito pela Ilustre Julgadora de 1ª instância: como o imóvel estava em grosso quando foi entregue e agora a A., depois de ter permitido o que permitiu, vem pretender que o mesmo imóvel lhe seja entregue igualmente em grosso, então a retirada das obras ou o levantamento das benfeitorias levadas a cabo pela opoente jamais poderá levar a um detrimento do mesmo imóvel!!
37 – Da análise dos acima transcritos depoimentos do R., C… e das testemunhas F…, H… e G…, resulta claramente a existência de tal detrimento do imóvel, caso houvesse o levantamento das benfeitorias, pelo que se afigura à opoente que não poderia nunca, com tais depoimentos, mal valorados pela Mª Juiz “a quo”, e com a documentação constante dos autos, aquela mesma magistrada dar como não provada a matéria que refere na sentença como constante dos arts. 37º, 41º, 42º, 43º, 44º e 45º do articulado de oposição espontânea, que teria, antes, de ser dada como provada, pelo que se entende que tais pontos de facto foram incorrectamente julgados pela Ilustre Juiz “a quo”.
38 – Dando-se como provado tal detrimento, que não se pode dissociar do estado em grosso em que se apresentava o imóvel antes da sua entrega pela A. à opoente para a realização daquelas específicas obras, então as benfeitorias úteis não podem ser levantadas, devendo o seu autor – a opoente – ser indemnizada por elas com base no enriquecimento sem causa.
39 – E grande parte do que agora se alega se justifica pelo facto de a Mª Juiz “a quo” não haver dado a devida relevância aos ditos depoimentos.
40 - Objectivamente, não podem resultar dúvidas de que, tendo em conta tudo o que ocorreu, e independentemente daquilo que a A. pretenda fazer agora da fracção autónoma, ela, A., enriqueceu com as obras feitas pela opoente e esta empobreceu, não havendo causa justificativa para tal enriquecimento.
41 - Num caso como o dos autos, o valor de tal enriquecimento é necessariamente, e pelo menos, igual ao valor total das obras ou benfeitorias levadas a cabo no prédio em questão, que foram devidamente provadas nos autos, aliás, e que é, também, o valor que tinham as benfeitorias à data em que se apresentou o articulado de oposição espontânea.
42 - O valor que a opoente acrescentou ao imóvel, após as benfeitorias que fez, é igual ao valor gasto com essas benfeitorias; é essa a medida do enriquecimento por parte da A. e do empobrecimento por parte da opoente (vide artsº 43º e 44º do articulado de oposição espontânea, que aqui se reiteram).
43 - O imóvel encontrava-se em grosso, apenas com o tecto e paredes ao alto e passou a mostrar-se completamente pronto e equipado, totalmente acabado em todas as artes de construção civil, para a finalidade comercial que a A. permitiu que a opoente instalasse e começasse a exercer–como exerceu efectivamente–no mesmo imóvel; daí a óbvia obrigação de indemnizar por parte da A., de “restituir” tal enriquecimento (artº 473º do C. Civil).
44 – Dos mesmos depoimentos acima transcritos, resulta igualmente que jamais a Mª Juiz “a quo” poderia ter dado como provada a matéria do artº 50º da contestação ao articulado de oposição espontânea, que teria de ser dado como não provada, o mesmo se dizendo relativamente aos arts. 31º e 33º da mesma contestação.
45 – Finalmente, e no que toca a uma nova errada apreciação de um depoimento testemunhal, diga-se que, analisando o que disse a acima referida testemunha G…, e que também acima se transcreveu, resulta à evidência que a Mª Juiz “a quo” não podia ter considerado como provada–mas antes como não provada–a matéria do artº 24º da réplica apresentada pela A., assim como deveria ter dado como provada a matéria constante do artº 17º do articulado de oposição espontânea, ao contrário do que fez.
46 – De tal depoimento, de facto, resulta claramente a motivação que levou a opoente a encerrar o estabelecimento que se encontrava a explorar no imóvel pertencente à A.: só o fez porque verificou que o negócio entre A. e RR. se tinha gorado e que não tinha futuro a sua manutenção naquele local.
47 – Andou, pois, mal a Mª Juiz “a quo” ao decidir como decidiu, fazendo improceder o pedido formulado pela opoente.
48 – Deverá, pois, ser corrigida em conformidade com o alegado na presente peça processual a matéria dada como provada e não provada pela Mª Juiz de 1ª instância.
49 – Pelo que, em consonância com tudo o até agora alegado, deveria–e deverá–ser julgado inteiramente provado e procedente o pedido formulado pela opoente no seu articulado, com a fundamentação de direito explanada nesse articulado e nestas alegações.
50 - Considera a apelante, com todas as considerações que fez ao longo destas conclusões, ter cumprido a exigência vertida na alínea b) do nº 2 do artº 685º-A do C. P. C. na sua anterior redacção, e alínea b) do nº 2 do artº 639º do mesmo diploma, na actual redacção, considerando-se igualmente cumpridas as exigências constantes do artº 685º-B do mesmo diploma legal, na sua anterior redacção, e 640º na actual redacção.
51 - Assim sendo, ao decidir como decidiu, violou a sentença recorrida os artigos 483º, 216º, 1.273º, 473º, 479º, 754º e 756º, todos do Código Civil.
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Devidamente notificada contra-alegou a Autora concluindo pela improcedência dos recursos, solicitando ainda a sua ampliação.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são as seguintes as questões que importa apreciar e decidir:
Recurso dos Réus
a)-saber se a sentença padece da nulidade estatuída no artigo 615.º, nº 1 al. b) do CPCivil;
b)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto;
c)- saber se se verifica, ou não, a procedibilidade da acção de reivindicação no que concerne à posse ou a detenção do bem reivindicado, pelos Réus demandados;
d)- saber se a Autora recorrida devia ter sido condenada, ou não, em sede de responsabilidade pré-contratual.
Recurso da Opoente
a)-saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto;
b)- saber se o pedido formulado pela opoente relativo à indemnização por benfeitorias devia, ou não, ter sido julgado improcedente
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

O tribunal recorrido deu como provados e não provados os seguintes factos:
Dos factos assentes por acordo das partes nos articulados e resultantes da prova documental:
Da petição inicial (factos assentes por acordo das partes nos articulados e resultantes da prova documental):
Do art. 1.º. A autora, por escritura de sete de Março de 2002, pelo preço de vinte e cinco mil euros, adquiriu por compra o seguinte bem: Parcela de terreno destinada a construção urbana com a área de setecentos metros quadrados, sito na Rua …, freguesia …, concelho da Trofa, inscrita no artigo urbano 3.112 e descrita sob o nº 2.649.
Do art. 2.º. Tal prédio está registado a favor da autora.
Do art. 3.º. Nessa parcela de terreno a autora construiu um prédio de rés-do-chão, três andares e vão de cobertura, inscrito no artigo urbano 5151 e descrito sob o nº 2649.
Do art. 4.º. E registado em nome e a favor da autora.
Do art. 5.º. Aliás, sempre por si e antepossuidores, a autora detém o referido prédio, há mais de 20 ou 30 anos, de forma pública, contínua, pacífica e de boa-fé.
Do art. 6.º. Na convicção de exercer direito próprio e não lesar quem quer que seja.
Do art. 7.º. Por assim ser, paga as contribuições a ele referentes, repara o telhado, as janelas, as portas, o manda pintar.
Do art. 8.º. Sempre na presença de todos os vizinhos e sem que alguém, alguma vez, fizesse sentir estar lesado.
Do art. 10.º. Por meados de Novembro foi entre autora e réus celebrado contrato promessa de compra e venda–tudo por forma verbal.
Do art. 11.º. Por esse contrato a autora prometeu vender aos réus o rés-do-chão do referido prédio, em grosso, ou seja a fracção “A”.
Do art. 12.º. Pelo preço de € 220.000,00.
Do art. 13.º.E os réus tal prometeram comprar.
Do art. 14.º. Estes (réus) até cederam o bem prometido comprar a uma sociedade de seu nome E…, Lda.
Do art. 15.º. E esta aí instalou no referido rés-do-chão um centro de estética e SPA.
Do art. 16.º. Com o conhecimento da autora.
Do art. 17.º. Este estabelecimento encerrou há já vários meses.
Do art. 19.º. Os réus, só aceitam outorgar a escritura por preço totalmente diferente do acordado.
Do art. 25.º. A autora está impedida de vender ou arrendar a dita fracção.
Do art. 26.º. Se arrendada a autora obteria um rendimento (renda) de mil euros por mês.
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Da contestação dos réus.

Do art. 19.º. As condições negociais foram estabelecidas e acordadas entre o réu marido e o Engº F…, este em representação quer da vendedora, ora autora, quer do I….
Do art. 22.º. Tendo em conta essa finalidade, ficou então acordado entre o réu marido e o Engº F…, que a compra daquela fracção pelos réus ficaria sujeita à verificação da condição seguinte:
a) A autora, através do mencionado I… procederia à execução, em obra, dos trabalhos de adaptação da fracção às necessidades da actividade que nela iria ser exercida pela sociedade E….
Do art. 28.º. Para a celebração dessa escritura, era imprescindível, entre outros documentos, a licença de utilização.
Do art. 32.º. Tendo a autora obtido a licença de utilização da fracção em 08 de Agosto de 2011.
Do art. 49.º. Procedendo, à instalação na fracção de um estabelecimento comercial totalmente equipado para os enunciados fins comerciais.
Do art. 52.º. Sempre com o conhecimento da autora.
Do art. 67.º. A obtenção dessa licença de utilização competia exclusivamente à autora.
Do art. 68.º. Que a obteve em 08 de Agosto de 2011.
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Do articulado de oposição espontânea
Do art. 7.º. Tal imóvel–ou seja, o dito rés-do-chão–destinava-se–porque nesse sentido já os réus e a opoente haviam acordado–, após a respectiva aquisição por parte dos mesmos réus, a ser dado de arrendamento à sociedade opoente, a fim de esta aí instalar não só a sua sede como o seu estabelecimento principal, passando nesse local a desenvolver a actividade comercial subjacente ao respectivo objecto social–serviços de estética, fisioterapia e spa.
Do art. 8.º. De tal acordo entre a aqui requerente e os réus estava bem ciente a autora.
Do art. 33.º. Instalou a opoente na fracção autónoma em questão um estabelecimento comercial de estética, fisioterapia e spa, totalmente equipado para esses fins.
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Da contestação à oposição espontânea
Do art. 10.º. A opoente com a autora nunca celebrou qualquer contrato, nunca com ela celebrou qualquer acordo.
Do art. 12.º. A opoente não ocupa a fracção desde Agosto de 2012.
Do art. 20.º. A autora havia entregue a fracção aos réus e para estes dela fazerem o que entendessem.
Do art. 35.º. A fracção foi prometida vender aos réus “em grosso” ou “em bruto”.
Do art. 38.º. A autora procedeu a várias obras na fracção.
Do art. 55.º. A opoente não ocupa a fracção.
Do art. 56.º. Não gasta luz, nem electricidade, não recebe os clientes, tem as portas de todos fechadas.
Do art. 57.º. Aí não exerce qualquer actividade, desde Agosto de 2012.
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No âmbito do procedimento cautelar apenso, foi acordado entre as partes a entrega da fracção em discussão nestes autos, à autora, até ao dia 28 de Fevereiro de 2015.
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Dos factos que resultaram provados no julgamento:
Da petição inicial:
Do art. 19.º. Os réus negam-se a outorgar a escritura pelo preço acordado.
Do art. 20.º. E negaram-se a entregar o referido rés-do-chão que continuaram a ocupar, até finais de Fevereiro de 2015.
Do art. 21.º. Contra a vontade da autora.
Do art. 22.º. E sem qualquer título, pelo menos desde a entrada da presente acção em juízo (20/11/2012).
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Da contestação dos réus.
Do art. 17.º. O contrato promessa verbal foi celebrado entre autora e réus em Novembro de 2009.
Do art. 20.º. Desde o início das negociações, mas depois de acertado o preço, o réu marido deu conhecimento à autora, na pessoa do identificado Engº F…, que os réus recorreriam a financiamento bancário para pagamento parcial do preço de aquisição da fracção.
Do art. 21.º. Tendo dado igualmente conhecimento que, após a aquisição da fracção pelos réus, esta se destinaria a ser cedida, por arrendamento, à sociedade E… para aí instalar um estabelecimento comercial de Estética e SPA.
Do art. 23.º. Os réus negociaram junto da J… a concessão de um empréstimo no montante de € 160.000,00 (cento e sessenta mil euros).
Do art. 24.º. O qual foi aprovado por esse montante, como resulta da notificação de 25 de Fevereiro de 2010 junta como doc. nº 1 com a contestação.
Do art. 25.º. O custo do empréstimo para os réus (capital e juros) ascenderia ao montante global de € 215.415,04 (duzentos e quinze mil, quatrocentos e quinze euros e quatro cêntimos), correspondente a um spread de 2,150%.
Do art. 29.º. Recebida a notificação da J… de 25 de Fevereiro de 2010, o réu marido deu conhecimento da aprovação do empréstimo e do seu prazo de validade, ao Engº F….
Do art. 31.º. A autora não concluiu as obras de adaptação até Julho de 2010, acabando-as vários meses depois dessa data.
Do art. 34.º. Os réus solicitaram à J…, em 01/02/2012, a simulação de um empréstimo com a mesma finalidade de investimento imobiliário, dela resultando um agravamento substancial das condições de financiamento, quer quanto ao capital inicial concedido–135 mil euros, em vez dos 160 mil euros do empréstimo aprovado em 2010– quer quanto aos juros totais que ascendiam a € 131.303,53, correspondente a um spread de 5,250%.
Do art. 35.º. O que significava que, se em 2010 o custo do financiamento aprovado para um empréstimo de 160 mil euros ascendia a € 215.415,04, já em 2012 o custo de um financiamento de apenas 135 mil euros ascendia a € 277.644,91.
Do art. 36.º. Representando para os réus um agravamento, apenas no que respeita a juros totais, de € 62.229,91.
Do art. 39º Os réus propuseram ainda que o montante desse agravamento fosse suportado por ambas as partes, dispondo-se a adquirir a fracção pelo preço de 180 mil euros, de modo a absorver parte do montante do agravamento do custo de aquisição.
Do art. 40.º. No entanto, dado que a ser concretizado um novo empréstimo o montante de capital a ser concedido seria de 135 mil euros, os réus propuseram pagar de imediato a quantia de 130 mil euros na data da outorga da escritura, o que não foi aceite pela autora que exigia o pagamento integral de € 180.000,00.
Do art. 41.º. Não tendo a autora aceitado a proposta dos réus, e apresentando esta uma contra-proposta que os réus não aceitaram, cessaram então nesse momento as negociações, gorando-se, consequentemente, o negócio de aquisição da fracção em causa nestes autos.
Do art. 43.º. Tendo em conta o propósito de os réus darem de arrendamento a fracção à sociedade E… para a actividade comercial de estética e SPA.
Do art. 44.º. Intenção essa que sempre foi do conhecimento da autora.
Do art. 45.º. Esta, no decorrer do ano de 2010 por intermédio do mencionado Engº F…, autorizou aquela sociedade a efectuar na fracção obras de construção civil, bem como a instalar diverso equipamento e mobiliário com vista ao exercício daquela actividade.
Do art. 48.º. Também durante o ano de 2010 e para os mesmos fins comerciais, aquela sociedade encomendou a outras empresas a execução de diversos trabalhos de carpintaria, designadamente portas, estrados, forras, rodapés, armários e prateleiras, bem como instalou condutas de ar, isolamento, portas de banho turco, torneiras, lavatórios, equipamento de ar condicionado, de aquecimento solar, e montras para efeitos publicitários;
Do art. 50.º. Igualmente com autorização e com o conhecimento da autora.
Do art. 51.º. Por consequência, a sociedade E… passou a usar a dita fracção em Maio de 2011 e passou aí a exercer a sua actividade comercial desde 04 de Junho de 2011 até Agosto de 2012.
Do art. 52.º. Sempre com conhecimento e autorização da autora.
Do art. 53.º. Desde 2010 com a autorização da autora para o início das obras de adaptação ou, pelo menos, desde Maio de 2011 com a inauguração do estabelecimento, que a E… passou a usar o referido imóvel.
Do art. 55.º. O estabelecimento comercial encerrou em Agosto de 2012.
Do art. 58.º. Não obstante o encerramento do estabelecimento, a E… permaneceu até à entrega efectuada no âmbito do procedimento cautelar, na posse da chave do imóvel, tendo em conta o avultado investimento que nele se efectuou na perspectiva de o vir a arrendar aos réus.
Do art. 65.º. Os réus deram conhecimento à autora da aprovação do financiamento contraído na J…, bem como do prazo de validade do mesmo.
Do art. 79.º. Autora e réus negociaram a aquisição da fracção autónoma objecto dos presentes autos.
Do art. 80.º. Estabeleceram um acordo no âmbito do qual fixaram o seu objecto e o preço.
Do art. 82.º. Sabendo a autora que a fracção se destinava a nela ser exercida, pela sociedade E…, a actividade comercial consistente na prestação de serviços de estética e de Spa.
Do art. 83.º. Mediante contrato de arrendamento que os réus celebrariam com a dita sociedade após adquirirem a fracção.
Do art. 84.º. Por efeito desse acordo e tendo em conta essa expectativa de aquisição para posterior arrendamento, os réus formalizaram e viram aprovada a proposta de financiamento referida supra nos itens 23º a 27º da contestação.
Do art. 85.º. Por sua vez a autora, em reconhecimento dessa expectativa e propósito dos réus, autorizou que aquela sociedade usasse o imóvel.
Do art. 88.º. E permitindo que essa sociedade adquirisse e mandasse instalar a outros fornecedores diversos equipamentos destinados aos mesmos fins.
Do art. 93.º. Tendo-a obtido apenas vários meses após tal financiamento haver caducado.
Do art. 94.º. Apesar desse prazo de validade lhe ter sido comunicado, pelos réus.
Do art. 95.º. A caducidade daquele financiamento bancário originou que os réus não pudessem já beneficiar das mesmas condições, rectius custos, para idêntico empréstimo.
Do art. 96.º. Resultando muitíssimo mais gravosos para os réus.
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Da réplica:
Do art. 19.º. A autora nunca transmitiu aos réus que a escritura de compra e venda não se realizaria, antes estes negam-se a pagar o preço que reconhecem ter acordado.
Do art. 21.º. A denominada sociedade E…, Lda, é detida pelos réus, ou melhor, o capital pertence à filha destes.
Do art. 22.º. Mas são os réus quem “põem e dispõem” na dita sociedade.
Do art. 24.º. A sociedade E… abandonou o local, mas e tão só por não ter lucros e nem sequer facturar para pagar as despesas, desde empregados, luz e água.
Do art. 35.º. A autora num esforço de conciliação e para evitar Tribunais aceitou celebrar a escritura de compra e venda pelo preço de € 180.000,00 e não pelos 220.000,00 inicialmente acordados.
Do art. 36.º. Mas nem assim os réus aceitaram celebrar a escritura prometida.
Do art. 48.º. Durante o período de tempo que a sociedade ocupou o imóvel nada pagou de renda à autora.
Do art. 46.º. A sociedade nunca gerou lucros que lhe possibilitassem pagar qualquer renda, muito menos de mil euros por mês.
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Do articulado de oposição espontânea
Do art. 8.º. De tal acordo entre a opoente e os réus estava bem ciente e conhecedora a autora.
Do art. 9.º. A autora permitiu que a opoente procedesse a diversas outras obras de construção civil no já identificado imóvel, obras essas que, igualmente, se destinavam, como destinaram, àquela adaptação.
Do art. 10.º. Permitiu que a sociedade opoente instalasse no mesmo imóvel diverso equipamento e mobiliário (algum dele, aliás, de grandes dimensões) destinado ao uso normal e corrente daquela actividade comercial de estética, fisioterapia e spa.
Do art. 11.º. Tudo isso permitiu, aliás, que a opoente passasse, de facto, a utilizar o aludido local, desenvolvendo as actividades habituais do seu já acima dito objecto social.
Do art. 12.º. Foi, pois, à sociedade opoente conferida expressamente pela autora a utilização do imóvel em questão (com a entrega das respectivas chaves ao réu), o que veio a acontecer na altura em que começaram a decorrer as referidas obras, ou seja, no mês de Outubro de 2010, tendo posteriormente, mais concretamente em 4 de Junho de 2011, inaugurado o seu estabelecimento e começado, a partir de então, a exercer a sua actividade comercial efectiva.
Do art. 13.º. Ou seja: sempre com o conhecimento e sob autorização da autora, de forma pública, continuada, pacífica e de boa-fé, a sociedade opoente passou a utilizar o bem imóvel em questão no circunstancialismo temporal mencionado no item antecedente.
Do art. 14.º. E por isso, a opoente levou a cabo todas as obras acima elencadas (e que à frente melhor se identificarão), bem como foi adquirido diverso material e equipamento para o mesmo local e sua actividade (e que à frente também melhor se identificarão).
Do art. 17.º. Independentemente de o estabelecimento se mostrar encerrado desde Agosto de 2012, a E… manteve consigo a chave do local, tendo em conta as avultadas obras que foram feitas no imóvel.
Do art. 20.º. Todas as obras mencionadas e que à frente se discriminarão foram pagas, com conhecimento da autora e consentimento desta para que fossem realizadas no imóvel em questão.
Do art. 22.º. A sociedade opoente procedeu às referidas obras, tendo-o feito de boa-fé na sequência da utilização que lhe foi conferida pela autora, que lhe permitiu a entrada no local e suas ocupação e utilização, bem sabendo que era a mesma sociedade ora opoente.
Do art. 26.º. Então, no decurso dos anos de 2010 e 2011 a autora, por intermédio do Sr. Eng. F…, autorizou a aqui requerente a levar a cabo no imóvel em questão diversas obras de construção civil, bem como a instalar variado equipamento e mobiliário tudo destinado ao exercício da já antes aludida actividade.
Do art. 28.º. Tais obras de construção civil foram de compartimentação e adaptação do local, criação de espaços operacionais do centro de estética, fisioterapia e SPA, tendo em conta o projecto aprovado, criação e construção de paredes (com acabamento a Seral projectado) e tectos falsos do tipo Pladur, com sancas para iluminação indirecta, tudo no valor de € 27.830,00, execução de redes de distribuição de água de consumo e esgotos, caleiras, regularização de pavimentos, fornecimento e aplicação de materiais cerâmicos nos pavimentos e instalações sanitárias (até ao tecto), fornecimento e aplicação de louças nas mesmas instalações sanitárias, fornecimento e aplicação de torneiras misturadoras em todos os duches, tudo no valor de € 24.070,53 (tudo consoante se mostra melhor elencado nos docs. 1 a 4, juntos com a oposição e que aqui se dão como integralmente reproduzidos).
Do art. 29.º. E mais: trabalhos de electricidade, telecomunicações e som, tudo no valor de € 6.958,48, colocação de silver shadow t kit torneira termoestática, pintura, vidros e ferragens, tudo no valor de € 7.613,93, fornecimento e aplicação de banheira de hidromassagem da marca Roca, modelo …, dotada de sistema de auto limpeza, iluminação e encostos de cabeça, no valor de € 6.776,00, pirâmide em inox, sanitários para mobilidade reduzida e 2ª fase de trabalhos de electricidade e telecomunicações, tudo no valor de € 12.835,18, colocação de peças sanitárias e dos vidros da pirâmide, tudo no valor de € 685,28.
Do art. 31.º. Além disso, e também durante o ano de 2010, a aqui requerente encomendou a outras empresas variados trabalhos e materiais: a execução de determinados trabalhos de carpintaria–portas, estrados, portadas, forras, rodapés, armários, prateleiras, aros, tampas, balcão, outras estruturas e degraus–, tudo no valor de € 26.777,30, um kit de fibra óptica e porta para banho turco, tudo no valor de € 4.529,00, dez cortinas em rolo, no valor global de € 1.213,02, material QE AVAC, condutas de ar, isolamento, cobre frigorífico, material solar, caldeiras, depósitos e outros acessórios, tudo no valor de € 24.645,00, torneiras, lavatório em vidro e conjunto WC wengué, tudo no valor de € 896,21, equipamentos de ar condicionado, aquecimento e aquecimento solar, tudo no valor de € 24.067,18, sempre incluindo material e mão de obra e tudo destinado ao imóvel onde ia exercer a sua actividade.
Do art. 34.º. Tudo foi feito com autorização e com pleno conhecimento da autora.
Do art. 36.º. Naquelas obras acima elencadas foi despendida uma quantia global de € 168.776,32, com IVA incluído.
Do art. 37.º. Todas as referidas obras ou benfeitorias de carácter fixo, cujos valores são os acima indicados nos itens 28º, 29º e 31º do presente articulado, não podem, pela sua própria natureza ser levantadas sem detrimento das benfeitorias em si mesmas consideradas, já que se mostram integradas na própria estrutura física do imóvel.
Do art. 45.º. Todas as obras feitas pela opoente e que acima foram elencadas foram, pois, de adaptação do local à actividade que aí iria pela mesma ser exercida.
Do art. 46.º. A fracção autónoma em questão encontrava-se, em grosso, apenas com o tecto e paredes ao alto, mostrando-se agora completamente pronta e equipada, totalmente acabada em todas as artes de construção civil, tanto mais que a ora requerente aí chegou, de facto, a exercer a sua actividade de estética, spa e fisioterapia.
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Da contestação à oposição espontânea
Do art. 31.º. Não há ganho da autora, antes há prejuízo.
Do art. 32.º. Pois as obras realizadas na fracção apenas poderiam ter utilidade para o exercício de actividade de SPA.
Do art. 33.º. Para outro fim, como café, lavandaria, as obras realizadas constituem um dano.
Do art. 34.º. Pois exige-se que sejam demolidas e a fracção colocada no estado anterior às mesmas, ou seja, em bruto.
Do art. 37.º. O Eng. F… nunca teve contactos com a gerente da opoente, mas sim exclusivamente com o réu marido.
Do art. 38.º. A autora procedeu a várias obras na fracção, mas sempre a pedido do réu marido.
Do art. 40.º. Algumas obras na fracção foram realizadas, sempre a pedido do réu e sempre com o fim SPA.
Do art. 41.º. Os documentos 1 a 4 juntos com a oposição espontânea foram emitidos a pedido do réu–sendo que foi este que sempre pagou as obras e formulou o pedido para as mesmas.
Do art. 50.º. As obras realizadas apenas o foram no interesse dos réus e da opoente, foram realizadas para seu benefício e prejuízo da autora.
*
Os factos não provados

Da petição inicial

Do art. 10.º meados de Novembro de 2011.
Do art. 18.º. A autora interpelou os réus para celebrarem escritura de compra e venda.
Do art. 19.º. Porém os réus negam-se a outorgar a escritura.
Do art. 27.º. Os réus ocupam o arrendado desde Novembro de 2011.
*
Da contestação dos réus
Do art. 21.º. Ficando igualmente acordado que.
Do art. 22.º. Tendo em conta essa finalidade, ficou então acordado entre o réu marido e o Engº F…, que a compra daquela fracção pelos réus ficaria sujeita à verificação da condição seguinte:
b) Esses trabalhos de adaptação ficariam concluídos até Julho de 2010.
Do art. 26.º. A proposta do empréstimo tinha, contudo, a validade de 6 meses após as notificações da J…, recebidas pelos réus com datas de 19/07 e 11/08, do ano de 2010– Docs. 3 e 4.
Do art. 27.º. Assim, findo que fosse tal prazo sem que os proponentes (aqui réus) indicassem a data da escritura de aquisição do imóvel, a proposta de empréstimo seria considerada nula e de nenhum efeito – Idem Docs. 3 e 4.
Do art. 29.º. em finais desse mês.
Do art. 30.º. Comunicando-lhe e alertando-o para a necessidade de concluir as obras de adaptação da fracção e de obter aquela licença de utilização em tempo útil, de modo a evitar a caducidade da proposta do empréstimo entretanto aprovado.
Do art. 31.º. no prazo a que se obrigara.
Do art. 33.º. Por esse facto, exclusivamente imputável à autora, não foi possível celebrar a escritura de aquisição da fracção, tendo em conta que a proposta de empréstimo aprovada pela J… entretanto caducara.
Do art. 37.º. Ora, tal diferença determinaria para os réus um substancial e incomportável agravamento do custo de aquisição, que assim passaria de 275 mil euros (220 mil euros + 55 mil euros juros) para cerca de 350 mil euros (220 mil euros + 131 mil euros juros).
Do art. 38.º. Alterando significativamente os termos e condições essenciais do negócio estabelecido com a autora.
Do art. 39.º. Tendo em conta que o referido agravamento de juros resultava, directa e objectivamente, de facto totalmente imputável à autora.
Do art. 40.º. do total do preço.
Do art. 42.º. Sem prejuízo da proposta alternativa que formulou à autora, seria, no entanto, absolutamente certo que os réus teriam adquirido a dita fracção se o custo total dessa aquisição não fosse superior ao que teriam de suportar com o empréstimo aprovado em 2010.
Do art. 46.º. Essas obras de construção civil, bem como pinturas, vidros, peças sanitárias, banheira de hidromassagem e bem assim a instalação do sistema de electricidade e comunicações, foram executadas pela própria autora.
Do art. 47.º. Sob encomenda e direcção da referida sociedade E…, que as pagou à autora.
Do art. 51.º. tomou posse material.
Do art. 53.º. tomou posse material e efectiva.
Do art. 54.º. Posse essa que continua a manter na sua esfera jurídica até à presente data.
Do art. 56.º. Quando lhe foi transmitido pelos réus que a aquisição da fracção não se concretizaria.
Do art. 57.º. E, por consequência, já não seria possível a celebração do contrato de arrendamento entre a sociedade e os ora réus na perspectiva da aquisição do imóvel por estes últimos.
Do art. 58.º até hoje na posse material do imóvel.
Do art. 63.º. A aquisição não veio a concretizar-se em virtude de a autora não ter obtido em tempo útil a licença de utilização da mesma.
Do art. 64.º. O que determinou a caducidade da proposta de financiamento negociado pelos réus junto da J… por esta já aprovado em 25/02/2010.
Do art. 66.º. Alertando-a simultaneamente para a necessidade de obter aquela licença, dado ser documento essencial para a escritura de compra e venda, bem como das consequências da sua não obtenção dentro do prazo de validade da proposta de financiamento.
Do art. 69.º. Sendo-lhe, por isso, exclusivamente imputável a caducidade da referida proposta de empréstimo.
Do art. 79.º. encetaram entre si negociações.
Do art. 80.º. Em consequência dessas negociações …e o prazo limite de celebração da escritura de compra e venda.
Do art. 81.º. Mais acordaram em que o pagamento do preço se faria com recurso dos réus a um financiamento bancário.
Do art. 85.º. tomasse posse efectiva e material do imóvel.
Do art. 86.º. Inclusive definindo e negociando directamente com ela a execução das diversas obras de adaptação do local ao exercício da prevista actividade comercial.
Do art. 87.º. Vendendo-lhe e instalando os materiais e equipamentos necessários à boa prossecução dos respectivos fins comerciais.
Do art. 91.º. A não formalização do contrato de compra e venda, rectius a outorga da respectiva escritura, deveu-se a facto da exclusiva responsabilidade da autora.
Do art. 92.º. Visto que não obteve, dentro do prazo de validade da proposta de financiamento bancário, a licença de utilização da fracção, originando a caducidade desse financiamento.
Do art. 94.º. por diversas vezes.
Do art. 99.º. Ficaram desse modo os réus, por facto unicamente imputável à autora, objectivamente impossibilitados de celebrar, dada a excessiva onerosidade de um novo empréstimo, a escritura de compra e venda da fracção em causa.
Do art. 100.º. Frustrando, assim, de modo irremediável, o interesse dos réus criado pela confiança no projecto de contrato.
Do art. 102.º. Viram os réus frustradas as expectativas dos ganhos que, pelo menos, resultariam do arrendamento da fracção dita sociedade E….
Do art. 103.º. Traduzidos numa renda mensal nunca inferior a Mil Euros.
Do art. 104.º. E pelo prazo mínimo de 5 anos, tendo em conta o tempo necessário à recuperação/amortização do valor do investimento efectuado por aquela sociedade.
*
Do articulado de oposição espontânea
Do art. 9.º. Tanto que, a própria autora, durante o transacto ano de 2010, procedeu, ela mesma, mas sempre a pedido ou por encomenda directa da ora requerente, a variadas obras de adaptação do acima indicado rés-do-chão à actividade comercial da aqui requerente.
Do art. 11.º sendo que foi a mesma aqui requerente que foi fiscalizando o desenvolvimento de todas as obras realizadas.
Do art. 12.º a posse …já que logo a partir daí passou a ser a aqui requerente a gerir no próprio local o desenvolvimento das obras em causa.
Do art. 13.º. tomou posse do bem imóvel em questão no circunstancialismo temporal mencionado no item antecedente.
Do art. 14.º e só por isso… e pagou, … e pagou.
Do art. 17.º. De qualquer forma, a posse ....(o que se compreende, até porque a aqui requerente, ao perceber que já não lhe iria ser possível manter no imóvel o seu negócio, tratou de o mudar para outro local), a E… está na posse material do mesmo.
Do art. 20.º foram pagas exclusivamente pela opoente.
Do art. 22.º. no que dispendeu quantias avultadas…da posse … até porque foi a própria autora quem, após encomenda daquela, fez grande parte das mesmas obras.
Do art. 27.º. Foi a própria autora, no decurso daqueles dois anos, e após encomenda nesse sentido feita pela ora requerente, que procedeu a muitas de tais obras, na sequência de orçamentos que apresentou expressamente para tal efeito.
Do art. 30.º. Todas essas obras de construção civil foram pagas pela ora requerente à autora.
Do art. 31.º e montras e vitrinas, no valor de € 2.299,00.
Do art. 32.º. Todos esses trabalhos (mão de obra e material) nas diversas artes- trolha, pedreiro, carpinteiro, picheleiro, electricista, pintor, etc–foram pagos pela ora requerente (tanto à autora, como se disse, como aos outros fornecedores).
Do art. 35.º. A opoente mantém a posse material da fracção autónoma em causa.
Do art. 36.º. Naquelas obras acima elencadas a opoente despendeu uma quantia global de € 171.075,32, com IVA incluído.
Do art. 37.º. Todas as referidas obras ou benfeitorias de carácter não fixo, cujos valores são os acima indicados nos itens 28º, 29º e 31º do presente articulado, não podem, pela sua própria natureza ser levantadas sem detrimento (aliás, tanto do próprio imóvel como das benfeitorias em si mesmas consideradas), já que se mostram integradas na própria estrutura física do imóvel.
Do art. 41.º. Por outro lado, tendo em conta, aliás conforme aceita a própria autora, que o imóvel em causa se encontrava em grosso, apenas com as paredes ao alto e tecto, e que foi a ora requerente que, para o adaptar à sua actividade comercial, despendeu todo o valor acima indicado nas ditas obras, óbvio se torna que, ficando a autora com o imóvel como ele se mostra agora, depois de realizadas tais obras e com o incremento ou valorização patrimonial que as mesmas produziram no imóvel, ocorre um manifesto enriquecimento sem causa da mesma autora, à custa a sociedade aqui requerente.
Do art. 42.º. Sendo que, num caso como o dos presentes autos, o valor de tal enriquecimento é necessariamente, e pelo menos, igual ao valor/custo total das obras ou benfeitorias levadas a cabo no prédio em questão, o que se indicou nos anteriores itens 28º, 29º, 31º e 36º e que é, também, o valor que actualmente têm tais benfeitorias.
Do art. 43.º. Na realidade, hoje, tal imóvel terá sempre, pelo menos, um valor igual à soma do valor que o mesmo tinha antes das obras levadas a cabo pela ora requerente- € 220.000,00-e do valor dispendido por esta nas mesmas obras (e que é o valor actual dessas mesmas obras)-€ 171.075,32: ou seja, hoje e mercê das benfeitorias referidas, o imóvel pertencente à autora tem um valor nunca inferior a € 391.075,32.
Do art. 44.º. Sendo aqueles valores os actuais de tais benfeitorias, são esses valores que a ora requerente acrescentou ao imóvel em questão, pelo que o montante do enriquecimento sem causa por parte da autora nunca é inferior a € 171.075,32.
Do art. 45.º. mas também o foram, claramente, para melhorar o imóvel onde foram incorporadas, como, de facto, melhoraram.
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III. O DIREITO
Antes de entrarmos na apreciação das questões colocadas no recurso convém definir o regime legal que lhe é aplicável.
Nas normas transitórias da Lei 41/2013 de 26/06 que aprovou o Novo Código de Processo Civil, prevê-se no artigo 5.º, nº 1, que o Código de Processo Civil é imediatamente aplicável ás acções declarativas pendentes, sendo que, no artigo 7.º, nº 1 apenas se prevê um regime especial no tocante aos recursos em relação às acções declarativas instauradas em data anterior a 01.01.2008, ou seja, a lei não estabeleceu um regime transitório para os recursos nos processos instaurados em data posterior a 01.01.2008, nos quais as decisões foram proferidas em data anterior à entrada em vigor do novo Código de Processo Civil.
Aplicando o regime previsto no artigo 12.º do CCivil ao processo civil resulta que na área do direito processual, a nova lei se aplica às acções futuras e também aos actos futuros praticados nas acções pendentes.
Como refere Antunes Varela: “(…) a ideia, complementar desta, de que a nova lei não regula os factos pretéritos ( para não atingir efeitos já produzidos por este ), traduzir-se-á, no âmbito do direito processual, em que a validade e regularidade dos actos processuais anteriores continuarão a aferir-se pela lei antiga, na vigência da qual foram praticados”.[1]
Portanto, a nova lei aplica-se imediatamente aos actos que houverem de praticar-se a partir do momento em que ela entra em vigor, pelo que os actos praticados ao abrigo da lei antiga devem ser apreciados em conformidade com esta lei.[2]
Especificamente, no que concerne às normas reguladoras dos recursos, Antunes Varela distinguia as normas que “fixam as condições de admissibilidade do recurso e as que se limitam a regular as formalidades da preparação, instrução e julgamento do recurso”, defendendo a aplicação imediata da lei nova sempre que não estejam em causa normas que “interferem na relação substantiva”.[3]
Ora, a presente acção foi instaurada em 2º de Novembro de 2012 e a sentença foi proferida em 12 de Maio de 2015. Como assim, proferida a sentença em data posterior a 01.09.2013, a nova lei aplicar-se-á quer ao puro formalismo processual quer quanto às condições de admissibilidade e fundamentos do recurso, nomeadamente quanto aos fundamentos e critérios de reapreciação da prova e prolação da respectiva decisão.
*
Isto dito, apreciemos, então, as questões colocadas em ambos recursos interpostos.
1. Recurso dos Réus

Como supra se referiu a primeira questão que neste recurso vem colocada consiste em:
a)-saber se a sentença padece da nulidade estatuída no artigo 615.º, nº 1 al. b) do CPCivil.
Nos termos da alínea b) do nº 1 do artigo 615.º a sentença é nula “quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”.
Referem a este propósito os recorrentes que a sentença enferma de nulidade por violação do dever de fundamentação, dado que não justificou a decisão de imputar aos Réus a ocupação da fracção na data da citação para a acção.
Não cremos, salvo o devido respeito, que assim seja.
Analisando.
A nulidade da falta de fundamentação de facto e de direito está relacionada com o comando do artigo 607.º, nº 3 do CPCivil que impõe ao juiz o dever de discriminar os factos que considera provados e de indicar, interpretar e aplicar as normas jurídicas correspondentes.
Como é entendimento pacífico da doutrina, só a falta absoluta de fundamentação, entendida como a total ausência de fundamentos de facto e de direito, gera a nulidade prevista na al. b) do nº 1 do citado artigo 615º.
A fundamentação deficiente, medíocre ou errada afecta o valor doutrinal da sentença, sujeita-a ao risco de ser revogada ou alterada em recurso, mas não produz nulidade.[4]
Ora, para que haja falta de fundamentação, como causa de nulidade da sentença, torna-se necessário que o juiz não concretize os factos que considera provados e os não coloque na base da decisão[5], coisa que, manifestamente, no caso em apreço não acontece, pois que, o tribunal recorrido, como o evidência a sentença recorrida, aí descriminou os factos que resultaram provados e não provados.
Portanto, ao contrário do que afirma as recorrentes, a sentença recorrida não enferma da nulidade que lhe vem assacada e constante da alínea b) do nº 1 do artigo 615.º
Coisa diferente é se houve uma errada subsunção jurídica do quadro factual que resultou provado nos autos, isto é, erro de aplicação das normas aos factos e, por isso, o desfecho da acção não deveria ter sido o decidido mas outro, o que se traduziria neste caso concreto em dizer-se que a matéria factual não suporta a condenação dos Réus recorrentes nos termos sentenciados, isto é, que da matéria factual não resulta que eles ocupassem a fracção em causa na data da citação para a acção, ou seja, que houve erro de julgamento.
Acontece que, isso não configura a nulidade estatuída no artigo 615.º, nº 1 al. b) do CPCivil.
*
Improcedem, assim, as conclusões formuladas pelos recorrentes sob as letras a) a k).
*
A segunda questão que vem colocada no recurso consiste em:

a)-saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.

Como decidido pelo Supremo tribunal de Justiça os Réus deram cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil.
Cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, os Réus apelantes não concordam com a decisão da matéria de facto relativa aos artigos 20°, 21° e 22° da petição inicial que, tendo sido dados como não provados, não o deveriam ter sido, e sobre os artigos 26º, 27º, 33º, 59º, 63º, 64º, 66º, 99º e 100º a 104º da contestação que foram dados como não provados mas que deviam ter sido dados como provados.
Quid iuris?
O controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Efectivamente, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º nº 5) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.[6]
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado”.[7]
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPCivil).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.[8]
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”.[9]
Importa, porém, não esquecer que, como atrás se referiu, se mantêm vigorantes os princípios da imediação, da oralidade, da concentração e da livre apreciação da prova e guiando-se o julgamento humano por padrões de probabilidade e nunca de certeza absoluta, o uso, pela Relação, dos poderes de alteração da decisão da 1ª instância sobre a matéria de facto deve restringir-se aos casos de flagrante desconformidade entre os elementos de prova disponíveis e aquela decisão, nos concretos pontos questionados.[10]
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão aos Réus apelantes, neste segmento recursivo da impugnação da matéria de facto, nos termos por eles pretendidos.
Os artigos 20º, 21º e 22º da petição tinham, respectivamente, a seguinte redacção:
art. 20º- E negaram-se (os RR) a entregar o referido rés-do-chão que continuaram a ocupar, até finais de Fevereiro de 2015.
art. 21º- Contra a vontade da autora.
art. 22º- E sem qualquer título, pelo menos desde a entrada da presente acção em juízo (20/11/2012)”.
Como supra se referiu, entendem os Réus recorrentes que tais factos deviam ter sido dados como não provados.
Para o efeito convocam o depoimento de parte do Réu C… e o depoimento da testemunha F….
Acontece que, os Réus se quedaram pela simples indicação dos referidos depoimentos, transcrevendo-os em parte sem tecer qualquer tipo de consideração sobre a prova assim indicada.
Todavia, isso não basta. A lei impõe aos recorrentes que indiquem o porquê da discordância, isto é, em que é que os referidos meios probatórios contrariam a conclusão factual do Tribunal recorrido, por outras palavras, importa apontar a divergência concreta entre o decido e o que consta dos citados meios probatórios.
É exactamente esse o sentido da expressão legal “quais os concretos meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que impunham decisão, sobre os pontos da matéria de facto impugnados, diversa da recorrida” (destaque e sublinhado nossos).
Repare-se na letra da lei: “Impunham decisão (não basta que sugiram) diversa da recorrida”!
Trata-se, aliás, da imposição de um ónus perfeitamente lógico e necessário, em primeiro lugar, porque ninguém está em melhor posição do que o recorrente para indicar os concretos pontos da sua discordância relativamente ao apuramento da matéria de facto, indicando os concretos meios de prova constantes do registo sonoro que, em seu entendimento, fundamentam tal discordância e qual a concreta divergência detectada.
Em segundo lugar, para permitir que a parte contrária conheça os argumentos concretos e devidamente delimitados do impugnante, para os poder contrariar cabalmente, assim se garantindo o devido cumprimento do princípio do contraditório.
Na verdade, transcrever ou mesmo indicar os depoimentos não é fazer a sua análise crítica, esta pressupõe que se construa um raciocínio lógico e fundamentado que leve a extrair uma conclusão baseada naqueles, ou seja, o que se exige é que se analisem esses meios de prova, cotejando-os mesmo com a prova em sentido contrário, relativizando o sentido dessa prova e dizendo porquê, mas também relativizando as provas que convoca para sustentar o seu ponto de vista e de tudo isso extraindo o sentido que lhe merecer acolhimento.
Ora nada disso os Réus apelantes fizeram.
Com efeito, comodamente, limitam-se a afirmar o seguinte:
Dizemos que o Tribunal não poderia basear a sua decisão nesses factos, porque, em vista dos extractos dos depoimentos gravados, que de seguida transcrevemos (e outros não há que abordem tal matéria), não os poderia ter dado como provados, como deu”.
Indicar depoimentos que vão de encontro ou contrariem a matéria factual impugnada não é impugnar a decisão da matéria de facto nos moldes que a nossa lei adjectiva o impõe.
A alteração da matéria factual não se basta com essa simples indicação.
O que se pretende que o advogado faça?
Certamente que apresente um discurso argumentativo onde, em primeiro lugar, alinhe as provas, identificando-as, ou seja, dizendo onde se encontram no processo e, tratando-se de depoimentos, identifique a passagem ou passagens pertinentes, e, em segundo lugar, produza uma análise crítica dessas provas, pelo menos, elementar.
A razão pela qual se afirma que o advogado deve produzir uma análise crítica mínima é esta: indicar apenas os meios probatórios, isto é, o depoimento da testemunha A ou B, ou o documento C ou D, é reproduzir apenas o que consta do processo, pelo que nada se acrescenta ao que já existe nos autos, nem se mostra a razão por que a resposta a uma dada matéria de facto deve ser diversa da que foi dada pelo juiz.
Para desencadear a reapreciação pelo Tribunal da Relação, o advogado tem de colocar uma questão a este tribunal.
Ora, só coloca uma questão se elaborar uma argumentação que se oponha à argumentação produzida pelo juiz em 1.ª instância colocando, então, o tribunal de recurso perante uma questão a resolver.
Não basta pois identificar meios de prova.
O advogado terá de elaborar e expor uma análise crítica da prova formalmente análoga à realizada pelo juiz e concluir no sentido que pretende.
*
Mas ainda que assim não se entenda, não se descortina como, com base em tais depoimentos, se pode alterar a decisão da matéria de facto no sentido pretendido pelos Réus Apelantes.
O Réu C… limita-se a dizer que apenas teve acesso ao imóvel em causa até à data da sua inauguração, sendo que, a partir daí tinha que pedir para lá entrar.
Todavia, o assim afirmado está totalmente em contradição com aquilo que afirma na correspondência electrónica que trocou com a testemunha F…, mais concretamente com a enviada em 09/09/2012 junta aos autos a fols. 419 a 420 e que não foi impugnada.
Efectivamente, na parte final dessa correspondência, o Réu afirma, e passamos a citar:
“(…)
2. Caso não aceitem a minha proposta de compra e venda deverá ocorrer o seguinte:
a. A firma I… deverá devolver à E… o Valor referido na alínea c do ponto anterior (20.000,00 €);
b. C…, após um período razoável que permita à E… recuperar o imobilizado possível, entregará a loja à I…” (negrito e sublinhados nossos).
Portanto, daqui se retira, sem margem para qualquer tergiversação que, a final, quem iria entregar a loja em causa, se não fosse aceite a proposta de compra do Réu, era este e não a E….
Ou seja, não obstante a referida E… estar a explorar na fracção um serviço de SPA e Estética, quem detinha o poder de facto sobre aquela era o Réu e não a referida E…, embora, por razões óbvias, a mesma tivesse a chave do referido espaço.
Havia, portanto, aqui uma simbiose entre a referida sociedade E…, Lda e os Réus como, aliás, o atesta a restante matéria factual que nos autos resultou demonstrada e que nem sequer foi objecto de impugnação.
Na verdade, não só foram eles que cederam o bem prometido comprar à referida sociedade, (facto correspondente ao artigo 14º da petição inicial e considerado provado por acordo das partes) e, pese embora o capital daquela pertença à filha dos Réus, são estes quem “põem e dispõem” na dita sociedade, factos correspondentes aos artigos 21º e 22º da réplica considerados provados no âmbito da realização do julgamento.
Por sua vez a testemunha F… apenas refere que era a referida E… que estava a funcionar nesse espaço, todavia, não foi a essa sociedade (à filha dos Réus), quando o negócio se gorou entre a Autora e os Réus, que foi solicitar as chaves e a entrega do imóvel mas sim ao Réu, tendo referido também que, nessa ocasião, este não procedeu à sua entrega justificando que tinha investimento feito na loja, ou seja, também por aqui se confirma que, embora a citada E… estivesse a explorar a loja em causa, o poder de facto sobre ela era exercido pelo Réu, pessoa, com quem, a final a Autora estava a negociar a venda da mesma, pois que, como resultou provado nos autos, a Opoente (E…) com a Autora nunca celebrou qualquer contrato, nunca com ela celebrou qualquer acordo (artigo 10º da contestação à oposição espontânea não impugnado).
E, perante esta realidade concatenado com o facto de a sociedade E… ter abandonado o local, pois que, deixou desde Agosto de 2012 de ocupar a fracção (artigo 12º da contestação à oposição espontânea e 24 da réplica) revela-se perfeitamente verosímil ter sido ao Réu que foi solicitada a entrega da fracção e este não o tenha feito, porque verdadeiramente era ele que aí tinha investido.
*
Decorre do exposto não terem os Réus convocado meios probatórios constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada que imponham que se dê como não provada a matéria dos artigos 20º, 21º e 22º da petição devendo, assim, tal matéria continuar a constar dos factos provados.
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Impugnam também os Réus a decisão da matéria de facto referente aos artigos 26º, 27º, 33º, 59º, 63º, 64º, 66º, 99º e 100º a 104º da contestação, matéria que o tribunal recorrido considerou não provada mas que, alegam, devia ser dada como provada.
Os artigos em causa tinham a seguinte redacção agora numerados de 1. a 12. respectivamente:
1. O prazo de validade–6 meses-do empréstimo concedido aos réus para aquisição da fracção, contados das notificações da J…, recebidas pelos réus em 19/07 e 11/08, de 2010–docs. 3 e 4 juntos com a Contestação:
2. Que, findo esse prazo (de 6 meses), sem que fosse celebrada a escritura de compra e venda do imóvel, essa proposta de empréstimo seria considerada nula e de nenhum efeito–Idem Docs. 3 e 4;
3. Que, por essa razão, exclusivamente imputável à autora, não foi possível celebrar a escritura de aquisição da fracção, tendo em conta que a proposta de empréstimo aprovada pela J… entretanto caducara.
4. E, por consequência, já não seria possível a celebração do contrato de arrendamento entre a sociedade e os ora réus na perspectiva da aquisição do imóvel por estes últimos.
5. A aquisição não veio a concretizar-se em virtude de a autora não ter obtido em tempo útil a licença de utilização da mesma.
6. O que determinou a caducidade da proposta de financiamento negociado pelos réus junto da J… por esta já aprovado em 25/02/2010.
7. Os Réus alertaram a autora para a necessidade de obter aquela licença, dado ser documento essencial para a escritura de compra e venda, bem como das consequências da sua não obtenção dentro do prazo de validade da proposta de financiamento.
8. Ficaram desse modo os réus, por facto unicamente imputável à autora, objectivamente impossibilitados de celebrar, dada a excessiva onerosidade de um novo empréstimo, a escritura de compra e venda da fracção em causa.
9. Frustrando, assim, de modo irremediável, o interesse dos réus criado pela confiança no projecto de contrato.
10. Viram os réus frustradas as expectativas dos ganhos que, pelo menos, resultariam do arrendamento da fracção dita sociedade E….
11. Traduzidos numa renda mensal nunca inferior a Mil Euros.
12. E pelo prazo mínimo de 5 anos, tendo em conta o tempo necessário à recuperação/amortização do valor do investimento efectuado por aquela sociedade.
*
Referem os Réus recorrentes que os factos 1. e 2. (de acordo a numeração agora feita) deviam ter sido dados como provados tendo em conta o teor dos documentos 3 e 4 juntos com a contestação.
Não cremos, que assim seja.
Os documentos em causa referem-se a aceitação de propostas de adesão de seguros de … e não ao empréstimo e muito menos à sua validade.
Com efeito, o que aí se refere é que, se no prazo de seis meses não fosse recebida a indicação da data de escritura seria considerada nula a proposta em causa e sem qualquer efeito.
Portanto, a validade de seis meses referia-se à proposta do seguro vida e não ao empréstimo sendo, aliás, da autoria da K… e não da J… como afirmam os recorrentes.
Referem depois os recorrentes que os factos 1. e 2. bem como os 3. a 7., 8., 11. e 12. deviam ter sido considerados provados, além do mais do que a esse propósito se alega, com base no depoimento da testemunha F….
A este respeito valem aqui, mutatis mutandis, as mesmas considerações tecidas a propósito da impugnação da decisão da matéria de facto constante dos artigos 20º a 22º da petição inicial.
Efectivamente, também aqui, os Réus apelantes se limitam a indicar o referido depoimento, não fazendo, como aí se assinalou, qualquer análise crítica do mesmo.
*
Mas ainda que assim não se entenda, analisemos o citado depoimento.
Quanto ao prazo de validade do empréstimo o que a testemunha afirma de relevante é que qualquer proposta de financiamento tem um prazo de validade mas que tudo é negociado e que, neste caso concreto o Réu lhe referiu que o empréstimo tinha sido aprovado não sabendo, contudo, se lhe havia enviado a comunicação dessa aprovação.
Repare-se, porém, que a testemunha embora diga que sabia qual o prazo de validade nunca refere qual fosse.
Efectivamente, perante a afirmação feita pelo mandatário dos Réus de que esse prazo seria de seis meses o que a testemunha respondeu é que era provável.
Acontece que, ao contrário das afirmações feitas pelo mandatário do Réu durante a instância, não existe nos autos qualquer documento que faça alusão ao referido prazo de validade do empréstimo (nós não o descortinamos), pois que, os únicos documentos que fazem referência a esse prazo são, como já noutro passo referimos, as propostas de adesão de seguros de ….
Acresce que, na comunicação enviada pela J… ao Réu, relativamente à aprovação da operação de crédito solicitada (cfr. doc. nº 5 junto com contestação, fols. 46 dos autos) o que aí se refere a esse propósito e passamos a citar é:
As condições atrás referidas poderão ser revistas, se os documentos necessários para o prosseguimento da operação não forem entregues no prazo de 30 dias”.
Portanto, daí não se retira que o houvesse prazo de validade para o empréstimo, as condições do mesmo é que podiam ser revistas em função da apresentação dos documentos necessários para o prosseguimento da operação.
Decorre, assim, do exposto que, não se divisa como a partir do depoimento da citada testemunha se podem dar como provados os pontos 1., 2., 3. e 4. dos factos não provados, pois que, para além do que supra se referiu, nunca a referida testemunha faz alusão, no seu depoimento, a qualquer caducidade do empréstimo por decurso de qualquer prazo, tendo referido apenas que o Réu lhe terá dito que a proposta havia caído, nem tão pouco à celebração de qualquer contrato de arrendamento.
Vejamos agora a questão da licença de utilização.
Dúvidas não existem de que para a celebração da escritura era necessário a existência de utilização.
Ora a testemunha F… afirmou que a era à Autora a quem incumbia a obtenção da referida licença de utilização e que ela foi obtida apenas em 8 de Agosto de 2011 factos, aliás, já dados como provados nos autos (cfr. artigos 67.º e 68º da contestação).
Todavia, em nenhum momento do seu depoimento afirma que a aquisição não veio a concretizar-se em virtude de a autora não ter obtido em tempo útil a licença de utilização e, muito menos, que a caducidade do empréstimo se deveu também à falta desse documento, ou que os Réus alertaram a Autora para a necessidade de obter aquela licença, dado ser documento essencial para a escritura de compra e venda, bem como das consequências da sua não obtenção dentro do prazo de validade da proposta de financiamento.
Do exposto, também com base no depoimento da indicada testemunha se não podem dar como provados os pontos 5. a 7. dos factos não provados.
Os pontos 8., 9., e 10. não contêm em si qualquer facto encerrando meros juízos conclusivos, sendo que, a fundamentação (de facto) da decisão (sentença ou acórdão) só pode ser integrada por factos (artigo 607.º, nº 4 do CPCIivil), aliás, que assim é, quanto aos pontos 9. e 10., dizem-no os Réus recorrentes quando afirmam que esses factos deviam ser dados como provados em decorrência da prova dos anteriores.
Mas ainda que assim não se entenda, quanto ao ponto 8., o depoimento da testemunha F… também não o corrobora, pois que, apenas afirma ter tido conhecimento que foi solicitado um segundo empréstimo e que os valores dos “spread” tinha disparado nessa altura.
No que concerne aos pontos 11. e 12. referem os recorrentes que o ponto 11. devia ter sido dado como provado tendo em conta que o Tribunal “a quo” deu também como provado facto idêntico aduzido pela autora no item 26º da petição inicial: “se arrendada a autora obteria um rendimento (renda) de mil euros por mês”.
Não vemos como da prova de um decorre a prova do outro.
Por outro lado, como resulta provado nos autos (artigo 21º da réplica) o capital da E…, Lda pertence à filha dos Réus e, como tal, não é verosímil que num eventual contrato de arrendamento a renda imposta por aqueles fosse de mil euros mensais, embora a testemunha F… admita que o valor de mercado dessa renda se situaria nos 1.300, 1.500 € mensais.
Por último quanto ao ponto 12. sobre ele, como dizem os recorrentes, não foi feita qualquer prova directa, e dizemos nós, nem indirecta, sendo que, neste conspecto não se pode, sem apoio num outro elemento coadjuvante, fazer apelo às regras da experiência.
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Destarte e no que à impugnação da matéria de facto feita pelos Réus diz respeito, deve permanecer inalterada a matéria de facto dada como provada pelo tribunal recorrido improcedendo, desde modo, as conclusões l) e m) formuladas por aqueles.
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A terceira questão que vem posta no recurso prende-se com:

c)- saber se se verifica, ou não, procedibilidade da acção de reivindicação no que concerne à posse ou a detenção do bem reivindicado, pelos Réus demandados.

Sob este conspecto defendem os recorrentes que à data da citação para a acção não eram eles que estavam na posse da fracção reivindicada mas sim a opoente E…, Ldª e, por conseguinte, não podiam restituir aquilo que não possuíam falhando, dessa forma, os requisitos da procedibilidade da acção de reivindicação.
Não cremos, salvo o devido respeito, que também aqui assista também razão aos recorrentes.
Da matéria de facto que o tribunal deu como provada resulta, é certo, que não obstante o encerramento do estabelecimento, a E… permaneceu até à entrega efectuada no âmbito do procedimento cautelar, na posse da chave do imóvel, tendo em conta o avultado investimento que nele se efectuou na perspectiva de o vir a arrendar aos réus (factos correspondentes ao artigo 58º da contestação e 17º da oposição espontânea considerados provados no âmbito da realização do julgamento).
Todavia, também resultou provado nos autos que os Réus se negaram a entregar o referido rés-do-chão que continuaram a ocupar, até finais de Fevereiro de 2015, contra a vontade da autora e sem qualquer título, pelo menos desde a entrada da presente acção em juízo (20/11/2012) (factos correspondentes aos artigos, 20º, 21º e 22º da petição inicial e considerados provados no âmbito da realização do julgamento).
Ora, não é pelo facto de a opoente ter a posse da chave da fracção em causa que os Réus não ocupassem a fracção ou melhor dito, exercessem sobre ela poderes de facto recusando assim a sua entrega, tanto mais que como supra se referiu no âmbito da questão da decisão da matéria de facto, foram eles que cederam o bem prometido comprar à sociedade opoente (facto correspondente ao artigo 14º da petição inicial e considerado provado por acordo das partes) e, embora o capital daquela pertence à filha dos Réus, contudo são estes, quem “põem e dispõem” na dita sociedade (factos correspondentes aos artigos 21º e 22º da réplica considerados provados no âmbito da realização do julgamento).
Significa, portanto, que ao contrário do que defendem os Réus recorrentes, a factualidade que nos autos se encontra assente preenche a factie species do artigo 1311.º do CCivil como, aliás, decidiu o tribunal recorrido.
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Improcedem, assim as conclusões n) a r) formuladas pelos recorrentes.
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A última questão colocada no recurso consiste em:

d)- saber se a Autora recorrida devia ter sido condenada, ou não, em sede de responsabilidade pré-contratual.

Como decorre da decisão recorrida o tribunal a quo entendeu que, no caso em apreço, tendo os Réus aceite a efectiva realização de um contrato promessa de compra e venda da fracção, nulo por falta de forma, não podem depois vir discutir se o que foi acordado entre as partes perfectibiliza um verdadeiro contrato–um contrato-promessa–ou se se enquadra ainda na fase de preparação da celebração do contrato, integrando um acordo pré-contratual e, por isso, excluída estava a responsabilidade pré-contratual da Autora em que aqueles fundamentam o seu pedido indemnizatório.
Todavia, ainda que se entenda, como defendem os recorrentes que em sede negocial se gerou, entre as partes, uma proposta de compra e não um mero contrato-promessa de compra e venda, seguida de uma aceitação de venda e não uma mera promessa de compra, o certo é que a matéria factual dada como provada não permite estribar que a Autora apelada tenha incorrido em responsabilidade pré-contratual.
Analisando.
Tendo em conta os ensinamentos do Prof. Almeida e Costa[11] podemos afirmar que o Código Civil coloca sob a égide do princípio da boa fé as fases fundamentais do desenvolvimento do vínculo contratual: a formação (artigo 227º; a integração (artigo 239º) e a execução (artigo 762º).
Estipula o artigo 227º do C.Civil que “quem negoceia com outrem para a conclusão de um contrato deve, tanto nos preliminares como na formação dele proceder segundo as regras da boa fé, sob pena de responder pelos danos que culposamente causar à outra parte”.
A doutrina sustenta que os deveres pré-contratuais encontram a sua fonte na relação que nasce entre as partes com o fim de preparar o conteúdo do futuro contrato. Isto porque o fim essencial e principal de quem negoceia é a “representação preventiva” do futuro contrato o mais próximo possível da realidade.
Ora, é precisamente para atingir este fim que incidem os chamados deveres de comportar-se segundo a boa fé, vinculando cada uma das partes a comunicar, conformemente à verdade, tudo aquilo de que a outra parte carece para formar um quadro exacto sobre a matéria objecto das negociações.
Não obstante a grande amplitude da formulação do artigo em causa, e tendo em conta a terminologia utilizada por Francesco Benaifi[12], os deveres pré-contratuais são, no entanto de três tipos: obrigação de informação, segredo e custódia.
Atenta a terminologia adoptada por Menezes Cordeiro[13] a boa fé abrangeria os deveres de protecção; informação e de lealdade. Os deveres de informação adstringem as partes à prestação de todos os esclarecimentos necessários à conclusão honesta do contrato, nomeadamente abrangem os eventuais vícios da coisa, ou visam impedir que um sujeito confie inutilmente na validade de um contrato; ou seja cada uma das partes pode, segundo a boa fé, esperar a comunicação dos factos que a outra parte deva admitir serem importantes para a sua decisão de contratar e de que por si só não possa obter conhecimento.
Os deveres de lealdade vinculam os negociadores a não assumir comportamentos que se desviem de uma negociação correcta e honesta: deve ser preservado, na actuação preliminar, o escopo da formação válida de um contrato, com exclusão de actos que a ponham em causa e não se deve, de modo injustificado interromper-se uma negociação em curso.
A culpa in contrahendo funciona, assim, quando a violação dos deveres de protecção, de informação e de lealdade conduza à frustração da confiança criada na contraparte pela actividade anterior do violador ou quando essa mesma violação retire às negociações o seu sentido substancial profundo da busca de um consenso na formação de um contrato válido, apto a prosseguir o escopo que, em termos de normalidade, as partes lhe atribuíram.
Ao falar-se em responsabilidade pela culpa na formação dos contratos, o vocábulo “formação” é usado em sentido amplo abrangendo todo o processo genético do acordo quer se chegue ou não a concluir o contrato.
Dai que, a culpa in cotrahendo se reporta às negociações em si, funcionando com independência face ao futuro contrato.
Ora, postos estes princípios gerais, da matéria factual dada como provada, não resulta que o negócio da compra e venda da fracção se não concluiu em virtude qualquer conduta imputável à Autora recorrida.
Efectivamente, não ficou demonstrado que a não formalização do contrato de compra e venda, rectius a outorga da respectiva escritura se deveu ao facto de a Autora não ter obtido, dentro do prazo de validade da proposta de financiamento bancário, a licença de utilização da fracção, originando a caducidade desse financiamento.
Aliás, esse facto, só por si, não bastaria para responsabilizar a Autora pré-contratualmente. Com efeito, para tal desiderato era ainda necessário que estivesse demonstrado que a licença de utilização da fracção, no referido prazo, só não foi obtida por facto imputável à Autora apelada.
Portanto, da matéria factual, dada como assente nos autos, não decorre que a Autora apelada tenha assumido comportamentos que se tivessem desviado de uma negociação correcta e honesta, que tivesse praticado actos pondo em causa a formação válida do contrato.
É que, não se pode olvidar que na aferição da existência de responsabilidade adveniente da culpa in contrahendo, haverá que ter em consideração a disciplina decorrente do artigo 483.º do CCivil (que impõe àquele que, com dolo ou mera culpa, viola ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios, a obrigação de indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação) e igualmente princípios gerais reguladores da responsabilidade contratual, designadamente o disposto no artigo 798.º do CCivil (onde se estabelece que o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação se torna responsável pelo prejuízo que causa ao credor, presumindo-se essa culpa nos termos do artigo 799.º, n.º 1, do CCivil).
Em suma, pode afirmar-se que a responsabilidade pré-contratual tem como pressupostos: a) o facto; b) a ilicitude; c) a culpa; d) o dano; e) o nexo de causalidade entre o facto e o dano.
*
Mas, mesmo que assim não se entendesse e, portanto, a Autora apelada tivesse incorrido em responsabilidade pré-contratual e, portanto, dando-se como provada a matéria factual que neste segmento os recorrentes impugnaram e que atrás se deixou descrita, ainda assim, o pedido reconvencional não teria melhor sorte.
Vejamos.
Nos termos da doutrina dominante, no ilícito pré-contratual apenas podem ser indemnizados os danos relativos ao interesse contratual negativo, ou seja, os danos que a parte sofreu por ter confiado na futura celebração de um contrato, que afinal não chegou a celebrar-se.[14]
Em sentido contrário, entendendo que a indemnização proveniente de responsabilidade pré-contratual encontra o seu regime nas regras gerais da responsabilidade civil, enfileiram Menezes Cordeiro, Sinde Monteiro, Ana Prata, Manuel Duarte Gomes da Silva e Rita Amaral Cabral.[15]
Há ainda autores que seguem uma terceira tese, válida para os casos em que o acordo já está conseguido, a fase da negociação já está concluída e só falta formalizar o contrato, através da outorga da usual escritura pública.
Em tais hipóteses, quando o contrato já está prestes a ficar formalmente concluído, em que se deve já considerar existente um autêntico dever de conclusão do contrato e já só falta dar ao acordo a forma legalmente exigida, a indemnização deve corresponder ao interesse contratual positivo ou de cumprimento.[16]
É também neste último sentido a posição de Sónia Moreira[17] quando escreve, em conclusão da referida anotação: “Na falta de uma disposição legal especial, que regule a indemnização devida por responsabilidade contratual, é de aplicar a regra geral dos artigos 562.º e segs do C.C. Nestes termos são de indemnizar todos os danos causados pelo ilícito pré-contratual. A aplicação deste critério causal significa que não é relevante a distinção entre interesse contratual positivo e interesse contratual negativo.
A situação em causa é que vai ditar o quantum indemnizatório que, a maior parte das vezes, corresponderá ao interesse contratual negativo, mas que também pode corresponder ao interesse contratual positivo.
Nos casos de ruptura ilícita de negociações, a indemnização será, em regra pelo interesse contratual negativo, por que as partes sabem que a celebração do contrato é meramente eventual e não tem outra expectativa que não seja a do desenvolvimento daquelas; contudo, há situações em que a indemnização será pelo interesse contratual positivo quando as negociações tiverem atingido um desenvolvimento tal que justifique a confiança na celebração do negócio.
Será o caso de se ter atingido um acordo sobre todas as questões essenciais e apenas falte a concretização/celebração do acordo através da forma legal “ (negrito e sublinhados nossos).
A este propósito veja-se o que também escreve Paulo Mota Pinto[18] que defende que a adopção “(…) de uma classificação das hipóteses de responsabilidade pré-contratual que atenda ao evento danoso-ou, na expressão do artigo 562.° ao definir o princípio geral em matéria de obrigação de indemnização, ao “evento que obriga à reparação”. Ora, nos casos de responsabilidade pré-contratual, este evento é a violação de um dever pré-contratual, ou a criação de confiança e/ou a sua frustração (alternativa, esta última, cuja exacta dilucidação se afigura cheia de consequências para a distinção entre a indemnização pelo interesse positivo ou pelo interesse negativo). Correspondentemente, o lesado deve ser colocado, nos termos do artigo 562.°, na situação em que estaria se não tivesse sido violado o dever pré-contratual ou não tivesse sido criada (e/ou frustrada) a sua confiança, sendo, pois, hipotizável, segundo as regras gerais e consoante o curso hipotético dos acontecimentos, que a indemnização se refira quer ao interesse negativo quer ao interesse positivo.
Tudo depende da configuração da hipótese de responsabilidade, para nela identificar o evento que obriga à reparação”(negrito e sublinhados nossos).
É este o entendimento que também perfilhamos, por se afigurar ser o mais equilibrado e o mais consentâneo com a realização da justiça material, de cada caso, entendimento que também tem sido acolhido pela jurisprudência do nosso mais alto tribunal.[19]
Ora, dito isto, torna-se evidente que os Réus recorrentes o que pretendiam era a indemnização pelo interesse contratual positivo consubstanciado no pagamento das rendas pela opoente no montante mensal de € 1.000,00 e durante cinco anos, após celebração de um contrato de arrendamento com a mesma, adquirida que fosse a propriedade da fracção com a celebração do contrato de compra e venda.
Todavia, para que assim fosse era necessário que tivesse sido alegado e provado, e não foi, que se havia gerado um acordo sobre todas as questões essenciais do negócio em que apenas faltava a concretização/celebração através da forma legal.
Aliás, o que resultou provado nos autos é que os Réus só aceitam outorgar a escritura por preço totalmente diferente do acordado, sendo certo que a Autora apelada nunca transmitiu aos Réus recorrentes que a escritura de compra e venda não se realizaria (factos correspondentes aos artigos 19º da petição inicial e 19º da réplica considerados provados no âmbito da realização do julgamento e que, saliente-se, nem sequer foram impugnados pelos recorrentes).
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Improcedem, destarte, as conclusões s) a jj) formuladas pelos recorrentes e, com elas, o respectivo recurso.
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2-Recurso da opoente E…, Lda

A primeira questão que vem colocada no recurso da Opoente prende-se com:

a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.

Como também decidido pelo Supremo tribunal de Justiça a Opoente deu cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil.
Cumpridos aqueles ónus e, portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, a Opente não concorda com a decisão da matéria de facto relativa aos artigos 9º, 20°, 22°, 27º, 30º, 32º, 36º, 37º, 41º, 42º, 43º, 44º e 45º do articulado da oposição espontânea que tendo sido considerada como não provada devia ter sido, antes, considerada como provada, da mesma forma que não devia ter sido considerado provada a matéria que consta do artigo 41º da contestação à oposição espontânea antes devia ter sido considerado não provado.
Quid iuris?
Os pontos 9º, 20°, 22°, 27º, 30º, 32º, 36º do articulado da oposição espontânea tinham a seguinte redacção:
art. 9.º. Tanto que, a própria autora, durante o transacto ano de 2010, procedeu, ela mesma, mas sempre a pedido ou por encomenda directa da ora requerente, a variadas obras de adaptação do acima indicado rés-do-chão à actividade comercial da aqui requerente;
art. 20.º foram pagas exclusivamente pela opoente.
art. 22.º. no que despendeu quantias avultadas…da posse … até porque foi a própria autora quem, após encomenda daquela, fez grande parte das mesmas obras.
art. 27.º. Foi a própria autora, no decurso daqueles dois anos, e após encomenda nesse sentido feita pela ora requerente, que procedeu a muitas de tais obras, na sequência de orçamentos que apresentou expressamente para tal efeito.
art. 30.º. Todas essas obras de construção civil foram pagas pela ora requerente à autora.
art. 32.º. Todos esses trabalhos (mão de obra e material) nas diversas artes-trolha, pedreiro, carpinteiro, picheleiro, electricista, pintor, etc-foram pagos pela ora requerente (tanto à autora, como se disse, como aos outros fornecedores).
Do art. 36.º. Naquelas obras acima elencadas a opoente despendeu uma quantia global de € 171.075,32, com IVA incluído”.
Para prova dos referidos factos a recorrente convocou o depoimento de parte do Réu C… e da testemunha G….
A este respeito valem aqui, mutatis mutandis, as mesmas considerações tecidas a propósito da impugnação da decisão da matéria de facto constante dos artigos 20º a 22º da petição inicial feita pelos Réus no recurso por eles interposto.
Efectivamente, também aqui, a Opoente recorrente se limita a indicar os referidos depoimentos, não fazendo, como aí se assinalou, qualquer análise crítica dos mesmos.
Não obstante sempre se dirá como se segue.
Quanto ao depoimento de parte do Réu C… nele nada se refere quanto à realização de obras na fracção por parte da Autora e a pedido da Opoente.
Efectivamente, o que o depoente aí afirma é que foi ele que custeou muitas das obras realizadas na fracção e que a Opoente contraiu um empréstimo junto do L… de € 100.000,00 para ser investido nas obras.
Portanto, como nos parece evidente, desse depoimento resulta que não foi a Opoente que pagou, de forma exclusiva, todas as obras levada a cabo na fracção, sendo que, do mesmo também não se afere que quantias aquela nela despendeu.
Por sua vez a testemunha G… apenas refere que a Autora enviou orçamentos a Opoente sem, todavia, especificar quais e, quanto aos pagamentos, afirma que foram feitos pela Opoente, mais dizendo que o valor que foi despendido ronda mais ou menos os 170.000,00.
Perante a pobreza confrangedora dos referidos depoimentos e sem qualquer elemento objectivável que os corrobore como, com base neles, se pode pretender alterar a matéria factual impugnada?
Não concorda também a Opoente com a matéria dos pontos 37º, 41º, 42º, 43º, 44º e 45º do articulado da oposição espontânea que o tribunal recorrido considerou não provados e que, no seu entender, deveriam ter sido dados como provados.
Esses pontos tinham a seguinte redacção:
“Do art. 37.º. Todas as referidas obras ou benfeitorias de carácter não fixo, cujos valores são os acima indicados nos itens 28º, 29º e 31º do presente articulado, não podem, pela sua própria natureza ser levantadas sem detrimento (aliás, tanto do próprio imóvel como das benfeitorias em si mesmas consideradas), já que se mostram integradas na própria estrutura física do imóvel.
Do art. 41.º. Por outro lado, tendo em conta, aliás conforme aceita a própria autora, que o imóvel em causa se encontrava em grosso, apenas com as paredes ao alto e tecto, e que foi a ora requerente que, para o adaptar à sua actividade comercial, despendeu todo o valor acima indicado nas ditas obras, óbvio se torna que, ficando a autora com o imóvel como ele se mostra agora, depois de realizadas tais obras e com o incremento ou valorização patrimonial que as mesmas produziram no imóvel, ocorre um manifesto enriquecimento sem causa da mesma autora, à custa a sociedade aqui requerente.
Do art. 42.º. Sendo que, num caso como o dos presentes autos, o valor de tal enriquecimento é necessariamente, e pelo menos, igual ao valor/custo total das obras ou benfeitorias levadas a cabo no prédio em questão, o que se indicou nos anteriores itens 28º, 29º, 31º e 36º e que é, também, o valor que actualmente têm tais benfeitorias.
Do art. 43.º. Na realidade, hoje, tal imóvel terá sempre, pelo menos, um valor igual à soma do valor que o mesmo tinha antes das obras levadas a cabo pela ora requerente- € 220.000,00-e do valor despendido por esta nas mesmas obras (e que é o valor actual dessas mesmas obras)-€ 171.075,32: ou seja, hoje e mercê das benfeitorias referidas, o imóvel pertencente à autora tem um valor nunca inferior a € 391.075,32.
Do art. 44.º. Sendo aqueles valores os actuais de tais benfeitorias, são esses valores que a ora requerente acrescentou ao imóvel em questão, pelo que o montante do enriquecimento sem causa por parte da autora nunca é inferior a € 171.075,32.
Do art. 45.º. mas também o foram, claramente, para melhorar o imóvel onde foram incorporadas, como, de facto, melhoraram”.
Para a alteração propugnada convoca a Opoente o relatório pericial e ainda o depoimento de parte do Réu C… e os depoimentos das testemunhas F…, H… e G….
Analisando o relatório pericial o que dele se retira contraria, em absoluto, a prova da referida matéria factual, ou parte dela.
Efectivamente como aí se refere todas as obras não fixas como sejam aparelhos electrónicos, louças sanitárias, misturadoras aparelhos de ar condicionado e quadro eléctrico, podem ser levantadas sem detrimento do imóvel nem delas, portanto, só as restantes obras fixas tais como paredes, tectos, carpintaria e outras é que provocarão danos no imóvel e nos elementos a retirar (respos ao quesito 5º).
Quanto ao acréscimo do valor imóvel aportado pelas obras aí executados referem os Srs. peritos que será de 60% do valor total considerado se for mantido o mesmo fim e mantida a mesma imagem e distribuição de espaços (resposta ao quesito 8º)
Todavia, referem os Sr. peritos que se na fracção se quiser montar uma padaria, um café ou restaurante, uma livraria e papelaria as referidas obras não têm qualquer utilidade.
Por sua vez do depoimento de parte do Réu C… nada se retira que contrarie a referida prova pericial, tendo apenas referido que dependendo do que lá se quiser montar, pode ser tudo demolido ou não.
Já a testemunha F… refere que como está a fracção não tem qualquer utilidade, referindo que aquele espaço é um bom espaço amplo, enquanto espaço compartimentado é um elefante branco rematando que, como está apenas tinha utilidade se chegasse lá alguém que quisesse um SPA o que nunca aconteceu até agora.
Portanto, este depoimento contraria igualmente a referida matéria factual.
A testemunha H… refere no seu depoimento que como está a fracção em causa, ou seja tudo fechado sem respirar, tinha que vir tudo abaixo e montar tudo de novo, isto é, nem para SPA teria utilidade.
Por último a testemunha G… apenas refere que muitas das obras ficaram na fracção como o pavimento a parte eléctrica etc.
Perante a prova pericial e os depoimentos das testemunhas, escalpelizados nos termos expostos, torna-se evidente que os factos em causa não podem ser dados como provados, aliás, tal como referido, parte das referidas provas contradiz mesmo os citados pontos factuais.
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Refere ainda a Opoente que o artigo 41º da contestação à oposição devia ter sido dado como não provado.
Este artigo tem a seguinte redacção:
Os documentos 1 a 4 juntos com a oposição espontânea foram emitidos a pedido do réu–sendo que foi este que sempre pagou as obras e formulou o pedido para as mesmas”.
Quanto a este facto o tribunal recorrido formou a sua convicção no depoimento da testemunha F… como, aliás, consta da respectiva motivação.
Ora, esse depoimento que o tribunal valorou não se mostra contrariado por outro meio de prova convocado pela Opoente.
Portanto, o tribunal valorou o depoimento da referida testemunha F… quando este afirmou que os orçamentos constantes de fols. 108 e 110 foram emitidos a pedido do Réu C…, sendo que, essa convicção, não foi objecto, aliás como toda a restante prova, de qualquer análise crítica que a pudesse contrariar apoiada num outro meio probatório.
Por outro lado, embora a documentação contabilística esteja toda emitida em nome da Opoente, daí não se segue que tenha sido ela a efectuar os pagamentos respectivos, tanto mais que, como resulta dos autos, todos os cheques que foram juntos para pagamento das obras são da conta da titularidade do Réu C… como, de resto, ele corroborou no seu depoimento, tendo embora afirmado que era por empréstimo à Opoente o que, diga-se, apenas se revelou manifestamente cómodo, pois que, nenhum outro elemento probatório junto aos autos confirmou tal relação de mútuo.
*
Improcedem, assim, as conclusões 28ª e 37ª formuladas pela opoente.
*
Como assim, permanecendo inalterada a matéria a matéria factual que o tribunal recorrido deu como provada, é apenas com base nela que se vai apreciar a segunda questão colocada no recurso da opoente e que consiste em:

b)- saber se o pedido formulado pela opoente relativo à indemnização por benfeitorias devia, ou não, ter sido julgado improcedente

Como emerge da factualidade que dos autos resultou provada verifica-se que com o conhecimento e autorização da Autora, foi entregue pelos Réus à Opoente a fracção em causa a qual se encontrava em grosso, apenas com o tecto e paredes ao alto, mostrando-se agora completamente pronta e equipada, totalmente acabada em todas as artes de construção civil, fruto das obras que nela a Opoente levou a cabo tendo em vista um contrato de arrendamento da mesma fracção que iria celebrar com os Réus, para nela exercer a sua actividade de SPA, que chegou a exercer durante cerca de 1 ano e 2 meses.
Ora, em relação a essas obras estamos perante benfeitorias, ou seja, em melhoramentos feitos na fracção pela Opoente.
O conceito de benfeitorias é-nos dado pelo artigo 216.º, nº 1, do C.Civil, ao estipular que se consideram como benfeitorias “todas as despesas feitas para conservar ou melhorar a coisa”.
No fundo, pode dizer-se que as benfeitorias são melhoramentos de uma coisa, ou seja, alterações introduzidas numa coisa feitas com a intenção de a beneficiar, por quem a ela está ligada por uma relação ou vínculo jurídico, aspecto este importante para a diferenciar de uma figura muito parecida, como é a da acessão.[20]
Porém, como é sabido e resulta do nº 2 do citado artigo 216.º do citado diploma legal, consoante o benefício efectivamente obtido, as benfeitorias distinguem-se em necessárias, úteis e voluptuárias.
Grosso modo, pode dizer-se que as primeiras (as necessárias) destinam-se a evitar o detrimento ou perda da coisa, as segundas (as úteis) a aumentar as potencialidades do gozo da mesma e as últimas (voluptuárias) têm mais como fim servir de recreio ou deleite a quem as utiliza.[21]
Aliás, é isso mesmo que resulta da caracterização legal consagrada no nº 3 do referido artigo 216.º onde se estatui que “são benfeitorias necessárias as que têm por fim evitar a perda, destruição ou deterioração da coisa; úteis as que, não sendo indispensáveis para a conservação, lhe aumentam, todavia, o valor; voluptuárias as que, não sendo indispensáveis para a sua conservação nem aumentando o seu valor, servem apenas para recreio do benfeitorizante”.
No caso em apreço como parece evidente, estas obras feitas pela opoente não se destinaram a evitar a perda, destruição ou deterioração do prédio, pois que, a fracção estava em grosso, apenas com o tecto e paredes ao alto, ou seja, não se tratou de benfeitorias necessárias.
Mas poder-se-ão considerar como benfeitorias úteis?
Antes demais, importa acentuar que nos termos do artigo 342.º, nº 1, do CCivil, incumbe a quem invocar o direito a indemnização por realização de benfeitorias o ónus de provar as características das obras efectuadas com vista à respectiva qualificação, à luz do disposto no citado artigo 216.º
Ora, não está provado nos autos que as obras tenham aumentado o valor venal ou objectivo da fracção em referência, nem sequer da mera descrição de tais obras se pode inferir qualquer conclusão segura nesse sentido, o que obsta, por si só, a que sejam consideradas como benfeitorias úteis (haja em vista a não prova dos factos descritos em 41º a 45º do articulado da oposição espontânea).
Aliás, o que resulta da matéria de facto dada como assente é que, com as referidas obras, não há ganho da autora, antes há prejuízo, pois que, as obras realizadas na fracção apenas poderiam ter utilidade para o exercício de actividade de SPA, sendo que, para outro fim, como café, lavandaria, as obras realizadas constituem um dano por terem que ser demolidas e a fracção colocada no estado anterior às mesmas, ou seja, em bruto (factos correspondentes aos artigos 31º a 34º da contestação à oposição espontânea considerados provados no âmbito da realização do julgamento).
Portanto, quando muito, poder-se-ia considerar que as referidas benfeitorias seriam voluptuárias, ou seja, como obras de adaptação funcional, tendo em vista o fim específico que a Opoente pretendia dar àquele espaço (SPA).
A este propósito, ensinava o Prof. Manuel Andrade[22], ainda no domínio do CCivil de 1867 mas com aplicação ao regime actual, que o aumento de valor, para efeito de qualificação de benfeitorias úteis, se reporta ao valor objectivo ou venal da coisa, também designado por valor comum ou real, sendo que o aumento de valor subjectivo, que represente apenas ornatos ou embelezamento de modo a tornar a coisa mais aprazível, conforme as preferências do possuidor, ou mesmo vantagens particulares, ainda que de ordem patrimonial, não relevam como benfeitorias úteis mas como benfeitorias voluptuárias.
E, sendo consideradas benfeitorias voluptuárias, evidentemente que a Opoente não tem o direito de ser por elas indemnizada.
Mas ainda que se considerem benfeitorias úteis assistirá à Opoente o direito à indemnização que reclama?
Analisando.
Em primeiro lugar é fora de qualquer dúvida que a Opoente nunca passou de mera detentora precária da fracção.
Pareceria assim, à primeira vista que não se lhe poderia aplicar o regime previsto para as benfeitorias do artigo 1273.º do C.Civil, já que tal regime apenas se refere à posse propriamente dita e não à mera detenção ou posse precária (ressalvados os casos em que a lei manda aplicá-lo a algumas destas últimas situações, como acontece com o credor pignoratício, com o locatário, com o comodatário ou o usufrutuário).
Mas não é assim.
Na verdade, a qualidade de mero possuidor precário, não impede, só por si, a aplicação do regime do citado artigo 1273.º, já que, em caso de nulidade, anulabilidade ou resolução do contrato, o nº 3 do artigo 289.º do C.Civil, manda aplicar o disposto nos artigos 1269.º e ss. (portanto também o artigo 1273.º) directamente ou por analogia.
Quer isto dizer que o preceito tem aplicação mesmo nas situações em que não se verifica posse, ou seja, mesmo que o direito transmitido ou constituído invalidamente tenha outra natureza que não a real, o regime das benfeitorias previsto em relação ao possuidor, tem aplicação analógica.
Significa, pois, que a Opoente com aquela detenção precária passou a figurar como titular de um direito pessoal de gozo (a que se refere, genericamente, o artigo 407.º do CCivil) sobre a mesma e, embora se trate de um direito de conteúdo não definido expressamente na lei, o mesmo reveste, nessa parte, uma natureza análoga ao direito pessoal de gozo que assiste ao locatário ou ao comodatário. Nessa medida, afigura-se aplicável, quanto às benfeitorias, regime idêntico ao previsto nos artigos 1046.º, nº 1, e 1138.º, nº 1, do CCivil, desde que consentâneo com tais limites.
Haverá, então, que averiguar se a Opoente, mesmo na qualidade de mero detentor está em condições de beneficiar de tal regime em relação às benfeitorias que implantou na fracção mesmo que sejam consideradas como úteis.
Estatui o artigo 1273.º, nº 1 do C.Civil acima citado que “que tanto o possuidor de boa fé como o de má fé têm o direito a ser indemnizados das benfeitorias necessárias que hajam feito, e bem assim a levantar as benfeitorias úteis realizadas na coisa, desde que o possam fazer sem detrimento dela” (nº 1) e que “quando para evitar o detrimento da coisa, não haja lugar ao levantamento das benfeitorias, satisfará o titular do direito ao possuidor o valor delas, calculado o segundo as regras do enriquecimento sem causa” (nº 2).
Tal como acima já se referiu a propósito da qualificação das benfeitorias, também incumbia à Opoente o ónus de alegar e provar a impossibilidade de levantamento das benfeitorias por o mesmo causar detrimento da coisa; isto é, quem formula o pedido de indemnização pelas benfeitorias úteis é que terá de alegar e provar factos que permitam concluir que elas não podem ser levantadas sem detrimento da coisa.[23]
Sublinhe-se que o detrimento a que pode dar lugar o levantamento das benfeitorias úteis se refere não a estas, mas à coisa benfeitorizada, ao contrário do que parece entender a Opoente apelante. Daí que, independentemente da situação subjectiva do possuidor, seja juridicamente irrelevante que do levantamento das benfeitorias resulte o detrimento destas.[24]
Ora, ainda que se considerasse que as obras levadas a cabo pela Opoente consubstanciavam benfeitorias úteis, o facto é que não se provou também a impossibilidade do levantamento das mesmas sem o detrimento da coisa (fracção).
Aliás, tendo a fracção sido entregue em bruto, todas as obras lá realizadas podem ser retiradas sem detrimento da fracção, que se pretende devolvida exactamente em bruto (como foi entregue).
Como supra se referiu, o detrimento provocado pelo levantamento das benfeitorias deve, para ser relevante, referir-se não a estas, mas à coisa benfeitorizada. Não releva, por isso, que o levantamento implique a destruição da obra ou dos bens incorporados em que a benfeitoria se traduziu. Interessa, sim, que não provoque prejuízo no próprio prédio. E no caso dos autos, a destruição da obra ou dos bens incorporados não causa prejuízo na fracção, pois que esta foi entregue em bruto, e assim deve ser devolvida.
É que, ao contrário, do que refere a Opoente apelante, não vemos como possa haver detrimento da fracção quando se proceda ao levantamento das benfeitorias nela realizadas.
Com efeito, estando ela em bruto ou seja, apenas com o tecto e paredes ao alto, o levantamento de todas as benfeitorias nela feitas não vai danificar seja o que for na referida fracção, com a remoção daquelas ela vai ficar no seu estado inicial, em grosso.
Diferente seria, se por exemplo a fracção não estivesse no estado de grosso ou tosco, então sim muito provavelmente o levantamento de algumas benfeitorias iria causar nela detrimento, mas estando em tosco não existe esse perigo.
É que, a fracção tinha apenas as paredes e tecto ao alto, ou seja o no seu interior não existiam divisórias, tudo nesse espaço foi construído e criado pela Opoente, razão pela qual tudo pode ser levantado ou demolido, sem que a fracção venha a sofrer qualquer detrimento.
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Decorre, assim do exposto que a Opoente nunca não teria arrimo legal para ser indemnizada pelas benfeitorias realizadas na fracção ainda que se classificassem de úteis.
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E será que podia obter a devolução do valor gasto nas referidas obras pela via do enriquecimento sem causa
A resposta é também aqui negativa.
Nos termos do artigo 473.º, nº 2, “a obrigação de restituir, por enriquecimento sem causa, tem de modo especial por objecto o que for indevidamente recebido, ou o que for recebido por virtude de uma causa que deixou de existir ou em vista de um efeito que não se verificou”.
Portanto, a obrigação de restituir, fundada no injusto locupletamento à custa alheia, pressupõe a verificação simultânea de três requisitos, que o artigo 473º, nº 1, do Código Civil, enumera, como sendo o enriquecimento obtido por alguém, que este seja alcançado, à custa de quem requer a sua restituição, e que o enriquecimento não tenha causa justificativa.
Ora, tal como se refere na decisão recorrida constitui jurisprudência pacífica que cabe ao autor do pedido de restituição em consequência de enriquecimento sem causa, o ónus da prova quanto à verificação dos respectivos pressupostos, ou, dito de outro modo, dos factos constitutivos do enriquecimento indevido.[25]
No caso dos autos, para além de não se ter provado que houve um empobrecimento da Opoente (pois que se não provou que os pagamentos das obras foram por si feitos), igualmente se não provou que o património da Autora se tenha enriquecido à custa do seu (dela, opoente) empobrecimento.
E assim, na ausência de demonstração, em concreto, dum empobrecimento da opoente e de um enriquecimento dos autores já se vê que também por esta via a pretensão da opoente não é atendível, tornando-se assim ocioso discutir a verificação dos restantes pressupostos do instituto, que são a falta de causa justificativa do enriquecimento e a obtenção deste à custa de quem requer a restituição.
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Improcedem, assim, todas as restantes conclusões formuladas pela Opoente apelante e, com elas, o respectivo recurso.
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Na improcedência dos recursos, desnecessário se torna apreciar a sua ampliação requerida pelo Autor recorrido. Aliás, diga-se, nunca por esta via se podia conhecer da questão aí suscitada.
Com efeito, a norma do artigo 636.º do CPCivil, está vocacionada para os casos em que, a apesar da decisão ser favorável à parte vencedora, nela não tenham sido acolhidos todos ou alguns dos fundamentos de facto ou de direito invocados.
Como refere Abrantes Geraldes[26] pode não ser de todo indiferente o modo como o tribunal a quo fundamentou a decisão se acaso vierem a ser acolhidos pelo tribunal ad quem as questões suscitadas pelo recorrente.
Na verdade, se o tribunal ad quem reconhecer razão aos argumentos invocados pelo recorrente, pode revelar-se importante para a defesa dos interesses do recorrido que exista também pronúncia sobre os argumentos que oportunamente esgrimiu e que foram objecto de resposta desfavorável.
Ora, nada disso está em causa no impetrado pelo apelado.
Efectivamente, o que o apelado pretendia era impugnar a decisão relativamente à admissão do incidente de oposição.
Acontece que, não é através da ampliação do âmbito do recurso que a apelada pode promover a reapreciação dessa decisão, essa reapreciação só podia ser feita mediante impugnação autónoma ou recurso subordinado (artigos 633.º e 644.º, nº 3 do CPCivil).

IV-DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta improcedente por não provada e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida.
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Custas das apelações por cada um dos respectivos recorrentes (Réus e Opoente) (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 9 de Janeiro de 2017.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
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[1] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio da Nora in Manual de Processo Civil, 2ª Almedina, pág. 49.
[2] Antunes Varela, ob. citada pág. 54.
[3] Obra citada pág. 55.
[4] Neste sentido, ver Alberto dos Reis, CPC Anotado, V, 140 e Antunes Varela, Manual de Processo Civil, Coimbra Editora, 1984, pág. 669.
[5] Cfr. Antunes Varela, obra citada pág. 670.
[6] De facto, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc.”-Abrantes Geraldes in “Temas de Processo Civil”, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (Abrantes Geraldes in “Temas…” cit., II Vol. cit., p. 273).
[7] Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348.
[8] Cfr. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, processo n.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[9] Cfr. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, processo n.º 3931/03.2TVPRT.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[10] Ac. Rel. Porto de 19 de Setembro de 2000, CJ XXV, 4, 186; Ac. Rel. Porto 12 de Dezembro de 2002, Proc. 0230722, www.dgsi.pt
[11] In Direito das Obrigações, 4ª Ed. pág. 73 a 82; 199 a 210 e 736 a 738.
[12] In, A Responsabilidade Pré-contratual, Almedina, 1970, pág.30 e segs.
[13] In Boa Fé no Direito Civil, vol. I, pág. 583 e segs.
[14] Cfr. neste sentido, Mota Pinto, A responsabilidade pré-contratual pela não conclusão dos contratos, BFD, Suplemento XIV, 1966, pág. 179/180; Almeida Costa, A responsabilidade pré-contratual da ruptura das negociações de um contrato; RLJ, Ano 116, págs. 205 e segs e 251 e segs; Antunes Varela, Das Obrigações em geral, Vol. I, 10ª ed, pág., 270 /271; Oliveira Ascensão, Direito Civil-Teoria Geral, Vol. II, pág. 374; Galvão Telles, Direito das Obrigações, 7ª ed, págs. 77/78; Galvão Telles, Manual dos Contratos em Geral, 3ª ed, pág. 187/188.
[15] In, respectivamente, Tratado de Direito Civil Português–Parte Geral, tomo I, pág. 346, Responsabilidade por Conselhos, Recomendações ou Informações, pág. 460, nota 15, Notas sobre responsabilidade pré-contratual, pág. 176 e Parecer, A Privatização da sociedade financeira portuguesa, Lex, Lisboa, 1995, pág. 320.
[16] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 4ª ed, pág. 216, nota 3; Baptista Machado, A Cláusula do Razoável, R.L.J.Ano 120, págs. 138-141; Carlos Ferreira de Almeida, Contratos, I, 2ª ed. pág. 192 e segs.
[17] In Anotação ao Ac. Rel. de Coimbra de 4-2-03, Cadernos de Direito Privado, nº7, Julho /Setembro, 2004, pags. 41 e segs.
[18] In “Interesse Contratual Negativo e Interesse Contratual Positivo”, vol. II, págs. 1191 e 1192”.
[19] Cfr. Ac. S.T.J. de 26-01-06, Col. Ac. S.T.J., XIV, 1º, 40; Ac. S.T.J. de 4-2-06, Col. Ac. S.T.J., XIV, 2º, 29; Ac. S.T.J. de 3-3-04, proferido no processo 04B2983 e Ac. S.T.J. de 11-01-07, proferido no processo 06B4223, ambos em www.dgsi.pt/jstj.
[20] Vide, a propósito, e entre outros, o Prof. Oliveira Ascensão in Direitos Reais, 4ª ed., Coimbra Editora, pág. 111/112; estudo do conselheiro Quirino Soares in CJ, Acs do STJ, Ano IV, Tomo, I págs. 11 e ss e Ac. da RC de 30/5/1982, in CJ ano Ano VII, T2, pág. 94).
[21] Cfr., entre outros, o Prof. Oliveira Ascensão, in Ob. cit., pág. 112.
[22] Teoria Geral da Relação Jurídica, Vol. 1º, Coimbra, 1974, pag. 274-275.
[23] Neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, CC Anotado, Vol. III, 2ª ed., 42; Rodrigues Bastos, Notas ao CC, Vol. V., 31 e entre outros, os Acs. da Relação do Porto de 20.7.78, CJ III, 4, 214 e do STJ de 3.4.84, BMJ 336-420, de 26.2.92, BMJ 414-556 e ainda, em www.dgsi.pt, de 29.5.79 (proc. nº 067830), de 3.5.90 (proc. nº 077854), de 23.4.2002 (proc. nº 01A4298), de 3.4.2003 (proc. nº 03A663).
[24] Neste sentido, Pires de Lima e Antunes Varela, Ibidem; citado Ac. da Relação do Porto de 20.7.78.
[25] Cfr. neste sentido, entre outros, o acórdão do STJ de 23/11/11, na CJ XIX, 3, pág. 133.
[26] Recursos em Processo Civil, Novo Regime, Almedina, pág. 107.