Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
645/12.6TMMTS-C.P3
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FRANCISCA MOTA VIEIRA
Descritores: RESPONSABILIDADES PARENTAIS
INCUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO DE ALIMENTOS
CONTRA-ORDENAÇÃO
CRIME
EFEITO NEGATIVO DO CASO JULGADO
Nº do Documento: RP20220407645/12.6TMMTS-C.P3
Data do Acordão: 04/07/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADO O DESPACHO RECLAMADO
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O tipo legal da contraordenação prevista no art 41º do RGTCC (Lei nº 141/2015, de 8.09) não se destina a tutelar bens jurídicos diversos dos que justificam a consagração do crime previsto no art 250º, nº1 do C. Penal, dirigindo-se, contudo, o primeiro a condutas que põem tais bens jurídicos em causa de forma menos gravosa ou meramente mediata.
II - Assim, se um progenitor foi condenado por acórdão transitado em julgado no processo crime como autor material do crime previsto no art 250º, nº1 do C. Penal, o efeito negativo da excepção do caso julgado material impede que a mesma realidade seja de novo apreciada autonomamente no âmbito do processo tutelar cível, a implicar a absolvição da instância do aqui requerido-recorrido relativamente aos pedidos de indemnização civil formulados que tinham por base a mesma factualidade apreciada e discutida no enxerto civil do processo crime, o que obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 645/12.6TMMTS-C.P3

EM CONFERÊNCIA

ACORDAM OS JUÍZES DA 3.ª SECÇÃO DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO:

I. RELATÓRIO:
Pela relatora foi proferido nos autos a seguinte decisão singular:
«1.Nos presentes autos no dia 23.11.2017 AA, solteira, residente na Rua ..., Póvoa de Varzim, propôs o presente Incidente de Incumprimento de Regulação das Responsabilidades Parentais contra BB, solteiro, com residência na Rua ..., ..., Vila do Conde, formulando a final os seguintes pedidos:
a)Se digne admitir o presente incidente e, a final, considerá-lo provado, declarando que o Requerido incumpriu culposamente a regulação das responsabilidades parentais em vigor;
b) Se digne designar dia e hora para a realização da conferência de pais a que alude o n.º 3 do artigo 41.º do RGPTC;
c) Face à conduta GRAVE e ILEGAL reiteradamente perpetrada pelo Requerido, considere provado o incumprimento culposo da regulação do poder paternal, e, para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 41.ºdo RGPTC, seja o Requerido condenado a pagar multa nunca inferior a 10 UCs – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC;
d)Face à conduta GRAVE e ILEGAL perpetrada pelo Requerido, considere provado o incumprimento culposo da regulação do poder paternal, e, para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC, seja o Requerido condenado a pagar à Requerente indemnização a título dos danos patrimoniais causados, não inferior a € 5.000,00 – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC;
e)Mais requer a V.ª Ex.ª, em face da conduta GRAVE e ILEGAL perpetrada pelo Requerido, considere provado o incumprimento culposo da regulação do poder paternal, e, para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 41.º indemnização a título dos danos não patrimoniais não inferior a € 5.000,00 – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC;
Alegou, para tanto, que entre Requerente e Requerido vigora a regulação das responsabilidades parentais quanto ao filho de ambos, CC, residindo o menor com a mãe, sendo que por decisão provisória datada de 12/03/2013 proferida nos autos de regulação das responsabilidades parentais foi decidido que o Requerido ficava obrigado ao pagamento mensal da quantia de € 100,00 (cem euros) para o filho menor, a título de prestação de alimentos, bem como obrigado a contribuir, na proporção de metade, nas despesas escolares, médicas e medicamentosas do menor, bem como metade das despesas de ATL, exibindo a mãe, para tal efeito, os respectivos documentos comprovativos dessas despesas. Que por sentença decretada nos mesmos autos em 11/11/2016 foi decidido que o Requerido ficava obrigado ao pagamento da quantia de € 150,00 (cento e cinquenta euros) para o filho menor, a título de prestação de alimentos, a qual seria actualizada anualmente no início de cada ano civil na quantia de € 2,00 (dois euros), valor esse a ser entregue à Requerente por qualquer meio documentado, até ao dia 8 do mês a que disser respeito.
Mais alegou que, pese embora o decidido, o Requerido não tem cumprido com as obrigações que sobre si impedem sendo que no ano de 2015 o Requerido não liquidou atempadamente os seguintes montantes: a) no final do mês de Dezembro do ano 2015, o progenitor devia a quantia de € 325,00, relativamente ao computo global de pensão de alimentos e encargos suportados não amortizados durante o ano. E durante o ano de 2016, o Requerido não liquidou os seguintes montantes: a) Relativamente à pensão de alimentos, cujo computo durante o ano de 2016, perfazia a quantia global de € 1.250,00 (11 X € 100,00 + € 150,00) e, no que tange às despesas legalmente exigíveis e comunicadas pela Requerente no valor global de € 770,12, o Requerido apenas pagou a quantia global de € 1.331,65, pelo que não liquidou o valor remanescente corresponde a € 1.013,47, apenas considerando o capital em divida. E durante o ano de 2017, o Requerido não liquidou as prestações alimentícias reportadas aos meses de Janeiro a Novembro sendo cada uma das prestações no valor de € 152,00, no valor global de € 1.824,00, apenas no que diz respeito ao valor do capital em divida, o Requerido nada pagou. As despesas a suportar pelo Requerido, devidamente comprovadas e comunicadas, o mesmo é devedor pelo menos da quantia de € 302,48, estando em dívida o montante global de € 3.464,95. Aos montantes totais, apenas de capital, deverá acrescer juros vencidos e vincendos, correspondentes à taxa legal aplicável de 4%, contabilizados desde as respectivas datas de vencimento e até efectivo e integral pagamento.
Mais alega que o Requerido omitiu, sem qualquer razão ou explicação, os pagamentos devidos à Requerente sobre pensão de alimentos, livros e material escolar, e ainda frequência de ATL do filho menor, que o pai segue um modelo educativo caprichoso, negligente e doloso, sendo a mãe que continua a cuidar e a suprir todas as carências do filho. Refere ainda que por serem recorrentes as situações de atraso no pagamento do que lhe compete, a Requerente vive muito triste, angustiada e deprimida com a falta de cuidado, tratamento e atenção que o pai dedica ao filho, nomeadamente para lhe proporcionar bem-estar, na respectiva proporcionalidade, como o mesmo necessita e merece.
A Requerente sente-se humilhada, vexada e fracassada perante toda a situação, para mais quando tem sistematicamente de recorrer aos serviços do tribunal, como é mais este caso pois que sem intervenção do tribunal, o Requerido não cumprirá voluntariamente nada a que esteja obrigado, causando-lhe ainda desgosto, indignação, revolta, frustração e ansiedade, o que seria evitável, se o Requerido se dignasse cumprir. O sacrifício económico da Requerente é evidente, sendo os valores a que tem direito especialmente avultados e a Requerente é pobre e tem dificuldades financeiras, muitas delas resultam da falta de recebimento das verbas que o Requerido não comparticipa e entrega, tem dedicado muito tempo da sua vida para lutar contra as atitudes de incumprimento e violação das regulações das responsabilidades parentais do Requerido, como é o caso.
A Requerente tem retirado muito do seu tempo de trabalho e descanso para procurar fazer valer os seus direitos, quer com deslocações à PSP para reportar o conjunto de incumprimentos do requerido, quer ao escritório do seu mandatário, quer mesmo com deslocações aos Tribunais, tem suportado vários encargos e despesas para procurar resolver as sucessivas situações causadas pelo Requerido, nomeadamente com a elaboração de comunicações e memorandos, envio de correspondência, despesas de deslocação e transporte, portagens, desgaste da viatura e combustíveis.
Em consequência a Requerente, entre outros, ficou obrigada a:a)– Despender tempo e dinheiro com deslocações para a PSP, tribunais e escritório do seu mandatário; b)– A amortizar verbas relativas a despesas, serviços extrajudiciais e honorários forenses; c)– A preparar, elaborar e obter documentos, bem como a proceder ao envio de sucessivas comunicações, por correio ou e-mail; d)– A efectuar frequentes contactos com o seu mandatário e a preparar, enviar e recepcionar interpelações judiciais e extrajudiciais.
Termina e pede que o Requerido seja condenado a pagar à Requerente indemnização pelos prejuízos e danos patrimoniais causados, em valor nunca inferior a € 5.000,00, atendendo à conduta grave e ilícita perpetrada por aquele, de forma repetida e sistemática, assim desconsiderando os interesses do menor e os direitos da Requerente, isto, nos termos do n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC; bem como pelos prejuízos e danos não patrimoniais (morais) causados, em valor nunca inferior a € 5.000,00, atendendo à conduta grave e ilícita perpetrada por aquele de forma repetida, dolosa e sistemática, assim desconsiderando e prejudicando a vida e os interesses do menor e os direitos da Requerente – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC.
Foi determinada a notificação do requerido para alegar nos termos previstos no art. 41º do RGPTC e solicitadas as informações constantes do despacho de fls. 73 e 74 (refª 387231988).
Notificado, veio a fls. 97 a 106 alegar (refª 27650283) dizendo que parte das quantias peticionadas não são devidas e como tal deve ser o valor não devido abatido ao valor peticionado.
Foi agendada conferência de pais tendo no seu âmbito da qual houve reconhecimento parcial da dívida, cfr. teor de fls. 381 e 382 dos autos, mais concretamente quanto às prestações alimentícias em atraso, dizendo o requerido ter pago os valores parciais de € 325,00 e € 1.800,00, mas negando quaisquer quantias a título de despesas a título de ATL, com a psicóloga e despesas escolares.
2.Procedeu-se a julgamento e o tribunal recorrido proferiu sentença no dia 27.03.2019 que julgou parcialmente procedente por provado o presente incidente e, em consequência:
a)reconhecer a existência de incumprimento por parte do requerido quanto à entrega da quantia global de € 3.399,00 (três mil trezentos e noventa e nove euros), sendo que entretanto o Requerido pagou a quantia de € 2.429,00 (dois mil quatrocentos e vinte e nove euros), estando em dívida a quantia de € 970,00 (novecentos e setenta euros);
b)condenar o requerido no pagamento da multa equivalente a 2 (duas) unidades de conta, absolvendo-se o requerido do demais peticionado;
c)reconhecer-se a inviabilidade do cumprimento coercivo das quantias em dívida através do mecanismo previsto no artigo 48º do RGPTC, dando-se, consequentemente, por findo este incidente.
3.Inconformada, a requerente interpôs recurso de apelação da sentença na parte em que o tribunal recorrido não condenou o requerido nos juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento de cada uma das prestações de alimentos não pagas, ate integral pagamento, bem como, na parte em que o requerido foi absolvido do pedido de indemnização civil, a significar que a sentença da 1ª instância transitou na parte em que o aqui requerido foi condenado no pagamento da multa equivalente a 2 (duas) unidades de conta.[1]
4.Este tribunal da Relação proferiu acórdão no dia 24.10.2019 cujo dispositivo se reproduz:
“Por tudo quanto ficou exposto, acorda-se nesta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação alterando a al. a) do dispositivo da sentença recorrida e assim reconhecer a existência de incumprimento por parte do requerido quanto à entrega da quantia global de € 3.399,00 (três mil trezentos e noventa e nove euros), acrescida do pagamento dos juros moratórios, à taxa legal, desde o vencimento de cada uma das prestações de alimentos não pagas, até integral pagamento, sendo que entretanto o Requerido pagou a quantia de € 2.429,00 (dois mil quatrocentos e vinte e nove euros), estando em dívida a quantia de € 970,00 (novecentos e setenta euros) e, ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº2, alínea c) e nº3, al. c) do CPC, anula-se a parte restante da decisão recorrida e, em consequência, determina-se o normal prosseguimento dos autos para averiguação da factualidade supra referida com ampliação da matéria de facto. [2]
Custas pela parte vencida a final, sem prejuízo do apoio judiciário da recorrente.”
5.Os autos foram devolvidos à 1ª instância e aí foi proferida segunda sentença no dia 18.07.2020, cujo dispositivo se reproduz (2ª sentença do tribunal recorrido)
“VI– Por tudo o exposto, decido julgar parcialmente procedente por provado o presente incidente e, em consequência: a)reconhecer a existência de incumprimento por parte do requerido quanto à entrega da quantia global de € 3.399,00 (três mil trezentos e noventa e nove euros), sendo que entretanto o Requerido pagou a quantia de € 2.429,00 (dois mil quatrocentos e vinte e nove euros), estando em dívida a quantia de € 970,00 (novecentos e setenta euros), entretanto liquidada nos autos; b)condenar o requerido no pagamento da multa equivalente a 2 (duas) unidades de conta, absolvendo-se o requerido do demais peticionado; c)reconhecer-se a inviabilidade do cumprimento coercivo das quantias em dívida através do mecanismo previsto no artigo 48º do RGPTC, dando-se, consequentemente, por findo este incidente. Custas pelo Requerido por ter dado azo ao presente incidente. Registe e notifique.”
6.Inconformada, a requerente apelou desta sentença colocando a este Tribunal as seguintes questões:
a)A errada valoração e credibilização /descredibilização da prova testemunhal e declarações da requerente e ausência de suficiente análise critica quanto a toda a prova documental junta aos autos e errada fundamentação da matéria de facto pelo tribunal;
b)Errada aplicação do direito aos factos e aos pedidos de indemnização;
c)A Não condenação como litigante de má-fé.
d)Dos Juros de mora
Foi apresentada resposta pela Ministério Público que se pronunciou pela procedência parcial do recurso apenas no tocante à questão dos juros de mora.
7.E no dia 5.11.2019 foi proferido por este Tribunal da Relação novo acórdão cujo dispositivo se reproduz:
“Por tudo quanto ficou exposto, ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº2, alínea c) e nº3, al. c) do CPC, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação do Porto em anular a sentença recorrida para ampliação da matéria de fato nos termos referidos, sem prejuízo da apreciação de outros pontos da matéria de fato, com o fim de evitar contradições. Custas pela parte vencida a final, sem prejuízo do apoio judiciário da recorrente.
8.Remetidos os autos ao tribunal de comarca foi reaberta a audiência a audiência de julgamento e feitas as pertinentes alegações, foi proferida nova sentença no dia 19.06.2021 cujo dispositivo se reproduz:
“VI – Por tudo o exposto, decido julgar parcialmente procedente por provado o presente incidente e, em consequência: a) reconhecer a existência de incumprimento por parte do requerido quanto à entrega da quantia global de € 3.399,00 (três mil trezentos e noventa e nove euros), sendo que entretanto o Requerido pagou a quantia de € 2.429,00 (dois mil quatrocentos e vinte e nove euros), estando em dívida a quantia de € 970,00 (novecentos e setenta euros), entretanto liquidada nos autos;
b) condenar o requerido no pagamento da multa equivalente a 2 (duas) unidades de conta, absolvendo-se o requerido do demais peticionado;
c) reconhecer-se a inviabilidade do cumprimento coercivo das quantias em dívida através do mecanismo previsto no artigo 48º do RGPTC, dando-se, consequentemente, por findo este incidente. Custas pelo Requerido por ter dado azo ao presente incidente. Registe e notifique.”

9.Inconformada, veio de novo (3ª vez) a requerente recorrer da sentença e formulou conclusões, nas quais, no essencial, a requerente colocou as seguintes questões para reapreciação:
A errada valoração e credibilização / descredibilização da prova testemunhal e declarações de parte da Requerente; Ausência de suficiente análise critica quanto a toda a prova documental junta aos autos e errada fundamentação da matéria de facto pelo tribunal; Alteração da decisão sobre a matéria de facto relativa aos pontos respectivamente descritos; Errada aplicação do direito aos factos e aos pedidos de indemnização e condenação como litigante de má-fé formulados; A (falta de) decisão sobre aplicação de juros moratórios.

10.Feita esta descrição da tramitação ocorrida nestes autos, resumindo-se o conteúdo essencial das várias decisões proferidas quer na 1ª instância, quer neste Tribunal da Relação, resulta, antes de mais, que a questão dos juros moratórios a liquidar sobre cada uma das prestações de alimentos vencidas e não pagas, foi decidida definitivamente no 1º acórdão proferido neste tribunal da Relação do Porto, no dia 24.10.2019, pelo que, vale essa decisão que transitou em primeiro lugar, independentemente da 1ª instância, ter indevidamente voltado a apreciar e decidir a questão das prestações de alimentos vencidos e não pagos nas duas novas decisões proferidas nessa instância.

11.Entretanto, oficiosamente este Tribunal da Relação verificou que a mesma factualidade que foi apreciada e decidida na sentença sob recurso nos presentes autos de Incidente de Incumprimento de Regulação das Responsabilidades Parentais instaurados contra BB tinha sido objecto de apreciação e decisão no processo crime que correu termos sob o nº 1846/16.3T9PVZ, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim por acórdão proferido a 2.12.2020 e transitado em julgado no dia 17.12.2020, conforme certidão de trânsito em julgado remetida pelo tribunal da comarca do Porto, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim.
Assim, por despacho proferido nestes a 23.11.2021 foi escrito o seguinte:
“Por virtude do exercício das minhas funções tomei conhecimento que no âmbito do processo crime que correu termos sob o Processo nº 1846/16.3T9PVZ, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim, o aqui apelado, no dia 27.04.2020, o ali arguido, por sentença proferida na 1ª instância foi condenado pela prática do crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo artigo 250º, nºs 1 e 2, do CP, na pena de 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP.
Posteriormente, nesses autos, foi proferido por este tribunal da Relação do Porto, no dia 2.12.2020, 4ª Secção Judicial-2ª Secção Criminal, acórdão, pelo qual, o aqui apelado e ali arguido, foi condenado a indemnizar a aqui autora- recorrente com a importância global de € 5.000,-- (cinco mil euros), acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal, até integral e efetivo pagamento.
E resulta do teor do acórdão ali proferido que os factos em causa e que eram objecto de apreciação traduzem-se na actuação-omissão do arguido, que, não obstante ter possuído meios para o fazer, não pagou, entre Abril/2013 e Dezembro /2017, as prestações de alimentos e as despesas no valor total, de, pelo menos, € 3399,00, a título de capital, devidas ao menor nascido a .../.../2005, filho da aqui requerente, AA, e do aqui requerido, BB.
Esse acórdão apreciou os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela ali demandante/ aqui requerente-recorrente em consequência da verificada omissão de pagamento dos alimentos devidos ao menor no período acima referido.
Resulta assim que tanto naquele processo crime, no qual, foi enxertado pedido cível, como nestes autos, estamos perante o mesmo objeto processual: não pagamento de alimentos devidos ao menor, entre abril/2013 e dezembro /2017, bem como, as despesas no valor total, de, pelo menos, € 399,00, a título de capital.
E na medida em que aquele acórdão já terá transitado em julgado, porque existe uma identidade fundamental entre os factos do processo crime e os factos do presente incidente tutelar cível, tal implicará, de per si, a procedência da exceção dilatória da consunção com a consequente inviabilidade de prosseguimento destes autos, (sendo certo que não pode haver cumulação de responsabilidades resultantes do mesmo facto jurídico, quando tal acarrete duplicação de indemnizações), bem como, a exceção dilatória do caso julgado relativamente aos factos que fundamentam o pedido de indemnização civil.(…)”

12.Esse despacho foi notificado às partes nos termos e para efeitos do disposto no art 3º, nº3 e 655º, ambos do CPC, sendo que a demandante –recorrente, apesar do teor desse despacho, pugna pelo prosseguimento destes autos.
13.Prosseguindo.
Isto posto, resulta que no requerimento inicial de 23.11.2017 do presente processo e na decisão de facto da sentença que é objecto do recurso de apelação interposto a 14.07.2021 foram vertidos factos que revelam o incumprimento por parte do requerido da obrigação de alimentos devidas ao menor nascido a .../.../2005, filho da aqui requerente, AA, e do aqui requerido, BB a que estava obrigado o requerido no período compreendido entre Abril/2013 e Dezembro /2017, bem como da obrigação de pagamento de despesas, sendo as prestações de alimentos e as despesas no valor total, pelo menos, de € 3399,00, a título de capital.
E naquele requerimento inicial de 23.11.2017 foram vertidos factos relativamente a alegados danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela ali demandante/ aqui requerente-recorrente em consequência da verificada omissão de pagamento dos alimentos devidos ao menor no período acima referido.
Ora, conforme já assinalamos, a mesma factualidade foi objecto de apreciação e decisão nos autos de processo que correram termos sob o nº1846/16.3T9PVZ (Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim- Comarca do Porto), onde foi também apreciado e decidido o Pedido de Indemnização Civil ali enxertado e que foi deduzido no dia 16.04.2019, referência 22235756, pela requerente do presente processo de incumprimento das responsabilidades parentais.
Assim, no dia 27.04.2020 foi proferida sentença na 1ª instância (Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim) que decidiu julgar a acusação pública parcialmente procedente em consequência decidiu:
“- Absolver o arguido BB da prática do crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo artigo 250º, nº3, do CP.
- Condenar o arguido BB pela prática do crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo artigo 250º, nºs 1 e 2, do CP, na pena de 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP.
De igual modo, decidiu:- Absolver o demandado BB da instância cível.
Condenando o arguido no pagamento das custas criminais, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC (artigo 513º, nº 1, do CPP, e 8º, nº9, do RCP) e determinando o pagamento das custas na parte civil a cargo da demandante (artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC, ex vi do artigo 523º do CPP).”
Foi interposto recurso da sentença proferida na 1ª instância, cujo objecto prendeu-se com a resolução da seguinte questão: - saber se a assistente, enquanto mãe do menor ofendido num crime de violação da obrigação de alimentos, deve ser considerada lesada nos termos e para os efeitos previstos no art. 74º do Código de Processo Penal e, em caso afirmativo, apurar o montante da indemnização.
E posteriormente, no dia 2 .12.2020, foi proferido douto acórdão na 4ª secção criminal deste Tribunal da Relação do Porto, pelo qual, foi decidido: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes subscritores em conferência e por unanimidade, em julgar provido o recurso da demandante AA e, em consequência:
“a)revogar a absolvição da instância do demandado BB;
b)condenar o demandado a indemnizar a demandante com a importância global de € 5.000,-- (cinco mil euros), acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal, até integral e efetivo pagamento; e
c)absolver o demandado do demais peticionado.
Sem custas na instância do recurso. Custas do enxerto cível a cargo da demandante e do demandado na proporção da respetiva sucumbência. “.
A significar, que ficou provada a ilicitude da actuação do requerido no âmbito do processo crime, no âmbito do qual, foi apreciada e decidida por sentença transitada em julgado o pedido de indemnização civil ali enxertado e que tinha por objeto a mesma realidade factual que é objecto de apreciação e decisão no presente recurso interposto nestes autos.
Desta constatação resulta que estamos perante uma situação de caso julgado material formado por sentença criminal na qual foi apreciado e decidido pedido de indemnização civil baseado na mesma realidade que foi alegada e decidida na sentença que é objecto de recurso nestes autos.
.A questão que está colocada traduz-se, pois, em apreciar e decidir sobre as implicações resultantes do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos de processo crime acima identificados sobre os presentes autos de incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, na parte que já que está em recurso, isto é, na parte que contende com os pedidos de indemnização formulados nas alíneas d) e e) do requerimento inicial.
Sendo que, naturalmente, ninguém pode ser julgado duas vezes pelos mesmos factos ainda que sejam aplicáveis sanções distintas.
E apesar de não ser objecto do presente recurso a pena de multa que foi aplicada ao requerido no âmbito do presente incidente de incumprimento de responsabilidades parentais, sempre se dirá que acolhemos o entendimento de Figueiredo Dias, a propósito, da relação entre o ilícito contra-ordenaçional e o ilícito criminal. Escreve Figueiredo Dias[3].
Ensinamento, que, atentas as circunstâncias descritas, designadamente de unidade de resolução, se nos afigura colher aplicação ao caso, porquanto, nos tipos de ilícito em causa, contraordenacional, no caso previsto no art 41º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, e criminal, no caso previsto no nº 1 do art 250º do Código Penal[4], os bens jurídicos a tutelar são de idêntica natureza, isto é, visa-se a protecção, em primeira linha, do titular do direito a alimentos face ao perigo de não satisfação das necessidades fundamentais, necessidades fundamentais essas que se podem traduzir, no direito a ter alimentos (na verdadeira asserção da palavra), o direito à saúde, o direito a ter uma boa educação, etc.
Analisado aquele tipo legal da contraordenação prevista no art 41º do RGTCC (Lei nº 141/2015, de 8.09) no regime jurídico em análise, não vemos que se destine a tutelar bens jurídicos diversos dos que justificam a consagração do crime previsto no art 250º, nº1 do C. Penal, dirigindo-se, contudo, o primeiro a condutas que põem tais bens jurídicos em causa de forma menos gravosa ou meramente mediata.
Concluimos, portanto, pela verificação de uma relação de consunção entre o tipo legal da contraordenação prevista no art 41º do RGTCC (Lei nº 141/2015, de 8.09) e o crime previsto no art 250º, nº1 do C. Penal. [5]
Avançando.
No tocante ao segmento do acórdão proferido nos autos de processo crime acima identificados que apreciou e decidiu pretensão indemnizatória baseada na mesma realidade factual que é objecto do presente incidente de incumprimento previsto no art 41º do RGPTCC, a operância do caso julgado material formado por esse acórdão arrasta consigo a inviabilidade do prosseguimento dos presentes autos com vista a decidir do recurso interposto, uma vez que deixou de existir fundamento para a condenação autónoma no processo tutelar cível no qual foram formulados pedidos de indemnização civil pela requerente-recorrente.
O trânsito em julgado, conforme decorre claramente do art.º 628.º do CPC, ocorre quando uma decisão é já insusceptível de impugnação por meio de reclamação ou através de recurso ordinário. Verificada tal insusceptibilidade, forma-se caso julgado, que se traduz, portanto, na impossibilidade da decisão proferida ser substituída ou modificada por qualquer tribunal, incluindo aquele que a proferiu.
Assim, diz-nos o artigo 619.º do CPC, que transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele, nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º do CPC.
Regem estes artigos sobre os conceitos e requisitos da litispendência e do caso julgado, que constituem excepções previstas na lei processual civil para evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou reproduzir uma decisão anterior, sendo nesta perspectiva seu pressuposto a repetição da causa pela existência da tríplice identidade nas duas acções: quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
Porém, nem sempre tal tríplice identidade é exigível, importando, desde logo efectuar a distinção entre a excepção de caso julgado e a autoridade de caso julgado, porquanto quando esta funciona e, ainda que não se verifique aquela tríplice identidade, também a autoridade de caso julgado obsta a que se defina de modo diverso situação já anteriormente julgada.
Assim, do caso julgado decorrem dois efeitos essenciais, a saber: a impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida -efeito negativo- e a vinculação do mesmo tribunal e eventualmente de outros, estando em causa o caso julgado material, à decisão proferida - efeito positivo do caso julgado[6].
Efectivamente, conforme doutrina e jurisprudência dominantes, o instituto do caso julgado exerce duas funções: uma função positiva e uma função negativa. Exerce a função positiva quando faz valer a sua força e autoridade, que se traduz na exequibilidade das decisões; e exerce a função negativa quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo mesmo ou por outro tribunal, em decorrência da necessidade da certeza e da segurança nas relações jurídicas. A função negativa exerce-se através da excepção de caso julgado.
Todavia, ocorrendo casos julgados contraditórios, a lei resolve apelando ao critério da anterioridade: vale a decisão contraditória sobre o mesmo objecto que tenha transitado em primeiro lugar (art.º 625.º n.º 1 do CPC), critério operativo ainda quando estejam em causa decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta (vide n.º 2 do preceito).
No caso em apreço, tendo transitado em julgado no dia 17.12.2020 o acórdão desta Relação do Porto proferido a 2.12.2020 nos autos de processo crime que correram termos sob o nº1846/16.3T9PVZ, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim – Tribunal Judicial da Comarca do Porto, acima identificados, o efeito negativo dessa excepção impede que a mesma realidade seja de novo apreciada autonomamente no âmbito deste processo, a implicar a absolvição da instância do aqui requerido-recorrido relativamente aos pedidos formulados nas alíneas d) e e) do requerimento inicial[7]
Ocorre, assim, circunstância que obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
14.Decidindo:
Nestes termos, oficiosamente julgo verificada a excepção dilatória de caso julgado material formado pelo acórdão proferido no dia 2.12.2020, transitado em julgado no dia 17.12.2020 nos autos de processo crime que correram termos sob o nº1846/16.3T9PVZ no Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim – Tribunal Judicial da Comarca do Porto, com a consequente absolvição da instância do requerido no tocante aos pedidos de indemnização formulados nas alíneas d) e e) do requerimento inicial, o que obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
Custas a cargo da requerente-recorrente, no tocante aos pedidos de indemnização vertidos nessas alíneas, quer no tocante ao recurso em apreciação.

Inconformada, a recorrente veio reclamar para a conferência, e, sem elaborar conclusões, alegou, no essencial, o seguinte:
. Foi fixada indemnização, no âmbito do processo crime que correu sob o n.º 1846/16.3T9PVZ, por danos materiais e morais, nos respectivos montantes.
.Todavia, no âmbito dos presentes autos está em causa a fixação de indemnização de índole diversa, porque a efectuar nos termos e para os efeitos do artigo 41.º do RGPTC, em virtude do comprovado incumprimento.
.A recorrente peticiona a condenação do recorrido, com fundamento mais amplo e diverso do que sucedeu nos aludidos autos penais, sendo certo que a indemnização fixada pela instância penal, em nada colide – nem se pode confundir – com a multa a aplicar ao faltoso
. os presentes autos tido o seu início muito antes da Sentença proferida no âmbito do processo crime que correu sob o n.º 1846/16.3T9PVZ, no qual veio a ser produzido acórdão apenas na data de 02/12/2020, caso soçobre a pretensão aqui peticionada pela recorrente, a decisão sobre custas a suportar pela mesma, quer no tocante aos pedidos de indemnização vertidos nas alíneas do respectivo requerimento inicial, quer quanto aos presentes autos recursivos, não devem ser imputados à aqui recorrente, sob pena de se estar a beneficiar o progenitor incumpridor, por se encontrar sobejamente demonstrado ter dado causa ao incidente.
. no momento em que a recorrente iniciou a instância, era absolutamente impossível antever o desfecho dos autos crime, ainda não existentes, sendo certo que só no ano de 2020 veio a ser conhecida decisão transitada em julgado, pela prática do crime de violação da obrigação de alimentos.
.sobre a responsabilidade pelas custas, deve ser atendida a presente reclamação e, consequentemente, ser alterada tal decisão, pois que a recorrente não é responsável, nem deu motivo à tramitação do incidente, cuja instância se iniciou antes de proferido o acórdão no processo crime, o que se requer.
II.CUMPRE DECIDIR.
Começaremos por dizer que na decisão singular reclamada, a relatora, esforçou-se por descrever a os fatos que relevaram para a posição assumida e por justificar a decisão com referência legal e dogmática, a qual, portanto, este Colectivo aqui reitera e faz sua.
Como resulta dessa argumentação, no requerimento inicial de 23.11.2017 do presente processo e na decisão de facto da sentença que é objecto do recurso de apelação interposto a 14.07.2021 foram vertidos factos que revelam o incumprimento por parte do requerido da obrigação de alimentos devidas ao menor nascido a .../.../2005, filho da aqui requerente, AA, e do aqui requerido, BB a que estava obrigado o requerido no período compreendido entre Abril/2013 e Dezembro /2017, bem como da obrigação de pagamento de despesas, sendo as prestações de alimentos e as despesas no valor total, pelo menos, de € 3399,00, a título de capital.
E naquele requerimento inicial de 23.11.2017 foram vertidos factos relativamente a alegados danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela ali demandante/ aqui requerente-recorrente em consequência da verificada omissão de pagamento dos alimentos devidos ao menor no período acima referido.
Nessa sequência pela requerente, ora reclamante foi formulado, entre o mais, o seguinte pedido de indemnização:
“Conclui pedindo que o Requerido seja condenado a pagar à Requerente indemnização pelos prejuízos e danos patrimoniais causados, em valor nunca inferior a € 5.000,00, atendendo à conduta grave e ilícita perpetrada por aquele, de forma repetida e sistemática, assim desconsiderando os interesses do menor e os direitos da Requerente, isto, nos termos do n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC; bem como pelos prejuízos e danos não patrimoniais (morais) causados, em valor nunca inferior a € 5.000,00, atendendo à conduta grave e ilícita perpetrada por aquele de forma repetida, dolosa e sistemática, assim desconsiderando e prejudicando a vida e os interesses do menor e os direitos da Requerente – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC.
Ora, conforme já assinalamos, a mesma factualidade foi objecto de apreciação e decisão nos autos de processo que correram termos sob o nº1846/16.3T9PVZ (Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim- Comarca do Porto), onde foi também apreciado e decidido o Pedido de Indemnização Civil ali enxertado e que foi deduzido no dia 16.04.2019, referência 22235756, pela requerente do presente processo de incumprimento das responsabilidades parentais.
Reproduzimos aqui segmentos desse acórdão, de forma a evidenciar essa identidade:
“1.A demandante deduziu um pedido de indemnização civil contra o demandado BB, no valor global “não inferior a 3.500,--€” por danos patrimoniais e 2.500,--€ para compensar danos não patrimoniais, acrescidos de juros de mora.
2.Efetuado o julgamento, foi proferida a sentença na primeira instância, que terminou com a absolvição da instância cível do demandado, por falta de legitimidade ativa da demandante.
(…)
Assim, no dia 27.04.2020 foi proferida sentença na 1ª instância (Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim) que decidiu julgar a acusação pública parcialmente procedente em consequência decidiu:
“- Absolver o arguido BB da prática do crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo artigo 250º, nº3, do CP.
- Condenar o arguido BB pela prática do crime de violação da obrigação de alimentos, p. e p. pelo artigo 250º, nºs 1 e 2, do CP, na pena de 4 (quatro) meses de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 2 (dois) anos, sujeita a regime de prova a delinear pela DGRSP.
De igual modo, decidiu:- Absolver o demandado BB da instância cível.
Condenando o arguido no pagamento das custas criminais, fixando-se a taxa de justiça em 2 UC (artigo 513º, nº 1, do CPP, e 8º, nº9, do RCP) e determinando o pagamento das custas na parte civil a cargo da demandante (artigo 527º, nºs 1 e 2, do CPC, ex vi do artigo 523º do CPP).”
Foi interposto recurso da sentença proferida na 1ª instância, cujo objecto prendeu-se com a resolução da seguinte questão: - saber se a assistente, enquanto mãe do menor ofendido num crime de violação da obrigação de alimentos, deve ser considerada lesada nos termos e para os efeitos previstos no art. 74º do Código de Processo Penal e, em caso afirmativo, apurar o montante da indemnização.
E posteriormente, no dia 2 .12.2020, foi proferido douto acórdão na 4ª secção criminal deste Tribunal da Relação do Porto, pelo qual, foi decidido: “Nos termos e pelos fundamentos expostos, acordam os juízes subscritores em conferência e por unanimidade, em julgar provido o recurso da demandante AA e, em consequência:
“a)revogar a absolvição da instância do demandado BB;
b)condenar o demandado a indemnizar a demandante com a importância global de € 5.000,-- (cinco mil euros), acrescida de juros de mora vincendos à taxa legal, até integral e efetivo pagamento; e
c)absolver o demandado do demais peticionado.
Sem custas na instância do recurso. Custas do enxerto cível a cargo da demandante e do demandado na proporção da respetiva sucumbência.”.

A significar, que ficou provada a ilicitude da actuação do requerido no processo crime, no âmbito do qual, foi apreciado e decidido por sentença transitada em julgado o pedido de indemnização civil ali enxertado e que, contrariamente ao alegado pela reclamante, tinha por objeto a mesma realidade factual que é objecto de apreciação e decisão no presente recurso interposto nestes autos relativo à decisão da primeira instância que julgou improcedente.
Assim, reproduzimos aqui a factualidade provada no processo crime com base na qual foi o ali arguido condenado em sede de pedido de indemnização civil ali enxertado, bem como algumas considerações ali tecidas:
«7º - Todavia o arguido, não obstante ter possuído meios para o fazer, não pagou, entre Abril/2013 e Dezembro/2017, as prestações de alimentos e as despesas no valor total de, pelo menos, € 3.399,00, a título de capital.
8º - Com efeito o arguido é comproprietário duma moradia de 2 pisos, com garagem, lavandaria, alpendre e logradouro, que adquiriu juntamente com a AA e que foi a casa de morada da família, sita na Rua ..., em ..., imóvel esse descrito na Conservatória do Registo Predial de Vila do Conde sob o nº ... e inscrito na respectiva matriz sob o art. ....
9º - É também comproprietário de vários prédios rústicos e urbanos na qualidade de herdeiro de património indiviso.
10º - O arguido tem trabalhado por conta própria na actividade de decoração de montras e vitrines e tem vindo a auferir do exercício dessa actividade profissional um rendimento mensal não concretamente apurado, não inferior a € 575,00/mensais.
11º - Está colectado no Serviço de Finanças com a actividade principal de Agências de Publicidade desde 2-1-2008, e com as actividades secundárias de Manutenção e Reparação de Veículos Automóveis e Comércio de Veículos Automóveis desde 5-10-2015, encontrando-se enquadrado, para efeitos de IVA, no regime normal trimestral e com contabilidade organizada por opção.
12º - Residiu, pelo menos até meados de 2017, em habitação própria, na referida moradia que adquiriu com a AA.
13º - É proprietário, desde 2011, do veículo da marca Hyundai, de matrícula ..-..-MM.
14º - Tem pelo menos desde 2012 uma aplicação financeira em conta poupança em títulos da dívida pública do IGCP, no montante de € 14.760. 15º - Beneficiou dos juros dessa aplicação, que em 2015 foram no montante de € 259,04 e em 2016 no montante de € 180,80.
16º - Utilizou, para a sua vida e negócios pessoais, pelo menos uma conta que abriu em Maio de 2014 no balcão de ... do Banco ... em nome do filho CC com o nº ..., e que cancelou com saldo nulo em Fevereiro/2017, tendo movimentado em seu proveito próprio, durante esse período de tempo, o montante total de € 63.781,07 nos termos constantes dos extratos de fls. 444v a 462v que aqui se dão por integralmente reproduzidos.
17º - E, conforme resulta desses extratos, o arguido teve sempre disponível verba mensal suficiente para pagar a pensão de alimentos ao menor.
18º - Devido ao não pagamento das pensões de alimentos e demais despesas com o menor, foi-lhe instaurado pela AA, em Março de 2017 e por apenso àquele processo de Regulação das Responsabilidades Parentais, uma execução especial por alimentos, que ainda se encontra pendente.
19º - O menor CC encontra-se, desde 2012, na dependência exclusiva da mãe, a AA, que trabalha desde 1997 como contabilista para a sociedade “P..., Lda.”, na Póvoa de Varzim, onde aufere um rendimento mensal na ordem dos € 1.000.
20º - E, como encargos tem as despesas com a renda da casa, a água, a luz, a alimentação, vestuário e saúde do seu filho e sua, bem como com a educação daquele, e ainda o IMI relativo à casa que tem em compropriedade com o arguido, despendendo mensalmente quantia superior ao seu salário, que é suportada por si e por familiares seus aos quais pede ajuda.
21º - Na verdade, a AA, para fazer face a todas as despesas, tem recorrido, desde 2012, ao auxílio económico dos pais, e é à custa destes que tanto ela como o menor sobrevivem.
22º - O arguido agiu voluntária, livre e conscientemente, com o propósito, conseguido, de se eximir ao pagamento das prestações alimentares que sabe serem-lhe legal e judicialmente exigíveis, e que a sua conduta era proibida e punida por lei.
23º - Para fazer face ao sustento do seu filho menor, a demandante vê-se obrigada a limitar os seus gastos.
24º - O arguido/demandado já levou o seu filho de férias por um número não concretamente apurado de vezes.
25º - Face à conduta do arguido, a demandante vive triste, angustiada, deprimida, humilhada e vexada, designadamente por ter que recorrer ao tribunal.
26º - A demandante instaurou contra o arguido seis incidentes de incumprimento da regulação das responsabilidades parentais relativas à violação do dever de prestação de alimentos, com as consequentes e inerentes deslocações à PSP, escritório do seu mandatário e aos tribunais, o que sucedeu por um número não concretamente apurado de vezes.
27º - A situação descrita em 26º acarretou para a demandante despesas com deslocações, serviços extrajudiciais e honorários de valor não concretamente apurado, bem como um dispêndio de tempo cuja quantificação não foi concretamente apurada.
28º - A conduta do arguido causa à demandante desgosto, indignação, revolta, frustração, ansiedade e agonia.
29º - Por força da conduta do arguido, a demandante fez sacrifícios económicos e viu-se obrigada a despender quantias não concretamente apuradas para suprir a falta de pagamentos por parte do arguido.
30º - Em virtude da sua conduta, a demandante foi afectada na sua paz e tranquilidade.
(…)
“Reconhece-se, ainda, a estreita conexão entre a omissão do pagamento da prestação de alimentos e os danos da demandante - tão estreita que aquela foi causa adequada destes e estes consequência também adequada daqueles -: como o demandado bem sabia, no caso de não pagar a prestação de alimentos ao seu filho, seria forçosamente a demandante, enquanto progenitora deste, por força da lei e das regras da experiência comum, a suportar com sacrifício o encargo acrescido com o sustento e as demais despesas correntes do alimentando.
Daqui resulta, inelutavelmente, que a obrigação de prestar alimentos é conjunta e, no caso do obrigado à prestação alimentar faltar totalmente com a sua obrigação, recai sobre o outro progenitor assegurar na íntegra o sustento, a segurança, a saúde e educação do filho.
Revertendo para o caso concreto, o menor alimentando ficou à guarda da mãe – a demandante e ora recorrente – e o arguido demandado ficou obrigado a contribuir a título de alimentos devidos ao seu filho com uma determinada quantia mensal e metade das despesas escolares, médicas e medicamentosas.
Todavia, não obstante ter possuído meios para o fazer, o arguido não pagou entre Abril de 2013 e Dezembro de 2017 as prestações de alimentos e as despesas no valor total de, pelo menos, € 3.399,00.
Não há quaisquer dúvidas em identificar o menor alimentando como credor de tal importância, tal como está subjacente à fundamentação da decisão recorrida.
Porém, sendo a obrigação conjunta, resulta também inequívoco que uma violação da obrigação de prestar alimentos por parte do pai do menor sobrecarrega diretamente a mãe do menor não só com despesas acrescidas, pois a mesma passa a ter de assegurar sozinha o sustento, a segurança, a saúde e a educação do filho, com os inerentes "danos patrimoniais" e "danos não patrimoniais".
Tais danos são, pois, diretamente emergentes da prática do crime para a demandante – e acentuados, "in casu", pela precaridade económica da demandante e a duração de cerca de quatro anos e seis meses da violação da obrigação da prestação de alimentos por parte do progenitor do filho»
Nos termos do artigo 563º do Código Civil, a obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que a lesada provavelmente não teria sofrido, se não fosse a lesão»

.Desta constatação resulta que estamos perante uma situação de caso julgado material formado por sentença criminal na qual foi apreciado e decidido pedido de indemnização civil baseado na mesma realidade que foi alegada e decidida na sentença que é objecto de recurso nestes autos.
.A questão que está colocada traduz-se, pois, em apreciar e decidir sobre as implicações resultantes do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos de processo crime acima identificados sobre os presentes autos de incidente de incumprimento das responsabilidades parentais, na parte que está em recurso, isto é, na parte que contende com os pedidos de indemnização formulados nas alíneas d) e e) do requerimento inicial.
Sendo que, naturalmente, ninguém pode ser julgado duas vezes pelos mesmos factos ainda que sejam aplicáveis sanções distintas.
E apesar de não ser objecto do presente recurso a pena de multa que foi aplicada ao requerido no âmbito do presente incidente de incumprimento de responsabilidades parentais, uma vez que nessa parte, a sentença da 1ª instância não foi impugnada, sempre se dirá que acolhemos o entendimento de Figueiredo Dias[8], a propósito, da relação entre o ilícito contra-ordenacional e o ilícito criminal .
Ensinamento, que, atentas as circunstâncias descritas, designadamente de unidade de resolução, se nos afigura colher aplicação ao caso, porquanto, nos tipos de ilícito em causa, contraordenacional, no caso previsto no art 41º do Regime Geral do Processo Tutelar Cível, e criminal, no caso previsto no nº 1 do art 250º do Código Penal, os bens jurídicos a tutelar são de idêntica natureza, isto é, visa-se a protecção, em primeira linha, do titular do direito a alimentos face ao perigo de não satisfação das necessidades fundamentais, necessidades fundamentais essas que se podem traduzir, no direito a ter alimentos (na verdadeira asserção da palavra), o direito à saúde, o direito a ter uma boa educação, etc.
Analisado aquele tipo legal da contraordenação prevista no art 41º do RGTCC (Lei nº 141/2015, de 8.09) no regime jurídico em análise, não vemos que se destine a tutelar bens jurídicos diversos dos que justificam a consagração do crime previsto no art 250º, nº1 do C. Penal, dirigindo-se, contudo, o primeiro a condutas que põem tais bens jurídicos em causa de forma menos gravosa ou meramente mediata.
Concluimos, portanto, pela verificação de uma relação de consunção entre o tipo legal da contraordenação prevista no art 41º do RGTCC (Lei nº 141/2015, de 8.09) e o crime previsto no art 250º, nº1 do C. Penal.
Avançando.
No tocante ao segmento do acórdão proferido nos autos de processo crime acima identificados que apreciou e decidiu pretensão indemnizatória baseada na mesma realidade factual que é objecto do presente incidente de incumprimento previsto no art 41º do RGPTCC, a operância do caso julgado material formado por esse acórdão arrasta consigo a inviabilidade do prosseguimento dos presentes autos com vista a decidir do recurso interposto, uma vez que deixou de existir fundamento para a condenação autónoma no processo tutelar cível no qual foram formulados pedidos de indemnização civil pela requerente-recorrente.
O trânsito em julgado, conforme decorre claramente do art.º 628.º do CPC, ocorre quando uma decisão é já insusceptível de impugnação por meio de reclamação ou através de recurso ordinário. Verificada tal insusceptibilidade, forma-se caso julgado, que se traduz, portanto, na impossibilidade da decisão proferida ser substituída ou modificada por qualquer tribunal, incluindo aquele que a proferiu.
Assim, diz-nos o artigo 619.º do CPC, que transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele, nos limites fixados pelos artigos 580.º e 581.º do CPC.
Regem estes artigos sobre os conceitos e requisitos da litispendência e do caso julgado, que constituem excepções previstas na lei processual civil para evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou reproduzir uma decisão anterior, sendo nesta perspectiva seu pressuposto a repetição da causa pela existência da tríplice identidade nas duas acções: quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
Porém, nem sempre tal tríplice identidade é exigível, importando, desde logo efectuar a distinção entre a excepção de caso julgado e a autoridade de caso julgado, porquanto quando esta funciona e, ainda que não se verifique aquela tríplice identidade, também a autoridade de caso julgado obsta a que se defina de modo diverso situação já anteriormente julgada.
Assim, do caso julgado decorrem dois efeitos essenciais, a saber: a impossibilidade de qualquer tribunal, incluindo o que proferiu a decisão, voltar a emitir pronúncia sobre a questão decidida -efeito negativo- e a vinculação do mesmo tribunal e eventualmente de outros, estando em causa o caso julgado material, à decisão proferida - efeito positivo do caso julgado.
Efectivamente, conforme doutrina e jurisprudência dominantes, o instituto do caso julgado exerce duas funções: uma função positiva e uma função negativa. Exerce a função positiva quando faz valer a sua força e autoridade, que se traduz na exequibilidade das decisões; e exerce a função negativa quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo mesmo ou por outro tribunal, em decorrência da necessidade da certeza e da segurança nas relações jurídicas. A função negativa exerce-se através da excepção de caso julgado.
Todavia, ocorrendo casos julgados contraditórios, a lei resolve apelando ao critério da anterioridade: vale a decisão contraditória sobre o mesmo objecto que tenha transitado em primeiro lugar (art.º 625.º n.º 1 do CPC), critério operativo ainda quando estejam em causa decisões que, dentro do mesmo processo, versem sobre a mesma questão concreta (vide n.º 2 do preceito).
No caso em apreço, tendo transitado em julgado no dia 17.12.2020 o acórdão desta Relação do Porto proferido a 2.12.2020 nos autos de processo crime que correram termos sob o nº1846/16.3T9PVZ, Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim – Tribunal Judicial da Comarca do Porto, acima identificados, o efeito negativo dessa excepção impede que a mesma realidade seja de novo apreciada autonomamente no âmbito deste processo, a implicar a absolvição da instância do aqui requerido-recorrido relativamente aos pedidos formulados nas alíneas d) e e) do requerimento inicial.
Assim, carece de razão a reclamante quando alega que a indemnização a fixar nestes autos será de índole diversa, daquela que foi fixada no âmbito do enxerto cível do processo crime.
Pelo contrário. A fixação da indemnização rege-se nos termos dos artigos 562 ºe ss do C.Civil e o pedido de indemnização formulado pela recorrente refere-se aos mesmos factos e não tem fundamento mais amplo do que aquela que foi fixada no processo crime, sendo certo que a recorrente formulou o pedido de indemnização em nome próprio e em seu benefício por danos por si sofridos.
Assim:
Resulta do teor do acórdão proferido nos autos de processo – crime acima identificados que os factos em causa e que eram objecto de apreciação traduzem-se na actuação-omissão do arguido, que, não obstante ter possuído meios para o fazer, não pagou, entre Abril/2013 e Dezembro /2017, as prestações de alimentos e as despesas no valor total, de, pelo menos, € 3399,00, a título de capital, devidas ao menor nascido a .../.../2005, filho da aqui requerente, AA, e do aqui requerido, BB.
Esse acórdão apreciou os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pela ali demandante/ aqui requerente-recorrente em consequência da verificada omissão de pagamento dos alimentos devidos ao menor no período acima referido.
Resulta assim que tanto naquele processo crime, no qual, foi enxertado pedido cível, como nestes autos, estamos perante o mesmo objeto processual: não pagamento de alimentos devidos ao menor, entre abril/2013 e dezembro /2017, bem como, as despesas no valor total, de, pelo menos, € 399,00, a título de capital.
E na medida em que aquele acórdão transitou em julgado, porque existe uma identidade fundamental entre os factos do processo crime e os factos do presente incidente tutelar cível, tal implica, de per si, a verificação da exceção dilatória do caso julgado relativamente aos factos que fundamentam o pedido de indemnização civil.
Concluímos assim que improcedem os argumentos apresentados pela reclamante.

.No tocante às custas alega a reclamante que caso soçobre a pretensão aqui peticionada pela recorrente, a decisão sobre custas a suportar pela mesma, quer no tocante aos pedidos de indemnização vertidos nas alíneas do respectivo requerimento inicial, quer quanto aos presentes autos recursivos, não devem ser imputados à aqui recorrente, sob pena de se estar a beneficiar o progenitor incumpridor, por se encontrar sobejamente demonstrado ter dado causa ao incidente.
Apreciando e decidindo:
Nesta parte, como resulta do relatório elaborado o incidente de incumprimento instaurado nos termos do art 41º do RGPTC foi apresentado no dia 23.11.2017.
O pedido de indemnização civil enxertado nos autos de processo crime que correram termos sob o nº 1846716.3T9PVZ, acima identificados, foi deduzido no dia 16.04.2019 pela requerente do presente processo de incumprimento das responsabilidades parentais, o qual, tinha por causa de pedir a mesma factualidade que foi alegada no pedido de indemnização formulado pela requerente no presente incidente.
A significar que a requerente tinha o dever de revelar ao tribunal de comarca e a este tribunal da Relação a pendência desse enxerto cível no qual era alegada a mesma factualidade que alegou nestes autos, o que, não fez.
E que tinha ainda o dever de informar este tribunal sobre o trânsito em julgado do acórdão desta Relação do Porto proferido nos autos de processo que correram termos sob o nº 1846/16.3T9PVZ, atrás identificados, o que, também não fez, tanto mais, que foi por este tribunal informada que oficiosamente tomamos conhecimento dessa realidade e, apesar disso, continuou a pugnar pela não verificação de uma situação de caso julgado impeditiva do prosseguimento dos autos de recurso, posição que mantém, como resulta da reclamação em apreço.
Feitas estas considerações resulta para nós, considerando o resultado alcançado (absolvição da instância do requerido por operância do caso julgado material) e o critério da causalidade em sede de imputação da responsabilidade pelas custas vertido no art 527º do CPC que aquele resultado foi decorrência da actuação da ora reclamante que deduziu em duas instâncias dois pedidos de indemnizações civil com fundamento na mesma factualidade.
Assim, a reclamante deveria ter informado o tribunal de comarca, bem como este tribunal da Relação do Porto da pendência de dois processos que tinham por objecto a mesma factualidade, sendo que a última sentença foi proferida na comarca no dia 19.06.2021 (cerca de 7 meses depois do trânsito em julgado da sentença proferida nos autos de processo crime) e a recorrente nada comunicou a este tribunal.
A significar que não merece acolhimento a discordância da reclamante relativamente às custas fixadas na decisão singular.
E deve a reclamante ser responsabilizada pelas custas desta reclamação.
Sumário.
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III. DISPOSITIVO:
Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto, em conferência, em confirmar a decisão sumária da Relatora, pela qual, oficiosamente julgou-se verificada a excepção dilatória de caso julgado material formado pelo acórdão proferido no dia 2.12.2020, transitado em julgado no dia 17.12.2020 nos autos de processo crime que correram termos sob o nº1846/16.3T9PVZ no Juízo Local Criminal da Póvoa de Varzim – Tribunal Judicial da Comarca do Porto, com a consequente absolvição da instância do requerido no tocante aos pedidos de indemnização formulados nas alíneas d) e e) do requerimento inicial, o que obsta ao conhecimento do objecto do recurso.
Custas do incidente da reclamação pela requerente com 3 UC´s de taxa de justiça.

Porto, 7.4.2022
Francisca Mota Vieira
Paulo Dias da Silva
Isabel Silva
______________
[1] E as questões jurídicas suscitadas no recurso são as seguintes:
A primeira questão consiste em saber se o tribunal a quo deveria ter condenado o requerido ao pagamento dos juros de mora, computados à taxa legal, desde a data de vencimento de cada uma das prestações vencidas e de cada interpelação efectuada para pagamento das despesas pagas pela recorrente no que toca à educação, livros e material escolar e despesas médicas e medicamentas.
A segunda questão traduz-se em decidir se dos factos dados como provados se conclui que o requerido deve ser condenado a pagar à requerente indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados.
A terceira questão consiste em saber se dos factos dados como provados se conclui que o requerido deve ser condenado como litigante de má –fé a pagar à requerente indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais causados.
[2] Porque releva, reproduz-se aqui o que a propósito dos juros de mora de mora se escreveu nesse acórdão:
“No que concerne à primeira questão, os factos que relevam não foram impugnados.
E porque afinal, trata-se de decidir questão relativa ao vencimento de juros de mora, questão que é autónoma das restantes questões colocadas neste recurso e para não prejudicar as partes decidimos tomar já posição.
É manifesto, em face da factualidade apurada e não impugnada que o progenitor incumpriu o regime das responsabilidades parentais no que toca ao pagamento de prestações alimentícias.
Todavia, não acolhemos o entendimento do tribunal recorrido quando afirma: “ No entanto, já o mesmo não se diga quanto aos peticionados juros de mora pois que não resulta provado que tenha sido acordado que o pagamento ou a falta de pagamento das prestações alimentícias venceriam juros legais.”
Nesta parte, assiste razão à Recorrente.
Configurando-se as prestações alimentícias como obrigações de prazo certo, existe mora independentemente de interpelação, art.º 805, n.º 2, al.a), do CC, constituindo o devedor na obrigação de indemnizar, art.º 804, n.º1, obrigação essa que corresponde aos juros a contar do dia da constituição em mora, à taxa legal, art.º 806, n.º1 e 2, todos do CC, pelo que, são devidos juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento de cada uma das prestações, até integral pagamento.
Assim, procede nesta parte o recurso de apelação, pelo que, a sentença recorrida na parte em que decidiu “ a)reconhecer a existência de incumprimento por parte do requerido quanto à entrega da quantia global de € 3.399,00 (três mil trezentos e noventa e nove euros), sendo que entretanto o Requerido pagou a quantia de € 2.429,00 (dois mil quatrocentos e vinte e nove euros), estando em dívida a quantia de € 970,00 (novecentos e setenta euros), deve ser alterada, por outra decisão que decida reconhecer a existência de incumprimento por parte do requerido quanto à entrega da quantia global de € 3.399,00 (três mil trezentos e noventa e nove euros), acrescida do pagamento dos juros moratórios, à taxa legal, desde o vencimento de cada uma das prestações não pagas, até integral pagamento, sendo que entretanto o Requerido pagou a quantia de € 2.429,00 (dois mil quatrocentos e vinte e nove euros), estando em dívida a quantia de € 970,00 (novecentos e setenta euros).”
[3] «Da circunstância de a um concreto comportamento ser em abstrato aplicável uma pluralidade de normas incriminadoras não pode concluir-se, sem mais, estarmos perante um concurso de factos puníveis. Importa, antes de tudo, determinar se as normas abstratamente aplicáveis se encontram numa relação lógico-jurídica tal (numa relação poderia dizer-se de “lógica hierárquica”) que, em verdade, apenas uma delas ou algumas delas são aplicáveis, excluindo a aplicação desta ou destas normas (prevalecentes) a aplicação da ou das restantes normas (preteridas); pela razão que à luz da(s) norma(s) prevalecente(s) se pode já avaliar de forma esgotante o conteúdo de ilícito (e de culpa) do comportamento global.» - [cf. Direito Penal, Parte Geral, I, 2.ª ed., p. 992 §1].
[4] Dispõe o artigo 250.º sob a epígrafe “Violação da obrigação de alimentos”
1 - Quem, estando legalmente obrigado a prestar alimentos e em condições de o fazer, não cumprir a obrigação, pondo em perigo a satisfação, sem auxílio de terceiro, das necessidades fundamentais de quem a eles tem direito, é punido com pena de prisão até 2 anos ou com pena de multa até 240 dias.
[5] De facto, parece-nos dificilmente sustentável que, verificado o condicionalismo apurado – de tempo, de lugar, de unidade de ação e de resolução -, incumprindo o sujeito a obrigação de prestar alimentos a filho menor, venha a sofrer condenação em simultâneo por uma contraordenação e por um crime que tutelam o mesmo bem jurídico.
[6] Na lição do Prof. Alberto dos Reis, no seu CPC anotado, vol. III, Reimpressão, págs. 92-93, o caso julgado exerce uma função positiva, quando faz valer a sua força e a0utoridade (princípio da exequibilidade), e uma função negativa, quando impede que a mesma causa seja novamente apreciada pelo tribunal.
[7] Reproduzimos aqui os pedidos formulados nessas alíneas:
d)Face à conduta GRAVE e ILEGAL perpetrada pelo Requerido, considere provado o incumprimento culposo da regulação do poder paternal, e, para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC, seja o Requerido condenado a pagar à Requerente indemnização a título dos danos patrimoniais causados, não inferior a € 5.000,00 – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC;
e)Mais requer a V.ª Ex.ª, em face da conduta GRAVE e ILEGAL perpetrada pelo Requerido, considere provado o incumprimento culposo da regulação do poder paternal, e, para cumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 41.º indemnização a título dos danos não patrimoniais não inferior a € 5.000,00 – n.º 1 do artigo 41.º do RGPTC;
[8] Escreve este autor: «Da circunstância de a um concreto comportamento ser em abstrato aplicável uma pluralidade de normas incriminadoras não pode concluir-se, sem mais, estarmos perante um concurso de factos puníveis. Importa, antes de tudo, determinar se as normas abstratamente aplicáveis se encontram numa relação lógico-jurídica tal (numa relação poderia dizer-se de “lógica hierárquica”) que, em verdade, apenas uma delas ou algumas delas são aplicáveis, excluindo a aplicação desta ou destas normas (prevalecentes) a aplicação da ou das restantes normas (preteridas); pela razão que à luz da(s) norma(s) prevalecente(s) se pode já avaliar de forma esgotante o conteúdo de ilícito (e de culpa) do comportamento global.» - [cf. Direito Penal, Parte Geral, I, 2.ª ed., p. 992 §1].»