Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
67/05.5TMMTS-O.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MADEIRA PINTO
Descritores: EMBARGOS DE EXECUTADO
COMPENSAÇÃO DE CRÉDITOS
OBRIGAÇÃO CONJUNTA
Nº do Documento: RP2018071167/05.5TMMTS-O.P1
Data do Acordão: 07/11/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 141, FLS 237-250)
Área Temática: .
Sumário: I - A jurisprudência maioritária do STJ é no sentido de que a indicação dos concretos meios de prova em que assenta a impugnação da matéria de facto pode apenas constar do corpo das alegações de recurso e não constarem integralmente nas conclusões recursivas, exigindo-se que nestas constem os demais ónus expressos naquela norma legal, já que é por elas que se delimita o âmbito do recurso – nº 4 do artº 635º do NCPC- uma vez que a intervenção do Tribunal da Relação não é nessa parte oficiosa.
II - Constituindo a compensação um facto extintivo (total ou parcial) da obrigação, pode ser invocada como fundamento de oposição a execução que se fundamente (como acontece no caso sub judice) em sentença, por força do disposto na alínea h), do artº 729º NCPC, norma aditada à redacção da anterior norma do artº 814º CPC, dirimindo a querela doutrinária e jurisprudencial antes existente.
III - Pela própria natureza dos embargos de executado caso se trate de execução de sentença para pagamento de quantia certa e por força dos princípios da preclusão e da concentração da defesa na contestação, entendemos que há uma ressalva essencial a fazer: a invocação da compensação do contra crédito do executado sobre a exequente apenas pode ser fundamento de embargos de executado e neles ser conhecido e reconhecido, sem que o tivesse sido antes em acção declarativa, se esse contra crédito for superveniente em relação à acção declarativa
IV - O benefício da divisão caracteriza e diferencia as obrigações correntemente designadas por conjuntas, das obrigações solidárias. Ao contrário destas, nas obrigações conjuntas cada devedor só é responsável, perante o credor, pela quota parte da obrigação que lhe corresponde e somente ao devedor solidário que pagou mais do que correspondia à sua real quota (nas relações internas entre devedores) é que é consagrado direito de regresso em termos gerais nos termos do artº 524º e 516º e em certas situações específicas, vg artºs 507º e 497º, nº 2, CC.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 67/05.5TMMTS-O.P1
Relator: Madeira Pinto
Adjuntos: Carlos Portela
José Manuel Araújo de Barros
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Sumário:
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1-RELATÓRIO:
B..., em 19.06.2014, por apenso, veio deduzir a presente oposição mediante embargos de executado à execução para pagamento de quantia certa com base em sentença homologatória da partilha, transitada em julgado, no processo de inventário subsequente ao seu divórcio, que constitui o processo principal, em que é exequente a ex-mulher C..., alegando, em suma, que, não obstante de acordo com o mapa de partilha homologado por sentença, a exequente ser credora de tornas sobre o embargante no montante de € 123.925,00, devem ser julgados procedentes os embargos e levantada a penhora efectuado e extinta a execução por via de compensação de contra crédito seu sobre a exequente no valor de € 231.807,74, resultante da meação desta no passivo da responsabilidade do ex-casal que o embargante pagou a terceiros com património seu, após a partilha.
No que concerne à penhora, considera que a concretização da penhora da expectativa de aquisição de imóvel sito em Matosinhos, ao qual o Sr. Agente de Execução atribuiu o valor de € 350.000,00, garante completamente o crédito da exequente, em caso de improcedência da oposição.
A exequente/embargada veio apresentar a sua contestação, alegando incumprimentos vários do executado e a inadmissibilidade legal do requerimento de embargos de executado, pugnando pela rejeição da oposição por falta de legitimidade processual. Por considerar que o executado litiga com má fé, requereu a sua condenação como tal, em montante não inferior a € 2.000,00 acrescido do montante devido a título de honorários. Pede que se julgue improcedente a oposição, devendo ser proferida decisão que mantenha a penhora realizada até cumprimento integral da dívida exequenda.
O executado respondeu, reforçando os mesmos fundamentos de facto e direito vertidos no requerimento inicial.
Foi proferido despacho em 11.01.2016, que admitiu liminarmente os embargos de executado, aproveitando a contestação aos mesmos já antes deduzida, que transitou em julgado (formal).
Não foi realizada audiência prévia, nem foram proferidos despacho que a dispensasse, despacho saneador, despacho a identificar o objecto do litígio e a enunciar os temas da prova, nos termos dos artºs 592º a 596º do NCPC.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento da causa com inquirição de testemunhas e depoimentos de parte, tendo sido concluída com as alegações orais dos ilustres mandatários das partes e como consta das respectivas actas[1].
Foi proferida sentença em 05.06.2017 que, além do mais, rejeitou os denominados articulados supervenientes apresentados pela exequente em fls 123 ss e em fls 540 ss, indeferiu o pedido de suspensão da instância formulado pela exequente, julgou as partes legítimas e decidiu julgar procedente a oposição à execução e à penhora e, em consequência, determinou a extinção da execução;
Absolveu o executado do pedido de condenação por litigância de má fé, formulado pela exequente.
E determinou o imediato levantamento das penhoras realizadas pelo Agente de Execução.
Para tal fundou-se na seguinte FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO:
Da discussão da causa resultaram provados os seguintes factos, com interesse para a discussão:
1. De acordo com o Mapa de Partilha organizado nos autos de Inventário a que estes se mostram apensos, competiria ao Executado e Interessado B... dar tornas à Exequente e Interessada C..., no montante apurado de 123.925,00 €.
2. No mapa informativo de fls... daqueles autos de Inventário com a referência 682862 fez-se a demonstração do total dos bens a partilhar entre os Interessados, que somavam a quantia de 473.048,66 € e fez-se também a demonstração do passivo no montante de 463.615,48 €.
3. Constando igualmente estes valores, quer os do activo, quer os do passivo no próprio Mapa de Partilha.
4. O passivo supra relacionado, no montante de 473.048,66 €, foi por ambos os Interessados (Exequente e o Executado) aprovado na conferência de Interessados que teve lugar no dia 05/03/2009, a fls... dos autos de Inventário, com a referência 484910.
5. Tal passivo dizia respeito a uma dívida de ambos os Interessados à mãe da Exequente, D..., no montante aprovado de 180.370,22 €.
6. E ainda uma dívida de ambos os Interessados ao E..., credor reclamante a fls. 514 dos autos, no montante de 283.245,26 €.
7. No decurso dos autos de Inventário o Executado B... procedeu à liquidação total da dívida à credora D....
8. E procedeu à liquidação total daquela dívida para evitar a venda dos bens penhorados ao ex-casal (Exequente e Executado), nomeadamente da expectativa de aquisição do bem imóvel que agora foi penhorado pela Exequente, liquidação essa que teve lugar nos autos de execução nº 2864/06.5TBMTS-C, 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos.
9. Tal liquidação foi efectuada com valores penhorados no vencimento do Executado, no montante de 86.869,98 € e ainda do valor de 66.000,00 € transferido no dia 12/11/2010, para a conta do Sr. Solicitador de Execução, F....
10. A dívida relativa ao credor E..., no valor de 283.245,26 € foi integralmente liquidada com património pessoal do Cabeça-de-casal, ora Executado, nomeadamente, através da venda judicial da sua casa própria que aquele credor tinha penhorado nos autos de execução nº 2294/05.6TBAMT instaurada contra o Cabeça-de-casal e a Interessada C..., autos que correram seus termos pelo 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Amarante.
11. Tal casa penhorada ao Cabeça-de-casal, ora Executado, foi vendida pelo preço total de 332.100,00 €, tendo ainda sido necessário depositar a quantia de 16.580,00 € que o Cabeça-de-casal entregou ao E... para concluir o pagamento da quantia exequenda e juros e assim tornar extinta a execução.
12. Nos termos do Mapa de Partilha organizado nos autos de Inventário, a responsabilidade por aquele passivo era de metade para cada um dos Interessados (Exequente e Executado).
13. Ou seja, competia metade à Exequente C..., no montante de 231.807,74 €, sendo esse montante a sua responsabilidade no passivo aprovado, conforme resulta do Mapa de Partilha.
14. E a outra metade, no montante de 231.807,74 € da responsabilidade do Executado.
15. É do conhecimento da Exequente, C... que todo o passivo, incluindo o que lhe pertencia a si assumir, se encontra totalmente liquidado pelo Executado.
16. A Exequente tomou conhecimento do desfecho do processo executivo nº 2294/05.6TBAMT, instaurado contra o ex-casal pelo E..., tendo inclusivamente, sido notificada pelo solicitador de execução da extinção da execução pelo seu pagamento.
17. A exequente sabe que é responsável pelo pagamento de metade do passivo que aprovou, no montante de € 231.807,74, conforme está estabelecido no Mapa de Partilha.
18. As tornas que cabem à Exequente, ascendem ao montante de 123.925,00 €.
19. Tem o Executado de receber da Exequente o valor do passivo que competia à mesma, e que liquidou à sua custa, no montante de 231.807,74 €.
20. Já nos autos de Inventário, o Executado manifestou perante a Exequente a sua vontade de ver compensado o seu crédito sobre o crédito da Exequente.
21. O que fez através de requerimento dirigido aos autos e em sede de alegações de recurso de Agravo que se encontram apensas ao processo de Inventário.
22. O Sr. Agente de Execução procedeu à penhora ao Executado "do direito à posição contratual referente ao contrato promessa de compra e venda relativo ao imóvel designado pela letra "D", correspondente a uma habitação no 1º andar direito, com entradas pela Avª. ..., .. e Rua ..., .., Matosinhos.
23. O Sr. Agente de Execução deu ao valor do direito penhorado a quantia de 350.000,00 €.
24. Aquela expectativa de aquisição foi adjudicada no inventário ao Executado, por tê-la licitado, no valor de 260.000,00 € na conferência de interessados.
25. Sendo aquela expectativa de aquisição o bem de maior valor da relação de bens do inventário.
26. E sendo, sobretudo, por causa da sua licitação pelo Executado que redundou no pagamento de tornas à Exequente.
27. Tal penhora foi efectuada sem citação prévia do Executado.
28. Em Março de 2006, por forma a concretizar a escritura e receber o que lhe era devido, a RAR informou através de carta registada o Ilustre Mandatário da exequente, que o direito arrestado é susceptível de se extinguir durante a pendência do arresto. 29. A exequente tem ainda acções em curso para reaver quantias que, no seu parecer, o património comum ainda lhe é devedor.
30. O executado dirigiu requerimento ao Sr. Agente de Execução, no qual se opôs às diligências de penhora.
31. Para a expectativa de aquisição do imóvel referido em 21), foi celebrada promessa de compra e venda que exequente e executado concretizaram em 2002 e, pelo menos desde 2006 que o executado se recusou a realizar o registo deste bem em nome dos promitentes adquirentes.
32. Apartamento, esse, pronto a habitar e escriturar pelo menos desde o dia 11 de Agosto de 2005.
33. Escritura que esteve agendada, pelo menos, três vezes para ser realizada, mas o executado não compareceu em nenhuma dessas datas.
Não se provou que:
1) Facto 10º da contestação (fls. 50) no segmento de atribuição de culpa exclusiva, ao executado;
2) Subsistem ónus e dívidas inerentes à falta de registo da fracção referida em 22) dos factos assentes.
3) Era sua intenção realizar tal escritura não para o casal, mas para uma sociedade do extinto casal, onde uma quota-parte da meação paga por estes, seria gratuitamente adquirida pela sociedade.
4) Com o seu articulado, o executado mais uma vez alterou intencionalmente a verdade dos factos relevantes para a decisão da causa, fazendo do processo e dos meios processuais um uso manifestamente reprovável, com o fim de conseguir um objectivo ilegal, através de novos expedientes dilatórios.
Não se responde à matéria vertida nos arts. 1, 10, 14, 21, 23, 24, 25, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 47, 48 e 54 do requerimento inicial e arts. 1, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9 a partir de “… e, sobretudo a faculdade…” até final, 10, 15, 16, 17, 18, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 31, 32, 33, 34, 35 e 37 da contestação, bem como as 4 questões prévias arguidas, por se tratar de matéria de carácter eminentemente impugnatório, e/ou conclusivo, e/ou de direito, meramente repetida ou apenas sem pertinência à discussão (de que se salientam os alegados incumprimentos no âmbito do exercício das responsabilidades parentais).
Desta decisão foi interposto recurso pelo embargante, tendo formulado as seguintes conclusões:
A) A decisão da matéria de facto que deu como provados os factos vertidos sob os nºs 7, 8, 9, 10, 11, 15 e 19 viola os elementares princípios da prova, nomeadamente quanto àqueles em que só é admissível a sua prova por documento ou confissão, pelo que não podiam ter sido dados como provados como foram; ou
B) Pelo menos não podiam ter sido dados como provados seja em todo o conteúdo e termos em que o foram, ou porque contraditados por prova documental existente nos autos ou porque não suportados por qualquer prova testemunhal ou depoimentos que não lhes dê crédito.
ASSIM,
C) O facto constante no n.º 7 não pode ser dado como provado porque não existe nos autos um único documento ou documentos de que resulte a prova desse facto, o qual de resto não pode ser dado como provado com base na prova testemunhal.
D) Porquanto dos documentos juntos pelo próprio Executado na Oposição como Docs. 1, 2 e 3, resulta apenas que na acção de execução em causa foi penhorado um valor de 86.869,98 € de vencimentos do Executado até 31 Out. 2010 e que no dia 12 Nov 2010, o Executado transferiu 66.000,00 € para a conta do Sr. AE.
E) Ora, mesmo fazendo equivaler o crédito exequendo da credora D..., nessa execução ao valor aprovado em sede de conferência de interessados, resulta que os alegados pagamentos pelo Executado apenas perfazem 152.870,00 €, e não o valor aprovado de 180.37022 €, o que é muito diferente!
F) Acresce que logo nos itens 10º e 11º da oposição à execução e à penhora, que aqui se dão por reproduzidos, o próprio Executado CONFESSOU que afinal não procedeu ao pagamento da totalidade da dívida à credora D....
G) Por isso também não é possível dar como provado o segmento do item 8 dos factos provados quando diz “E procedeu à liquidação total daquela dívida…”, bem como o item 9. dos mesmos que ambos se impugnam face à prova resultante daqueles documentos.
H) Relativamente à matéria dos factos 7., 8. e 9. apenas se aceita que seja dado como provado, o que resulta resultar dos Docs. 1, 2 e 3 juntos pelo Executado na oposição à execução, que:
a) A credora D..., instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra a Exequente e o Executado, que correu termos sob o n.º 2864/06.5TBMTS-C do 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos;
b) No âmbito desses autos, foi penhorado o valor de 86.869,98 € do vencimento do Executado B..., até 31 de Outubro de 2010;
c) Que no dia 12/11/2010, o Executado B... efectuou transferência de 66.000,00 € para a conta do Agente do Execução do processo, F...;
d) No citado processo judicial foi também penhorado bem comum do extinto casal, nomeadamente o direito/expectativa de aquisição do bem imóvel que foi agora penhorado pela Exequente.
I) E se tal matéria não resulta da prova documental, também não resulta sequer da prova testemunhal, bem pelo contrário, como resulta da passagem entre os 05:46m a 08:29m da gravação referente à testemunha G..., filha do Executado, do depoimento da Exequente entre 19:18m e 21.42m, e ainda do depoimento do Executado entre 7:16m e 9:01m. e ainda entre 40:46m e 43:16m.
J) Portanto, ao ter dado como provado o constante nos itens 7., 8., e 9. dos factos provados, o Tribunal a quo violou a regra geral do ónus da prova, consagrada no art.º 342º do CC, segundo o qual “Àquele que invocar um direito cabe fazer prova dos factos constitutivos do direito alegado”.
K) Dos factos dos itens 7., 8. e 9. APENAS poderão ser substituídos pelos factos vertidos nas alíneas a), b), c) e d) supra, por serem os únicos que é possível extrair e ter como assentes, face à prova documental e alguns excertos dos depoimentos e declarações conjugadas com aqueles.
L) Também quanto aos factos que dos itens 10 e 11 na parte em que consigna que a satisfação da dívida ao credor E... ocorreu à custa do património pessoal do Executado cabeça-de-casal, se entende que tais factos não poderiam ter sido dados como provados.
M) Em primeiro lugar, porque o Tribunal a quo ignorou toda a prova que resulta da tramitação do processo de Inventário, que corresponde ao Apenso B, que por isso integram os presentes autos e que não podem deixar de ser aqui tomados em consideração.
N) Desde logo porque não resulta provado nos autos que a dívida ao E... fosse uma dívida comum no domínio das relações internas entre a Exequente e o Executado e que a sua satisfação tivesse sido efectuada à custa do seu património pessoal.
O) O Executado apenas logrou demonstrar documentalmente nos autos que:
a) o E... instaurou no ano de 2005 uma execução contra a Exequente e Executado destes autos, que correu termos sob o processo 2294/05.6TBAMT do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Amarante, no âmbito do qual o Banco apresentou uma proposta de compra do imóvel que era bem próprio do Executado, a qual foi aceite, pela importância de 332.100,00 € em 3 de Dez. de 2009. – Doc 4 da oposição à execução e penhora;
b) Que o Executado em 15/09/2010 depositou ainda na conta que o próprio possuía no Banco E... com o n.º ......... de 16.580,00 €. – (Doc. 5 da oposição à execução e à penhora), valor este que diz (mas não prova) ter sido entregue ao Banco para extinção da execução;
c) A citada execução foi extinta, conforme notificações feitas à Exequente e Executado em 08 Nov. 2010 - (Docs. 6 e 7 da oposição à execução e à penhora), ou seja muito ANTES da sentença homologatória da partilha;
P) Ao Tribunal cumpria indagar da responsabilidade de cada um dos cônjuges pela dívida ao E..., mas no âmbito das relações internas, ao abrigo do disposto nos artigos 1690 e seguintes do CC, e não ter como assente a responsabilidade de ambos sob o pretexto de integrar passivo aprovado na conferência, para efeitos da responsabilidade perante o credor.
Q) Pois a dívida ao E..., contraída pela Exequente e Executado, já casados, serviu para pagar a dívida exclusiva do Executado ao H..., pelo que a Exequente apenas interveio como garante da obrigação perante o credor, dada a alteração do estado civil do Executado.
R) O Executado apenas juntou um comprovativo de um depósito de determinada quantia na sua conta junto do E..., pelo que não podia o Tribunal dar como provado que tal montante se destinou ao pagamento da dívida exequenda, como refere no item 11 dos factos provados, que deve ser eliminado.
S) O Tribunal mais uma vez deu factos como provados sem qualquer prova documental, quando a natureza do facto impõe a exigência desta prova para que assim fosse.
T) Consequentemente, também os itens dos 15 e 19 não se podem manter como provados.
U) Desde logo por falta de prova do pagamento da totalidade da dívida à credora D..., e que pelo simples motivo de a Exequente ser responsável perante o Banco E..., por figurar como mutuária no empréstimo, daí não resulta que seja responsável perante o Executado nas relações entre eles, como ex-cônjuges.
V) Além do art.º 607º n.º 4 do CPC, a decisão quanto à matéria de facto, viola ainda os arts. 341º, 342º, 352º, 358º, 362º, 393º e 396º, 1691.º n.º 1 a), 1694 n.º 2 , 1730º e 524º todos do CC.
QUANTO AO DIREITO
W) A Exma. Sra. Juiz a quo não andou bem no que concerne à subsunção do direito aos factos, por quatro ordens de razões: falta de requisitos do crédito compensante; violação do caso julgado; inexistência do crédito a favor do Executado e condenatio ex vel ultra petitum.
X) A compensação de créditos possa ser atendida, em sede de embargos de executado, terá de respeitar os pressupostos previstos nos artigos 847º e 848º do CC, como é entendimento pacífico na jurisprudência e na doutrina.
Y) In casu, não se verifica o requisito previsto na al. a) do artigo 847º do CC, segundo o qual o crédito a compensar (o contra crédito) tem de ser exigível judicialmente.
Z) Como vem sendo jurisprudência maioritária do STJ, entende-se que não estando o alegado crédito do Executado/Oponente previamente reconhecido judicialmente, ou seja, tratando-se ainda de um crédito controvertido, não podia ser invocado como fundamento de oposição à execução, ao abrigo do disposto na al. h) do artigo 729º do CPC, e sobretudo não podia ter sido admitida essa compensação, nos termos em que a decisão recorrida o fez. – Neste sentido vide principalmente o Ac. STJ de 14/03/2013, processo 4867/08.6TBOER-A.L1.S1; mas ainda Acórdão do STJ de 02-06-2015, proc. 4852/08.8YYLSB-A.L1.S2, e os Acórdãos da Relação de Coimbra de 24-02-2015; da Relação de Lisboa de 16-09-2014 e da Relação do Porto de 03-06-2013.
AA) A admissibilidade da compensação visada pelo titular do crédito compensante encontra-se condicionada, no processo executivo, ao prévio reconhecimento judicial da existência deste último crédito, como também assim tem entendido a doutrina. – Vide ob. cit. Prof. Antunes Varela, Prof. Menezes Leitão, e Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio Rebelo, Juízes de Direito em Secções de Execução da Instância Central.
BB) Ao reconhecer na sentença recorrida o alegado crédito do Executado, que não tinha qualquer decisão judicial a suportá-lo, a sentença recorrida violou o requisito previsto no artigo 847º “de o crédito ser exigível judicialmente”, e violou ainda, por erro de interpretação, o previsto na al. h) do artigo 729º do CPC.
CC) O Tribunal a quo também incorreu em flagrante erro de direito quando admitiu que o Executado reiterasse os argumentos apresentados em sede declarativa, que lhe foram indeferidos, nos autos de inventário renovando-os em sede de oposição à execução.
DD) Como resulta da interpretação sistemática do artigo 729º do CPC, e os princípios da certeza e segurança jurídica assim impõem, o Executado apenas pode lançar mão, em sede de oposição à execução, de qualquer facto extintivo ou modificativo da obrigação que seja POSTERIOR à formação do título executivo na acção declarativa, o que não era o caso.
EE) Porquanto no inventário, do qual resultou a sentença que constitui o título executivo, já tinha sido apreciado o invocado crédito que o Executado alegou possuir em despacho que transitou em julgado, muito antes de ser proferida a sentença judicial, de que resulta o crédito exequendo.
FF) Tendo então sido proferido o despacho de 07/04/2011, de fls. 297 dos autos de inventário – Apenso B – onde foi então INDEFERIDO o pedido feito pelo Executado de dilação do pagamento das tornas para momento posterior ao da liquidação do passivo comum, pedido esse que este formulou já em momento POSTERIOR aos alegados pagamentos do passivo comum, que diz ter feito, com bens ou rendimentos próprios.
GG) A circunstância de o citado despacho judicial ter transitado em julgado assume a maior importância e relevo, pois tendo-se assim decidido, não podia por esse motivo e fundamento, a sentença recorrida ter dado acolhimento à tese do Executado e reconhecer um contra crédito sobre a Exequente, e julgar operada a compensação na parte correspondente, o que é de todo inadmissível também por violação de caso julgado.
HH) Assim, o Tribunal a quo violou os arts 580º, 581º, 619º, 621º e 625º do CPC.
II) Sem prescindir, sempre se dirá que, o Executado não é credor da Exequente de quantia certa, líquida e judicialmente exigível e só alegou um crédito sobre a Exequente na tentativa de extinguir a execução, sem qualquer título válido e eficaz e da mesma natureza da Exequente.
JJ) A sentença recorrida ultrapassando a indispensável e absolutamente necessária acção declarativa, declarou o Executado como titular de um contra crédito sobre a Exequente sem que se tivesse provado sequer a sua existência.
KK) Ao reconhecer um crédito ao Executado, pela simples divisão por dois do valor do passivo aprovado em conferência de interessados, de 463.615,48 €, sem qualquer prova, o Tribunal violou o disposto nos artigos 341º, 342º, 352º, 358º, 362º, 393º e 396º do CC.
LL) Sem prescindir ainda, uma análise cuidada dos autos e do regime substantivo da responsabilidade dos ex-conjuges, no âmbito das relações internas, impunha concluir que no tocante à dívida ao E... estamos perante uma dívida exclusiva do Executado.
MM) É indubitável que o mútuo junto do E... serviu para substituir o mútuo do Executado junto do H..., sendo que a quantia mutuada naquele foi utilizada para liquidar este, e alterou a responsabilidade externa dos devedores, na medida em que perante o novo credor, a Exequente também ficou como responsável perante o seu pagamento, ao contrário do que sucedia com o H...
NN) E porque o Banco credor E... já se encontrava a executar a dívida foi que a Exequente aceitou reconhecer a dívida ao Banco como COMUM, na conferência de interessados de 05/03/2009, o que é de todo irrelevante na medida em que o credor já havia reclamado o pagamento da mesma na sua totalidade no processo executivo 2294/05.6TBAMT.
OO) No domínio interno, ou seja, entre o extinto casal dos Exequente e Executado, a responsabilidade daquela dívida é exclusivamente deste, em decorrência do regime substantivo previsto nos artigos 1690º e seguintes do Código Civil.
PP) De facto, se por um lado a Exequente e Executado eram ambos responsáveis perante o credor E..., por figurarem ambos como mutuários, NÃO é indiferente a questão da dívida subjacente, no âmbito das relações internas entre a Exequente e o Executado, enquanto ex-cônjuges.
QQ) E dúvidas não existem, porque documentalmente provado, que o direito do Executado de haver da Exequente metade do pagamento da dívida ao E... pura e simplesmente NÃO EXISTE no domínio das relações entre codevedores, pois que está excluída a responsabilidade de quem não beneficiou da dívida, que veio substituir e pagar dívidas próprias do Executado contraídas antes do casamento e por isso e em garantia exclusiva do seu pagamento ele deu de hipoteca o imóvel.
RR) O princípio ínsito no artigo 1694º n.º 2 do CC proclama que “em estrita obediência à lógica substancial das coisa”, as dívidas que oneram bens próprios de um dos cônjuges serão da responsabilidade exclusiva deste.
SS) O Tribunal a quo incorreu em errado enquadramento jurídico dos factos e violou pois, os arts. 1691.º n.º 1 a), 1694 n.º 2 , 1730º e 524º todos do CC.
TT) Finalmente, não pode ainda a Exequente concordar com a sentença que além de ter extinguido a execução, reconheceu um direito de crédito ao Executado superior ao crédito exequendo, quando a oposição à execução apenas se destina à cobrança coactiva de um direito de crédito.
UU) A sentença recorrida, foi muito além, daquilo que foi peticionado pelo Executado, extravasando os limites impostos pelo artigo 609º do CPC, pois o reconhecimento do direito de crédito do Executado na diferença que excede a quantia exequenda não foi sequer questão suscitada pelo Executado na oposição à execução – e nem que o tivesse sido – não o poderia o julgador fazer, em obediência àquele princípio fundamento jurídico-processual civil.
VV) Neste sentido, a sentença recorrida violou nesta parte os arts. 5º e 615º n.º 1 al. d) e d) do CPC.
Nestes termos, deve o presente recurso ser dado como procedente e provado, e proferido douto Acórdão que revogue a decisão recorrida na parte em que julgou a oposição à execução procedente e extinguiu a execução e substituída por decisão que ordene o prosseguimento da execução, com as demais consequências legais.
Foram apresentadas contra alegações pelo recorrido em que conclui pela manutenção do julgado.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. DO RECURSO:
O recurso é balizado pelas conclusões das alegações, estando vedado ao tribunal apreciar e conhecer de matérias que naquelas não se encontrem incluídas, a não ser que se imponha o seu conhecimento oficioso, acrescendo que os recursos não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido e no recurso não se apreciam razões ou argumentos, antes questões- artºs 627º, nº1, 635º e 639º, nºs 1 e 2, CPC, na redacção da Lei nº 41/2013, de 26.06.2013, aplicável ao presente processo face ao disposto no artº 8º desta Lei.
Assim, seguem-se as questões a decidir.
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II.1- Nulidade da sentença:
As causas de nulidade da sentença ou de qualquer decisão são as que vêm taxativamente enumeradas no nº 1 do artº 615º do CPC.
Nos termos daquele preceito, é nula a sentença quando: a) Não contenha a assinatura do juiz; b) Não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão; c) Os fundamentos estejam em oposição com a decisão ou ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível; d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento; e) O juiz condene em quantidade superior ou em objecto diverso do pedido.
Os vícios determinantes da nulidade da sentença correspondem a casos de irregularidades que afectam formalmente a sentença e provocam dúvidas sobre a sua autenticidade, como é a falta de assinatura do juiz, ou ininteligibilidade do discurso decisório por ausência total de explicação da razão por que decide de determinada maneira (falta de fundamentação), quer porque essa explicação conduz, logicamente, a resultado oposto do adoptado (contradição entre os fundamentos e a decisão), ou uso ilegítimo do poder jurisdicional em virtude de pretender conhecer questões de que não podia conhecer (excesso de pronúncia) ou não tratar de questões de que deveria conhecer (omissão de pronúncia). São, sempre, vícios que encerram um desvalor que excede o erro de julgamento e que, por isso, inutilizam o julgado na parte afectada[2] .
Refere o ilustre Prof. Castro Mendes (in “Direito Processual Civil”, Vol. III, pg. 308), que uma sentença nula “não contém tudo o que devia, ou contém mais do que devia”.
Por seu turno, o Prof. Antunes Varela (in “Manual de Processo Civil”, pg. 686), no sentido de delimitar o conceito, face à previsão do artº 668º do Código de Processo Civil (actual artº 615º), salienta que “não se inclui entre as nulidades da sentença o chamado erro de julgamento, a injustiça da decisão, a não conformidade dela com o direito substantivo aplicável, o erro na construção do silogismo judiciário (…) e apenas se curou das causas de nulidade da sentença, deixando de lado os casos a que a doutrina tem chamado de inexistência da sentença”.
Nas conclusões TT) a VV), a apelante imputa à sentença recorrida o vício previsto na al. d) do citado nº 1 do artº 615º do CPC, ou seja que ocorreu excesso de pronúncia, porquanto “A sentença recorrida, foi muito além, daquilo que foi peticionado pelo Executado, extravasando os limites impostos pelo artigo 609º do CPC, pois o reconhecimento do direito de crédito do Executado na diferença que excede a quantia exequenda não foi sequer questão suscitada pelo Executado na oposição à execução – e nem que o tivesse sido – não o poderia o julgador fazer, em obediência àquele princípio fundamento jurídico-processual civil ”.
A doutrina e a jurisprudência distinguem “questões” de “razões” ou “argumentos” e concluem que só a falta ou a apreciação das primeiras integra a nulidade, respectivamente, de omissão ou de excesso de pronúncia; já não a integra a mera falta de discussão das “razões” ou “argumentos” invocados pelas partes para concluir sobre as questões, bem como a explanação de razões ou argumentos jurídicos que justificam a decisão das questões que submeteram ao veredicto judicial[3]. E, essas questões são o(s) pedido(s) formulado pelo autor e a(s) excepções ou a reconvenção (em sede de acção declarativa), deduzidos pelo réu, nos termos dos artºs 3º, nº1, 552º, nº 1, al. e), 572º, al. c), 576º266º e 583º, todos do NCPC, aprovado pela Lei nº 41/2013, de 26.06.
Tais normas processuais são aplicáveis com as devidas adaptações aos presentes embargos de executado, dado que, no fundo, se trata de contestação do executado ao processo executivo, em que não é admissível o pedido reconvencional e em que, em primeiro lugar, regem as regras próprias previstas nos artºs 730º a 734º NCPC.
Segundo o ensinamento de Alberto dos Reis[4]:
«(…) quando o juiz tome conhecimento de factos de que não pode servir-se, por não terem sido, por exemplo, articulados ou alegados pelas partes (art. 664.º), não comete necessariamente a nulidade da 2.ª parte do art. 668.º. Uma coisa é tomar em consideração determinado facto, outra conhecer de questão de facto de que não podia tomar conhecimento; o facto material é um elemento para a solução da questão, mas não é a própria questão.
(…) uma coisa é o erro de julgamento, por a sentença se ter socorrido de elementos de que não podia socorrer-se, outra a nulidade de conhecer questão de que o tribunal não podia tomar conhecimento. Por a sentença tomar em consideração factos não articulados, contra o disposto no art. 664.º, não se segue, como já foi observado, que tenha conhecido de questão de facto de que lhe era vedado conhecer.»
Qualquer dessas eventualidades não se traduz em excesso ou omissão de pronúncia que impliquem a nulidade da sentença, mas, quando muito, em erro de julgamento a considerar em sede de apreciação de mérito.
Ora, transpondo estes ensinamentos para a sentença impugnada, esta conheceu da questão que tinha de conhecer, ou seja, a compensação de um pretenso crédito do embargante, no montante de 231.807,74 € com o crédito exequendo, no montante de 123.925,00 €, fundamento dos presentes embargos de executado com vista à extinção da execução, não tendo extravasado o que se lhe impunha conhecer, de acordo com o disposto no artºs 607º, nº2 e 3 e 608º, nº2, NCPC.
Com efeito, na sentença diz-se que:
Do exposto resulta assim a necessidade de reconhecer judicialmente, nestes autos, o crédito do executado, assente como está na liquidação integral do passivo comum (dele e da exequente), com bens/rendimentos próprios, considerando a factualidade provada no tocante à forma como solveu as dívidas do casal a D... e ao E....
Neste pressuposto, temos por admissível que as respectivas obrigações de executado e exequente sejam extintas, do lado do executado, totalmente, e do lado da exequente, parcialmente (considerando que o valor das tornas é inferior ao da meação do passivo comum), encontrando-se o executado dispensado de realizar a sua prestação/quantia exequenda à exequente (para além de manter o seu crédito sobre ela concernente à diferença entre as tornas e o crédito que lhe adveio, a executar, querendo, noutra sede)”.
Não ocorre condenatio ex vel ultra petitum na sentença recorrida.
Indefere-se, pois, a pretensa nulidade da sentença.
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II.2-Impugnação da matéria de facto:
A apelante, nas conclusões de recurso, insurge-se contra a decisão da matéria de facto da sentença da seguinte forma:
H) Relativamente à matéria dos factos 7., 8. e 9. apenas se aceita que seja dado como provado, o que resulta resultar dos Docs. 1, 2 e 3 juntos pelo Executado na oposição à execução, que:
a) A credora D..., instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra a Exequente e o Executado, que correu termos sob o n.º 2864/06.5TBMTS-C do 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos;
b) No âmbito desses autos, foi penhorado o valor de 86.869,98 € do vencimento do Executado B..., até 31 de Outubro de 2010;
c) Que no dia 12/11/2010, o Executado B... efectuou transferência de 66.000,00 € para a conta do Agente do Execução do processo, F...;
d) No citado processo judicial foi também penhorado bem comum do extinto casal, nomeadamente o direito/expectativa de aquisição do bem imóvel que foi agora penhorado pela Exequente”.
“L) Também quanto aos factos que dos itens 10 e 11 na parte em que consigna que a satisfação da dívida ao credor E... ocorreu à custa do património pessoal do Executado cabeça-de-casal, se entende que tais factos não poderiam ter sido dados como provados.
M) Em primeiro lugar, porque o Tribunal a quo ignorou toda a prova que resulta da tramitação do processo de Inventário, que corresponde ao Apenso B, que por isso integram os presentes autos e que não podem deixar de ser aqui tomados em consideração.
N) Desde logo porque não resulta provado nos autos que a dívida ao E... fosse uma dívida comum no domínio das relações internas entre a Exequente e o Executado e que a sua satisfação tivesse sido efectuada à custa do seu património pessoal.
O) O Executado apenas logrou demonstrar documentalmente nos autos que:
a) o E... instaurou no ano de 2005 uma execução contra a Exequente e Executado destes autos, que correu termos sob o processo 2294/05.6TBAMT do 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Amarante, no âmbito do qual o Banco apresentou uma proposta de compra do imóvel que era bem próprio do Executado, a qual foi aceite, pela importância de 332.100,00 € em 3 de Dez. de 2009. – Doc 4 da oposição à execução e penhora;
b) Que o Executado em 15/09/2010 depositou ainda na conta que o próprio possuía no Banco E... com o n.º ......... de 16.580,00 €. – (Doc. 5 da oposição à execução e à penhora), valor este que diz (mas não prova) ter sido entregue ao Banco para extinção da execução;
c) A citada execução foi extinta, conforme notificações feitas à Exequente e Executado em 08 Nov. 2010 - (Docs. 6 e 7 da oposição à execução e à penhora), ou seja muito ANTES da sentença homologatória da partilha;
(…)
“T) Consequentemente, também os itens dos 15 e 19 não se podem manter como provados.
U) Desde logo por falta de prova do pagamento da totalidade da dívida à credora D..., e que pelo simples motivo de a Exequente ser responsável perante o Banco E..., por figurar como mutuária no empréstimo, daí não resulta que seja responsável perante o Executado nas relações entre eles, como ex-cônjuges”.
Apreciemos.
Face ao Novo Código de Processo Civil, é na sentença que o juiz declara quais os factos que julga provados e os que julga não provados.
A selecção da matéria de facto só pode integrar acontecimentos ou factos concretos, que não conceitos, proposições normativas ou juízos jurídico-conclusivos. Caso contrário, as asserções que revistam tal natureza devem ser excluídas do acervo factual relevante- artº 607º, nº 4, NPCP.
Quanto aos factos que estão admitidos por acordo, provados por documentos ou por confissão reduzida a escrito, o juiz está sujeito a essa prova vinculada- artº 607º, nº 4, NCPC.
Quanto aos demais factos necessitados de prova, vigora o princípio da livre convicção do juiz face as restantes provas legalmente admissíveis pela forma que foram realizadas- artºs 607º, nº 5 e 410º, NCPC, sem prejuízo da relevância dos factos que não carecem de alegação e de prova face ao disposto no artº 412º NCPC.
Esta Relação deve alterar a decisão da matéria de facto se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa-artº 662º, nº 1, NCPC.Nesta matéria veja-se o acórdão do STJ de 11.02.2011 (Abrantes Geraldes)[5] sobre o alcance dessa tarefa do Tribunal da Relação, instância que fixa em definitivo os factos provados.
Como nele se escreve “Esta tem sido a tese adoptada pela doutrina em geral e que, além disso (ou mais do que isso), corresponde à jurisprudência reiterada expressa em numerosos acórdãos deste Supremo Tribunal de Justiça, em qualquer dos casos afirmando que o exercício dos poderes da Relação no que respeita à decisão da matéria de facto não pode quedar-se pela enunciação de argumentos marginais de pendor abstracto, impondo sempre a reapreciação dos meios de prova oralmente produzidos”[6] .
O artigo 5.º deste novo diploma, que corresponde com algumas alterações aos artigos 264.º e 664.º do anterior Código, define em sede de matéria de facto o que constitui o ónus de alegação das partes e como se delimitam os poderes de cognição do tribunal.
Assim, nos termos do n.º 1, às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiam as excepções invocadas.
Todavia, o n.º 2 acrescenta que além dos factos articulados pelas partes, são ainda considerados pelo juiz: a) os factos instrumentais que resultem da instrução da causa; b) os factos que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado e resultem da instrução da causa, desde que sobre eles tenham tido a possibilidade de se pronunciar; c) os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções.
Resulta desta norma que o tribunal deve considerar na sentença factos não alegados pelas partes. Não se trata, contudo, de uma possibilidade sem limitações.
Desde logo, não cabe ao juiz supor ou conceber factos que poderão ter relevo, é necessário que estejamos perante factos que resultem da instrução da causa, isto é, factos que tenham aflorado no processo através dos meios de prova produzidos e, portanto, possuam já alguma consistência prática, não sejam meras conjecturas ou possibilidades abstractas.
Por outro lado, o juiz só pode considerar factos instrumentais e, quanto aos factos essenciais, aqueles que sejam complemento ou concretização dos que as partes hajam alegado. E isto é assim porque mesmo no novo Código de Processo Civil o objecto do processo continua a ser delimitado pela causa de pedir eleita pela parte [artigos 5.º, n.º 1, 552.º, n.º 1, alínea d), 581.º e 615.º, n.º 1, alínea d), segunda parte] e subsistem ainda as limitações à alteração dessa causa de pedir (artigos 260.º, 264.º, 265.º).
A grande diferença em relação ao anterior Código de Processo Civil é que a consideração dos factos essenciais que sejam complemento ou concretização dos alegados não depende já de requerimento da parte interessada nesse aproveitamento para que ele aconteça, como exigia o artigo 264.º, n.º 3, daquele diploma. Presentemente, o juiz pode considerá-los mesmo oficiosamente, sem requerimento de nenhuma das partes, bastando que a parte tenha tido a possibilidade de se pronunciar sobre tais factos.
Importa notar, porém, que este entendimento não é unânime, havendo quem propugne que o juiz não pode oficiosamente considerar tais factos.
Como refere Lebre de Freitas[7] “Os factos que completem ou concretizem a causa de pedir ou as excepções deficientemente alegadas podem também ser introduzidos no processo quando resultem da instrução da causa; mas, neste caso, basta à parte a quem são favoráveis declarar que quer deles aproveitar-se, assim observando o ónus da alegação. A necessidade desta declaração, decorrente do princípio do dispositivo estava expressa no anterior art. 264-3 ("desde que a parte interessada manifeste vontade de deles se aproveitar e à parte contrária tenha sido facultado o exercício do contraditório") e está implícita na formulação do actual art. 5-2-b ("desde que sobre eles [as partes] tenham tido a possibilidade de se pronunciar"): a pronúncia das partes, ou de uma delas (normalmente a que é onerada com a alegação do facto: "a parte interessada"), terá de ser positiva (no sentido da introdução do facto no processo), pois de outro modo seria violado o princípio do dispositivo, em desarmonia com a norma paralela do art. 590-4. A alteração de redacção tem apenas o significado objectivo de frisar que a alegação pode provir de qualquer das partes, atendendo a que o facto em causa não altera nem amplia a causa de pedir (como o do art. 265-1) ou uma excepção, apenas completando ou concretizando uma causa de pedir ou uma excepção já identificada”[8] .
A jurisprudência maioritária do STJ é no sentido de que a indicação dos concretos meios de prova em que assenta a impugnação da matéria de facto pode apenas constar do corpo das alegações de recurso e não constarem integralmente nas conclusões recursivas, exigindo-se que nestas constem os demais ónus expressos naquela norma legal, já que é por elas que se delimita o âmbito do recurso – nº 4 do artº 635º do NCPC- uma vez que a intervenção do Tribunal da Relação não é nessa parte oficiosa. Sintetiza-se tal entendimento jurisprudencial no seguinte trecho do Acórdão do STJ de 23.02.10, in wwwdgsi.pt: “Não se exige que o recorrente, nas conclusões, reproduza o que alegou acerca dos requisitos enunciados no art. 690º-A, nº1, a) e b) e nº2, do Código de Processo Civil, o que tornaria as conclusões, as mais das vezes, não numa síntese, mas uma complexa e prolixa enunciação repetida do que afirmara no corpo alegatório. Mas, esta consideração não dispensa o recorrente de fazer alusão àquela questão que pretende ver apreciada, mais não seja pela resumida indicação dos pontos concretos que pretende ver reapreciados, de modo a que ao ler as conclusões das alegações resulte inquestionável que o recorrente pretende impugnar o julgamento da matéria de facto.”
Ora, nas conclusões das alegações completadas pelo seu corpo a apelante cumpre todos os ónus da impugnação daqueles factos dados como provados na sentença exigidos pelo artº 640º nºs 1 e 2, NCPC, indicando os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, pronunciando-se quanto ao sentido da alteração pretendida, especificando os meios probatórios em que se funda para propugnar por um sentido da decisão de facto diverso da decisão proferida face ao complemento do corpo das alegações e indicando a localização dos depoimentos de testemunhas no respectivo registo transcrevendo-os no corpo das alegações. Assim, não é de rejeitar essa impugnação.
Dos itens 7. a 9. dos factos provados na sentença.
Tais factos foram alegados pelo embargante nos artigos 8º a 11º do requerimento inicial de embargos. Constituem factos essenciais da causa de pedir, ou seja do fundamento específico dos presentes embargos de executado que consistia na compensação de créditos, cabendo ao embargante a sua prova e podendo o embargado “opor-lhe contraprova destinada a torna-los duvidosos; se o conseguir, é a questão decidida contra a parte onerada com a prova”, nos termos dos artºs 342º, nº1 e 346º do Código Civil de 1966 e artºs 410º e 414º NCPC.
Face aos documentos juntos pelo embargante com o requerimento de embargos sob os números 1 a 3, que não foram impugnados pela embargada, mas que não mereceram especial citação na motivação da matéria de facto da sentença, e deveriam merecer, considerando a especial prova do auto de abertura de propostas de 15.11.2010, elaborado pelo senhor solicitador de execução F... e o despacho judicial nele proferido, no âmbito do Procº de execução nº 2864/06.5TBMTS-C., do 5º Juízo Cível de Matosinhos, em que era exequente D... e executados os aqui embargante e embargada, que já se encontravam divorciados por sentença de 15.05.2006, transitada em julgado em 29.06.2006, na falta de conhecimento concreto de qualquer outro pagamento e sua forma pelas testemunhas ouvidas e ponderados os depoimentos de parte prestados por ambas as partes, sem que tivesse ocorrido confissão expressa da exequente, dado que nenhuma assentada consta da acta de julgamento de 17.10.2016 (Fls 632 a 634), resulta que a Senhora juíza a quo não poderia ter dado como provados aqueles factos in totum como o fez, até em excesso do que foi alegado pelo embargante de forma vaga no artigo 10º do requerimento inicial (“a liquidação foi efectuada, no seu grosso montante…”).
Assim, perante a referida prova produzida, esta Relação na sua livre convicção e atentas as apontadas regras da repartição o ónus da prova, apenas considera provados quanto a esta matéria os seguintes factos:
a) A credora D..., instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra a Exequente e o Executado, que correu termos sob o n.º 2864/06.5TBMTS-C do 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos;
b) No âmbito desses autos, foi penhorado o valor de 86.869,98 € do vencimento do Executado B..., até 31 de Outubro de 2010;
c) No dia 12/11/2010, o Executado B... efectuou o pagamento, em numerário, de € 66.000,00 na conta do solicitador de execução daquele processo, F..., para pagamento da quantia exequenda.
d) No citado processo judicial foi penhorado, como bem comum do ex-casal, o direito/expectativa de aquisição do bem imóvel que foi agora penhorado ao executado, referido no ponto 22. dos factos provados.
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Dos itens15 e 19. dos factos provados na sentença.
A matéria do facto 15. não resulta confessada pela exequente em depoimento de parte ou por confissão expressa ou ficta nos articulados ou em documento junto aos autos -artº 463º NCPC e artºs 352º, 355º, 356º 358º Código Civil de 1966, nem se encontra comprovada nos autos documentalmente, sem prejuízo do facto provado do número 16. da sentença. Tem, pois, que ser retirada dos factos provados.
De acordo com o disposto no artº 607º, nºs 3 e 4 do NCPC, na sentença deve o juiz discriminar os factos provados e não provados com interesse para a decisão de direito. Constituem factos as ocorrências da vida real, isto é, ou os fenómenos da natureza, ou as manifestações concretas dos seres vivos, nomeadamente os actos e factos dos homens.
Ora, o que ficou a constar do ponto 19. da factualidade provada da sentença não constitui um facto concreto, antes se trata de uma conclusão jurídica que não está assente em factos provados e que deverá ser decidida em sede de conhecimento de direito. Deve, pois, ser eliminado.
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Dos itens10. e 11. dos factos provados na sentença.
Tal matéria de facto encontra-se provada face aos documentos juntos pelo embargante com o requerimento inicial de embargos sob os números 4 a 8 e que não foram impugnados pela embargada. Nenhuns documentos foram indicados em concreto, nem qualquer outro meio de prova que infirmem aqueles meios de prova.
Mantém-se, assim, essa factualidade provada.
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Face ao assim decidido quanto ao recurso de impugnação da matéria de facto, este Tribunal da Relação considera PROVADOS e com interesse para a decisão dos presentes embargos de executado os seguintes FACTOS:
1. De acordo com o Mapa de Partilha organizado nos autos de Inventário a que estes se mostram apensos, competiria ao Executado e Interessado B... dar tornas à Exequente e Interessada C..., no montante apurado de 123.925,00 €.
2. No mapa informativo de fls... daqueles autos de Inventário com a referência 682862 fez-se a demonstração do total dos bens a partilhar entre os Interessados, que somavam a quantia de 473.048,66 € e fez-se também a demonstração do passivo no montante de 463.615,48 €.
3. Constando igualmente estes valores, quer os do activo, quer os do passivo no próprio Mapa de Partilha.
4. O passivo supra relacionado, no montante de 473.048,66 €, foi por ambos os Interessados (Exequente e o Executado) aprovado na conferência de Interessados que teve lugar no dia 05/03/2009, a fls... dos autos de Inventário, com a referência 484910.
5. Tal passivo dizia respeito a uma dívida de ambos os Interessados à mãe da Exequente, D..., no montante aprovado de 180.370,22 €.
6. E ainda uma dívida de ambos os Interessados ao E..., credor reclamante a fls. 514 dos autos, no montante de 283.245,26 €.
7. A credora D..., instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra a Exequente e o Executado, que correu termos sob o n.º 2864/06.5TBMTS-C do 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos;
8. No âmbito desses autos, foi penhorado o valor de 86.869,98 € do vencimento do Executado B..., até 31 de Outubro de 2010;
9. No dia 12/11/2010, o executado B... efectuou o depósito em numerário de € 66.000,00 na conta do solicitador de execução daquele processo, F..., para pagamento da quantia exequenda.
10. No citado processo judicial foi penhorado, como bem comum do ex-casal, o direito/expectativa de aquisição do bem imóvel que foi aqui penhorado ao executado, referido no ponto 22. dos factos provados.
11. A dívida relativa ao credor D..., no valor de 283.245,26 € foi integralmente liquidada com património pessoal do Cabeça-de-casal, ora Executado, nomeadamente, através da venda judicial da sua casa própria que aquele credor tinha penhorado nos autos de execução nº 2294/05.6TBAMT instaurada contra o Cabeça-de-casal e a Interessada C..., autos que correram seus termos pelo 1º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Amarante.
12. Tal casa penhorada ao Cabeça-de-casal, ora Executado, foi vendida pelo preço total de 332.100,00 €, tendo ainda sido necessário depositar a quantia de 16.580,00 € que o Cabeça-de-casal entregou ao E... para concluir o pagamento da quantia exequenda e juros e assim tornar extinta a execução.
13. Nos termos do Mapa de Partilha organizado nos autos de Inventário, a responsabilidade por aquele passivo era de metade para cada um dos Interessados (Exequente e Executado).
14. Ou seja, competia metade à Exequente C..., no montante de 231.807,74 €, sendo esse montante a sua responsabilidade no passivo aprovado, conforme resulta do Mapa de Partilha.
15. E a outra metade, no montante de 231.807,74 € da responsabilidade do Executado.
16. A Exequente tomou conhecimento do desfecho do processo executivo nº 2294/05.6TBAMT, instaurado contra o ex-casal pelo D..., tendo inclusivamente, sido notificada pelo solicitador de execução da extinção da execução pelo seu pagamento.
17. A exequente sabe que é responsável pelo pagamento de metade do passivo que aprovou, no montante de € 231.807,74, conforme está estabelecido no Mapa de Partilha.
18. As tornas que cabem à Exequente, ascendem ao montante de 123.925,00 €.
19. Já nos autos de Inventário, o executado manifestou perante a exequente a sua vontade de ver compensado o seu crédito sobre o crédito da exequente.
20. O que fez através de requerimento dirigido aos autos e em sede de alegações de recurso de Agravo que se encontram apensas ao processo de Inventário.
21. O Sr. Agente de Execução procedeu à penhora ao executado do direito à posição contratual referente ao contrato promessa de compra e venda relativo ao imóvel designado pela letra "D", correspondente a uma habitação no 1º andar direito, com entradas pela Avª. ..., .. e Rua ..., .., Matosinhos.
22. O Sr. Agente de Execução deu ao valor do direito penhorado a quantia de 350.000,00 €.
23. Aquela expectativa de aquisição foi adjudicada no inventário ao executado, por tê-la licitado, no valor de 260.000,00 € na conferência de interessados.
24. Sendo aquela expectativa de aquisição o bem de maior valor da relação de bens do inventário.
25. E sendo, sobretudo, por causa da sua licitação pelo executado que redundou no pagamento de tornas à exequente.
26. Tal penhora foi efectuada sem citação prévia do executado.
27. Em Março de 2006, por forma a concretizar a escritura e receber o que lhe era devido, a RAR informou através de carta registada o Ilustre Mandatário da exequente, que o direito arrestado é susceptível de se extinguir durante a pendência do arresto. 29. A exequente tem ainda acções em curso para reaver quantias que, no seu parecer, o património comum ainda lhe é devedor.
28. O executado dirigiu requerimento ao Sr. Agente de Execução, no qual se opôs às diligências de penhora.
29. Para a expectativa de aquisição do imóvel referido em 21), foi celebrada promessa de compra e venda que exequente e executado concretizaram em 2002 e, pelo menos desde 2006 que o executado se recusou a realizar o registo deste bem em nome dos promitentes adquirentes.
30. Apartamento, esse, pronto a habitar e escriturar pelo menos desde o dia 11 de Agosto de 2005.
31. Escritura que esteve agendada, pelo menos, três vezes para ser realizada, mas o executado não compareceu em nenhuma dessas datas.
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II.3- Compensação de créditos como fundamento de embargos de executado:
Resulta claro que o único fundamento destes embargos de executado é a compensação de créditos invocada pelo embargante ao abrigo do disposto no artº 729º, al h), NCPC.
Nos termos do disposto no artigo 847.º, n.º 1, do CC:
Quando duas pessoas sejam reciprocamente credor e devedor, qualquer delas pode livrar-se da sua obrigação por meio de compensação com a obrigação do seu credor, verificados os seguintes requisitos:
a) Ser o seu crédito exigível judicialmente e não proceder contra ele excepção, peremptória ou dilatória de direito material;
b)Terem as duas obrigações por objecto coisas fungíveis da mesma espécie e qualidade”.
Acrescenta-se no artigo 848.º, n.º 1, que a compensação se torna efectiva mediante declaração de uma das partes à outra.
Ora, constituindo, como constitui, a compensação um facto extintivo (total ou parcial) da obrigação, pode, pois, a mesma, ser invocada como fundamento de oposição a execução que se fundamente (como acontece no caso sub judice) em sentença, por força do disposto na alínea h), do artº 729º NCPC, norma aditada à redacção da anterior norma do artº 814º CPC, dirimindo a querela doutrinária e jurisprudencial antes existente[9].
Era antes do actual Código de Processo Civil doutrina e jurisprudência maioritária no STJ a que considerava que “A compensação formulada pelo executado na oposição do crédito exequendo com um seu alegado contra crédito sobre a exequente, não reconhecido previamente e cuja existência pretende ver declarada na instância de oposição, não é legalmente admissível” (Ac. de 14.12.06, relatado pelo Ex. mo Cons. João Moreira Camilo) e outros do mesmo tribunal superior referidos no Acórdão de 05.06.2015 (Fernandes do Vale)[10].
Face ao disposto na alínea h), do artº 729º, NCPC “Fundando-se a execução em sentença, a oposição só pode ter algum dos fundamentos: Contra crédito sobre o exequente, com vista a obter a compensação de créditos”, cremos que não é defensável mais a referida anterior doutrina e jurisprudência que recusava liminarmente este fundamento dos embargos de executado (oposição à execução).
Entendemos que agora tem plena cobertura legal o entendimento ainda na versão anterior do CPC de que “a mera circunstância de o crédito não estar judicialmente reconhecido e a mera circunstância de o crédito ser controvertido – porque o respectivo devedor impugna a sua existência – não constituem, em princípio, obstáculo à admissibilidade de invocação da compensação, na oposição à execução, para efeitos de extinção do crédito exequendo, devendo ser feita a prova do crédito e da sua exigibilidade, no processo onde a compensação é invocada”- parte do sumário do douto Acórdão desta Relação de 03-11-2010 (Maria Catarina), in www.dgsi.pt.
Mas, pela própria natureza dos embargos de executado caso se trate de execução de sentença para pagamento de quantia certa e por força do princípio da preclusão e da concentração da defesa na contestação, entendemos que há uma ressalva essencial a fazer: a invocação da compensação do contra crédito do executado sobre a exequente apenas pode ser fundamento de embargos de executado e neles ser conhecido e reconhecido, sem que o tivesse sido antes em acção declarativa, se esse contra crédito for superveniente em relação à acção declarativa. Afastamo-nos, em parte do entendimento do Professor Miguel Teixeira de Sousa, in Blogue IPCC, de 27.06.2015 e dos juízes Virgínio da Costa Ribeiro e Sérgio rebelo, in “A Acção Declarativa Anotada e Comentada, 2ª Edição, comentário ao artº 729º NCPC.
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II.4-Caso julgado:
Nas conclusões CC) a HH) invoca a apelante/exequente violação do caso julgado formado pelo despacho de 07.04.2011, de fls 297, dos autos de processo de inventário para partilha dos bens comuns do ex-casal - Apenso B- pelo qual foi indeferido requerimento seu para dilação do pagamento do aludido crédito de tornas da exequente para momento posterior ao da liquidação do passivo comum que ambos os ex-cônjuges reconheceram na conferência de interessados realizada em 05.03.2009, sem que tivesse sido interposto recurso.
Carece de qualquer fundamento a pretensão da apelante.
Pese embora não ter invocado a aludida excepção dilatória de caso julgado na contestação destes embargos, instaurados em 19.06.2014, não foi a mesma conhecida na sentença, tendo sido conhecida a excepção de litispendência (que foi rejeitada). Mas, sendo a questão do caso julgado de conhecimento oficioso é admissível a sua apreciação em sede deste recurso- artºs 576º, nºs 1 e 2, 577º, al. i) e 578º NCPC.
Ora, não há caso julgado material porquanto o referido despacho não conheceu do mérito da compensação de créditos invocada nestes embargos de executado, nem tal ocorreu numa acção tendo por objecto esta questão entre as mesmas partes, por sentença de mérito transitada em julgado- artºs 580º, nºs 1 e 2, 581º, nºs 1, 3 e 4; NCPC.
Aquele despacho incidiu apenas sobre uma questão processual colocada no processo de inventário pelo que apenas fez caso julgado formal, não tendo força obrigatória fora do inventário- artº 620º, nº 1, NCPC. A execução de que estes embargos de executado são incidente com natureza declarativa, tem autonomia processual relativamente ao referido processo de inventário e daí que o aludido despacho nem força de caso julgado formal tenha para estes embargos de executado.
Improcede, pois, a invocada excepção dilatória de caso julgado.
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II.5- Existência e exigibilidade do crédito do embargante:
Posto isto, vejamos, então, se se verificam ou não, os indicados pressupostos para que possa operar a compensação.
A exequente C... instaurou execução para pagamento da quantia de tornas que lhe são devidas no valor de € 123.925,00, quantia acrescida de juros de mora, tendo como título executivo a sentença homologatória da partilha de 27.09.2013, transitada em julgado, no processo de inventário subsequente ao divórcio, que constitui o processo principal, contra o ex-cônjuge B....
Trata-se, assim, de uma execução para pagamento de quantia certa em que o título executivo é a aludida sentença homologatória da partilha- artºs 703º, nº 1, al. a), 704º, nº1 e 724º ss, NCPC.
O executado veio deduzir a presente oposição à execução mediante embargos de executado, confessando-se devedor desse montante de tornas devidas à exequente mas pretendendo declarar a compensação de contra crédito seu sobre a exequente no valor de € 231.807,74, resultante da meação desta no passivo da responsabilidade do ex-casal que o embargante alega ter pagado a terceiros com património seu, após a partilha. Sendo o crédito da exequente inferior requer que, julgados procedentes os embargos, seja extinta a execução.
Na contestação aos embargos apresentada em 11.02.2015 a embargada não toma efectiva posição, nem deduz qualquer matéria de excepção à invocada compensação de créditos do embargante. O processo prosseguiu para julgamento para apreciação da efectiva compensação a realizar- artº 732º, nº 2 e 3, NCPC.
Face aos factos que resultam comprovados do processo de divórcio litigioso, subsequente inventário para separação de meações, execução a que estes autos de embargos estão apensos e aos factos que supra esta Relação considerou definitivamente provados, resulta que:
- O embargante e a embargada casaram entre si em 11.09.1999, sem convenção antenupcial de bens;
- Por sentença de 15.05.2006, transitada em julgado, foi decretado o divórcio entre si e extinto o casamento, tendo o cônjuge marido sido declarado único culpado;
- Em 18.09.2006 foi instaurado inventário para separação das meações dos bens comuns do ex casal;
- Nesse inventário pelos ex cônjuges foi aprovado em conferência de Interessados que teve lugar no dia 05/03/2009, o passivo que havia sido relacionado, no montante de 473.048,66 €, que dizia respeito a uma dívida comum à mãe da ora exequente, D..., no montante aprovado de 180.370,22 € e uma dívida comum ao E..., credor reclamante a fls. 514 dos autos, no montante de 283.245,26 €.
- No mapa de partilha de 21.06.2013 daqueles autos de Inventário fez-se a demonstração do total dos bens a partilhar entre os Interessados, que somavam a quantia de 473.048,66 € e fez-se também a demonstração do passivo no montante de 463.615,48 €.
- De acordo com o mapa de partilha cabia ao ora executado e Interessado B... pagar de tornas à ora exequente e Interessada C..., o valor de 123.925,00 €.
- Nos autos de inventário foi proferida sentença em 27.09.2013, transitada em julgado em 30.10.2013, que homologou a partilha constante do mapa de fls 1441 e 1442, adjudicando os respectivos quinhões aos interessados e condenou os interessados no pagamento daquele passivo aprovado unanimemente aprovado e judicialmente reconhecido em conferência de interessados.
- A credora D..., instaurou acção executiva para pagamento de quantia certa contra a Exequente e o Executado, que correu termos sob o n.º 2864/06.5TBMTS-C do 5º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Matosinhos;
- No âmbito desses autos, foi penhorado o valor de 86.869,98 € do vencimento do Executado B..., até 31 de Outubro de 2010;
- No dia 12/11/2010, o executado B... efectuou o depósito em numerário de € 66.000,00 na conta do solicitador de execução daquele processo, F..., para pagamento da quantia exequenda.
Quanto a esta dívida comum do ex casal à credora D..., ignora-se quando a execução foi instaurada, sabendo-se apenas que “No âmbito desses autos, foi penhorado o valor de 86.869,98 € do vencimento do Executado B..., até 31 de Outubro de 2010” e que “ No dia 12/11/2010, o executado B... efectuou o depósito em numerário de € 66.000,00 na conta do solicitador de execução daquele processo, F..., para pagamento da quantia exequenda”. Desconhece-se se esta execução foi extinta por qualquer circunstância, vg desistência parcial da ali exequente ou acordo de pagamento. Certo é que apenas está comprovado pagamento no montante global de 152,869,98 €.
Resulta da cópia da sentença declarativa junta de fls 82 a 87, que na acção principal dessa execução foi proferida sentença em 11.09.2006 que reconheceu o referido crédito e condenou os ali réus, aqui exequente e executado, no pagamento da quantia de 171.210,50 €, acrescida de juros de mora contados desde a citação até integral pagamento à taxa legal de 4%.
Necessariamente que tendo aquela execução sido instaurada após o trânsito em julgado da respectiva sentença que lhe serviu de título executivo, sendo posterior ao divórcio decretado em 15.5.2006, “os efeitos do divórcio produzem-se a partir do trânsito em julgado da respectiva sentença, mas retrotraem-se à data da propositura da acção quanto às relações patrimoniais entre os cônjuges”- artº 1789º, nº1, Código Civil de 1966. Daí que dúvidas não há de que o pagamento de parte da referida dívida comum dos ex cônjuges através de desconto no salário do ora embargante, no valor global de 86.869,98 € até 31 de Outubro de 2010, o foi com bem próprio do embargante, visto já estar extinto o casamento e não ser aplicável a regra prevista no artº 1724º, al. a), CC.
Quanto ao facto provado que “No dia 12/11/2010, o executado B... efectuou o depósito em numerário de € 66.000,00 na conta do solicitador de execução daquele processo, F..., para pagamento da quantia exequenda”, é apenas isso. Não ficou provado qual a origem do dinheiro depositado, ou seja se é dinheiro pertencente apenas ao embargante.
Daqui resulta que a referida dívida comum foi paga parcialmente no montante global de 152.869,98 e comprovadamente por património próprio do embargante no montante de 86.869,98 €.
Na sentença os ali réus não foram condenados solidariamente no pagamento daquela prestação pecuniária, nem tal resulta de contrato ou da lei, pelo que aquela obrigação de pagamento é conjunta e não solidária- artºs 512º, 513º e 518º, CC.
O benefício da divisão caracteriza e diferencia as obrigações correntemente designadas por conjuntas, das obrigações solidárias. Ao contrário destas, nas obrigações conjuntas cada devedor só é responsável, perante o credor, pela quota parte da obrigação que lhe corresponde e somente ao devedor solidário que pagou mais do que correspondia à sua real quota (nas relações internas entre devedores) é que é consagrado direito de regresso em termos gerias nos termos do artº 524º e 516º e em certas situações específicas, vg artºs 507º e 497º, nº 2, CC[12].
Não é exigível, assim, do embargante à embargada qualquer crédito pelo comprovado pagamento por banda daquele da quantia de 86.869,98 € de uma dívida conjunta a D... no montante de 171.210,50 €, acrescida de juros de mora contados desde a citação até integral pagamento à taxa legal de 4% e que foi reconhecida no inventário a que estes autos estão apensos na conferência de interessados no montante de 180.370,22 €.
Falece, pois, a invocada compensação de qualquer crédito do embargante sobre a embargada nessa parte.
Quanto ao crédito do E..., credor reclamante a fls. 514 dos autos de inventário, no montante de 283.245,26 €, como atrás ficou provado também, tal crédito foi aprovado na conferência de interessados e foi incluído no mapa de partilha, tendo ambos os ex cônjuges sido condenados no seu pagamento por sentença homologatória da partilha de 27.09.2013.
Provou-se que o aludido crédito daquele Banco foi integralmente pago com bens próprios do embargante e que a embargada foi notificada da extinção daquela execução em conformidade- factos provados 11,12 e 16. Mas, tal pagamento ocorreu antes de 27.09.2013, data da sentença homologatória da partilha e que condenou os ex cônjuges no pagamento daquele passivo aprovado. Com efeito, a data da aceitação da proposta de adjudicação daquele bem próprio do embargante ao Banco ali exequente é de 3 de Dezembro de 2009 (fls 24) e a do depósito complementar é de 15.09.2010 (fls 26).
Daqui resulta que, como supra defendemos, não se verifica a superveniência do pretenso crédito a compensar, mesmo que comprovado estivesse, relativamente à sentença que homologou a partilha.
Acresce que, tal como se referiu para o anterior crédito reconhecido no inventário, esta dívida dos ex cônjuges é uma dívida conjunta e não solidária e, assim sendo, não assiste direito de regresso do embargante sobre a embargada que possa exigir em sede destes embargos de executado com base em compensação de créditos como fundamento de oposição à execução do crédito de tornas da exequente.
Finalmente, entendemos que não pode ser conhecida em sede de recurso a questão nova trazida pela apelante nas conclusões LL) a SS) e, mesmo que assim não fosse, o seu conhecimento fica prejudicado atenta a procedência da questão anterior.
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III- DECISÃO:
Nestes termos, acordam os juízes nesta Relação em julgar parcialmente procedente a apelação e revogar a sentença recorrida, julgando-se improcedentes os presentes embargos de executado e ordenando o prosseguimento da execução.
Custas pelo recorrido.

Porto, 11-07-2018
Madeira Pinto
Carlos Portela
José Manuel Araújo de Barros
_________________
[1] Embora algumas intituladas por lapso de “Ata de inquirição de testemunhas”.
[2] Abílio Neto, CPC Anotado, 22ª ed., pág. 948.
[3] Alberto dos Reis, CPC Anotado, Vol. V, Coimbra Editora, 1981, pp. 144-146.
[4] Obra citada, pág 143.
[5] WWW.DGSI.PT
[6] Acórdão do STJ de 07.09.2017 (Tomé Gomes), que mitiga essa sindicância da forma que consta deste seu sumário: “5. O nosso regime de sindicância da decisão de facto pela 2.ª instância tem em vista não um segundo julgamento latitudinário da causa, mas sim a reapreciação dos juízos de facto parcelares impugnados, na perspectiva de erros de julgamento específicos, o que requer, por banda do impugnante, uma argumentação probatória que, no limite, os configure”.
[7] A acção declarativa, pág. 141, nota 2, págs. 165/166, nota 38 da págs. 168/169, nota 57 da pág
[8] Contra, esta posição veja-se Maria José Capelo, na anotação a um ac. do TRC, feita na RLJ 143, Março-Abril de 2014, pág. 294, considerando que “os factos complementares ou concretizadores podem ser carreados para a causa por iniciativa judicial, seja qual for a vontade da parte (a quem o facto aproveita)”, embora tenha, de factos complementares ou concretizadores, uma ideia diferente da de Lebre de Freitas (como se vê na 2ª coluna da pág. 296 da anotação: [os factos complementares ou concretizadores embora necessários para a procedência da causa nascem apenas no processo (não na hipótese legal), limitando-se, por conseguinte, a concretizar ou completar os factos que sustentam a relação material controvertida. […]” e ainda o acórdão desta Relação de 29/05/2014 in www.dgsi.pt.
[9] Ver sobre esta querela decisões diferentes proferidas no Acórdão da Relação do Porto, de 03/11/2010, Acórdãos do TRC de 07-05-2015 e de 22-09-2015 e Ac. STJ de 14/12/2006, todos in www.dgsi.pt.
[10] Todos in www.dgsi.pt
[11] Neste sentido e desenvolvidamente ver Rui Pinto, “A Problemática de Dedução da Compensação no Código de Processo Civil de 2013”, acessível na Internet.
[12] Vidé Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, Vol. I, 3ª edição, Coimbra Editora, anotação aos referidos artigos.