Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5953/16.4T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FERNANDA SOARES
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
JUSTIFICAÇÃO
NULIDADE
Nº do Documento: RP201706265953/16.4T8VNG.P1
Data do Acordão: 06/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÕES EM PROCESSO COMUM ESPECIAL (2013)
Decisão: PARCIALMENTE PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º259, FLS.54-62)
Área Temática: .
Sumário: I - Dedicando-se a empregadora ao transporte rodoviário de mercadorias deve ela organizar-se de modo a satisfazer, quando necessário, os pedidos dos seus clientes, organização que passa, naturalmente, por períodos de maior procura dos seus serviços e períodos de menos procura.
II - Não é suficiente fazer constar do contrato de trabalho a termo certo – para efeitos do disposto nos artigos 140º, nº2, al. f) e 141º, nº1, al. e) do CT/2009 – que o motivo da celebração do contrato pelo período de 7 meses é a realização de serviços de transporte extra ou serviços extra solicitados por 2 clientes da empregadora, ainda que a empregadora tenha feito coincidir a duração do contrato do trabalhador com a duração dos serviços extra solicitados (7 meses), na medida em que aquelas expressões são vagas e genéricas.
III - Deste modo, não é possível, através dessas expressões, estabelecer uma real concretização da excepcionalidade do acréscimo de actividade da empregadora, da relação entre o acréscimo e o termo estipulado e da relação entre o acréscimo e a concreta actividade para a qual o trabalhador foi contratado.
IV - Assim, é nula a cláusula do contrato de trabalho a termo por não indicação concreta do motivo justificativo para a sua celebração pelo período de tempo nele indicado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º5953/16.4T8VNG.P1
Relatora: M. Fernanda Soares – 1471
Adjuntos: Dr. Domingos José de Morais
Dra. Paula Leal de Carvalho
Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I
B… instaurou, em 13.07.2016, na Comarca do Porto, Vila Nova de Gaia – Instância Central – 5ª Secção Trabalho – J1, acção emergente de contrato de trabalho contra C…, LDA., pedindo a condenação da Ré a) A reconhecer o Autor como contratado sem termo desde 01.07.2015; b) A reconhecer a ilicitude do despedimento; c) A pagar ao Autor todas as prestações que ele deixou de auferir, desde a data do despedimento, até à data do trânsito em julgado da decisão; d) A readmitir o Autor no seu posto e local de trabalho ou, então, se assim vier a optar, a pagar-lhe a indemnização de antiguidade que monta já ao valor de €1.725,00; e) A pagar ao Autor a quantia de €1.286,70, relativa ao trabalho suplementar prestado no período compreendido entre 01.07.2015 e 31.12.2015; f) A pagar os juros de mora, à taxa legal, desde a data do vencimento de cada uma das retribuições não pagas.
Alega o Autor que no dia 01.07.2015 foi admitido ao serviço da Ré, mediante a celebração de contrato de trabalho a termo certo, para exercer as funções de motorista de pesados, pelo período de 6 meses, sendo que o motivo aposto no referido contrato se traduz, tão só, numa consideração genérica, que resulta do normal desenvolvimento da actividade da empresa, acrescendo o facto de o serviço distribuído ao Autor não ter sido exclusivamente o solicitado pelos clientes mencionados no contrato de trabalho, o que torna nula a cláusula da estipulação do termo, a determinar a existência de um contrato de trabalho sem termo, sendo que a comunicação da Ré, de que o contrato cessaria em 31.01.2016, configura um despedimento ilícito. Acresce que durante a vigência do contrato de trabalho o Autor, por ordem da Ré e no seu exclusivo interesse, prestou trabalho suplementar em dias normais de trabalho, em dias feriados e de descanso semanal e complementar, que indica, que não foi pago pela Ré, de acordo com o determinado na convenção colectiva de trabalho publicada no BTE nº9, de 08.03.1980 e no BTE nº16, de 29.04.1982, e posteriores alterações, tendo em conta que o Autor é sócio do Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte, associação que integra a FECTRANS, subscritora do referido CCT e a Ré é associada da ANTRAM.
A Ré veio contestar pedindo a improcedência da acção. Caso assim não se entenda deve ser tido em conta o valor já pago pela Ré ao Autor, no montante de €3.274,27 e pede ainda a condenação do Autor como litigante de má-fé em multa, a fixar pelo Tribunal, acrescidas das despesas e procuradora condigna. Alega que o contrato a termo é válido quanto à justificação aposta no mesmo para a sua celebração. Defende que o pedido formulado a título de pagamento de trabalho suplementar prestado é um pedido genérico, e por tal inadmissível. Em via reconvencional, alega ter pago ao Autor, por acordo entre ambos, o trabalho suplementar que se encontra discriminado nos recibos de vencimento sob a rúbrica «ajudas de custo», «horas extras» e «horas nocturnas», aí se incluindo os direitos resultantes da clªs.39ª, 40ª e 41ª do CCT. Para a hipótese desse acordo ser considerado nulo pede a restituição de tudo quanto pagou ao Autor a esse título, no montante de €3.274,27.
O Autor veio responder.
Proferido o despacho saneador e fixado o valor da causa em €3.011,70, foi a reconvenção liminarmente indeferida ao abrigo do artigo 195º do CPC. Procedeu-se a julgamento com gravação da prova pessoal e foi proferida sentença que julgou a acção totalmente improcedente e absolveu a Ré dos pedidos.
O Autor, inconformado, veio recorrer pedindo a revogação da sentença e a sua substituição por acórdão que julgue a acção totalmente procedente, concluindo do seguinte modo:
1. O Tribunal a quo não podia dar como provado o constante do ponto 16, pois do contrato de trabalho é impossível inferir essa factualidade, sendo que como está formulado o referido ponto, o mesmo reflecte uma conclusão e não um facto.
2. O Tribunal poderia e deveria ter dado como provado que no contrato de trabalho consta como motivo justificativo o constante da clª16ª do contrato.
3. Mas nunca poderia concluir – vertendo tal conclusão como sendo um facto provado – que aqueles clientes da Ré (D… e E…) tivessem solicitado efectivamente serviços acrescidos desde Julho de 2015 e com previsão de duração até início de 2016, tendo no entanto tais serviços decrescido já em Dezembro de 2015.
4. E não podia fazê-lo porque do contrato de trabalho nada consta nesse sentido.
5. Ora, do contrato de trabalho não consta com suficiência bastante quais os serviços extra que foram solicitados pelos clientes D… e E…, por isso, não podia o Tribunal a quo ter dado como provado o constante do ponto 16, devendo o mesmo ser eliminado dos factos provados.
6. Ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, o contrato em causa não contém factos concretos justificadores da necessidade temporária da Ré.
7. O simples facto de constar da clª16ª do contrato de trabalho o nome de 2 clientes, a quem a Ré imputa ter contratos de serviços de transporte extra, não é suficiente para se concluir que está estabelecida a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, conforme prescreve o nº3 do artigo 141º do CT.
8. Se esses serviços de transporte extra foram efectivamente contratados pelos clientes da Ré acima referidos, esta tinha a obrigação legal de transpor para o contrato de trabalho quais os serviços extra em concreto que foram contratados por aqueles clientes.
9. Porém, a Ré não o fez, limitando-se a indicar o nome de 2 clientes seus para com isso arrogar-se no cumprimento legal da concretização dos factos que levam à contratação a prazo.
10. Acresce que, tal foi dado como provado, a Ré é uma empresa que se dedica ao transporte rodoviário de mercadorias, sendo que a vida quotidiana de uma qualquer empresa desse sector é estar sujeita ao que as empresas, suas clientes, lhe solicitam em termos de distribuição de encomendas.
11. Não podendo esses altos e baixos de cargas para transportar servir como motivo justificador para contratar a termo, uma vez que não se trata de uma necessidade temporária da empresa, mas sim uma realidade constante.
12. Por outro lado, no contrato de trabalho não foi, tão pouco, alegada qualquer sazonalidade dos ditos serviços extra de transporte.
13. Por isso, forçoso será concluir que a «justificação» apontada pela Ré não pode proceder, já que não obedece aos requisitos que, de forma pacífica, a Jurisprudência e a Doutrina têm vindo a fixar.
14. Nestes termos, deverá ser declarada nula a estipulação do termo aposta no contrato celebrado entre o Autor e a Ré, com as demais consequências daí advindas.
15. Tendo em conta a matéria de facto dada como provada no ponto 15 e ainda que nos termos da clª20ª do CCT aplicável o domingo é o dia de descanso semanal e o sábado é o dia de descanso complementar, deveria a Ré ter sido condenada a pagar ao Autor a retribuição correspondente ao trabalho prestado naqueles dias.
16. O facto de na clª13ª do contrato de trabalho não estar fixado os dias de descanso do Autor, reinando a absoluta discricionariedade, tal não significa que se tome tal cláusula como válida e como capaz de afastar o disposto no CCT aplicável.
17. Acresce que a matéria de facto constante do ponto 18 dos factos provados não é a mesma coisa que dar como provado que os dias de descanso semanal e complementar do Autor foram gozados em determinados dias úteis.
18. Aliás, efectuar descanso não é a mesma coisa que efectuar descanso semanal, já que naqueles dias constantes do ponto 18 podia o Autor ter efectuado descanso compensatório nos termos do disposto no nº5 da clª41ª do CCT.
A Ré contra alegou pugnando pela manutenção da decisão recorrida e veio requerer a ampliação do objecto do recurso concluindo do seguinte modo:
1. Caso venha a considerar-se nulo o termo do contrato de trabalho celebrado, sempre se dirá que jamais a Ré poderá ser condenada no pedido que contra ela vem dirigido, na medida em que o Autor, caso venha a ser considerado despedimento ilícito, apenas teria direito a receber uma indemnização em substituição da sua reintegração, conforme optou, no valor de €1.725,00.
2. Sendo que ao referido valor terá de ser deduzido o montante de €201,25 pago pela Ré a título de caducidade do contrato, conforme recebo de vencimento junto aos autos a folhas 31.
3. Pelo que, a ser devida qualquer quantia ao Autor será no valor de €1.523,00 e nada mais.
4. Devendo ainda atender-se ao estipulado no nº2 do artigo 390º do CT, pelo que quanto às retribuições que o Autor deixou de auferir, sempre as mesmas terão de ser objecto de incidente de liquidação previsto no nº2 do artigo 358º do CPC.
O Exmo. Procurador-Geral Adjunto junto desta Relação emitiu parecer no sentido da improcedência do recurso, quer relativamente à validade do termo aposto no contrato de trabalho quer no que concerne ao trabalho suplementar.
Admitido o recurso cumpre decidir.
* * *
II
Matéria de facto dada como provada e a ter em conta na decisão do recurso.
1. O Autor foi admitido ao serviço da Ré.
2. Uma sociedade comercial que se dedica ao transporte rodoviário de mercadorias.
3. Por força de um contrato de trabalho a termo certo celebrado em 01.07.2015, pelo período de sete meses, até 31.01.2016.
4. A partir daquela data, o Autor passou a exercer a sua actividade profissional remunerada, por conta e sob a direcção e fiscalização da Ré.
5. Estando classificado profissionalmente como motorista de pesados.
6. Ao serviço da Ré auferiu o Autor a retribuição mensal de € 575,00, acrescida de um subsídio de refeição no valor diário de €4,27.
7. À relação laboral em causa ambas as partes reconhecem como aplicável o CCTV publicado no BTE nº9, de 08.03.1980 e no BTE nº16, de 29.04.1982 e posteriores alterações.
8. O Autor é sócio do Sindicato dos Trabalhadores dos Transportes Rodoviários e Urbanos do Norte, associação sindical que integra a FECTRANS – anteriormente denominada FESTRU – federação sindical subscritora do IRCT referido.
9. E a Ré é associada da ANTRAM – Associação Nacional dos Transportes Públicos Rodoviários de Mercadorias.
10. O Autor cumpria um horário de trabalho de 40 horas semanais, 8 horas diárias, em regime de horário flexível, com 2 dias de descanso semanal a definir pela Ré, conforme clª13ª do contrato de trabalho, junto a folhas 18 a 24.
11. A Ré justificou a contratação do Autor a termo com os motivos exarados na clª16ª do contrato e que denomina de serviços extra solicitados pelos clientes D… LDA e E… LDA entre Julho de 2015 e final de Janeiro de 2016.
12. O Autor prestou efectivamente serviço para esses clientes da Ré mas desde pelo menos Dezembro de 2015 trabalhou também para outro cliente (F… ou G…).
13. Por carta datada de 07.01.2016 a Ré comunicou ao Autor que o contrato de trabalho celebrado entre ambos iria cessar em 31.01.2016.
14. Desde esta data, não mais a Ré permitiu que o Autor reocupasse o seu posto de trabalho.
15. O Autor prestou serviço à Ré em alguns sábados e domingos, designadamente nos seguintes: 11, 18 e 25 de Julho de 2015; 1 e 8 de Agosto de 2015; 26 e 27 de Setembro de 2015; 3, 4, 10, 11, 17, 18, 24 e 31 de Outubro de 2015; 1, 7, 8, 14, 15, 21, 28 e 29 de Novembro de 2015; 5 e 12 de Dezembro de 2015.
16. Os clientes da Ré D… LDA e E… LDA solicitaram efectivamente serviços acrescidos desde Julho de 2015 e com previsão de duração até inícios de 2016, tendo no entanto tais serviços decrescido já em Dezembro de 2015.
17. Por isso e nessa altura o Autor foi afecto a prestar também e sobretudo serviços para a F…, em substituição de outro colega.
18. O Autor efectuou descanso em dias não coincidentes com fins-de-semana designadamente nos seguintes: 2, 9 e 23 de Outubro de 2015; 6, 7, 22, 23, 24 e 26 de Novembro de 2015; 3 e 4 de Dezembro de 2015.
Adita-se a seguinte factualidade:
19. Do contrato referido em 11 consta a clª16ª com o seguinte teor: “1- Ao abrigo no disposto nos artigos 140º, nº2, alínea f) e 148º, do Código do Trabalho, aprovado pela Lei nº7/2009, de 12 de Fevereiro, o presente contrato a termo resolutivo é motivado por um acréscimo excepcional e temporário da actividade da empresa, resultante da adjudicação à Primeira Contraente de diversos serviços de transporte extra solicitados pela sua cliente D… LDA e E… LDA. 2- Os serviços extra agora solicitados pelos clientes da Primeira Contraente e acima identificados terão a duração de sete meses, tendo o seu início em 01.07.2015, com final a 31.01.2016. 3- Actualmente os recursos humanos da Primeira Contraente são insuficientes para responder a tal aumento de trabalho, que exige a contratação de um novo motorista permanente. Contudo, 4- E dado tratar-se de serviços extra, a Primeira Contraente não poderá garantir a manutenção do volume de serviços de transporte, pelo que o reforço dos meios humanos será temporário”.
* * *
III
Objecto do recurso.
1. Da validade do termo aposto no contrato de trabalho celebrado em 01.07.2015.
2. Do trabalho suplementar prestado e não pago.
* * *
IV
Da validade do termo oposto no contrato de trabalho celebrado em 01.07.2015.
Na sentença recorrida – considerando o teor da clª16ª supra transcrita – concluiu-se que o contrato de trabalho “contém uma justificação formalmente atendível para a contratação do Autor pelo prazo de 7 meses. Com efeito aí se refere que o trabalho do Autor que se tornou necessário por causa de serviços extra solicitados pelos clientes D… LDA e E… LDA e que tinham justamente uma duração previsível de 7 meses. Tal justificação encontra acolhimento no artigo 140º, nº2, al. f) do CT e respeita as exigências de forma do artigo 141º, nº3 do CT, já que contém factos concretos (designadamente quanto aos clientes que justificaram a contratação) e uma relação entre esses factos e o termo estipulado (7 meses). É certo que não estão descriminados os serviços extra solicitados por aqueles clientes, mas podendo os mesmos ser de diversa ordem, não nos parece exigir maior concretização. Por outro lado e embora seja certo que o Autor não trabalhou exclusivamente para aqueles clientes, não é menos certo que isso apenas ocorreu na fase final do contrato e justamente por decréscimo dos serviços anteriores. Nesse circunstancialismo e dado que o Autor foi substituir outro colega no serviço da F…, não podemos concluir que, aquando da sua contratação, a justificação invocada o foi apenas para iludir as disposições legais que regulam o contrato sem termo. Não vemos assim que haja motivo para considerar nula a estipulação do termo, seja por via da alínea a), seja por via das alíneas b) ou c) do nº1 do artigo 147º do CT” (…).
O apelante, apesar de não ter impugnado a decisão quanto à matéria de facto, começa por referir o seguinte: o Tribunal a quo não podia dar como provado o constante do ponto 16, pois do contrato de trabalho é impossível inferir essa factualidade, sendo que como está formulado o referido ponto, o mesmo reflecte uma conclusão e não um facto. O Tribunal poderia e deveria ter dado como provado que no contrato de trabalho consta como motivo justificativo o constante da clª16ª do contrato. Mas nunca poderia concluir – vertendo tal conclusão como sendo um facto provado – que aqueles clientes da Ré (D… e E…) tivessem solicitado efectivamente serviços acrescidos desde Julho de 2015 e com previsão de duração até início de 2016, tendo no entanto tais serviços decrescido já em Dezembro de 2015. E não podia fazê-lo porque do contrato de trabalho nada consta nesse sentido. Ora, do contrato de trabalho não consta com suficiência bastante quais os serviços extra que foram solicitados pelos clientes D… e E…, por isso, não podia o Tribunal a quo ter dado como provado o constante do ponto 16, devendo o mesmo ser eliminado dos factos provados.
Será o facto 16 – como defende o apelante – apenas uma conclusão?
Algumas vezes não é fácil distinguir o que é matéria de direito e o que é matéria de facto, quando os limites entre uma e outra são ténues ou se tocam.
Alberto do Reis defendia que “tudo o que sejam juízos de valor, induções, conclusões, raciocínios, valorações de factos, é actividade estranha e superior à simples actividade instrutória” – CPC anotado, volume 3, página 212.
Também Jorge Augusto Pais de Amaral refere que “os factos (matéria de facto) abrangem principalmente as ocorrências concretas da vida real. Os juízos de facto situam-se na meia encosta entre os puros factos (que ocorreram na planície terrena da vida) e as questões de direito (situadas nas cumeadas das normas jurídicas)” – Direito Processual Civil, 9ªedição, página 268.
António Abrantes Geraldes escreve que o juiz deve irradiar da base instrutória “as alegações com conteúdo técnico-jurídico, de cariz normativo ou conclusivo, a não ser que porventura tenham, simultaneamente, uma significação corrente e da qual não dependa a resolução das questões jurídicas que no processo se discutem” – Temas da Reforma do Processo Civil, volume 2, página 138.
O facto 16 – os clientes da Ré D… LDA e E… LDA solicitaram efectivamente serviços acrescidos desde Julho de 2015 e com previsão de duração até inícios de 2016, tendo no entanto tais serviços decrescido já em Dezembro de 2015 – apesar de não constar, de forma expressa, dos articulados, tem um conteúdo facilmente apreensível e compreensível e tem a ver com a veracidade do motivo aposto no contrato celebrado entre as partes, pelo que não encerra em si mesmo uma conclusão ou um juízo de valor. Questão diferente é o teor da clª16ª do contrato de trabalho, já que a mesma se prende com a justificação para a celebração do contrato a termo certo. E tendo já sido aditada à matéria de facto o teor da clª16ª do contrato de trabalho celebrado entre as partes nada mais cumpre dizer a tal respeito. Posto isto, podemos avançar.
O apelante defende que, ao contrário do que decidiu o Tribunal a quo, o contrato em causa não contém factos concretos justificadores da necessidade temporária da Ré. O simples facto de constar da clª16ª do contrato de trabalho o nome de 2 clientes, a quem a Ré imputa ter contratos de serviços de transporte extra, não é suficiente para se concluir que está estabelecida a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado, conforme prescreve o nº3 do artigo 141º do CT. Se esses serviços de transporte extra foram efectivamente contratados pelos clientes da Ré acima referidos, esta tinha a obrigação legal de transpor para o contrato de trabalho quais os serviços extra em concreto que foram contratados por aqueles clientes. Porém, a Ré não o fez, limitando-se a indicar o nome de 2 clientes seus para com isso arrogar-se no cumprimento legal da concretização dos factos que levam à contratação a prazo. Acresce que, tal foi dado como provado, a Ré é uma empresa que se dedica ao transporte rodoviário de mercadorias, sendo que a vida quotidiana de uma qualquer empresa desse sector é estar sujeita ao que as empresas, suas clientes, lhe solicitam em termos de distribuição de encomendas. Não podendo esses altos e baixos de cargas para transportar servir como motivo justificador para contratar a termo, uma vez que não se trata de uma necessidade temporária da empresa, mas sim uma realidade constante. Por outro lado, no contrato de trabalho não foi, tão pouco, alegada qualquer sazonalidade dos ditos serviços extra de transporte. Por isso, forçoso será concluir que a «justificação» apontada pela Ré não pode proceder, já que não obedece aos requisitos que, de forma pacífica, a Jurisprudência e a Doutrina têm vindo a fixar. Vejamos então.
Nos termos do artigo 140º, nº1 do C. do Trabalho de 2009 – aplicável ao caso tendo em conta a data da celebração do contrato a termo (01.07.2015) – “ O contrato de trabalho a termo resolutivo só pode ser celebrado para satisfação de necessidade temporária da empresa e pelo período estritamente necessário à satisfação dessa necessidade”, sendo que “ Considera-se, nomeadamente, necessidade temporária da empresa: acréscimo excepcional de actividade da empresa” (nº2, al. f) do citado artigo).
Susana Sousa Machado refere, quanto à al. f) do nº2 do artigo 140º do CT/2009, o seguinte: (…) “ os contratos previstos nestas situações correspondem, geralmente, a trabalhos inseridos no âmbito da actividade habitual da empresa mas que, por motivos excepcionais ou condições cíclicas potencialmente relacionadas com certas épocas do ano, excedem o seu volume normal; ou assumem um carácter ocasional no seio da actividade da empresa. Estamos, por exemplo, a pensar numa determinada encomenda que ultrapassa os níveis normais e habituais de produção da empresa.” – Contrato de Trabalho a Termo, A Transposição da Directiva 1999/70/CE para o Ordenamento Jurídico Português: (In)compatibilidades, página 171.
Também o artigo 141º, nº1, al. e) do C. do Trabalho exige que do contrato conste, entre outras formalidades, a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, devendo, nos termos do nº3 da mesma disposição legal, a mesma ser feita “ pela menção expressa dos factos que o integram, devendo estabelecer-se a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado”.
Do teor das citadas disposições legais decorre que não basta indicar no contrato de trabalho as menções referidas no artigo 140º, nº2 do C. do Trabalho, mas concretizar em factos essas menções. Esta é a posição de Susana Sousa Machado ao referir que (…) “a indicação do termo estipulado e do respectivo motivo justificativo, prevista no artigo 141º, nº3, do CT, deve ser feita pela menção expressa aos factos que o integram, sendo essencial estabelecer a relação entre a justificação invocada e o termo estipulado. Neste sentido, a fundamentação do contrato a termo deve constar do texto do contrato, com referência circunstanciada aos motivos que lhe servem de base. Assim, a exigência do nexo de causalidade entre a justificação invocada e o termo estipulado deve reflectir-se no elevado grau de precisão exigido na redacção da respectiva cláusula contratual. Tal indicação, que não é mais do que uma consequência do carácter excepcional da contratação a termo, deverá permitir o controlo da existência de uma necessidade temporária ou de outras situações previstas, designadamente, no artigo 140º, nº4, do CT, bem como a demonstração de que o mesmo é celebrado pelo período estritamente necessário à satisfação dessas necessidades” (…) – obra citada, páginas 200/201.
Cumpre, assim, verificar se o contrato de trabalho a termo obedeceu aos princípios enumerados.
Da matéria de facto provada resulta que as empresas D… LDA e E… LDA são clientes da Ré [o mesmo decorre do teor da clª16ª do contrato]. E se assim é, podemos concluir, recorrendo às regras da experiência, que elas, clientes, solicitam serviços de transporte à Ré, serviços que constituem a normal actividade desta. E dedicando-se a Ré ao transporte rodoviário de mercadorias tem ela de se organizar de modo a satisfazer, quando necessário, os pedidos dos seus clientes, incluindo a D… LDA e a E… LDA, organização essa que passa, naturalmente, por períodos de maior procura dos seus serviços e períodos de menos procura. Posto isto, há assim que analisar se na clª16ª constam os motivos excepcionais do acréscimo da actividade da Ré.
O texto da clª16ª do contrato – o presente contrato a termo resolutivo é motivado por um acréscimo excepcional e temporário da actividade da empresa, resultante da adjudicação à Primeira Contraente de diversos serviços de transporte extra solicitados pela sua cliente D… LDA e E… LDA. 2- Os serviços extra agora solicitados pelos clientes da Primeira Contraente e acima identificados terão a duração de sete meses, tendo o seu início em 01.07.2015, com final a 31.01.2016 – não permite saber se os serviços contratados por aqueles clientes constituíam uma excepção à normal actividade da Ré, ou então, se era um «pico» de actividade com carácter excepcional.
Na verdade, não é suficiente fazer constar do contrato de trabalho a realização de serviços de transporte extra ou serviços extra solicitados na medida em que não se concretiza, no contrato, a razão dessa denominação [as frases que deixamos assinaladas a itálico, e constantes da clª16ª do contrato a termo, são vagas e genéricas]. Será motivo para perguntar se no período compreendido entre 01.07.2015 e 31.01.2016 as referidas clientes da Ré não lhe solicitavam serviços de transportes e por isso a Ré os apelidou de transporte/serviços extras ou se outras razões, quais, ocorreram para que aquelas solicitações fossem consideradas extraordinárias/excepcionais.
Ou seja, não se indicam se os serviços solicitados para o período compreendido entre 01.07.2015 e 31.01.2016 constituíam um «acréscimo», «uma excepção» à actividade normal exercida pela Ré [actividade que, e como já referido, está sujeita a períodos de maior solicitação de serviços e outros de menor solicitação]. Uma «encomenda» feita por um cliente pode ser uma «encomenda extra» [porque vai além do que normalmente ele encomenda] mas isso pode não se reflectir na actividade normalmente exercida pela «pessoa» que satisfaz essa mesma encomenda. Daí a necessidade de concretizar no contrato a termo as razões que estiveram por detrás da contratação do Autor.
É certo que a Ré fez coincidir a duração do contrato do Autor com a duração dos serviços extra solicitados (7 meses) mas, como já referido, não identificou a causa e as circunstâncias concretas que determinaram, no âmbito da actividade de carácter permanente da Ré, a contratação do Autor pelo período de 7 meses, limitando-se a consignar no contrato de trabalho uma expressão de conteúdo vago.
Sem esses concretos factos não é possível “estabelecer uma real concretização da excepcionalidade do acréscimo de actividade, da relação entre o acréscimo e o termo estipulado e da relação entre o acréscimo e a concreta actividade para a qual o trabalhador foi contratado” [acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 14.11.2013, cujo sumário está publicado na CJ. Ano 2013, tomo V, página 326].
Conclui-se, assim, pela nulidade do termo aposto no contrato de trabalho, devendo considerar-se o mesmo sem termo, atento o disposto na al. c) do nº1 do artigo 147º do CT.
Deste modo, a declaração que a Ré remeteu ao Autor a comunicar a cessação do contrato em 31.01.2016 configura um despedimento ilícito – artigo 381º, al. c) do CT [mais adiante se conhecerá dos pedidos formulados pelo Autor relacionados com o seu despedimento].
* * *
V
Do trabalho suplementar prestado e não pago.
Na sentença recorrida julgou-se improcedente o pedido de pagamento de trabalho suplementar referindo-se o seguinte: (…) “cumpre averiguar se é dever da Ré proceder ao pagamento de trabalho suplementar prestado pelo Autor nos dias que descriminava nos artigos 37 a 47, todos coincidentes com sábados e domingos. Ora, o trabalho assim prestado apenas seria de considerar suplementar, com direito ao acréscimo remuneratório previsto na cláusula 41 do CCT aplicável, se e na medida em que os sábados e domingos fossem efectivamente e no caso do Autor de considerar como dias de descanso. Contudo, a Ré logrou demonstrar que assim não sucedia. Desde logo a cláusula 13 do contrato de trabalho estipulava um regime de horário flexível, com direito a 2 dias de descanso, mas a definir pela entidade empregadora. Por outro lado, e segundo a cláusula 20ª, nº1 e 2 do CCT, o dia de descanso semanal (obrigatório) coincidirá com o domingo, mas apenas sempre que possível, e o dia de descanso complementar pode ser fixado antes ou depois do dia de descanso semanal. Acresce que, mesmo face às normas legais (supletivas, no caso) do artigo 232º do CT, o dia de descanso semanal obrigatório pode deixar de ser ao domingo em certas actividades que não possam parar nesse dia. Nestes termos, não só a cláusula 13 do contrato era admissível como só perante as escalas de serviço fixadas pela Ré se poderia concluir e/ou apurar se os dias de sábado e domingo em que o Autor trabalhou eram efectivamente dias de descanso (podendo antes ser outros). Aliás, a Ré demonstrou que o Autor teve descanso em dias diversos, o que só denota não serem os sábados e domingos os dias de descanso normais ou fixados para o efeito. De notar ainda que o Autor se limitou a demonstrar o trabalho em alguns sábados e domingos e não já os períodos/números de horas de trabalho (nesses dias) que alegava na petição” (…).
O apelante discorda argumentando do seguinte modo: tendo em conta a matéria de facto dada como provada no ponto 15 e ainda que nos termos da clª20ª do CCT aplicável o domingo é o dia de descanso semanal e o sábado é o dia de descanso complementar, deveria a Ré ter sido condenada a pagar ao Autor a retribuição correspondente ao trabalho prestado naqueles dias. O facto de na clª13ª do contrato de trabalho não estar fixado os dias de descanso do Autor, reinando a absoluta discricionariedade, tal não significa que se tome tal cláusula como válida e como capaz de afastar o disposto no CCT aplicável. Acresce que a matéria de facto constante do ponto 18 dos factos provados não é a mesma coisa que dar como provado que os dias de descanso semanal e complementar do Autor foram gozados em determinados dias úteis. Aliás, efectuar descanso não é a mesma coisa que efectuar descanso semanal, já que naqueles dias constantes do ponto 18 podia o Autor ter efectuado descanso compensatório nos termos do disposto no nº5 da clª41ª do CCT. Analisemos então.
Antes do mais cumpre aqui referir que para se concluir pela existência de trabalho suplementar é preciso saber, em primeiro lugar, qual o horário de trabalho do Autor e, em segundo lugar, quais os dias e as horas em que o trabalho foi prestado para além do horário de trabalho e também se os sábados e os domingos eram dias normais de trabalho para o Autor.
O que consta da clª 13ª do contrato a termo [1- O período normal de trabalho será de quarenta horas semanais, oito horas diárias, prestado em regime de horário flexível, com dois dias de descanso semanal ficando a livre definição do horário de trabalho a cargo da Entidade Patronal, nos termos e dentro dos limites legais] é manifestamente insuficiente para se apurar qual o horário de trabalho do Autor, na medida em que aí apenas se faz referência aos limites máximos do período normal de trabalho semanal e diário e relativamente ao horário de trabalho usou-se um conceito vago, sem qualquer concretização.
Da análise da petição inicial decorre que o Autor reclamou trabalho prestado em dias de descanso semanal, complementar e feriados, ou seja, o Autor sem indicar, especificadamente, o seu horário de trabalho considera que os domingos e sábados, nos termos da clª20ª do CCT aplicável, são dias de descanso obrigatório e complementar, respectivamente, ou seja, praticava um horário de segunda a sexta-feira, descansando ao sábado e ao domingo. O Tribunal a quo não deu como provado que o horário de trabalho do Autor era de 2ª a 6ª feira, pelo que o facto de se ter provado que ele trabalhou alguns sábados e alguns domingos não significa que trabalhou em dias de descanso. Ora, ao não ter provado o seu horário de trabalho – o que era seu ónus – terá o Autor neste particular de ver o seu pedido improceder. Mas avancemos.
Segundo o disposto na clª20ª do CCT aplicável – factos provados sob o nº7, 8 e 9 – “1. O dia de descanso semanal coincidirá sempre que possível com o domingo. 2. O dia de descanso completar tem de ser fixado imediatamente antes ou a seguir ao dia de descanso semanal”.
Do teor do nº1 da referida cláusula resulta, ao contrário do defendido pelo apelante, que o dia de descanso semanal não é obrigatoriamente o domingo. Por isso, competia ao Autor alegar e provar qual o horário de trabalho que cumpriu ao longo da relação de trabalho existente com a Ré, o que não logrou fazer.
Improcede, assim, a sua pretensão neste particular.
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VI
Dos créditos do Autor e da ampliação do objecto do recurso a requerimento da Ré.
Como decorre da acta de audiência de julgamento do dia 13.02.2017 o Autor optou pela indemnização. Assim, cumpre aqui fixá-la.
Nos termos do artigo 391º, nº1 do CT “Em substituição da reintegração, o trabalhador pode optar por uma indemnização, até ao termo da discussão em audiência final de julgamento, cabendo ao tribunal determinar o seu montante, entre 15 e 45 dias de retribuição base e diuturnidades, atendendo ao valor da retribuição e ao grau de ilicitude decorrente da ordenação estabelecida no artigo 381º”.
Sobre o referido artigo considerámos oportunas as considerações feitas por Pedro Furtado Martins, ao referir que “ A variabilidade da indemnização permite um tratamento diferenciado de situações materialmente diversas, o que se afigura uma boa solução. Desde logo, porque não se justifica sancionar do mesmo modo todos os despedimentos ilícitos, dando igual tratamento aos que não tenham sido antecedidos de nenhum procedimento ou cujo fundamento seja patentemente inexistente ou insuficiente e aos realizados com observância do procedimento devido e invocação de motivos sérios e reais, mas que o tribunal veio a considerar insuficientes para fundamentar a cessação do contrato, mercê de especiais circunstâncias do caso concreto ou apenas de uma diferente avaliação da relevância da motivação apresentada pelo empregador” (…) – Cessação do Contrato de Trabalho, 3ªedição, página 502/503.
No caso dos autos há que atender aos seguintes elementos: a) o despedimento do Autor ocorreu sem observância do formalismo legal – artigo 381º al. c) do CT – no pressuposto da existência de um contrato de trabalho a termo válido; b) o salário base do trabalhador era de €575,00 mensais; c) a antiguidade do trabalhador, na presente data é de 2 anos – artigo 391º, nº2 do CT – sendo que a indemnização não pode ser inferior a 3 meses de retribuição base e diuturnidades – nº 3 do artigo 391º do CT; d) a retribuição mínima mensal garantida era, na data do despedimento (31.01.2016) de € 505,00 – DL nº144/2014 de 30.09.
Ora, tudo ponderando, afigura-se-nos perfeitamente adequada à situação em análise a fixação da indemnização em 30 dias de retribuição base por cada ano de antiguidade ou fracção, e que nesta data monta ao valor de €1.725,00 [575,00 x 3 meses]. A esta quantia acrescem os juros de mora, à taxa de 4% ao ano, contados desde a data do presente acórdão e até efectivo e integral pagamento.
Para além da referida quantia tem o Autor direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde 13.06.2016 – artigo 390º, nº1 e nº2, al. b) do CT – até ao trânsito em julgado do presente acórdão, deduzido do eventual subsídio de desemprego que tenha auferido – al. c) do nº2 do artigo 390º do CT – a determinar em incidente de liquidação nos termos do artigo 609º, nº2 do CPC. A esta quantia acrescem os juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados da data da decisão proferida no incidente de liquidação.
Passemos à ampliação do âmbito do recurso a requerimento da Ré.
As questões relativas à indemnização por despedimento, em vez da reintegração, bem como a aplicação do determinado nas alíneas b) e c) do nº2 do artigo 390º do CT, já foram tratadas, oficiosamente, no acórdão, pelo que aqui não há que conhecer delas.
Resta, assim, a questão da dedução do montante de €201,25 pago pela Ré a título de compensação pela cessação do contrato a termo por caducidade.
Tal matéria consta do artigo 57 da contestação. Da matéria de facto dada como assente nada ficou provado a respeito de tal pagamento. Acresce que no artigo 55 da contestação a Ré alegou que o Autor se encontrava a trabalhar pelo que não teria direito a peticionar qualquer quantia, invocando o determinado no nº2 do artigo 390º do CT. Sobre tal matéria nada ficou a constar da factualidade provada.
A Ré não veio impugnar a decisão sobre a matéria de facto em especial a alegada nos artigos 55 e 57 da contestação, o que poderia ter feito ao abrigo do artigo 636º, nº2 do CPC. Sem tal impugnação não é possível conhecer de tais questões por inexistência de factos a sustentar tais pretensões.
Deste modo, e com tais fundamentos, não se conhece da requerida ampliação do objecto do recurso na parte em que se requereu a dedução à indemnização por despedimento ilícito da quantia de €201,25 e a dedução das quantias auferidas pelo Autor com a cessação do contrato de trabalho (artigo 390º, nº2, al. a) do CT).
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Termos em que se julga a apelação parcialmente procedente, se revoga a sentença recorrida na parte em que não declarou a nulidade da clª16ª do contrato de trabalho, se substitui pelo presente acórdão e, consequentemente
1. Se condena a Ré a reconhecer o Autor como contratado sem termo desde 01.07.2015.
2. Se condena a Ré a reconhecer a ilicitude do despedimento declarado ao Autor em 31.01.2016.
3. Se condena a Ré a pagar ao Autor as retribuições que deixou de auferir desde 13.06.2016 – artigo 390º, nº1 e nº2, al. b) do CT – até ao trânsito em julgado do presente acórdão, deduzido do eventual subsídio de desemprego que tenha auferido – al. c) do nº2 do artigo 390º do CT – a determinar em incidente de liquidação nos termos do artigo 609º, nº2 do CPC. A esta quantia acrescem os juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, contados desde a data do trânsito da decisão a proferir no incidente de liquidação e até efectivo e integral pagamento.
4. Se condena a Ré a pagar ao Autor a indemnização a que alude o artigo 391º nº1 do CT, que se fixa em 30 dias de retribuição base por cada ano de antiguidade ou fracção, e que nesta data monta ao valor de €1.725,00 [575,00 x 3 meses]. A esta quantia acrescem os juros de mora, à taxa de 4% ao ano, contados desde a data do trânsito do presente acórdão e até efectivo e integral pagamento.
5. No mais se confirma a decisão recorrida.
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Custas em ambas as instâncias a cargo do Autor/apelante e da Ré/apelada na proporção de 1/3 e 2/3 respectivamente, sem prejuízo da isenção de que goza o primeiro.
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Porto, 26.06.2017
Fernanda Soares
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho