Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
126/16.9T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: DOMINGOS MORAIS
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO SEM TERMO
CONTRATO DE TRABALHO COM TERMO
COEXISTÊNCIA TEMPORAL
Nº do Documento: RP20170626126/16.9T8MAI.P1
Data do Acordão: 06/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÕES EM PROCESSO COMUM E ESPECIAL (2013)
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL) (LIVRO DE REGISTOS Nº 259, FLS 153-162)
Área Temática: .
Sumário: I - Vigorando 2 contratos de trabalho, com a mesma ré, um, sem termo, mais antigo e outro, com termo, mais recente, deve concluir-se que este colocou termo ao mais antigo, revogando-o.
II - Se a autora pede a indemnização em substituição da reintegração, existe uma incompatibilidade entre aquele pedido e a realidade da existência do trabalho a termo, cuja caducidade lhe foi comunicada em tempo oportuno.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 126/16.9T8MAI.P1
Origem: Comarca do Porto-Maia-Inst. Central-2ª S. Trabalho-J1
Relator - Domingos Morais - registo 679
Adjuntos - Paula Leal Carvalho
Rui Penha

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

IRelatório
1. – B... intentou acção comum emergente de contrato individual de trabalho, na Comarca de Porto-Maia-Inst. Central-2ª S. Trabalho-J1, contra
C..., Lda, ambos nos autos identificados, alegando, em resumo, que:
“A Autora tem a categoria profissional de cabeleireira, tendo verbalmente celebrado contrato de trabalho com a empresa D... em Outubro de 2005.
Auferindo, normalmente, o montante de 1.000,00€ por mês a título de retribuição.
Em finais de 2014, a empresa D... transmitiu o estabelecimento sito no centro comercial E..., Estrada Nacional .., loja . e ., à empresa C..., Lda., aqui Ré.
Em Dezembro de 2014, o sócio-gerente da Ré, Sr. F..., reuniu-se com os trabalhadores da D... afim de saber quem iria continuar ao serviço desta e quem iria transitar para a nova empresa, aqui Ré.
Nessa reunião ficou combinado que quem transitasse para a nova empresa não perderia os direitos adquiridos na D....
Nesses termos, a Autora decidiu transitar para a Ré, ficando ao serviço da mesma, sob sua direção, autoridade e fiscalização.
Optou pela transição pois já possuía uma carteira de clientes vasta naquele estabelecimento, o que constituía também uma vantagem para a Ré.
Assim, deixou de prestar serviço para a D... em 31.12.2014, passando a prestar serviço para a C..., Lda. a partir de 01.01.2015.
Certo é que, do dia 01 ao dia 15 de janeiro a Autora aguardou em casa que a contactassem pois durante esse período procederam a alterações da disposição de todo o mobiliário que se encontrava no estabelecimento.
E a partir do dia 16.01.2015 começou a laborar.
Em 09.03.2015, para seu total espanto, receciona uma missiva da Ré a informar da “oposição à renovação do contrato de trabalho”, produzindo os seus efeitos em 25.04.2015.
Ora, só nesse exato momento é que a Autora refletiu e teve conhecimento que o documento que assinou em fevereiro, muito depois do inicio efetivo do seu trabalho, era um contrato de trabalho a termo.”
Terminou, pedindo:
Nestes termos e nos mais que V. Exa. doutamente suprirá, deve a presente ação ser declarada totalmente procedente, por provada, e em consequência:
a) Ser o despedimento da Autora ser declarado ilícito, por se estar perante um contrato sem termo dada a transmissão da posição da anterior empregadora para a Ré;
b) Ou caso assim não se entenda, que seja declarado o despedimento da Autora ilícito por se estar perante um contrato sem termo, dada a violação das formalidades legalmente exigidas;
c) Condenar-se a Ré a pagar à Autora o valor das retribuições já vencidas, desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença final, nos termos do disposto no art.º 390.º do CT, que nesta data corresponde a 6.600,00€;
d) Condenar-se a Ré ao valor da indemnização, prevista no n.º 1 do art.º 391.º do CT, a qual deverá ser fixada em 45 dias de retribuição base, que nesta data corresponde ao valor de 5.640,00€, em substituição da integração;
e) Ao montante correspondente aos créditos de horas de formação profissional no valor de 416,25€;
f) Ao montante correspondente à percentagem calculada em função do atendimento de clientes, de janeiro e fevereiro, no montante de 800,00€;
g) Ser a Ré condenada no pagamento da quantia de 2.000,00€ a título de danos morais pelo despedimento ilícito;
h) Ser ainda a Ré condenada no pagamento dos juros vincendos à taxa legal de 4% sobre as quantias peticionadas, contabilizados desde a citação da Ré e até integral e efetivo pagamento.”.
2. - Frustrada a conciliação na audiência de partes, a ré contestou, excepcionando a caducidade da acção e o erro na forma de processo, e impugnando os factos essenciais da causa de pedir, e alegando, em resumo, que a relação contratual cessou por não renovação do contrato de trabalho a termo celebrado com a autora.
Termina, concluindo:
“Termos em que deve a presente contestação ser admitida e consequentemente:
a) Deve a presente acção ser julgada totalmente improcedente por não provada com a consequente absolvição da Ré dos pedidos;
Mais,
b) Deve a Autora ser condenada como litigante de má fé em custas, multa, procuradoria e o demais legalmente previsto, bem como em indemnização condigna a pagar à Ré, valor este a fixar segundo o prudente arbítrio do Tribunal, mas nunca em montante inferior a 20% do valor da presente acção.”.
3. – A autora respondeu, concluindo pela improcedência das excepções deduzidas pela ré.
4. – No despacho saneador, não foi admitida a resposta da autora, por extemporânea; foi fixado o valor da acção em € 15.456,25; e foram julgadas improcedentes “a exceção dilatória de erro na forma do processo” e a “exceção de caducidade do direito de ação.”.
5. - Realizada a audiência de discussão e julgamento e decidida a matéria de facto, a Mma Juiz proferiu decisão:
“Julga-se a presente ação parcialmente procedente, por provada, em consequência:
1) Declarando-se ilícito o despedimento da autora perpetrado pela ré em 25.04.2015;
2) Condenando-se a ré a pagar à autora a quantia de € 1.800,00, a título de indemnização a que alude o artigo 393.º/2, al. a) do Código do Trabalho, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença e até efetivo e integral pagamento;
3) Condenando-se a ré a pagar à autora a quantia de € 180,00, a título de compensação a que alude o artigo 344.º/2 do Código do Trabalho acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data do trânsito em julgado da presente sentença e até efetivo e integral pagamento;
4) Condenando-se a ré a pagar à autora a quantia de € 62,28, a título de formação não ministrada, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano, desde a data da citação e até efetivo e integral pagamento.
Custas por autora e ré, na proporção do vencimento-decaimento, sem prejuízo do apoio judiciário de que aquela beneficia.”.
6. - A autora, inconformada com a parte da decisão desfavorável, apresentou recurso de apelação, concluindo:
“I. A Douta Sentença deu como provados os factos vertidos nos pontos 6/7/20/28 e 30, constantes do capítulo IV, no entanto, nada concluiu em relação a esses factos, havendo uma clara falta de fundamentação da Douta Sentença, desde logo, por contradição entre os factos dados como provados e os dados como não provados e a efetiva conclusão da Sentença, em que não condena a Recorrida pelos factos dados como assentes.
II. O Tribunal a quo reconheceu o termo aposto no contrato de trabalho como válido apesar de não ter sido celebrado pelo prazo permitido na lei (art.º 148.º/2 do CT).
III. O que a Recorrente discorda completamente, desde logo, primeiramente, porque a execução do trabalho efetivo iniciou-se (em 17.01.2015) muito antes da celebração do contrato escrito (23.01.2015), para além do facto de nunca ter sido entregue qualquer cópia ou original do contrato de trabalho à Recorrente.
IV. Tal como se prova em audiência de julgamento, através da inquirição da testemunha G..., no dia 24.05.2016, em que diz “Não porque nós a meio, começamos a trabalhar a 17, no inicio, no final do mês de janeiro”(08:45 a 11:10).
V. E, de igual modo, na inquirição da mesma testemunha, se retira que “não deram o contrato logo que entramos para lá, só foi assinado depois para aí um mês ou quinze dias para aí é que nos deram o contrato” (10:45 a 10:53).
VI. Bem como, ficou provado que não foi entregue cópia/original do contrato (de 18:09 a 18:32) Advogada da A.: Sabe se na altura a D. B... assinou o contrato e ficou com uma cópia?; Testemunha G...: Não, não. A D. B... na altura assinou os dois contratos e entregou-mos a mim e eu deixei-os na receção. Porquê, porque não estavam assinados pelo patrão; Advogada da A.: e depois ela voltou a recebê-los assinado pelo…;Testemunha G...: não, não, não. Depois houve aquela confusão toda e não…
VII. Como também se prova pela inquirição da testemunha H..., no dia 24.05.2016: (de 03:40 a 05:00) Advogada da A.: sabe mais ou menos quando a sua mãe começou a trabalhar lá? Testemunha H...: talvez em janeiro deste ano, perto da altura do natal. (…) Testemunha H...: Foi o ano passado (04:53) foi em dezembro de 2014 e passou para 2015. (…) logo, mais ou menos, em janeiro. (05:00).
VIII. Conclui-se com o exposto que a laboração da Recorrente na empresa da Recorrida iniciou-se antes da celebração do contrato de trabalho, em 17.01.2016, devendo esse facto ser dado como procedente, por provado, com as demais consequências legais;
IX. Bem como, também se conclui, pela prova produzida em sede de audiência de julgamento que a Recorrente não ficou com nenhuma cópia do contrato de trabalho celebrado com a Recorrida. Assim, deve esse facto ser tido como procedente, por provado, com as demais consequências legais.
X. Assim, quer quanto à não entrega do contrato de trabalho à Recorrente, quer quanto à data da celebração do contrato ser posterior à execução efetiva do trabalho prestado pela Recorrente, resulta claro que estamos perante um contrato de trabalho sem termo, por, desde logo, violação dos princípios consagradores do direito ao trabalho e à liberdade do trabalhador/a e do, consequente, direito à informação.
XI. A promessa de contrato foi feita na reunião anterior ao início da execução do trabalho, em dezembro de 2014; aí foi estabelecido o acordo entre Recorrida e Recorrente, pelo que, iniciando o seu trabalho em 17.01.2015, sem que tivesse celebrado qualquer contrato de trabalho, na forma escrita, presume-se que este seja sem termo, regendo-se pelo acordado verbalmente com a empresa. Firmando-se aí a convicção da Recorrente estar perante um contrato de trabalho sem limitação temporal.
XII. Consequentemente, nos termos do disposto no art.º 390.º do CT, por todo o já explanado, deve ser declarado como contrato sem termo, dada a violação das formalidades legalmente exigidas, sendo assim condenada a Ré ao pagamento das retribuições já vencidas, desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença final, nos termos do art.º 390.º CT.
XIII. Bem como, ser condenada a Ré ao pagamento de uma indemnização, cfr. n.º 1 do art.º 391.º do CP;
XIV. Pese embora ter sido dado como provado o facto de a Recorrida acordar com a Recorrente o pagamento de comissões de 15% a 20% caso a empresa facturasse o montante de 2.750,00€ (sem IVA) com o serviço prestado pelo Recorrente, igualmente, como deu como provado que nunca foi paga qualquer quantia a título de comissão, apesar de devida, o Tribunal a quo veio julgar improcedente o respetivo pagamento do montante relativo às comissões devidas pelo trabalho efetuado nos meses de janeiro e fevereiro, no montante global de 800,00€.
XV. Não havendo qualquer fundamentação para a improcedência, visto ter-se dado como provado ter sido acordado entre as partes, que a Recorrente cumpriu os pressupostos para receber as comissões e bastando efetuar o cálculo da percentagem de 15% sobre o valor estipulado de 2.750,00€ para se chegar ao montante a pagar à Recorrente, a título de comissões.
XVI. Devendo, para esse efeito, o Tribunal ad quem considerar como procedente, por provado, o pedido de pagamento de dois meses de comissão devia, no montante de 800,00€.
Termos em que, deve o recurso interposto pela Autora ser dado como procedente, atentos os fundamentos supra invocados.
Consequentemente, revogando-se a Sentença proferida pelo Tribunal a quo, nos termos ora aduzidos, com todas as consequências legais.
Assim se fazendo inteira JUSTIÇA!”.
7. - A ré não contra-alegou.
8. - O M. Público, junto deste Tribunal, pronunciou-se pela procedência parcial do recurso de apelação.
9. - Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.

II. - Fundamentação de facto
1. - Na 1.ª instância foi proferida a seguinte decisão de facto:
“A – Factos provados
1) A Autora tem a categoria profissional de cabeleireira.
2) A autora prestou a sua atividade para a empresa “D...”, no estabelecimento sito no centro comercial E..., Estrada Nacional .., loja . e ..
3) A autora deixou de prestar serviço para a “D...” em 31.12.2014.
4) Nas primeiras semanas de janeiro de 2015 realizaram-se obras no estabelecimento referido em 2).
5) Do recibo de remunerações de fls. 12 v.º dos autos constam 40 horas extra.
6) As partes acordaram o pagamento de uma retribuição mensal de 600,00 € (seiscentos euros), acrescendo o subsídio de alimentação, mais uma percentagem não concretamente apurada, mas entre 15% e 20% do apuro total de cada mês, sendo devida a percentagem sempre que a ré, com o trabalho da autora, auferisse mais de 2.750,00 € (sem IVA).
7) Percentagem essa que nunca auferiu.
8) A autora auferiu a retribuição mensal de 600,00€, subsídio de alimentação e frações proporcionais dos subsídios de natal e férias.
9) No dia 26.02.2015, a autora encontrava-se a trabalhar quando, a hora não apurada, dirigiu-se ao gabinete para se reunir, em privado, com a D. G... e a D. I..., colegas de trabalho, quando outra colega, D. J..., apercebendo-se que estariam as três reunidas nesse gabinete, entra de rompante gritando “estão a falar de mim!”
10) A autora e suas colegas estavam a conversar sobre um episódio ocorrido dias antes que envolvia essa mesma colega.
11) A D. J... desmaiou, sem mais e sem ninguém prever tal desfecho.
12) Na altura, a D. I... decidiu suspender a autora e a D. G... por três dias.
13) A D. I... não é sócia gerente da ré,
14) A autora não contrariou e aceitou essa ordem.
15) No dia 02.03.2015, quando a autora foi trabalhar, foi-lhe apresentado o doc. junto aos autos a fls. 15, o qual informava a autora que a partir daquela data ficaria suspensa até findar o procedimento disciplinar que ainda havia de ser instaurado.
16) Tal documento que foi assinado por K..., administrativo da ré.
17) A autora recusou-se assinar tal documento.
18) A autora enviou à ré a carta junta a fls. 18 e v.º, datada de 03.03.3015, onde pede esclarecimentos e informa o que, na sua versão, teria sucedido no dia 26.02.2015.
19) Nunca qualquer procedimento disciplinar foi instaurado à autora.
20) No dia 09.03.2015, a autora rececionou a carta junta aos autos a fls. 19, enviada pela ré e datada de 02.03.2015, com o seguinte teor:
“… Vimos pela presente comunicar a V. Exa. a nossa oposição à renovação do contrato de trabalho celebrado entre esta empresa e V. Exa., com efeitos a partir do dia 25 de abril de 2015. …”.
21) A esta carta respondeu a autora por carta datada de 12.03.2015 (documento junto aos autos a fls. 20-22), à qual a ré, por seu turno, respondeu por carta datada de 23.03.2015 (documento junto aos autos a fls. 25) – documentos cujos teores aqui se dá por integralmente reproduzidos.
22) A atividade desenvolvida pela “D...” e pela ré é a mesma.
23) Do contrato de trabalho celebrado por G... consta: “o contrato é celebrado a termo certo, pelo período de três meses, nos termos do art.º 140.º da Lei n.º7/2009, de 12 de Fevereiro, com a última alteração na Lei n.º 47/2012 de 29 de Agosto.” (cláusula segunda).
24) A ré não proporcionou à autora formação.
25) A autora sempre adorou o que fazia e sempre se dedicou de corpo e alma ao seu trabalho.
26) A autora viu-se sem a retribuição mensal que lhe permitia fazer face às suas despesas e encargos mensais.
27) A autora não teve direito a subsídio de desemprego.
28) A autora ficou afetada psicologicamente, com ansiedade e nervosismo que afetaram o seu dia-a-dia e o seu descanso.
29) A autora assinou o recibo de vencimento junto a fls. 13 v.º dos autos.
30) Da carta envida pela autora à ré datada de 12.03.2015, consta:
“… 22. Ao arrepio das negociações, e acordos firmados, no sentido do início do contrato ser em 1 de janeiro de 2015, e, em contradição com a efetiva execução, que teve início em 16 de janeiro de 2015, a firma apresentou um texto para assinar, que julguei corresponder ao negociado, e verifico agora que se trata de contrato por prazo de 3 meses, com período de experiência de um mês, com início em 22 de janeiro de 2015 e termo em 21 de abril de 2015.
23. fui enganada, porque nunca negociei tais condições, nem as aceitaria em troca de manutenção do contrato por tempo indeterminado coma D..., e ainda mais com um período experimental de 30 dias, que permitiria a cessação do contrato sem fundamento, … quando eu, ao permanecer no estabelecimento, mantive a fidelidade de uma série de clientes e, em cerca de um mês e meio, aviei 363 clientes. (…)
25. E mais: sendo a vossa firma sedeada em Paços de Ferreira, foi aposto, na 16.ª cláusula, que o Tribunal competente para dirimir qualquer questão seria o Tribunal de Lisboa, com o objetivo de dificultar a defesa dos meus direitos. …”.
31) A ré passou a ocupar o espaço anteriormente ocupado pela “D...”.
32) A ré não celebrou qualquer tipo de contrato com a “D...”.
33) As sociedades “D...” e “C...” não negociaram o quer que seja, a segunda não pagou à primeira qualquer quantia, nem adquiriu qualquer bem à primeira.
34) A sociedade “D...” decidiu cessar o contrato que tinha com o proprietário da loja e “seguiu a sua vida”.
35) A ré contratou, em janeiro de 2015, com a sociedade “L..., S.A.” um “Contrato de Utilização de Loja em Galeria Comercial”.
36) Com vista a iniciar a sua atividade naquele espaço, a ré teve de proceder a obras na loja e à aquisição dos necessários equipamentos para desenvolver a sua atividade.
37) A ré não aproveitou nada da “D...”, até porque nada foi deixado. 38) Muitos dos que trabalhavam naquele local para a “D...”, foram deslocados para outros salões.
39) Os clientes do cabeleireiro são os clientes que fazem compras no Centro Comercial E....
40) A autora cessou atividade junto da Autoridade Tributária com efeito a 04.08.2015.
41) Com data de 23.01.2015, foi celebrado entre autora e ré o contrato de trabalho junto aos autos a fls. 75-77, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
42) É do seguinte teor a cláusula 2.ª de tal contrato: “o contrato é celebrado a termo certo, pelo período de três meses, nos termos do artigo 140.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com a última alteração na Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto”.
43) É do seguinte teor o n.º1 da cláusula 7.ª de tal contrato: “o presente contrato é celebrado por tempo determinado, nos termos da al. a) do n.º4 do artigo 140.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro: Código do Trabalho, tendo início e produzindo os seus efeitos a partir do dia 26 de janeiro de 2015 e fim em 25 de abril de 2015, em virtude da entidade patronal ter sido constituída em 18 de dezembro de 2014 e iniciado recentemente a laboração”.
44) A ré é uma sociedade comercial que foi constituída em 18.12.2014.
45) A ré tinha e tem menos de 750 trabalhadores.
46) A autora começou a laborar para a ré, a partir do dia 17.01.2015”.
47) A autora não ficou com o original, nem com cópia, do contrato referenciado nos pontos 41 a 43) dos factos provados. – os pontos 46) e 47) foram aditados, conforme fundamentação infra.

B – Factos não provados
a) A autora celebrou verbalmente um contrato de trabalho com a empresa D... em Outubro de 2005.
b) Quando prestou a sua atividade para a “D...”, a autora auferia retribuição mensal variável, calculada em função do número de clientes atendidos em cada mês, sendo que pagariam a percentagem de 40% no atendimento de homens e 30% pelo atendimento de mulheres.
c) Trabalhando a autora quase que exclusivamente, nos últimos três anos, só no atendimento de homens.
d) Auferindo, normalmente, o montante de 1.000,00€ por mês a título de retribuição.
e) Em finais de 2014 a empresa D... transmitiu o estabelecimento sito no centro comercial E..., Estrada Nacional .., loja . e ., à empresa “C..., Lda.”.
f) Em Dezembro de 2014, o sócio-gerente da Ré, Sr. F..., reuniu-se com os trabalhadores da “D...”, afim de saber quem iria continuar ao serviço desta e quem iria transitar para a nova empresa, aqui Ré.
g) Nessa reunião ficou combinado que quem transitasse para a nova empresa não perderia os direitos adquiridos na “D...”.
h) Nesses termos, a autora decidiu transitar para a ré, ficando ao serviço da mesma, sob sua direção, autoridade e fiscalização.
i) Optou pela transição pois já possuía uma carteira de clientes vasta naquele estabelecimento, o que constituía também uma vantagem para a ré.
j) A autora passou a prestar serviço para a ré em 01.01.2015.
k) Do dia 01 ao dia 15 de janeiro, a autora aguardou em casa que a contactassem.
l) A autora começou a laborar a partir do dia 16.01.2015. (passou a constar dos factos provados)
m) Nesse dia, entrou ao serviço às 14 horas e saiu à 01:30 horas.
n) Nos dias seguintes fez os sequentes horários: dia 17.01.2015, das 11 horas às 23 horas; dia 18.01.2015 (que era dia de folga), das 11 horas às 16 horas; dia 19.01.2015, das 9 horas às 16 horas; dia 20.01.2015, das 9 horas às 17 horas; e dia 21.01.2015, das 9 horas às 18 horas.
o) Desde o dia 17.01.2015 até ao dia 31.01.2015, atendeu a autora 154 clientes e do dia 01.02.2015 ao dia 26.02.2015 atendeu 209 clientes.
p) O documento referido em 16) foi assinado na presença da autora.
q) Nunca foi explicado à autora o porquê da sua suspensão.
r) Só aquando do referido em 20), a autora refletiu e teve conhecimento que o documento que assinou em fevereiro, muito depois do início efetivo do seu trabalho, era um contrato de trabalho a termo.
s) A autora não ficou com o referido contrato, nem com cópia. (passou a constar dos factos provados)
t) Era convicção da autora que o contrato de trabalho era sem termo e que contemplava todo o acordado na reunião tida em dezembro de 2014, que a convenceu a transitar para a empresa da ré
u) Caso tivesse percebido que estaria a assinar um contrato de trabalho a termo, a autora não ficaria a trabalhar com a ré e continuaria a laborar com a empresa “D...”.
v) A “D...” não pagou à autora qualquer indemnização pela cessação do contrato de trabalho.
w) No estabelecimento referido em 2), após a ré aí passar a laborar, os bens móveis mantiveram-se, assim como a clientela.
x) G... celebrou com a ré contrato de trabalho na mesma altura que a Autora.
y) O referido contrato é exatamente igual ao celebrado com a autora.
z) A autora incumpriu com o pagamento do empréstimo bancário, por não conseguir mais suportar tal pagamento.
aa) A autora teve de contrair dívidas, por não conseguir dar resposta aos compromissos que só assumiu por pensar na segurança do seu emprego.
bb) A autora não conseguia adormecer sem a ajuda de medicamentos.
cc) A autora está na posse do documento referido em 41).
dd) A autora tinha perfeito conhecimento que a ré era uma sociedade acabada de constituir.
ee) Aquando do referido em 20), o volume de negócio da ré não justificava a manutenção de tantos trabalhadores.”.

III. – Fundamentação de direito
1. - Atento o disposto nos artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.ºs 1 e 2, ambos do Código de Processo Civil (CPC), aplicáveis por força do artigo 1.º, n.º 2, alínea a) e artigo 87.º do Código de Processo do Trabalho (CPT), e salvo questões de conhecimento oficioso, os objectos dos recursos estão delimitados pelas conclusões dos recorrentes, supra transcritas.
Mas essa delimitação é precedida de uma outra, qual seja a do reexame de questões já submetidas à apreciação do tribunal recorrido, isto é, o tribunal de recurso não pode criar decisões sobre matéria nova, matéria não submetida ao exame do tribunal de que se recorre.

2. - Objecto do recurso:
- A reapreciação da matéria de facto,
- A natureza e forma de cessação do contrato de trabalho celebrado pelas partes.
- O direito às comissões, no valor de 800,00€.

4. - A reapreciação da matéria de facto.
4.1. - Atento o disposto no artigo 662.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil (CPC), o Tribunal da Relação deve alterar a decisão da 1.ª instância sobre a matéria de facto, “se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
Para o efeito da alteração da decisão de facto, o artigo 640.º, do novo CPC, dispõe:
1 - Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida.
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2 - No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exactidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo da possibilidade de poder proceder à respectiva transcrição dos excertos que considere relevantes; (…)”.
No presente caso, a recorrente cumpriu o ónus que sobre si impendia, por força do citado normativo, com excepção no que reporta ao ponto 14), como a seguir explicaremos.

4.2. – A ré impugna a decisão sobre a matéria de facto quanto às alíneas l) - “A autora começou a laborar a partir do dia 16.01.2015” - e s) - “A autora não ficou com o referido contrato, nem com cópia.” - dos factos não provados, considerando que devem integrar os factos provados, indicando, como prova, os depoimentos das testemunhas G... e H....

4.3. - Ouvida toda a prova testemunhal gravada, mormente, os depoimentos das testemunhas indicadas pela recorrente, é possível concluir-se que a autora reiniciou funções, para a ora ré, em meados de janeiro de 2015, mais, precisamente, no dia 17, no dizer da testemunha G..., colega de trabalho da autora. Esta mesma testemunha afirmou que o contrato a termo apresentado pela ré, apenas foi assinado pela autora duas ou três semanas depois do dia 17 de Janeiro, não lhe tendo a ré entregue cópia do mesmo.
Já a testemunha H..., filha da autora, não precisando, disse que o reinício de funções da mãe ocorreu no início de Janeiro de 2015.
Assim, as alíneas l) e s) dos factos não provados passam a integrar os factos provados, sob os números 46) e 47), com a seguinte redacção:
46) - “A autora começou a laborar para a ré, a partir do dia 17.01.2015” e
47) - “A autora não ficou com o original, nem com cópia, do contrato referenciado nos pontos 41 a 43) dos factos provados.”.

5. - A natureza e forma de cessação do contrato de trabalho celebrado pelas partes e suas consequências.
5.1. - Nas suas conclusões de recurso, a autora alegou:
“(…).
II. O Tribunal a quo reconheceu o termo aposto no contrato de trabalho como válido apesar de não ter sido celebrado pelo prazo permitido na lei (art.º 148.º/2 do CT).
III. O que a Recorrente discorda completamente, desde logo, primeiramente, porque a execução do trabalho efetivo iniciou-se (em 17.01.2015) muito antes da celebração do contrato escrito (23.01.2015), para além do facto de nunca ter sido entregue qualquer cópia ou original do contrato de trabalho à Recorrente.
(…).
VIII. Conclui-se com o exposto que a laboração da Recorrente na empresa da Recorrida iniciou-se antes da celebração do contrato de trabalho, em 17.01.2016, devendo esse facto ser dado como procedente, por provado, com as demais consequências legais;
IX. Bem como, também se conclui, pela prova produzida em sede de audiência de julgamento que a Recorrente não ficou com nenhuma cópia do contrato de trabalho celebrado com a Recorrida. Assim, deve esse facto ser tido como procedente, por provado, com as demais consequências legais.
X. Assim, quer quanto à não entrega do contrato de trabalho à Recorrente, quer quanto à data da celebração do contrato ser posterior à execução efetiva do trabalho prestado pela Recorrente, resulta claro que estamos perante um contrato de trabalho sem termo, por, desde logo, violação dos princípios consagradores do direito ao trabalho e à liberdade do trabalhador/a e do, consequente, direito à informação.”.
XI. A promessa de contrato foi feita na reunião anterior ao início da execução do trabalho, em dezembro de 2014; aí foi estabelecido o acordo entre Recorrida e Recorrente, pelo que, iniciando o seu trabalho em 17.01.2015, sem que tivesse celebrado qualquer contrato de trabalho, na forma escrita, presume-se que este seja sem termo, regendo-se pelo acordado verbalmente com a empresa. Firmando-se aí a convicção da Recorrente estar perante um contrato de trabalho sem limitação temporal.
XII. Consequentemente, nos termos do disposto no art.º 390.º do CT, por todo o já explanado, deve ser declarado como contrato sem termo, dada a violação das formalidades legalmente exigidas, sendo assim condenada a Ré ao pagamento das retribuições já vencidas, desde o despedimento até à data do trânsito em julgado da sentença final, nos termos do art.º 390.º CT.
XIII. Bem como, ser condenada a Ré ao pagamento de uma indemnização, cfr. n.º 1 do art.º 391.º do CP;
(…)”.
Para que não restem dúvidas, registe-se que da leitura das conclusões de recurso, é permitido concluir que a autora não questiona o decidido na sentença recorrida sobre a inexistência de transmissão do estabelecimento da sociedade “D...” para a actual ré: Ora, face ao que se expôs e aos factos apurados, parece-nos que no caso presente não é possível afirmar qualquer transmissão do estabelecimento, para efeitos do disposto no artigo 285.º do Código do Trabalho.”.
Assim, nesta parte, a sentença transitou em julgado.

5.2. - Resta, pois, apreciar a natureza e forma da cessão do contrato de trabalho celebrado pela autora e ré, no dia 23 de Janeiro de 20015.
Sobre a celebração deste contrato, está provado o seguinte:
“41) Com data de 23.01.2015, foi celebrado entre autora e ré o contrato de trabalho junto aos autos a fls. 75-77, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
42) É do seguinte teor a cláusula 2.ª de tal contrato: “o contrato é celebrado a termo certo, pelo período de três meses, nos termos do artigo 140.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro, com a última alteração na Lei n.º 47/2012, de 29 de agosto”.
43) É do seguinte teor o n.º 1 da cláusula 7.ª de tal contrato: “o presente contrato é celebrado por tempo determinado, nos termos da al. a) do n.º4 do artigo 140.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro: Código do Trabalho, tendo início e produzindo os seus efeitos apartir do dia 26 de janeiro de 2015 e fim em 25 de abril de 2015, em virtude da entidade patronal ter sido constituída em 18 de dezembro de 2014 e iniciado recentemente a laboração”.
Sobre esta questão, a sentença recorrida consignou:
“Alegara a autora, tendo por base o contrato de trabalho assinado pela sua colega G..., que o contrato de trabalho a termo que a própria assinara apenas fazia menção à norma que estipula a admissibilidade deste tipo de contrato, sem sequer referir qual a justificação para mesmo.
Todavia, e como resultou da matéria apurada, o contrato celebrado entre as partes foi outro, distinto, resultando da leitura da sua cláusula 7.ª/1 que “o presente contrato é celebrado por tempo determinado, nos termos da al. a) do n.º4 do artigo 140.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro: Código do Trabalho, tendo início e produzindo os seus efeitos a partir do dia 26 de janeiro de 2015 e fim em 25 de abril de 2015, em virtude da entidade patronal ter sido constituída em 18 de dezembro de 2014 e iniciado recentemente a laboração”.
Com efeito, a lei laboral permite, no n.º 4 do artigo 140.º, que possa ser celebrado contrato de trabalho a termo certo para «lançamento de nova atividade de duração incerta, bem como início de laboração de empresa ou de estabelecimento pertencente a empresa com menos de 750 trabalhadores».
Este motivo justificativo não tem na sua base uma necessidade transitória de trabalho, mas antes uma determinada incerteza empresarial quanto à sua viabilidade económica – trata-se de um critério genérico, destinado a acautelar o risco empresarial.
Tal como ressalta do disposto no artigo 148.º/2, à contrario e 1, al. b), a duração do contrato a termo justificado pelos motivos acabados de referir não pode ser inferior a seis meses, nem pode, haja ou não renovações, exceder dois anos.
Este tem sido, pois, o prazo que o legislador entendeu como suficiente para fomentar a iniciativa empresarial e aferir a viabilidade económica de uma atividade.
Seguindo os ensinamentos de Jorge Leite (ainda ao abrigo da LCCT), a duração do contrato a termo nestes casos, deve respeitar três requisitos: a) não ser inferior a seis meses; b) não ser superior a dois anos, haja ou não renovação; c) não prolongar-se para além do termo do chamado período de lançamento, sendo que este representa uma espécie de período de garantia a partir do qual se deve considerar suficientemente fundadas as perspetivas de subsistência ou êxito do empreendimento em causa.
A possibilidade de contratar a termo certo para lançamento de novas atividades ou início de laboração de empresa ou estabelecimento surge, assim, sem restrições de trabalhadores, podendo mesmo dar-se o caso (lícito) de uma empresa que inicia a sua laboração contratar a totalidade dos seus trabalhadores através de contratos a termo [neste sentido, cfr. Mário Júlio Vieira Gomes, Direito do Trabalho, pág. 597].
Ora, no caso dos autos, importa notar que ficou provado que a ré é uma sociedade comercial que foi constituída em 18.12.2014, tendo celebrado em janeiro de 2015 um “contrato de utilização de loja em galeria comercial”, local onde iniciou posteriormente a sua laboração. Mais se provou que a ré tinha e tem menos de 750 trabalhadores.
Destes factos resulta, pois, o preenchimento dos requisitos fixados no artigo 140.º/4, al. a) do Código do Trabalho.
Todavia, e como também se extrai do convénio celebrado, o referido contrato foi celebrado pelo período de três meses.
Ora, como já vimos e resulta à contrário do artigo 148./2 do Código do Trabalho, o contrato de trabalho a termo certo previsto no artigo 140.º/4, al. a) não pode ser celebrado por prazo inferior a três meses. No caso dos autos, ocorreu, assim, violação do disposto no citado preceito legal, sancionando o n.º 3 do mesmo preceito tal violação com consideração do contrato como celebrado pelo prazo de seis meses.
Concluímos, pois, que o contrato de trabalho a termo celebrado pelas partes se há-de considerar como válido, mas celebrado pelo prazo de seis meses.”.
Na verdade, estando provado que “A ré é uma sociedade comercial que foi constituída em 18.12.2014; que tinha e tem menos de 750 trabalhadores” – factos 44) e 45) – e que consta da cláusula 7.ª, n.º 1, do contrato de trabalho a termo certo que “o presente contrato é celebrado por tempo determinado, nos termos da al. a) do n.º4 do artigo 140.º da Lei n.º 7/2009, de 12 de fevereiro: Código do Trabalho, tendo início e produzindo os seus efeitos a partir do dia 26 de janeiro de 2015 e fim em 25 de abril de 2015, em virtude da entidade patronal ter sido constituída em 18 de dezembro de 2014 e iniciado recentemente a laboração”, está justificada a sua celebração, com a alteração da sua duração para seis meses, como decidido na 1.ª instância.
A verdadeira questão que a autora coloca é a do início da actividade em 17.01.2015, quando o referido contrato de trabalho a termo certo data de 23.01.2015.
Ou seja, a autora entende que estando em vigor um contrato de trabalho por tempo indeterminado, desde 17.01.2015, não será possível a celebração de contrato de trabalho a termo certo, sob pena de “violação dos princípios consagradores do direito ao trabalho e à liberdade do trabalhador/a e do, consequente, direito à informação.”.
Sobre esta matéria já se pronunciou o Supremo Tribunal de Justiça, no sentido dessa possibilidade – cf., por exemplo, os acórdãos do STJ, de 27.03.2003, processo n.º 4673/2002, e de 09.09.2015, disponíveis em www.stj.pt.
Assim, no primeiro dos acórdãos citados, referindo os dois contratos do caso em apreço, escreveu-se: “concorreriam, no mesmo lapso temporal, dois contratos de trabalho, um sem termo e outro a termo, pelo que, «como não se compatibilizam os regimes de um e outro, arredando a admissibilidade da coexistência de ambos, somos levados à conclusão de que o contrato posterior pôs termo ao mais antigo, revogando-o, sendo ele que passou a regular os direitos e obrigações em que as partes acordaram”.
No caso dos autos, afastada a transferência de estabelecimento, nos termos supra descritos, vigoraram dois contratos de trabalho com a ré, C..., Lda., um, sem termo, com início em 17.01.2015 e outro, com termo, com início em 23.01.2015.
Assim, como se afirma no acórdão do STJ, de 09.09.2015, «as partes ao celebrarem o contrato de trabalho a termo vincularam-se em termos incompatíveis com parte do que o Autor pretendia nesta ação: se nesta ação o trabalhador pede a reintegração na empresa e se por virtude do contrato de trabalho a termo (cuja validade e eficácia não vem posta em causa) passa a trabalhar na empresa, existe uma incompatibilidade entre aquele pedido e a realidade ocorrida.».
Em conclusão: se nesta acção a autora pede a indemnização em substituição da reintegração, quando celebrou com a ré um contrato de trabalho a termo resolutivo, cuja caducidade lhe foi comunicada em tempo oportuno, existe uma incompatibilidade entre aquele pedido e a realidade do contrato de trabalho a termo.
Deste modo, improcede, nesta parte, a pretensão da autora.

6. - O direito às comissões, no valor de 800,00€.
A autora pretende o pagamento da quantia de € 800,00 a título de comissões, alegando, nas conclusões de recurso, que:
“XIV. Pese embora ter sido dado como provado o facto de a Recorrida acordar com a Recorrente o pagamento de comissões de 15% a 20% caso a empresa facturasse o montante de 2.750,00€ (sem IVA) com o serviço prestado pelo Recorrente, igualmente, como deu como provado que nunca foi paga qualquer quantia a título de comissão, apesar de devida, o Tribunal a quo veio julgar improcedente o respetivo pagamento do montante relativo às comissões devidas pelo trabalho efetuado nos meses de janeiro e fevereiro, no montante global de 800,00€.
XV. Não havendo qualquer fundamentação para a improcedência, visto ter-se dado como provado ter sido acordado entre as partes, que a Recorrente cumpriu os pressupostos para receber as comissões e bastando efetuar o cálculo da percentagem de 15% sobre o valor estipulado de 2.750,00€ para se chegar ao montante a pagar à Recorrente, a título de comissões.
XVI. Devendo, para esse efeito, o Tribunal ad quem considerar como procedente, por provado, o pedido de pagamento de dois meses de comissão devia, no montante de 800,00€.”.
Da matéria de facto dada como provada, consta nos pontos 6) e 7):
“6) As partes acordaram o pagamento de uma retribuição mensal de 600,00 € (seiscentos euros), acrescendo o subsídio de alimentação, mais uma percentagem não concretamente apurada, mas entre 15% e 20% do apuro total de cada mês, sendo devida a percentagem sempre que a ré, com o trabalho da autora, auferisse mais de 2.750,00 € (sem IVA).
7) Percentagem essa que nunca auferiu.”.
Assim, para que a autora pudesse receber a percentagem/comissão acordada, era necessário que tivesse provado, como era seu ónus, que, nos meses de janeiro e fevereiro, a ré, com o trabalho da autora, tinha auferido mais de 2.750,00 € (sem IVA).
Ao não ter provado tal factualidade, não lhe pode ser reconhecido o direito às comissões, no valor de 800,00€, como pretende, pelo que, também, nesta parte, improcede o recurso.

III. - A Decisão
Atento o exposto, acorda-se em julgar procedente o recurso no que reporta à alteração da matéria de facto e improcedente quanto à matéria de direito e, em consequência, confirma-se a sentença recorrida.
Custas pela autora.

Porto, 2017.06.26
Domingos Morais
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha