Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
7207/15.4T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS QUERIDO
Descritores: VENDA À CONSIGNAÇÃO
PRIVAÇÃO DE USO
DANO ATENDÍVEL
Nº do Documento: RP201811057207/15.4T8VNG.P1
Data do Acordão: 11/05/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 683, FLS 239-258)
Área Temática: .
Sumário: I - As questões a que se referem o n.º 2 do artigo e a alínea d), do n.º 1, do artigo 615º, ambos do CPC, são apenas questões de direito, pelo que a omissão do conhecimento de facto juridicamente relevante não integra a nulidade por omissão de pronúncia prevista na alínea d) do n.º 1 do art.º 615.º do CPC, antes constituindo um vício suscetível de gerar as consequências previstas no art.º 662.º do CPC, devendo a Relação: suprir a omissão do conhecimento da factualidade em causa, caso constem do processo todos os elementos probatórios; ou anular a decisão recorrida, se tais elementos não constarem do processo, a fim de ser ampliada a matéria de facto.
II - Na venda à consignação, o consignatário realiza a venda em nome próprio, mas por conta do consignante, pressupondo tal negócio jurídico um mandato sem poderes de representação, celebrando o mandatário o negócio, em seu próprio nome mas por conta do mandante.
III - O dano indemnizável reporta-se sempre à situação concreta do lesado, não podendo ser considerado como uma abstração, não bastando ao lesado alegar e provar a privação da coisa, mostrando-se ainda necessário que alegue e demonstre que pretendia utilizá-la, ou seja, que dela pretende retirar as utilidades que a coisa normalmente lhe proporcionaria se não estivesse dela privado pela atuação ilícita do lesante.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 7207/15.4T8VNG.P1

Sumário do acórdão:
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto

I. Relatório
Em 7.08.2015, B... intentou na Instância Local de Vila Nova de Gaia (Secção Cível - J2), da Comarca do Porto, ação declarativa sob a forma de processo comum contra C..., D... e marido, E..., pedindo:
a) que se declare que o autor é o titular do direito de propriedade sobre o veículo automóvel de matrícula ..-..-QR, referido no artigo 1º da petição;
b) a condenação dos réus a emitirem e entregarem ao autor o requerimento do registo de propriedade a seu favor;
c) a condenação dos réus a entregarem ao autor o certificado de matrícula, em 2ª via, se necessário, relativo ao veículo em apreço, emitido pelos serviços competentes;
d) a condenação dos réus, conjunta e solidariamente, a pagarem ao autor, a título de indemnização, a quantia de 5.000,00 € e, bem assim, a quantia que se vier a liquidar, à razão de 5,00 € por cada dia, desde a apresentação em juízo da petição e até à entrega ao autor dos documentos do veículo que por este foi adquirido, acrescidas dos respetivos juros desde a data da citação
Como fundamento da sua pretensão, alegou o autor em síntese: no dia 2 de novembro de 2012 adquiriu à 1ª ré, num stand sito no ..., ..., em Vila Nova de Gaia, o veículo automóvel da marca Volkswagen, modelo ..., de matrícula ..-..-QR, pelo preço de € 6.750,00; na mesma data, pagou à 1ª ré o referido preço através da entrega de duas viaturas automóveis, uma da marca Honda e outra da marca Volkswagen e, ainda, da entrega da quantia de 5.000,00 € em numerário; a partir da referida data passou a deter a referida viatura, comprometendo-se a 1ª ré a efetuar o registo de propriedade em nome do autor, tendo ficado com os documentos do veículo; no entanto, apesar de interpelada para o efeito, a 1ª ré não procedeu ao registo do veículo em nome do autor e também não lhe entregou os documentos que lhe permitam circular, usar e fruir do veículo, designadamente, o certificado de matrícula; soube o autor que a referida viatura tinha sido colocada no stand da 1ª ré pelos 2ª e 3º réus, alegadamente os seus proprietários, para que o vendesse, e que em virtude de divergências entre estes, a 2ª ré, por indicação do seu marido, 3º réu, sabendo da venda ao autor, no dia 20.12.2012 registou a seu favor a referida viatura, recusando-se a entregar os documentos da mesma ao autor, apesar de interpelada para o efeito; conclui, em face do exposto, ser o titular do direito de propriedade sobre o veículo ..-..-QR, por efeito da compra e venda realizada no dia 2 de Novembro de 2012, sendo como tal ilegítima a retenção dos documentos pelos 2ª e 3º réus que, com a sua conduta, prejudicam o direito do autor; com efeito, não obstante ser o dono do veículo, o autor não o pode utilizar por falta de documentos, estando privado do seu uso desde o dia 02.11.2012; o dano, resultante da sua paralisação, deverá ser quantificado à razão diária de 5,00€, somando, na data da petição, 5.000,00 € (1000 dias x 5,00 €); pese embora os 2ª e 3º réus não tenham sido parte no contrato pelo qual o autor adquiriu à 1ª ré o veículo em causa, certo é que retêm, sem fundamento legal, os respetivos documentos, bem sabendo que ao recusar entregá-los, além de inviabilizarem o cumprimento desse dever pela 1º ré, atentam ainda contra o direito de propriedade do autor, prejudicando-o pelas limitações decorrentes da falta de tais documentos para a circulação do veículo; são assim todos os réus, conjunta e solidariamente, responsáveis perante o autor.
Regularmente citados, os réus apresentaram contestação.
A 1ª ré, C... contestou, impugnando a generalidade, a factualidade alegada pelo autor, referindo ainda que o valor acordado pelo pagamento do veículo foi entregue pelo autor a L... e não a si.
Os 2ª e 3º réus, D... e marido contestaram, defendendo-se por exceção, alegando que são casados no regime imperativo da separação de bens, facto do qual retiram a inutilidade da eventual condenação do réu E... nos pedidos formulados nas alíneas b) e c) e, por consequência, a falta de fundamento para que viesse a sê-lo nos pedidos formulados nas alíneas d) e e). Concluem pela ilegitimidade do réu para os termos da ação.
Defendem-se ainda por impugnação, alegando desconhecer a factualidade invocada na petição, ressalvando o facto de ser o autor que detém o veículo desde novembro de 2012 e de a invocada aquisição do mesmo por parte do autor não se encontrar registada.
Mais alegam os 2ª e 3º réus: a ré D... se dedica à compra e venda de bens de empresas declaradas insolvente; no exercício da sua atividade, no dia 22.05.2012, adquiriu, num leilão realizado nas instalações da insolvente “F..., Lda.”, diversos bens, entre os quais o veículo em causa nos autos; como por diversas vezes havia sucedido, o réu E... foi contactado pela ré C..., no sentido de saber se a ré D... teria viaturas para vender, disponibilizando o seu stand para as expor e encontrar comprador; acordaram então a ré C... e a ré D..., através do réu E..., que o veículo em causa fosse exposto no stand da ré C..., tendo ficado ajustado que, logo que esta encontrasse comprador, pagaria à ré D... o valor de € 5.500,00 e esta lhe entregaria a documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem aquela indicasse; a ré C..., em finais de outubro ou início de novembro de 2012, contactou os réus, dizendo-lhes que encontrara comprador e que dentro de duas semanas lhes iria entregar o preço ajustado de € 5.500,00 e levantar a documentação para a transferência da propriedade; porém, o tempo foi passando sem que a ré C... aparecesse, nem para pagar o preço nem para levantar a documentação; os réus D... e E... temerem pelo destino do veículo, apressando-se a dar conhecimento ao autor do sucedido, com vista à recuperação do veículo ou ao pagamento do que lhes era devido; não tendo sido bem sucedida, a ré D... efetuou o registo da propriedade do veículo em seu nome, o que fez em 20.12.2012. Entretanto, a ré C... encerrou o stand e nunca mais pagou aos réus o preço do veículo; concluem que o autor não adquiriu a propriedade do veículo.
Para além de contestar a ação, a ré D... deduziu ainda pedido reconvencional, alegando em síntese: é dona e legítima proprietária do veículo em causa nos autos; o autor não pagou o preço do mesmo à sua legítima proprietária, detendo-o ilegitimamente e devendo restituí-lo à reconvinte; recusando-se a pagar o preço do veículo bem como a restituí-lo à reconvinte, o reconvindo privou-a de o usar no seu negócio ou de o revender, para dispor do montante do preço na concretização de outros negócios; com tal conduta causou-lhe prejuízos que se estima em € 5.500,00; acresce a tal prejuízo a desvalorização do veículo, cujo valor comercial é, na presente data, de € 2.500,00; conclui pedindo a condenação do autor a entregar o veículo à reconvinte, bem como a pagar-lhe, a título de indemnização, a quantia de € 8.500,00 pelos prejuízos que lhe foram causados, decorrentes da retenção indevida do veículo e da respetiva desvalorização.
Notificado da contestação e do pedido reconvencional deduzido pelos réus D... e E..., o autor apresentou réplica, na qual pugna pela improcedência da exceção de ilegitimidade invocada pelos réus, referindo que tal como decorre da respetiva contestação, ambos gerem a atividade que exercem, a ré D... enquanto gerente de direito e o réu E... enquanto gerente de facto, pelo que ambos são responsáveis pelo danos causados ao Autor. Quanto ao pedido reconvencional, alega que os réus referem ter celebrado um contrato de consignação com a ré C..., para que esta, através do seu stand, vendesse as viaturas dos réus e por sua conta. Ora, a venda à consignação configura um mandato sem representação, o qual confere ao mandatário a legitimidade e o poder de vender, pelo que a venda, embora o bem seja alheio, é válida, perdendo o mandante o domínio sobre ela, como se o mandatário tivesse poderes de representação. Assim, o pedido reconvencional terá de improceder.
Em 20.06.2016 foi proferido despacho no qual se julgou territorialmente incompetente a instância local cível de Vila Nova de Gaia e se determinou a remessa dos autos à Unidade Local Cível de Ovar, da Comarca de Aveiro.
Recebidos os autos na Instância Local de Ovar [Secção Cível - J1], da Comarca de Aveiro ali foi proferido despacho em 8.09.2016, no qual se julgou incompetente, em razão do território a Instância Cível de Ovar, determinando-se a remessa dos autos à Instância Local de Matosinhos, Comarca do Porto.
Recebidos os autos na Instância Local de Matosinhos [Secção Cível - J3], da Comarca do Porto, foi fixada à ação o valor de € 20.250,00 (despachos de 17.11.2016 e 10.01.2017).
Foi proferido despacho em 7.03.2017, no qual: se dispensou a realização da audiência prévia; se admitiu o pedido reconvencional deduzido pela ré D...; se julgou improcedente a exceção dilatória invocada pelos réus, declarando-se a legitimidade passiva do réu E...; se definiu o objeto do litígio e se enunciaram os temas de prova.
Realizou-se a audiência final em 5.03.2018, após o que, em 23.04.2018, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Face ao exposto:
A) Julgo a presente acção parcialmente procedente por provada e, em consequência:
a) Declaro que o autor é o titular do direito de propriedade sobre o veículo automóvel de matrícula ..-..-QR, identificado no artigo 1º da petição;
b) Condeno os réus a entregarem ao autor o requerimento para registo de propriedade do veículo a seu favor;
c) Condeno os réus a entregarem ao autor o certificado de matrícula relativo ao veículo, em 2ª via, se necessário; e,
d) Condeno os réus, solidariamente, a pagarem ao autor, a título de indemnização, a quantia de 5,00 € por cada dia decorrido entre 23.11.2012 até à data em que o autor adquiriu o novo veículo, cujo concreto montante será apurado em sede de incidente de liquidação.
B) Julgo o pedido reconvencional totalmente improcedente.
Custas da acção pelo autor e pelos réus na proporção dos respectivos decaimentos, os quais se fixam, respectivamente, em 20% e 80%- art.º 527, n.ºs 1 e 2, do CPC -, sem prejuízo do benefício de apoio judiciário concedido à ré C....
Custas da reconvenção pela ré D....».
Não se conformou o autor e interpôs recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formula as seguintes conclusões:
1 – B..., Autor nos presentes autos, não se conformando com parte da Douta Sentença, que apenas condenou os Réus, solidariamente, a pagar ao Autor, a título de indemnização, a quantia de 5,00€ por cada dia decorrido entre 23.11.2012 até à data em que o Autor adquiriu o novo veículo, a liquidar em execução de sentença, vem dessa parte dela recorrer;
2 - O Autor intentou a presente ação declarativa de processo comum contra os Réus pedindo: a) que se declare que o autor é o titular do direito de propriedade sobre o veículo automóvel de matrícula ..-..-QR, referido no artigo 1º da petição; b) a condenação dos réus a emitirem e entregarem ao autor o requerimento do registo de propriedade a seu favor; c) a condenação dos réus a entregarem ao autor o certificado de matrícula, em 2ª via, se necessário, relativo ao veículo em apreço, emitido pelos serviços competentes;
d) a condenação dos réus, conjunta e solidariamente, a pagarem ao autor, a título de indemnização, a quantia de 5.000,00 € e, bem assim, a quantia que se vier a liquidar, à razão de 5,00 € por cada dia, desde a apresentação em juízo da petição e até à entrega ao autor dos documentos do veículo que por este foi adquirido, acrescidas dos respetivos juros desde a data da citação;
3 – Após julgamento, o Tribunal “a quo” decidiu, e bem, julgar procedente o primeiro, segundo e terceiro dos pedidos formulados pelo Autor, tendo em consequência declarado que o autor é o titular do direito de propriedade sobre o veículo automóvel de matrícula ..-..-QR, identificado no artigo 1º da petição; condenado os réus a entregarem ao autor o requerimento para registo de propriedade do veículo a seu favor; e condenado os réus a entregarem ao autor o certificado de matrícula relativo ao veículo, em 2ª via, se necessário;
4 - Porém, e no que concerne ao pedido de condenação dos réus, solidariamente, no pagamento de uma indemnização por danos patrimoniais decorrentes da privação do uso do veículo por si adquirido, privação essa que resultará da paralisação forçada do veículo por falta de entrega dos documentos necessários à sua circulação, no montante de 5.000,00€, calculados desde 02.11.2012 até 07.08.2015 (data da instauração da presente ação) à razão diária de 5€, e bem assim, na quantia que se vier a liquidar à razão diária de 5€ por cada dia, desde a data de apresentação em juízo da petição inicial até à entrega dos documentos do veiculo matrícula....-..-QR, acrescidas de juros desde a citação,
5 - O Tribunal “a quo” decidiu apenas condenar os Réus, solidariamente a pagar ao autor, a título de indemnização, a quantia de 5,00€ por cada dia decorrido entre 23.11.2012 até à data em que o autor adquiriu o novo veículo, valor concreto a apurar em sede de incidente de liquidação;
6 - Ora, salvo sempre o devido respeito que é muito, por opinião em contrário, não concordamos com a tese defendida pelo Tribunal “a quo” de que a indemnização pela privação do uso de um veículo automóvel depende da prova de um dano concreto;
7 - Ora, conforme ficou dado como provado, os réus estavam obrigados a entregar ao autor, quer o requerimento para registo de propriedade do veículo a seu favor, quer o respetivo certificado de matrícula, obrigação essa que incumpriram, impedindo-o dessa forma de com ele circular;
8 - E que o veículo ..-..-QR se destinava a assegurar as deslocações do Autor e do seu agregado familiar;
9 - Ora, é certo, tal como vem referido na Douta Sentença, que a Jurisprudência nem sempre tem sido uniforme e unanime quanto a esta questão da privação do uso;
10 - Estamos com os que entendem que a simples privação do uso, por si só, constitui um dano indemnizável, independentemente da utilização que dele se faça, ou não, durante o período da privação;
11 - Nestes termos, deviam os Réus ter sido condenados, solidariamente, a pagar ao A. a quantia global de 9.890,00€ (1978 dias x5€), calculada tendo em conta o período a partir do qual o Autor ficou privado do uso do veículo, 23.11.2012 e a data da prolação da sentença, sem prejuízo de tal quantitativo diário se vencer até efetiva entrega dos documentos do veículo ao Autor.
12 – Impondo-se, assim, nesta parte, a revogação da Douta Sentença.
Nestes termos e nos melhores de direito que V. Ex.as doutamente suprirão, deve ser dado provimento ao presente recurso e, consequentemente:
- Ser revogada, em parte, a Sentença proferida pelo Tribunal Recorrido e, em sua substituição ser proferido Acórdão que condene os Réus a pagar solidariamente, a pagar ao A. a quantia global de 9.890,00€ (1978 dias x 5€), a titulo de indemnização, calculada tendo em conta o período a partir do qual o Autor ficou privado do uso do veículo, 23.11.2012 e a data da prolação da sentença, 23.04.2018, sem prejuízo de tal quantitativo diário se vencer até efetiva entrega dos documentos do veículo ao Autor, com as demais consequências legais.
Fazendo-se, assim, a costumada, inteira e sã JUSTIÇA.
Não se conformaram os réus D... e marido, E... e interpuseram recurso de apelação, apresentando alegações, findas as quais formulam as seguintes conclusões:
1. O A. alegou na petição - art. 5.º - que a viatura ..-..-QR tinha sido colocada no stand da R. pelos 2º e 3º réus, estes casados entre si, e alegadamente os seus proprietários, para que o vendesse (sublinhado nosso).
2. Esta matéria foi levada aos Temas da Prova, constando do respectivo ponto 3. apurar “se o veículo foi colocado no estabelecimento da ré C... pelos réus D... e E..., seus proprietários, para que o vendesse. (sublinhado nosso)
3. O Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre esta questão, que integra a causa de pedir invocada pelo A. para fundar o pedido formulado na presente acção.
4. Efectivamente, não consta dos Factos Provados ou dos Factos não Provados qualquer referência a essa matéria, que está intimamente ligada ao pedido da Acção e à respectiva causa de pedir.
5. A questão essencial cujo conhecimento foi imposto ao Tribunal prende-se com controvérsia a dirimir e que consiste em saber se o veículo foi entregue à ré C..., para que o vendesse, ou não, já que é aí que o A. assenta a legitimidade da transferência para si do direito de propriedade sobre o referido veículo (o contrato de consignação só existe se uma das partes remeter à outra certa mercadoria, para que esta a vendai).
6. Desta forma, entendemos Recorrentes que o Tribunal “a quo” omitiu o tratamento e a solução dessa questão fulcral suscitada na acção, atenta a causa de pedir e o pedido, bem assim, os Temas de Prova de que, aliás, as partes não reclamaram.
7. Há assim que concluir, com o devido respeito, que a douta sentença enferma da nulidade prevista na parte do art.s 615.º n.º 1, al. d), do CPCivil.
8. Na Fundamentação de Facto constante da douta sentença (1.15. dos Factos Provados) foi dado como provado o seguinte: “1.15. Acordaram a R. C... e o Réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que logo que esta encontrasse comprador para o mesmo pagaria ao réu E... um valor não concretamente apurado mas não superior a 5.500,00€, entregando-lhe este a necessária documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem a ré indicasse”.
9. Segundo se refere na mesma sentença, “a convicção do Tribunal, no que à factualidade provada se refere, alicerçou-se no teor dos documentos juntos aos autos, bem como no depoimento das testemunhas inquiridas.”
10. Deparamo-nos, contudo, com a completa ausência de elementos probatórios que suportem a matéria de facto constante da segunda parte do referido ponto 1.15. dos Factos Provados, quando aí se refere “(...) e que logo que esta encontrasse comprador para o mesmo pagaria ao réu E... um valor não concretamente apurado mas não superior a 5.500,00€, entregando-lhe este a necessária documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem a ré indicasse.”
11. Efectivamente, além de não existir nos autos qualquer documento do qual seja possível extrair inferência quanto a essa matéria, constata-se que a única testemunha que depôs sobre tal matéria - atinente à relação estabelecida entre o R. E... e a R. C..., e que precedeu o negócio realizado entre esta e o A. - foi G..., cujo depoimento consta da gravação em CD, com início às 11:01 h. e termo às 11:15 h..
12. Acontece que, ouvida a gravação de tal depoimento verifica-se que a testemunha em causa, nas concretas passagens do seu depoimento, acima transcritas, afirmou, por mais do que uma vez, que o veículo em questão foi colocado no stand da l.ª R., “para exposição”, não tendo sido conferidos poderes a esta para vender tal viatura.
13. Esse depoimento, cuja credibilidade não foi posta em causa, mostra-se também congruente com o que se refere nos pontos 1.6., e 1.14. dos Factos Provados.
14. Sendo que, a ausência de poderes para vender, também se infere, por um lado, do facto de os documentos relativos ao veículo ..-..-QR terem permanecido na posse dos réus E... e D... (cfr. Ponto 1.10 dos Factos Provados), e, por outro, do facto de esses réus não terem entregue à ré C... os documentos e o requerimento para registo de propriedade, dessa mesma viatura.
15. Ora, em face das circunstâncias referidas, verifica-se que existe manifesto erro na apreciação das provas pelo Tribunal ‘a quo’, pois as provas produzidas levam inequivocamente a uma resposta diversa da dada na segunda parte do questionado ponto 1.15. dos Factos Provados.
16. Pelo que tem de concluir-se que a matéria de facto provada constante da segunda parte do ponto 1.15. dos Factos Provados, como não sobreveio de prova documental, nem do depoimento de qualquer testemunha, não pode manter-se.
17. Tudo justificando, inevitavelmente, a alteração parcial desse Ponto 1.15 dos Factos Provados, substituindo a sua redação pela seguinte:
“1.15. Acordaram a R. C... e o Réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que caso aparecesse comprador o réu E... era avisado para fazer a venda”.
Por outro lado:
18. Como se colhe dos autos, o Tribunal baseia-se, como circunstância fundante da transferência para o A, do direito de propriedade sobre o referido veículo, no alegado facto de o réu E..., com o conhecimento e o consentimento da ré D..., ter entregue o veículo em causa à ré C..., autorizando-a a expor o mesmo no seu stand e a proceder à sua venda.
19. Entendeu, assim, o Tribuna! recorrido que o veículo foi entregue em consignação à ré C..., e que foi na sequência dessa entrega que a ré o vendeu ao A., a quem o entregou.
20. Entendem os Recorrentes que, perante os documentos juntos ao processo e na medida em que o depoimento da única testemunha que sobre esse facto se pronunciou tem um sentido diametralmente oposto ao que foi considerado, não se verificam os pressupostos do contrato de consignação.
21. Os Recorrentes não podem estar mais em desacordo com a prova de tal matéria, por entenderem que nenhuma prova se encontra nos autos, ou foi produzida, nos termos da qual se possa concluir pela existência de um contrato de consignação.
22. O contrato de consignação, como aliás bem se refere na sentença recorrida, citando MOTA PINTO, in Teoria Geral da Relação Jurídica, pág. 253., é definido como aquele “nos termos do qual uma das partes remete à outra tantas unidades de certa mercadoria, para que esta as venda, com o direito a uma participação nos lucros e a obrigação de restituir as unidades não vendidas”.
23. Daqui decorre que, para que haja contrato de consignação, enquanto requisito essencial, é necessário que sejam conferidos poderes ao destinatário das mercadorias para proceder à venda das mesmas.
24. Ora, para se concluir, como se concluiu na sentença recorrida, que a ré C... foi autorizada a proceder à venda da viatura em questão, importava demonstrar que a mesma tinha fundamento para o fazer - e dos factos provados não se infere que este existisse.
25. Acresce que, tratando-se de um facto constitutivo do direito invocado pelo Autor, era sobre este que recaía o ónus de provar (cfr. art. 3429/1 do CCivil) aquilo que alegou no citado art. 5.º da petição inicial, isto é, que a viatura tinha sido colocada no stand da ré C... para que esta a vendesse, o que A. não provou.
26. Do que se deixa dito, e de acordo com os elementos probatórios recolhidos, não se verifica a existência desse requisito essencial do contrato de consignação, uma vez que a ré C... não detinha poderes - pois não lhe foram conferidos pelos réus Recorrentes - para proceder à venda da viatura em questão.
27. O Tribunal "a quo" descurou, pois, uma particularidade exigida pela lei, para qualificar o contrato de consignação, porquanto inexistiu e não ficou demonstrado que o veículo em causa tenha sido entregue à ré C... com autorização para esta proceder à sua venda.
28. Por isso ao condenar os réus, ora Recorrentes, pela forma como condenou, no pressuposto de que existiu um contrato de consignação, o Tribunal recorrido incorreu em erro de julgamento na avaliação dos requisitos exigidos para a existência de tal contrato.
Por último:
29. Está demonstrado que a ré D..., em 20.12.2012, efectuou o registo de propriedade do veículo ..-..-QR em seu nome (cfr. 1.21 dos Factos Provados).
30. A ré D... é, pois, dona e legítima proprietária desse veículo automóvel, como também se alcança da certidão emitida pela Conservatória do Registo Automóvel que foi junta à Contestação.
31. Sobre o autor de uma acção de reivindicação impende apenas o ónus de alegar e provar que é proprietário da coisa que reivindica e que esta se encontra em poder do réu.
32. O réu, por sua vez, se quiser evitar a condenação terá de alegar e provar que a sua detenção é legitima e oponível ao autor.
33. Ora, foi precisamente isto que o A., ora recorrido, não fez.
34. Por isso, a reconvenção deve ser julgada procedente e em consequência ser o A., ora recorrido, condenado a entregar o veículo à ré/Reconvinte.
Termos em que, deve o presente recurso ser provido, declarando-se a nulidade da douta sentença recorrida por omissão de pronúncia sobre questão que devia ter apreciado, ou, quando assim se não entenda, ser revogada a mesma sentença, julgando-se a acção totalmente improcedente, e procedente reconvenção, relativamente ao pedido de condenação do A./REconvindo na entrega do veículo à R./Reconvinte, assim se fazendo inteira
JUSTIÇA.

II. Do mérito do recurso
1. Definição do objeto do recurso
O objeto dos recursos delimitados pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635.º, n.º 3 e 4 e 639.º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil), salvo questões do conhecimento oficioso (artigo 3.º, n.º 3, do diploma legal citado), consubstancia-se nas seguintes questões:
i) apreciação da nulidade arguida (recurso dos réus);
ii) apreciação da impugnação da decisão da matéria de facto (recurso dos réus);
iii) reponderação do mérito jurídico da sentença, com base na factualidade definitivamente fixada:
a) apreciação dos pressupostos do contrato de consignação (recurso dos réus);
b) apreciação da questão do dano de privação de uso (recurso do autor);

2. Apreciação da nulidade arguida pelos recorrentes (réus)
Alegam os recorrentes (conclusões 1.ª a 7.ª):
«1. O A. alegou na petição - art. 5.º - que a viatura ..-..-QR tinha sido colocada no stand da R. pelos 2º e 3º réus, estes casados entre si, e alegadamente os seus proprietários, para que o vendesse (sublinhado nosso).
2. Esta matéria foi levada aos Temas da Prova, constando do respectivo ponto 3. apurar “se o veículo foi colocado no estabelecimento da ré C... pelos réus D... e E..., seus proprietários, para que o vendesse. (sublinhado nosso)
3. O Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre esta questão, que integra a causa de pedir invocada pelo A. para fundar o pedido formulado na presente acção.
4. Efectivamente, não consta dos Factos Provados ou dos Factos não Provados qualquer referência a essa matéria, que está intimamente ligada ao pedido da Acção e à respectiva causa de pedir.
5. A questão essencial cujo conhecimento foi imposto ao Tribunal prende-se com controvérsia a dirimir e que consiste em saber se o veículo foi entregue à ré C..., para que o vendesse, ou não, já que é aí que o A. assenta a legitimidade da transferência para si do direito de propriedade sobre o referido veículo (o contrato de consignação só existe se uma das partes remeter à outra certa mercadoria, para que esta a vendai).
6. Desta forma, entendemos Recorrentes que o Tribunal “a quo” omitiu o tratamento e a solução dessa questão fulcral suscitada na acção, atenta a causa de pedir e o pedido, bem assim, os Temas de Prova de que, aliás, as partes não reclamaram.
7. Há assim que concluir, com o devido respeito, que a douta sentença enferma da nulidade prevista na parte do art.s 615.º n.º 1, al. d), do CPCivil».
Cumpre decidir.
Nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, a sentença é nula sempre que o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
A referida estatuição é uma consequência pela infração ao disposto no n.º 2 do artigo 608.º do Código de Processo Civil.
Preceitua a citada disposição legal: «O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras […]».
Como refere Lebre de Freitas[1] «“resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação” não significa considerar todos os argumentos que, segundo as várias vias, à partida plausíveis de solução do pleito, as partes tenham deduzido».
As questões a decidir reconduzem-se aos concretos problemas jurídicos que o tribunal tem, imperativamente, de solver em função da causa de pedir e do pedido, dendo algo de diverso dos argumentos aduzidos pelas partes para sustentar as posições que assumem, salientando-se a compatibilidade da vinculação do tribunal às concretas questões ou problemas suscitados pelas partes, com a sua liberdade de qualificação jurídica (artigo 5.º, n.º 3, do CPC).
No regime processual em vigor, o vício na decisão da matéria de facto por omissão, integra uma violação do disposto no nº 4, do artigo 607º do Código de Processo Civil.
As questões a que se refere o artigo 608º, nº 2, do Código de Processo Civil e, correlativamente, a alínea d), do nº 1, do artigo 615º do mesmo diploma legal, são apenas questões de direito, pelo que mesmo no atual contexto normativo, a omissão do conhecimento de certa questão de facto juridicamente relevante de acordo com as posições assumidas pelas partes não constitui um vício na construção da sentença, passível por isso de integrar uma nulidade da sentença por omissão de pronúncia[2].
No entanto, a circunstância da omissão de decisão sobre factualidade juridicamente relevante não integrar um vício da sentença, não obsta a que essa patologia seja suscitada em via de recurso e seja sindicada, oficiosamente, em segunda instância, nos termos previstos na alínea c), do nº 2, do artigo 662º do Código de Processo Civil.
A temática suscitada traduz-se na alegada preterição de um facto, não de omissão de pronúncia sobre uma questão que o juiz devesse apreciar.
A preterição de um facto constitui, também ela, um vício, o qual, a verificar-se, antes se comina com a consequência do seu suprimento, na medida em que tal se mostre possível, no quadro do artigo 662.º do Código de Processo Civil
Decorre do exposto que, se a matéria indicada pelos recorrentes se revelar pertinente, uma de duas: ou é possível proceder à ampliação da matéria de facto nesta instância, com recurso a toda a prova produzida, nomeadamente à prova gravada, o que implica que tenha sido produzida prova sobre a matéria que foi omitida na sentença; ou, não sendo isso possível, deverá anular-se a decisão recorrida a fim de ser ampliada a matéria de facto, nos termos previstos na alínea c), do nº 3, do artigo 662º do Código de Processo Civil.
Com estes fundamentos se julga improcedente a arguição de nulidade da sentença recorrida por omissão de pronúncia (sem prejuízo da apreciação da questão noutra sede)[3].
3. Impugnação da decisão da matéria de facto
Nas conclusões 8.ª a 17.ª, os réus impugnam o facto provado n.º 1.15, alegando que nenhuma prova foi produzida, suscetível de suportar o referido facto.
Invocam o depoimento da testemunha G..., para concluir que do mesmo não resulta provado o facto em apreço.
Vejamos.
Consta do facto em causa:
«4.15[4]. Acordaram a ré C... e o réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que logo que esta encontrasse comprador para o mesmo pagaria ao réu E... um valor não concretamente apurado mas não superior a 5.500,00 €, entregando-lhe este a necessária documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem a ré indicasse».
Pretendem os réus que o facto em causa passe a ter a seguinte redação:
«Acordaram a R. C... e o Réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que caso aparecesse comprador o réu E... era avisado para fazer a venda».
Consta da motivação do Tribunal:
«A convicção do tribunal, no que à factualidade provada se refere, alicerçou-se no teor dos documentos juntos aos autos, bem como no depoimento das testemunhas inquiridas.
Desde logo, no que aos documentos se refere, destacam-se os seguintes:
- A “Declaração” junta a fls. 7, conjugada com as informações emitidas pelo “IRN” juntas a fls. 7 verso e 8 e, ainda, com a “Factura/Recibo” junta a fls. 8 verso, contribuiu para que se considerasse como provada a factualidade elencada em 1.1., 1.2., 1.3. e 1.4. (no que se refere á não entrega dos documentos relativos ao veículo);
- A carta remetida pela mandatária do autor à ré C..., junta a fls. 9 a 10, com base na qual foi considerada como provada a matéria elencada em 1.5. (no que concerne à interpelação da ré C...);
- A informação emitida pelo IRN, junta a fls. 10 verso, com base na qual foi considerada como provada a matéria elencada em 1.7. (no que se refere ao registo do veículo) e 1.20.;
- A carta remetida pela mandatária do autor à ré D..., junta a fls. 11 a 12, com base na qual foi considerada como provada a matéria elencada em 1.11.; - O “recibo” junto a fls. 41 verso, conjugado com a informação relativa ao leilão efectuado no âmbito do processo de insolvência nele referenciado, junta a fls. 42 a 44, com base no qual foi considerada como provada a matéria elencada em 1.13.
Foram também relevantes, conforme se referenciou, os depoimentos das testemunhas inquiridas, os quais, conjugados com os documentos acima referenciados, permitiram considerar como provada a matéria elencada em 1.4., 1.5., 1.6., 1.7., 1.8., 1.9., 1.10., 1.12., 1.14., 1.15., 1.16., 1.17., 1.18., 1.19. e 1.21.
A testemunha H... é casada com o autor. Declarou que estava presente quando o marido comprou o carro em causa nos autos á ré C..., num stand em ..., fez 5 anos em Novembro de 2017. Para pagamento do preço o marido entregou dois veículos e 5.000,00 € em dinheiro. No entanto, não tem os documentos do veículo. A ré C... ficou de “passar” os mesmos para o seu nome, o que este aceitou porque assim não tinha que pagar o registo. Chegou a fazer o seguro do veículo e chegou a circular com ele. Entretanto tiveram que “parar” o carro porque o mesmo tinha que ir à inspecção e não tinham documentos. Como não podiam circular com ele, adquiriram um outro veículo, decorrendo das suas palavras que o veículo em causa nos autos era o único que tinham e que a aquisição do novo veículo se deveu, em exclusivo, à sua imobilização. Declarou que o réu E... abordou o marido, dizendo-lhe que sabia que o veículo lhe tinha sido vendido mas que não tinha recebido o respectivo preço. Disse-lhe também que por isso o registou em nome da mulher. Foram abordando os réus C... e E... mas nada se resolveu, encontrando-se o veículo parado, em casa. Mais declarou que o marido é uma pessoa nervosa e que esta situação foi muito complicada para ele.
A testemunha I... é filha do autor. Declarou que o pai comprou e pagou o veículo. Andaram com ele duas a três semanas mas deixaram de o fazer, pois entretanto o mesmo tinha que ir à inspecção e não tinham documentos. Desde essa altura está parado, em casa. Lembra-se de o pai passar horas no stand a tentar resolver a situação. Por seu lado, a ré C... dizia sempre que ia resolver. Entretanto, encerrou o estabelecimento. Esclareceu que o pai entregou os dois carros que tinham para pagar este, pelo que foi o único veículo com que ficaram. Tem ideia de o réu E... ter ido a casa dos pais, de querer o veículo e de o pai não lho dar, mas não ouviu a conversa toda.
A testemunha J... é irmã do autor. Recorda-se de o irmão chegar a casa com o veículo. A dada altura começa a queixar-se que a ré C... não lhe dá os documentos do mesmo e começa a fazê-lo todos os dias. Chorava ele, chorava a cunhada e iam para o stand. Entretanto surge o réu E... a dizer que o carro é dele. Por seu lado, a ré C... dizia que ia resolver mas acabou por fechar o stand. Mais referiu que o veículo está parado.
A testemunha K... declarou conhecer o réu E... e o stand da ré C.... No entanto, não demonstrou ser conhecedor de qualquer facto relevante para a decisão da causa.
A testemunha G... é filho dos réus E... e D.... Declarou que compram veículos em leilões de insolvência e em vendas particulares para depois os tornarem a vender, esclarecendo, com referência a essa actividade, que a mesma é da mãe mas que o pai é que trata de tudo, sendo ele que os compra e que os regista em nome da mãe. Esclareceu que já antes tinham tido veículos em exposição para venda no estabelecimento da ré C.... Caso aparecesse comprador o pai era avisado para “fazer a venda”. Assim sucedeu com o veículo em causa nos autos, cujo valor era de 5.000,00 €. A dada altura o pai passa pelo stand da ré e depara-se com a falta do mesmo. Contactada, a ré C... afirmou que o comprador tinha recorrido ao crédito para o adquirir e que, por isso, teriam de aguardar cerca de 14 dias pelo pagamento do preço. O pai estranhou a situação, pois não havia emitido a declaração de venda, mas aguardou.
Decorridos 14 dias regressou ao stand e pediu o dinheiro à ré. Ela diz que ainda não o tem, o que deixa o pai desconfiado. Entretanto, no decurso da pesquisa que efectuaram junto de um mediador de seguros, constatam que o veículo já tem seguro e conseguem identificar o autor. Contactam-no e este diz-lhes que comprou o veículo e que o pagou. Confirma que não entregaram os documentos do veículo, pois só o fazem depois de receberem o dinheiro. Mais referiu que o veículo, estando imobilizado, vale menos de 5.000,00 €, não conseguindo especificar quanto.
No que se refere à factualidade contida em 1.15., concretamente à menção “com conhecimento e consentimento da ré D...”, cumpre referir que a mesma resulta reconhecida pela própria ré no art.º 9º da sua contestação.
Aqui chegados e prosseguindo para a factualidade considerada como provada, cumpre apenas referir que, quanto à mesma, foi total a ausência de prova».
Reponderando a prova no segmento indicado:
Ouvimos o depoimento da testemunha G..., no qual os recorrentes (réus) alicerçam a sua pretensão impugnatória.
De tal audição concluímos exatamente o contrário do que pretendem os recorrentes.
Mais. Consideramos lamentável a facilidade com que, sob juramento, com a maior leviandade, se afirmam inverdades perante o Tribunal, sem curar de atender a um mínimo de coerência lógica nos depoimentos.
Esta testemunha estava preocupada com uma mensagem: a afirmação de que o veículo estava no stand apenas em exposição, sem se destinar à venda pela dona do stand (em consignação).
Inquirido pelo ilustre mandatário dos recorrentes no início do depoimento, nestes termos [“diga lá o que sabe”], respondeu de imediato: “a única coisa que eu sei é que o meu pai tinha lá carros no sítio para exposição e se algum fosse vendido tinha de ser chamado para fazer a venda” (00:40).
Um pouco adiante, afirmou: “caso aparecesse algum comprador, era avisado. O meu tai tinha de fazer o negócio com o comprador” (02:17)
A incongruência da afirmação “se algum fosse vendido tinha de ser chamado para fazer a venda” transparece na parte seguinte do depoimento: “… o meu pai deparou-se com a falta da viatura lá [no stand] e perguntou-lhe [à dona do stand – ré C...], e ela disse-lhe que tinha de esperar porque tinha sido feito um crédito para essa viatura e que demorava cerca de 14 dias a chegar o dinheiro” (03:11).
Afirma a testemunha que o pai esperou e que ao fim de 14 dias foi novamente ao stand e que afinal o dinheiro ainda não tinha vindo, dizendo-lhe a ré C..., que teria de esperar mais uns dias.
Na versão da testemunha, esta ligou para o mediador de seguros, vindo a saber que a viatura estava segurada em nome do autor (4:00), o qual veio a informar os réus, de que tinha comprado e pago a viatura (4:24).
Na versão ipsis verbis da testemunha: “ficámos de boca aberta porque estávamos à espera que fosse uma financeira a pagar e não uma pessoa que tinha pago já…”.
Em suma, o veículo fora vendido para ré C... (dona do stand), havia sido pago pelo comprador (autor) e os réus D... e E..., que não sabiam da venda, foram informados da mesma pela dona do stand, e limitaram-se a ficar à espera do dinheiro que, supostamente, seria pago por uma instituição de crédito.
Mais: os réus D... e E..., aceitaram a venda, sem qualquer protesto perante a dona do stand (o que seria de esperar, face à afirmação da testemunha, de que o carro estava apenas em exposição e só o réu o podia negociar), e ficaram apenas à espera do recebimento do preço.
A afirmação da prova de um certo facto representa sempre o resultado da formulação de um juízo humano, o qual, não podendo basear-se numa absoluta certeza, não pode prescindir da convicção profunda assente em padrões de probabilidade, capaz de afastar a situação de dúvida razoável[5].
Como se refere no acórdão desta Relação, de 19.12.2012[6], o princípio da livre apreciação da prova, que alicerça o julgamento da matéria de facto, sustenta-se em critérios racionais e objetivos, em juízos de ilações e inferências razoáveis, mas sempre de mera probabilidade e conduz a um juízo positivo de prova quando, em face dos instrumentos disponíveis, do seu conteúdo, consistência e harmonia, se afigure aceitável à consciência de um cidadão medianamente informado e esclarecido, que a realidade por eles indiciada já se possa ter como efetivamente assumida.
A avaliação do julgador não pode prescindir da análise racional e lógica do depoimento da testemunha, determinando a sua total incongruência a rejeição de qualquer credibilidade.
É manifesta a incongruência do depoimento desta testemunha, ao qual não pode ser reconhecida qualquer credibilidade.
Alegam os recorrentes que a ré C... não podia vender o veículo, como se infere do facto de os respetivos documentos terem permanecido na posse dos réus E... e D....
Salvo todo o respeito devido, não lhes assiste razão, não havendo que confundir venda e registo.
A venda foi efetuada, como se provou, não sendo necessário para o efeito qualquer documento, atenta a sua natureza consensual no que à forma diz respeito.
Improcede, em consequência, a impugnação da factualidade provada.
4. A alegada necessidade de aditamento factual
Alegam os réus (recorrentes) que deverá ser anulado o julgamento para produção de prova sobre o seguinte facto articulado pelos autores: “se o veículo foi colocado no estabelecimento da ré C... pelos réus D... e E..., seus proprietários, para que o vendesse”.
Como se referiu noutra sede, a preterição de um facto constitui um vício que, a verificar-se, se comina com a consequência do seu suprimento, na medida em que tal se mostre possível, no quadro do artigo 662.º do Código de Processo Civil
Daí que, revelando-se pertinente, ou se deverá proceder à ampliação da matéria de facto com recurso a toda a prova produzida, ou, não sendo isso possível, deverá anular-se a decisão recorrida a fim de ser ampliada a matéria de facto, nos termos previstos na alínea c), do nº 3, do artigo 662º do Código de Processo Civil.
Provou-se (não tendo sido objeto de impugnação, nomeadamente:
1.15. Acordaram a ré C... e o réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que logo que esta encontrasse comprador para o mesmo pagaria ao réu E... um valor não concretamente apurado mas não superior a 5.500,00 €, entregando-lhe este a necessária documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem a ré indicasse.
1.16. Constatando que o veículo ..-..-QR não se encontrava no stand da ré C..., o réu E... contactou-a, tendo-lhe esta dito que encontrara comprador para o veículo mas que se encontrava pendente o processo relativo ao pedido de crédito para pagamento do preço.
Face à factualidade provada, concluímos que não se revela necessária qualquer produção de prova sobre o facto referido (alegado pelo autor como suporte da sua pretensão), na medida em que está definitivamente provado que a ré C... expunha o veículo no seu stand, procurava comprador, e vendia-o, pagando ao réu E... o valor acordado, devendo este entregar à ré C... a documentação necessária para esta poder proceder ao registo da aquisição a favor do comprador encontrado.
Improcede o recurso dos réus, também neste segmento.

5. Fundamentos de facto
Face ao teor da decisão que antecede, está provada nos autos a seguinte factualidade relevante:
5.1. No dia 2 de Novembro de 2012, o autor acordou com a ré C..., num stand sito no ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, o fornecimento pela ré ao autor do veículo automóvel da marca Volkswagen, modelo ..., de matrícula ..-..-QR, mediante o pagamento pelo autor do preço de 6.750,00 €.
5.2. Na mesma data, o autor pagou à ré C... o preço identificado em 4.1. através da entrega de dois veículos automóveis - um da marca Honda, modelo ..., de matrícula ..-..-DS e outro da marca Volkswagen, modelo ..., de matrícula ..-..-GU - e da entrega da quantia de 5.000,00 € em numerário.
5.3. No dia 2 de Novembro de 2012 o veículo ..-..-QR foi entregue ao autor que a partir daí o passou a deter.
5.4. A ré C... comprometeu-se a efetuar o registo de propriedade do veículo ..-..-QR em nome do autor, não lhe tendo entregue os documentos do mesmo.
5.5. Apesar das interpelações do autor para o efeito, a ré C... não procedeu ao registo do veículo ..-..-QR em seu nome, nem lhe entregou nenhum dos documentos que lhe permitam circular com o mesmo, designadamente, o respetivo certificado de matrícula.
5.6. O veículo ..-..-QR tinha sido colocado no stand da ré C... pelo réu E..., casado com a ré D..., para que a ré C... arranjasse comprador para o mesmo.
5.7. Na sequência de divergências entre o réu E... e a ré C..., a ré D..., sabendo do acordo celebrado entre o autor e a ré C..., procedeu, no dia 20.12.2012 e tal como se refere em 5.21., ao registo do veículo ..-..-QR em seu nome, recusando-se os réus a entregar os documentos do mesmo ao autor.
5.8. O autor, por falta de documentos, deixou de circular com o veículo ..-..-QR cerca de 3 semanas após a data a que se alude em 5.3., tendo entretanto adquirido um outro veículo para suprir a sua imobilização.
5.9. O veículo ..-..-QR destinava-se a assegurar as deslocações do autor e do seu agregado familiar.
5.10. Os documentos relativos ao veículo ..-..-QR encontram-se na posse dos réus E... e D....
5.11. A aqui mandatária do autor, em sua representação, dirigiu à ré D..., mediante correio registado, a comunicação escrita junta aos autos a fls. 11 a 12, datada de 23.01.2013, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
5.12. Os réus D... e E... dedicam-se à compra para posterior revenda de bens de empresas declaradas insolventes.
5.13. No exercício da atividade identificada em 5.12., a ré D..., no dia 22 de Maio de 2012, adquiriu, num leilão realizado nas instalações da insolvente “F..., Lda”, o veículo ..-..-QR, identificado em 5.1.
5.14. A ré C... já antes havia acordado com o réu E... no sentido de expor no seu stand os veículos que este último pretendia vender e de encontrar comprador para os mesmos.
5.15. Acordaram a ré C... e o réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que logo que esta encontrasse comprador para o mesmo pagaria ao réu E... um valor não concretamente apurado mas não superior a 5.500,00 €, entregando-lhe este a necessária documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem a ré indicasse.
5.16. Constatando que o veículo ..-..-QR não se encontrava no stand da ré C..., o réu E... contactou-a, tendo-lhe esta dito que encontrara comprador para o veículo mas que se encontrava pendente o processo relativo ao pedido de crédito para pagamento do preço.
5.17. O tempo foi passando sem que a ré C... aparecesse para entregar o valor ajustado com o réu E... para o veículo ..-..-QR e levantar a documentação relativa ao mesmo.
5.18. O réu E... temeu pelo destino do veículo ..-..-QR.
5.19. Em data não concretamente apurada mas posterior àquela a que se alude em 5.1. a 5.3., o réu E... contactou o autor, dizendo-lhe que não havia recebido o valor correspondente ao preço do veículo ..-..-QR.
5.20. A ré D..., em 20.12.2012, efetuou o registo da propriedade do veículo ..-..-QR em seu nome.
5.21. A ré C... encerrou o stand e nunca mais entregou aos réus D... e E... o valor correspondente ao preço do veículo e referenciado em 5.15.
5.2. Factos não Provados:
Não resultou provado qualquer outro facto, de entre os alegados, com interesse para a decisão da causa, designadamente, não se provou que:
5.1. O valor acordado pelo pagamento do veículo ..-..-QR foi entregue pelo autor a L....
5.2. O valor de 4.500,00 € foi entregue pelo autor ao L..., a pedido deste.
5.3. Os réus D... e E... são casados no regime da separação de bens.
5.4. Para o exercício da atividade identificada em 4.12. é indispensável haver liquidez, visto que os bens são comprados a pronto pagamento.
5.5. O valor comercial do veículo ..-..-QR é, na presente data, de 2.500,00 €.

6. Fundamentos de direito
6.1. Apreciação do segmento jurídico do recurso dos réus
6.1.1. Natureza jurídica do negócio
Na sentença, a Mª Juíza, integrando juridicamente a factualidade provada, cita o Professor Mota Pinto (Teoria Geral do Negócio Jurídico, pág. 253), acolhendo a noção doutrinária de contrato de consignação como aquele «nos termos do qual uma das partes remete à outra tantas unidades de certa mercadoria, para que esta as venda, com o direito a uma participação nos lucros e a obrigação de restituir as unidades não vendidas».
Nas conclusões 18.ª a 28.ª, os recorrentes (réus) insurgem-se contra a qualificação jurídica do contrato, alegando, em síntese: para que haja contrato de consignação, enquanto requisito essencial, é necessário que sejam conferidos poderes ao destinatário das mercadorias para proceder à venda das mesmas; não ficou demonstrado que a ré C... tenha ficado autorizada a proceder à venda da viatura; tratando-se de um facto constitutivo do direito invocado pelo autor, sobre ele recaía o ónus da prova.
Vejamos.
Como se refere no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 9.10.2003, (processo n.º 03B1585), na venda à consignação, «o consignatário efectua as vendas em nome próprio, mas por conta do consignante», existindo «um verdadeiro mandato para venda do bem entregue em regime de consignação (com a obrigatoriedade, para o consignatário, de devolver o bem se o não vender) embora sem que ao mandatário sejam conferidos poderes de representação, situação expressamente prevista pelo artº. 1180º do C.Civil». Configura-se um mandato sem representação, nos termos e para os efeitos dos artºs. 1180º e seguintes do C.Civil, quando, «concertadamente, e sem outorga da procuração específica, o mandatário celebra um dado negócio jurídico em seu próprio nome (nomine proprio) mas por conta do mandate, ocorrendo em tal situação uma interposição real de pessoas», sendo certo que, «tal como prevê o art.º 217º do C.Civil, a declaração negocial, designadamente a integrante do contrato de mandato (com ou sem poderes de representação) pode ser expressa ou tácita, revestindo esta última forma quando se deduz de factos (factos concludentes) que, com toda a probabilidade, a revelem».
A nulidade da venda de bens alheios apenas se aplica “à venda de coisa alheia como própria” (art.º 904.º do CC), podendo as partes considerar as coisas como futuras (art.º 893.º do CC), sendo válida a venda de bens futuros (art.º 880.º do CC), ficando o vendedor «obrigado a exercer as diligências necessárias para que o comprador adquira os bens vendidos» (art.º 880.º, n.º 1 do CC).
Como lapidarmente refere Pedro Romano Martinez[7]: «A lei não impede assim que se proceda à venda, por exemplo, de bens alheios, desde que essa situação, a falta de titularidade do direito, seja conhecida do comprador. Por conseguinte, se o comprador sabe que os bens adquiridos estão na disponibilidade jurídica do vendedor, nada impede a celebração do contrato de compra e venda. A compra e venda de coisa futura na perspetiva de alheia, não se confunde com a venda de bens alheios, regulada nos art.s 892.º e ss. CC, em que a falta de legitimidade não foi tida em conta».
Provou-se, com particular relevância, que:
5.14. A ré C... já antes havia acordado com o réu E... no sentido de expor no seu stand os veículos que este último pretendia vender e de encontrar comprador para os mesmos.
5.15. Acordaram a ré C... e o réu E..., com conhecimento e consentimento da ré D..., que o veículo ..-..-QR seria exposto, como foi, no stand da ré C..., e que logo que esta encontrasse comprador para o mesmo pagaria ao réu E... um valor não concretamente apurado mas não superior a 5.500,00 €, entregando-lhe este a necessária documentação para a transferência da propriedade do veículo a quem a ré indicasse.
5.16. Constatando que o veículo ..-..-QR não se encontrava no stand da ré C..., o réu E... contactou-a, tendo-lhe esta dito que encontrara comprador para o veículo mas que se encontrava pendente o processo relativo ao pedido de crédito para pagamento do preço.
Em suma, da factualidade provada decorre que: o réu E... entregou à ré C... (dona do stand) o veículo, para que esta encontrasse comprador; ficou acordado que após efetuar a venda, a ré C... pagaria ao réu E... o valor acordado entre estes; a ré C... procedeu à venda, dizendo ao réu E... que aguardava o pagamento do veículo através de instituição de crédito (à qual o comprador teria recorrido); no entanto, o comprador (autor) já tinha pago o preço (vide facto 4.2).
Pensamos, salvo todo o respeito devido, que a ré C... tinha manifesta legitimidade para realizar a venda, decorrendo da factualidade provada a existência de um óbvio mandato para venda, sem representação, e que o negócio em apreço se deverá qualificar como venda à consignação.
Conclui-se na sentença recorrida:
«Ora, no contrato de consignação, melhor dito, de venda à consignação, o consignatário efectua as vendas em nome próprio, mas por conta do consignante. Há, pois, um verdadeiro mandato para venda do bem entregue em regime de consignação (com a obrigatoriedade, para o consignatário, de devolver o bem se o não vender) embora sem que ao mandatário sejam conferidos poderes de representação, situação expressamente prevista pelo art.º 1180 do CC, nos termos do qual “O mandatário, se agir em nome próprio, adquire os direitos e assume as obrigações decorrentes dos actos que celebra, embora o mandato seja conhecido dos terceiros que participam nos actos ou sejam destinatários destes.” […]
Em face do exposto, concluímos que o mandato conferido à ré C..., mesmo sem representação, conferiu-lhe legitimidade para vender o veículo ..-..-QR. E, assim sendo, a venda do veículo ..-..-QR pela mesma efectuada ao autor é válida, pese embora a coisa seja alheia. Tal como referem Pires de Lima e Antunes Varela, in “Código Civil Anotado”, vol. II, 3ª edição, pág. 749, importa aqui “reconhecer que, no momento da execução do mandato, o mandante perde o seu direito de propriedade em consequência da venda, e que passou a ser proprietário, nesse mesmo momento, o terceiro adquirente. A obrigação de entregar a coisa, essa pertence ao mandatário, nos termos do artº. 1180º”.
Assim, com a venda efectuada pela ré C... ao autor do veículo ..-..-QR, ocorreu a transferência para o autor do direito de propriedade sobre o referido veículo, tal como determina o art.º 879, al. a), do CC.».
Face às considerações jurídicas tecidas supra, concluímos que não merece qualquer censura a conclusão jurídica expressa na sentença.
Improcede o recurso dos réus neste segmento.
6.1.2. A ineficácia do registo
Finalmente, nas conclusões 18.ª a 24.ª, insurgem-se os recorrentes contra o dispositivo da sentença, alegando, em síntese: a ré D..., em 20.12.2012, efetuou o registo de propriedade do veículo ..-..-QR em seu nome; a ré D... é, pois, dona e legítima proprietária desse veículo automóvel; sobre o autor de uma ação de reivindicação impende apenas o ónus de alegar e provar que é proprietário da coisa que reivindica e que esta se encontra em poder do réu; a reconvenção deve ser julgada procedente e em consequência ser o autor, ora recorrido, condenado a entregar o veículo à ré/reconvinte.
Invocam os réus a presunção legal iuris tantum emergente do artigo 7º do Código do Registo Predial.
As presunções legais têm um valor legalmente fixado, podendo ser juris tantum ou juris et de jure (artigo 350º, nº 2, do Código Civil) e têm incidência direta na questão do ónus da prova, na medida em que quem beneficia da uma presunção legal está dispensado de provar o facto a que a presunção legal conduz (artigo 350º, nº 1, do Código Civil).
Salvo todo o respeito devido, os réus não podem prevalecer-se da presunção que invocam, considerando que a ré D... bem sabia, quando efetuava o registo, que o fazia após a propriedade do veículo ter sido validamente transferida para o autor.
É o que resulta da seguinte factualidade provada:
5.3. No dia 2 de Novembro de 2012 o veículo ..-..-QR foi entregue ao autor que a partir daí o passou a deter.
5.4. A ré C... comprometeu-se a efetuar o registo de propriedade do veículo ..-..-QR em nome do autor, não lhe tendo entregue os documentos do mesmo.
5.5. Apesar das interpelações do autor para o efeito, a ré C... não procedeu ao registo do veículo ..-..-QR em seu nome, nem lhe entregou nenhum dos documentos que lhe permitam circular com o mesmo, designadamente, o respetivo certificado de matrícula.
5.6. O veículo ..-..-QR tinha sido colocado no stand da ré C... pelo réu E..., casado com a ré D..., para que a ré C... arranjasse comprador para o mesmo.
5.7. Na sequência de divergências entre o réu E... e a ré C..., a ré D..., sabendo do acordo celebrado entre o autor e a ré C..., procedeu, no dia 20.12.2012 e tal como se refere em 5.21., ao registo do veículo ..-..-QR em seu nome, recusando-se os réus a entregar os documentos do mesmo ao autor. (sublinhado da responsabilidade do relator)
Em suma, o negócio foi celebrado em 2.11 2012 e só no dia 20.12.2012 (mais de um mês depois), tendo já conhecimento da venda, a ré D... registou (abusivamente) a titularidade do veículo em seu nome.
Não se vislumbra assim, como possa invocar a presunção em causa.
Improcede o recurso neste segmento.
6.2. Apreciação do segmento jurídico do recurso do autor
Insurge-se o autor contra a sentença, no segmento em que condena os réus apenas por cada dia decorrido entre 23.11.2012 até à data em que o autor adquiriu o novo veículo
Alega em síntese (conclusões 6.ª a 12.ª): os réus estavam obrigados a entregar ao autor, quer o requerimento para registo de propriedade do veículo a seu favor, quer o respetivo certificado de matrícula; o veículo destinava-se a assegurar as deslocações do autor e do seu agregado familiar; deviam os réus ter sido condenados, solidariamente, a pagar a quantia global de 9.890,00€ (1978 dias x5€), calculada tendo em conta o período a partir do qual o autor ficou privado do uso do veículo, 23.11.2012 e a data da prolação da sentença, sem prejuízo de tal quantitativo diário se vencer até efetiva entrega dos documentos do veículo ao Autor.
Consta da fundamentação da sentença, no segmento em apreço:
«Temos por assente que a privação do uso do veículo não constitui, só por si, autonomamente, um dano indemnizável, ou seja, sem que se comprove um prejuízo concreto, na medida em que a simples detenção do veículo pode não traduzir qualquer utilização.
A jurisprudência nem sempre tem sido uniforme relativamente a esta questão, entendendo uns que a indemnização pela privação do uso de um veículo automóvel depende da prova de um dano concreto, ou seja, da demonstração de prejuízos decorrentes directamente da não utilização do bem, sustentando outros que a simples privação do uso, por si só, constitui um dano indemnizável, independentemente da utilização que dele se faça, ou não, durante o período da privação.
Seguimos a primeira corrente jurisprudencial por considerar mais consentânea com os textos legais da responsabilidade civil.
É que a obrigação de indemnizar pressupõe a existência de um dano real, concreto, efectivo - art.ºs 563 e 564, n.º 2, do CC -, pelo que não basta demonstrar-se a simples privação, é necessário, ainda, que o lesado alegue e prove que a privação da coisa lhe acarretou prejuízo, ou seja, que seria por ele utilizada durante o período da privação (neste sentido o Ac. do STJ de 03.05.2011, Processo n.º 2618/08.06TBOVR.P1, in www.dgsi.pt).
Não oferece dúvidas que a mera utilização ou uso de um veículo automóvel se traduz numa vantagem patrimonial susceptível de avaliação pecuniária e, consequentemente, inscrita nos danos indemnizáveis (art.ºs 562 e ss. e 1305, do CC) de acordo com critérios de equidade, ponderadas as circunstâncias do caso concreto, nos termos do art.º 566, n.º 3, do CC.
Como se escreveu no Ac. do STJ de 03.05.2011, “Em termos rigorosos, portanto, dir-se-á que a privação do uso é condição necessária, mas não suficiente, da existência de um dano correspondente a essa realidade de facto. Isto porque, como bem se observa no acórdão do STJ de 16/3/011 (Proc.º 3922/07.4TBVCT.G1.S1),“Podem ... configurar-se situações da vida real em que o titular da coisa não tenha interesse algum em usá-la, não pretenda dela retirar as utilidades que aquele bem normalmente lhe podia proporcionar (o que até constitui uma faculdade inerente ao direito de propriedade), ou pura e simplesmente não usa a coisa. Em situações como estas, se o titular se não aproveita das vantagens que o uso normal da coisa lhe proporcionaria, também não poderá falar-se de prejuízo ou dano decorrente da privação do uso, visto que, na circunstância, não existe uso, e, não havendo dano, não há, evidentemente, obrigação de indemnizar. Por isso, competindo ao lesado provar o dano ou prejuízo que quer ver ressarcido, não chega alegar e provar a privação da coisa, pura e simplesmente, mostrando-se ainda necessário, que o A. alegue e demonstre que pretendia usar a coisa, ou seja, que dela pretende retirar as utilidades (ou algumas delas) que a coisa normalmente lhe proporcionaria se não estivesse dela privado pela actuação ilícita do lesante. E tal exigência não se nos afigura exorbitante. Apresenta-se, tão só, na sequência lógica da realidade das coisas, como pressuposto mínimo da existência do dano e como índice seguro para que o tribunal possa arbitrar a indemnização pretendida com base na utilidade ou utilidades que o titular queria usufruir e não pôde, por estar privado da coisa por ato culposo de outrem (...).A título de exemplo, quando a privação do uso recaia sobre um veículo automóvel danificado num acidente de viação, bastará que resulte dos autos que o seu proprietário o usaria normalmente (o que na generalidade das situações concretas constituirá facto notório ou poderá resultar de presunções naturais a retirar da factualidade provada) para que possa exigir-se do lesante uma indemnização a esse título, sem necessidade de provar direta e concretamente prejuízos efetivos, como, por exemplo, que deixou de fazer esta ou aquela viagem de negócios ou de lazer, que teve de utilizar outros meios de transporte (táxi, transportes públicos, automóvel alugado, etc.) com o custo correspondente. Portanto, se puder ter-se por provado que o proprietário lesado utilizava na sua vida corrente e normal o veículo sinistrado, ficando privado desse uso ordinário em consequência dos danos sofridos pela viatura no acidente, provado está o prejuízo indemnizável durante o período de privação, ou, tratando-se de inutilização total, enquanto não for indemnizado da sua perda nos termos gerais. É neste contexto que dizemos que a privação do uso, constitui, por si, um prejuízo indemnizável”.
No caso concreto, resultou provado que o veículo ..-..-QR foi adquirido pelo autor para assegurar as suas deslocações e do seu agregado familiar, sendo que, por falta de documentos, o autor deixou de circular com ele cerca de 3 semanas após a data em que o adquiriu, tendo entretanto adquirido um outro veículo para suprir a sua imobilização.
Neste contexto, não temos dúvidas de que a privação do veículo causou prejuízos ao autor. Efectivamente, no período compreendido entre 23.11.2012 (3 semanas após a aquisição do veículo) e a data em que adquiriu o novo veículo para suprir a sua falta (data essa que desconhecemos), o autor ficou sem qualquer veículo com que assegurar as suas deslocações. Conclui-se assim que lhe assiste o direito a ser indemnizado pela privação do uso do veículo em causa nos autos, desde a data de 23.11.2012 até à data em que adquiriu um novo veículo.
Consequentemente, fazendo uso do princípio da equidade previsto no art.º 566, n.º 3 do CC, e tendo em conta todas as circunstâncias do caso concreto, considera-se adequado fixar a indemnização devida a tal título na quantia peticionada de € 5,00 diários, cujo valor total, dependendo da data em que o autor adquiriu o novo veículo, terá de ser apurado em sede de incidente de liquidação».
Cumpre decidir.
Provou-se a seguinte factualidade relevante:
5.3. No dia de novembro de 2012 o veículo ..-..-QR foi entregue ao autor que a partir daí o passou a deter.
5.8. O autor, por falta de documentos, deixou de circular com o veículo ..-..-QR cerca de 3 semanas após a data a que se alude em 5.3., tendo entretanto adquirido um outro veículo para suprir a sua imobilização.
5.9. O veículo ..-..-QR destinava-se a assegurar as deslocações do autor e do seu agregado familiar.
Como se refere na sentença recorrida, verifica-se uma profunda divergência na jurisprudência, relativamente à indemnização por privação de veículo, entendendo uma corrente, que a atribuição de uma tal indemnização depende da prova do dano concreto, ou seja, para a determinação do dano deve o lesado concretizar e demonstrar a situação hipotética que existiria se não fosse a lesão (no caso, a privação do uso), o que se traduz na exigência da prova da situação vantajosa concreta e da sua frustração pela privação do uso da coisa (o que se conduz à aplicação da teoria da diferença), defendendo a outra corrente que a simples privação do uso de certa coisa, desde que imputável à culpa de terceiro, constitui um dano indemnizável, autónomo, independentemente da utilização que se faça ou não faça do bem em causa durante o período da privação, o que significa, que nessa perspetiva, a privação de uso de uma coisa determina automaticamente um prejuízo para o seu dono, que deverá ser indemnizado quando a mesma seja imputável a terceiro a título de culpa[8].
Entendemos que a decisão a proferir sobre a situação sub judice não implica, necessariamente, a opção por qualquer destas correntes jurisprudenciais.
Com efeito, como ponto de partida haverá que considerar que o dano reporta-se sempre à situação concreta do lesado, não podendo ser considerado como uma abstracção[9].
Ora, como se defende no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça citado (de 16.03.2011, processo n.º 3922/07.2TBVCT.G1.S1), mesmo aderindo à segunda tese enunciada, o dano indemnizável nunca se reportará a uma situação abstrata.
Refere-se no citado aresto, que não podem restar dúvidas de que a privação injustificada do uso de uma coisa pelo respetivo titular, pode constituir um ilícito suscetível de gerar obrigação de indemnizar, uma vez que, «na normalidade dos casos, impedirá o seu proprietário do exercício dos direitos inerentes à propriedade, isto é, impede-o de usar a coisa, de fruir as utilidades que ela normalmente lhe proporcionaria, enfim, impede-o de dela dispor como melhor lhe aprouver, violando o direito de propriedade do respetivo titular».
«Podem, porém, configurar-se situações da vida real em que o titular da coisa não tenha interesse algum em usá-la, não pretende dela retirar as utilidades que aquele bem normalmente lhe podia proporcionar (o que até constitui uma faculdade inerente ao direito de propriedade) ou pura e simplesmente não usa a coisa».
«Em situações como estas, se o titular se não aproveita das vantagens que o uso normal da coisa lhe proporcionaria, também não poderá falar-se de prejuízo ou dano decorrente da privação do uso, visto que, na circunstância, não existe uso, e, não havendo dano, não há, evidentemente, obrigação de indemniza».
E conclui-se no citado aresto:
«Por isso, competindo ao lesado provar o dano ou prejuízo que quer ver ressarcido, não chega alegar e provar a privação da coisa, pura e simplesmente, mostrando-se ainda necessário, que o A. alegue e demonstre que pretendia usar a coisa, ou seja, que dela pretende retirar as utilidades (ou algumas delas) que a coisa normalmente lhe proporcionaria se não estivesse dela privado pela actuação ilícita do lesante.
E, tal exigência não se nos afigura exorbitante. Apresenta-se, tão só, na sequência lógica da realidade das coisas, como pressuposto mínimo da existência do dano e como índice seguro para que o tribunal possa arbitrar a indemnização pretendida com base na utilidade ou utilidades que o titular queria usufruir e não pôde, por estar privado da coisa por acto culposo de outrem.
De contrário, sendo a coisa adequada, segundo a experiência comum, a proporcionar várias utilidades ou vantagens, teria de ser o julgador a escolher, aquela ou aquelas em que iria fundamentar a indemnização, o que contrariaria o princípio do pedido e poderia ser arbitrário.
Aliás, a prova de tal circunstancialismo de facto, em muitos casos concretos, poderá advir de simples presunções naturais ou judiciais a retirar pelas instâncias da factualidade envolvente.
A título de exemplo, quando a privação do uso recaia sobre um veículo automóvel danificado num acidente de viação, bastará que resulte dos autos que o seu proprietário o usaria normalmente (o que na generalidade das situações concretas constituirá facto notório ou poderá resultar de presunções naturais a retirar da factualidade provada) para que possa exigir-se do lesante uma indemnização a esse título, sem necessidade de provar directa e concretamente prejuízos efectivos, como, por exemplo, que deixou de fazer esta ou aquela viagem de negócios ou de lazer, que teve de utilizar outros meios de transporte (táxi, transportes públicos, automóvel alugado etc) com o custo correspondente.
Portanto, se puder ter-se por provado que o proprietário lesado utilizava na sua vida corrente e normal o veículo sinistrado, ficando privado desse uso ordinário em consequência dos danos sofridos pela viatura no acidente, provado está o prejuízo indemnizável durante o período de privação, ou, tratando-se de inutilização total, enquanto não for indemnizado da sua perda nos termos gerais.
É neste contexto que dizemos que a privação do uso, constitui, por si, um prejuízo indemnizável».
Aderimos a este entendimento, também acolhido no acórdão da Relação de Coimbra, de 8.04.2014 (processo n.º 1091/12.7TJCBR.C1)[10], no qual, perfilhando a segunda corrente jurisprudencial enunciada supra, se conclui que «sempre será necessário provar o dano, mas não exactamente nos termos defendidos pela primeira teoria acima referida, pois que não haverá dúvidas sérias de que a privação injustificada do uso de uma coisa pelo respectivo titular, pode constituir um ilícito susceptível de gerar obrigação de indemnizar, uma vez que, na generalidade dos casos, impedirá o seu proprietário do exercício dos direitos inerentes à propriedade».
Revertendo à situação sub judice, não restam dúvidas, face à prova produzida, de que o recorrente (autor) teve um prejuízo concreto e efetivo decorrente da privação de uso do veículo.
A Mª Juíza enquadrou tal prejuízo no âmbito temporal que medeia entre o momento em que deixou de utilizar o veículo e o momento (a definir em sede de liquidação), em que adquiriu um outro veículo “para suprir a sua imobilização”.
O recorrente (autor) insurge-se contra este segmento decisório, alegando que o prejuízo continuou a verificar-se.
Salvo o devido respeito, não estamos de acordo.
A partir do momento em que adquiriu outro veículo “para suprir a (…) imobilização” do veículo que adquirira aos réus, deixou de se verificar o dano de privação de uso, podendo verificar-se, quanto muito, um outro dano, cujo ressarcimento o autor não pede: o eventual dano decorrente do capital adiantado para a aquisição do novo veículo, o qual se deveria medir pela capacidade de rendimento de tal capital mobilizado, desde a data da mobilização até à entrega dos documentos que permitiriam a utilização (circulação) do veículo adquirido aos réus.
Atenta a formulação da pretensão do autor na petição, e o facto de se ter provado que adquiriu um outro veículo para substituir o que adquiriu aos réus, entendemos que não merece censura a sentença recorrida, também neste segmento.
Decorre do exposto a total improcedência das pretensões recursórias formuladas por autor e réus.

III. Dispositivo
Com fundamento no exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar totalmente improcedentes os recursos, aos quais negam provimento, mantendo, em consequência, na íntegra, a sentença recorrida.
*
Custas dos recursos pelos respetivos recorrentes.
*
O presente acórdão compõe-se de trinta e nove páginas e foi elaborado em processador de texto pelo relator.
*
Porto, 5 de novembro de 2018
Carlos Querido
Correia Pinto
Ana Paula Amorim
____________
[1] A Ação Declarativa Comum Á Luz do Código de Processo Civil de 013, Coimbra Editora, 3.ª edição, 2013, pág. 320.
[2] Seguimos de perto o entendimento expresso nos seguintes acórdãos desta Relação, não disponíveis no site da DGSI: acórdão de 1.06.2015, proferido no processo n.º 121439/13.0YIPRT.P1 e acórdão de 24.10.2016, proferido no processo n.º 7671/11.0TBMTS.P1, relatados pelo Desembargador Carlos Gil e subscrito pelo ora relator como 1.º adjunto, e acórdão de 19.03.2018, proferido pelo ora relator no processo n.º 316/15.1T8FLG.P1.
[3] Cabe referir a latere, que causa alguma estranheza a invocação de omissão de apreciação dum facto alegado pela parte contrária (autor) que os apelantes (réus) consideram integrante da causa de pedir. Com efeito, a alegada omissão de apreciação dum facto integrador da causa de pedir, alegado pelo autor, só a este poderia prejudicar.
[4] Foi alterada a numeração para mais correta sistematização do acórdão.
[5] Vide, a propósito, o acórdão da RP de 20.3.2001-processo 0120037 (publicado no “site” da dgsi): A prova, por força das exigências da vida jurisdicional e da natureza da maior parte dos factos que interessam à administração da justiça, visa apenas a certeza subjectiva, a convicção positiva do julgador. Se a prova em juízo de um facto reclamasse a certeza absoluta da verificação do facto, a actividade jurisdicional saldar-se-ia por uma constante e intolerável denegação da justiça.
[6] Proferido no processo n.º 1267/06.6TBAMT.P2, acessível no site da DGSI, subscrito pelo ora relator na qualidade de 1.º adjunto.
[7] Contratos em Especial, Universidade Católica Editora, 2.ª edição, 1996, pág. 56.
[8] Vide acórdão do STJ, de 16.03.2011 (processo n.º 3922/07.2TBVCT.G1.S1), onde se enuncia e se debate a questão.
[9] Vide José Alberto González, Direito da Responsabilidade Civil, Quid Juris, 2017, pág. 67.
[10] Vide no citado aresto, disponível no site da DGSI, a vasta referência aos acórdãos que perfilham qualquer das posições divergentes referidas.