Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
80/13.9TTSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO A TERMO
DESPEDIMENTO ILÍCITO
INDEMNIZAÇÃO
SUBSÍDIO DE DESEMPREGO
Nº do Documento: RP2015010580/13.9TTSTS.P1
Data do Acordão: 01/05/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: No despedimento ilícito ocorrido no âmbito de um contrato de trabalho a termo o disposto no art. 393º, nº 2, al. a), do CT/2009 consagra um montante compensatório mínimo, não lhe sendo aplicável a dedução prevista no art. 390º, nº 2, al. c), do citado Código.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 80/13.9TTSTS.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 806)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Maria José Costa Pinto

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

B…, aos 08.02.2013 e litigando com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, intentou contra C…, LDA., ação declarativa de condenação, com processo comum, pedindo que seja:
“a)- declarada a ilicitude do despedimento efetuado pela Ré ao Autor no dia 21/05/2012;
b)- condenada a Ré a pagar ao Autor o valor de € 2.817,05 a título de indemnização pelo despedimento;
c)- condenada a Ré a pagar ao Autor o valor de € 225,36 a título de férias não gozadas pelo Autor;
d)- condenada a Ré a pagar ao Autor o valor de € 563,40 a título de subsídio de férias e subsídio de Natal;
e)- condenada a Ré a pagar ao Autor o valor de € 338,00, correspondente a 3 dias de retribuição base por cada mês de duração do contrato;
f)- condenada a Ré a pagar ao Autor o valor de € 500,00 a título de danos não patrimoniais;
- Valores acrescidos de juros de mora, à taxa legal, desde a data em que tais montantes eram devidos (21/05/2012) até integral pagamento, e deduzidos dos montantes já pagos pela Ré ao Autor (€ 3.512,02).”
Para tanto, e em síntese, alegou que:
Aos 21.04.2014, celebrou com a Ré o contrato de trabalho a termo certo de seis meses, para o exercício das funções de motorista distribuidor, mediante a retribuição mensal de €563,41, constando como data de início de tal contrato a de 21.04.2012 e termo em 21.05.2012 e, como período experimental, o de 30 dias, muito embora, aquando dessa celebração, já se encontrasse ao serviço da ré há cerca de uma semana.
No dia 21.05.2012, a Ré comunicou-lhe que tal contrato de trabalho cessaria nesse dia e no período experimental, altura em que lhe foi entregue declaração de situação de desemprego, de onde consta essa mesma data de 21/05/2012 como data da cessação do contrato.
Acontece, que a comunicação da cessação do contrato, nessa data, ocorreu já após o decurso do período experimental, pelo que o despedimento do autor é ilícito, com as consequências legais decorrentes do disposto no art. 393º, nº 2, al. a), do CT, ou seja, no pagamento de uma indemnização a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, a qual não pode ser inferior ao que o A. deixou de auferir desde o despedimento até ao termo do contrato (ou seja, até 10.10.2012), no montante de €2.817,05 (€563.41 x 5).
Tem ainda direito às quantias reclamadas a título de férias não gozadas e de subsídios de férias e de Natal, bem como, nos termos do art. 344º do CT, à de €338,00.
Alega ainda que depois do sucedido recebeu cartas da ré, a que deu resposta, e cujas cópias se encontram juntas aos autos, no sentido de que teria havido lapso nos serviços da ré, pelo que o contrato de trabalho do autor não havia cessado, o que só sucederia em 20 de Outubro de 2012, caso não fosse renovado, o que mais tarde lhe foi comunicado, havendo-lhe, já após ter-lhe sido concedido o respetivo subsídio de desemprego, feito várias transferências para a conta bancária do A., no total de €3.512,02.
A tudo isso sempre se opôs o autor, que entende não assistir razão à ré, estando inclusivamente a receber já subsídio de desemprego, razão pela qual não considerava os valores que a ré havia creditado na sua conta bancária como retribuição (o que sempre pressuporia a prestação de trabalho, que não ocorreu) mas antes parte da indemnização prevista na Lei, devendo tais valores ser descontados aos que o autor tem direito a receber.

A Ré contestou alegando em síntese que: efetivamente entregou ao A. em 21 de Maio de 2012, declaração de situação de desemprego, indicando a cessação de contrato de trabalho por denúncia, no período experimental, o que se deveu, todavia, a mero lapso, reconhecido pela ora contestante naquele mesmo dia, tendo, na sequência, informado o autor que tal declaração de despedimento devia ser dada sem efeito, razão pela qual se devia apresentar ao trabalho e retomar a atividade. O autor não mais retomou a sua atividade até ao final do contrato, nem compareceu no seu local de trabalho, tendo a ré, todavia, pago todas as retribuições a que o mesmo tinha direito, até final do contrato, no montante global de €3.512,02.
Deste modo, sempre terá de se concluir que o autor recebeu indevidamente o subsídio de desemprego da Segurança Social, o que determina a exigência de devolver à Segurança Social os montantes indevidamente recebidos àquele título.
Invocando o art. 325º e segs. do CPC requereu a intervenção principal provocada do Centro Distrital de Segurança Social do Porto como auxiliar da ora contestante, a fim de reclamar, querendo, os montantes que o autor alegada e indevidamente terá recebido, a título de subsídio de desemprego.

O A. respondeu nos termos constantes de fls. 78 e segs, aí ampliando o pedido formulado nos termos do qual pediu a condenação da Ré a pagar-lhe: a) €1.000,00 a título de danos não patrimoniais, conforme alegado nos artigos 2ª a 7ª antecedentes; b) o valor que se vier a liquidar em incidente posterior à sentença, conforme alegado nos artigos 8º a 11º antecedentes; tudo com juros de mora, à taxa legal, desde a data da notificação da ampliação do pedido até integral pagamento.
Para tanto alegou que devido ao facto de a Ré ter comunicado à Segurança Social – embora falsamente – que o autor se encontrava a receber remunerações, veio esta a comunicar ao A. a suspensão do subsídio de desemprego que se encontrava a receber, a partir de Março de 2013, até que a situação fosse esclarecida. Ora, tal situação – “que não teria sucedido se a ré não tivesse falsamente comunicado à Segurança Social que o autor se encontrava ao seu serviço” - tem causado elevadíssimos danos ao autor, desde logo de natureza moral (“impossibilidade de fazer face aos seus encargos e tendo de recorrer a ajudas de familiares para poder sobreviver, bem como sua esposa e um filho de tenra idade, o que deixa o A. completamente transtornado e revoltado, para além de lhe causar perdas de sono, irritação e grande instabilidade emocional”) que merecem a tutela do direito e que acrescem aos já alegados na p.i., devendo os mesmos ser compensados com valor nunca inferior a € 1.000,00.
Por outro lado, tendo em conta que tal situação apenas ocorreu pelo facto de a Ré ter feito a falsa comunicação à Segurança Social de que o A. se encontrava ao seu serviço, a Ré deverá também ser condenada a pagar-lhe os valores que o mesmo vier a deixar de receber da Segurança Social até que a situação seja regularizada naquela entidade, razão pela qual deverá a Ré ser também condenada a pagar ao Autor o valor que se vier a liquidar em incidente posterior à sentença relativamente a tais danos, por tal montante ser ainda neste momento ilíquido.

A Ré respondeu à matéria da ampliação, alegando em síntese: o que já consta da contestação; mesmo que se considerasse ilícita a cessação do contrato, a Ré pagou ao A. tudo quanto seria devido até à cessação do contrato, concretamente a indemnização a que se reporta o art. 393º, nº 2, al. a), do CT, o que inviabiliza os invocados danos não patrimoniais com fundamento na impossibilidade de fazer face aos encargos do dia a dia; tendo recebido todas as remunerações não as pode cumular com o subsídio de desemprego. Conclui pela improcedência da ampliação.

Após a realização de diversas diligências, mormente junto da Segurança Social, aos 13.05.2014 veio a ser proferida a decisão de fls. 140 a 151, nos termos da qual se indeferiu o pedido de intervenção da Segurança Social, e se julgou a ação parcialmente procedente por provada e, em consequência se decidiu:
“a)- Declarar a ilicitude do despedimento efectuado pela Ré ao Autor no dia 21/05/2012;
b)- Condenar a Ré a pagar ao Autor o valor de 2.817,05 euros a título de indemnização pelo seu ilícito despedimento;
c)- Condenar a Ré a pagar ao Autor os proporcionais referentes ao trabalho prestado, a título de férias, subsídio de férias e de Natal, no valor global de 788,76 euros;
d)- Condenar a Ré a pagar ao Autor o valor de 500,00 euros a título de danos não patrimoniais;
e) Aos valores em causa, de b-) a c-), acrescerão juros de mora, à taxa legal, desde a data em que tais montantes eram devidos (21/05/2012) até integral pagamento, e deduzidos dos montantes já pagos pela Ré ao Autor, no valor apurado de 3.512,02 euros;
f-) Mais se condena a ré a pagar ao autor os valores - que o mesmo deixou de receber da Segurança Social, ou tenha, eventualmente, de restituir à Segurança Social, por força das prestações de desemprego que recebeu a partir de Maio/2012 até Outubro/2012, desde que tal ocorra, em consequência e exclusivamente, por força da ilícita comunicação da ré àquela entidade, de que o autor estaria a trabalhar para si – e a que acrescerão todos os custos que o autor tenha de despender para fazer valer os seus direitos junto da Segurança Social e assim repor as prestações sociais a que teria direito por força desta questão - o que se remete para liquidação posterior.”
Mais fixou à ação, “para efeito de custas”, o valor de €5.443,81, não tendo sido proferida decisão em matéria de custas.

Inconformada, veio a Ré recorrer, formulando, a final das suas alegações, as seguintes conclusões:
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O Recorrido contra-alegou pugnando pelo não provimento do recurso.

A Exmª Srª Procuradora Geral Adjunta emitiu douto parecer no sentido do parcial provimento do recurso (provimento quanto ao segmento decisório em que condenou a ré a pagar ao A. a indemnização por danos não patrimoniais e não provimento quanto ao demais).
Sobre tal parecer pronunciaram-se as partes, concordando com o mesmo na parte em que lhes é favorável e discordando na parte em que o não é.

Foi dado, pela relatora, cumprimento ao disposto no art. 657º, nº 2, do CPC/2013.
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II. Matéria de facto dada como provada pela 1ª instância

“1º Com data de 21 de Abril de 2012 foi assinado um contrato, denominado “Contrato de Trabalho a Termo Certo”, pela ré (como entidade patronal) e o autor (como funcionário), nos termos do qual a ré admitiu o autor ao seu serviço para desempenhar as funções de motorista-distribuidor, mediante o pagamento da retribuição mensal ilíquida de € 563,41, acrescida de € 3,60 a título de subsídio de alimentação (ver fls. 13/16).
2º. Tal contrato foi assinado pelo período de seis meses, com início em 21/04/2012 e termo em 21/10/2012, tendo ficado exarado em tal contrato um período experimental de 30 dias.
3º. No dia 21 de Maio de 2012, quando o autor terminou a sua jornada de trabalho, foi-lhe comunicado que o contrato de trabalho havia cessado, no período experimental, altura em que foi entregue ao autor pela ré a declaração de situação de desemprego (onde consta essa mesma data de 21/05/2012 como data da cessação do contrato – ver fls. 17).
4º. Tendo então o autor, munido da declaração que lhe foi entregue pela ré, requerido a atribuição do respetivo subsídio de desemprego, que lhe foi concedido.
5º. No dia 22 de Maio de 2012, o autor remeteu à ré a missiva cuja cópia se encontra junta a fls. 20/22 dos autos, e cujo teor aqui se reproduz para todos os efeitos legais, onde, em suma, a informava que considerava o despedimento que aquela tinha operado ilegal, e por isso reclamava os valores a que entendia ter direito, tendo, em resposta, recebido a carta da ré, datada de 31 do mesmo mês, junta a fls. 23, onde a mesma referia ter “processado um recibo de remunerações com acertos”, por lapso dos seus serviços administrativos, que teriam confundido o autor com outro funcionário, erro do qual se penitenciavam.
6º. O autor respondeu, por carta de 5 de Junho de 2012, junta a fls. 24/25, reiterando o que já havia dito anteriormente, tendo a ré, em carta remetida em 11/06/2012, junta a fls. 27, dito que o contrato de trabalho do autor não havia cessado, apelando novamente ao lapso ocorrido, o que só sucederia em 20 de Outubro de 2012, caso não fosse renovado, pelo que deveria o autor retomar a sua atividade o mais breve possível.
7º. Novamente o autor respondeu, conforme fls. 29, dizendo que não aceitava aquela argumentação, já que havia sido despedido verbalmente e por escrito (através da entrega da declaração para requerer o subsídio de desemprego, o qual já requerera).
8º. Entretanto, com data de 1 de Outubro de 2012, a ré remeteu novamente ao autor outra carta, junta a fls. 30, onde lhe comunicava a caducidade do contrato de trabalho a termo certo, ali referindo que “conforme lhe foi transmitido e aqui se reitera, está dispensada a sua prestação de trabalho, até ao final do contrato, sem perda de qualquer retribuição e/ou crédito emergente do contrato de trabalho a termo que irá cessar para todos os efeitos legais na atrás identificada data, como, aliás, lhe tem sido pagos, pontualmente, todos os montantes por transferência bancária”.
9º. Tendo o autor respondido, conforme fls. 32/33, reiterando que tinha sido despedido já em 21/05/2012, e que estava a receber já subsídio de desemprego, pelo que não considerava os valores que a ré havia creditado na sua conta bancária como retribuição (que sempre pressuporia a prestação de trabalho, o que não ocorrera) mas antes parte da indemnização prevista na Lei.
10º. Na mesma carta o autor chamou a atenção da ré para o facto de ter tomado conhecimento que a mesma havia lançado na Segurança Social (como se de salários se tratassem) os montantes que creditara na conta bancária do autor, o que lhe poderia trazer problemas com a Segurança Social (já que estava a receber o subsídio de desemprego).
11º. Entretanto recebeu o autor uma carta da ré, datada de 22/10/2012, junta a fls. 34, em que confirma a anterior carta de 01/10/2012, e uma carta de 31 do mesmo mês, a fls. 35, em que lhe remete novos documentos para poder requerer o subsídio de desemprego.
12º. E mais uma vez o autor respondeu à ré, reiterando tudo quanto já havia referido nas comunicações anteriores (fls. 40).
13º. Desde o dia 21 de Maio que o autor não mais retomou a sua actividade até ao final do contrato, nem compareceu no seu local de trabalho.
14º. Não obstante a não prestação de actividade, a ré pagou ao autor, até final do contrato, lançando tais quantias como retribuição (ver fls. 96), o valor global de 3.512,02 euros.
15º. A ré comunicou à Segurança Social a contratação do aqui autor, em 26/04/2012, com início do vínculo contratual em 21/04/2012 e data da cessação do mesmo contrato, por iniciativa da empregadora, como denúncia no período experimental, em 21/05/2012 (fls. 94).
16º. A ré comunicou à Segurança Social a contratação do aqui autor, em 10/08/2012, com início do vínculo contratual em 22/05/2012 e data da cessação do mesmo contrato, por caducidade do contrato de trabalho a termo certo, em 20/10/2012 (fls. 95).
17º. Em consequência do descrito em 4º., o autor passou a receber da Segurança Social a equivalência por prestação de desemprego total, conforme fls. 99.
18º. Em consequência da ré ter comunicado à Segurança Social que o autor se encontrava a receber remunerações, tendo iniciado vinculo contratual em 22/05/2012, a Segurança Social entendeu suspender o pagamento das retribuições por subsídio de desemprego, no período de 21/04/2012 a 13/12/2012, entretanto lançadas, após o que retomou tal pagamento até 27/04/2013, data em que cessou (ver fls. 107 a 110 e 123).
19º. Por carta datada de 10/10/2012, a Segurança Social exigiu ao autor a restituição de prestações que entendeu terem sido indevidamente pagas, no valor apurado de 1.676,36 euros (fls.126/127).
20º. E, na sequência da reclamação apresentada pelo autor, com data de 29/01/2013, informou o mesmo que estava anotada naqueles serviços uma suspensão total por exercício de actividade profissional por conta de outrem em 21/04/2012, pelo que, tendo sido processadas prestações de desemprego até 09/2012, foi criado o débito em causa, referente ao período de Maio/2012 a Setembro/2012.”
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III. Do Direito

Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões, as questões a apreciar (pela ordem por que o faremos) consistem saber se deve a Ré/Recorrente ser absolvida dos segmentos da decisão recorrida em que a condenou:
- A pagar “os valores - que o mesmo deixou de receber da Segurança Social, ou tenha, eventualmente, de restituir à Segurança Social, por força das prestações de desemprego que recebeu a partir de Maio/2012 até Outubro/2012, desde que tal ocorra, em consequência e exclusivamente, por força da ilícita comunicação da ré àquela entidade, de que o autor estaria a trabalhar para si – e a que acrescerão todos os custos que o autor tenha de despender para fazer valer os seus direitos junto da Segurança Social e assim repor as prestações sociais a que teria direito por força desta questão - o que se remete para liquidação posterior.
- A pagar a quantia de €500,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.

1.1. Na sentença recorrida considerou-se que o A. foi verbalmente despedido no dia 21.05.2012, que tal despedimento não pode ser objeto de retratação pela Ré e que o mesmo é ilícito, havendo, em consequência e nos termos do disposto no art. 393º, nº 2, al. a), do CT/2009, considerado ter o A. direito a uma indemnização a título de danos patrimoniais e não patrimoniais que, não podendo ser inferior às retribuições que este deixou de auferir desde o despedimento até ao termo do contrato (ou seja, até 20.10.2012), fixou em €2.817,05 (€563.41 x 5).

2. Da 1ª questão

A sentença recorrida condenou a Ré a pagar ao A. “os valores - que o mesmo deixou de receber da Segurança Social, ou tenha, eventualmente, de restituir à Segurança Social, por força das prestações de desemprego que recebeu a partir de Maio/2012 até Outubro/2012, desde que tal ocorra, em consequência e exclusivamente, por força da ilícita comunicação da ré àquela entidade, de que o autor estaria a trabalhar para si – e a que acrescerão todos os custos que o autor tenha de despender para fazer valer os seus direitos junto da Segurança Social e assim repor as prestações sociais a que teria direito por força desta questão - o que se remete para liquidação posterior.
Desta decisão discorda a Recorrente alegando, em síntese, que: pagou ao Recorrido as retribuições que a este eram devidas até ao termo do contrato (20.10.2012); que o A. não pode cumular tais retribuições com o subsídio de desemprego; em consequência, não poderá ser responsabilizada pelo reembolso, ao A., do montante que a este foi reclamado pela Segurança Social, no valor de €1.676,36, referente aos subsídios de desemprego pagos entre Maio e Setembro de 2012; o entendimento preconizado na sentença recorrida viola o disposto no art. 390º, nº 2, al. c) do CT e constitui um enriquecimento ilícito por parte do A.

2.1. Na sentença recorrida, ainda que a propósito dos danos não patrimoniais, mas com relevância também para a questão ora em apreço, referiu-se o seguinte:
(…)
Já assim não será, numa segunda fase, na sequência da comunicação da ré à Segurança Social de novo vínculo, em Maio/2012, sendo tal comunicação absolutamente ilícita e sem correspondência com a realidade, não tendo a ré qualquer fundamento legal para comunicar à Segurança Social o início de um vínculo contratual que sabia não ser verdade. Aliás, não podemos deixar de estranhar que tal comunicação apenas seja feita em Agosto/2012, pese embora pretenda a ré fazer crer que tudo não passou de um mero lapso, que de imediato se apercebeu e reparou! E como faz ela tal comunicação após a troca de correspondência com o autor onde este claramente lhe diz não aceitar voltar a trabalhar para si dado que tinha sido despedido?
Todos os danos e transtornos seguidamente causados ao autor, desde a suspensão da prestação de desemprego, a carta da segurança social a exigir-lhe o pagamento de retribuições indevidas, a que teve de responder a apresentar reclamação, deve-se, exclusivamente, ao comportamento da ré, (…)”.
E, concretamente a propósito da questão ora em apreço, nela se referiu o seguinte:
Do pedido ampliado respeitante à Segurança Social.
Mais pede o autor que a ré seja condenada a pagar-lhe os valores que vier a deixar de receber da Segurança Social até que a situação esteja regularizada naquela entidade, mormente se não lhe forem pagos os valores que se venceram até então, bem como todos os custos que tenha de despender para fazer valer os seus direitos junto da Segurança Social e assim repor as prestações sociais a que tem direito, o que deverá se remetido para liquidação posterior.
Tal pedido foi admitido.
Vimos já que na sequência do despedimento ilícito do autor em 21/05/2012 o mesmo tinha direito, preenchidos os restantes requisitos sociais, ao recebimento do subsídio de desemprego. Recebendo-o, nada teria a devolver, pois que se encontrava efectivamente em situação de desemprego após o despedimento de que fora ilicitamente alvo.
Acontece, porém, resulta dos autos, a Segurança Social exige ao autor a restituição dos valores pagos a título de subsidio de desemprego dos meses de Maio a Setembro, período em que o autor já não se encontrava ao serviço da ré por ter sido despedido em 21/05/2012, pelo que, apenas por força da comunicação da ré, totalmente destituída de qualquer fundamento legal – fls. 97 - é que aquela entidade entendeu estarem suspensas as prestações de desemprego entre Abril/2012 a Outubro/2012 por força do vínculo contratual que unia autor e ré, o que, como vimos, não é verdade.
O braço de ferro da ré não faz aliás o menor sentido, se errou, se apenas por lapso pôs fim à relação laboral, então que assuma o seu erro, não podendo desfazer o que fez, pois que simplesmente não é sua a opção, dado que, comunicando ao autor o despedimento apenas se este o quisesse se poderia restabelecer o vínculo. E este não quis. Ponto final. Não compete à ré, sabedora da posição do autor, comunicar falsamente à segurança social que, afinal, não teria ocorrido qualquer despedimento, e
que o autor iniciara novo vínculo em 22/05, o que sabia não ser verdade, devendo pois consequentemente ser responsabilizada pelos custos e prejuízos gastos que o autor suporte por força de tal atitude. A exigência de devolução, a concretizar-se, e apurando-se que a mesma se deve exclusivamente ao comportamento da ré – e não por terem sido esgotados os 270 dias de concessão possíveis – conduz à necessária responsabilização desta, como peticionado. Ou seja, concretizando-se tal devolução pelo autor, e tendo apenas a mesma como fundamento o facto de a ré ter ilicitamente comunicado que o mesmo estaria a trabalhar para si desde Maio a Outubro, o que não é de todo verdade, os valores que o autor tenha de repor poderá exigi-los à ré, bem como todos os custos que tenha de despender para fazer valer os seus direitos junto da Segurança Social e assim repor as prestações sociais a que teria direito, o que se remete para liquidação posterior.”.

2.2. Desde já se dirá que se concorda com a decisão recorrida, importando todavia tecer algumas considerações adicionais.
No caso, estamos perante um despedimento ilícito promovido no âmbito de um contrato de trabalho a termo certo, cuja validade não foi posta em causa nos autos e que, assim, se tem como assente, pelo que as consequências da ilicitude do despedimento são as previstas no art. 393º do CT/2009.
Dispõe este preceito que:
Artigo 393º
Regras especiais relativas a contrato de trabalho a termo
1 - Ao contrato de trabalho a termo aplicam-se as regras gerais de cessação do contrato, com as alterações constantes do número seguinte.
2 - Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado:
a) No pagamento da indemnização pelos prejuízos causados, não devendo o trabalhador receber uma compensação inferior à importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato, ou até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal se aquele termo ocorrer posteriormente;
b) Na reintegração do trabalhador sem prejuízo das sua categoria, caso o termo ocorra depois do trânsito em julgado da decisão do tribunal. [sublinhados nossos]

Por sua vez, no que se reporta às consequências do despedimento ilícito promovido no âmbito de um contrato de trabalho sem termo, rege o art. 390º, que dispõe o seguinte:
Artigo 390º
Compensação em caso de despedimento ilícito
1- Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do nº1 artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal.
2- Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se:
a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento;
b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento;
c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no nº 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social. [sublinhado nosso].

No acórdão desta Relação de 27.10.2008[1], ainda que incidindo sobre o art. 440º do CT/2003 (correspondente ao art. 393º do atual CT/2009) e sobre o desconto das retribuições intercalares entre a data do despedimento ilícito e o 30º dia anterior à propositura da ação (art. 437º, nº 4, do então CT/2003), considerou-se o seguinte:
“(…)
Ora, do cotejo destes normativos ressalta, desde logo, a distinção entre a compensação como efeito da ilicitude do despedimento nos contrato de trabalho sem termo e a compensação decorrente do contrato a termo. Assim, enquanto no contrato sem termo ou por tempo indeterminado à compensação - compreendendo as retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal – é deduzido o montante das retribuições respeitantes ao período decorrido desde a data do despedimento até 30 dias antes da data da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento; já no contrato de trabalho a termo há regras especiais, e ao que cremos imperativas, porquanto a compensação não deve ser inferior à importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato ou até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal se aquele termo ocorrer posteriormente.
Ou, como melhor refere Júlio Gomes[2], “a lei continua a consagrar um regime especial para o contrato de trabalho a termo. Na verdade, aplicam-se as regras gerais, mas com duas alterações: Por um lado, na hipótese de despedimento ilícito, o empregador só será condenado à reintegração se o termo do contrato ocorrer depois do trânsito em julgado da decisão do tribunal; e por outro lado o trabalhador tem direito à indemnização pelos prejuízos causados (o que corresponde, de resto, à regra geral), mas não deverá receber uma compensação inferior à importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato ou até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal se este se verificar antes do termo (expressamente a lei não faz aqui referência a deduções).” [realce nosso]
Logo se a lei não faz referência expressa às deduções previstas na regra geral da cessação do contrato como consequência do despedimento, antes realça no tocante ao contrato de trabalho a termo a alteração segundo a qual o trabalhador não deve receber uma compensação inferior à importância correspondente ao valor das retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato, parece-nos que com tais normas outra coisa não visou o legislador que não fosse compensar, também nesta vertente, a precariedade e a insegurança da relação de trabalho ligada geneticamente a esta forma de contratação.
Aliás, como outrossim refere Leal Amado,[3] [nos contratos a termo], por força da al. a) [do nº2 do art. 440º do CT], “em caso de despedimento ilícito, o empregador será condenado no pagamento da indemnização pelos prejuízos causados, tal como já decorreria do disposto no art. 436º/1-a), tendo o quantum indemnizatório como limite mínimo o valor dos salários intercalares devidos ao trabalhador desde a data do despedimento até à verificação do termo do contrato ou até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, consoante o que ocorra em primeiro. Os salários intercalares correspondentes ao período que medeia entre estas duas datas (data do despedimento e data da verificação do termo resolutivo ou do trânsito em julgado da decisão) representam, pois, montante mínimo a pagar pelo empregador ao trabalhador, a título de indemnização compensatória dos prejuízos causados pelo despedimento ilícito, não parecendo haver aqui espaço para que o tribunal proceda a qualquer das deduções previstas nos nºs 2, 3 e 4 do art. 437º. Com efeito - acrescenta - importa não olvidar que nos contratos de duração indeterminada os salários intercalares, ainda que sujeitos aquelas deduções, acrescem à indemnização pelos danos causados (arts 436º/1-a) e 437º/1 do CT), ao passo que no âmbito dos contratos a termo os salários intercalares, sem deduções funcionam com padrões mínimos da indemnização”.
E funcionando os salários intercalares como padrão mínimo de indemnização no âmbito dos contratos a termo, parece-nos - em suma - não haver lugar neste domínio à dedução do montante das retribuições prevista no art. 437º/4, como igualmente nos parece não ocorrer in casu qualquer situação de desigualdade entre trabalhadores diligentes e outros que o não são e muito menos se ambos tiverem celebrado um contrato a termo.”.
Tais considerações mantêm atualidade no âmbito do CT/2009, que não introduziu, nessa matéria, alterações, sendo igualmente transponíveis para os descontos do subsidio de desemprego a que se reporta o art. 390º, nº 2, al. c), e que estão previstos unicamente no que se refere às retribuições intercalares devidas em consequência do despedimento ilícito perpetrado no âmbito de um contrato de trabalho sem termo.
Tais deduções não estão previstas no âmbito do contrato de trabalho a termo, nem são a este aplicáveis nos termos e pelos fundamentos expostos no acórdão transcrito.
Com efeito, e como decorre do que se consignou, a consequência indemnizatória prevista no art. 393º, nº 2, al. a), deverá abranger os danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos pelo trabalhador, tendo ela, porém, como limite mínimo obrigatório montante correspondente às retribuições que o trabalhador haja deixado de auferir desde o despedimento até ao termo certo ou incerto do contrato (ou até ao trânsito em julgado da decisão judicial, se aquele termo for posterior). Correspondendo tal limite a um limite mínimo obrigatório e reportando-se o preceito às retribuições como mero elemento referencial para o cálculo desse valor mínimo, não há que efetuar qualquer dedução (a referência às retribuições que seriam auferidas até ao termo do contrato tem como desiderato, tão-só, o de fixar o padrão mínimo do montante indemnizatório).
Também no sentido de que o citado preceito consagra um montante compensatório mínimo se pronuncia Albino Mendes Batista, in Primeiras Reflexões sobre os Efeitos da Ilicitude do Despedimento no Novo Código do Trabalho[4], Prontuário do Direito do Trabalho, CEJ, nº 66, pág. 23 e Acórdãos da RP de 11.06.2007, Processo 0711041, da RL, de 13.02.2008 (Processo 9071/2007-4) e da RC, de 05.06.2008 (Processo 590/06.4TTGRD.C1), todos in www.dgsi.pt. Diga-se que estes arestos reportam-se à inaplicabilidade dos descontos referentes às retribuições auferidas pelo trabalhador após o despedimento e/ou ao período entre a data do despedimento e o 30º anterior à propositura da ação. Não obstante, a orientação neles perfilhada é igualmente transponível no que toca aos descontos relativos ao subsídio de desemprego.
Ou seja, do referido há que concluir que, independentemente da indemnização devida pela Ré em consequência do despedimento ilícito, o A., por virtude desse despedimento, teria direito ao recebimento do subsídio de desemprego (que lhe foi atribuído), não se colocando a questão da cumulação indevida entre essa indemnização e o subsídio auferido, nem a necessidade do desconto do mesmo, nem o alegado enriquecimento sem causa, pois que, como decorre do exposto, não há, no caso, que proceder aos descontos a que se reporta o art. 390º, nº 2, al. c). As retribuições intercalares a que se reporta o art. 390º, nº 1, e a indemnização a que se refere o art. 393º, nº 2, al. a), ainda que tenham, ambas, natureza indemnizatória, não se reconduzem à mesma realidade. Aquela consubstancia uma das componentes indemnizatórias do despedimento ilícito (a par de outras, designadamente a indemnização de antiguidade em substituição da reintegração caso o trabalhador por aquela opte); esta consubstancia uma indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais sofridos, em que a lei fixa um limite mínimo obrigatório, apenas se socorrendo das retribuições que seriam devidas até ao termo do contrato como valor referencial de determinação desse limite mínimo.
No caso, o pedido de restituição, formulado pela Segurança Social ao A., teve como base uma declaração inexata e não correspondente à realidade e de que a Ré é a única responsável ao ter comunicado àquela entidade que o A. com ela mantinha um contrato de trabalho e que, no âmbito do mesmo, lhe havia pago a correspondente retribuição, quando, na verdade, tal não correspondia à realidade, uma vez que o A. havia sido ilicitamente despedido, o que, para além do direito à indemnização correspondente, lhe conferia o direito ao subsídio de desemprego no período de Maio de 2012 a Outubro de 2012.
Assim sendo, improcedem nesta parte das conclusões do recurso.

2.3. De todo o modo, sempre se dirá, por mera hipótese de raciocínio que, a proceder a tese da Recorrente, então haveria que aplicar, em toda a sua extensão, o disposto no art. 390º, nº 2, al. c), do CT/2009, com a consequente condenação da ré a pagar à Segurança Social as quantias que o A. recebeu a título de subsídio de desemprego no período de Maio de 2012 a Outubro de 2012, não sendo tal obrigação aniquilada pelo facto de a Ré haver pago ao A. a totalidade da retribuição correspondente a esse período (quando apenas deveria pagar, por via desses descontos, a diferença entre a retribuição e o subsídio de desemprego).
É que, conforme decorre do disposto no art. 770º do Cód. Civil, a prestação feita a terceiro [no caso, o A., pois que o credor seria, no montante correspondente aos subsídios de desemprego, a Segurança Social – art. 390º, nº 2, al. c)] não extingue a obrigação, a menos que se verifique alguma das situações previstas nas als. a) a f) desse preceito que, no caso, não se mostra que se verifiquem. Ou seja, independentemente de ter pago ao A. o que pagou, sempre seria a Ré, e não o A., quem teria reembolsar a Segurança Social dos montantes por esta pagos ao A. a título de subsídio de desemprego.
Em tal caso, poderia eventualmente a Ré ter direito, a título de enriquecimento sem causa, à restituição, pelo A., do que a este pagou no montante equivalente aos subsídios de desemprego (e cujo pagamento a Ré teria que efetuar à Segurança Social), restituição essa que, porém, a Ré não peticionou nos autos e em que, por consequência, esta Relação, por via do princípio do dispositivo, estaria impedida de condenar o A.
Ora, mesmo que a indemnização em causa nos autos e o recebimento do subsídio de desemprego não fossem, como defende a Recorrente, cumuláveis, tal não obstaria à condenação da Ré constante da al. f) do segmento decisório. Havendo o A. sido ilicitamente despedido e tendo, por isso, direito ao subsídio de desemprego, que lhe foi atribuído pela Segurança Social, não seria ele quem teria que o restituir, mas sim a Ré que teria que reembolsar tal entidade. Por outro lado, o fundamento da restituição solicitada ao A. pela Segurança Social assentou num pressuposto que era errado (qual seja o da existência de um contrato de trabalho) por culpa exclusiva da Recorrente que comunicou à Segurança Social a existência do contrato de trabalho.

3. Quanto à 2ª questão

Tem esta questão por objeto a condenação da Recorrente no pagamento da quantia de €500,00 a título de danos não patrimoniais, decisão de que aquela discorda por entender não terem ficado provados danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, mas apenas meros transtornos em face da suspensão do subsídio de desemprego e da carta da Segurança Social a exigir do A. a reposição dos subsídios pagos e a que o mesmo teve de responder.

3.1. A este propósito, referiu-se na decisão recorrida o seguinte:
“Dos danos morais:
Reclama finalmente o autor o pagamento de uma indemnização pelos danos que alegadamente diz ter sofrido com a situação que relata nos autos.
Vejamos então.
Dispõe, o art.º 496.º do CC, na parte que aqui interessa, o seguinte: “1. Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito. 3. O montante da indemnização será fixado equitativamente pelo tribunal (…)”
Ora, tem-se entendido que o dano não patrimonial se analisa num prejuízo causado na pessoa do lesado, podendo ser físico ou psíquico. Tal dano, para ser juridicamente relevante e, portanto, ressarcível, deve ser grave, correspondente a uma situação cujo grau seja acima da média, por contraposição aos meros e habituais incómodos da vida corrente, de forma que fosse exigível ao lesante comportamento diverso do empreendido. Tal valoração impõe a adopção de um critério objectivo, comum à generalidade das pessoas, que sirva de padrão para apreciar o grau de gravidade do dano, desprendido de sensibilidades exageradas ou requintadas, embora reportado ao dano concreto. Tal apreciação exige, assim, o recurso a um método de valoração em que quem aprecie o prejuízo se distancie o suficiente do caso de forma que no resultado final não entre a subjectividade do lesado.
Por outro lado, dada a natureza do dano não patrimonial, a sua ressarcibilidade efectua-se através de, mais do que de uma indemnização, de uma compensação, tendente a, na medida do humanamente possível, que o lesado se restabeleça da contrariedade, derivada do dano não patrimonial, com alguma satisfação que a quantia entregue pelo lesante possa proporcionar.
Deve referir-se, por último, que é ao trabalhador que compete alegar e provar os factos correspondentes ao dano não patrimonial, sua extensão e nexo de causalidade entre ele e a justa causa invocada para a ocorrência dos mesmos, como decorre das regras gerais, atento o disposto no art.º 342.º, n.º 1 do CC.
No caso dos autos, não nos parece que, numa primeira fase, o autor tivesse efectivamente direito à pretendida indemnização. Em boa verdade, e pese embora por razões erradas, certo é que o autor auferiu sempre, e mensalmente, o seu vencimento, que a ré lhe foi depositando, e que cumulou, em parte, com o subsídio de desemprego.
Já assim não será, numa segunda fase, na sequência da comunicação da ré à Segurança Social de novo vínculo, em Maio/2012, sendo tal comunicação absolutamente ilícita e sem correspondência com a realidade, não tendo a ré qualquer fundamento legal para comunicar à Segurança Social o início de um vínculo contratual que sabia não ser verdade. Aliás, não podemos deixar de estranhar que tal comunicação apenas seja feita em Agosto/2012, pese embora pretenda a ré fazer crer que tudo não passou de um mero lapso, que de imediato se apercebeu e reparou! E como faz ela tal comunicação após a troca de correspondência com o autor onde este claramente lhe diz não aceitar voltar a trabalhar para si dado que tinha sido despedido?
Todos os danos e transtornos seguidamente causados ao autor, desde a suspensão da prestação de desemprego, a carta da segurança social a exigir-lhe o pagamento de retribuições indevidas, a que teve de responder a apresentar reclamação, deve-se, exclusivamente, ao comportamento da ré, que entendemos dever sancionar, por merecer a tutela do direito os transtornos causados, e que fixaremos em 500,00 euros.”.

3.2. Como decorre do transcrito, o comportamento da Ré aí ponderado como causa da indemnização arbitrada não radicou em eventuais danos decorrentes da ilicitude do despedimento, sendo que, nesta parte, o A. nem recorreu subordinadamente, nem requereu a ampliação do objeto do recurso, pelo que, nessa medida, a decisão transitou em julgado.
Com efeito, o comportamento tido em conta na decisão recorrida prendeu-se com a comunicação, pela Ré, à Segurança Social, em Maio de 2012, da existência de novo vínculo contratual, com a consequente suspensão da prestação de desemprego e com o pedido de reembolso por parte daquela entidade e a que o A. teve de responder.
Acontece que da matéria de facto provada não consta que tal comportamento tenha sido causador de danos não patrimoniais ao A.. Aliás, nem a decisão os concretiza, reportando-se apenas aos transtornos daí decorrentes.
Dispõe o art. 496º, nº 1, do Cód. Civil que “1- Na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”.
São quatro os requisitos da tutela dos danos não patrimomniais: (a) comportamento ilícito e culposo do agente; (b) existência de danos; (c) que esses danos, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (não bastando um mero incómodo); (d) que se verifique um nexo causal entre aquele comportamento e o dano, por forma a que este seja daquele consequência.
Ora, no caso, na matéria de facto provada não se relatam quaisquer danos decorrentes do aludido comportamento da Ré, sendo que a decisão recorrida apenas se reporta a transtornos. Nem estes consubstanciam um dano, nem, muito menos, um dano cuja gravidade mereça a tutela do direito.
Acontece porém que o A., na ampliação do pedido que formulou, alegou nos arts. 5º e 6º, como consequência do mencionado comportamento da ré, a existência de danos não patrimoniais e que concretizou referindo os seguintes: “impossibilidade de fazer face aos seus encargos e tendo de recorrer a ajudas de familiares para poder sobreviver, bem como sua esposa e um filho de tenra idade, o que deixa o A. completamente transtornado e revoltado, para além de lhe causar perdas de sono, irritação e grande instabilidade emocional”.
A Ré, na resposta a essa ampliação (apresentada aos 18.04.2013), para além de ter alegado que o A. recebeu as retribuições devidas até ao termo do contrato de trabalho e que, com elas, não podia acumular o subsídio de desemprego, concluiu não ser compreensível que venha o mesmo reclamar a existência de danos “morais”.
À data da apresentação desse articulado estava em vigor o CPC/1961, em cujo art. 490º, nº 2, se dispunha que “consideram-se admitidos por acordo os factos que não forem impugnados, salvo se estiverem em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, (…)”.
Na situação em apreço, e pese embora a Ré não haja impugnado expressamente os alegados danos, fê-lo de forma tácita, estando eles em oposição com a defesa considerada no seu conjunto, designadamente com a parte em que é referido não ser compreensível a alegação da existência de tais danos. Ou seja, os alegados danos consubstanciam matéria de facto controvertida e, tanto assim, que a decisão recorrida não os levou à matéria de facto assente.
Ora, tendo a decisão recorrida sido proferida em sede de despacho saneador, sem audiência de discussão e julgamento e tendo em conta as várias soluções plausíveis de direito, importa que a ela se proceda com vista à ampliação da referida matéria, alegada pelo A. nos arts. 5º e 6º da ampliação do pedido e consequente decisão sobre essa factualidade, o que, nos termos do art. 662º, nº 2, al. c), do CPC/2013, determina a anulação, nessa parte, da sentença recorrida.

3.3. Finalmente, constata-se que a decisão recorrida é omissa quanto à responsabilidade pelas custas. Não sendo caso do disposto no art. 616º, nº 3, do CPC/2013 [uma vez que, sendo a decisão omissa quanto a custas, dela não poderá caber recurso em matéria de custas], deverá ainda a 1ª instância proceder à retificação da decisão recorrida em matéria de custas [art. 614º, nº 1, do CPC/2013].
*
V. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em:

I. Negar provimento ao recurso no que se reporta ao segmento condenatório da Ré constante da alínea f) da parte dispositiva da decisão recorrida [parte em que foi a Ré condenada “a pagar ao autor os valores - que o mesmo deixou de receber da Segurança Social, ou tenha, eventualmente, de restituir à Segurança Social, por força das prestações de desemprego que recebeu a partir de Maio/2012 até Outubro/2012, desde que tal ocorra, em consequência e exclusivamente, por força da ilícita comunicação da ré àquela entidade, de que o autor estaria a trabalhar para si – e a que acrescerão todos os custos que o autor tenha de despender para fazer valer os seus direitos junto da Segurança Social e assim repor as prestações sociais a que teria direito por força desta questão - o que se remete para liquidação posterior.”].
II. Anular a decisão recorrida no que se reporta ao segmento condenatório da Ré constante da alínea d) da parte dispositiva da decisão recorrida [parte em que a Ré foi condenada a pagar ao A. a quantia de €500,00 a título de danos não patrimoniais] para ampliação da decisão da matéria de facto constante dos arts. 5 e 6 do articulado de ampliação do pedido de fls. 78 e segs, consequente realização da audiência de discussão e julgamento e, após, prolação de decisão sobre essa alegada matéria de facto e sentença quanto a essa parte do pedido [a que se reporta a al. a) do pedido formulado nesse articulado].
III. Determinar à 1ª instância que proceda à retificação da decisão recorrida em matéria de custas.

Custas do recurso pela Ré, na proporção de ½, considerando nele ter ficado vencida no que se reporta à decisão proferida no ponto IV.I. do presente acórdão; quanto à restante metade, correspondente à parte objeto da anulação determinada no ponto IV.2. do presente acórdão, as custas serão suportadas pela parte vencida a final, na totalidade se decair totalmente nesse pedido, ou por ambas as partes, na proporção do decaimento, se ambas nele decaírem.

Porto, 05.01.2015
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Maria José Costa Pinto
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[1] Inédito, ao que supomos, relatado pelo Exmº Desembargador Fernandes Isidoro e em que a ora relatora interveio como 2ª adjunta.
[2] - Cfr. DIREITO DO TRABALHO, volume I, Relações Individuais de Trabalho, 2007, p. 1037
[3] - Em «OS EFEITOS DO DESPEDIMENTO ILÍCITO (sobre os arts 436º a 440º do Código do Trabalho)», Temas Laborais 2, 2007, ps 93/94.
[4] Reportando-se ao CT/2003.