Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
201/13.1T2ALB.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: AUGUSTO DE CARVALHO
Descritores: CONTRATO DE COMPRA E VENDA
REGIME DE EXCLUSIVIDADE
FORNECIMENTO DE CAFÉ
DEVERES DE COMUNICAÇÃO E DE INFORMAÇÃO
DESPROPORCIONALIDADE DAS PENALIZAÇÕES
Nº do Documento: RP20160620201/13.1T2ALB.P1
Data do Acordão: 06/20/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 628, FLS.371-378)
Área Temática: .
Sumário: I - O dever de comunicação tem de ser concretizado de forma adequada e com antecedência, tendo em conta, nomeadamente, a importância do contrato, a sua extensão e a complexidade das cláusulas.
II - O dever de informação consiste em, ainda em fase pré-contratual, comunicar quais as cláusulas a inserir no contrato mas, e também, prestar todos os esclarecimentos razoáveis, designadamente, informando a outra parte do seu significado e implicações.
III - Ao incumprimento dos deveres de comunicação e de informação, o artigo 8º, alíneas a) e b), do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, faz corresponder a exclusão das cláusulas dos contratos singulares.
IV - A proibição consagrada na alínea c) do artigo 19º não se verifica quando exista uma pequena desproporção entre os danos a reparar e a pena fixada, mas apenas quando tal desproporção seja sensível.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação nº 201/13.1T2ALB.P1

Acordam no Tribunal da Relação do Porto

B…, S.A., intentou a presente ação com processo comum de declaração contra C… e mulher D…, pedindo que se declare válida a resolução do contrato ajuizado e, por via disso, sejam os réus condenados a pagar-lhe a quantia global de €15.121,49, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

A fundamentar o pedido, alega, em síntese, que entre a autora e os réus foi ajustado um acordo de fornecimento de café, nos termos e condições constantes de escrito particular por todos subscrito, em 25-08-2006, intitulado «Contrato de compra e venda em regime de exclusividade nº …», sendo certo que por via desse acordo, os réus obrigaram-se a adquirir à autora, em regime de exclusividade, a quantidade mínima mensal de 16 kg de café, marca «…», Lote «…», pelo período mínimo de 60 meses, num total de 960 kg, a fim de ser revendido como bebida, no estabelecimento comercial que explorava, denominado «E…», sito na Rua …, …, ….
Mais aduz que, como contrapartida da convencionada exclusividade, a autora emprestou aos réus, para utilização no seu estabelecimento: 1 máquina de café …, de dois grupos, no valor de € 2.400,00, IVA incluído; 1 moinho de café …, no valor de € 400,00, IVA incluído; 3 toldos de braços rectos, no valor de € 1.452,00, IVA incluído; 2 conjuntos de esplanada em alumínio, compostos por 2 mesas de 0,70 m por 0,70 m, 8 cadeiras e 2 chapéus de sol, no valor de € 588,64, IVA incluído; 6 conjuntos de mobiliário, compostos por 6 mesas com a refª. 210, de 0,60 m por 0,60 m, MDF 6 e 24 cadeiras com a refª. 450, no valor de € 3.952,80, IVA incluído.
Conclui, referindo que os réus, além de não adquirirem a quantidade mínima mensal de café a que se obrigaram, deixaram de adquirir qualquer quantidade de café, desde o último fornecimento, em Abril de 2009, pelo que a autora resolveu o contrato, sendo devida competente indemnização contratual e que ainda não foi paga, sendo certo que os réus já foram interpelados para o efeito.

Os réus contestaram, alegando, em síntese, que jamais lhes foi dito, em circunstância alguma, que teriam de pagar as indemnizações previstas nas cláusulas 3ª e 8ª do contrato. Que os réus nem se aperceberam da sua existência.
Efectivamente, outorgaram o aludido contrato, sob grande pressão do colaborador da empresa vendedora, que dizia sempre para não se preocuparem, que o contrato era uma mera formalidade, pois, a empresa queria era vender café.
Nunca os réus tiveram conhecimento ou lhes foi entregue a tabela junta com a petição inicial.
Do exposto, resulta claramente que o contrato em causa é um verdadeiro contrato de adesão, cujas cláusulas foram previamente elaboradas e não foram negociadas pelas partes. Foram previamente e exclusivamente elaboradas pela autora, limitando-se os réus a subscrever tais cláusulas.
Não existem dúvidas que existiu clara violação dos deveres de comunicação e de informação previstos nos artigos 5º e 6º do DL 446/85, o que determina a sua nulidade, nos termos do disposto no nº 2 do artigo 9º do citado diploma, a qual se invoca, desde já.
Além do mais, se os réus tivessem tido conhecimento de algumas cláusulas do contrato, nunca o teriam assinado, sobretudo nas quantidades de café a adquirir e nas cláusulas indemnizatórias, sentindo-se os réus enganados, pois confiaram no vendedor da autora. O contrato em causa não traduz a vontade dos réus, existindo erro manifesto na formação da vontade por parte dos réus.
Bem como erro nos pressupostos que levaram a ré a celebrar o contrato em causa, o que origina a anulabilidade do negócio, nos termos do disposto nos artigos 247º e seguintes do C.C.
Sem prescindir, e por mero dever de patrocínio, sempre se dirá que existe manifesta desproporcionalidade entre o valor indemnizatório e a parte eventualmente não cumprida do contrato (a apurar-se a existência de incumprimento). Os valores pedidos são exagerados.
Concluem pela improcedência da ação.

A autora respondeu a fls. 51 e seguintes, alegando que foi o legal representante da sociedade F…, Lda., Sr. G…, que contatou com a ré mulher e que, após negociação dos termos e condições do acordo titulado pelo escrito particular, acabou por o assinar, conjuntamente com o seu marido.
Na data da assinatura desse documento, esteve o mesmo na posse dos réus para o lerem e, concordando, ou não, com o seu teor, o assinarem, ou não. Certo é que foi assinado, sem qualquer reserva.
Tal acordo teve o seu início em Agosto de 2006 e só ao fim de três anos é que surgiram problemas na execução do contrato, aquando das sucessivas cessões de exploração por parte dos réus, que não salvaguardaram a exclusividade a que se encontravam adstritos.

Procedeu-se a julgamento e, a final, proferida sentença, na qual a ação foi julgada procedente e, em consequência, condenados os réus a pagar solidariamente à autora a quantia global de €15.119,30, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a citação até integral pagamento.

Inconformados, os réus recorreram para esta Relação, formulando as seguintes conclusões:
1. Os recorrentes suscitaram a questão da eventual violação do dever de comunicação por parte da recorrida.
2. A sentença não se pronunciou sobre essa questão.
3. Tendo a mesma relevância para uma boa decisão da causa.
4. E não se pronunciando, o Meritíssimo Juiz sobre uma questão que devia apreciar e com enorme relevância para o resultado, deve ser declarada a nulidade da sentença, ora recorrida, por violação do disposto no artigo 615º, nº 1, alínea d), do C.P.C.
5. O Meritíssimo Juiz não apreciou convenientemente uma eventual violação do dever de informação.
6. Na celebração do contrato em causa, foi violado o dever de informação, previsto no artigo 6º do D.L. nº 446/85.
7. Pois, o contrato já ia praticamente todo elaborado e não é num curto espaço de tempo que se dá conhecimento do teor de todas as cláusulas desse contrato.
8. Aliás, é do conhecimento comum a forma como estes contratos são dados a conhecer às partes.
9. Devendo, assim, revogar-se, nesta parte, a sentença ora recorrida, por violação do dever de informação.
10. As cláusulas do contrato onde estavam previstas as penalizações para o caso de incumprimento pelos recorrentes não podem deixar de ser consideradas relativamente proibidas, nos termos previstos no artigo 19º, alínea c), do R.J.C.C.G.
11. Pois, as penalizações aí previstas são manifestamente desproporcionadas aos danos a ressarcir.
12. O valor da indemnização que os recorrentes foram condenados a pagar ultrapassam em muito o valor que a recorrida investiu na sequência da celebração do contrato em causa.
13. Pelo que, deve ser revogada, nesta parte, a sentença, determinando-se, no máximo, que os recorrentes têm de indemnizar a recorrida em valor equivalente aos bens que foram colocados no estabelecimento.
14. Termos em que deverá proceder a presente apelação nos termos e motivos acima expostos.

Não houve contra-alegações.

Cumpre decidir.

Na sentença recorrida consideraram-se assentes os seguintes factos:
1. Entre a autora e os réus foi ajustado um acordo de fornecimento de café, nos termos e condições constantes de escrito particular por todos subscrito, em 25-08-2006, intitulado «Contrato de compra e venda em regime de exclusividade n.º …», sendo que por via desse acordo, os réus obrigaram-se a adquirir à autora, em regime de exclusividade, a quantidade mínima mensal de 16 kg de café, marca «…», Lote «…», pelo período de 60 meses, num total de 960 kg, a fim de ser revendido como bebida, no estabelecimento comercial que exploravam, denominado «E…», sito na Rua …, …, ….
2. Como contrapartida da convencionada exclusividade, ficou estipulado que a autora emprestava aos réus, como emprestou, para utilização no seu estabelecimento: 1 máquina de café …, de dois grupos, no valor de € 2.400,00, IVA incluído; 1 moinho de café …, no valor de € 400,00, IVA incluído; 3 toldos de braços rectos, no valor de € 1.452,00, IVA incluído; 2 conjuntos de esplanada em alumínio, compostos por 2 mesas de 0,70 m por 0,70 m, 8 cadeiras e 2 chapéus-de-sol, no valor de € 588,64, IVA incluído; 6 conjuntos de mobiliário, compostos por 6 mesas com a refª. 210, de 0,60 m por 0,60 m, MDF 6 e 24 cadeiras com a refª. 450, no valor de € 3.952,80, IVA incluído.
3. Igualmente estipularam as partes que em caso de incumprimento por motivo imputável os réus, estes constituíram-se na obrigação de indemnizar a autora na quantia pecuniária correspondente ao resultado da multiplicação do número de quilos de café que se mostrem em falta para atingir a quantidade total prevista e referida em 1, à data da sua resolução, pelo valor de € 7,00 o kg e 20% do valor dos equipamentos por cada ano ou fracção de utilização, a título de aluguer dos mesmos, legitimando a resolução do acordo.
4. Por carta registada com aviso de recepção, datada de 24/4/2013, foi resolvido pela autora o acordo supra referido, interpelando-se os réus á liquidação do valor global de € 15.121,49 a título indemnizatório.
5. No âmbito do acordo supra referido, os réus apenas adquiriram à autora 306 kg, tendo deixado de adquirir café em Abril de 2009, e sendo o valor global dos equipamentos fornecidos de € 9.193,44.
6. O escrito referido em 1 é igual para todos os clientes, com excepção da parte dos dados pessoais dos clientes, das quantidades de café e do material emprestado.

Factos provados, na sequência da ampliação da matéria de facto:
7. Foi o Senhor G… que contactou a ré mulher e que, após negociação dos termos e condições do contrato, aquela acabou por assiná-lo, conjuntamente com o seu marido.
8. Na data da assinatura do contrato, o respetivo documento esteve na posse dos réus para o lerem.

Factos não provados:
a) Que os réus tenham assinado o acordo referido em 1, sem o terem lido, não lhes tendo sido informado que teriam que pagar as indemnizações previstas no mesmo, nem sequer se tendo apercebido da sua existência.
b) Que os réus tenham assinado a acordo referido em 1 sob grande pressão do colaborador da empresa vendedora.
c) Que os réus não tenham tido conhecimento da tabela dos preços dos equipamentos fornecidos.
d) Que os réus tenham ficado convencidos que apenas tinham de comprar café à autora e esta como contrapartida emprestava-lhes o referido equipamento, que seria devolvido quando os réus deixassem de comprar café.
e) Que os réus apenas tenham tomado conhecimento do teor das cláusulas indemnizatórias em inícios de 2009.
f) Que os réus se tivessem tido conhecimento do teor integral das cláusulas referidas em 1, nunca teriam assinado o aludido acordo.

São apenas as questões suscitadas pelos recorrentes e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar – artigos 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do novo C.P.C.
As questões a decidir são as seguintes: nulidade da sentença, nos termos do artigo 615º, nº 1, alínea d), do C.P.C; ampliação da matéria de facto; violação dos deveres de comunicação e de informação; desproporcionalidade das penalizações previstas no contrato.

I. O artigo 615º, nº 1, alínea d), do novo C. P. Civil, estabelece que a sentença é nula, quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
A nulidade prevista neste preceito traduz-se no incumprimento, por parte do juiz, do dever prescrito no nº 2, do artigo 608º, ambos do novo C. P. Civil, que é o de resolver todas as questões submetidas à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, e o de não poder ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras.
Os apelantes fundamentam a nulidade, alegando que a sentença não se pronunciou sobre a questão da violação do dever de comunicação por parte da autora/apelada.
É verdade que a sentença não desenvolve com abundância a questão do dever de comunicação, mas diz, apesar de tudo, que «careceu de qualquer prova um eventual erro na formação da vontade por parte dos réus, bem como a violação do dever de informação por parte da autora, nos termos do artigo 8º, nº 1, alíneas a) a c), do DL nº 446/85, de 25/10».
Não é feita menção expressa ao dever de comunicação mas, a alínea a) do nº 1 do citado artigo 8º refere-se, precisamente, à consequência da omissão daquela obrigação nos termos do artigo 5º.
Não ocorre, pois, a invocada nulidade da sentença.

II. A propósito da violação dos deveres de comunicação e informação, nos artigos 3 a 8 da resposta apresentada pela autora (fls. 51 a 55), foram alegados factos com interesse para a decisão da causa e que não foram incluídos nos provados ou nos não provados.
Com efeito, encontra-se aí alegado que não foi nenhum funcionário da autora que contactou com os réus, mas sim o legal representante da sociedade que gira sob a firma F…, Lda., a qual distribui os produtos da autora na área geográfica correspondente ao distrito de Aveiro, Sr. G…. Foi esta pessoa que contactou com a ré mulher e que, após negociação dos termos e condições do acordo titulado pelo escrito particular junto como documento 1, acabou por o assinar, conjuntamente com o seu marido, aqui também réu.
Na data da assinatura desse documento, esteve o mesmo na posse dos réus para o lerem e, concordando ou não com o seu teor, o assinarem ou não. Certo é que foi assinado, sem qualquer reserva.
Estes factos, como se disse, revestem interesse para a decisão da causa e, portanto, deve haver lugar a ampliação da matéria de facto.
A tal ampliação da matéria de facto procede-se, agora, em segunda instância, desde que sobre os respetivos factos tenha sido produzida prova (positiva ou negativa) e depois de ouvidas as partes.
Como refere Abrantes Geraldes, «considerando a fase em que agora nos encontramos, a Relação deve ponderar o enquadramento jurídico em face do objeto do recurso ou de outros elementos a que oficiosamente puder atender, contando também com o que possa esperar-se de uma eventual intervenção do Supremo ao abrigo do disposto no artigo 682º, nº 3. Por outro lado, tal como sucede com as anteriores situações, a anulação da decisão da 1ª instância apenas deve ser decretada se não constarem do processo todos os elementos probatórios relevantes. Ao invés, se estes estiverem acessíveis, a Relação deve proceder à sua apreciação e introduzir na decisão da matéria de facto as modificações que forem consideradas oportunas». Recursos no Novo Código de Processo Civil, 3ª edição, pág. 263.
As partes foram notificadas de que se iria proceder à ampliação da matéria de facto em segunda instância e nada disseram.
Sobre a referida matéria, a ré D… prestou declarações de parte, nos termos do artigo 466º do C.P.C., tendo referido que ela e o seu marido leram o contrato quando o assinaram (lemos o contrato quando o assinámos).
Por sua vez, a testemunha G…, gerente comercial da empresa F…, Lda., é distribuidor da marca de cafés da autora, há 22 anos.
Esta testemunha descreveu as negociações que levaram à assinatura do contrato pelos réus e afirmou que estes ficaram conscientes de todas as cláusulas desse mesmo contrato.
Neste sentido, conjugadas as declarações de parte da ré D… e o depoimento da testemunha G… com o documento junto a fls. 9 e 10 (contrato assinado pelos réus), esta Relação considera provados os seguintes factos:
1 – Foi o Senhor G… que contactou a ré mulher e que, após negociação dos termos e condições do contrato, aquela acabou por assiná-lo, conjuntamente com o seu marido.
2 – Na data da assinatura do contrato, o respetivo documento esteve na posse dos réus para o lerem.

III. Violação dos deveres de comunicação e de informação.
No âmbito das suas atividades, autora e réus ajustaram um acordo de fornecimento de café, nos termos e condições constantes de escrito particular por todos subscrito, em 25-08-2006, intitulado «Contrato de compra e venda em regime de exclusividade nº …», sendo que por via desse acordo, os segundos obrigaram-se a adquirir à primeira, em regime de exclusividade, a quantidade mínima mensal de 16 kg de café, marca «…», Lote «…», pelo período mínimo de 60 meses, num total de 960 kg, a fim de ser revendido como bebida, no estabelecimento comercial que exploravam, denominado «E…», sito na Rua …, ….
Como contrapartida da convencionada exclusividade, ficou estipulado que a autora emprestava aos réus, como emprestou, para utilização no seu estabelecimento, vários equipamentos.
Na contestação, os réus alegaram tratar-se de um verdadeiro contrato de adesão e que existiu clara violação dos deveres de comunicação e de informação, previstos nos artigos 5º e 6º do DL 446/85, de 25 de Outubro.
As cláusulas contratuais gerais inseridas em propostas de contratos singulares devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las – artigo 5º, nº 1, do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, alterado pelos Decretos-lei nº 220/95, de 31 de Agosto, e 249/99, de 7 de Julho.
A referida comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efetivo por quem use de comum diligência – artigo 5º, nº 2.
O ónus da prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contraente que submeta a outrem as cláusulas contratuais gerais – artigo 5º, nº 3.
A lei prescreve, a propósito do dever de informação, que o contraente que recorra a cláusulas contratuais gerais deve informar, de acordo com as circunstâncias, a outra parte dos aspectos nelas compreendidos cuja aclaração se justifique, devendo ainda ser prestados os esclarecimentos razoáveis solicitados – artigo 6º.
O citado artigo 5º do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, estabelece o seguinte: 1 – As cláusulas contratuais gerais devem ser comunicadas na íntegra aos aderentes que se limitem a subscrevê-las ou a aceitá-las; 2 – A comunicação deve ser realizada de modo adequado e com a antecedência necessária para que, tendo em conta a importância do contrato e a extensão e complexidade das cláusulas, se torne possível o seu conhecimento completo e efetivo por quem use de comum diligência; 3 – O ónus de prova da comunicação adequada e efectiva cabe ao contratante que submeta a outrem as clausulas contratuais gerais.
O dever de comunicação desdobra-se em duas exigências: «A comunicação integral das cláusulas e a necessidade de proporcionar à contraparte a possibilidade de uma exigível tomada de conhecimento do respectivo conteúdo.
Não basta, assim, para que esteja cumprido tal dever, a mera comunicação das cláusulas, sendo exigível, que a sua transmissão se concretize de tal modo e com tal antecedência que se verifique por parte do destinatário uma efectiva tomada de conhecimento do seu conteúdo, pois só assim, poderá formar adequadamente a sua vontade e medir o alcance e as consequências das suas decisões». Almeno de Sá, Cláusulas Contratuais Gerais e Directiva sobre Cláusulas Abusivas, pág. 234.
Impõe-se, portanto, que a comunicação se realize de forma adequada e com antecedência, tendo em conta, nomeadamente, a importância do contrato, a sua extensão e a complexidade das cláusulas.
O dever de informação consiste em, ainda em fase pré-contratual, comunicar quais as cláusulas a inserir no negócio mas, e também, prestar todos os esclarecimentos razoáveis, designadamente, informando a outra parte do seu significado e implicações.
Como se refere no Acórdão do STJ, de 8 de Abril de 2010, «a entidade que pretenda inserir cláusulas contratuais gerais nos contratos singulares que celebra deve comunicá-las antes da conclusão do negócio, de modo a proporcionar à contraparte a indispensável reflexão e um conhecimento completo e efectivo do clausulado; e este dever de comunicação, situado na fase de negociação ou pré-contratual, destina-se a que o aderente possa conhecer, com a necessária antecipação relativamente ao momento da consumação do negócio, o respectivo conteúdo contratual, de modo a poder apreendê-lo, nas suas efectivas e reais consequências prático-jurídicas, outorgando-lhe, deste modo, um espaço de reflexão e ponderação sobre o âmbito e dimensão das vinculações que lhe irão resultar da celebração do negócio». in www.dgsi.pt.
Como resulta do exposto, o DL 446/85 distingue, respetivamente, nos artigos 5º e 6º, as obrigações de comunicação e de informação, o que provoca, no dizer de Ana Prata, «uma separação relativamente forçada ou artificial. No modo como artigo 5º concebe a primeira vão contidas as informações necessárias à compreensão do conteúdo do contrato. A utilidade autónoma do artigo 6º reside sobretudo no seu nº 2. Admite-se, todavia, que a lei tenha querido enfatizar a necessidade de cabal esclarecimento das cláusulas contratuais com o nº 1 do artigo 6º». Contratos de Adesão e Cláusulas Contratuais Gerais, pág. 252.
Ao incumprimento dos deveres de comunicação e de informação, o artigo 8º, alíneas a) e b), do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, faz corresponder a exclusão das cláusulas dos contratos singulares.
Como refere Ana Prata, «sempre que for incumprida a obrigação de comunicação ou a de informação, as cláusulas não comunicadas ou aclaradas consideram-se excluídas do contrato.
Há, pois, uma redução ope legis do contrato, uma amputação deste das cláusulas, que não são consideradas nele integradas, por violação das obrigações pré-contratuais que a lei enuncia». ob cit., pág. 266.
Nesta questão de saber se a autora comunicou e informou os réus das cláusulas apostas no contrato, de facto, não se provou que aqueles o tivessem assinado, sem a respetiva leitura e sem terem sido informados de que estariam sujeitos ao pagamento das indemnizações previstas; que tivessem assinado o acordo sob grande pressão do colaborador da empresa vendedora; que não tenham tido conhecimento da tabela de preços dos equipamentos fornecidos; que tenham ficado convencidos que apenas tinham de comprar café à autora e esta, como contrapartida, emprestava-lhes o referido equipamento, que seria devolvido quando os réus deixassem de comprar tal produto; que apenas tenham tomado conhecimento do teor das cláusulas indemnizatórias em inícios de 2009; que, se tivessem tido conhecimento do teor integral das cláusulas referidas em 1, nunca teriam assinado o aludido acordo.
Pelo contrário, provou-se que Foi o Senhor G… que contatou a ré mulher e que, após negociação dos termos e condições do contrato, aquela acabou por assiná-lo, conjuntamente com o seu marido; e que, na data da assinatura do contrato, o respetivo documento esteve na posse dos réus para o lerem.
Não se provou, pois, a violação dos deveres de comunicação e informação das oito cláusulas contratuais.

III. Desproporcionalidade das penalizações previstas no contrato.
Os apelantes consideram as penalizações previstas no contrato manifestamente desproporcionadas aos danos a ressarcir, pois, na pior das hipóteses, teriam de devolver à autora/apelada os equipamentos entregues ou o seu valor.
Na cláusula 3ª do contrato, ficou estabelecido: “Se o contrato cessar antes do seu termo final, por motivo imputável ao segundo outorgante, este obriga-se a restituí-los em bom estado de conservação e a pagar 20% do seu valor, acima indicado, por cada ano ou fração de utilização, a título de aluguer dos mesmos”.
Dispõe o artigo 19º, alínea c), do DL 446/85, que são relativamente proibidas as cláusulas contratuais gerais que consagrem cláusulas penais desproporcionadas aos danos a ressarcir.
Para se avaliar a adequação e proporcionalidade da cláusula estabelecida deve ter-se em conta o valor dos danos a reparar e a pena contratualmente fixada, que vale como indemnização pré-determinada, de modo a que se possa afirmar que há uma equivalência entre os dois valores.
As cláusulas penais são, no dizer de Ana Prata, «quase inevitavelmente – excluídas as hipóteses de fraude à lei, isto é, de cláusulas penais que constituam cláusulas de exclusão ou de limitação da responsabilidade – vantajosas para o credor, uma vez que, fixando antecipadamente o montante indemnizatório em caso de incumprimento, dispensam-no da prova de qualquer dos pressupostos do direito à indemnização que não seja o não cumprimento obrigacional». ob. cit., pág. 413.
A desproporção ou desequilíbrio entre a cláusula penal e os danos a reparar não tem de ser manifestamente excessiva, como se exige para a redução equitativa da cláusula penal, prevista no artigo 812º do C.C., fixada por negociação das partes.
Cremos que a proibição consagrada na alínea c) do artigo 19º não se verifica quando exista uma pequena desproporção entre os danos a reparar e a pena fixada, mas apenas quando tal desproporção seja sensível. cfr. Acórdão do STJ, de 29.1.2003, in www.dgsi.pt
Na estipulação de cláusulas penais em contratos deste tipo tem de estar subjacente a boa-fé, sob pena de proibição, como resulta dos artigos 15º e 16º do diploma que tem vindo a ser citado.
Por outro lado, os fins compulsórios das cláusulas penais pressupõem a verificação de um certo grau de desproporção, sendo que o princípio da liberdade contratual, consagrado no artigo 405º do C.C., não deve sofrer limitações nos casos em que é pequena tal desproporção entre o dano a ressarcir e a pena fixada.
No caso em apreço, não se vê que haja uma desproporção sensível entre os danos e as indemnizações exigidas a título de cláusula penal.
A indemnização é calculada sobre 20% do valor dos equipamentos que os réus/apelantes receberam, sendo que estes nada pagaram pelos mesmos. Além disso, o valor indemnizatório afere-se pelo período de utilização desses equipamentos, sem que os réus tivessem de pagar qualquer contrapartida por essa mesma utilização, não se afigura, de facto, que haja a referida desproporção sensível a justificar, sequer, uma redução do seu valor. De resto, a autora nem peticiona a devolução dos equipamentos.
O mesmo se diga da indemnização estipulada na cláusula 8ª – multiplicação do número de quilos de café que se mostrem em falta para atingir a quantidade prevista no número um da cláusula 6ª (960kg), à data da sua resolução, pelo valor de €7,00 por quilo. Também aqui não se vê qualquer desproporção sensível.
Improcede, assim, o recurso dos réus C… e mulher D….

Decisão:
Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes desta secção cível em não tomar conhecimento do recurso interposto pelo exequente.

Custas pelos apelantes.

Sumário:
I. O dever de comunicação tem de ser concretizado de forma adequada e com antecedência, tendo em conta, nomeadamente, a importância do contrato, a sua extensão e a complexidade das cláusulas.
II. O dever de informação consiste em, ainda em fase pré-contratual, comunicar quais as cláusulas a inserir no contrato mas, e também, prestar todos os esclarecimentos razoáveis, designadamente, informando a outra parte do seu significado e implicações.
III. Ao incumprimento dos deveres de comunicação e de informação, o artigo 8º, alíneas a) e b), do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, faz corresponder a exclusão das cláusulas dos contratos singulares.
IV. A proibição consagrada na alínea c) do artigo 19º não se verifica quando exista uma pequena desproporção entre os danos a reparar e a pena fixada, mas apenas quando tal desproporção seja sensível.

Porto, 20.6.2016
Augusto de Carvalho
José Eusébio Almeida
Carlos Gil