Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
213/19.1T8AMT-B.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: INÊS MOURA
Descritores: INSOLVÊNCIA
LISTA PROVISÓRIA
IMPUGNAÇÃO
RELATÓRIO
RELAÇÃO DE CRÉDITOS
Nº do Documento: RP20190912213/19.1T8AMT-B.P1
Data do Acordão: 09/12/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS, N.º181, FLS.253-263)
Área Temática: .
Sumário: I - A lista provisória de credores prevista no art.º 154.º CIRE, integra como anexo o relatório apresentado pelo Administrador da Insolvência e vai servir de base à definição da participação e votação dos credores nas deliberações que à Assembleia de Credores compete tomar.
II - Uma impugnação apresentada àquela lista não é atendível no âmbito do apenso de reclamação de créditos, não desobrigando o interessado de apresentar nos termos e no prazo previstos no art.º 130.º do CIRE a impugnação que tenha por conveniente à lista de credores reconhecidos e não reconhecidos que vier ser apresentada pelo Administrador da Insolvência em cumprimento do art.º 129.º do CIRE.
III - A relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos a que alude o art.º 129.º do CIRE constitui um documento autónomo da lista provisória de credores anexa ao relatório e é ela que vai dar origem à tramitação judicial do incidente de verificação e graduação de créditos, que corre termos por apenso ao processo de insolvência enquanto incidente que se apresenta com uma tramitação própria e diferenciada daquele processo principal.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. Nº 213/19.1T8AMT-B.P1
Apelação em processo comum e especial
Sumário: (art.º 663.º n.º 7 do C.P.C.)
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Acordam na 3ª secção do Tribunal da Relação do Porto
I. Relatório
Os presentes autos de reclamação de créditos correm termos por apenso ao processo de insolvência em que por sentença de 07/02/2019 foi decretada a insolvência da B… Unipessoal, Ld.ª.
O Administrador de Insolvência veio a 25/03/2019 apresentar a relação dos créditos reconhecidos e não reconhecidos sobre a insolvente, nos termos do art.º 129.º do CIRE, requerimento que deu origem à constituição do presente apenso de reclamação de créditos, reconhecendo, entre outros, um crédito a favor de C… e D…, no valor de €23.400,00 indicando-o como crédito privilegiado/sob condição e fazendo menção a penhor mercantil constituído sobre bens móveis que integravam o estabelecimento comercial da insolvente e ao facto de estar pendente recurso da homologação da transacção no proc. 134/18.5T8FLG.
A 24/04/2019 foi proferida sentença de verificação e graduação de créditos que afirmou não ter existido impugnação da lista de créditos reconhecidos apresentada pelo Administrador em 25/03/2019 e com fundamento em erro manifesto quanto à qualificação do crédito reconhecido aos credores C… e D…, qualificou o mesmo como crédito subordinado, no mais homologando a lista de credores reconhecidos, procedendo à sua graduação e concluindo com a seguinte decisão:
“a) Homologar a lista de credores reconhecidos, elaborada pelo Sr. Administrador da Insolvência e apresentada em 25.03.2019, que não foi objeto de impugnação, salvo quanto à qualificação dada ao crédito reconhecido aos credores C… e D…, o qual se qualifica como crédito subordinado;
b) Graduar tais créditos, para serem pagos pelo produto da venda de todos os bens móveis apreendidos (já que inexistem bens imóveis apreendidos), nos seguintes termos:
1.º Após salvaguarda das despesas e dívidas da massa, pelo remanescente, o crédito com privilégio mobiliário geral, do credor Segurança Social, no montante global de 1.587,44 euros;
2.º Pelo remanescente, os créditos comuns, reclamados e reconhecidos, devendo proceder-se a rateio, na proporção devida, caso não seja possível a plena satisfação dos créditos;
3.º, Se houver remanescente, os créditos subordinados.”
É com esta decisão que a Recorrente Insolvente não se conforma e dela vem interpor recurso, pedindo a sua revogação e substituição por outra que determine que o processo siga os termos previstos nos art.º 130.º ss. do CIRE para apreciação da impugnação por si deduzida, a qual não foi atendida, apresentando para o efeito as seguintes conclusões, que se reproduzem:
A - A lista a que se refere o Art.º 154º e o Art.º 129º do CIRE são uma e a mesma lista, razão pela qual, sendo Impugnada a lista apresentada nos termos do Art.º 154º do CIRE com o relatório apresentado nos termos do Art.º 155º do CIRE, têm que ser seguidos os procedimentos do Art.º 130º e segs. Do CIRE;
B - Nos presentes autos, a 21 de Março de 2019, e com o relatório do Art.º 155º do CIRE, o senhor AI fez juntar aos autos a lista de créditos nos termos do Art.º 154º do CIRE, sendo que, a 22 de Março de 2019, a Recorrente deduziu impugnação do crédito reclamado pelos credores C… e D…, impugnação que repetiu na Assembleia de Credores de 26 de Março de 2019;
C - Não obstante a apresentação da impugnação do crédito, quando aberto o apenso de reclamação ao qual foi atribuída a letra A, a secretaria não fez juntar ao mesmo o teor da impugnação de crédito que tinha sido apresentada em 22 de Março de 2019 pela Recorrente, e reafirmada em Assembleia de Credores de 26 de Março de 2019;
D - Por tal facto, o tribunal não atentou no teor da Impugnação e não ordenou a sua autuação no apenso de reclamação de créditos;
E - A omissão da referência à Impugnação e a sua junção ao apenso de reclamação integram nulidade processual que influi sobre maneira no direito de defesa da recorrente, afectando-o de forma grave;
F - Acresce que, a reclamação deduzida e que consta do processo principal, não foi objecto de contraditório nos autos, mas também não foi devidamente autuada no apenso da reclamação de créditos;
G - A impugnação apresentada é de molde a afastar o crédito dos credores impugnados, que inclusivamente apresentaram o contraditório nos autos, sem que tal constasse do apenso de reclamação de créditos;
H - Por tal facto, afigura-se ser nula a sentença proferida nos autos, por preterição de formalidade essencial, com afectação do direito de defesa, bem como por omissão de pronuncia, nulidade a ser declarada com os devidos e legais efeitos.
Foi admitido o recurso interposto e conhecendo da nulidade da sentença suscitada no recurso, nos termos do art.º 617.º n.º 1 do C.P.C., veio a ser proferido o seguinte despacho pela Exm.ª Sr.ª Juiz a quo:
Nas suas alegações de recurso apresentado a recorrente suscita a nulidade da sentença proferida por, no seu entender, ter sido cometida nulidade por omissão de pronuncia quanto à impugnação apresentada pela recorrente à Lista de Credores apresentada pelo Sr. Administrador de Insolvência. Todavia, e salvo melhor entendimento, cremos que não ocorre a nulidade invocada, já que a sentença em crise não tinha de considerar qualquer impugnação pois que, contrariamente ao que vem alegado, a Recorrente não impugnou a Lista de Créditos reconhecidos e Não Reconhecidos apresentada pelo Sr. Administrador de Insolvência. Com efeito, embora em sede de autos principais e antes da data designada para a realização da Assembleia de Credores, a Devedora tivesse ali impugnado a Lista provisória de credores junta com o relatório a que se refere o artigo 155.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o que fez para efeitos de votação do Relatório na assembleia de credores realizada em 26.03.2019, a verdade é que, neste apenso de reclamação de créditos, a Recorrente nenhuma impugnação apresentou à Lista de Credores apresentada em 25.03.2019, sendo que esta foi a única Lista apresentada e que deu origem ao apenso de reclamação de créditos, e sendo esta que esteve na origem da sentença aqui proferida e que agora é objeto de recurso. Assim, cremos que nenhuma nulidade foi praticada que agora devesse ser sanada, já que o tribunal não tinha de tomar em conta a impugnação apresentada nos autos principais à Lista provisória de credores junta com o relatório a que alude o artigo 155.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, já que o credor caso pretendesse que a sua impugnação fosse novamente apreciada e decidida tinha de apresentar neste apenso de reclamação de créditos e no prazo que a lei de confere para o efeito, impugnação às Listas a que se refere o artigo 129.º, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas, o que não sucedeu já que nenhuma impugnação foi apresentada no prazo legal, como resulta inequívoco da tramitação deste apenso.”
II. Questões a decidir
Tendo em conta o objecto do recurso delimitado pela Recorrente nas suas conclusões- art.º 635.º n.º 4 e 639.º n.º 1 do C.P.C.- salvo questões de conhecimento oficioso- art.º 608.º n.º 2 in fine:
- da nulidade da sentença por omissão de pronuncia ao não atender à impugnação do crédito apresentada no processo principal, na sequência da lista provisória de créditos junta com o relatório a que alude o art.º 155.º do CIRE.
III. Fundamentos de Facto
Os factos relevantes para a decisão são os que constam do relatório que antecede a que acrescem os seguintes, resultado da tramitação processual evidenciada no processo principal:
- a 21/03/2019 o Administrador de Insolvência apresentou nos autos principais o relatório a que alude o art.º 155.º do CIRE, acompanhado da lista provisória de credores como anexo 3 do mesmo;
- a 22/03/2019 a insolvente veio apresentar requerimento aos autos principais, ali referindo impugnar a lista provisória de credores apresentada, quanto aos credores C… e D…;
- em sede de Assembleia de Credores realizada a insolvente reiterou aquela mesma impugnação;
- sobre a mesma foi proferido o seguinte Despacho: “Tendo em conta que o requerimento da devedora foi apresentado em 22-03-2019 e que ainda se encontra em curso o prazo para exercício do contraditório quanto aos credores com créditos impugnados, considerando que a questão se afigura de alguma complexidade quanto a sua decisão e que não se mostra viável decidir apressadamente sem que do processo conste, todos os elementos relevantes para a boa decisão a proferir, determino que seja emitido o voto pelos credores C… e D… aqui representados pelo Ilustre Mandatário Dr. E…, o qual será ou não atendido, consoante a decisão que vier a ser proferida quanto à impugnação do respetivo crédito, a qual será proferida decorrido que seja o prazo em curso para estes credores exercerem o seu direito ao contraditório quanto à impugnação deduzida e após junção dos documentos que abaixo se irá determinar sejam juntos.
Assim, concede-se ao devedor o prazo de 8 dias para a junção da certidão da transação posta em causa na impugnação apresentada, com a respetiva sentença homologatória e nota de trânsito em julgado ou, não estando ainda, do estado do processo, devendo constar ainda da certidão em causa se na data em que foi efetuada a transação ambas as partes estavam patrocinadas por mandatário, no caso de o processo ter alçada que exija a constituição de mandatário e ainda certidão de todas as pessoas cujo parentesco é invocado e se foi certificada a qualidade da pessoa que interveio na transação em representação da sociedade aqui devedora.
Decorrido o prazo concedido, deverá ser aberta conclusão a fim de o Tribunal aferir do montante e da qualidade do crédito invocado pelos credores, cujo crédito foi impugnado e da sua possibilidade de votar nesta assembleia e, se for o caso, ser decidido se o tribunal lhe reconhece o crédito pela totalidade ou lhe confere o direito de voto e neste caso em que percentagem.”
- a 25/03/2019 o Administrador da Insolvência dirigiu ao processo a lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos a que alude o art.º 129.º do CIRE que veio a dar origem ao apenso de reclamação de créditos;
IV. Razões de Direito
- da nulidade da sentença por omissão de pronuncia ao não atender à impugnação do crédito apresentada no processo principal, na sequência da lista provisória de créditos junta com o relatório a que alude o art.º 155.º do CIRE
Entende a Recorrente que devia ter sido atendida pelo tribunal a impugnação que apresentou no processo principal em 22/03/2019 à lista provisória de créditos que o Administrador de Insolvência juntou com o relatório a que alude o art.º 155.º do CIRE, impugnação que reiterou na Assembleia de Credores.
O tribunal a quo considerou que não foi apresentada qualquer impugnação à lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos apresentada pelo Administrador de Insolvência nos termos do art.º 129.º do CIRE, a 25/03/2019, no entendimento de que a impugnação apresentada à lista provisória de credores, no processo de insolvência, apenas releva para efeitos da votação a realizar em sede de Assembleia de Credores, não tendo sido apresentada qualquer impugnação àquela lista neste apenso de reclamação de créditos.
Conforme dispõe o art.º 155.º do CIRE compete ao Administrador da Insolvência a elaboração de um relatório com as indicações contidas em tal artigo, ao qual deve ser anexada uma lista provisória de credores, como refere o n.º 2 deste artigo, relatório esse que é submetido à Assembleia de Credores para deliberação, nos termos do art.º 156.º n.º 2 do CIRE.
Os credores têm o direito de estar presentes e de participar na Assembleia, como estabelece o art.º 72.º do CIRE, sendo-lhes conferido o direito de voto, conforme regulado no art.º 73.º.
Esta lista provisória de credores que o Administrador da Insolvência junta, constitui um anexo do relatório por ele elaborado que vai ser alvo de apreciação e deliberação em sede de Assembleia de credores, nos termos do art.º 156.º do CIRE, não se confundindo com a relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos a que alude o art.º 129.º do CIRE, que o Administrador deve elaborar na sequência das reclamações de créditos apresentadas pelos credores no prazo fixado para o efeito na sentença de declaração de insolvência.
Não é controvertido o entendimento de que o desenrolar do processo de insolvência integra diversas fases processuais autónomas e distintas, com regulamentação própria, destacando-se para o efeito o processo principal no qual é apresentado pelo Administrador o relatório que vai ser submetido à Assembleia de Credores com uma lista provisória de credores anexa, e o apenso de reclamação de créditos que visa a verificação e graduação de créditos, no qual é apresentada pelo Administrador a lista dos créditos reconhecidos e não reconhecidos, correspondendo esta uma fase processual diferente e não estando o Administrador da Insolvência desobrigado de apresentar esta lista, apenas pelo facto de ter junto anteriormente com o seu relatório uma lista provisória de credores.
No reconhecimento de autónomas e diferentes fases que integram o processo de insolvência, diz-nos o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 20/04/2017 no proc. 2116/14.7T8VNG-E.P1 in www.dgsi.pt : “Se não é pacífico nem linear a qualificação processual do processo de insolvência, é ao menos consensual que envolve uma fase de pendor declarativo, que visa a declaração de insolvência, com a consequente alteração na situação jurídica do devedor e o despoletar dos efeitos que lhe são inerentes, e uma fase de pendor executivo de natureza concursal, em que são chamados a intervir no processo todos os credores do devedor.”
A lista provisória de credores prevista no art.º 154.º CIRE, integra o relatório apresentado pelo Administrador da Insolvência e vai servir de base à definição da participação e votação dos credores nas deliberações que à Assembleia de Credores compete tomar, destinando-se as impugnações apresentadas a esta lista apenas a limitar ou a impedir a participação ou votação dos credores naquela Assembleia. Foi assim que aquela impugnação apresentada pela devedora deu origem a incidente que veio a ser tramitado e objecto de decisão naquele processo.
Do despacho proferido sobre a mesma, em sede de Assembleia de credores resulta precisamente que a impugnação apresentada pela devedora à lista provisória de credores, iria ser ponderada pelo tribunal para efeitos de determinação da votação dos credores em Assembleia. Esta decisão não desobrigou de forma alguma a reclamante de apresentar no prazo legal devido a impugnação que viesse a ter por conveniente à lista de credores reconhecidos e não reconhecidos que viesse a ser apresentada pelo Administrador da Insolvência em cumprimento do art.º 129.º do CIRE, nos termos e no prazo previstos no art.º 130.º.
A relação de créditos reconhecidos e não reconhecidos a que alude o art.º 129.º do CIRE, constitui um documento autónomo daquela lista provisória de credores anexa ao relatório (ainda que possam coincidir no seu teor) e é ela que vai dar origem à tramitação judicial do incidente de verificação e graduação de créditos que corre termos por apenso ao processo de insolvência, incidente que se apresenta com uma tramitação própria e diferenciada da do processo principal de insolvência, como resulta dos art.º 128.º ss. do CIRE.
A relação dos créditos reconhecidos e não reconhecidos deve ser elaborada pelo Administrador da Insolvência nos termos previstos no art.º 129.º do CIRE e de acordo com o n.º 1 deste artigo, dela devem constar os créditos que tenham sido reclamados pelos credores e também aqueles que constem da contabilidade do devedor ou tenham chegado ao seu conhecimento por qualquer outra forma.
Os credores do insolvente devem reclamar os seus créditos sobre o devedor, no prazo que é definido na sentença que decreta a insolvência e que, conforme estabelece o art.º 36.º n.º 1 al. j) do CIRE, pode ir até 30 dias, dispondo o art.º 128.º n.º 1 do CIRE: “Dentro do prazo fixado para o efeito na sentença declaratória da insolvência, devem os credores da insolvência, incluindo o Ministério Público na defesa dos interesses das entidades que representa, reclamar a verificação dos seus créditos por meio de requerimento acompanhado de todos os documentos probatórios de que disponham.”
O art.º 130.º do CIRE, com a epígrafe “impugnação da lista de credores reconhecidos”, dispõe no seu n.º 1: “Nos 10 dias subsequentes ao termo do prazo indicado no artigo anterior, pode qualquer interessado impugnar a lista de credores reconhecidos através de requerimento dirigido ao juiz com fundamento na indevida inclusão ou exclusão de créditos ou incorrecção do montante ou da qualificação dos créditos reconhecidos.
Em face desta previsão normativa, são três as situações que podem fundamentar a impugnação da lista dos credores reconhecidos:
a) a indevida inclusão ou exclusão de créditos;
b) a incorrecção do montante dos créditos reconhecidos;
c) a qualificação dada aos créditos pelo administrador da insolvência.
Este art.º 130.º n.º 1 do CIRE prevê que qualquer interessado possa impugnar para o juiz a lista de credores reconhecidos apresentada pelo Administrador da insolvência, sendo o objectivo desta fase da verificação e graduação de créditos determinar quem tem créditos sobre a insolvente, o seu montante e natureza, para de seguida se definir a sua graduação ou prioridade, como vista ao seu pagamento a final.
O interessado em impugnar a lista de credores reconhecidos e não reconhecidos é a pessoa a quem podem advir prejuízos do modo como a lista foi indevidamente organizada.
No caso, em cumprimento do disposto no art.º 129.º do CIRE foi apresentada a lista dos créditos reconhecidos pelo Administrador da Insolvência e a Recorrente/Insolvente não impugnou a mesma com observância do procedimento e nos termos do art.º 130.º n.º 1 do CIRE, razão pela qual não podemos dizer que existiu uma omissão do tribunal ao não ter considerado uma impugnação que a mesma apresentou em sede de processo de insolvência e reiterada na Assembleia de Credores quanto aos credores C… e D… que constavam da lista provisória de credores a que alude o art.º 155.º e cuja decisão proferida pelo tribunal apenas interfere com o direito de voto dos credores em Assembleia.
Esta omissão é imputável à Impugnante que não observou os procedimentos processuais necessários a que o tribunal pudesse ter em conta a sua pretensão. Regista-se aliás que no requerimento por ela apresentado para o efeito, a mesma especifica que vem impugnar a lista provisória de credores, lista que foi apresentada com o relatório do Administrador da Insolvência no processo principal.
Aceitar-se a pretensão da Recorrente, no sentido de que a impugnação que apresentou à lista provisória de credores anexa ao relatório junto pelo Administrador da Insolvência devia ser igualmente considerada pelo tribunal como impugnação efectuada nos termos do art.º 130.º do CIRE à lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos junta mais tarde pelo Administrador da Insolvência, para efeitos do disposto no art.º 129.º do CIRE, seria subverter a regulamentação estabelecida pelo legislador sobre a matéria da verificação e reclamação de créditos na insolvência, já que seria admitir a impugnação de créditos em forma e prazo diferentes daqueles que são processualmente previstos naquela fase processual.
Não podemos por isso dizer que no âmbito da sentença de verificação e graduação de créditos proferida, o tribunal andou mal ao não considerar a impugnação do crédito apresentada pelo devedor no processo de insolvência à lista provisória de credores que acompanhou o relatório da insolvência, antes se entendendo que a partir do momento em que não foi devidamente apresentada, nos termos do art.º 130.º do CIRE, uma impugnação à lista dos créditos reconhecidos e não reconhecidos apresentada pelo Administrador da Insolvência nos termos do art.º 129.º, só podia o tribunal concluir, como concluiu, que não foram apresentadas impugnações àquela lista.
Os direitos que qualquer interessado pretenda fazer valer no âmbito do processo de insolvência, têm de ser por ele exercidos nos termos em que o próprio CIRE o determina, constituindo por isso um ónus para o interessado que pretenda excluir um crédito da lista de créditos reconhecidos pelo Administrador da Insolvência, proceder à impugnação do mesmo no apenso de verificação e graduação de crédito, no prazo e sob a forma que o CIRE estabelece no art.º 130.º.
Na prática, o que a Recorrente pretende é que não seja considerado verificado e graduado, um crédito de que não reclamou nos termos legais e para esse efeito, com fundamento numa impugnação de uma lista provisória de credores anteriormente apresentada para efeitos de votação na Assembleia de Credores, impugnação que não é dirigida nem teve como finalidade o incidente de verificação e graduação de créditos da insolvência, com vista ao seu posterior pagamento.
O art.º 615.º n.º 1 do C.P.C. estabelece que a sentença é nula quando, entre outras situações:
d) o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.”
Esta norma vem cominar com a nulidade a decisão em que se verifica a omissão ou excesso de pronuncia por parte do juiz.
Relaciona-se esta previsão com o princípio expresso no art.º 608.º n.º 2 do C.P.C. segundo o qual o juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, exceptuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras, não podendo ocupar-se também de questões que não sejam suscitadas pelas partes, salvo se forem de conhecimento oficioso.
Na situação em presença, não há que atender no âmbito do apenso de reclamação de créditos e na prolação da decisão de verificação e graduação de créditos a uma impugnação que não foi apresentada nos termos do art.º 130.º do CIRE. Quanto à impugnação da lista provisória de credores apresentada no processo principal trata-se de uma questão que no âmbito deste incidente o tribunal não conheceu por dela não ter que conhecer.
Não há qualquer omissão de pronuncia susceptível de fundamentar a nulidade da sentença prevista no art.º 615.º n.º 1 al. d) do C.P.C tendo o tribunal tomado posição sobre todas as questões que lhe competia resolver, não merecendo censura a decisão recorrida que considerou que não houve impugnações à lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos apresentada pelo Administrador da Insolvência nos termos do art.º 129.º do CIRE a 25/03/2019, não existindo qualquer omissão do tribunal susceptível de invalidar a decisão proferida.
V. Decisão:
Em face do exposto, julga-se improcedente o recurso interposto, confirmando-se a decisão recorrida.
Custas pela massa insolvente.
Notifique.
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Porto, 12 de Setembro de 2019
Inês Moura
Francisca Mota Vieira
Paulo Dias da Silva