Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
71170/17.6YIPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ MANUEL DE ARAÚJO BARROS
Descritores: COMPETÊNCIA MATERIAL
CONCESSÃO DE SERVIÇOS PÚBLICOS
FORNECIMENTO DE ÁGUA
Nº do Documento: RP2018091371170/17.6YIPRT.P1
Data do Acordão: 09/13/2018
Votação: UNANIMIDADE COM 1 DEC VOT
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ªSECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º144, FLS.2-6 VRS.)
Área Temática: .
Sumário: Atenta a natureza da relação jurídica que nela se versa, não caracterizável como administrativa, são os tribunais judiciais os competentes para o conhecimento da acção em que uma concessionária da gestão e exploração do serviço público de fornecimento de água exige a um particular o pagamento de serviços que lhe prestou, no cumprimento de contrato com ele para o efeito pactuado.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: 3ª SECÇÃO – Processo nº 71170/17.6YIPRT.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo Local Cível de Ovar
SUMÁRIO
(artigo 713º, nº 7, do Código de Processo Civil)
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto
I
RELATÓRIO
B…, SA, intentou a acção declarativa especial para cumprimento de obrigações pecuniárias contra C… – Unipessoal, Lda, pedindo a condenação desta no pagamento da quantia de 356,66€.
Estribou o seu pedido em contrato com a ré pactuado, reclamando o pagamento de serviços de fornecimento de água e saneamento.
A ré foi citada e não deduziu oposição.
Suscitada oficiosamente a questão da incompetência material do tribunal, veio a ser proferida decisão que julgou verificada a excepção dilatória de incompetência do tribunal em razão da matéria e, consequentemente, absolveu a ré da instância.
Inconformada, veio a autora interpor recurso, o qual foi admitido como de apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, com efeito meramente devolutivo.
Conclui a recorrente, nas suas alegações.
1. Conforme resulta do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), o âmbito da jurisdição administrativa em matéria contratual não depende do carácter jurídico-administrativo do contrato.
2. Não se aplica o artigo 4.º, n.º 1, alínea o) do ETAF, dado não estarem perante relações jurídicas administrativas e fiscais que não digam respeito às matérias previstas nas alíneas anteriores, praticados por sujeitos privados.
3. A relação material em litígio é de natureza manifestamente privada e contratual, pois é pedido a condenação do cliente/consumidor final no pagamento de determinado montante referente aos serviços prestados de água e saneamento, sendo a causa de pedir a violação da relação sinalagmática pelo não pagamento do preço acordado e não do foro administrativo, não se alicerçando no disposto no art.º 4, n.º 1 alínea o) da ETAF, estando excluída a sua aplicação.
4. O contrato dos autos (contrato de fornecimento de água), para efeitos de critério de justiciabilidade administrativa, é um contrato de consumo, regulado no âmbito do direito privado, de uma relação de consumo, que não se celebra em substituição de qualquer ato administrativo.
5. Apesar de ser objecto de uma regulação específica, está longe de se poder considerar uma regulação baseada em normas de direito público, antes tal regulação é, pelo menos nos anos mais recentes, claramente, a protecção do consumidor no contexto de uma relação de consumo de um serviço público essencial.
6. Sempre se dirá que o contrato de fornecimento de água seria qualificado como contrato de direito privado ainda que o fornecimento de água fosse efectuado por uma entidade pública.
7. O contrato dos autos não foi expressamente submetido pelas partes a um regime substantivo de direito público.
8. A competência dos tribunais administrativos em matéria de contratos da Administração (em sentido lato) não depende (apenas) da administratividade, mas antes de outros critérios que inspiram as alíneas do artigo 4.º do ETAF, sobre o âmbito da jurisdição administrativa relativa a contratos.
9. Os contratos de fornecimento de água por empresas como a da Recorrente não entram em nenhum dos preceitos constantes do ETAF, antes ordenam-se no âmbito do direito privado: são contratos de direito privado.
10. Da interpretação do ETAF resulta que, só a ordenação dos mesmos como contratos administrativos seria susceptível de os reconduzir à jurisdição dos tribunais administrativos.
11. Os contratos de fornecimento de água não são administrativos pela simples razão de que não são objecto de uma regulação baseada em normas de direito administrativo; trata-se de contratos de consumo, em parte regulados por normas que protegem precisamente os direitos dos consumidores/utentes - Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, Lei dos Serviços Públicos Essenciais.
12. Estamos perante uma simples cobrança de dívida civil, por uma empresa privada, regulada pelas regras do direito privado.
13. A Recorrente é uma empresa privada, que não actua munida de poder soberano na sua relação com o consumidor, antes actua, perante este, em situação de paridade.
14. Não está aqui em discussão nem consubstancia o pedido ou a causa de pedir tal qual foi apresentada pela ora recorrente, a relação entre a Recorrente e os entes públicos indicados no Contrato de Parceria.
15. Muito menos a correcta ou incorrecta determinação do preço ou das taxas devidas pela prestação do serviços e/ou pela utilização do domínio público, está em apreço nos autos.
16. Ou sequer a validade das clausulas contratuais subjacentes à prestação do serviço não pago.
17. Estamos perante uma acção tem por objecto o pagamento de valores constantes de facturas, mais juros à taxa legal para juros cíveis e ou comerciais, nos termos da fruição do uso do contador e da água consumida, pela qual foram emitidas facturas que não se mostram pagas.
18. Uma acção que tem por base uma relação jurídica de direito privado, e consubstancia uma situação de incumprimento das obrigações contratuais assumidas.
19. Obrigações que tendo natureza civil, regem-se, pelas normas dos contratos civis, estando em causa a apreciação de pressupostos da responsabilidade e do incumprimento e mora contratuais nos termos da lei civil – artigos 762 e segs, 792 e segs, art 806, todos do CC.
20. A sujeição à jurisdição civil em face do incumprimento contratual é similar à que resulta da falta de pagamento de uma factura de electricidade ou de uma factura emitida por operadora de telemóveis ou de comunicações electrónicas - Lei n.º 23/96, de 26 de Julho, Lei dos Serviços Públicos Essenciais.
21. Aqui o interesse que se satisfaz, com o fornecimento do serviço é o interesse particular do consumidor, ainda que no âmbito da prestação de serviços públicos essenciais.
22. Ficando toda a entidade pública ou privada que o preste independentemente da sua natureza jurídica, do título a que o faça ou da existência ou não de contrato de concessão, sujeita a um regime substantivo de direito privado que regula essa mesma prestação.
23. Num caso e noutro não se podem enquadrar as relações contratuais estabelecidas entre a empresa prestadora do serviço e o consumidor em realidade materialmente sujeita a jurisdição administrativa.
24. Não se confunda, a questão da determinação da qualificação da relação jurídica com a prestação de serviços essenciais, transversal aos serviços de fornecimento de água, electricidade e comunicações telefónicas, entre outros.
25. Não se confunda, ainda, a prerrogativa de contratar ou não contratar e/ou negociar ou não negociar o preço do serviço com a aplicação de normas de direito público versus normas de direito privado.
26. Porquanto essa mesma questão, no âmbito dos contratos de adesão e do “monopólio” que certas empresas tem na distribuição de certos serviços (o caso da EDP, durante tanto tempo, entre outras) é questão distinta que em nada condiciona a atribuição da competência de um tribunal em razão da matéria.
27. Determinada e qualificada, que está, a relação jurídica tal qual foi configurada pelo Autor no processo.
28. Na base da competência em razão da matéria está o princípio da especialização, com o reconhecimento da vantagem de reservar para órgãos judiciários diferenciados o conhecimento de certos sectores do Direito, pela vastidão e pela especificidade das normas que os integram pelo que só será competente o tribunal judicial (comum) se a causa não estiver inserida por lei na competência dos tribunais administrativos.
29. Assim, é perante os termos em que é estruturada a petição inicial que se afere se, atentos os contornos objectivos (pedido e seus fundamentos) e subjectivos (identidade das partes) da acção, a sua apreciação se enquadra na competência dos Tribunais Administrativos ou na competência dos tribunais judiciais comuns.
30. Os actos de gestão privada são, de modo geral, aqueles que, embora praticados por órgãos, agentes ou representantes do Estado ou de outras pessoas colectivas públicas, estão sujeitos às mesmas regras que vigorariam para a hipótese de serem praticados por simples particulares, são actos em que o Estado ou pessoa colectiva pública intervém como um simples particular, despido do seu poder de soberania ou do seu “jus imperium.”
31. O presente diferendo insere-se estritamente nas relações entre a ora Recorrente e os consumidores/utilizadores, pedindo aquela o pagamento das quantias devidas pelo fornecimento de água a que estava obrigada por força do contrato de fornecimento, centrando-se o diferendo no volume e pagamento do preço da água.
32. Baseando-se num contrato que se ordena no âmbito do direito privado.
Pelo que deve ser dirimido nos Tribunais Judiciais, tendo Tribunal da Comarca de Aveiro – Juízo Local Cível de Ovar, competência material.
Foram violados os artigos 64º, 65.º, 96º, 97º, n.º 2, 99º, n.º 1, 278º, n.º 1, al. a), 576º, n.º 2, 1.º parte, 577º, nº 1, al. a), todos do Código de Processo Civil, bem como o artigo 1.º, n.º 1, do ETAF, e ainda os artigos 211, n.º 1, e 212, n.º 3, da Constituição da República Portuguesa.
Não deveria ter tido aplicação o disposto no artigo 4.º do ETAF.
A ré não contra-alegou.
Foram dispensados os vistos.
II
FUNDAMENTAÇÃO
Discute-se no presente recurso qual o tribunal competente (tribunal administrativo e fiscal ou tribunal judicial) para o conhecimento de uma acção, pela qual a empresa concessionária do serviço de abastecimento de águas pede a condenação de um particular consumidor a pagar montante correspondente a consumo por este efectuado.
Tal questão não tem vindo a ser encarada de forma consensual, na doutrina e na jurisprudência. No acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 18 de Dezembro de 2013, Proc. nº 125096/12.2YIPRT.P1, subscrito pelos ora relator e adjunta, entendeu-se ser competente o tribunal judicial. Retomaremos, no essencial, o aí expendido.
No artigo 211º, nº 1, da Constituição da República Portuguesa estabelece-se a regra de que os tribunais judiciais «exercem jurisdição em todas as áreas não atribuídas a outras ordens judiciais». Sendo que o nº 3 do artigo 212º confina o âmbito da competência dos tribunais administrativos e fiscais ao «julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais».
Tais preceitos são reiterados no artigo 18º, nº 1, da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais Judiciais - «são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional» - e no artigo 1º, nº 1, do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, que dispõe serem estes os competentes «para administrar a justiça em nome do povo, nos litígios compreendidos pelo âmbito de jurisdição previsto no artigo 4.º deste Estatuto». Sendo que, no actual artigo 4º, nº 1, alínea e), deste diploma, resultante da revisão operada pelo DL nº 214-G/2015, de 28 de Setembro, se estabeleceu competir aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objecto apenas a matéria derivada de contratos administrativos ou dos contratos celebrados «nos termos da legislação sobre contratação pública».
O critério de atribuição da competência assenta, desse modo, no conceito de relação jurídica administrativa. Aroso de Almeida e Fernandes Cadilha, no Comentário ao Código de Processo nos Tribunais Administrativos, Almedina, 3ª Edição, 2010, pág.17, dão-nos uma noção analítica da mesma, que será “uma relação regulada por normas de direito administrativo que atribuam prerrogativas de autoridade ou imponham deveres, sujeições ou limitações especiais, a todos ou a alguns dos intervenientes, por razões de interesse público, que não se colocam no âmbito de relações de natureza jurídico-privada”.
O que particularmente nos importará reter desta definição é a alusão à especificidade que, por via do interesse público, é conferida ao conteúdo de determinadas relações jurídicas.
Nessa linha, e no âmbito estritamente contratual, o artigo 1º, nº 6, do Código dos Contratos Públicos, aprovado pelo DL nº 18/2008, de 29 de Janeiro, na definição de contrato administrativo, fez acompanhar a conexão subjectiva “contraentes públicos e co-contratantes” da exigência de uma especial conformação do acordo das vontades negociais, por referência ao objecto do contrato. Transcreve-se o elucidativo preceito - «sem prejuízo do disposto em lei especial, reveste a natureza de contrato administrativo o acordo de vontades, independentemente da sua forma ou designação, celebrado entre contraentes públicos e co-contratantes ou somente entre contraentes públicos, que se integre em qualquer uma das seguintes categorias: a) contratos que, por força do presente Código, da lei ou da vontade das partes, sejam qualificados como contratos administrativos ou submetidos a um regime substantivo de direito público; b) contratos com objecto passível de acto administrativo e demais contratos sobre o exercício de poderes públicos; c) contratos que confiram ao co-contratante direitos especiais sobre coisas públicas ou o exercício de funções dos órgãos do contraente público; d) contratos que a lei submeta, ou que admita que sejam submetidos, a um procedimento de formação regulado por normas de direito público e em que a prestação do co-contratante possa condicionar ou substituir, de forma relevante, a realização das atribuições do contraente público».
O que já tinha sido também claramente assumido pelo legislador do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais (ETAF), ao fazer assentar prevalentemente em critérios conexos com o seu regime substantivo a competência dos tribunais administrativos na área dos contratos. E se extraía do teor da alínea f) do nº 1 do artigo 4º, ainda antes da alteração introduzida em 2015 - «compete aos tribunais de jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham nomeadamente por objecto (…) questões relativas à interpretação, validade e execução de contratos de objecto passível de acto administrativo, de contratos especificamente a respeito dos quais existam normas de direito público que regulem aspectos específicos do respectivo regime substantivo, ou de contratos em que pelo menos uma das partes seja uma entidade pública ou um concessionário que actue no âmbito da concessão e que as partes tenham expressamente submetido a um regime substantivo de direito público». O que se veio a tornar ainda mais claro com a redacção entretanto introduzida pelo DL nº 214-G/2015, que alterou o artigo 1º e suprimiu a anterior alínea f), substituindo-a pela actual alínea e), na qual se esclareceram possíveis dúvidas, confinando a competência dos tribunais administrativos aos contratos celebrados «nos termos da legislação sobre contratação pública».
Relembremos que os elementos identificadores de qualquer acção são os sujeitos, o pedido e a causa de pedir. Definidos no artigo 498º do Código de Processo Civil, respectivamente, como a qualidade jurídica em que as partes se assumem, o efeito jurídico que se pretende obter e o facto jurídico do qual este procede. É, portanto, essencial à possível consideração de um litígio como emergente de relação jurídica administrativa, não só a qualidade das partes, mas também a pretensão deduzida e os factos em que esta se funda.
Ora, a autora pede que lhe seja pago o montante de preço que lhe é devido por via de contrato de fornecimento de água que com a ré pactuou. Tal contrato, ao contrário do que sucede com o celebrado entre a autora, como concessionária, e o Estado Português e alguns municípios do distrito de Aveiro, como adjudicantes, não é um contrato administrativo. Assim, parece que a previsão do artigo 6º, nº 1, alínea c), do Código dos Contratos Públicos, só deverá abarcar os contratos de concessão de serviços públicos, neste caso, os pactuados entre o adjudicatário da concessão e o concessionário. Não sendo legítimo daí extrair sem mais que tal natureza se transmita aos contratos realizados entre estes e os consumidores.
Além disso, o que é o ponto fulcral desta análise, a exigência que a autora faz do preço estriba-se em normas que regem a relação contratual que nada têm a ver com (ou importam do) direito público, tampouco resultando que as partes tivessem pretendido submetê-la a preceitos desse cariz. Apresentando-se ela como qualquer outro normal credor de prestação decorrente de um contrato de compra e venda ou de prestação de serviços. Em nenhum momento tendo convocado interesses ou normas de direito público.
Estamos, portanto, nitidamente fora da previsão da referida alínea e) do artigo 4º, nº 1, do ETAF. Não podendo deixar de ilustrar a relevância de tal factor com a afirmação que se colhe no acórdão do Tribunal de Conflitos de 5.11.2013 (Ana Paula Boularot), in dgsi.pt, quando não aceita que seja deferida aos tribunais administrativos a competência para o conhecimento de questão relativa ao accionamento de uma garantia prestada num contrato de empreitada em que intervinha um município, por transcender a ambiência que naquele preceito se exigia para que a mesma lhes fosse deferida.
No que mais especificamente concerne ao contrato em apreço, aplaude-se o que se aduz no acórdão desta Relação do Porto de 16.04.2013 (Maria João Areias), ibidem, quando se salienta que “o carácter privado de tais contratos ressaltará ainda da circunstância da actual Lei de Defesa do Consumidor (Lei nº 24/96, de 31.07) ter procedido ao alargamento do âmbito material da protecção dos consumidores aos bens e serviços prestados pelos organismos da administração pública, aplicando-se-lhes o direito de arrependimento (artigo 8º, nº 4), bem como o regime das cláusulas contratuais gerais (artigo 9º, nº 3) previsto no DL 446/85, de 25 de Outubro (que exclui a aplicação do seu regime a contratos submetidos a normas de direito público, no artigo 3º, al. c)”. Seguindo Carlos Ferreira de Almeida, Serviços Públicos, Contratos Privados, in Estudos em Homenagem à Prof. Drª. Isabel de Magalhães Colaço, Vol. II, Almedina, 2002, o qual, após enfatizar que o que de específico se verificou foi até de sinal contrário, já que a lei tendeu a retirar poderes autoritários do fornecedor, ao consagrar regras de protecção do utente, conclui, na pág. 124, que “os actos geradores das obrigações de prestação de serviço e de pagamento pelo utente são, portanto, contratos de direito privado, que, no essencial, se regem pelo direito privado”. Em sentido idêntico, Elionora Cardoso, Os Serviços Públicos Essenciais: a sua problemática no ordenamento jurídico português, Coimbra Editora, págs. 54 e 55.
Razões pelas quais concluímos ser o tribunal judicial o competente para o conhecimento da presente acção.
Deixaremos apenas a nota final de que, em casos idênticos, a jurisprudência se vem prevalentemente pronunciado no mesmo sentido - acórdãos deste Tribunal da Relação do Porto de 16.04.2013 (Maria João Areias) e de 10.07.2013 (Luís Lameiras), do Tribunal da Relação de Guimarães de 23.10.2012 (Manuela Fialho) e de 19.02.2013 (António Beça Pereira), todos in dgsi.pt. Bem como o mais recente acórdão deste Tribunal da Relação do Porto de 30 de Maio de 2017 (Vieira e Cunha), ibidem, no qual se enfatiza, e transcrevemos o ponto II do seu sumário, que “nos termos do actual ETAF, resultante da revisão operada pelo DL nº 214-G/2015, de 28/9, entrado em vigor em 2/12/2015, e do actual artigo 4º, nº 1, al. e), compete aos tribunais da jurisdição administrativa e fiscal a apreciação de litígios que tenham por objecto apenas a matéria derivada de contratos administrativos ou dos contratos celebrados nos termos da legislação sobre contratação pública”.
III
DISPOSITIVO
Na procedência do recurso e julgando-se o tribunal competente, revoga-se a sentença recorrida.
Custas pela recorrida - artigo 527º do Código de Processo Civil.

Notifique.

Porto, 13 de Setembro de 2018
José Manuel de Araújo Barros
Filipe Caroço (subscrevo o acórdão, mudando a posição que venho seguindo de atribuir competência aos tribunais administrativos, podendo agora a alteração do ETAF pelo Dec. Lei nº 214-G/2015, mencionado no acórdão, não obstante o Tribunal de Conflitos conceber e atribuir a competência àqueles tribunais em situação semelhante  - cf., mais recentemente, o acórdão de 6/4/2016, proferido no processo 014/16, relator Nuno Gomes da Silva)
Judite Pires