Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1540/15.2T8OAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: ACIDENTE DE TRABALHO
CONCEITO DE RETRIBUIÇÃO
GRATIFICAÇÃO POR ACTA
Nº do Documento: RP201904291540/15.2T8OAZ.P1
Data do Acordão: 04/29/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: PROVIDO PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º293, FLS.216-230)
Área Temática: .
Sumário: I - A LAT/2009 adota um conceito próprio de retribuição, que é mais amplo do que o do Código do Trabalho de 2009.
II - Consubstancia retribuição, para efeitos de cálculo das prestações devidas por acidente de trabalho a designada “gratificação por acta”, paga durante 8 dos 12 meses anteriores à data do acidente de trabalho e que se destina a incentivos à melhoria da produtividade do trabalhador no exercício das suas funções e da sua assiduidade e zelo.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 1540/15.2T8OAZ.P1 Apelação
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1112)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:
I. Relatório:
Participado acidente de trabalho e frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na fase conciliatória da presente acção declarativa de condenação, com processo especial emergente de acidente de trabalho, o A., B…, patrocinado pelo Ministério Público, apresentou petição inicial demandando as RR., Companhia de Seguros C…, SA e D…, SA, pedindo a condenação das mesmas no pagamento: do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia no montante de €1.903,95, devida a partir de 6-4-2015, calculada com base na retribuição anual ilíquida de €10.493,56 e na IPP de 25,92%; da quantia de €2.550,73, a título de diferenças indemnizatórias pelos períodos de incapacidade temporária sofridos; da quantia de €16,00, respeitante a despesas de transporte com as suas deslocações obrigatórias ao GML E… e a este Juízo do Trabalho de Oliveira de Azeméis; de juros de mora já vencidos e os vincendos, à taxa legal de 4%, contados a partir do vencimento das obrigações e até efetivo e integral pagamento, computando-se os primeiros na quantia global de €2.377,16, à data da propositura da presente acção. Mais peticionou a prestação de acompanhamento médico oftalmológico regular, com a periodicidade de uma vez por ano.
Para tanto alegou, em síntese, que sofreu um acidente de trabalho de que resultaram lesões, períodos de incapacidade temporária para o trabalho e, após a alta, sequelas que lhe determinaram uma IPP de 25,92%, mantendo a necessidade de acompanhamento regular na especialidade de oftalmologia; auferia a retribuição mensal de €573,98, percebida 14 vezes ao ano, acrescida de €124,30 x 11 meses de subsídio de alimentação; e, no período de 1-6-2012 a 31-5-2013, mais precisamente nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2013, o A. auferiu também, como contrapartida do seu trabalho, €99,14 x 11 meses (em média) de outra remuneração regular, sob a designação de “gratificação por ata”; não foi possível o acordo na fase conciliatória quanto ao pagamento da totalidade das prestações pois existe divergência com a empregadora quanto ao montante da retribuição.

As RR contestaram:
- A Ré empregadora, alegando, em síntese, que, na data do acidente, a retribuição mensal ilíquida do sinistrado era de €545,00 acrescida de subsídio de alimentação diário de €5,65 pois os valores que recebia a título de “gratificações para ata”, “prémio” ou “prémio de produção” não ocorriam sempre, tinham carácter aleatório e visavam compensar o sinistrado por despesas e incentivá-lo a aumentar a sua produtividade e assiduidade e, por conseguinte, não integram o conceito de retribuição.
- A Ré Seguradora alegando, em síntese, que: por contrato de seguro foi para si transferida a responsabilidade por danos sofridos pelo sinistrado emergentes de acidente de trabalho pela retribuição anual correspondente a €573,98 x 14 meses e subsídio de alimentação de €4,27 x 22 dias x 11 meses; já pagou a quantia de €6.573,27 a título de indemnização por incapacidades temporárias e os juros de mora devem incidir apenas sobre as pensões vencidas e não sobre o capital de remição.

Proferido despacho saneador, seleccionada a matéria de facto (consignando-se a assente e a controvertida) e realizada a audiência de julgamento, com gravação da prova pessoal, foi proferida sentença que decidiu nos seguintes termos:
“(…) julgo procedente a ação e, em consequência, declaro que o autor sofreu um acidente de trabalho em 18 de Junho de 2013 em resultado do qual ficou com sequelas que consolidaram em 5 de Abril de 2015 e que lhe determinaram uma IPP de 25,92% e, por via disso, condeno as rés no seguinte:
A ré seguradora:
No pagamento do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de €1.645,48 com vencimento em 6 de Abril de 2015 e acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde esta data até integral pagamento;
No pagamento da quantia de €1.279,89 a título de diferenças indemnizatórias por incapacidades temporárias relativo à parte da responsabilidade da ré seguradora acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento de cada prestação até integral pagamento;
No pagamento da quantia de € 16 a título de despesas de deslocação acrescida de juros de mora desde o dia seguinte à tentativa de conciliação; e
Na prestação ao sinistrado de acompanhamento médico oftalmológico regular, com a periodicidade de uma vez por ano.
A ré empregadora:
No pagamento do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de €184,86 com vencimento em 6 de Abril de 2015 e acrescido de juros de mora, à taxa legal, desde esta data até integral pagamento; e
No pagamento da quantia de €864,64 a título de diferenças indemnizatórias por incapacidades temporárias relativo à parte da responsabilidade da ré empregadora acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde o vencimento de cada prestação até integral pagamento.
Mais condeno as rés no pagamento das custas, na proporção da responsabilidade, fixando-se à causa o valor de €26.306,37.”

Inconformada, a Ré D…, SA, veio recorrer,
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Colheram-se os vistos legais.
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II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância

É a seguinte a decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância [1]:
“1. Factos provados:
1.1. No dia 18-6-2013, pelas 10:00 horas, em Oliveira de Azeméis, o autor foi vítima de acidente que consistiu em, quando passava um camião na obra, ter saltado uma pedra, atingindo-o no olho direito.
1.2. O autor trabalhava então, como pedreiro, sob as ordens, direção e fiscalização da ré empregadora.
1.3. Em consequência de tal acidente, o autor sofreu traumatismo do sobredito olho, com necessidade de submissão a posterior intervenção cirúrgica e, como suas sequelas, apresenta:
- Reflexos pupilares com defeito pupilar aferente à direita;
- Leucomas lineares cirúrgicos na córnea, às 10 horas límbicas e 2-3 horas corneanas;
- Lente intraocular de câmara posterior bem, sem outras alterações;
- Tensão ocular de 12 e 16 mmHg;
- Silicone, pregas oculares pigmentadas, retina assente, disco pálido e laser a 360º da periferia;
- Conta dedos a 1 metro.
1.4. Em virtude de tais lesões, esteve afetado de:
- Incapacidade temporária absoluta (ITA), de 4-4-2014 a 5-4-2015 (368 dias);
- Incapacidade Temporária Parcial (ITP) de 30%, de 20-8-2013 a 3-4-2014 (227 dias);
- Incapacidade Temporária Parcial (ITP) de 10%), de 19-6-2013 a 19-8-2013 (62 dias).
1.5. Na perícia de avaliação do dano corporal, o Perito Médico do GML E… fixou a consolidação médico-legal das lesões no dia 5-4-2015 e, mercê das referidas sequelas, arbitrou ao autor um coeficiente de desvalorização de 25,92%, a título de IPP, considerando também que o mesmo deverá manter acompanhamento oftalmológico regular, com periodicidade de uma vez por ano.
1.6. O autor recebeu da ré seguradora pelo menos a importância de €6.350,41, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária sofridos.
1.7. Nada lhe foi pago pela ré empregadora a esse propósito.
1.8. O autor gastou a quantia de €16,00 em despesas de transporte, com as suas deslocações obrigatórias ao referido GML e a este Juízo do Trabalho de Oliveira de Azeméis.
1.9. À data do acidente, vigorava entre as rés um contrato de seguro de acidentes de trabalho, titulado pela apólice nº ……., na modalidade de prémio variável, nos termos do qual a ré empregadora transferia para a ré seguradora a responsabilidade infortunística relativa a sinistros ocorridos com os seus trabalhadores.
1.10. Na tentativa de conciliação, realizada a 16-5-2017, o autor concordou com o coeficiente de desvalorização que lhe foi atribuído pelo Perito Médico do GML E… e reclamou consequentemente das rés, na medida das responsabilidades de cada uma, o pagamento do capital de remição de uma pensão anual e vitalícia no montante de €1.903,95 (€1.636,97 a cargo de ré seguradora e €266,98 a cargo da ré empregadora), devida a partir de 6-4-2015, calculada com base na retribuição anual ilíquida de €10.493,56 e na IPP de 25,92%, da quantia de €16,00, respeitante às aludidas despesas de transporte, bem assim como da quantia de €2.550,73, a título de diferenças indemnizatórias pelos períodos de incapacidade temporária sofridos e ainda a prestação de acompanhamento oftalmológico regular com a periodicidade de uma vez por ano e, por sua vez, a ré seguradora aceitou a existência do acidente e a sua caracterização como de trabalho, o nexo de causalidade entre o mesmo e as lesões sofridas, a categoria profissional e a retribuição do autor, bem assim como o coeficiente de desvalorização que lhe foi arbitrado pelo Perito Médico do Gabinete Médico- Legal e Forense E… e a transferência para si da responsabilidade infortunística, em função da retribuição anual ilíquida de somente €9.022,09 (€573,98 x 14 + €89,67 x 11), nos termos da citada apólice de seguro mas não aceitou também a data da alta, visto entender que a consolidação médico-legal das lesões deve ser fixada a 22-6-2015 e, por conseguinte, aceitou pagar ao sinistrado o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia no montante de apenas €1.636,97, devida a partir de 23-6-2015, calculada com base na retribuição anual ilíquida de €9.022,09 e na IPP de 25,92%, a quantia de €16,00, respeitante às supracitadas despesas de transporte, bem assim como a quantia de €1.302,56, referente a diferenças indemnizatórias e aceitou, de igual modo, prestar ao sinistrado acompanhamento oftalmológico nos termos reclamados e, do mesmo passo, a ré empregadora aceitou a existência do acidente e a sua caracterização como de trabalho, o nexo de causalidade entre o mesmo e as lesões sofridas, bem assim como a retribuição do autor e o coeficiente de desvalorização que lhe foi arbitrado pelo Perito Médico do Gabinete Médico-Legal e Forense E… mas nada aceitou, porém, pagar ao autor, a título de capital de remição ou a qualquer outro título, dado entender que a responsabilidade infortunística se acha integralmente transferida para a ré seguradora.
1.11. O autor auferia o vencimento mensal de €545, percebido 14 vezes ao ano, acrescido de €124,30 x 11 meses de subsídio de alimentação.
1.12. No período de 1-6-2012 a 31-5-2013, mais precisamente nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2013, o autor auferiu também, como contrapartida do seu trabalho, €99,14 x 11 meses (em média) de outra remuneração regular, sob a designação de “gratificação por ata”, sendo que todos os meses, nos últimos anos, com exceção do mês de férias, o autor recebia uma quantia a este título.
1.13. Estes valores correspondiam a incentivos à melhoria da sua produtividade no exercício das suas funções, da sua assiduidade e zelo.
1.14. Para além da importância de €6.350,41, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária sofridos, já referida, o autor recebeu da seguradora mais a quantia de €30,50.
2. Factos não provados:
a) O autor auferia o vencimento mensal de €573,98, percebido 14 vezes ao ano.
b) Estes valores recebidos a título de gratificação por ata destinavam-se a compensar o sinistrado de custos aleatórios por si suportados.
c) Para além da importância de €6.350,41, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária sofridos, já referida, o autor recebeu da seguradora mais a quantia de €222,86.”
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III. Fundamentação
1. Salvas as matérias de conhecimento oficioso, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10).
Assim, são as seguintes as questões a apreciar:
- Impugnação da decisão da matéria de facto;
- Se a quantia paga ao A. sob a designação de “gratificação por acta” está excluída do conceito de retribuição.
2. Da impugnação da decisão da matéria de facto
É o seguinte o teor do ponto 1.12 dos factos provados: “1.12. No período de 1-6-2012 a 31-5-2013, mais precisamente nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2013, o autor auferiu também, como contrapartida do seu trabalho, €99,14 x 11 meses (em média) de outra remuneração regular, sob a designação de “gratificação por ata”, sendo que todos os meses, nos últimos anos, com exceção do mês de férias, o autor recebia uma quantia a este título.”,
E, bem assim, o teor da al. b) dos factos não provados: “b) Estes valores recebidos a título de gratificação por ata destinavam-se a compensar o sinistrado de custos aleatórios por si suportados.”
Discorda a Recorrente do ponto 1.12. dos factos provados, bem como da al. b) dos factos não provados, entendendo que deve ser dado como provado o seguinte: i) “No período de 1-6-2012 a 31-05-2013, mais precisamente nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2013, o autor recebeu uma “gratificação para a ata” de montante variável”; ii) “Estes valores correspondiam a incentivos à melhoria da sua produtividade no exercício das suas funções, da assiduidade e zelo e, ainda, a compensar o sinistrado de custos aleatórios por si suportados”; iii) “Tais valores não eram pagos sempre, nem eram sempre do mesmo valor, nem foram, nem estavam antecipadamente garantidos pela Ré e não eram devidos por força do contrato de trabalho e nem estavam previstos no contrato e não têm carácter regular e permanente.”.
A sustentar a alteração invoca o depoimento da testemunha F…, indicando a localização, no tempo, do excerto da gravação que tem como pertinente, assim como invoca os recibos de remunerações.
A Recorrente deu, pois, cumprimento aos requisitos previstos no art. 640º, nºs 1, als. a), b) e c), e 2, al. a), do CPC, pelo que nada obsta à reapreciação da decisão da matéria de facto impugnada, tendo-se procedido à audição dos depoimentos de parte do A. e da testemunha F…, contabilista da Ré empregadora.

2.1. Na fundamentação da decisão da matéria de facto, no que poderá relevar, a 1ª instância referiu o seguinte:
“(…) Por fim, dos recibos de vencimento resulta que o autor recebeu as quantias indicadas a título de gratificação por ata e confirmou que desde sempre recebeu um valor a este título, embora não tenha sido sempre o mesmo valor, com exceção do mês de férias, sendo que não era para compensar quaisquer despesas mas dependia da produção da empresa e, eventualmente, para compensar algum tempo que ficava a mais para acabar o trabalho que estivesse em curso. Por sua vez, a testemunha F… referiu que se tratava de um incentivo à assiduidade e produção que alguns trabalhadores recebiam, todos os meses desde que trabalhassem, para motivar a produtividade e que era reservado todos os anos em ata.”.

2.3. No que se reporta à pretensão mencionada nas als. i) e ii):
Pretende a Recorrente que se dê como provado que i) “No período de 1-6-2012 a 31-05-2013, mais precisamente nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2013, o autor recebeu uma “gratificação para a ata” de montante variável” e, bem assim, que ii) “Estes valores correspondiam a incentivos à melhoria da sua produtividade no exercício das suas funções, da assiduidade e zelo e, ainda, a compensar o sinistrado de custos aleatórios por si suportados
Tais pontos prendem-se com os nºs 1.12 e 1.13 dos factos provados, dos quais consta que:
“1.12. No período de 1-6-2012 a 31-5-2013, mais precisamente nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril e Maio de 2013, o autor auferiu também, como contrapartida do seu trabalho, €99,14 x 11 meses (em média) de outra remuneração regular, sob a designação de “gratificação por ata”, sendo que todos os meses, nos últimos anos, com exceção do mês de férias, o autor recebia uma quantia a este título.”.
“1.13. Estes valores correspondiam a incentivos à melhoria da sua produtividade no exercício das suas funções, da sua assiduidade e zelo”.
Desde logo, há que dizer que o que consta do ponto 1.13 não é posto em causa pela Recorrente, sendo que o que esta pretende é que, ao aí referido, se adite que a prestação em causa visava, também, “compensar o sinistrado de custos aleatórios por si suportados”.
No que se reporta ao período de 01.06.2012 a 31.05.2013, foram juntos pela Ré empregadora [na fase conciliatória do processo e, posteriormente, com a contestação] os recibos de remunerações do A. referentes aos meses de outubro de 2012 a maio de 2013 [foram juntos, também os recibos de janeiro de 2011 a agosto de 2011 e de junho de 2013], recibos esses de onde constam os montantes pagos sob a designação “gratificações p/acta”: em outubro de 2012, €33,64; em novembro de 2012, €127,52 e €22,67 [cfr., quanto a este valor de 22,67, o recibo junto na fase conciliatória], em dezembro de 2012, €134,12; em janeiro de 2013, €127,52; em fevereiro de 2013, €127,52; e, em cada um dos meses de março, abril e maio de 2013, €130,00. Dos concretos montantes, que constam desses recibos e que se apuraram, resultará se os montantes pagos sob essa designação são, ou não, variáveis, sendo que, relativamente, aos meses de maio, junho, julho, agosto e Setembro de 2013 não constam dos autos os recibos respectivos, nem o A., nem a testemunha F… referiram quais os concretos montantes pagos sob essa denominação.
Quanto aos depoimentos, o A. referiu que sempre recebeu uma bonificação da sua retribuição, que era paga conforme a produção e de acordo com o que a Ré empregadora entendia pagar, de valor que variava, sendo às vezes de 40€, 50€ ou 60€ e, confrontado com o facto de, nos recibos de remunerações de outubro de 2012 a maio de 2013, essa verba ser superior, referiu que recebia de modo a que “em folha” totalizasse €660.00. €670,00, mas que “não se lembra bem”.
Do depoimento da testemunha F… resulta que o mesmo não sabia, em concreto, quais os montantes que o A. recebeu sob a designação de “gratificação por ata”, mas referiu que o A. os recebia e que: no final de cada ano, para efeitos fiscais, ficava consignada a previsão de afectação de uma verba para pagamento de gratificações (uma vez que se pagaria menos IRC, desde que a verba fosse no ano seguinte afecta ao pagamento das mesmas); “o Sr. G… é que atribuía em função do funcionário ser um bom funcionário ou não”; que esse pagamento tem a ver com a prestação do trabalho pelo trabalhador, em função do zelo, do cuidado, “se falta ou não falta”; que era atribuída quando o trabalhador trabalhasse efectivamente; “se os ordenados por vezes são um bocado mais baixos, é uma forma que a gerência tem para que as pessoas se sintam com mais vontade, entre aspas, em trabalhar, é gratificá-los”; se o trabalhador “chateasse ou dissesse que não fazia qualquer coisa, ou não trabalhasse ou não andasse motivado, a gerência cortava”, não sabendo todavia se isso teria acontecido com o A.
Quanto ao segmento do ponto 1.12. onde se refere: “(…) como contrapartida do seu trabalho, €99,14 x 11 meses (em média) de outra remuneração regular, (…)”.
Tendo em conta que se encontram juntos aos autos os recibos relativos aos meses de outubro de 2012 a maio de 2013 entende-se que o que deverá ser dado como provado são os valores, acima referidos, mencionados nos recibos de, respectivamente, €33,64, €127,52 e €22,67 [estas em novembro], €134,12, €127,52, €127,52, €130,00, €130,00 e €130,00], que não foram impugnados pelo A., ao invés de se dar como provado o valor médio auferido mensalmente de €99,14. Este há-de decorrer, ou não, dos valores mensais auferidos, valor esse que, aliás, se desconhece como foi alcançado – não é explicitado na p.i., nem na fundamentação da sentença - e não resulta da média que decorre dos valores referidos nos mencionados recibos. Acresce que da prova pessoal produzida (depoimentos do A. e da testemunha F…) nada resulta no sentido de concretizar ou explicar a razão do mencionado valor médio de €99,14.
E é de referir ainda que dos autos não constam os recibos de remunerações relativos aos meses de junho, julho, agosto e Setembro de 2012, desconhecendo-se se o A., nesses meses, auferiu ou não tal prestação e se, porventura, não a auferiu, por que razão tal terá sucedido. E é ainda de esclarecer que, na fase conciliatória do processo, juntamente com os recibos de remunerações, foi junta uma “Conta Corrente Resumida” relativa a 2012 onde, por reporte ao “Sub. Natal”, consta, sob a designação de “Abonos” “Outros”, a quantia de €158,92. Desconhece-se todavia a que se reporta este montante, mormente se se refere, ou não, ao pagamento da “Gratificação P/Acta”, sendo que ele não consta dos recibos de remunerações juntos, nem tal foi explicitado pela prova pessoal produzida em julgamento (nem pelo A. na p.i. ou pela Ré empregadora na contestação). Ora, assim sendo, não se atendeu a tal montante.
Por outro lado, as expressões “como contrapartida do seu trabalho” e “outra remuneração regular” utilizada no ponto 1.12. dos factos provados, tendo em conta que do ponto 1.13. consta a razão do pagamento da prestação em causa [“1.13. Estes valores correspondiam a incentivos à melhoria da sua produtividade no exercício das suas funções, da sua assiduidade e zelo”], tem conotação conclusiva ou valorativa na medida em que há-de resultar, ou não, de se considerar se o que consta do nº 1.13 dos factos provados consubstancia, ou não, “contrapartida do trabalho” e “remuneração regular”, sendo que a regularidade há-de resultar, ou não, da cadência com que é feito o pagamento.
No que se reporta ao excerto “sendo que todos os meses, nos últimos anos, com exceção do mês de férias, o autor recebia uma quantia a este título.”:
Os depoimentos do A. e da testemunha F… não permitem concluir que o A. tivesse, nos “últimos anos”, auferido todos os meses tal prestação, sendo que não concretizaram desde quando a mesma era auferida, referindo apenas genericamente que era paga, com exceção do mês de férias e dos subsídios de férias e de Natal. E, por outro lado e sem maiores concretizações, o A. referiu ter tido um acidente de trabalho em 2011 e que nesse período não a recebeu.
Decorre, todavia, dos recibos de remunerações referentes a janeiro de 2011 a agosto de 2011 [dos autos apenas constam esses recibos e, bem assim, os relativos a outubro de 2012 a maio de 2013, já acima referidos, e o de junho de 2013] decorre que: em cada um dos meses de janeiro e fevereiro de 2011 foi paga a quantia nos mesmos referida sob a designação de «prémio de produção”; de fevereiro de 2011 a agosto de 2011, foram pagos os montantes, variáveis, aí referidos sob a designação de “gratificação por acta”; e em junho de 2013 foi paga a quantia no mesmo referida sob a designação de “gratificação por acta”.
Assim, entende-se que o referido segmento deve ser alterado por forma a dele ficar a constar que: “sendo que, desde data que não se logrou apurar mas, pelo menos, desde janeiro de 2011 a agosto de 2011, o A. auferiu, em janeiro e fevereiro, sob a designação de “prémio produção” as quantias de €40,39 e de €53,65, de março a agosto desse ano, auferiu mensalmente, sob a designação de “gratificação por acta”, as quantias de respectivamente: €64,09, €97,47, €61,95, €74,35, €127,22 e de €68,59 e em junho de 2013 auferiu, sob a designação de “gratificação por acta” a quantia de €130,00.”
No que se reporta à pretensão da Recorrente se dar como provado que a prestação em causa se destinaria ainda “a compensar o sinistrado de custos aleatórios por si suportados” não tem a mesma qualquer fundamento.
Desde logo, tal pretensão tem natureza meramente conclusiva, sendo que passava pela alegação e prova de quais os concretos custos que o A. teria suportado e que esse pagamento visaria compensar, custos esses que não foram, sequer, alegados pela Recorrente na contestação. E à decisão da matéria de facto apenas deverão ser levados factos e não matéria de direito e/ou conclusiva, como decorre do art. 607º, nº 4, do CPC. Acresce que não foi, também, feita qualquer prova de que o pagamento em causa visasse compensar qualquer concreto custo que o A. tivesse tido que suportar, sendo que a testemunha F… não o referiu. O que a mesma referiu foi o que já acima se disse, em consonância com o que foi dado como provado no ponto 1.13. dos factos provados.
Pelo exposto, altera-se o ponto 1.12. dos factos provados que passará a ter a seguinte redacção:
1.12. No período de 1-6-2012 a 31-5-2013, o A. auferiu também, pelo menos nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio de 2013, sob a designação de “gratificação por ata”, as quantias de respectivamente €33,64, €127,52 e €22,67 [estas em novembro], €134,12, €127,52, €127,52, €130,00, €130,00 e €130,00, sendo que, desde data que não se logrou apurar mas, pelo menos, desde janeiro de 2011 a agosto de 2011, o A. auferiu, em janeiro e fevereiro, sob a designação de “prémio produção” as quantias de €40,39 e de €53,65 e, de março a agosto desse ano, auferiu mensalmente, sob a designação de “gratificação por acta”, as quantias de respectivamente: €64,09, €97,47, €61,95, €74,35, €127,22 e de €68,59 e, em junho de 2013 auferiu, sob a designação de “gratificação por acta”, a quantia de €130,00.”

2.4. Quanto à al. iii) que a Recorrente pretende que seja dada como provada:
Pretende a Recorrente que seja dado como provado que “Tais valores não eram pagos sempre, nem eram sempre do mesmo valor, nem foram, nem estavam antecipadamente garantidos pela Ré e não eram devidos por força do contrato de trabalho e nem estavam previstos no contrato e não têm carácter regular e permanente.”.
No que se reporta ao segmento “Tais valores não eram pagos sempre”, tem ele natureza conclusiva, para além de não foi feita prova disso, remetendo-se para o que acima se disse. Se é certo que não se fez, como já se referiu, prova de que hajam sido sempre pagos, daí não resulta a prova do facto contrário, ou seja de que “não eram pagos sempre”. Para além de que nem a Ré concretizou, na contestação, quando foram ou quando não foram pagos, sendo que os recibos de remunerações juntos apenas provam que foram pagos nos meses a que eles se reportam, mas não provam que não hajam sido pagos nos demais meses. E a testemunha F… referiu o que acima se disse, não sabendo, contudo e em concreto, em que meses foi ou não feito o pagamento.
Quanto ao segmento em que se refere “nem eram sempre do mesmo valor” remete-se para o que se disse, sendo que que já foi o ponto 1.12. alterado no sentido de se dar como provado os montantes que, de acordo com o que se logrou apurar, foram pagos.
Quanto ao segmento “nem estavam antecipadamente garantidos pela Ré e não eram devidos por força do contrato de trabalho” consubstancia manifestamente matéria de direito e/ou conclusiva, pelo que não deve constar da decisão da matéria de facto.
Quanto ao segmento “e nem estavam previstos no contrato” desde logo não decorre da prova produzida, nem consta dos autos, que entre o A. e a Ré haja sido celebrado contrato de trabalho escrito de forma a se concluir se a previsão do pagamento dele constaria ou não. Por outro lado, o contrato de trabalho pode ser verbalmente celebrado, para além de que durante a sua execução podem ser acordadas, seja de forma expressa ou tácita alterações ao contrato, não sendo pelo facto de a alteração não ser reduzida a escrito ou o não ser de forma expressa, que se possa dizer que “não estavam previstos no contrato”. Se o empregador, porventura, a partir de determina da altura, passa a pagar determinadas prestações e o trabalhador as recebe não há qualquer razão para se entender que “não estejam previstas no contrato”. Acresce que do depoimento da testemunha F…, pese embora tivesse referido que as prestações em causa não estavam previstas no contrato, fê-lo de forma genérica e conclusiva, não resultando que soubesse o que, em concreto, terá sido acordado entre o A. e a Ré empregadora. A afirmação da testemunha mais não é do que uma conclusão da mesma, quiçá decorrente apenas da circunstância de que a empregadora, no final do ano, consignava “em ata” a afetação de determinada verba para “gratificações” no ano seguinte, do que, todavia, não decorre que, uma vez atribuídas as mesmas, não pudessem elas passar “a fazer parte do contrato”.
Quanto ao segmento “e não têm carácter regular e permanente” é meramente conclusivo; a regularidade ou permanência, ou falta dela, há- de resultar da cadência com que é feito o pagamento da prestação.
Assim, e nesta parte, improcede a impugnação.

2.5. Em conclusão, altera-se o ponto 1.12 dos factos provados, que passará a ter a seguinte redacção:
1.12. No período de 1-6-2012 a 31-5-2013, o A. auferiu também, pelo menos nos meses de Outubro, Novembro e Dezembro de 2012 e Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Maio de 2013, sob a designação de “gratificação por ata”, as quantias de respectivamente €33,64, €127,52 e €22,67 [estas em novembro], €134,12, €127,52, €127,52, €130,00, €130,00 e €130,00, sendo que, desde data que não se logrou apurar mas, pelo menos, desde janeiro de 2011 a agosto de 2011, o A. auferiu, em janeiro e fevereiro, sob a designação de “prémio produção” as quantias de €40,39 e de €53,65 e, de março a agosto desse ano, auferiu mensalmente, sob a designação de “gratificação por acta”, as quantias de respectivamente: €64,09, €97,47, €61,95, €74,35, €127,22 e de €68,59 e, em junho de 2013 auferiu, sob a designação de “gratificação por acta”, a quantia de €130,00.
No mais, mantém-se a decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância.

3. Se a quantia paga ao A. sob a designação de “gratificação por acta” está excluída do conceito de retribuição

Está em causa nos autos saber se as quantias pagas pela Ré empregadora ao A. sob a designação de “gratificação por ata” têm ou não natureza retributiva, defendendo a Recorrente que o não têm tendo em conta, em síntese, a razão da sua atribuição, o não terem o carácter de regularidade/permanência exigível e a variabilidade dos montantes.

3.1. Dispõe o art. 71º da Lei 98/2009, de 04.09 (LAT/2009), que: “1. A indemnização por incapacidade temporária e a pensão por morte e por incapacidade permanente absoluta ou parcial, são calculadas com base na retribuição anual ilíquida normalmente devida ao sinistrado, à data do acidente. 2. Entende-se por retribuição mensal todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios. 3. Entende-se por retribuição anual o produto de 12 vezes a retribuição mensal acrescida dos subsídios de Natal e de férias e outras prestações anuais a que o sinistrado tenha direito com carácter de regularidade. 4. Se a retribuição correspondente ao dia do acidente for diferente da retribuição normal, esta é calculada pela média dos dias de trabalho e a respectiva retribuição auferida pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente. (…)”.
A LAT adota um conceito próprio de retribuição, que é mais amplo do que o do Código do Trabalho de 2009 (arts. 258º e segs), e que, para além do que este considera como retribuição, se centra na regularidade desse recebimento, apenas considerando como não a integrando o que se destine a compensar o sinistrado por custos aleatórios, cabendo ao empregador o ónus de alegação e a prova de que é este o fim da prestação.
Sobre esta questão tem relevância o recente Acórdão do STJ de 31.10.2018, Proc. 359/15.5T8STR.L1.S1, in www.dgsi.pt, onde, a propósito do citado art. 71º, se refere o seguinte:
“Analisados estes dispositivos, decorre dos mesmos que o conceito de retribuição assumido como elemento de base do cálculo da reparação das consequências do acidente não coincide com o conceito de retribuição que emerge dos artigos 258.º e ss. do Código do Trabalho.
Para os efeitos daquele artigo 71.º, são retribuição «todas as prestações recebidas com carácter de regularidade que não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios».
Não se faz apelo à contrapartida da efetiva prestação de trabalho, estando-se antes perante uma noção mais ampla onde cabem todas as prestações recebidas pelo sinistrado que não se destinem a compensar custos aleatórios.
Outro dos elementos que permitem incluir estas prestações na base de cálculo das reparações é o conceito de regularidade.
O conceito de regularidade tem aqui implícita uma dimensão temporal que aponta para a repetição dos pagamentos e a partir daí a dimensão dos rendimentos normalmente auferidos pelo sinistrado.
Importa que na ponderação deste conceito não se esqueça que o que está em causa é a perda da capacidade para o futuro do sinistrado e não a fixação da dimensão de rendimentos devidos ao sinistrado.
Carece, deste modo, de sentido o apelo que a decisão recorrida faz ao critério subjacente ao acórdão desta Secção proferido em 10 de outubro de 2015, consagrado no processo n.º 4156/10.6TTLSB.L1.S1[9].
Neste acórdão estava apenas em causa a consideração da natureza retributiva de uma específica prestação para saber da integração da mesma no cálculo do valor do subsídio de férias e da retribuição de férias.
A jurisprudência aí fixada nada tem a ver com o reflexo da perda da capacidade de ganho do sinistrado e com a sua projeção em termos de rendimentos futuros.
Com efeito, apesar de proferida sobre a norma do artigo 26.º da Lei n.º 100/97, de 13 de setembro, continua inteiramente válida a jurisprudência fixada nesta Secção no acórdão invocado na sentença proferida na 1.ª instância[10], onde a este propósito se referiu o seguinte:
«Por seu turno, o n.º 3 do falado artigo 26.º prescreve deste modo:
“Entende-se por retribuição mensal tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas mensalmente que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
Se este normativo começa por apelar ao critério geral de retribuição – que já alude, ele próprio, à regularidade da prestação – para depois adicionar aquelas prestações regulares que não se destinem a compensar custos aleatórios, é forçoso reconhecer que perfilha um conceito mais abrangente, apenas aludindo, para efeitos de exclusão retributiva, à variabilidade e contingência das prestações.
No domínio da sinistralidade laboral, o que o legislador pretende é compensar o sinistrado pela falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho: assim se compreende que as prestações reparatórias atendam ao “salário médio”, onde se integram todos os valores que a entidade patronal satisfazia regularmente e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida.»
E mais recentemente, embora tendo por base a mesma Lei dos Acidentes de Trabalho, no acórdão proferido por esta Secção em 13/04/2011, proferido no processo n.º 216/07.9TTCBR.C1.S1 de que foi extraído, o seguinte sumário: «I- Conforme resulta do nº 3 do artigo 26º da Lei 100/97 de 13 de Setembro, constitui retribuição, para efeito de acidentes de trabalho, tudo o que a lei considera como seu elemento integrante e todas as prestações recebidas que revistam carácter de regularidade e não se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios.»[11]
Neste contexto, o subsídio de prevenção auferido pelo sinistrado durante 7 meses no ano anterior ao do acidente tem natureza retributiva para os efeitos dos n.ºs 1, 2, e 3 do artigo 71.º da Lei n.º 98/2009 e, como tal, deve ser tomado em consideração no cálculo das pensões e indemnizações ali previstas.”
E, bem assim, o Acórdão desta Relação de 01.12.2014, Processo 166/09.4TTOAZ.P1, in www.dgsi.pt, cujas considerações, ainda que no âmbito do art. 26º da antecedente Lei 100/97, são aplicáveis também no âmbito da actual LAT, aresto esse onde se refere, para além do mais, o seguinte:
“Este artigo 26.º da L.A.T. adopta um conceito de retribuição que, aproximando-se, num primeiro momento, do conceito genérico vertido no artigo 249.º do Código do Trabalho de 2003, acaba por nele integrar, num segundo momento, todas as prestações que assumam carácter de regularidade, perfilhando um conceito mais abrangente que apenas alude, para efeitos de exclusão retributiva, ao destino aleatório das prestações. O legislador conferiu particular atenção ao elemento periodicidade ou regularidade no pagamento ao dispor que por “retribuição mensal” se entende "todas as prestações recebidas com carácter de regularidade", acrescentando expressamente que esta “não” abarca as prestações regulares que “se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios”.
Deixou pois a LAT de fazer remissão para os critérios da lei geral (como sucedia no âmbito da Base XXIII da Lei nº 2127, de 3 de Agosto de 1965, em que o legislador começava por definir retribuição através de uma remissão genérica para "tudo o que a lei considere como seu elemento integrante"), mas continuou a conferir especial atenção ao elemento da regularidade no pagamento.
E exceptua agora expressamente do conceito as prestações que se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios que tenha que suportar por causa do trabalho, (…)”.
A característica essencial da retribuição que a LAT releva – marcada apenas pela regularidade da sua percepção e com a excepção das prestações destinadas a compensar custos aleatórios – assinala a medida das expectativas de ganho do trabalhador e, por essa via, confere relevância ao nexo existente entre a retribuição e as necessidades pessoais e familiares do mesmo.
Bem se compreende que assim seja.
Procurando-se com as indemnizações ou pensões fixadas na sequência de um acidente de trabalho, compensar o trabalhador da falta ou diminuição da sua capacidade laboral e, consequentemente, da falta ou diminuição dos rendimentos provenientes do trabalho, lógico é que, para o cálculo daquelas indemnizações ou pensões, se atenda a todas as prestações que o empregador satisfazia e em função das quais o trabalhador programava regularmente a sua vida (por não serem desde logo absorvidas em custos aleatórios).
Só não deverão contabilizar-se neste módulo retributivo assinalado essencialmente pela medida das expectativas de ganho do trabalhador aquelas prestações que, na palavra do artigo 26.º da LAT de 1997, se destinem a compensar o sinistrado por custos aleatórios, (…)”.
E também o Acórdão desta Relação de 24.09.2012, Proc. 1654/10.5TTPRT.P1, in www.dgsi.pt, de cujo sumário consta:
“I – O conceito de retribuição, para efeitos de acidente de trabalho, abarca todas as atribuições patrimoniais feitas pelo empregador ao trabalhador, com carácter de regularidade e desde que não se destinem a cobrir custos aleatórios, sendo mais lato que o estabelecido no Código do Trabalho.
II – Assim pagando o empregador ao trabalhador uma quantia que denominou de “prémio de gratificação balanço”, em 8 ou em 12 meses, durante cada ano, tal atribuição integra a retribuição para efeitos de acidente de trabalho, dada a regularidade do seu pagamento e a falta de prova de que tais quantias se destinavam a satisfazer custos aleatórios, independentemente da alegação de que se trataria de distribuição de dividendos, do seu carácter de liberalidade ou outro.”

3.2. No caso, da matéria de facto provada decorre que o A. sofreu o acidente de trabalho em causa nos autos aos 18.06.2013 e que, no ano anterior ao mesmo, ou seja, de junho de 2012 a maio de 2013, recebeu, pelo menos em 8 meses, uma prestação denominada “gratificação p/ata”, nos montantes indicados no ponto 1.12. dos factos provados.
Mais resulta que o pagamento de tai prestação visava incentivar a sua produtividade, assiduidade e zelo (nº 1.13 dos factos provados).
Ora, assim sendo, estava tal prestação directamente ligada ou relacionada com o exercício, e com a forma desse exercício, da actividade profissional do A., sendo que foi recebida em, pelo menos, 8 dos 12 meses anteriores ao acidente, não podendo, para efeitos da LAT, deixar de ser considerada como regularmente auferida, para além de que não visava compensar o A. de qualquer custo aleatório que o mesmo tivesse que suportar, custos esses que aliás nem foram concretizados pela Ré na contestação e que não se provaram. Tem, pois, tal prestação, natureza retributiva.
E a isso não obsta que a prestação seja de valor variável, sendo que a própria LAT/2009 prevê, no art. 71º, nº 4, essa situação, ao dispor que “4. Se a retribuição correspondente ao dia do acidente for diferente da retribuição normal, esta é calculada pela média dos dias de trabalho e a respectiva retribuição auferida pelo sinistrado no período de um ano anterior ao acidente”.
Improcedem, assim, as conclusões do recurso.

4. Não obstante, e como referido a propósito da reapreciação da decisão da matéria de facto, constata-se que, dos valores referidos pelo A. nos 12 meses anteriores ao acidente sob a designação de “gratificação para ata”, não decorre que a sua média seja a de €99,14 mensais, este o valor considerado na sentença para efeitos de cálculo das reparação decorrente do acidente de trabalho em apreço, desconhecendo-se como ou por que razão, seja na petição inicial, seja na sentença recorrida, se alcançou tal valor já que tal não é explicitado.
Ora, tendo em conta os 12 meses que antecederam a data do acidente, ou seja, o período de junho de 2012 a maio de 2013 e os valores que, nesse período, foram auferidos pelo A. referidos no ponto 1.12. dos factos provados, temos que, nesse período, o A. auferiu o montante global de €962,99, pelo que a média mensal a atender é a €80,25 [€962,99 / 12] e, o montante anual, o €882,75 [€80,25 x 11 meses] [na sentença considerou-se, como montante anual dessa prestação, o auferido em 11 meses, excluindo pois, o mês de férias e os subsídios de férias e de Natal, o que não foi posto em causa no recurso, para além do que corresponde ao que o A. alegou na petição inicial].
Ou seja, o A. auferia a retribuição anual total de €9.880,05 [(545x14)+(124,30 x 11)+(80,25 x 11)].
Na sentença recorrida considerou-se que a responsabilidade da Ré empregadora se encontrava transferida para a Ré seguradora com base na retribuição anual de €9.069,00 (montante aceite na contestação), o que não é posto em causa no recurso.
Ora, assim sendo, é a Ré empregadora responsável, nos termos do art. 79º, nº 4, da LAT/2009, pela reparação devida com base na diferença, ou seja, com base na retribuição anual de €811,05 [9.880,05 – 9.069,00], assim se impondo a reformulação do cálculo das prestações devidas ao A. a cargo da Ré empregadora (na sentença teve-se em conta, na parte desta, a retribuição anual de €1.018,84).
O A., em virtude de tais lesões sofridas no acidente, esteve afectado:
- de incapacidade temporária absoluta (ITA), de 4-4-2014 a 5-4-2015 (368 dias), pelo que, a este título e nos termos do art. 48º, nº 3, al. d), da LAT/2009, tem direito a receber da Ré empregadora a indemnização de €572,74 [(811,05 x 70% quanto aos primeiros 12 meses) + (811,05 / 365 dias x 75% relativamente ao período subsequente x 3 dias)].
- de incapacidade temporária parcial (ITP) de 30%, de 20-8-2013 a 3-4-2014 (227 dias), pelo que, a este título e nos termos do art. 48º, nº 3, al. e), da LAT/2009, tem direito a receber a indemnização de €105,93 [811,05 / 365 x 30% de ITP x 70% x 227 dias]
- de incapacidade temporária parcial (ITP) de 10%, de 19-6-2013 a 19-8-2013 (62 dias), pelo que, a este título e nos termos do citado art. 48º, nº 3, al. e), da LAT/2009, tem direito a receber a indemnização de €9,64 [811,05 / 365 x 10% de ITP x 70% x 62 dias].
Ou seja, a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária, absoluta e parcial, tem o A. direito a receber a quantia global de €688,31.
Da matéria de facto prova decorre que o A., em consequência do acidente, ficou afetado da IPP de 25,92%, sendo que a data da alta definitiva (consolidação médico-legal das lesões) ocorreu a 05.04.2015. Assim, tem o A. direito, nos termos dos arts. 48º, nº 3, al. c), da LAT/2009 e com efeitos a partir de 06.04.2015, ao capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de €147,16 [811,05 x 70% x 25,92%].
No mais, e que não foi impugnado no recurso, designadamente quanto à condenação nos juros de mora sobre as quantias em dívida pela Ré empregadora, mantém-se o decidido na sentença.
***
IV. Decisão
Em face do exposto, acorda-se em conceder parcial provimento ao recurso, em consequência do que se decide revogar a sentença recorrida na parte em que condenou a Ré, D…, SA, a pagar ao A., B…, a quantia de €864,64 a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária e, bem assim, o capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de €184,86, a qual é substituída pelo presente acórdão em que se decide condenar a mencionada Ré a pagar ao Autor:
A. A quantia de €688,31 a título de indemnização pelos períodos de incapacidade temporária, acrescida de juros de mora nos termos fixados na sentença recorrida;
B. O capital de remição correspondente à pensão anual e vitalícia de €147,16, acrescida de juros de mora nos termos fixados na sentença recorrida.
No mais impugnado no recurso, nega-se-lhe provimento, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente, na proporção do decaimento, sendo que o A./Recorrido delas se encontra isento (artº 4º nº 1 al. h) do RCP)

Porto, 29.04.2019
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha (tem voto de concordância do 1ºadjunto, Sr. Dr. Rui Penha, mas porque não assina por não estar presença, conforme o artigo 133, n.º1 do C.P.C.)
Jerónimo Freitas
_______________
[1] A numeração, na matéria de facto provada, bem a introdução das alíneas, na matéria de facto não provada, é da nossa autoria, uma vez que não constam da decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância.