Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
95961/13.8YIPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: INJUNÇÃO
ARTICULADOS
EXCEPÇÕES
FALTA DE IMPUGNAÇÃO
CONTRADITÓRIO
COMPENSAÇÃO
Nº do Documento: RP2015022395961/13.8YIPRT.P1
Data do Acordão: 02/23/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A injunção de valor inferior à alçada do Tribunal da Relação, após deduzida a oposição, segue o procedimento previsto para as acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias, comportando apenas dois articulados: a petição inicial e a contestação.
II - Deduzida na contestação a excepção de compensação e o cumprimento defeituoso, em obediência ao princípio do contraditório plasmado no artigo 3.º, n.º 4, do CPCivil, pode a Autora responder-lhe oralmente no início da audiência de discussão e julgamento.
III - Fora dos casos previstos (artigo 584.º), no actual CPCivil desapareceu o articulado réplica como o articulado normal de resposta às excepções deduzidas na contestação, a não ser que se defenda que é possível que o juiz convide a parte a apresentar um terceiro articulado, ao abrigo do princípio da adequação formal (artigo 547.º do CPCivil).
IV - Não obstante a inexistência de tal articulado, há que conjugar o disposto no artigo 3.º, n.º 4, com os artigos 572.º al. c) e 587.º, n.º 1 do CPCivil, não tendo este último deixado de prever que “A falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu”, seja na audiência prévia, caso haja lugar a esta, seja no início da audiência final, tem o efeito previsto no artigo 574.º do mesmo diploma (admissão por acordo dos factos não impugnados), sob pena de os referidos normativos ficarem esvaziados de conteúdo.
V - E, se isso é assim para o processo declarativo comum deixa de se poder utilizar o argumento decorrente do artigo 505.º do anterior CPCivil (falta de apresentação de articulado quando este é admissível ou a falta de impugnação nele dos novos factos) para os processos especiais no âmbito dos quais estejam previstos apenas também dois articulados e, em concreto, para o procedimento de injunção.
VII - Razão pela qual o estatuído pelo legislador no artigo 3.º, nº 4 do CPCivil, não pode ser visto apenas como uma faculdade que a parte pode usar ou não, sem que daí decorram quaisquer efeitos cominatórios, antes tem de ser visto como sendo o momento processual que o legislador deferiu à parte para responder às excepções deduzidas com o último articulado, sob pena de se verificarem os efeitos decorrentes da falta do ónus de impugnação.
VIII - No actual CPCivil parece resultar que a compensação de créditos deve ser sempre objecto de um pedido reconvencional, uma vez que a compensação ultrapassa a mera defesa, sendo uma pretensão autónoma, ainda que não exceda o montante do crédito reclamado pelo autor.
IX - O recurso à compensação, postula, como sucede no direito substantivo, o reconhecimento de um crédito, ao qual se opõe um contra-crédito, pelo que, a parte respectiva, não pode pretender a compensação se nega a existência do crédito invocado pelo autor.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 95961/13.8YIPRT.P1-Apelação
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto 3º Juízo Cível
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Caimoto Jácome
2º Adjunto Des. Macedo Domingues
Sumário:
I- A injunção de valor inferior à alçada do Tribunal da Relação, após deduzida a oposição, segue o procedimento previsto para as acções especiais para cumprimento de obrigações pecuniárias, comportando apenas dois articulados: a petição inicial e a contestação.
II- Deduzida na contestação a excepção de compensação e o cumprimento defeituoso, em obediência ao princípio do contraditório plasmado no artigo 3.º, n.º 4, do CPCivil, pode a Autora responder-lhe oralmente no início da audiência de discussão e julgamento.
III- Fora dos casos previstos (artigo 584.º), no actual CPCivil desapareceu o articulado réplica como o articulado normal de resposta às excepções deduzidas na contestação, a não ser que se defenda que é possível que o juiz convide a parte a apresentar um terceiro articulado, ao abrigo do princípio da adequação formal (artigo 547.º do CPCivil).
IV- Não obstante a inexistência de tal articulado, há que conjugar o disposto no artigo 3.º, n.º 4, com os artigos 572.º al. c) e 587.º, n.º 1 do CPCivil, não tendo este último deixado de prever que “A falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu”, seja na audiência prévia, caso haja lugar a esta, seja no início da audiência final, tem o efeito previsto no artigo 574.º do mesmo diploma (admissão por acordo dos factos não impugnados), sob pena de os referidos normativos ficarem esvaziados de conteúdo.
V- E, se isso é assim para o processo declarativo comum deixa de se poder utilizar o argumento decorrente do artigo 505.º do anterior CPCivil (falta de apresentação de articulado quando este é admissível ou a falta de impugnação nele dos novos factos) para os processos especiais no âmbito dos quais estejam previstos apenas também dois articulados e, em concreto, para o procedimento de injunção.
VII- Razão pela qual o estatuído pelo legislador no artigo 3.º, nº 4 do CPCivil, não pode ser visto apenas como uma faculdade que a parte pode usar ou não, sem que daí decorram quaisquer efeitos cominatórios, antes tem de ser visto como sendo o momento processual que o legislador deferiu à parte para responder às excepções deduzidas com o último articulado, sob pena de se verificarem os efeitos decorrentes da falta do ónus de impugnação.
VIII- No actual CPCivil parece resultar que a compensação de créditos deve ser sempre objecto de um pedido reconvencional, uma vez que a compensação ultrapassa a mera defesa, sendo uma pretensão autónoma, ainda que não exceda o montante do crédito reclamado pelo autor.
IX- O recurso à compensação, postula, como sucede no direito substantivo, o reconhecimento de um crédito, ao qual se opõe um contra-crédito, pelo que, a parte respectiva, não pode pretender a compensação se nega a existência do crédito invocado pelo autor.
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I-RELATÓRIO
Acordam no Tribunal da Relação do Porto:
B…, S.A.”, com sede no …, Maia intentou a presente acção destinada a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergente de contrato (injunção) contra C…, residente na Rua …, nº …, Porto, pedindo a condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de € 9.918,65, acrescida de Juros vencidos no montante de € 159,13 e vincendos até efectivo e integral pagamento à taxa legal.
Alega para o efeito e em síntese que contratou com o Réu serviços de telecomunicações. Acontece que, tendo o Réu utilizado referidos serviços, emitidas as facturas correspondentes, ainda não pagou algumas delas além de não ter respeitado o período de fidelização a que se obrigou.
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O Réu tendo deduzido oposição, defendeu-se invocando a nulidade da denominada “Cláusula de Fidelização” por violação por parte da Autora do dever de informação, o cumprimento defeituoso do contrato por parte desta e ainda a compensação.
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Realizou-se audiência de discussão e julgamento, com observância das formalidades legais.
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A final foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a presente acção e consequentemente absolveu o Réu do pedido.
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Não se conformando com o assim decidido veio a Autora interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
1. Decidiu o tribunal a quo pela improcedência da acção;
2. No entanto, constando da sentença ter ficado “…demonstrado que a Autora é titular dum crédito sobre o Réu referente a serviços não pagos, de €1517,58”, deveria, desde logo, ter julgado o pedido da Apelante parcialmente procedente, no montante de €1517,58, a título de facturas, acrescido dos correspondentes juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento até efectivo e integral pagamento;
3. Foi admitida, pelo tribunal a quo, a excepção de compensação;
4. Porém, atendendo à natureza do crédito invocado pelo Apelado, que alegou “prejuízos deverão ser objecto de indemnização” (cfr. art.º 34º da oposição) e “chegou mesmo a deixar de realizar alguns negócios” (cfr. art.º 31 da oposição), tal configura uma situação de responsabilidade civil contratual ou obrigacional derivada da violação de uma obrigação, ou seja, atribuiu à Apelante não uma obrigação de prestar, mas um dever de indemnizar;
5. Os factos articulados pelo Apelado não configuram, por isso, um direito de crédito nessa altura exigível, carecendo de ser judicialmente reconhecido por via da verificação do ilícito contratual culposo, do dano e do nexo de causalidade entre este e aquele;
6. Deste modo, não se encontrava preenchido o requisito de ordem substantiva de funcionamento da compensação previsto no art.º 847º, n.º 1, alínea a) do CC, pelo que não poderia o tribunal recorrido tê-la admitido;
7. Foi julgada admitida por acordo a matéria das excepções invocadas na oposição, porque a “…Autora não quis (expressamente) tomar posição quanto aquelas questões..”;
8. Não foi, por isso, relativamente às excepções de cumprimento defeituoso e compensação, considerada a prova produzida em audiência de julgamento, mas assumiu-se terem sido confessadas;
9. No entanto, a sentença recorrida é ambígua e ininteligível, porque não concretiza se a falta de tomada de posição, pela Apelante, foi no início da audiência ou durante a audiência;
10. Na hipótese do tribunal a quo se ter referido ao início da audiência, a ausência de pronúncia sobre as excepções, por parte da Apelante, não determinaria a confissão, uma vez que o que resulta do art.º 3º, n.º 4 é uma faculdade e não um ónus; e seguindo os autos o regime das acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias, caracterizado por dois articulados, o ónus de impugnação especificada previsto no artigo 574º, n.º 2, do CPC não tem aplicação aos casos em que a excepção tenha sido deduzida no último articulado legalmente admissível, nem se aplica o artigo 587º do CPC, reservado às situações em que existe articulado de resposta (réplica);
11. Pelo que, no início da audiência de julgamento, não se tendo pronunciado, a Apelante não confessou;
12. No início da audiência de julgamento, não se tendo pronunciado, a Apelante declarou - tomando, por isso, posição - ““…que não houve um cumprimento defeituoso, houve uma prestação de serviços que não foi paga e, por isso, procedeu à desactivação …” (gravação de dia 12.11.2013 - 09:55:37 às 09:56:13);
13. Durante a audiência a Apelante tomou posição sobre as excepções: por requerimentos juntos aos autos em 17.12.2013 e 01.03.2014, na inquirição das testemunhas, nas alegações;
14. Não poderia, por isso, a sentença recorrida tomar como pressuposto a confissão das excepções, a não “tomada de posição” pela Apelante, uma vez que (i) a Apelante tomou posição sobre as excepções na audiência (ii) e a ausência de pronúncia no início da audiência constitui uma faculdade, não lhe correspondendo efeito cominativo;
15. Existiu, porém, uma confissão, que o tribunal a quo deveria ter considerado, e não o fez: a que resulta da alegação do Apelado, quando invocou a compensação do seu, suposto, crédito de €5000,00 no valor que fosse condenado a pagar;
16. Não admitindo as acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias deduzir reconvenção, tendo sido invocado, como excepção peremptória, um crédito e a sua compensação, constitui pressuposto de invocação da referida excepção a admissão, pelo Apelado, da sua dívida à Apelante em montante não inferior a €5000,00, confissão que deveria ter sido considerada;
17. Tal determina a impugnação da matéria de facto, por se ter considerado, indevidamente, a confissão da Apelante e, indevidamente, não se ter considerado a confissão do Apelado;
18. Relativamente à matéria de facto considerada provada na sentença recorrida, porque não se verifica o pressuposto da confissão que a determinou, deverá a mesma ser alterada, (i) passando a constarem, como não provados, os pontos 6 a 12 dos factos provados, relativos à excepção de cumprimento defeituoso (ii) constarem, como não admitidos, os pontos 13 a 22 dos factos provados relativos à compensação, ou não provados, em função da decisão relativa à excepção de cumprimento defeituoso;
19. Deverá integrar o elenco dos factos provados a confissão de dívida que resulta da excepção de compensação que o Apelado deduziu, em igual montante ao crédito que invocou;
20. Ainda que o tribunal recorrido não tenha atendido à prova produzida na decisão sobre as excepções, as partes tiveram oportunidade de produzir prova, sendo certo que cabia ao Apelado o ónus de provar os factos constitutivos do direito que alegou (art.º 342º do CC);
21. Em relação à excepção de cumprimento defeituoso: (i) não foram juntos pelo Apelado documentos que o provassem; (ii) a Apelante provou, por documentos e através da sua testemunha, que prestou o serviço sem falhas e que o serviço foi, efectivamente utilizado; (iii) como decorre da transcrição das gravações, a testemunha do Apelado, seu funcionário, assumiu não ter conhecimento directo dos factos e nada concretizou; (iv) não foram inquiridos clientes e /ou fornecedores do Apelado que tenham testemunhado ter-se apercebido de qualquer corte ou falha nas comunicações e se lhes foram ou não explicados os motivos dessas falhas e a quem eram imputáveis;
22. Em relação à excepção de compensação, sempre careceria da prova do seu pressuposto, que não foi feita;
23. Ainda que tivesse sido feita prova do cumprimento defeituoso e a compensação preenchesse os requisitos legais para ser deduzida, também não foi provada: (i) não foi junto qualquer documento que provasse e discriminasse prejuízos; (ii) nenhum documento que demonstrasse os rendimentos do Apelado no período do contrato, por contraposição com os auferidos em períodos anteriores; (iii) não foram inquiridos clientes e /ou fornecedores do Apelado que tenham testemunhado ter deixado de contratar com o Apelado ou existido qualquer impacto negativo na sua imagem comercial no referido período; (iv) a testemunha do Apelado, como resulta das gravações, não só não concretizou prejuízos, como fez a contraprova do que o Apelado alegou, declarando terem existido prejuízos por diminuição das encomendas a uma empresa que o ofício da Autoridade Tributária e Aduaneira confirmou não declarar rendimentos desde 2010.
De tudo quanto ficou exposto, resulta que, a decisão proferida nos presentes autos:
- é nula, por ausência de especificação do momento processual, na parte em que considerou que a “…Autora não quis (expressamente) tomar posição quanto aquelas questões..”;
- deverá ser corrigida, por lapso manifesto, na parte em que admitiu um crédito da Apelante, mas julgou a acção totalmente improcedente;
- carece de fundamento e violou os art.ºs 196º e 193º, n.º 3, ambos, do CPC, e o art.º 847º, n.º 1 do CC, por ausência do requisito para admissão da excepção de compensação;
- carece de fundamento e violou o art.º 3º, n.º 4 do CPC, que estabelece uma faculdade e não uma cominação por ausência de pronúncia;
- carece de fundamento e violou o art.º 574º, n.º 2º do CPC, relativamente à compensação, uma vez que, não sendo possível deduzi-la, por ausência do requisito substantivo a que se reporta o artigo 847º, n.º 1, alínea a), do Código Civil, não seria admissível a confissão;
- carece de fundamento o elenco de 06 a 22 da matéria de facto considerada provada;
- deveria ter atendido à (ausência de) prova que consta dos autos na decisão relativa às excepções, julgando-as improcedentes, pelo que violou o art.º 342º do CC;
- violou os art.ºs 352º ss do CC, ao não ter considerado a confissão que decorre da dedução, pelo Apelado, da excepção de compensação.
Deverá, pois, a decisão proferida ser declarada nula, ser rectificada e substituída por outra que julgue
(i) improcedente, por não provada, a excepção de cumprimento defeituoso;
(ii) inadmissível ou improcedente, por não provada, a excepção de compensação,
(iii) parcialmente procedente o pedido da Apelante, sendo o Apelado condenado:
- no montante de €5000,00, acrescido de juros de mora desde a data da notificação da injunção, considerando a confissão que decorre da dedução da excepção da compensação;
- ou, sem prescindir, no montante de €1517,58, a título de facturas, acrescido dos correspondentes juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento até efectivo e integral pagamento, considerando o reconhecimento, pela sentença recorrida, de que ficou demonstrado que a Autora é titular dum crédito sobre o Réu referente a serviços não pagos, de €1517,58.
Nestes termos e nos demais de direito, que doutamente se suprirão, deve ser concedido provimento ao presente recurso, revogando-se a decisão recorrida.
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Não foram apresentadas contra-alegações.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são duas as questões que importa apreciar:

a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.
b)- decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual e, mesmo não se alterando esta, se a subsunção jurídica se encontra correctamente feita.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1. A Autora celebrou com o requerido, de acordo com proposta por este assinada, um contrato de prestação de bens e serviços de telecomunicações, datada de 31.10.2012 e com o n° ………..
2. Após a recepção da proposta, a Autora entregou equipamentos ao Réu, activou e prestou serviços, que o Réu utilizou, tem emitido as facturas correspondentes.
3. Tais facturas foram enviadas ao réu e permanecem em divida as facturas:- Factura n° ………..212, emitida em 07.12.2012, no valor de € 608,43, vencida em 27.12.2012 e de que permanecem em dívida €380,57;- Factura n° ………..113, emitida em 07.01.2013, no valor de €435,86, vencida em 27.01.2013; - Factura n° ………..213, emitida em 07.02.2013, no valor de €367,57, vencida em 27.02.2013; — Factura n° ………..313, emitida em 06.03.2013, no valor de € 333,56, vencida em 26.03.2013;- Factura n° ……….413, emitida em 05.04.2013, no valor de € 8.401,07, vencida em 25.04.2013;
4. Não foi entregue ao Réu cópia escrita da proposta subscrita pelo Réu;
5. Não foi remetida cópia do contrato contendo as condições contratuais associadas à proposta que o Réu formulou junto do agente da Autora.
6. Iniciada a prestação de serviços, constatou-se que as condições de acesso à internet eram praticamente nulas, o que impedia o Réu de utilizar o seu ‘IPad”.
7. O mesmo sucedendo com o número de telecomunicações móveis.
8. As falhas de ambos os cartões (de internet e de telecomunicações) eram sucessivas;
9. A partir de Novembro de 2012, o Réu começou a ficar dois ou três dias sem conseguir aceder à internet e sem lograr estabelecer qualquer comunicação móvel.
10. Depois de apresentar reclamação, os acessos e as comunicações eram restabelecidos, após o que algum tempo depois ficavam novamente indisponíveis.
11. Passavam-se dias sem que o Ré tivesse acesso às comunicações.
12. O acesso à internet era também intermitente;
13. Tais dificuldades prejudicaram a actividade profissional do Réu que dependia quase exclusivamente duma ligação fiável e rápida à internet e que se desenvolvia, em grande medida, mediante a utilização da rede móvel de comunicações.
14. O Réu mantém uma actividade de produção e organização de congressos médicos para o que dispunha duma estrutura muito reduzida em termos de instalações e de pessoal.
15. Toda a logística relacionada com a parte operacional da produção e organização dos eventos era tratada mediante o recurso exclusivo à internet e através de contactos telefónicos.
16. Em resultado das dificuldades e das limitações supra, o Réu deixou de realizar alguns negócios.
17. O Réu reportou todas estas dificuldades e inoperâncias, por inúmeras vezes, junto da Autor e do seu agente.
18. A resposta que obtinha era que a situação se iria resolver e que as dificuldades desapareceriam num curtíssimo prazo.
19. Todas as situações relatadas provocaram ao Réu perda de prestígio e uma clara diminuição da sua consideração e imagem junto de alguns clientes.
20. Alguns clientes hesitaram em contratar novamente os serviços do Réu.
21. Em face da inoperacionalidade do seu número móvel, o Réu chegou mesmo a deixar de realizar alguns negócios.
22. O que provocou prejuízos ao Réu no montante de € 5.000,00;
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III. O DIREITO

Pese embora quer no corpo alegatório quer nas alegações recursivas a Autora apelante tenha disposto as questões a decidir por diferente ordem cronológica, pensamos, todavia, que a primeira que deve ser por nós apreciada se prende com:

a)- a decisão da matéria de facto.

Efectivamente, a decisão de tal questão poderá influenciar, como nos parece evidente, na resposta a dar às restantes questões colocadas no recurso.
Tendo como desiderato o pagamento da quantia titulada pelas facturas que indicou, a apelante apresentou a presente Injunção, a qual configura um dos procedimentos especiais, destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 30.000,00 (cfr. artigo 1.º do diploma preambular-Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro). [1]
Esta providência especial tem por finalidade conferir força executiva ao requerimento destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a 30.000,00€, ou das obrigações emergentes das transacções comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de Fevereiro[2], independentemente do valor (cfr. artigo 7.º do anexo ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro).
No caso em apreço atendo o valor da causa (€ 10.285,78) e o facto de não se tratar de obrigações emergentes das transacções comerciais nos termos definidos pelos artigos 2.º e 3º do citado D. Lei 32/2003, estamos, perante um procedimento especial de injunção.
Como decorrente dos autos o requerido deduziu oposição.
Ora, estatui o artigo 16.º, nº 1 do D. Lei 269/98 que, “Deduzida oposição ou frustrada a notificação do requerido, no caso em que o requerente tenha indicado que pretende que o processo seja apresentado à distribuição, nos termos da alínea j) do n.º 2 do artigo 10.º, o secretário apresenta os autos à distribuição que imediatamente se seguir”.
Foi o que aconteceu no caso dos autos em que o requerimento e oposição foram enviados à distribuição em 12-09-2013.
Como assim, nos termos plasmados no artigo 17.º, nº 1 do citado D. Lei 269/98 após a distribuição seguem-se, com as necessárias adaptações, o disposto no nº 4 do artigo 1º e nos artigos 3.º e 4º.
De harmonia com a previsão dos artigos 1.º a 4.º do anexo ao Regime dos Procedimentos a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular ao Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de Setembro, estamos perante um processo especial que se desenrola nos termos ali definidos, dos quais se realça:
“Artigo 1.º
Petição e Contestação
1 - Na petição, o autor exporá sucintamente a sua pretensão e os respectivos fundamentos (…).
2 - O réu é citado para contestar no prazo de 15 dias, se o valor da acção não exceder a alçada do tribunal de 1.ª instância, ou no prazo de 20 dias, nos restantes casos.
3 - A petição e a contestação não carecem de forma articulada (…). 4 - O duplicado da contestação será remetido ao autor simultaneamente com a notificação da data da audiência de julgamento.
Artigo 2.º
Falta de contestação
“Se o réu, citado pessoalmente, não contestar, o juiz, com valor de decisão condenatória, limitar-se-á a conferir força executiva à petição, a não ser que ocorram, de forma evidente, excepções dilatórias ou que o pedido seja manifestamente improcedente”.
Artigo 3.º
Termos posteriores aos articulados
1 - Se a acção tiver de prosseguir, pode o juiz julgar logo procedente alguma excepção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer ou decidir do mérito da causa.
2 - A audiência de julgamento realiza-se dentro de 30 dias, não sendo aplicável o disposto nos n.os 1 a 3 do artigo 155.º do Código de Processo Civil às acções de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª instância.
(…)
4 - As provas são oferecidas na audiência, podendo cada parte apresentar até três testemunhas, se o valor da acção não exceder a alçada do tribunal de 1.ª instância, ou até cinco testemunhas, nos restantes casos.
(…).
Artigo 4.º
Audiência de julgamento
1 - Se as partes estiverem presentes ou representadas, o juiz procurará conciliá-las; frustrando-se a conciliação, produzem-se as provas que ao caso couber.
2 - Não é motivo de adiamento a falta, ainda que justificada, de qualquer das partes e, nas acções de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, também a dos seus mandatários.
3 - Nas acções de valor superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, em caso de adiamento, a audiência de julgamento deve efectuar-se num dos 30 dias imediatos, não podendo haver segundo adiamento.
4 - Nas acções de valor não superior à alçada do tribunal de 1.ª instância, quando as partes não tenham constituído mandatário judicial ou este não comparecer, a inquirição das testemunhas é efectuada pelo juiz.
5 - Se ao juiz parecer indispensável, para boa decisão da causa, que se proceda a alguma diligência, suspenderá a audiência na altura que reputar mais conveniente e marcará logo dia para a sua realização, devendo o julgamento concluir-se dentro de 30 dias; a prova pericial é sempre realizada por um único perito.
6 - Finda a produção de prova, pode cada um dos mandatários fazer uma breve alegação oral.
7 - A sentença, sucintamente fundamentada, é logo ditada para a acta.
Destas disposições legais aplicáveis ao processo especial em apreço, ressalta de imediato a respectiva semelhança com o regime da acção sumaríssima que lhe serviu de modelo, conforme o legislador anunciou no preâmbulo do diploma.
Tratando-se de um processo especial, aplica-se apenas aos casos expressamente previstos na lei e rege-se pelas disposições que lhe são próprias e pelas disposições gerais e comuns; em tudo o que não estiver prevenido numas e noutras, observar-se-á o que se acha estabelecido para o processo ordinário–artigos 546.º, nº 2 e 549.º, nº 1 ambos do CPCivil anterior[3].
Como vimos, na previsão da tramitação deste processo especial, a lei apenas prevê a existência de dois articulados: a petição inicial e a contestação, não prevendo a réplica, nem sequer a resposta à contestação.
Assim sendo, a questão que agora se coloca é se, nos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias de valor inferior à alçada da Relação, em que na oposição o requerido se defenda por excepção, o requerente pode ou não responder a essa matéria em articulado próprio.
Ora, em face do regime adjectivo expressamente previsto neste procedimento especial, em nosso entender, a resposta não pode deixar de ser negativa.
De facto, o procedimento em apreço reduz-se a dois articulados (petição e contestação) notificando-se a contestação ao autor apenas com a notificação da data para realização da audiência de julgamento, razão pela qual se deve concluir que não há lugar ao articulado de resposta à contestação.[4]
Este entendimento já era o defendido no domínio do processo sumaríssimo, no âmbito do qual é maioritariamente aceite que não é admissível a reconvenção e não há lugar a resposta às excepções deduzidas na contestação.[5]
E, cremos, que é o único que nos parece curial defender em face das regras de interpretação da lei consagradas no artigo 9.º do Código Civil[6], não podendo ser-lhe atribuído um sentido que esvazie de conteúdo a intenção do legislador.
Assim, não pode considerar-se que a ausência de menção neste procedimento especial à possibilidade de articulado de resposta à contestação configura uma lacuna a integrar por aplicação das disposições gerais e comuns, sendo antes uma clara intenção do legislador de simplificar o processado e encurtar os prazos, razão pela qual, se entende não ser de admitir a possibilidade de tal articulado de resposta no âmbito deste referido processo especial.
Posto isto, a segunda questão que a este respeito se coloca é a de saber se, assim sendo, está vedado ao Autor deste processo especial pronunciar-se sobre as excepções arguidas pelo Réu na contestação, questão que, diga-se, não se confunde com a anterior.
Com efeito, apesar de não estar prevista na tramitação do DL n.º 269/98 essa possibilidade, a mesma decorre dos princípios gerais de processo, consagrados em múltiplas disposições gerais, mormente, do princípio do contraditório plasmado no artigo 3.º do CPCivil que é manifestamente uma das “disposições gerais e comuns” aplicáveis aos processos especiais nos termos previstos no artigo 463.º, n.º 1, do CPC.
Como assim, estatuindo o n.º 4, do referido artigo 3.º do CPC, que “às excepções deduzidas no último articulado admissível pode a parte contrária responder na audiência preliminar ou, não havendo lugar a ela, no início da audiência final”, deve o princípio do contraditório ser observado e feito cumprir pelo juiz a quem não é lícito decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a oportunidade de sobre elas se pronunciarem (n.º 3, do referido preceito legal).
Impõe-se, desta forma, concluir que, nos casos dos processos especiais em que a contestação é o último articulado admissível e tendo neste sido deduzidas excepções, o princípio do contraditório cumpre-se com a notificação desta peça ao autor simultânea com a notificação para a realização da audiência de julgamento, conferindo-se-lhe por esta via a possibilidade de, no início da audiência, responder à respectiva matéria.[7]
Evidentemente que, tal resposta do autor, deverá ser efectuada oralmente, atentos os princípios que enformam este processo especial, porquanto não estando prevista a existência de peça processual própria para o efeito, e presidindo a oralidade à audiência, sendo inclusivamente a sentença ditada para a acta, e sendo na mesma apresentados, também por esta via, todos os requerimentos de prova, não seria curial que a resposta fosse apresentada por escrito.
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Aqui chegados verifica-se que, na oposição, o requerido deduziu quer a excepção da compensação quer do incumprimento imperfeito quer ainda a nulidade da denominada “Cláusula de Fidelização” por violação por parte da Autora do dever de informação.
A Srª juiz na sentença, a nível da motivação da decisão de facto, discorreu do seguinte modo:
Relativamente à matéria das excepções invocadas pelo Réu na contestação, a Autora não quis (expressamente) tomar posição quanto aquelas questões, pelo que se consideram confessados os factos alegados.”
Portanto, o tribunal recorrido entendeu, não tendo a requerente apelante tomado posição expressa relativamente à matéria das excepções, ser aplicável os efeitos decorrentes da falta do ónus de impugnação especificada (artigo 574.º, nº 1 do CPCivil) e, como tal, considerou confessados os factos respectivos.
Deste entendimento dissente a apelante alegando que não deveriam ter sido considerados provados os factos 6. a 22. da fundamentação factual.
A questão que agora se coloca é se, aqueles factos (já iremos ver adiante que alguns não são factos mas simples conclusões), podiam ter sido considerados provados por falta de impugnação.
Ora, a resposta a esta questão não se apresenta de forma linear e isenta de algumas dúvidas.
Como atrás se referiu, a requerente apelante podia ter respondido às excepções deduzidas no último articulado admissível no início da audiência final.
Mas não o tendo feito qual é a respectiva consequência?
Pode entender-se que o estatuído no artigo 3.º, nº 4 do CPCivil, já atrás citado, se trata de uma mera uma faculdade, ou seja, a parte pode responder à excepções, afirma o legislador, dando-lhe a possibilidade de exercer o contraditório, mas tão só isso.
Isto é, nos casos ali previstos o legislador não veio estabelecer qualquer sanção se a parte não exercer a faculdade que lhe confere em homenagem ao princípio do contraditório.[8]
Parece-nos, porém que se este entendimento, podia ainda ter algum apoio na lei adjectiva anterior, no actual CPCivil, parece-nos, que esse apoio desapareceu.
Na vigência do anterior CPCivil sustentava-se, seguindo aquele entendimento, que o ónus de impugnação especificada previsto no artigo 490.º, nº 1 do CPCivil, não se aplicava aos casos em que a excepção tenha sido deduzida no último articulado legalmente admissível ao qual o autor não respondeu, simplesmente porque não tinha que fazê-lo, uma vez que a previsão do artigo 505.º daquele diploma apenas se aplicava aos casos em que faltasse o articulado de resposta ou a falta de impugnação nele dos novos factos, não sendo consequentemente extensível aos casos em que não exista legalmente qualquer articulado para efectuar a impugnação.
Não cremos, todavia, que este argumento seja ainda defensável no actual CPCivil aprovado pela Lei 41/2013 de 26/06.[9]
No que concerne ao objecto do processo há, no NCPCivil, duas novidades relevantes a destacar: a restrição das finalidades da réplica e a eliminação da tréplica e o tratamento processual da compensação como reconvenção.
No artigo 584.º do NCPC, prevê-se que a réplica só é admitida para defesa do autor perante a reconvenção deduzida pelo réu (n.º 1) e, nas acções de simples apreciação negativa, para impugnação dos factos constitutivos alegados pelo réu e alegação dos factos impeditivos ou extintivos do direito por ele invocado (n.º 2).
Deixa, pois, de ser admitida a réplica para resposta às excepções deduzidas pelo réu, sem embargo, quando a réplica tenha lugar por a acção ser de apreciação negativa ou ter sido deduzida reconvenção, de ser admissível aproveitá-la para responder às excepções, em antevisão do que o autor sempre poderia fazer por via do artigo 3.º, n.º 4.
Ora, não havendo articulado normal de resposta às excepções, coloca-se a questão de saber qual o conteúdo útil da segunda parte do artigo 572.º, alínea c) do CPCivil, segundo a qual, os factos essenciais em que se baseiam as excepções deduzidas devem ser especificados separadamente, sob pena de não se considerarem admitidos por acordo por falta de impugnação.
Não obstante a inexistência de tal articulado, há que conjugar o disposto no artigo 3.º, n.º 4 do CPCivil, com o artigo 587.º, n.º 1 do mesmo diploma, o qual não deixou de prever que “A falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu”, seja na audiência prévia, caso haja lugar a esta, seja no início da audiência final, tem o efeito previsto no artigo 574.º do mesmo diploma (admissão por acordo dos factos não impugnados).
Naturalmente, se o réu não tiver especificado separadamente as excepções deduzidas, não poderá operar a referida admissão por acordo, tendo plena aplicação o disposto na parte final da alínea c) do artigo 572.º.
Evidentemente que se pode defender que é possível que o juiz convide a parte a apresentar um terceiro articulado, ao abrigo do princípio da adequação formal (artigo 547.º do CPCivil)[10], com o ónus de impugnação inerente, encontrando-se, por esta via, uma das concretizações do referido preceito.
Mas se não adoptar tal procedimento tendo o réu dando cumprimento ao estatuído no artigo 572.º al. c) supra referido?
Cremos, portanto, no âmbito do novo diploma adjectivo que, tendo desaparecido o articulado réplica nos termos sobreditos, como articulado normal de resposta às excepções, a parte tem obrigatoriamente de se pronunciar quanto aos novos factos em que se baseiam as excepções invocada pelo réu, seja na audiência prévia, caso haja lugar a esta, seja no início da audiência final sob pena de se considerarem admitidos por acordo os factos não impugnados.
E, se isso é assim, para o processo declarativo comum deixa de se poder utilizar o argumento decorrente do artigo 505.º do anterior CPCivil para os processos especiais no âmbito dos quais estejam previstos apenas também dois articulados e, em concreto, para o procedimento de injunção, já que não existe no NCPCivil, fora do casos nele previstos, o articulado resposta à matéria das excepções.
Decorre do exposto que o estatuído pelo legislador no artigo 3.º, nº 4 do CPCivil, não pode, salvo o devido respeito por opinião contrária, ser visto apenas como uma faculdade que a parte pode usar ou não, sem que daí decorram quaisquer efeitos, antes tem de ser visto como sendo o momento processual que o legislador deferiu à parte para responder às excepções deduzidas com o último articulado, sob pena de se verificarem os efeitos decorrentes da falta do ónus de impugnação.
Repare-se que o artigo 587.º, nº 1 do CPCivil podia ter adoptado redacção semelhante ao antigo artigo 505.º também da lei adjectiva, todavia, não o fez, tendo distinguido claramente as duas situações:
a) falta de apresentação da réplica;
b) falta de impugnação dos novos factos alegados pelo réu.[11]
Ou seja, a cominação (admissão por acordo dos factos não impugnados) não se aplica só, tal como acontecia na vigência do pretérito artigo 505.º quando falte o articulado réplica, ou nele se não tenham impugnado os novos factos alegados pela parte contrária no articulado anterior, tal cominação também se aplica quando, não sendo admissível a apresentação de tal articulado (fora dos casos consignados no artigo 584.º), o réu na contestação tenha alegado matéria factual que integra excepções cumprindo o plasmado no artigo 572.º al. c) e a parte contrária não tenha impugnado essa nova factualidade.
É que, se assim não se entender, quer a norma do artigo 572.º al. c) que a norma do artigo 587.º, nº 1 2ª parte, ficam esvaziadas de qualquer conteúdo e, portanto, passam a ser letra morta, coisa que, certamente, não terá estado na intenção do legislador.
Por conseguinte, no caso em apreço, a apelante deveria ter, no início da audiência final, respondido às excepções deduzidas pelo requerido apelado, coisa que não fez, como decorre da acta de julgamento que teve lugar no dia 12/11/2013, sendo irrelevante que depois, em requerimentos autónomos de 17/12/2013 e 01/03/23014, tenha respondido às referidas excepções.
Como assim, a Srª juiz e quanto à matéria das excepções, tinha que ter dado como provados, como, aliás, o fez, os factos respectivos, nada havendo, assim, que censurar sob este segmento a decisão recorrida.
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Destarte, terá, pois que, improceder a impugnação da decisão da matéria de facto pelas razões atrás expostas e todas as restantes questões conexas com ela, isto é, as conclusões 7ª a 18ª.
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Permanecendo inalterada a matéria factual vejamos agora se a sua subsunção se encontra correctamente efectuada.
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Na decisão recorrida entendeu-se que decorrente do incumprimento imperfeito da relação contratual tinham advindo, para o requerido apelado prejuízos no montante de € 5.000,00, e tendo este oposto a excepção da compensação julgou a acção improcedente por o crédito da apelante ser apenas de € 1. 517,58.
Deste entendimento dissente a recorrente por entender que não está verificada a factie species do artigo 847.º, nº 1 al. a) do CCivil.
Quid iuris?
Analisando.
Preceitua o artigo 265.º, n.º 2, alínea c) do NCPCivil que a reconvenção é admissível (…) “quando o réu pretender o reconhecimento de um crédito, seja para obter a compensação, seja para obter o pagamento do valor em que o crédito invocado excede o do autor”.
Estará aqui consagrado um verdadeiro ónus de reconvir no que tange à compensação?
Parece resultar da análise do preceito que, na parte em que os valores dos dois créditos coincidem, teremos uma causa de extinção das obrigações (artigo 874.º, n.º 1, do Código Civil), já não tratada como uma excepção peremptória, mas como constituindo um novo pedido (artigo 266.º, n.º 1 do NCPCivil) e, como tal, produzindo a ampliação do objecto do processo.
Subjacente esta alteração estará a tese segundo a qual a compensação de créditos deve ser sempre objecto de um pedido reconvencional, uma vez que a compensação ultrapassa a mera defesa, sendo uma pretensão autónoma, ainda que não exceda o montante do crédito reclamado pelo autor e porque só em sede de reconvenção é permitido ao réu formular pedidos contra o autor.[12]
Portanto, para os defensores desta tese, no caso da arguição, por exemplo, do pagamento, o réu situa-se no âmbito do objecto definido pelo autor na petição inicial; se alega um contra-crédito coloca-se noutro domínio, distinto da estrita defesa por excepção peremptória.
Em abono desta tese, invoca-se o argumento do caso julgado material, pois este atinge apenas a decisão que respeita ao pedido mas não já os seus fundamentos.
Cumpre ainda salientar que a reconvenção não deixa de ser facultativa, como resulta do n.º 1 do artigo 266.º do NCPC.
Trata-se de um poder do réu, o que significa que não fica precludida a possibilidade de fazer valer o direito, que pretendia exercer em reconvenção, em acção autónoma.
Ora, sendo a reconvenção facultativa, e invocando o réu a compensação por excepção, o que fará o juiz?
Perspectivando-se o recurso à reconvenção como um ónus, a solução mais justa e que se coaduna com o espírito do NCPC (cfr. artigos 7.º e 590.º), passa por convidar o réu ao aperfeiçoamento da contestação, devendo este cumprir o disposto no artigo 583.º daquele diploma, sob pena de ser rejeitada a arguição da compensação.
Nas acções em que não é admissível reconvenção, como as acções especiais para o cumprimento de obrigações pecuniárias, previstas no Decreto-Lei n.º 269/98, de 1 de, como a presente Setembro, ou nas acções em que seja inadmissível a dedução da compensação quando a apreciação do contra-crédito não seja da competência do tribunal judicial (artigo 93.º, n.º 1 do NCPCivil), a interpretação deste preceito não nos deve conduzir a efeitos tão restritivos.
Efectivamente, o chamamento de uma nova relação jurídica a tribunal também acontece na novação (artigo 857.º do CCivil), cuja natureza de excepção peremptória não é discutida. E o artigo 395.º do Código Civil integra a compensação e a novação no conceito de factos extintivos da obrigação.
Parece-nos, assim, que ao réu não deve ser coarctado este relevantíssimo fundamento de defesa.
É, pois, de concluir que, ainda que se entenda que, deduzida a compensação, o réu tem o ónus de reconvir, o tratamento da compensação não pode deixar de ser o da excepção peremptória nos processos em que não é admissível a reconvenção.
Diante do exposto, cremos que, efectivamente, o requerido podia, por via da excepção, invocar a compensação, além de que o crédito invocado era de valor inferior ao da requerente apelante.
A questão que agora se coloca é se estará verificada a referida excepção, como o entendeu o tribunal recorrido.
E, a resposta, salvo o devido respeito, é negativa.
A compensação “é uma forma de extinção das obrigações em que no lugar do cumprimento, como sub-rogado dele, o devedor opõe o crédito que tem sobre o credor. Ao mesmo tempo que se exonera da sua dívida, cobrando-se do seu crédito, o compensante realiza o seu crédito liberando-se do seu débito, por uma espécie de acção directa”.[13]
Os requisitos de que a mesma depende encontram-se vertidos nas disposições conjugadas dos artigos 847.º, nº 1, 848.º, n.º 1 e 851.º, n.ºs 1 e 2 do CC, podendo sintetizar-se que “são requisitos necessários para operar a compensação legal:
i) a existência de dois créditos recíprocos, um activo e outro passivo, de que são titulares o devedor compensante e o credor compensado;
ii) a exigibilidade judicial do crédito do autor da compensação ou do crédito activo;
iii) a fungibilidade e a homogeneidade das prestações;
iv) a não exclusão, por lei, da compensação;
v) A declaração de uma das partes à outra.
Importa, assim, desde logo, dizer que, quem pretende liberar-se ou desobrigar-se pelo recurso à compensação tem, necessariamente, de admitir a preexistência de um crédito por banda daquele a quem se acha juridicamente vinculado, ou seja, o recurso à compensação, postula, como sucede no direito substantivo, o reconhecimento de um crédito, ao qual se opõe um contra-crédito, pelo que, a parte respectiva, não pode pretender a compensação se nega a existência do crédito invocado pelo autor.[14]
Acontece que, no caso em apreço, o requerido apelado não admite que a requerente apelante seja titular de qualquer crédito perante ele, antes pelo contrário nega a sua existência.
Na verdade, no artigo 35º da oposição o requerido quantifica a sua indemnização em € 5.000,00 e depois afirma no artigo 36.º da mesma peça o seguinte:
Este montante deverá ser compensado naquele que porventura o Réu possa ser condenado a pagar à Autora for força da presente instância (artºs. 847º e 848º, ambos do Código Civil)”.
Portanto, o requerido não admite a existência do crédito da requerente apelante, o que refere é que deve operar-se a compensação para o caso de vir a ser condenado na demanda.
E, por esse razão também não se descortina em que fundamento se baseia a apelante para dizer que tendo o apelado alegado um suposto crédito sobre ela que estimou em € 5.000,00, reconheceu de forma implícita a sua condição de devedor também a ela do mesmo montante.
Mas, para além disso não resulta provado dos autos matéria factual que permita concluir pela existência de qualquer crédito do requerido apelado sobre a requerente apelante.
Vejamos.
Admitindo que houve cumprimento defeituoso da prestação contratual (artigo 799.º, nº 1 do CCivil) por banda da requerente apelante que danos é que o requerido apelado sofreu na sua decorrência?
É que, a consequência mais importante do cumprimento defeituoso é a obrigação do ressarcimento dos danos causados ao credor.
O apelado não os alega.
Na verdade, a este respeito o que o apelado alega não passam de mera conclusões ou vaguidades.
O que neste conspecto se encontra provado é, tão somente, o seguinte:
“19. Todas as situações relatadas provocaram ao Réu perda de prestígio e uma clara diminuição da sua consideração e imagem junto de alguns clientes.
20. Alguns clientes hesitaram em contratar novamente os serviços do Réu.
21. Em face da inoperacionalidade do seu número móvel, o Réu chegou mesmo a deixar de realizar alguns negócios.
22. O que provocou prejuízos ao Réu no montante de € 5.000,00”.
O vertido nestes pontos da fundamentação factual não passam de meros juízo de valor e de simples conclusões.
Como se sabe o dano é a perda in natura que o lesado sofreu, em consequência de certo facto, nos interesses materiais, espirituais ou morais.
Ora, o que o apelado deveria ter alegado era uma facticidade donde resultassem os danos que sofreu com aquele cumprimento defeituoso da prestação.
Dizer-se que o Réu teve perda de prestígio e uma clara diminuição da sua consideração e imagem junto de alguns clientes é uma conclusão que se devia retirar dos factos correspondentes.
Em que se traduziu essa perda de prestígio e a diminuição de consideração e imagem?
Dizer-se que alguns clientes hesitaram em contratar novamente os seus serviços, não é coisa nenhuma.
Mas deixaram? Pelos vistos não.
E dessa hesitação decorreram danos para o apelado?
Quais?
E deixou de realizar alguns negócios?
Quais?
Quais os seus termos e qual o lucro esperado com a sua realização?
Falta, portanto, um acervo factual que, uma vez provado, conduzisse à conclusão de que o apelado em consequência do cumprimento defeituoso da prestação por parte da apelante sofreu danos, e que o montante desses danos ascenderam ao montante de € 5.000,00.
É que lidos os factos deles parece resultar que aqueles € 5.000,00 se referem à não realização de alguns negócios, quando não foi isso que foi alegado.
Efectivamente, o que o apelado alegou é que computava os danos morais e patrimoniais naquele montante (cfr. artigos 33º a 35º da oposição).
Resulta, assim do exposto que também por esta razão não poder ser oposta a excepção da compensação à apelante, pois que, se não verifica que o apelado seja titular de qualquer crédito perante aquela.
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Isto dito, e resultando dos autos que a apelante é titular de um crédito sobre o apelado no montante de € 1.517,58 a acção terá que proceder com a condenação do apelado no seu pagamento.
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Procedem, assim, as conclusões 19ª a 23ª formuladas pela apelante.
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IV-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta parcialmente procedente e, consequentemente, revogando-se a decisão recorrida condena-se o requerido apelado a pagar à apelante a quantia de € 1.517,58 (mil quinhentos e dezassete euros e cinquenta e oito cêntimos) acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento das respectivas facturas descritas no facto 3. da fundamentação factual.
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Custas da apelação por apelante e apelado na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 23 de Fevereiro de 2015.
Manuel Domingos Alves Fernandes
Caimoto Jácome
Macedo Domingues
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[1] Diploma que será invocado na redacção mais recente que foi introduzida pela 16.ª alteração ao diploma, trazida pelo DL n.º 226/2008, de 20/11, aplicável em face da data de entrada da presente Injunção.
[2] Na redacção introduzida pelo DL n.º 107/2005, de 01-07.
[3] Ainda aqui aplicável face à data em que foi deduzida a oposição.
[4] Diz-nos Salvador da Costa, in A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 6.ª Edição Actualizada e Ampliada, Almedina 2008, pág. 84, que “como o instrumento de contestação não é logo notificado ao autor, impõe-se a conclusão de que, nesta espécie processual, não há lugar a resposta à contestação, ainda que nesta haja sido deduzida alguma excepção, nem, como adiante melhor se verá, à formulação de pedido reconvencional
[5] Cfr. José Alberto dos Reis, Código de Processo Civil Anotado, VI, pág. 493, Manuel de Andrade, Noções Elementares de Processo Civil, pág. 367, e mais recentemente Jorge Augusto Pais de Amaral, Direito Processual Civil, 7.ª Edição, Almedina 2008, pág. 444. Castro Mendes, começou por defender entendimento semelhante mas acabou por reconsiderar a posição após a Reforma do CPC de 67, admitindo a possibilidade de ser deduzida reconvenção em processo sumaríssimo, a qual deveria ser notificada ao autor para em 8 dias responder.
[6] Não havendo razão para as não aplicar na interpretação da lei adjectiva–cfr. neste sentido, Artur Anselmo de Castro, Direito Processual Civil Declaratório, vol. I, Almedina 1981, pág. 43.
[7] Cfr. neste sentido, Salvador da Costa, ob. e loc. citado, reforçando a ideia na pág. 132.
[8] Neste sentido Acs. da Relação de Coimbra de 02/10/2010 e de 23/10/2012 in www.dgsi.pt. e ainda Paulo Ramos de Faria e Ana Loureiro, Primeiras Notas ao Novo Código de Processo Civil, nas páginas 504 e 505, anotação 1.2, do volume I, 2ª Ed.
[9] Aqui aplicável tendo em conta a pendência da acção aquando da sua entrada em vigor e o facto da oposição ter apenas dado entra em 9 de Setembro de 20013.
[10] No sentido da possibilidade de inserir um terceiro articulado se pronunciou, a propósito do Regime Processual Civil Experimental, Paulo Ramos de Faria, in “Regime Processual Civil Experimental Comentado”, Coimbra, Almedina, 2010, pg. 121.
[11] A redacção do artigo 505.º era a seguinte: “A falta de algum dos articulados de que trata a presente secção ou a falta de impugnação, em qualquer deles, dos novos factos alegados pela parte contrária no articulado anterior tem o efeito previsto no artigo 490.º”.
[12] Neste sentido, vide “Introdução ao Estudo e à Aplicação do Código de Processo Civil de 2013”, de João Correia, Paulo Pimenta e Sérgio Castanheira, Coimbra, Almedina, 2013, pgs. 41 a 43.
[13] Cfr. Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, 3.ª edição revista e actualizada, Coimbra Editora, 1986, II vol. pág. 135.
[14] Cfr. neste sentido Ac. do STJ de 10-02-1983: BMJ 324-513, Acs. da Relação do Porto de 26/04/1993 e 09/12/1992 in www.dgsi.pt.