Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
9663/17.7T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JORGE SEABRA
Descritores: DOAÇÃO
PARTILHA
COLAÇÃO
DESPACHO SANEADOR
Nº do Documento: RP201811159663/17.7T8VMG.P1
Data do Acordão: 11/15/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: ALTERADA
Decisão: APELAÇÃO
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 684, FLS 15-36)
Área Temática: .
Sumário: I - No contrato em que alguém adquire um imóvel para o dar à sua filha (e marido) – visando prejudicar os demais filhos – e, para atingir este fim, os faz intervir formalmente, como compradores, na respectiva escritura pública de compra e venda, poderá existir uma doação indirecta.
II - Se o doador pode dispensar a colação no acto da doação ou posteriormente e se essa dispensa pode ter lugar em termos expressos ou tácitos, obedecendo a doação indirecta à forma de escritura pública, a declaração de dispensa de colação tem de revestir essa mesma forma ou que ter lugar por meio de testamento. Se assim não for, a dispensa de colação não é válida.
III - A restituição à massa da herança, para efeitos de igualação na partilha, pode efectuar-se em substância ou pelo valor; Não existindo acordo dos interessados, é inviável a restituição em substância, restando apenas a restituição em valor.
IV - Sempre que existam factos controvertidos com relevo directo para a decisão e/ou a questão de direito se apresente como admitindo várias soluções plausíveis de direito, justifica-se que o juiz só conheça do mérito da causa no despacho saneador quando possa emitir uma decisão segura que, em princípio, não seja afectada pela evolução posterior do processo, designadamente em via de recurso pela adopção na instância superior de uma outra solução igualmente plausível.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 9663/17.7T8VNG.P1- Apelação
Origem: Comarca do Porto - Juízo Central Cível de Vila Nova de Gaia – J3.
Relator: Des. Jorge Seabra
1º Adjunto Des. Maria de Fátima Andrade
2º Adjunto Des. Fernanda Almeida
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Sumário (elaborado pelo Relator):
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Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto:
I. RELATÓRIO:
1. B... e C... propuseram contra D... e marido E... a presente acção declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, peticionando, a final, que sejam os RR. condenados a restituir à massa da herança aberta por óbito de F... a fracção autónoma melhor descrita sob o artigo 6º da petição inicial, objecto de doação, assim como os bens móveis existentes no interior da mesma fracção à data do óbito da aludida F....
Subsidiariamente, por o caso de assim não se entender, devem, de todo o modo, os RR. serem condenados a restituir à mesma massa da herança o valor correspondente ao preço de aquisição da fracção descrita, assim como o valor das obras realizadas na mesma fracção e que foram suportadas pela autora da herança, valores estes acrescidos de juros legais.
Alegam, para tanto, que são eles AA. e a 1ª Ré (com quem o 2º Réu é casado) filhos de F..., falecida a 21.02.2015, no estado de divorciada.
Por outro lado, ainda, alegaram que quando os mesmos fizeram a partilha dos bens deixados por sua mãe fizeram-no em erro, pois que da relação de bens apresentada não constava a casa de morada de família da Autora da herança (a fracção já referida), nem mesmo os bens móveis que compunham o seu recheio.
É certo que os RR. se arrogam como proprietários da dita fracção por a terem adquirido por escritura pública de compra e venda de 3.08.2012; Porém, foi a autora da herança quem realizou diligências tendo em vista a sua aquisição, tendo inclusive verbalizado a mesma, assim como manifestou a intenção de realizar alterações no seu interior, habitando a casa que dizia ser sua; Além disso, foi ela que escolheu, comprou e pagou os móveis que compunham o respectivo recheio.
Na referida escritura de compra e venda do imóvel figuram os RR. como compradores, tendo, inclusive, realizado o respectivo registo. Souberam, no entanto, os AA. que foi a sua mãe quem ordenou a transferência de € 184.000,00 da sua conta bancária para uma conta terceira antes da aquisição do imóvel; Sendo assim, concluem que foi a sua mãe que liquidou o valor de compra do imóvel, assim doando aos RR. o valor constante da escritura como sendo o da aquisição, ou seja, € 77.500,00.
Alegam, assim, que se está perante doação do imóvel, ou pelo menos do valor em numerário correspondente ao preço pago pela autora da herança quanto à compra, obras realizadas e aquisição dos bens móveis, realidade que prejudica os demais herdeiros, os ora AA.
Por conseguinte, os valores respectivos devem ser trazidos à colação na herança pois que a autora da herança e a 1ª Ré tiveram o intuito de prejudicar os AA., sendo um negócio indirecto de doação, pelo que, tendo sido já partilhados os restantes bens, impõe-se a dita colação.
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2. Os RR. contestaram impugnando a versão dos AA. e alegando que adquiriram, com recurso a meios próprios, a dita fracção, assim como os bens móveis que compõem o seu recheio.
Pugnam, assim, pela improcedência da causa.
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3. Foi realizada audiência prévia, na qual foi dado a conhecer pela Exmª Srª Juiz o seu propósito de conhecer, desde logo, da pretensão dos AA. e no sentido da sua improcedência, pelos fundamentos ali abreviadamente expostos.
Nessa sequência, e no prazo que lhe foi concedido vieram os AA. pronunciar-se sustentando, em síntese, que, mesmo a admitir-se que os factos descritos nos autos devem ser tidos como uma doação manual, estando assim dispensada a sua colação, sempre se impõe o prosseguimento dos autos para apuramento do valor e eventual inoficiosidade da doação.
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4. Os RR. exerceram o contraditório, mantendo a posição já manifestada na sua contestação.
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5. Após, foi proferido despacho que fixou o valor da causa, que saneou o processo, afirmando da validade e regularidade da instância, e julgou improcedente a acção, absolvendo os RR. dos pedidos contra si formulados.
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6. Inconformados com a decisão proferida, vieram os AA. interpor recurso de apelação, que foi admitido nos termos legais, oferecendo alegações e deduzindo, a final, as seguintes
CONCLUSÕES
I – Os Recorrentes intentaram a presente acção, à qual foi atribuído o valor de € 81.105,65, peticionando a restituição à Massa da Herança aberta por óbito de F..., a casa de morada de família da De Cujus, mais concretamente, o prédio urbano sito na Avenida ..., n.ºs .... e ...., fracção “EA”, correspondente a uma habitação no quinto andar direito, com entrada pelo n.º .. da Rua ..., um lugar de garagem na cave designado pelas letras “EA”, com entrada pelo n.º .. da Rua ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, bem como os bens móveis existentes à data do óbito da Autora da Herança, no interior da fracção – casa de morada de família da De Cujus;
II – Peticionando ainda que, se assim se não entendesse, fossem os ora Recorridos condenados a restituir à Massa da Herança o valor correspondente ao valor de aquisição da fracção em causa nos presentes autos, valor pago pela De Cujus com as obras realizadas na fracção e, valor dos bens móveis por esta adquiridos que se encontravam na fracção – casa de morada de família da falecida.
III – Para tal alegaram que, Recorrentes e a Recorrida mulher são filhos de F..., cujo óbito ocorreu em 21/02/2015, no estado de divorciada, sendo estes os seus únicos Herdeiros, tendo a Autora da Herança em 05/06/2012, outorgado no cartório Notarial Dr.ª G..., testamento a favor da aqui Recorrida mulher, sua filha, instituindo-a como sua herdeira no que à quota disponível diz respeito.
IV. Que a Recorrida mulher habilitou-se a tal herança e, nela assumiu as funções de cabeça-de-casal e, no exercício de tais funções apresentou a relação de bens propriedade da Autora da Herança e que compunha o acervo hereditário, não fazendo constar de tal relação de bens a casa de morada de família da Autora da Herança, mais concretamente, o prédio urbano sito na Avenida ..., n.ºs .... e ...., fracção “EA”, correspondente a uma habitação no quinto andar direito, com entrada pelo n.º .. da Rua ..., um lugar de garagem na cave designado pelas letras “EA”, com entrada pelo n.º .. da Rua ..., freguesia ..., concelho de Vila Nova de Gaia, nem os bens móveis que compunham o recheio da mesma.
V – Que os ora Recorrentes apenas com a apresentação da relação de bens pela cabeça-de-casal (Recorrida mulher) aferiram que, a fracção em causa nos presentes autos se encontrava registada a favor dos Recorridos por ter a mesma sido omitida na relação de bens apresentada, o mesmo se verificando no que aos bens móveis que compunham o recheio da casa de morada de família da De Cujus e, que se encontravam no interior de tal fracção.
VI – Interpelada a cabeça-de-casal, ora Recorrida mulher sobre tal omissão, foram informados que os Recorridos se intitularam proprietários da fracção e dos bens móveis, o que vieram a constatar no que à fracção diz respeito, por consulta efetuada na Conservatória de Registo Predial e, copia da escritura de compra e venda junta aos autos e com base na qual foi efectuado o registo de aquisição por parte dos Recorridos.
VII - Foi efectuada partilha extrajudicial entre os herdeiros, ora Recorrentes e Recorrida mulher, quanto aos bens objecto da relação de bens apresentada pela Recorrida mulher no exercício das funções de cabeça-de-casal.
VIII – A escritura de compra e venda da fracção em causa foi outorgada pelos Recorridos, assumindo, estes, em tal ato a posição de compradores e, que a fracção foi adquirida pelo montante de € 77.500,00 (setenta e sete mil e quinhentos euros), tendo a mesma sido adquirida sem recurso a qualquer credito bancário, decorrendo tal realidade da inexistência de qualquer inscrição hipotecária, conforme certidão predial junta aos autos.
IX - Os Recorridos à data em que ocorreu tal aquisição, encontravam-se a pagar uma prestação mensal ao Banco respeitante à sua casa de morada de família, a Recorrida mulher estava numa situação de desemprego e, o Recorrido marido era trabalhador fabril tendo como rendimento mensal valor em pouco superior ao correspondente ao salario mínimo nacional, não lhe sendo conhecidos outros rendimentos que não fossem o do vencimento mensal do Recorrido marido.
X – Em 29/05/2012 a Autora da Herança F..., era detentora na sua conta bancária a prazo, sediada no Banco H... do valor de € 185.000,00 (cento e oitenta e cinco mil euros), tendo ordenado a transferência do referido valor para a sua conta à ordem no mesmo Banco, e, ordenado a transferência do valor de € 184.000,00 para uma conta terceira.
XI – Foi a Autora da Herança quem escolheu a fracção, conduziu e participou em todas as negociações para a efectiva aquisição, pedindo, nomeadamente, à Recorrente filha (por esta ser advogada) para analisar o contrato promessa de compra e venda, contrato esse onde figurava como promitente compradora a De Cujus, bem como foi esta que projectou as obras de alteração a realizar na fracção, negociando com a promitente vendedora quais as obras cujo custo aquela assumia e quais iriam ser suportados pela De Cujus, programando-as conjuntamente com o ora Recorrente filho o seu planeamento e execução, bem como foi esta que adquiriu e pagou os bens móveis que estavam à data do seu óbito no interior da fracção.
XII – Foi a falecida F..., quem fiscalizou a execução das obras que foram realizadas e, após a celebração da escritura e aquisição dos bens móveis, por volta do mês de Agosto/Setembro fixou a sua residência, como sendo a sua casa de morada de família, em tal fracção, passando a habitá-la, sempre se referindo à fracção como sendo de sua propriedade, comportando-se como sua verdadeira proprietária quer para com os ora Recorrentes quer para com terceiros.
XIII – Sempre tendo dito aos ora Recorrentes que havia sido ela quem tinha adquirido a fracção e, foi, efectivamente pois que, foi a Autora da Herança quem procedeu ao pagamento do preço acordado à vendedora, não obstante figurarem os Recorridos como adquirentes na escritura de compra e venda da fracção em causa, tal só lhes foi possível por ter a De Cujus pago o valor correspondente ao preço de compra, razão pela qual não tiveram de recorrer a qualquer crédito bancário.
XIV – A fracção objecto dos presentes autos, bens móveis que a compunham à data do óbito o recheio da mesma, foram adquiridos pela De Cujus, realidade que sustenta o peticionado na presente acção ou seja, que seja objecto de restituição à Massa da Herança ou, pelo menos, que o montante despendido pela De Cujus na compra da fracção por forma a permitir aos Recorridos a outorga da escritura a seu favor, valor das obras e dos bens móveis que compunham o seu recheio, seja objecto de restituição à Massa da Herança, para que se proceda à igualação para efeitos de partilha.
XV - A De Cujus ao proceder ao pagamento do valor acordado para a compra da fracção extinguiu a obrigação que recaia sobre os ora Recorridos, facto que não podendo ser caracterizado como uma atribuição patrimonial directa nos termos em que se encontra configurada no art. 940º, n.º 1 do Código Civil, configura uma “atribuição patrimonial”, ainda que indirecta – realidade que sustenta a aplicação analógica do regime da doação.
XVI – Por aplicação do regime da doação temos que, o art.º 940º n.º 1 do Código Civil estabelece, efectivamente, o que se pode e deve entender por doação, nomeadamente que, a mesma se caracteriza pelo ato mediante o qual se dispõe de forma gratuita de uma coisa ou de um direito, ou o assumir de uma obrigação em beneficio de outrem.
XVII - A lei estabelece que, a doação de coisas móveis não está dependente de qualquer formalidade quando ocorre a aceitação do donatário, o que se verifica quando é acompanhada da tradição da coisa doada – art. 947º, n.º 2 do Código Civil – mas como nas demais doações decorre sempre uma atribuição patrimonial que é geradora de enriquecimento para o donatário.
XVIII – Nos presentes autos temos que, o preço da fracção, obras realizadas e aquisição dos bens móveis que compunham o seu recheio, foi pago aos respectivos credores pela De Cujus;
XIX – Os pagamentos efectuados pela Autora da Herança, falecida, não podem ser entendidos como uma simples entrega de coisa doada, discretamente efectuada pela De Cujus (Doadora) aos Recorridos mas antes, o dinheiro para aquisição da fracção em que formalmente intervieram os Recorridos foi pago pela De Cujus e à custa do seu património, o mesmo ocorrendo com as obras e bens móveis em causa.
XX – O art. 2104, n.º 1 do Código Civil estabelece que: “1. Os descendentes que pretendam entrar na sucessão do ascendente devem restituir à massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes foram doados por este: esta restituição tem o nome de colação.” – tendo a Recorrida mulher, na qualidade de descendente da De Cujus, entrado na sucessão aberta por óbito desta, nela assumindo as funções de cabeça-de-casal e, tendo recebido o valor correspondente à quota disponível nos termos da vontade testamentária manifestada pela falecida no testamento outorgado e junto aos autos – impondo-se a aplicação do regime da colação.
XXI – O art. 2106º estabelece que: “A obrigação de conferir recai sobre o donatário, se vier a suceder ao doador, ou sobre os seus representantes, ainda que estes não hajam tirado benefício da liberalidade.”
XXII – A partilha dos demais bens foi efectuada de forma extrajudicial, tendo sido respeitada a disposição testamentária no que à quota disponível a favor da Recorrida mulher estabelecida pela falecida diz respeito, pois que a esta havia sido atribuída e, porque entrou na sucessão – não se tendo verificado a inclusão na relação de bens da fracção e dos bens móveis peticionados nos autos, por a Recorrida mulher se ter recusado a incluir/restituir tais bens à Massa da Herança – o que aliás se diga, não ocorreu até à presente data.
XXIII - O preço de aquisição da fracção, obras e bens móveis foi efectuado pela De Cujus, não se podendo concluir que estamos perante uma doação manual, que é caracterizada como sendo de reduzido valor mas antes, estamos perante uma obrigação que impendia sobre os Recorridos de liquidar o preço de aquisição da fracção, obras e bens móveis e que, tendo sido a De Cujus a proceder a tal liquidação, a obrigação se extinguiu na esfera jurídica destes perante o vendedor;
XXIV – A assunção da divida respeitante ao preço da venda por parte da Autora da Herança com respectivo pagamento ao vendedor e, pagamento por si efectuado dos bens moveis que compunham o recheio da fracção, não consubstancia uma pura entrega de coisa doada discretamente efectuada pelo doador ao beneficiário acompanhada da tradição do bem – facto que caracteriza a doação manual;
XXV – Assim, não tendo ocorrido uma doação “directa”, estando como está em causa uma “atribuição patrimonial” e, tendo a Recorrida mulher na qualidade de descendente da De Cujus entrado na sucessão desta, impõe-se seja ordenada a restituição à Massa da Herança tais valores de forma que seja possível a igualação da partilha quanto a tais montantes – através do instituto da colação, uma vez que tal instituto não foi afastado pela Doadora (De Cujus).
XXVI – O Tribunal a quo entendeu na sentença por si proferida que, os factos vertidos no articulado petição inicial não configuram uma doação indirecta do imóvel mas, que a provar-se a versão dos Recorrentes, estamos perante uma “doação do valor equivalente ao preço do prédio e dos móveis, e das obras pretensamente realizadas, a favor da 1ª R.” – concluindo que: “Tratando-se uma doação manual – de dinheiro - tal não está sujeito a qualquer formalidade e presume-se dispensada de colação –artº. 2113º, nº.3 do C.C.”;
XXVII – Mais tendo entendido que: “Os A:A. nada alegam para afastar esta presunção, pelo contrário, já que afirmam expressamente que com tudo isto quis a autora da herança (e a 1ª R.) prejudicar os A.A., o que significa que se os quis prejudicar, quis beneficiar a 1ª R…..” – sustentando que, “… sendo a doação uma liberalidade à custa do património do doador, o qual dispõe gratuitamente de uma coisa ou direito, ou assume uma obrigação, a favor do donatário (art.º 940º, nº. 1, do C.C.), na doação manual o seu objecto são coisas móveis, não depende de qualquer formalidade externa e é acompanhada da tradição da coisa doada – artº. 947º, nº. 2, do C.C….”
XXVIII - Não podem os Recorrentes se conformar com tal decisão pois que, não está em causa uma doação manual nos termos estabelecidos no art. 2113º, n.º 3 do C.C. mas, em presença do valor em causa que de todo não é reduzido nomeadamente por inexistirem quaisquer outros bens de valor relevante no acervo hereditário como decorre da analise da relação de bens já junta aos autos, se forçaria concluir que, teria sido encontrada a formula perfeita de um qualquer Progenitor/ascendente conseguir afastar algum ou alguns dos seus herdeiros legitimários (Descendentes), em total violação do disposto no art. 2027º do Código Civil (a contrario sensu).
XXIX - O Tribunal a quo ao entender que, a doação efectuada pela De Cujus à Recorrida mulher sendo uma doação manual não está sujeita à colação e, que quando os Recorrentes assumem que tal ato visou prejudica-los tal é demonstrativo de que a doadora pretendia mesmo que tal montante não fosse sujeito à colação – vai em sentido totalmente contrario do estabelecido na lei, nomeadamente do disposto no art. 2104º n.º 1 do Código Civil fazendo uma errada analise dos factos em crise nos presentes autos.
XXX - É a própria lei que proíbe, fora dos casos estabelecidos na lei o deserdar dos filhos, herdeiros legitimários (art. 2027º C.C.) bem como, tendo sido a De Cujus a pagar o preço da fracção, obras e aquisição e pagamento directamente dos bens móveis cujos valores não são exíguos nem tais pagamentos foram efectuados de forma discreta, não podem tais actos ser configurados como uma doação manual e, consequentemente, é também a própria lei que estabelece que tais valores estão sujeitos a colação (art. 2104º n.º 1 C.C.);
XXXI – Como ensina Platinol – “a doação é mais um fenómeno económico do que um acto jurídico” – pois que se trata de uma liberalidade da qual decorre um enriquecimento do donatário mas, ao qual também pode estar conjugada com o interesse pessoal do doador – o que no caso em apreço era o de afastar os Recorrentes da sucessão, de forma totalmente contraria à lei, mesmo que se possa entender que nas doações de móveis, desde que acompanhadas pela traditio da coisa, não é exigido qualquer formalismo.
XXXII - Os factos vertidos e em causa nos presentes autos levam a concluir em sentido contrário ao da sentença ora em crise pois que, a fracção foi objecto de negociação directa e pessoal, quer quanto ao valor como às obras de alteração a realizar no seu interior, pela De Cujus, o preço acordado foi liquidado pela De Cujus tudo não obstante terem feito figurar/intervir na escritura de compra e venda os ora Recorridos – pelo que a fracção foi adquirida pela falecida Autora da Herança, tendo figurado na escritura os Recorridos como compradores, com um provável objectivo de fazer uma liberalidade a favor da Recorrida filha à custa do seu património – pelo que não se pode concluir que estamos perante uma doação em dinheiro do preço do imóvel - estamos perante uma verdadeira doação da fracção aos Recorridos.
XXXIII - A De Cujus com a sua actuação e comportamento, assumiu não só a obrigação do pagamento do preço acordado para a aquisição da fracção como, pagando como pagou o preço, extinguiu a respectiva obrigação dos Recorridos – realidade que não pode ser caracterizada como uma atribuição patrimonial directa como tipicamente é caracterizada pelo art. 940º n.º 1 do C.C. mas antes, configura uma “atribuição patrimonial”, mesmo que seja indirecta pela De Cujus que justifica a aplicação do regime da doação por analogia mas, que não permite que seja considerada uma doação manual.
XXXIV – Como decidiu o Tribunal da Relação do Porto, no seu Acórdão 0531136, de 31/03/2005 “No contrato em que alguém adquire um imóvel para dar a seu filho (visando prejudicar a legitima dos demais descendentes), e para atingir tal desiderato, o faz intervir, como comprador, na respectiva escritura pública de compra e venda, há uma (verdadeira) doação indirecta.”
XXXV – Tendo ainda sido decidido em tal Acórdão que “Sendo o fim principal da colação a igualdade da partilha, está na sua base a presunção – iuris tantum - de que o doador não quis beneficiar o seu presuntivo herdeiro legitimário em detrimento dos outros, mas apenas antecipar a transferência da parte do seu património que há-de vir a competir-lhe.”
XXXVI – Estando como está no caso dos autos, em causa um bem imóvel sujeito a registo, cuja negociação e pagamento do preço foi efectuada pela Autora da Herança e a escritura outorgada pelos Recorridos e, não tendo em tal escritura ou em documento formal celebrado em data anterior ou posterior sido declarada a dispensa de colação, que teria de necessariamente revestir a mesma forma ou de ser feita por testamento – impõe-se que não seja afastado o regime da colação.
XXXVII – Mas mesmo que assim se não entendesse, sempre teríamos que, se é certo que a lei não define com rigor o que é doação manual dúvidas não existem que versa sobre coisas móveis e que se opera pela tradição da coisa mas, no caso dos autos sempre teria de ser afastada a aplicação do regime estabelecido pelo art. 2113º, n.º 3 do Código Civil;
XXXVIII – A De Cujus sempre se intitulou como a proprietária do imóvel, após a sua aquisição fixou a sua residência na fracção, comportava-se como sua verdadeira proprietária e foi ela quem liquidou o preço de aquisição, não estando em causa valores reduzidos que se possam caracterizar como doação manual mas, ao invés, está em causa valores superiores a todo o demais acervo hereditário.
XL - O instituto do direito sucessório assenta no valor social que é atribuído às doações, em vida, efectuadas a presuntivos herdeiros legitimários do doador – as quais são consideradas como meras antecipações da herança que iria ocorrer num futuro – só não o sendo quando o doador dispensou a colação em ato com a mesma formalidade do que tenha acompanhado, de facto, a realização da doação – que no caso em concreto teria de ser por escritura publica uma vez que, a aquisição do imóvel pago pela De Cujus cumpriu tal formalismo.
XLI – Não tendo sido cumprido tal formalismo, a eventual doação aqui em causa terá de ser imputada à quota disponível impondo-se, consequentemente, que se verifique a sua restituição à Massa Hereditária para igualação dos herdeiros, não obstante ter sido efectuada a partilha parcial no que aos demais bens diz respeito, a restituído à Massa Hereditária dos valores em causa na presente acção para posterior partilha pelos herdeiros legitimários impõe-se, nos termos do disposto nos art.ºs 2114º, 2162º do Código Civil.
XLII - O Tribunal a quo ao decidir como decidiu, tendo considerado que os factos em crise nos presentes autos configuram uma situação de doação manual a qual, por ter sido realizada em dinheiro, não está sujeita a colação bem como, que os Recorridos não deveriam ter aceite a partilha extrajudicial dos bens já efectuados por da relação de bens não constarem os bens em causa nos presentes autos, não interpretou nem aplicou correctamente as normas legais atinentes, nomeadamente os art.ºs 947º, 2027º, 2104º, n.º 1, 2108º, n.º 1, 2113º n.º 1, 2114º e 2162º, todos do Código Civil.
XLIII - Impõe-se, por isso, que a sentença recorrida seja revogada e, em consequência, deve ser substituída por outra que condene os Recorridos a restituir à Massa da Herança a fracção autónoma em crise nos presentes autos bem como os bens móveis existentes à data do óbito da Autora da Herança, no interior de tal fracção, ou se assim se não entender, que condene os Recorridos a restituir à Massa da Herança o valor correspondente ao valor de aquisição da fracção em crise nos presentes autos, bem como o valor suportado pela De Cujus quanto às obras realizadas em tal fracção e dos bens móveis que compunham o recheio da fracção, casa de morada de família da De Cujus;
XLIV – Ou, se assim se não entender, seja ordenada a revogação da sentença ora em crise, ordenando o prosseguimento dos autos, para realização das diligencias requeridas pelos Recorrentes no seu articulado Petição Inicial ou outras que se venham a verificar como essenciais para a descoberta da verdade material e, consequentemente, ordenada a realização da audiência de Discussão e Julgamento por forma a ser efectuada prova bastante dos factos articulados nos autos pelos Recorrentes e Recorridos.
Dado o exposto (…), deve ser revogada a sentença proferida pelo Tribunal a quo e, em consequência deve ser substituída por outra que condene os Recorridos a restituir à Massa da Herança a fracção autónoma em crise nos presentes autos bem como, os bens móveis existentes à data do óbito da Autora da Herança, no interior de tal fracção, ou se assim se não entender, que condene os Recorridos a restituir à Massa da Herança o valor correspondente ao valor de aquisição da fracção em crise nos presentes autos, bem como o valor suportado pela De Cujus quanto às obras realizadas em tal fracção e, dos bens moveis que compunham o recheio da fracção, casa de morada de família da De Cujus;
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7. Os recorridos ofereceram contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso e consequente manutenção da decisão recorrida.
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8. Foram cumpridos os vistos legais.
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II. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO:
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - artigos 635º, nº 3 e 639º, n.ºs 1 e 2, do novo Código de Processo Civil, na redacção emergente da Lei n.º 41/2013 de 26.06 (doravante designado apenas por CPC).
Acresce, ainda, sem prejuízo das matérias de conhecimento oficioso, que o tribunal de recurso não pode conhecer de questões não suscitadas pelas partes em 1ª instância e, por isso, não apreciadas nessa instância, sendo que a instância recursiva, tal como configurada no sistema de recursos vigente, não se destina à prolação de novas decisões, mas à reapreciação pela instância hierarquicamente superior das decisões proferidas pelas instâncias, em função das questões convocadas pelas partes e dos fundamentos da própria decisão recorrida. [1]
Neste enquadramento, as questões que se mostram colocadas e que importa dirimir são as seguintes:
i. Da doação manual;
ii. Da restituição à massa da herança da fracção descrita nos autos, dos bens móveis e das obras realizadas na dita fracção ou, a assim não se entender, do seu valor;
iii. Do prosseguimento dos autos.
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III. FUNDAMENTAÇÃO de FACTO:
O tribunal de 1ª instância considerou provados os seguintes factos:
1) Os A.A. e a 1ª R. são filhos de F..., que faleceu em 21/02/2015 no estado de divorciada, tendo os mesmos sido habilitados como seus herdeiros – docs. de fls. 23 a 26.
2) A falecida F... fez testamento em 5/06/2012, no qual instituiu como herdeira da sua quota disponível a 1ª R. – doc. de fls. 27 a 29.
3) Por seu óbito a 1ª R. apresentou a relação de bens da falecida conforme doc. de fls. 30 a 34 cujo teor aqui se dá por reproduzido.
4) Foi feita a partilha desses bens a 1 de Abril de 2015, entre A.A. e 1ª R., tendo a esta sido atribuída a parte correspondente à quota disponível e da sua legítima.
5) Desses bens não constava o prédio urbano sito na Av. ..., n.ºs .... e ...., fração EA, correspondente a uma habitação no 5º andar direito, com entrada pelo nº. .., da Rua ..., um lugar de garagem na cave designado pelas letras EA, com entrada pelo nº. .., da Rua ..., ..., Vila Nova de Gaia.
6) Também não constavam da indicada relação de bens os móveis que compunham o seu recheio.
7) A 1ª R. declarou que o prédio e recheio é dos R.R. e por estes adquiridos.
8) Em 03/08/2012 foi outorgada escritura de compra e venda da referida fração, onde figuram como adquirentes os R.R. e como vendedor o I..., conforme doc. de fls. 35 a 38 cujo teor aqui se dá por reproduzido.
9) O prédio encontra-se registado na Conservatória do Registo Predial de Vila Nova de Gaia, conforme doc. de fls. 39 a 45 cujo teor aqui se dá por reproduzido.
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IV. FUNDAMENTAÇÃO JURÍDICA:
IV.I. Doação Manual – Restituição dos bens à massa da herança ou do seu valor:
Como resulta do despacho saneador-sentença proferido nos autos, partindo a Srª Juiz do pressuposto que o estado do processo permitia, sem necessidade de produção de quaisquer outras provas, conhecer do mérito dos pedidos formulados pelos AA. (artigo 595º, n.º 1 al. b), do CPC), no mesmo foi decretada a improcedência de todos os pedidos deduzidos pelos AA. (a título principal e subsidiário), com a consequente absolvição dos RR. de tais pedidos.
De facto, embora seja excepcional que, com o encerramento dos articulados, o julgador tenha à sua disposição todos os factos que interessam à resolução da questão de direito suscitada pelas partes ou encontre nos autos todos os elementos de prova essenciais ao julgamento da matéria de facto envolvida no litígio, certo é que, quando tal acontecer, o julgamento antecipado da causa “ não constituirá uma simples faculdade do julgador, sujeita a critérios de oportunidade ou de conveniência. “ Em tal circunstancialismo, o imediato conhecimento do mérito da causa corresponde a um dever legal do juiz, “ não deixando para mais tarde (para a sentença) aquilo que pode resolver já, o que radica num critério de economia processual e de razoabilidade, já que toda a posterior actividade processual nada acrescentaria de pertinente à questão. “ [2]
Como assim, para além de outras hipóteses, a acção deverá ser julgada improcedente no despacho saneador sempre que os factos articulados pelo autor não permitam a produção do efeito jurídico pretendido; Note-se que a decisão de improcedência será de proferir quer os factos tenham sido impugnados ou não. Isto é, a improcedência da acção resulta da afirmação/constatação da inconcludência jurídica do pedido, pois que mesmo que todos os factos alegados se demonstrassem, nem assim a acção procederia. [3]
É esta a posição subjacente ao despacho saneador-sentença recorrido, pois que, e não obstante a factualidade alegada pelos autores se mostrar substancialmente impugnada (vide artigos 1º e 2º da contestação – onde é aceite pelos RR. apenas a matéria alegada sob os artigos 1º, 2º, 3º, 4º, 5º, 7º, 20º e 24º da petição inicial e impugnada toda a demais matéria alegada), considerou, no essencial, a Srª Juiz que, de acordo com a factualidade alegada pelos AA. (e admitindo que a mesma se viesse a provar integralmente a final), a situação retratada nos autos (repete-se, na versão dos AA.) consubstanciaria uma doação de dinheiro, efectuada verbalmente pela mãe dos AA. e da 1ª Ré e com traditio, ou seja, uma doação manual, doação esta dispensada da colação nos termos do artigo 2113º, n.º 3 do Código Civil (adiante designado apenas por CC), sendo certo, ainda, que, segundo o afirmado no despacho recorrido, a presunção iuris tantum ali consignada (quanto à dispensa de colação dos bens móveis doados manualmente), não se mostrava ilidida em face da própria alegação dos AA. (de que a dita doação tina sido realizada com o fito de prejudicar os AA. e, logicamente, com o intuito de beneficiar a Ré), mas, ao invés, confirmada.
É essencialmente contra este sentido decisório que se insurgem os apelantes, sustentando, ao invés, em função das conclusões do recurso, que a situação por si alegada na petição inicial não configura uma doação manual, não existindo, pois, dispensa de colação, razão pela qual, em conformidade com o disposto no artigo 2104º, n.º 1 do CC, devem os RR., a Ré enquanto herdeira legitimária e o Réu enquanto casado com aquela, serem condenados “a restituir à massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes foram doados por este (ascendente).”
Cumpre, assim, neste contexto, conhecer da questão em apreço.
Nesta sede, cumpre, à partida, expor nos seus traços essenciais a alegação dos AA. tal qual a mesma consta da sua petição inicial, na medida em que, não só ela releva uma factualidade não inteiramente coincidente com a que se mostra invocada no despacho recorrido para efeitos de fundamento do ali decidido, como, ainda, essa factualidade se nos afigura decisiva para conhecer da questão nuclear subjacente ao dissídio em face da decisão recorrida, qual seja a noção de doação, de doação manual e se no caso dos autos existe essa modalidade de doação, com a consequente dispensa de colação, como perfilhado no despacho ora recorrido.
A alegação fundamental dos AA. é a seguinte:
a- Os AA. e a 1ª Ré são filhos de F..., falecida a 21.02.2015 (artigo 1º da petição inicial).
b- Esta última, depois de ter decidido comprar uma fracção – estando indecisa entre a fracção em causa nos autos e uma outra -, optou, sob indicação e aconselhamento dos AA., pela aquisição da fracção referida nos autos, descrita sob o artigo 6º da p.i., celebrando, desde logo, para o efeito, um contrato-promessa de compra e venda, no qual figurava a dita F... como promitente-compradora.
Mais, ainda, informou a dita F... que iria realizar alterações no interior da fracção, sendo que uma parte dessas alterações/obras iriam ser por si pagas e outra parte pelo vendedor, sendo certo, ainda, que a escritura pública de compra e venda só seria celebrada quando as ditas obras estivessem concluídas (artigos 8º a 15º da petição inicial).
c- A partir do mês de Agosto/Setembro de 2012, a dita F... passou a habitar na aludida fracção, sempre se tendo referido à mesma como sendo a sua casa e como a tendo adquirido, sendo certo que foi ela quem escolheu, comprou e pagou todos os móveis e equipamentos que, à data do seu óbito, se encontravam na casa (artigos 16º e 17º da mesma peça).
d- Todavia, após o falecimento da sua mãe, a Ré mulher declarou aos AA. (seus irmãos) que a aludida fracção havia sido adquirido por ela e pelo seu marido (ora 2º Réu), vindo os AA. a confirmar que, de facto, a 3.08.2012, tinha sido outorgada escritura pública de compra e venda da dita fracção, na qual figuram como compradores os RR. e como vendedor o “ I..., SA “, sendo que, como base em tal escritura, foi efectuado o respectivo registo de aquisição na CRP de VN Gaia a favor dos ditos RR. (artigos 20º a 24º da mesma p.i).
e- Apesar disso, na verdade, foi a aludida F... quem procedeu ao pagamento do preço da compra da fracção antes referida, ao pagamento das obras realizadas e ao pagamento do preço dos bens móveis que compunham o recheio da mesma fracção, sendo certo que foi ela quem conduziu todas as negociações tendentes à aquisição da fracção, bem como foi esta que organizou, determinou e acompanhou as obras e alterações que foram executadas na fracção, adaptando-a aos seus interesses e gosto próprios, ali vivendo desde Agosto/Setembro de 2012 e até à data do seu óbito, sempre se comportando, designadamente perante os aqui AA. e amigos, como se fosse a sua verdadeira proprietária (artigos 30º, 31º, 32º, 33º e 37º da petição inicial).
f- A aludida F... e a Ré mulher, com o intuito de prejudicar os ora AA., fizeram intervir, como compradores, na escritura pública de compra e venda da aludida fracção os RR., para se assegurarem que a mesma fracção seria da Ré mulher. (artigo 39º da petição inicial).
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Tendo presente este quadro factual alegado pelos AA., a primeira matéria que importa abordar – e ainda que a mesma não se mostre explicitada nas conclusões do recurso, apesar de abordada a latere no despacho recorrido – refere-se à putativa simulação do negócio de compra e venda celebrado a 3.08.2012, sendo certo que, à luz da alegação dos AA., nele teriam intervindo os RR., apesar de a aquisição ser na verdade da inventariada F..., que pagou o respectivo preço da fracção e passou a nela viver, arrogando-se a qualidade de verdadeira proprietária de tal fracção, devendo-se essa intervenção dos RR. no acto aquisitivo, como compradores, apenas ao acordo da Ré mulher e da inventariada (sua mãe) com o intuito de prejudicar os restantes seus filhos, ou seja, os aqui AA.
Nesta matéria, a sentença recorrida afastou – e bem, em nosso entender –, ainda que sumariamente, a verificação dos pressupostos do dito vício.
De todo o modo, e sendo certo que o tribunal pode conhecer oficiosamente – desde que se mostrem invocados nos autos os pertinentes factos – da nulidade do negócio simulado, cumpre, em termos breves, conhecer da questão.
Como resulta do disposto no artigo 240º, n.º 1 do CC, “Se por acordo entre declarante e declaratário, e no intuito de enganar terceiros, houver divergência entre a vontade negocial e a vontade real do declarante, o negócio diz-se simulado.”
Por outro lado, ainda, segundo o n.º 2 do mesmo preceito, o negócio simulado é nulo.
Conforme é posição pacífica da doutrina, a simulação, enquanto, divergência (intencional) entre a vontade negocial e a declaração supõe para a sua verificação três requisitos cumulativos, a saber: i) divergência intencional entre a vontade negocial real e a declaração negocial exteriorizada; ii) acordo simulatório entre o declarante e o declaratário (pactum simulationis); iii) intenção de enganar terceiros (com ou sem intenção de os prejudicar). [4]
No caso dos autos, como se alcança da factualidade elencada, falece, desde logo, no negócio de compra e venda a verificação de um acordo simulatório entre o declarante (vendedor, I...) e os declaratários (compradores, RR), na estrita medida em que o vendedor
é, à luz da factualidade alegada, por completo, alheio à intervenção dos RR. no negócio em causa, sendo-lhe, nessa perspectiva, indiferente a pessoa que no negócio em causa figura como comprador, desde que, naturalmente, o preço acordado lhe fosse pago.
Como assim, e ainda que, segundo a alegação dos AA., existisse um acordo entre a Ré mulher e a sua mãe, F..., para que fossem os RR. a figurar como compradores no dito contrato de compra e venda, enquanto meio de os prejudicar (pois que o imóvel faria, assim, faria parte do património dos RR. e não da “ verdadeira “ compradora, a inventariada, F...), certo é que, nada constando dos autos no sentido de que o declarante/vendedor tivesse intervindo em tal acordo entre a Ré mulher e a sua mãe, F..., é evidente que não ocorre o exigível pactum simulationis entre o declarante e o declaratário no negócio jurídico em apreço, ou seja, um dos pressupostos cumulativos da simulação, enquanto vício da declaração. [5]
Afastada, portanto, a simulação, e arrancando da validade do negócio de compra e venda em apreço, a questão que se coloca é a de saber se, em função da matéria alegada pelos AA., está em causa uma doação manual de dinheiro em favor dos RR., dinheiro que corresponde ao preço pago pela inventariada F... pela aquisição do imóvel em causa, pela realização das obras efectuadas na mesma fracção e pela aquisição dos móveis que compõem o recheio da dita fracção – como está subjacente à decisão ora recorrida – ou, ao invés, se, como sustentam os apelantes, está antes em causa uma doação indirecta do imóvel em causa (nele se integrando as obras de alteração que no mesmo foram realizadas pela inventariada F... e nele se mostram integradas) e dos bens móveis que integram o seu recheio.
Segundo o disposto no artigo 940º, n.º 1, do CC, a doação é “o contrato pelo qual uma pessoa, por espírito de liberalidade e à custa do seu património, dispõe gratuitamente de uma coisa ou de um direito, ou assume uma obrigação, em benefício do outro contraente. “
O nosso legislador, ao contrário do que sucede em outros ordenamentos jurídicos, qualificou expressamente a doação como um contrato, considerando, pois, indispensável para a formação do mesmo uma proposta negocial e uma sua posterior aceitação, sendo certo que tendo a doação por objecto uma coisa móvel, a tradição da coisa (ou do seu título representativo) é havido como aceitação por parte do donatário (cfr. artigo 945º, n.º 2, do CC). Por conseguinte, para que se conclua o processo constitutivo do contrato de doação é sempre necessária a aceitação do donatário (que deve ocorrer em vida do doador, sob pena de caducidade da proposta – cfr. artigo 945º, n.º 1, do CC). Antes da aceitação, poderá existir uma simples proposta, mas não uma doação, pois que o acordo de vontades é sempre elemento essencial, nos termos do artigo 232º do CC. [6]
A doação pressupõe três requisitos essenciais:
a) Disposição gratuita de certos bens ou direitos, ou assunção de uma dívida, em benefício do donatário, ou seja, uma atribuição patrimonial sem correspectivo;
Este primeiro requisito da doação consiste na existência de uma atribuição patrimonial geradora de um enriquecimento, ou seja, de um acto que atribua uma concreta vantagem patrimonial. O artigo 940º refere que essa atribuição patrimonial pode consistir, quer na disposição de uma coisa ou de um direito, quer na assunção de uma obrigação do donatário; Em suma, o enriquecimento patrimonial pode traduzir-se num aumento do activo do donatário como numa diminuição do seu passivo, seja por perdão, remissão ou pagamento de uma sua dívida.
b) Diminuição do património do doador;
Este segundo requisito significa que, para que exista uma doação, é suposto que ao incremento patrimonial do donatário (seja por acréscimo do activo, seja por diminuição do passivo) corresponda uma efectiva diminuição ou uma diminuição em substância do património do doador.
c) Espírito de liberalidade do doador (animus donandi).
Este último requisito significa que da parte do doador tem de existir a intenção de atribuir o correspondente benefício a outrem por simples generosidade ou espontaneidade, oposta à ideia de necessidade ou de cumprimento de um dever.
De facto, apesar de o elemento da atribuição patrimonial geradora de enriquecimento dever ser entendido em sentido objectivo, a lei acrescenta um elemento subjectivo que é o de esse enriquecimento ser determinado espontaneamente por intenção do próprio doador. O doador deve através do seu acto pretender beneficiar o donatário sem visar qualquer contrapartida patrimonial, podendo no entanto esse fim concorrer com outros intuitos ou expectativas, sendo estes considerados como meros motivos do acto e, por isso, irrelevantes. [7]
Relativamente à forma do contrato de doação, por regra, o contrato em apreço é um contrato formal já que segundo o artigo 947º, n.ºs 1 e 2, do CC (na redacção introduzida pelo DL n.º 116/2008 de 4.08), a doação de coisas imóveis só é válida se for celebrada por escritura pública ou por documento particular autenticado, ao passo que a doação de bens móveis deve observar a forma escrita, salvo se for acompanhada de tradição da coisa (ou do seu título representativo), caso em que não está “ dependente de formalidade alguma externa. “
Como refere RUTE TEXEIRA PEDRO [8] “A doação é, em princípio, um negócio formal, podendo, em certas circunstâncias, em alternativa, ser um contrato real quoad constitutionem [9]. Assim, a regra é a de que as declarações negociais do doador e do donatário devem revestir uma forma especial, escapando à aplicação da regra do art. 219º.
Se a doação tiver por objecto uma coisa imóvel deve constar de escritura pública ou de documento particular autenticado, em conformidade com o n.º 1 do citado artigo 947º.
Se a doação tiver por objecto uma coisa móvel, deve, em princípio, ser celebrado por escrito, nos termos da parte final do art. 947º, n.º 2. Ressalva-se apenas, quanto aos móveis, a situação de concomitantemente à aceitação, se verificar a tradição da coisa para o donatário; Nesse caso, a tradição, sendo considerada um elemento constitutivo do contrato, torna dispensável a forma exigida. Estas doações de móveis – denominadas doações manuais – constituem contratos reais quoad constitutionem.”
E prossegue ainda a mesma Autora “A exigência de forma ou de tradição da coisa servem o propósito idêntico de garantir a devida ponderação do doador, quanto ao acto que vai celebrar.”
Neste sentido, refere-se no AC STJ de 16.06.2016 [10] “a exigência legal de que a doação verbal de móveis seja acompanhada da tradição da coisa, o que, de resto, já se encontrava previsto no artigo 1458.º, & 2.º, do Código Civil de 1867, nas palavras de Vaz Serra “(…) funda-se na circunstância de a doação poder ser perigosa se não houver um facto que chame especialmente a atenção das partes para a gravidade do acto.”
E também como escreve Baptista Lopes: “… a necessidade de escrito, para a doação de móveis, quando não seja manual, funda-se na conveniência de evitar doações levianas, atitudes imponderadas e precipitadas, pois o escrito chama a atenção do doador para o acto pelo qual, doando móveis sem os entregar ao donatário, desfalca o seu património de uma maneira não visível materialmente. Havendo tradição, esta chama já por si mesma essa atenção.”
Todavia, como se acentua ainda no citado aresto do STJ, a tradição ou entrega não terá de ser necessariamente simultânea da declaração de doar, podendo ser anterior ou mesmo posterior a esta e podendo consistir numa entrega material da própria coisa doada ou numa entrega simbólica do bem doado, por exemplo do seu título representativo, como decorre, aliás, do disposto nos artigos 945.º, n.º 2, e 1263.º, alínea b), do CC. [11]
Em suma, considera-se doação manual a doação verbal de coisas móveis acompanhadas da sua tradição manual, isto é, da transmissão da sua posse, da entrega pelo doador ao donatário da(s) coisa(s), entrega essa que, porém, não tem que ser contemporânea da própria declaração verbal do doador, e que não necessita de ser provada por documento.
De todo o modo, certo é que, sendo exigida a forma escrita (quanto à doação de bens móveis sem tradição da coisa) ou a forma de escritura pública ou documento autenticado (quanto à doação de bens imóveis), não sendo observada essa formal legal, em conformidade com o disposto no artigo 220º do CC, a doação será nula por vício de forma.
Relativamente aos efeitos da doação, consagrados no artigo 954º, do CC [12], de acordo com a doutrina, tem a mesma efeitos obrigacionais e reais. Nas três alíneas do artigo encontram-se dois efeitos obrigacionais (als. b e c) e um efeito real (al. a).
Os efeitos essenciais da doação variam em função do objecto doado e da modalidade de formação do contrato; Assim, quando a doação tem por objecto uma coisa ou um direito real, e não se trate de uma doação manual prevista no artigo 947º, n.º 2 (pois que esta, como se referiu, tem por objecto bens móveis acompanhados da respectiva tradição da coisa), o contrato produz os efeitos obrigacionais e reais consagrados nas alíneas a) e b) do artigo 954º; Diversamente, quando tenha por objecto uma coisa móvel e no acto da sua celebração tenha sido integrada a tradição da coisa, a doação só produzirá o efeito real enunciado na alínea a) do mesmo normativo. Finalmente, se a doação tiver por objecto a constituição de um direito de crédito a favor do donatário – quando o doador assume uma obrigação em favor do outro contraente – o contrato produz apenas o efeito obrigacional referido na alínea c) do preceito em causa. [13]
Definido, assim, para o que ora releva, nos seus traços essenciais, o contrato de doação e o seu regime, é tempo de analisar o caso dos autos, em função das questões suscitadas no recurso.
A primeira matéria que importa abordar refere-se aos bens móveis discutidos nos autos, ou seja, as obras alegadamente realizadas pela inventariada F... na fracção em discussão, assim como os bens móveis que integram o recheio dessa mesma fracção.
Na decisão recorrida, entendeu-se que subjacente ao pagamento do preço de tais obras e bens móveis estava em causa uma doação de dinheiro (equivalente ao dito preço) da inventariada F... em favor da sua filha, 1ª Ré e, ainda, que essa doação de tais quantias consubstanciaria uma doação manual, dispensada da colação ao abrigo do preceituado no artigo 2113º, n.º 3, do CC, sendo certo que, ainda que susceptível de ser ilidida a presunção ali consignada (de que através da doação o doador pretende beneficiar o donatário em detrimento dos demais herdeiros legitimários e não apenas adiantar-lhe em vida uma parte do seu património que há-de de vir a competir-lhe, ou seja, fazer uma espécie de adiantamento por conta da quota hereditária do donatário), no caso essa presunção não se mostra ilidida, antes confirmada pelo facto alegado pelos próprios AA. de que o propósito da inventariada foi o de prejudicar os AA. (filhos da inventariada) e, logicamente, beneficiar, mediante a dispensa da colação, a Ré, também sua filha e irmã dos AA.
Neste pressuposto, dir-se-á, à partida, que não existem dúvidas que a entrega de dinheiro com animus donandi por parte do doador e a sua aceitação pelo donatário constitui uma doação manual que, enquanto tal, estará, à partida, dispensada da colação, em conformidade com o disposto no artigo 2113º, n.º 3, do CC.
Neste contexto, não nos merece, pois, qualquer discordância a jurisprudência convocada pela Exmª Srª Juiz a quo na decisão recorrida em sustento da posição ali adoptada.
Na verdade, como se escreveu no Acórdão desta Relação de 22.04.2008 “Por doação manual entende-se todo o acto pelo qual o tradens, com animus donandi, entrega bem móvel, no caso determinadas quantias em dinheiro, ao accipiens que, pelo simples facto de o receber e dele tomar posse, revela vontade de aceitar a liberalidade.”[14]
Por conseguinte, à partida, a dita doação manual de dinheiro estará dispensada da colação, o que não significa, note-se, como devidamente se salienta no AC desta Relação de 27.01.2015 (também citado na decisão recorrida) [15], que a dita doação não deva ser relacionada no inventário para efeitos de cálculo da legítima e da quota disponível e eventual redução da doação por inoficiosidade; Todavia, como bem se salienta na decisão recorrida, não é isso que está em causa no presente processo, pois que o pedido formulado pelos AA. não se reconduz ao relacionamento de tal doação, nem, ainda, à sua redução, mas à colação de tal montante, isto é, à restituição de tais bens ou valores à massa da herança, sendo certo, ademais, que, como também se salienta na decisão recorrida, essas questões (relacionadas com as operações prévias à partilha) só podem ser dirimidas no processo de inventário e não nestes autos de processo comum.
Dito isto, e no que se refere aos ditos bens móveis, não cremos, porém, com o devido respeito, que existam nos autos e em função da estrita alegação dos AA. (e que suporta a decisão decorrida, pois que a mesma foi proferida em audiência prévia e a título de saneador-sentença) elementos de facto bastantes para dar por provada a invocada doação e, logicamente, para a considerar como uma doação (manual ou não).
Com efeito, como já se referiu, a doação é um contrato e supõe necessariamente uma convergência de duas vontades negociais, ou seja, uma declaração de doar por parte do doador (proposta contratual) e uma aceitação posterior dessa proposta, aceitação essa que pode decorrer da mera aceitação da entrega da coisa móvel doada.
Ora, neste enquadramento, compulsada a petição inicial dos AA. – e cujos traços essenciais já antes deixámos expostos – em parte nenhuma se alega que a inventariada F... doou ou pretendeu doar/agraciar a 1ª Ré, sua filha, com as obras que realizou na fracção em causa ou com o recheio da mesma fracção; O que resulta de tal alegação é, outrossim, que a dita F... escolheu e decidiu das obras/alterações a realizar na fracção que pretendia adquirir, tendo procedido ao pagamento do preço das mesmas ao respectivo empreiteiro(s), e passou a disfrutar da fracção em causa (com as ditas alterações por si decididas) desde Agosto/Setembro de 2012 e até à data do seu óbito, assim como, ainda, escolheu, comprou (pagando o preço aos respectivos fornecedores/vendedores) os móveis/equipamentos que constituem o recheio de tal habitação e de que usufruiu também até à data do seu óbito, sendo que os RR., enquanto proprietários da fracção em causa (por assim figurarem na escritura de compra e venda da mesma), se recusaram a entregar a fracção, nesse pressuposto, ou seja, enquanto seus proprietários com as alterações que nela foram introduzidas e com o seu respectivo recheio, ou seja, com os móveis e equipamentos nela existentes à data do óbito da inventariada F....
Vale, pois, por dizer que, em função da própria alegação dos AA., não só não é possível dizer-se, ao contrário do que sustenta a apelante, que existiu uma doação de tais obras realizadas na fracção ou uma doação do recheio nela existente, como, ainda, aqui ao contrário do que se mostra defendido na decisão recorrida, que existe uma doação manual do dinheiro correspondente ao preço das obras ou ao preço dos bens móveis que constituem o recheio, na estrita medida em que da factualidade alegada não emerge, em nosso ver, que o pagamento de tais quantias aos respectivos credores tenha subjacente um qualquer animus donandi, um propósito de doação, mesmo que indirecta ou tácita, por parte da inventariada F... quanto a tais bens móveis, obras ou, ainda, quanto a tal quantia em dinheiro; Na verdade, um tal propósito ou animus, pelo menos quanto às ditas obras e recheio, é em absoluto omisso da factualidade alegada pelos AA. na sua petição inicial.
Destarte, não existindo uma doação dir-se-ia, à partida, que excluída estaria também a colação de tais bens ou valores, à luz do preceituado no artigo 2014º, n.º 1, do CC.
Todavia, importa referir que se se entender que quanto ao imóvel/fracção existiu uma doação indirecta (questão de que conheceremos em seguida), então, em nosso ver, o dispêndio das quantias com a realização de obras nessa fracção e com a aquisição do respectivo recheio assumirá a natureza de doação em conformidade com o preceituado nos artigos 2104º, n.º 2 e 2110º, do mesmo CC.
De facto, como resulta da concatenação de tais normativos, consideram-se como doações para efeitos de colação não apenas as doações mas, ainda, “tudo quanto o falecido tiver despendido gratuitamente em proveito dos descendentes.”
Dito de outra forma, como salienta L. CARVALHO FERNANDES [16], apesar de o objecto privilegiado da colação serem as doações a favor dos descendentes, a lei equipara às doações, para efeito de colação, outras atribuições patrimoniais gratuitas feitas a descendentes.
Ora, como se referiu, se se admitir que a aquisição da fracção em referência nos autos pode consubstanciar uma doação (indirecta) da mesma, isso significa, em nosso ver, que a realização de obras de beneficiação da fracção e a aquisição do respectivo recheio se traduzem em dispêndios gratuitos em proveito dos RR., incluindo a 1ª Ré, herdeira legitimária da inventariada (artigo 2157º, do CC), enquanto proprietários da fracção e consequente beneficiários de tais obras e do respectivo recheio/equipamentos que dela fazem parte.
É certo, diga-se, que os apelantes não deram à causa esta roupagem jurídica, mas, como é consabido, o tribunal está sujeito apenas às alegações de facto das partes, mas já não à sua qualificação jurídica, assistindo-lhe, pois, plena liberdade nessa diversa qualificação (artigo 5º, n.º 3, do CPC), desde que, naturalmente, essa outra qualificação seja compatível – como ora sucede – com as pretensões formuladas pelos AA., pelo menos, com as pretensões que foram deduzidas a título subsidiário.
Significa isto que, em nosso ver, é, no mínimo, discutível que quanto aos valores despendidos pela inventariada F... na realização das obras em causa e na aquisição do recheio da fracção não estejam os mesmos sujeitos à colação, em conformidade com o preceituado nos citados artigos 2104º, n.º 2 e 2110º, ambos do CC, como se mostra afirmado no despacho saneador-sentença recorrido, sendo certo, ademais, que os RR. não só impugnaram a factualidade alegada pelos AA., como, ainda, alegaram que a aquisição da fracção e a realização das despesas ora em causa foram realizadas com meios próprios e não da inventariada.
Trata-se, em nosso ver e com o devido respeito por opinião em contrário, de matéria factual (a alegada pelos AA. e pelos RR.) que importará, pois, ser devidamente submetida a prova para, em função do quadro factual final, poder merecer posterior decisão jurídica segura e conscienciosa.
E o mesmo sucede, ainda, em relação à aquisição da fracção ora em causa nos autos.
Quanto a esta aquisição – e tendo por base o mesmo raciocínio já antes explicitado – o despacho recorrido sustentou que estaria em causa uma doação manual do dinheiro do preço de tal aquisição (€ 77.500,00), doação esta que, como tal, se encontra dispensada da colação, em conformidade com o disposto no artigo 2113º, n.º 3, do CC, preceito este que prevê que a colação se presume sempre dispensada nas doações manuais e nas doações remuneratórias.
Em nosso ver, e como se defende no Acórdão desta Relação de 31.03.2005 [17] – referido pelos apelantes nas suas alegações e que versa sobre situação muito similar à dos presentes autos -, afigura-se-nos, desde logo, discutível que se esteja perante uma doação (manual) de dinheiro quando, em face da própria alegação dos AA., não houve qualquer entrega do dinheiro em apreço pela inventariada F... aos ora RR..
Na verdade, apesar de referirem que a inventariada F... procedeu em 29.05.2012 a transferências de valores para uma “conta terceira” (?!) - sem que explicitem a quem pertence tal conta e, em particular, se essa transferência ocorreu em favor dos RR. (vide artigos 25º a 26º da petição inicial) -, certo é que os AA. alegam também que foi a inventariada quem assumiu e liquidou o valor da aquisição ao vendedor na data da escritura pública de compra e venda a 3.08.2012, que era ela quem efectivamente pretendia adquirir a dita fracção e a escolheu e negociou , tendo feito intervir no acto como compradores os RR. apenas com o fito de os prejudicar e beneficiar a 1ª Ré mulher, na estrita medida em que o dito imóvel não faria assim parte do seu património, nomeadamente à data do seu óbito, mas antes seria pertença dos RR., e, ainda, que estes não tinham à data meios para proceder ao pagamento do preço de tal fracção. (cfr. artigos 22º, 27º, 28º, 29º, 32º, 35º e 39º, todos da p.i.)
Ora, em face desta alegação, não se nos afigura consentâneo afirmar-se que ocorreu uma doação da quantia equivalente ao preço quando essa outra quantia não esteve nunca na disponibilidade dos RR., antes tendo sido, segundo o que resulta da alegação dos AA., entregue directamente pela inventariada ao vendedor.
É certo que os AA., de forma conclusiva, referem na sua petição que “ estamos perante uma doação do imóvel ou, pelo menos, do valor em numerário correspondente ao preço pago “ (artigo 37º da petição inicial) ou, ainda, que “ estamos, por isso, perante um negócio indirecto de doação “, mas o que revela não é o que os AA. concluem mas antes o que os factos concretos por si alegados significam à luz da sua interpretação e do respectivo enquadramento jurídico, tarefa esta que incumbe ao tribunal.
Ora, neste enquadramento, somos tentados a referir, tal como sucedeu no Acórdão desta Relação de 31.03.2015, que o que a matéria de facto alegada revela é que, se é certo que na perspectiva do vendedor, teve lugar uma verdadeira venda do imóvel – pois que o imóvel foi vendido por um determinado preço e não dado – não é menos certo que o que também, efectivamente, aconteceu por via da celebração de tal negócio, agora na relação entre a inventariada F... e os RR., foi uma verdadeira doação da fracção da mãe à filha, 1ª Ré e a seu marido, o 2º Réu, e não do seu respectivo preço em dinheiro.
E, como se refere ainda no mesmo aresto, não é pelo facto de a inventariada não ter tido participação formal directa na escritura de compra e venda da fracção que deixou de ser parte activa no negócio; É que, à luz da factualidade alegada, foi ela quem escolheu a fracção, quem a negociou e quem a pagou ao vendedor, vindo os RR. a figurar como compradores apenas por vontade da inventariada (e aceitação dos RR.) e como forma de prejudicar os AA.; Ou seja, não obstante a inventariada ter feito intervir na escritura pública de compra e venda os RR., a fracção foi efectivamente adquirida por aquela para a dar a estes últimos, com o fito de beneficiar a 1ª Ré perante os seus restantes irmãos, os ora AA.. Foi este, à luz da factualidade alegada, o objectivo da inventariada: fazer uma liberalidade aos RR., em especial a 1ª Ré, sua filha, enriquecendo-a à custa do seu património, com o intuito de afastar os AA., seus filhos, de eventuais direitos sobre essa fracção, em caso de vir a ocorrer o seu óbito.
Por conseguinte, como se refere ainda no citado aresto desta Relação, não se nos afigura possível sustentar-se que o que houve foi apenas uma doação do dinheiro – preço do prédio. É que, da mesma forma que tal não poderia ser afirmado caso tivesse havido duas escrituras – uma de compra e venda entre o Banco/vendedor e a inventariada como compradora seguida de outra de doação a favor dos RR. -, “também não é correcto dizer-se que houve doação do dinheiro só pelo facto de o doador ter escolhido como meio tradício, já não uma escritura de doação subsequente à venda, mas apenas esta, com intervenção nela do presenteado.”
Em suma, no contrato sub judice em que a inventariada adquire o imóvel para o dar à sua filha (1ª Ré), e, para atingir tal desiderato, a faz intervir (com o marido), como compradores, na respectiva escritura, existe uma doação indirecta. Isto mesmo defende J. LOPES CARDOSO quando refere “No âmbito global da colação (e, assim, na relacionação respectiva) compreendem-se não só as doações com observância do próprio formalismo, como também as denominadas doações indirectas (compras pelo pai em nome dos filhos, pagamentos de dívidas destes, renúncias de que os filhos tiraram proveito, etc.). [18] (sublinhado nosso)
Portanto, será, em nosso ver, perfeitamente sustentável e até o mais correcto, ao contrário do que se sustenta no despacho recorrido, ter-se como verificada, no caso, uma verdadeira doação indirecta de imóvel – e formalmente válida, pois a forma utilizada como meio (apenas mais expedito) de a inventariada/doadora transferir, desde logo, a fracção em causa para os RR. foi precisamente a venda directa a estes últimos por escritura pública, meio bastante para assegurar a validade formal da doação de imóveis (artigo 947º, n.º 1, do CC).
Dito isto, coloca-se, no entanto, a questão de saber se esta doação está sujeita à colação.
Como resulta da alegação dos AA., a dita venda, rectius doação (indirecta) foi levada a cabo com o propósito de beneficiar a 1ª Ré (filha da inventariada) e para prejudicar, por seu turno, os próprios, também filhos da inventariada.
A colação encontra-se prevista no artigo 2104º, n.º 1, do CC que estipula que “Os descendentes que pretendam entrar na sucessão do ascendente devem restituir à massa da herança, para igualação da partilha, os bens ou valores que lhes foram doados por este: esta restituição tem o nome de colação.”

A colação consiste no instituto destinado a proteger os herdeiros legitimários do doador, “tendo por fim a igualação, na partilha, do descendente donatário com os demais descendentes do autor da herança.” [19]
Trata-se, grosso modo, de uma restituição à herança dos bens ou dos valores que foram doados em vida ao descendente que pretenda entrar na partilha, partindo daquela que será, à partida, a vontade presumida do autor da sucessão.
De facto, segundo as regras da normalidade, é de aceitar que quando o de cujus faz uma doação a descendentes legitimários ou despesas com estes, que, de acordo com a lei, lhe são equiparáveis, não quer beneficiá-los, em detrimento dos outros, mas apenas adiantar-lhes a sua quota hereditária; Assim, a partir desta presunção, a colação visa que, no momento da partilha, todos os herdeiros legitimários recebam o mesmo, pois que o doador não terá querido avantajar uns em desfavor dos outros.
No caso dos autos, não há dúvidas que quer os AA., quer a 1ª Ré eram, à data da liberalidade (artigo 2105º, do CC), herdeiros legitimários da inventariada F..., pois que são todos seus filhos (artigo 2157º, do CC).
Todavia, à luz do antes exposto, dir-se-ia que, no caso dos autos, não poderia haver lugar à colação; Efectivamente, sendo a razão de ser da colação a presunção iuris tantum de que o doador não quis beneficiar o seu herdeiro legitimário em detrimento dos outros, mas apenas antecipar a transferência da parte do seu património que há-de competir-lhe, e alegando os AA. que a doação foi realizada com intuito de os prejudicar e beneficiar a outra filha (a 1ª Ré), logo se poderia concluir que ficou afastada a colação.
Sucede, no entanto, que se é certo que o doador pode dispensar expressa ou tacitamente a colação, quer momento da doação, quer em momento posterior (artigo 2113º, n.º 1, do CC) – e então a doação é imputada na quota disponível (artigo 2114º, n.º 1, do CC) -, certo é também que se a doação tiver obedecido a alguma formalidade externa, a dispensa de colação tem necessariamente que revestir a mesma forma ou de ser feita em testamento, em conformidade com o preceituado no n.º 2 do artigo 2113º.
Efectivamente, como se refere, ainda, no citado Acórdão desta Relação, que aqui se vem acompanhando de perto, o acto de dispensa voluntária da colação da doação segue o princípio da equivalência face à forma efectivamente usada para o acto de doação, pois que o aludido n.º 2 do artigo 2113º refere que “se a doação tiver sido acompanhada de alguma formalidade externa, só pela mesma forma, ou por testamento, pode ser dispensada.”
Ora, no caso dos autos, tal como no caso sobre que versa o dito Acórdão desta Relação, ter-se-á de entender que a doação indirecta feita pela inventariada aos RR. obedeceu à formalidade externa que a escritura pública de compra e venda outorgada 3.08.2012 consubstanciou. Outra coisa não podia, de facto, entender-se já que foi precisamente por via desse negócio directo (a compra e venda) que se operou e concretizou o negócio indirecto, a doação.
Assim sendo, não existindo qualquer declaração, expressa ou tácita, de dispensa de colação que tenha revestido a mesma forma empregue para a doação – escritura pública – ou, ainda, testamento em que tenha sido consignada essa dispensa, tal significa, em nosso ver, que não existe válida dispensa de colação e, como tal, a doação está sujeita à colação, em sentido oposto ao que foi decidido pelo Tribunal de 1ª instância.
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IV.II. Prosseguimento dos autos:
Nestes termos, atento o antes exposto (e mesmo admitindo que a solução ora por nós aventada são seja líquida ou a única, mas sendo ela, em nosso ver, absolutamente plausível), tendo, ainda, presente, não só que se encontra impugnada a versão carreada aos autos pelos AA., mas também que os RR. invocaram na sua contestação que a fracção em apreço foi adquirida com recurso a meios próprios seus, tal vem a significar que, em face da matéria de facto relevante para a decisão que permanece controvertida e em face da controvérsia sobre as questões jurídicas suscitadas nos autos, se nos apresenta como prematuro o conhecimento do mérito da causa logo após o termo da fase dos articulados; Ao invés, cremos que devem os autos prosseguir os seus ulteriores termos para, em função do quadro factual definitivo que se venha a apurar, possam essas questões ser dirimidas com a exigível segurança e consciência, seja em 1ª instância, seja nesta outra instância superior, se vier a existir recurso a final.
Como salienta J. LEBRE de FREITAS [20] e vem sendo posição reiterada pela doutrina e jurisprudência, “o conhecimento de mérito só deve ter lugar quando o processo contenha todos os elementos necessários para uma decisão conscienciosa, segundo as várias soluções plausíveis de direito e não apenas tendo em vista a partilhada pelo juiz da causa”. Ou, como refere PAULO PIMENTA, op. cit., pág. 257, nestas situações – em que existem factos controvertidos com relevo directo para a decisão e/ou a questão de direito pode ter mais do que uma solução – “justifica-se que o juiz só conheça do mérito da causa no despacho saneador quando possa emitir uma decisão segura que, em princípio, não seja afectada pela evolução posterior do processo, designadamente em via de recurso.”
Dito de outra forma, por uma questão de cautela, o juiz deverá usar um critério objectivo, isto é, tomando como referência indicadores que não se cinjam apenas à sua própria convicção acerca da solução jurídica do problema, ou seja, aferindo se, de facto, a sua posição e a sua solução se apresentam de tal modo como inequívocas que, por princípio, não serão postas em causa por uma outra posição e solução (doutrinaria ou jurisprudencialmente perfilhadas) que conduza à alteração do decidido, designadamente por via de recurso.
Ora, no caso, em função do exposto e sustentado, a posição defendida pelo Tribunal de 1ª instância, não é a única defensável, bem pelo contrário, sobretudo quanto à questão essencial e controvertida da colação dos bens ou valores em discussão nos autos entre as partes e os seus efeitos, revelando-se, além disso, essencial para uma decisão segura e conscienciosa o integral e definitivo apuramento de factos relevantes para a solução das ditas questões, sejam os que foram alegados pelos AA., seja os que, em contraposição, foram alegados pelos RR..
O que, em conclusão, impõe a procedência da apelação, não no sentido da imediata procedência da causa – que não pode ser decretada pela simples e óbvia razão de que permanecem controvertidas as versões opostas apresentadas pelas partes -, mas no sentido do prosseguimento dos autos para efeitos de realização da legal audiência prévia e ulterior julgamento da causa.
Dito isto, e sem prejuízo do que se expôs, existe, no entanto, um segmento decisório perfilhado pelo Tribunal de 1ª instância que não pode deixar de ser confirmado nesta instância, pois que é inequívoco que a restituição à massa da herança, por força da possível colação, não pode ter lugar através da restituição dos próprios bens em causa.
Explicitando.
Como resulta dos pedidos formulados pelos AA. reclamam estes a título principal (pontos A e B do petitório) que os RR. sejam condenados a restituir à massa da herança a fracção autónoma e os bens móveis existentes no interior da fracção. A título subsidiário (pontos C e D) pedem a restituição dos valores da fracção e das obras nela realizadas.
O pedido subsidiário, como é consabido, é o que é formulado para ser tomado em consideração somente no caso de não proceder um pedido anterior (artigo 554º, n.º 1, do CPC).
Ora, quanto à colação/restituição ela pode realizar-se em substância (isto é, pela restituição dos próprios bens doados massa da herança e para efeitos de igualação da partilha) ou em valor (isto é pelo valor dos bens doados).
Neste sentido, estipula o artigo 2108º, n.º 1, do CC, que “a colação faz-se pela imputação do valor da doação ou da importância das despesas na quota hereditária, ou pela restituição dos próprios bens doados, se houver acordo de todos os herdeiros.” (sublinhado nosso)
Como salienta a este propósito L. CARVALHO FERNANDES, op. cit., pág. 399 [21], “como regra, é o regime de imputação do valor da doação (…) que a lei acolhe. A restituição em espécie depende da aceitação de todos os herdeiros.” (sublinhado nosso)
Significa isto que, quando não existir acordo de todos os herdeiros – como é o caso dos autos – é inviável a restituição à herança dos próprios bens doados, restando, pois, apenas e só a sua restituição em valor, calculado nos termos legais.
Ora, no caso em apreço, certo é que, mesmo que se admita a sujeição à colação da doação da fracção em causa e das despesas realizadas pela inventariada com a aquisição dos bens móveis do recheio da fracção, inexistindo acordo de todos os herdeiros (AA. e 1ª Ré), é evidente e seguro desde já afirmar-se que os pedidos formulados em A e B estão irremediavelmente condenados à improcedência, pois que a restituição em espécie peticionada não pode proceder por ausência de acordo dos herdeiros.
O que significa, pois, que quanto à improcedência dos pedidos principais formulados em A e B da petição inicial é de confirmar o decidido pelo Tribunal de 1ª instância, ainda que por diversa fundamentação da invocada, prosseguindo os autos – nos termos já explicitados – apenas para o conhecimento dos pedidos subsidiários formulados em C), D) e E).
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V. DECISÃO:
Pelos fundamentos expostos, acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto em julgar parcialmente procedente a apelação e, em consequência,
a). confirmar a sentença recorrida na parte que decretou a improcedência dos pedidos formulados pelos AA. a título principal, ainda que por fundamentação distinta da invocada;
b). revogar a sentença recorrida na parte que decretou a improcedência dos pedidos formulados pelos AA. a título subsidiário, devendo, apenas quanto a estes pedidos, prosseguirem os autos os seus ulteriores termos e tendo em vista o oportuno conhecimento do mérito dos mesmos.
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Custas pela parte que vier a ficar vencida a final.
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Porto, 15.11.2018
Jorge Seabra
Fátima Andrade
Fernanda Almeida

(O presente acórdão não segue na sua redacção o novo acordo ortográfico)
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[1] Vide, neste sentido, F. AMÂNCIO FERREIRA, “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 8ª edição, pág. 147 e A. ABRANTES GERALDES, “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2ª edição, pág. 92-93.
[2] Vide, neste sentido, A. VARELA, “Manual de Processo Civil”, 2ª edição, Revista e Actualizada, pág. 386, A. ANSELMO de CASTRO, “Direito Processual Civil Declaratório”, III volume, pág. 254 e PAULO PIMENTA, “Processo Civil Declarativo”, 2015, pág. 255.
[3] Vide, neste sentido, PAULO PIMENTA, op. cit., pág. 255-256 e A. CASTRO, op. cit., pág. 253.
[4] Vide, neste sentido, por todos, A. BARRETO MENEZES CORDEIRO, “Da Simulação no Direito Civil”, 2ª edição, pág. 65, MANUEL de ANDRADE, “Teoria Geral da Relação Jurídica”, II volume, 1987, pág. 169-171 e ANA FILIPA MORAIS ANTUNES, “Comentário do Código Civil – Parte Geral”, UCP, 2014, pág. 553.
[5] Sobre a distinção entre os vícios da declaração (divergência intencional ou não intencional entre a vontade negocial real a e vontade negocial exteriormente declarada) e os vícios da vontade (erro-vício), vide, por todos, MANUEL de ANDRDADE, op. cit., pág. 151-152, ANA FILIPA MORAIS ANTUNES, in “Comentário ao Código Civil – Parte Geral”, UCP, 2014, pág. 592.
[6] Vide, neste sentido, por todos, L. MENEZES LEITÃO, “Direito das Obrigações - Contratos em Especial”, III volume, 5ª edição, pág.169-170 e P. LIMA, A. VARELA, “Código Civil Anotado”, II volume, 3ª edição, pág. 267.
[7] Sobre os elementos do contrato de doação e no sentido perfilhado no texto, vide, por todos, L. MENEZES LEITÃO, op. cit., pág. 170-173, P. LIMA, A. VARELA, op. cit., II volume, pág. 257-260, MANUEL BAPTISTA LOPES, “Das Doações”, 1970, pág. 11-17 e ANA PRATA (Coord.),”Código Civil Anotado”, I volume, 2017, pág. 1156-1160.
[8] RUTE TEIXEIRA PEDRO, anotação ao artigo 947º, in “Código Civil Anotado”, ANA PRATA (Coord.), cit., pág. 1171.
[9] Sobre a distinção entre os negócios meramente consensuais e os negócios reais, em que é exigida a entrega da coisa para a conclusão do negócio, vide, por todos, MANUEL de ANDRADE, op. cit., II volume, pág. 50-51 ou, ainda, PEDRO PAIS VASCONCELOS, “Teoria Geral do Direito Civil”, 7ª edição, pág. 380-381.
[10] Processo n.º 865/13.6TBDL.L1.S1, relator Juiz Conselheiro TOMÉ GOMES, disponível in www.dgsi.pt.
[11] BAPTISTA LOPES, op. cit., pág. 42, nota 1. Aí se escreve “A tradição pode, pois, ser anterior ou posterior à declaração de doar ou serem esta e aquela simultâneas.”
[12] Preceitua o artigo 954º do CC que a doação tem como efeitos essenciais: a) A transmissão da propriedade da coisa ou da titularidade do direito; b) A obrigação de entregar a coisa; c) A assunção da obrigação, quando for esse o objecto do contrato.
[13] RUTE TEIXEIRA PEDRO, op. cit., pág. 1178-1179.
[14] Processo n.º 0822226, relator VIEIRA e CUNHA, disponível in www.dgsi.pt.
[15] Processo n.º 2727/09.2TBVCD-A.P1, relator FRANCISCO MATOS ou, ainda, no mesmo sentido, por todos, AC RP de 29.09.2011, Processo n.º 144/09.3TBPNF-A.P1, relator TELLES MENEZES, AC RP de 26.02.2013, Processo n.º 153/11.2T2ETR.P1, relator MARIA JOÃO AREIAS, todos in www.dgsi.pt.
[16] L. CARVALHO FERNANDES, “Lições de Direito das Sucessões”, Quid Iuris, 2ª edição, pág. 396; Vide, ainda, no mesmo sentido, P. LIMA, A. VARELA, op. cit., VI volume, pág. 174 e CARLOS PAMPLONA CORTE REAL, “Direito da Família e das Sucessões”, Lex, 1993, pág. 313.
[17] Processo n.º 0531136, relator FERNANDO BAPTISTA, disponível in www.dgsi.pt.
[18] J. A. LOPES CARDOSO, “Partilhas Judiciais”, I volume, 4ª edição, 1990, pág. 429-430, nota 1232. Vide, ainda, fazendo alusão à figura da doação indirecta, ainda que noutro âmbito, AC STJ de 17.06.2014, Processo n.º 930/11.4TVAVR.C1.S1, relator Consº FERNANDES do VALE, disponível in www.dgsi.pt.
Sobre as doações indirectas vide, ainda, CARLOS FERREIRA de ALMEIDA, “Contratos III – Contratos de Liberalidade, de Cooperação e de Risco”, 2ª edição, 2017, pág. 53; O Autor crítica a utilidade do conceito no ordenamento jurídico português, sustentando que as situações a que a mesma é normalmente associada podem ser tratadas como verdadeiras doações, sendo, pois, dispensável, na sua perspectiva a utilização de um conceito distinto da doação.
[19] Vide, neste sentido, por todos, P. LIMA, A. VARELA, op. cit., VI volume, pág. 173 e, ainda, L. CARVALHO FERNANDES, op. cit., pág. 387.
[20] J. LEBRE de FREITAS, ISABEL ALEXANDRE, “CPC Anotado”, 2º volume, 3ª edição, 2018, pág. 659.
[21] Vide, ainda, sobre a matéria, no mesmo sentido, RABINDRANATH CAPELO de SOUSA, “Lições de Direito das Sucessões”, II volume, 2ª edição (reimpressão), 1990, pág. 321-327.