Acórdão do Tribunal da Relação do Porto | |||
Processo: |
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Nº Convencional: | JTRP000 | ||
Relator: | PAULA LEAL DE CARVALHO | ||
Descritores: | RETRIBUIÇÕES INTERCALARES | ||
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Nº do Documento: | RP202306051658/21.2T8VFR-A.P2 | ||
Data do Acordão: | 06/05/2023 | ||
Votação: | UNANIMIDADE | ||
Texto Integral: | S | ||
Privacidade: | 1 | ||
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Meio Processual: | APELAÇÃO | ||
Decisão: | PARCIALMENTE PROCEDENTE; ALTERADA A SENTENÇA | ||
Indicações Eventuais: | 4. ª SECÇÃO SOCIAL | ||
Área Temática: | . | ||
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Sumário: | O termo final a atender, quanto às retribuições intercalares em caso de ilicitude do despedimento, é, nos termos e para os efeitos do art. 390º, nº 1, do CT/2009 [“(…) até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento”], a data em que transita em julgado o segmento decisório que declara a ilicitude do despedimento e condena no pagamento das retribuições intercalares, ainda que da sentença haja sido interposto recurso mas cujo objeto haja sido, nos termos do art. 635º, nºs 2 e 4, do CPC, restringido pelas partes a outras questões que não aquelas. | ||
Reclamações: | |||
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Decisão Texto Integral: | Procº nº 1658/21.2T8VFR-A.P2 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1334) Adjuntos: Des. Rui Penha Des. Jerónimo Freitas Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório AA, deduziu o presente incidente de liquidação de sentença contra A..., Lda, pedindo a fixação em €20.639,88 do valor a pagar pela ré a título de retribuições vencidas desde 10/02/2022 até ao trânsito em julgado da sentença, ocorrido em 31/07/2022, deduzidos já os valores que recebeu a título de subsídio de desemprego. Regularmente citada a ré, veio a mesma deduzir contestação, alegando, em suma, que o segmento decisório relativo à ilicitude do despedimento e, por decorrência, do pagamento das retribuições intercalares não foi objeto de recurso pelas partes, pelo que transitou em julgado após a prolação da sentença em primeira instância. Mais diz que no recurso por si interposto da sentença delimitou o seu objeto, declarando expressamente aceitar a parte da decisão que agora é convocada. Nessa medida, pagou ao autor as retribuições que lhe eram devidas até à data da sentença. Conclui no sentido da improcedência do presente incidente. O autor reafirmou que a ré foi condenada a pagar-lhe as retribuições vencidas até ao trânsito em julgado da sentença. Realizou-se a audiência prévia, na qual foi concedida às partes a possibilidade de se pronunciarem, após o que foi proferido despacho saneador/sentença, consignado na ata da referida audiência, que julgou o incidente nos seguintes termos: “Nestes termos, julgo parcialmente procedente o presente incidente de liquidação e, consequentemente, condeno A..., Lda. a pagar a AA a quantia de €2.333,85 (dois mil trezentos e trinta e três euros e oitenta e cinco cêntimos) a título de retribuições em dívida pelo período decorrido entre 10/02/2022 e 01/03/2022, absolvendo-a do demais peticionado. * Custas a cargo do autor e da ré, na proporção do respectivo decaimento, nos termos do disposto no artigo 527.º, n.os 1 e 2 do Código de Processo Civil. * * * Valor do incidente: ao abrigo do disposto no artigo 297.º, n.ºs 1 e 2 e 306.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, fixo o valor do incidente em €20.639,88 (vinte mil seiscentos e trinta e nove euros e oitenta e oito cêntimos).”Inconformado, o A. veio recorrer, tendo formulado as seguintes conclusões: “1ª A sentença dada à liquidação condenou a R., no ponto 2.1, no valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença. 2ª O trânsito em julgado da sentença só ocorreu com o acórdão da RP de 13.7.2022. 3ª A decisão recorrida, ao considerar que o trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento ocorreu em 1.3.2022, uma vez que nenhuma das partes recorreu dessa decisão, fez uma cisão ilegítima desse segmento decisório, para efeitos de trânsito em julgado, que a lei não permite (artºs 628º e 635º do CPC) e que viola o caso julgado anterior, pois na sentença nem sequer se utilizou a fórmula do artº 390º, nº 1, do CT («até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento»). 4ª O trânsito em julgado corresponde a uma qualidade de uma sentença e não apenas de um segmento decisório: O trânsito em julgado, na parte da declaração da ilicitude, não é cindível, como sustentou a decisão recorrida. 5ª A decisão recorrida não analisou sequer o conteúdo da sentença condenatória anterior, cometendo a nulidade do artº 615º, nº 1, d), do CPC: O teor da sentença não oferece margem para dúvidas (artº 236º do CC) de que considerou o trânsito em julgado da sentença, de toda ela, e não só da decisão ou segmento que declarou a ilicitude do despedimento, não podendo, no incidente de liquidação, alterar-se o decidido (caso julgado) ou fazer de conta que o que foi decidido foi afinal a formulação legal que não adotou (e nem isso justificaria a decisão recorrida, como se viu na conclusão 4ª). 6ª É também evidente que não existe qualquer abuso de direito ou má fé na exigência dos salários de tramitação até ao trânsito da acórdão da RP, pois foi essa a condenação da R.. O facto de a R. lhe ter pago voluntariamente nada acrescenta ao caso, pois tratou-se do mero cumprimento da sua obrigação. 7ª Subsidiariamente e sem conceder, se a tese da sentença vingasse sempre faltariam os proporcionais de férias, de subsídio de férias e de natal correspondentes a 21 dias, desde a data considerada pela R., 10.2.2022, e 1.3.2022. Logo, 3.700€: 365 dias x 21 dias x 3 = 638,63€. - DEVE O RECURSO MERECER PROVIMENTO E A LIQUIDAÇÃO EFETUADA PELO A. JULGADA TOTALMENTE PROCEDENTE.” A Recorrida contra-alegou, pugnando pelo não provimento do recurso [não tendo formulado conclusões]. Aquando do despacho de admissão do recurso a Mmª Juiz pronunciou-se sobre a invocada nulidade de sentença referindo o seguinte: “Tendo sido suscitada a questão sobre a nulidade da sentença com fundamento no disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do Código de Processo Civil, cumpre apreciá-la no presente despacho. Com efeito, alega o recorrente que o Tribunal não se pronunciou sobre o facto de na sentença não ter sido utilizada a fórmula legal do artigo 390.º, n.º 1, do Código do Trabalho («até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento»), antes tendo adoptado a formulação da condenação da ré no valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença. Salvo melhor entendimento, ambas as expressões possuem idêntico sentido, na medida em que a obrigação de pagamento das retribuições intercalares “até ao trânsito em julgado da sentença” num processo em que é declarada a ilicitude do despedimento só pode dizer respeito àquelas que se vencem desde o despedimento até ao “trânsito em julgado da sentença que declara a ilicitude do despedimento”. Sobre a noção de trânsito em julgado e a sua aplicação in casu, ao que cremos, pronunciou-se a sentença ora em crise. Sempre se dirá, aliás, que defendendo o recorrente que “o trânsito em julgado corresponde a uma qualidade de uma sentença e não apenas de um segmento decisório”, nem sequer vislumbramos em que medida a adopção da formulação legal contenderia com a sua posição. Por conseguinte, julgamos que a sentença não padece do vício que lhe é assinalado. Nesta conformidade, indefere-se a invocada nulidade por entendermos inexistir fundamento legal para o efeito.” O Recorrente respondeu ao despacho acima mencionado, que se pronunciou sobre a nulidade da sentença, referindo o seguinte: “Tendo sido notificado do despacho de 24.11.2022, que indeferiu a arguição de nulidade, vem dizer que não obstante esse despacho, pretende ver a questão apreciada no recurso interposto. Ao abrigo do direito ao contraditório e de defesa, sempre se dirá o seguinte que, com o devido respeito, o despacho ora notificado não nos parece correto. Justifica-se: O despacho considera que as expressões «trânsito em julgado da sentença» e «trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento» são sinónimos e por isso entende que se pronunciou sobre a questão cuja nulidade se arguiu [1]. Ora, é evidente que tais expressões não são sinónimos. Se assim fosse, a própria sentença não teria tido necessidade de nas pgs. 5/6/7 se fundamentar com a tese do trânsito em julgado de um mero segmento decisório, qual fosse o da parte/decisão da sentença que se pronunciou sobre a ilicitude do despedimento. É também claro que para efeitos de trânsito em julgado, na posição que se defende no recurso, se a sentença do processo principal tivesse adotado a fórmula legal do «trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento», nada contenderia com o que se defende no ponto I do recurso, como aliás expressamente referimos nas alegações. Mas a verdade é que não tendo a sentença adotado a fórmula legal, mas sim a do «trânsito em julgado da sentença», colocou-se ao abrigo da crítica recursiva feita no ponto II das alegações do recurso, concretamente a violação do caso julgado anterior.” O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, referindo o seguinte: “2. Na acção havia sido proferida, além do mais, a seguinte decisão: “2. Declara-se a ilicitude do despedimento do autor e, consequência, condena-se a ré a pagar ao autor: 2.1. A quantia a liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença, no que se inclui os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, à razão de €3.700,00 (três mil e setecentos euros) mensais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, do Código do Trabalho.” No incidente de liquidação foi a Ré/recorrida condenada a pagar a AA a quantia de €2.333,85 (dois mil trezentos e trinta e três euros e oitenta e cinco cêntimos) a título de retribuições em dívida pelo período decorrido entre 10/02/2022 e 01/03/2022, absolvendo-a do demais peticionado. Considerando-se o cálculo daquelas retribuições até ao “trânsito em julgado da presente sentença”, a data do trânsito da decisão da 1ª instância, uma vez que as partes não recorreram deste segmento da sentença. O recorrente, por sua vez, contabiliza esta data como a data do trânsito do acórdão da Relação, uma vez que, embora não abrangendo esta parte da sentença, esta só transitou depois de proferido aquele acórdão. Está em causa, assim, no presente recurso, saber qual a data a atender para liquidar “as retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença”, se 01.03.2022 ou 13.07.2022. 3. A questão é a de saber, quando se considera transitada em julgado, para este efeito de cálculo destas retribuições, a parte da sentença que condenou a ré a pagar ao autor a quantia a liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença, no que se inclui os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, à razão de €3.700,00 (três mil e setecentos euros) mensais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, do Código do Trabalho.” Se bem que para efeitos genéricos se considere que a sentença transita com o trânsito do acórdão do Tribunal da Relação, para este efeito, aceitando, ambas as partes, a sentença nesta parte, justo parece que a data a atender seja aquela que corresponderia ao trânsito da sentença. Parece ser a que vai de encontro à vontade das partes. Restringindo, elas, os recursos a parte da sentença, os demais segmentos tornam-se definitivos. Nestes casos (art.º 635º, 2, do CPC), como se refere na douta sentença recorrida, a parte não recorrida adquire a força de caso julgado, (e cita no mesmo sentido, Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 3.º, Coimbra Editora, 2003, p. 33 e Fernando Amâncio Ferreira, “Manual dos Recurso em Processo Civil”, 4.ª ed., Almedina, p. 140). Assim, salvo melhor opinião, a decisão em recurso não merece censura ou reparo, devendo ser confirmada.”. As partes, notificadas, não responderam ao parecer. Colheram-se os vistos legais. *** II. Objeto do recursoO objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo porém as matérias que sejam de conhecimento oficioso, (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10, alterado, designadamente, pela Lei 107/2019). Assim, são as seguintes as questões suscitadas pelo Recorrente: - Violação do caso julgado; - Nulidade de sentença; - Data a atender para o termo do cálculo das retribuições intercalares (se 01.03.2022 ou 13.07.2022); - Se a liquidação deveria ter incluído os proporcionais de férias e dos subsídios de férias e de Natal referentes a 10.02.2022 a 01.03.2022. *** III. Fundamentação de FactoNa decisão recorrida considerou-se como provada a seguinte factualidade: A) Por sentença proferida em 09/02/2022, foi a acção de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento assim decidida: 1. Julgam-se procedentes as excepções de prescrição da infracção disciplinar e de caducidade da acção disciplinar, no que toca aos factos constantes dos artigos 14.º a 24.º do articulado motivador do despedimento. 2. Declara-se a ilicitude do despedimento do autor e, consequência, condena-se a ré a pagar ao autor: 2.1. A quantia a liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença, no que se inclui os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, à razão de €3.700,00 (três mil e setecentos euros) mensais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, do Código do Trabalho. 2.2. A quantia de €133.200,00 (cento e trinta e três mil e duzentos euros), a título de indemnização por antiguidade, em substituição da reintegração, sem prejuízo de até ao trânsito em julgado da sentença decorrer mais algum ano completo de antiguidade, caso em que acrescerá o valor de €4.933,33 (quatro mil novecentos e trinta e três euros e trinta e três cêntimos) por cada ano completo decorrido, acrescido dos juros, à taxa legal de 4%, que se vencerem a partir do trânsito em julgado da sentença até efectivo e integral pagamento. 3. Julga-se a reconvenção parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência, condena-se a ré a pagar ao autor: 3.1. A quantia de €8.000,00 (oito mil euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a sentença até integral pagamento, absolvendo-a do demais peticionado. 3.2. A quantia de €2.348,50 (dois mil trezentos e quarenta e oito euros e cinquenta cêntimos), a título de crédito de formação dos últimos três anos, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento. 3.3. A quantia de €3.700,00 (três mil e setecentos euros), correspondente às férias vencidas em 01/01/2021, acrescida de juros de mora, à taxa legal de 4%, desde a data do respectivo vencimento até integral pagamento. 3.4. Absolver a ré do demais contra si peticionado, sem prejuízo do decidido a respeito dos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021 mencionados em 2.1. 4. Julgar improcedente o pedido de condenação da ré como litigante de má fé, dele o absolvendo. 5. Condenar autor e ré no pagamento das custas processuais, na proporção de 21,11% e 78,89%, respectivamente. B) A sentença foi notificada às partes por cartas registadas datadas de 10/02/2022, tendo a notificação enviada aos Ilustres Mandatários das partes sido realizada no mesmo dia por via electrónica. C) Por requerimento entrado em juízo em 21/02/2022, o autor interpôs recurso da sentença por não se conformar com esta na parte em que: “i) condenou a R. numa indemnização de antiguidade na base de apenas 40 dias por ano e ii) numa indemnização por danos morais de apenas 8.000€ e iii) absolveu a R. do prémio de 25 anos de antiguidade e iv) do pedido de condenação como litigante de má fé”. D) Por requerimento entrado em juízo em 15/03/2022, a ré interpôs recurso da sentença por não se conformar com esta na parte em que a condenou: “• no pagamento de uma indemnização ao autor no montante de 133.200€, acrescida de 4.933,33€ por cada ano completo de antiguidade que decorrer até trânsito em julgado da sentença), bem como em juros de mora à taxa legal de 4%, desde o trânsito em julgado da sentença (ponto 2.2. da condenação); • no pagamento de uma indemnização por danos morais ao autor/reconvinte no montante de 8.000€, acrescidos de juros de mora à taxa legal de 4%, desde o trânsito em julgado da sentença (ponto 3.1. da condenação); • nas custas do processo em função do respectivo decaimento, na proporção de 78,89% sendo a revogação deste segmento decisório mera decorrência da discordância relativamente ao montante da indemnização fixada”. E) Declarou ainda a ré no requerimento de interposição de recurso: “Nesta conformidade, o recurso ora interposto cinge-se à problemática do quantum indemnizatório arbitrado ao trabalhador, a título de indemnização, pelo que a ré/reconvinda aceita expressamente: a cessação imediata do vínculo laboral; a procedência das excepções de prescrição e caducidade; a ilicitude do despedimento por falta de prova de justa causa e pela procedência das excepções invocadas; bem como a obrigação de pagamento ao autor das quantias referidas nos itens 2.1., 3.2. e 3.3. do segmento decisório da douta sentença final proferida em primeira instância”. F) Por acórdão proferido em 13/07/2022, o Tribunal da Relação do Porto julgou a apelação interposta pelo autor improcedente e procedente a interposta pela ré, no que toca à matéria de facto, declarando no mais o recurso improcedente. G) Nessa data foi o acórdão notificado às partes por via electrónica. H) A ré pagou ao autor as retribuições a este devidas até 10/02/2022. I) A ré descontou no recibo do mês de Fevereiro, como faltas, a quantia de €2.333,85, J) O autor recebeu de subsídio de desemprego, desde 08/03/2022 até 31/07/2022, a quantia de €5.281,47.” *** IV. Fundamentação de direito 1. Importa começar por transcrever o teor da decisão recorrida (para melhor esclarecimento e enquadramento das questões que o Recorrente suscita): “Tendo em conta o pedido deduzido e a posição assumida pela ré na contestação, a questão que primeiramente se coloca é de saber em que data operou o trânsito em julgado da sentença proferida nos presentes autos. Definido esse momento, importa aquilatar se alguma quantia permanece em dívida a título de retribuições intercalares e qual o respectivo quantitativo. * Segundo o artigo 628.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, “A decisão considera-se transitada em julgado logo que não seja susceptível de recurso ordinário ou de reclamação”. Por outro lado, nas acções em que esteja em causa o despedimento do trabalhador por iniciativa do empregador, independentemente da sua modalidade, é sempre admissível recurso para a Relação (artigo 79.º, alínea a), do Código de Processo do Trabalho). Quando a decisão é susceptível de recurso, “o trânsito em julgado depende, em primeiro lugar, do facto de se encontrarem esgotadas as possibilidades de interposição de recursos ordinários para a Relação ou para o Supremo. Considerando, porém, que as decisões são passíveis de arguição de nulidades ou de reclamações, estando aberta a possibilidade de arguir nulidades (…) ou de requerer a reforma (…), a data do trânsito só ocorre quando se esgotar o prazo previsto para tais actos” – Abrantes Geraldes, “Recursos em Processo Civil Novo Regime”, Almedina, 2007, p. 25. In casu, a sentença proferida era susceptível de recurso ordinário, o qual, de resto, foi interposto por ambas as partes. Contudo, ambas as partes delimitaram objectivamente os respectivos recursos, não tendo nenhum deles versado sobre o ponto 2.1 da sentença, precisamente aquele que ora se discute, verificando-se inclusivamente que a ré, a quem a decisão era desfavorável, declarou expressamente aceitar tal segmento decisório. Estabelece o artigo 635.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que: “Se a parte dispositiva da sentença contiver decisões distintas, é igualmente lícito ao recorrente restringir o recurso a qualquer delas, uma vez que especifique no requerimento a decisão de que recorre”, sendo que, nos termos do n.º 5 do mesmo artigo, “os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo”. Com efeito, a parte dispositiva da sentença pode ser singular ou plural, ou seja, pode conter decisões distintas, como a sentença em apreço possui, sendo lícito ao recorrente restringir o recurso a uma dessas decisões, como efectivamente sucedeu. Nestes casos, a parte não recorrida adquire a força de caso julgado (cfr., neste sentido, Lebre de Freitas, “Código de Processo Civil Anotado”, vol. 3.º, Coimbra Editora, 2003, p. 33 e Fernando Amâncio Ferreira, “Manual dos Recurso em Processo Civil”, 4.ª ed., Almedina, p. 140). Ainda que, face à noção contida no artigo 628.º, do Código de Processo Civil, se possa defender que o trânsito em julgado constitui um atributo da sentença e não de cada um dos seus segmentos decisórios, restringindo os efeitos do julgado à delimitação do recurso e à preclusão do conhecimento de questões não submetidas à apreciação do Tribunal ad quem, sendo aqueles estranhos ao conceito de trânsito em julgado, que assim não poderá ser parcial, consideramos que quando estamos, designadamente, perante segmentos decisórios totalmente distintos e autónomos (ou perante situações de coligação ou de litisconsórcio voluntário, por exemplo), haverá que ter presente que se o recorrente restringir o recurso a qualquer um daqueles segmentos, a questão ou questões não suscitadas não constituem, sob pena de nulidade, objecto de pronúncia do tribunal superior (artigos 608.º, n.º 2, 615.º, n.º 1, alínea d), 663.º, n.º 2 e 666.º, n.º 1, do Código de Processo Civil) e a decisão, nessa parte, torna-se insusceptível de recurso e transita em julgado. A isso acresce que, os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo, regra esta que embora esteja intrinsecamente relacionada com o trânsito em julgado da decisão se traduz na proibição de reformatio in peius, obstando a que a decisão do Tribunal ad quem seja mais desfavorável ao recorrente do que a decisão proferida pelo Tribunal a quo, mas não impede a possibilidade de a decisão ter “critérios ou motivações diversas” (cfr. Lebre de Freitas, Ob. Cit., p. 34). Consequentemente, o trânsito em julgado parcial da decisão obsta a que o tribunal ad quem conheça da questão não recorrida, enquanto a proibição da reformatio in peius obsta a que a decisão seja reformada para pior, mas não impede o conhecimento da questão. Posto isto, sendo o segmento decisório não impugnado autónomo das restantes componentes dispositivas e que por isso mesmo não seria afectado com a decisão a proferir pelo Tribunal da Relação do Porto, afigura-se-nos ser possível afirmar que a sentença transitou em julgado, no que respeita ao primeiro, não no dia em que foi proferida, nem somente com a prolação do Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, mas, recuperando o que acima se disse, logo que insusceptível de recurso ordinário ou de reclamação. Vejamos. O prazo para interposição do recurso é de 15 dias (artigo 80.º, n.º 2, do Código de Processo do Trabalho). Acrescerá à contabilização desse prazo o prazo de 10 dias previsto no n.º 3 do artigo 80.º, do Código de Processo do Trabalho? Nestes casos e na senda do decido nos Acórdãos do Tribunal da Relação de Coimbra, de 23/09/2014, proc. n.º 913/09.4TBCBR.C1 e de 06/10/2015, proc. n.º 1466/14.7T8CBR-E.C1, ambos acessíveis in www.dgsi.pt, ainda que tirados a propósito do n.º 7 do artigo 638.º, do Código de Processo Civil, mas aqui aplicáveis mutatis mutandis, entendemos que, não tendo sido interposto recurso da sentença naquela parte, o prazo de 10 dias não deve ser ponderado na contabilização do trânsito em julgado da sentença. Nas palavras do primeiro Acórdão aludido, “1.- Só com a efectiva interposição do recurso e com a incidência do mesmo sobre o julgamento de facto, se pode considerar que o recorrente beneficia do prazo adicional de 10 dias previsto no nº 7 do art. 638º do Código Processo Civil. 2.- Desse modo, esse prazo de 10 dias nunca entra no cálculo do trânsito em julgado, pois que, o mesmo pressupõe sempre a interposição de recurso ao julgamento de facto”. Por outro lado, também o prazo de três dias úteis consagrado no artigo 139.º, n.º 5, do Código de Processo Civil não é passível de ser ponderado para este efeito. Na verdade, como se salienta no Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 10/02/2004, proc. n.º 04A4156, acessível in www.dgsi.pt (ainda que tirado à luz da lei anteriormente em vigor), “o prazo de três dias concedido pelo art.º 145º, n.º 5, do Cód. Proc. Civil, é um mero prazo de tolerância que não afecta a contagem do prazo para interposição de recurso nem para apresentação de reclamações, nem portanto para o trânsito em julgado da decisão, prazo esse que é de apenas dez dias nos termos dos art.ºs 685º, n.º 1, ou 153º, do Cód. Proc. Civil, e que não é alargado por aquele n.º 5 do art.º 145º. Com efeito, este expressamente se refere ao “termo do prazo” para a prática do acto processual, expressão essa, - “termo do prazo” -, mantida na actual redacção desse dispositivo, dada pelo Dec. – Lei n.º 324/2003, de 27/12, e que mostra claramente que o legislador continua a considerar o prazo inicialmente fixado para a prática dos actos processuais, nomeadamente para a interposição de recurso ou reclamação, como um prazo autónomo que se mantém inalterado, apenas concedendo por mera tolerância condicional um outro, subsequente, em condições que indica, mas que não impede que o primeiro se extinga. Ou seja, a concessão desse prazo suplementar de três dias não constitui alargamento do prazo que existia, mas o aditamento de um outro prazo que tem por objectivo apenas o de destruir os efeitos do caso julgado já produzido pela decisão no termo do prazo de dez dias, na condição de no decurso dos três dias úteis subsequentes ser praticado o acto processual nas circunstâncias determinadas no mesmo dispositivo, funcionando assim como uma espécie de condição resolutiva que origina que, decorrido o dito prazo de três dias sem a prática do acto processual ou sem o pagamento da multa apesar da sua prática, a decisão se considere definitiva desde o termo do prazo de dez dias para reclamação ou recurso, reportando-se o trânsito em julgado a esse termo, já ficando porém esse trânsito nessa data sem efeito se algum acto processual for efectivamente praticado no dito prazo suplementar nas condições indicadas naquele dispositivo”. Posto isto, temos que a sentença foi proferida em 09/02/2022 e notificada por carta registada às partes e electronicamente aos seus Mandatários no dia 10/02/2022, pelo que se considera notificada no dia 14/02/2022 (artigos 248.º e 249.º, do Código de Processo Civil), tendo assim transitado na parte que se aprecia em 01/03/2022. Outra interpretação, segundo cremos, contenderia com o princípio da boa fé, porquanto o autor, em face dos limites objectivos dos recursos interpostos, sabia já que, naquela parte, a sentença ficaria intocada fosse qual fosse a decisão que viesse a ser proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, ao que acresce a circunstância de logo em Fevereiro – sem esperar pela decisão deste Tribunal – a ré lhe ter pago as retribuições até então devidas. Sucede que, era devida ao autor a retribuição integral correspondente ao mês de Fevereiro de 2022, no montante de €3700,00, à qual a ré descontou a quantia de €2.333,85, que lhe deve. Nada mais, porém, lhe é devido.” Ou seja, na decisão recorrida, em síntese, apreciou-se e considerou-se que: a sentença [que veio a dar lugar ao presente incidente de liquidação, e à qual nos reportaremos quando nos referirmos, apenas, à sentença] contém segmentos decisórios distintos; face à delimitação do objeto do recurso feito pelas partes nos recursos então dela interpostos, ficou o mesmo restringido à apreciação de outras questões que não a da declaração da ilicitude do despedimento e da condenação nas retribuições intercalares que não foram neles impugnadas e que, assim, transitaram em julgado aos 01.03.2022. Acrescenta que outra interpretação “contenderia com o princípio da boa fé, porquanto o autor, em face dos limites objectivos dos recursos interpostos, sabia já que, naquela parte, a sentença ficaria intocada fosse qual fosse a decisão que viesse a ser proferida pelo Tribunal da Relação do Porto, ao que acresce a circunstância de logo em Fevereiro – sem esperar pela decisão deste Tribunal – a ré lhe ter pago as retribuições até então devidas.” 2. Nulidade da sentença por omissão de pronúncia O Recorrente invoca a existência de nulidade de sentença por omissão de pronúncia, uma vez que “não analisou sequer o conteúdo da sentença condenatória anterior, cometendo a nulidade do artº 615º, nº 1, d), do CPC: O teor da sentença não oferece margem para dúvidas (artº 236º do CC) de que considerou o trânsito em julgado da sentença, de toda ela, e não só da decisão ou segmento que declarou a ilicitude do despedimento, não podendo, no incidente de liquidação, alterar-se o decidido (caso julgado) ou fazer de conta que o que foi decidido foi afinal a formulação legal que não adotou (e nem isso justificaria a decisão recorrida, como se viu na conclusão 4ª)”. 2.1. Dispõe a al. d) do nº 1 do 615º do CPC/2013 que: “ 1. É nula a sentença quando “(…);d) O juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. Como dizem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre in Código de Processo Civil Anotado, Volume 2, 4ª Edição, Almedina, pág.735 Coimbra Editora, pág.669, os casos das alíneas b) a c) do nº 1 respeitam “à estrutura ou aos limites da sentença. Respeitam à estrutura da sentença os fundamentos das alíenas b) (falta de fundamentação) e c) (oposição entre os fundamentos e a decisão). Respeitam aos seus limites os das alíenas d) (omissão e excesso de pronúncia) e e) (pronúncia ultra petitum).” A nulidade por omissão de pronúncia prende-se com o disposto no art. 608º, nº 2, do mesmo, nos termos do qual “2. O juiz deve resolver todas as questões que as partes tenham submetido à sua apreciação, excetuadas aquelas cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras; não pode ocupar-se senão das questões suscitadas pelas partes, salvo se a lei lhe permitir ou impuser o conhecimento oficioso de outras”. De referir que apenas a omissão de conhecimento de questões, não já de argumentos, determinam a nulidade prevista no art. 615º, nº 1, al. d). No caso: No segmento decisório constante do ponto IV. nº 2 e 2.1. da sentença foi declarada a ilicitude do despedimento do A. e a Ré condenada a pagar-lhe “2.1. A quantia a liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença, no que se inclui os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, à razão de €3.700,00 (três mil e setecentos euros) mensais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, do Código do Trabalho.” No presente incidente de liquidação estava em discussão saber se as retribuições intercalares devidas ao A. deveriam ser liquidadas até à data do trânsito em julgado do Acórdão da Relação (este de 13.07.2022) proferido sobre os recursos então interpostos pelo A. e pela Ré da sentença, como reclamava o A. no requerimento de liquidação, ou apenas até 01.03.2022, data esta considerada pela decisão recorrida como a do trânsito em julgado do segmento decisório que julgou ilícito o despedimento e condenou a Ré no pagamento das retribuições intercalares. Esta era a questão que estava em discussão, sobre ela se tendo pronunciado a decisão recorrida nos termos que deixámos transcritos, concluindo, pelas razões que apontou, no sentido de que as retribuições intercalares eram devidas apenas até à data em que considerou ter transitado em julgado a decisão que declarou a ilicitude de despedimento e que essa data era em 01.03.2022. E considerou-o tendo como pressuposto (bem ou mal, o que, para estes efeitos agora não releva) que a condenação constante da sentença tinha por objeto a condenação nas retribuições intercalares até ao transito em julgado da sentença que declarou a ilicitude do despedimento e, bem assim, porque entendeu que a decisão era cindível, que as partes delimitaram o objeto do recurso da sentença, excluindo a declaração da ilicitude do despedimento e condenação nas retribuições intercalares, e que, por isso, transitou em julgado na data em que esses segmentos decisórios se teriam tornado definitivos (mostrando-se irrelevante a interposição dos recursos pelas partes quanto às demais questões neles suscitadas) e que entendimento diferente violaria o princípio da boa fé. Ou seja, não existe, por parte da decisão recorrida, omissão de pronúncia sobre a questão que estava em discussão, sendo que dela decorre, inequivocamente, que tem como pressuposto ou subjacente que a sentença condenatória anterior assentou no “trânsito em julgado da decisão que declara a ilicitude do despedimento” e interpretando este momento nos termos apontados e, assim, tendo-se pronunciado. O mais alegado pelo Recorrente consubstancia ou questão – violação do caso julgado - ou argumentação mas tendente a demonstrar o erro de tal decisão, sendo que a violação do caso julgado não consubstancia questão que tivesse sido invocada no requerimento de liquidação ou contestação ao mesmo, sobre o qual a decisão recorrida se devesse, nos termos do art. 608º, nº 2, do CPC, ter pronunciado. Embora sendo de conhecimento oficioso e a porventura verificar-se, o que se poderia dizer é que a decisão recorrida teria errado na decisão uma vez que não teria tido em conta que a decisão sufragada violaria o caso julgado. De todo o modo, e ainda que, porventura e como hipótese de raciocínio, se entendesse que teria ocorrido nulidade de sentença por omissão de pronúncia sobre o caso julgado, este sempre seria (art. 665º, nº 1, do CPC), como aliás irá ser, apreciado. Improcede, assim, a invocada nulidade de sentença. 3. Da violação do caso julgado Diz o Recorrente que: “3ª A decisão recorrida, ao considerar que o trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento ocorreu em 1.3.2022, uma vez que nenhuma das partes recorreu dessa decisão, fez uma cisão ilegítima desse segmento decisório, para efeitos de trânsito em julgado, que a lei não permite (artºs 628º e 635º do CPC) e que viola o caso julgado anterior, pois na sentença nem sequer se utilizou a fórmula do artº 390º, nº 1, do CT («até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento»). 4ª O trânsito em julgado corresponde a uma qualidade de uma sentença e não apenas de um segmento decisório: O trânsito em julgado, na parte da declaração da ilicitude, não é cindível, como sustentou a decisão recorrida.” 3.1. Dispõe o art. 619º, nº 1, do CPC, que se reporta ao caso julgado material, que “1. Transitada em julgado a sentença ou o despacho saneador que decida do mérito da causa, a decisão sobre a relação material controvertida fica a ter força obrigatória dentro do processo e fora dele nos limites fixados pelos artigos 580º e 681, sem prejuízo do disposto nos artigos 696º a 702º.” E, o art. 625º do mesmo, que “1. Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumpre-se a que passou em julgado em primeiro lugar. 2. É aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual.” O caso julgado ocorre quando se verifica uma repetição da causa; isto é, quando entre duas causas existe: identidade de sujeitos (quando as partes são as mesmas do ponto de vista da sua qualidade jurídica); identidade de pedido (quando em ambas as causas se visa obter o mesmo efeito jurídico); e identidade de causa de pedir (quando a pretensão deduzida em ambas procede do mesmo facto jurídico) – artºs 580º e 581º do CPC/2013. E uma decisão transita em julgado logo que não seja suscetível de recurso ordinário ou de reclamação – art. 628º do CPC/2013. E, desde já se dirá, nos termos do art. 635º, nº 5, do mesmo, os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo. Como é sabido, o caso julgado visa, essencialmente, obstar à contradição prática entre duas decisões – decisões contraditórias concretamente incompatíveis –, ou seja, que o tribunal decida de modo diverso sobre o direito ou questão concreta já definida por decisão anterior, evitando colocar o tribunal na situação de se contradizer (ou de reafirmar o que já havia sido decidido), princípio esse que, como é assinalado pela doutrina e jurisprudência, se desenvolve numa dupla vertente: uma vertente negativa (exceção do caso julgado) e uma vertente positiva (autoridade do caso julgado). A função negativa do caso julgado é exercida através da exceção dilatória do caso julgado, a qual tem por fim evitar a repetição de causas (artigo 580.º n.ºs 1 e 2 do CPC), implicando a tríplice identidade a que se reporta o artigo 581.º, n.º 1 do CPC, a saber, os sujeitos, o pedido e a causa de pedir. Já a autoridade do caso julgado, por via da qual é exercida a sua função positiva, pode funcionar, independentemente, da verificação da aludida tríplice identidade, pressupondo, todavia, a decisão de determinada questão que não pode voltar a ser discutida. Como se diz no Acórdão desta Relação de 20.10.2014, proferido no Processo 369/07.6TTVRLB.P1[2]: “O caso julgado só se forma, em princípio, sobre a decisão contida na sentença. É essa a posição dos Professores Manuel de Andrade [Noções Elementares de Processo Civil, página 318] Antunes Varela [Manual de Processo Civil, 1984, páginas 695/696] e Anselmo de Castro [Direito Processual Civil Declaratório, volume 3, página 392]. No entanto, os mesmos ensinam que não é de excluir que se possa e deva recorrer à parte motivatória da sentença para interpretar a decisão, para reconstruir e fixar o seu verdadeiro conteúdo – M. Andrade, obra citada, página 318 e A. Varela, obra citada, páginas 696/697. E igual posição é sustentada por Jacinto Bastos ao referir “ser de concluir que embora as premissas de decisão não adquira, em regra, força de caso julgado, deve reconhecer-se-lhe essa natureza, quer quando a parte decisória a elas se referir de modo expresso, quer quando constituírem antecedente lógico, necessário e imprescindível, da decisão final” – notas ao CPC, páginas 230/231.”. No sentido, também, da relevância da fundamentação da sentença para a determinação do âmbito do caso julgado, veja-se o Acórdão do STJ de 12.03.2014, Processo 177/03.3TTFAR.E1.S1, in www.dgsi.pt, de cujo sumário consta que “1 – A determinação do âmbito do caso julgado de uma decisão judicial pressupõe a respectiva interpretação, não bastando na sua concretização do seu sentido considerar a parte decisória da mesma, cumprindo tomar em consideração também a respectiva fundamentação e a relação desta com o dispositivo, visando garantir a harmonia e a coerência entre estas duas partes, devendo atender-se ainda a todas as circunstâncias que possam funcionar como meios auxiliares de interpretação, de forma a permitir concluir-se sobre o sentido que se quis atribuir à decisão;” [sublinhado nosso]. 3.2. Na situação em apreço, o caso julgado, a verificar-se, seria na vertente da autoridade do caso julgado, uma vez que, segundo o Recorrente, já teria sido decidido, na sentença, a condenação da Ré nas retribuições intercalares vencidas até ao trânsito em julgado da sentença, este ocorrido (segundo o Recorrente) apenas com o trânsito em julgado do acórdão desta Relação de 13.07.2022, argumentando que: na sentença, bem ou mal, não se utilizou a formulação prevista no art. 390º, nº 1, de condenação “até ao transito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento”, mas sim e apenas a de condenação até ao trânsito em julgado da sentença; a sentença, para efeitos do seu trânsito em julgado, não é cindível, pelo que, quando a sentença condenatória se reporta ao trânsito em julgado, está a referir-se à decisão final do processo, não a um seu segmento. Quanto aos termos utilizados na sentença, ainda que não expressamente referido, não podemos deixar de considerar que a condenação se reporta ao trânsito da sentença que declarou a ilicitude do despedimento e não ao transito da sentença no seu todo. Com efeito, e ainda que se reconheça que melhor teria sido que a sentença condenatória o tivesse feito com expressa referência ao trânsito em julgado da decisão que declara a ilicitude do despedimento [assim utilizando a terminologia legal e evitando a (eventual) ambiguidade em que, em retas contas, o Recorrente se fundamenta para sustentar que os termos em que se encontra formulada a condenação é no sentido de que se reporta ao trânsito da sentença no seu todo], o segmento final condenatório constante da sentença não pode deixar se ser interpretado com apelo ao que se diz na sua fundamentação e à disposição legal que nela se invoca, que se passa a transcrever: “2.1 - Salários intercalares. Dispõe o n.º 1 do artigo 390.º, do Código do Trabalho que: “1 - Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do n.º 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento. 2 - Às retribuições referidas no número anterior deduzem-se: a) As importâncias que o trabalhador aufira com a cessação do contrato e que não receberia se não fosse o despedimento; b) A retribuição relativa ao período decorrido desde o despedimento até 30 dias antes da propositura da acção, se esta não for proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento; c) O subsídio de desemprego atribuído ao trabalhador no período referido no n.º 1, devendo o empregador entregar essa quantia à segurança social.” Deste modo, tendo sido a acção proposta nos 30 dias subsequentes ao despedimento, assiste o direito ao autor a receber as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão do tribunal que declara a ilicitude do despedimento, porquanto “a declaração judicial de ilicitude/invalidade do despedimento produz efeitos retroactivos, repondo em vigor o contrato de trabalho que o empregador havia tentado, sem êxito, dissolver” (cfr. João Leal Amado e Catarina Gomes dos Santos, Ob. Cit., p. 1079). Tendo sido o empregador/credor quem impediu, sem causa justificativa, o trabalhador/devedor de cumprir a prestação a que estava vinculado, essa circunstância não desonera aquele da realização da contraprestação, ou seja, do pagamento dos salários, decorrente do contrato (artigo 795.º, n.º 2, do Código Civil), correspondendo os salários intercalares ou de tramitação “aquilo que ele ganharia se o contrato tivesse subsistido” (cfr. António Monteiro Fernandes, “Direito do Trabalho”, 13.ª ed., Almedina, 2006, p. 568). Resultou demonstrado, no entanto, que a ré pagou ao autor (…) pelo que apenas lhe serão devidas as remunerações vencidas a partir do mês de Agosto de 2021, inclusive, até à data do trânsito em julgado da sentença. (…) Por conseguinte, a quantia mensal devida ao autor ascende a €3.700,00, até ao trânsito em julgado da presente decisão. (…)” [sublinhado nosso] Do referido, e pese embora nessa fundamentação se aluda também “ao trânsito em julgado da presente decisão”, dela decorre inequivocamente que o termo final do direito às retribuições intercalares foi nela situado com o trânsito em julgado da decisão que julgou ilícito o despedimento. É isso o que resulta da conjugação da declaração da ilicitude do despedimento, da referência e transcrição do art. 390º, nº 1, do CT/2009 e, bem assim, da afirmação que nela se faz, e que se sublinhou, de que “assiste o direito ao autor a receber as retribuições que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente decisão do tribunal que declara a ilicitude do despedimento”. A referência feita ao transito em julgado da presente decisão ou ao trânsito em julgado da sentença mais não é do que uma forma abreviada e/ou simplificada dos termos do art. 390º, nº 1. O argumento da Recorrente mais não decorre do que de uma, mas meramente aparente, divergência de escrita, de redação, mas em termos meramente formais, que não substanciais pois que significam o mesmo. Não existe, pois, violação da autoridade do caso julgado, nem qualquer contradição entre o que foi decidido na sentença condenatória e o que foi decidido na decisão final do incidente de liquidação. A sentença condenatória não condenou a Ré no pagamento das retribuições intercalares até ao trânsito em julgado da sentença como um todo, nem se pronunciou sobre a cindibilidade, ou não, dos diferentes segmentos decisórios para efeitos do trânsito em julgado e, por consequência, do termo final das retribuições intercalares, ou excluído da possibilidade desse trânsito os segmentos parcelares da sentença. Aliás, na sentença, não se aborda sequer tal questão, designadamente o que se entende por trânsito em julgado para efeitos do termo final das retribuições intercalares. A questão que, na verdade, se coloca não é a da violação do caso julgado/autoridade do caso julgado, mas sim a de saber até quando são devidas as retribuições intercalares e, para o efeito, o que se dever entender por trânsito em julgado da decisão que declara a ilicitude do despedimento. Quanto ao argumento de que a sentença, para efeitos do seu trânsito em julgado, não é cindível, pelo que, quando ela se reporta ao trânsito em julgado, está a referir-se à decisão final do processo, não a um seu segmento, está o Recorrente a partir do pressuposto, que tem como assente, mas que está por demonstrar, de que os segmentos decisórios não são cindíveis para efeitos de consideração do seu trânsito em julgado. E esse pressuposto consubstancia a verdadeira questão que se suscita no presente recurso, qual seja, como referido, a de saber até quando são devidas as retribuições intercalares e, para o efeito, o que se dever entender por trânsito em julgado da decisão que declara a ilicitude do despedimento, não tendo, pois, a ver com a violação do caso julgado/autoridade do caso julgado e com qualquer contradição entre o decidido na sentença condenatório e na decisão do incidente de liquidação ora em apreço. Assim, e nesta parte, improcedem as conclusões do recurso. 4. Da data a atender quanto ao termo final do cálculo das retribuições intercalares Como sintetiza o Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto no seu parecer tal questão consiste em “saber qual a data a atender para liquidar “as retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença”, se 01.03.2022 ou 13.07.2022”. E tal questão coloca-se mesmo na formulação constante do art. 390º, nº 1, do CT [“(…) até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento”]. A data de 01.03.2022 corresponde à data em que, tendo em conta o disposto art. 635º, nº 5, do CPC [nos termos do qual os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo], terão transitado em julgado os segmentos decisórios constantes da sentença em que se julgou ilícito o despedimento e se condenou a Ré a pagar ao A. as retribuições intercalares até ao seu trânsito em julgado, como defendido na decisão ora recorrida e pela Recorrida, sendo que, pese embora tenham sido interpostos recursos (pelo A. e pela Ré) de tal sentença, os mesmos não tinham por objeto tais segmentos [tendo estes, segmentos, sido expressamente excluídos pela Ré, que, também expressamente, os aceitou]; A data de 13.07.2022 corresponde à data do acórdão desta Relação que se pronunciou sobre os mencionados recursos, transitado em julgados aos 29.07.22, e que, na parte neles impugnada, confirmou a sentença recorrida. É de relembrar o objeto dos mencionados recursos interpostos da sentença: Quanto ao recurso interposto pelo A., tinha o mesmo por objeto os segmentos decisórios que: “i) condenou a R. numa indemnização de antiguidade na base de apenas 40 dias por ano e ii) numa indemnização por danos morais de apenas 8.000€ e iii) absolveu a R. do prémio de 25 anos de antiguidade e iv) do pedido de condenação como litigante de má fé”. Quanto ao recurso interposto pela Ré, tinha o mesmo por objeto os segmentos decisórios na parte em que esta foi condenada: “• no pagamento de uma indemnização ao autor no montante de 133.200€, acrescida de 4.933,33€ por cada ano completo de antiguidade que decorrer até trânsito em julgado da sentença), bem como em juros de mora à taxa legal de 4%, desde o trânsito em julgado da sentença (ponto 2.2. da condenação); • no pagamento de uma indemnização por danos morais ao autor/reconvinte no montante de 8.000€, acrescidos de juros de mora à taxa legal de 4%, desde o trânsito em julgado da sentença (ponto 3.1. da condenação); • nas custas do processo em função do respectivo decaimento, na proporção de 78,89% sendo a revogação deste segmento decisório mera decorrência da discordância relativamente ao montante da indemnização fixada”. E é também de realçar, embora já decorrendo de tudo quanto foi referido, que o que estava em causa na sentença condenatória e que foi objeto de tais recursos, não era a reintegração do A., mas sim a condenação na indemnização substitutiva de tal reintegração e, bem assim, a indemnização por danos não patrimoniais, o que em nada se relacionava com a impugnação da declaração da ilicitude do despedimento e com as consequências dessa declaração no que toca às retribuições intercalares, designadamente, quanto aos termos dessa condenação e pressupostos, incluindo o montante da retribuição a atender, do seu cálculo. Do decidido na decisão ora recorrida discorda o Recorrente argumentando que: o trânsito em julgado corresponde a uma qualidade de uma sentença e não apenas de um segmento decisório; basta ver que os recursos dos artºs 644º, nº 4/671º, nº 4, 688º (uniformização de jurisprudência) e 696º (revisão) consideram como trânsito em julgado o que se reporta a toda a sentença/decisão final do processo, e não a um segmento decisório. O mesmo quanto a remédios quanto a demoras abusivas (artº 670º, nº 2). O mesmo, por exemplo, quanto a execuções (artº 704º, nºs 1 e 3) e à prestação de caução (artº 650º, nº 3). Ou seja, para o ordenamento jurídico, o trânsito em julgado refere-se à sentença (artº 628º) ou decisão final do processo e não ao de um segmento decisório; Não pode deixar de ser assim. Basta pensar que a sentença podia ser anulada pelo Tribunal da Relação, por um qualquer vício até do conhecimento oficioso (v.g. artº 662º do CPC), e sendo assim lá claudicava o trânsito em julgado do segmento da ilicitude do despedimento (sem prejuízo do nº 5 do artº 635º do CPC). Ora, como se decidiu no acórdão do STJ de 22.2.2017 (pº 659/12.6TTMTS.P2-A.S1, CJ, 2017, Tomo 1, p. 199, e in dgsi.pt), «o trânsito da sentença só ocorre depois de esgotados todos os meios de reação legalmente previstos ou o decurso do respetivo prazo, designadamente, a interposição de recurso nos termos gerais ou excecionais, mesmo que não admissível, a reclamação do despacho de não admissão do recurso, o pedido de reforma ou a arguição de nulidades». Ou seja, o trânsito em julgado, na parte da declaração da ilicitude, não é cindível, como sustentou a decisão recorrida; (…) neste momento não é possível alterar a condenação e entrar em teses sobre se o trânsito em julgado é divisível ou não, porque no caso concreto a sentença é bem clara e remete o cálculo das remunerações intercalares até ao trânsito da própria sentença. E não há dúvidas que a sentença só transitou com o acórdão da Relação do Porto de 13.7.2022. É também evidente que não existe qualquer abuso de direito ou má fé na exigência dos salários de tramitação até ao trânsito da acórdão da RP, pois foi essa a condenação da R.. O facto de a R. lhe ter pago voluntariamente nada acrescenta ao caso, pois tratou-se do mero cumprimento da sua obrigação.” Como já dito no ponto IV.3.2. do presente acórdão, entendemos que o segmento condenatório da sentença em que se condenou no pagamento das retribuições intercalares se reporta às retribuições intercalares devidas até ao trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento a que se reporta o art. 390º, nº 1, do CT. Mas, também nesta aceção, importa saber, para efeitos de tal preceito, quando se deve considerar que tal trânsito ocorreu num caso, como o dos autos, em que a sentença condenatória contém diversos segmentos condenatórios distintos, dois dos quais – os que agora relevam (declaração da ilicitude do despedimento e condenação nas retribuições intercalares) – não foram objeto dos recursos então interpostos pelas partes, recursos estes cuja decisão em nada interferiria com os mencionados segmentos, estes os que estão agora em causa na decisão recorrida, que procedeu à sua liquidação. Importa, desde já, referir que não desconhecemos o recente Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24.05.2023, Proc. 20069/17.8T8LSB.L3.S1, in www.dgsi.pt, que se pronunciou no sentido de que a data a atender é a do trânsito em julgado da decisão final do processo e não a do segmento decisório que julga ilícito o despedimento e condena no pagamento das retribuições intercalares. Desde já avançando, dir-se-á, pese embora o respeito devido pela diferente interpretação do mencionado aresto do STJ e sua douta argumentação, que, no caso se entende dever ser tido em conta, para efeitos do termo final da obrigação de pagamento das retribuições intercalares a que se reporta o art. 390º, nº 1, do CT/2009, a data em que esses segmentos da sentença condenatória se tornaram, por falta de impugnação nos recursos do A. e Ré, definitivos, assim correspondendo à data do trânsito em julgado dos mesmos [e, diga-se, que o mesmo entenderíamos ainda que nos ativéssemos apenas à redação utilizada na sentença condenatória, pois que do facto de nela se fazer referência ao transito em julgado da sentença não implica ou impõe necessariamente que se reportasse à sentença como um todo, e não já aos segmentos cindíveis que não foram impugnados no recurso]. Dessa sentença foi interposto recurso tanto pelo A., como pela Ré, recursos esses que, todavia, não impedem o trânsito em julgado, ainda que parcial, da sentença, isto é, na parte em que o que nela foi decidido não foi impugnado no recurso. Com efeito, os recorrente, se a parte dispositiva da sentença contiver disposições distintas, podem restringir o recurso a qualquer delas, restrição essa que tanto pode ter lugar no requerimento, como nas conclusões, aqui de forma expressa ou tácita (arts. 635º nºs 2 e 4 e 639 nº 1 do CPC/2013), sendo que os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo (art. 635º, nº 5, do CPC/2013), remetendo-se para o referido na decisão recorrida. Os segmentos que não sejam objeto do recurso transitam, pois, em julgado, não mais podendo ser alterados. É de relembrar que: No segmento decisório constante do ponto IV. nº 2 e 2.1. da sentença foi declarada a ilicitude do despedimento do A. e a Ré condenada a pagar-lhe “2.1. A quantia a liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença, no que se inclui os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, à razão de €3.700,00 (três mil e setecentos euros) mensais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, do Código do Trabalho.” A Ré, no recurso que então interpôs da sentença condenatória não recorreu desses segmentos decisórios que julgaram o despedimento ilícito e que a condenou no pagamento das retribuições intercalares à razão de €3.700 mensais (sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o art. 390º, nº 2), como aliás o referiu expressamente, sendo que o que pôs em causa no recurso dessa sentença em nada afeta os efeitos do julgado quanto aos segmentos não impugnados. Por sua vez, o A., no recurso que interpôs dessa sentença, não a impugnou quanto aos segmentos decisórios ora em causa, sendo que o que pôs em causa no recurso dessa sentença também em nada afeta os efeitos do julgado quanto aos segmentos não impugnados. Se a totalidade do decidido na sentença não transitou em julgado, ela tornou-se todavia definitiva relativamente aos segmentos decisórios não impugnados, não havendo, salvo melhor opinião, que confundir entre a ilicitude do despedimento, a indemnização substitutiva da reintegração e as retribuições intercalares; estando estas dependentes daquela, consequências que são, ambas, dessa ilicitude, tratam-se todavia de realidades distintas e independentes, sendo que, uma vez definitivamente julgada a primeira (ilicitude do despedimento), bem como a condenação nas retribuições intercalares, a fixação do montante da indemnização de antiguidade e por danos não patrimoniais consubstanciam questões totalmente independentes que em nada contendem com aquelas. E, daí, que não haja razão para, para efeitos do art. 390º, nº 1, considerar que a sentença não transitou em julgado nas partes em que, como referido, efetivamente transitou. E releva para tal interpretação a circunstância de ser feita no âmbito e para feitos do enquadramento jurídico da questão, este o constante desse art. 390º, nº1. Na interpretação da lei há que ter em conta a letra da lei, que é o seu ponto de partida, devendo no entanto procurar-se a ratio legis, reconstituindo-se o pensamento legislativo e atendendo-se ao seu elemento histórico, mas sem perder de vista a unidade e harmonia do sistema jurídico (art. 9º do Cód. Civil). O art. 390º, nº 1, do CT/2009, como já referido, dispõe que: “1. Sem prejuízo da indemnização prevista na alínea a) do nº 1 do artigo anterior, o trabalhador tem direito a receber as retribuições que deixar de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do Tribunal que declare a ilicitude do despedimento.”. No que toca à letra da lei, ela, ao reportar-se ao trânsito em julgado da decisão que declara a ilicitude do despedimento, aponta no sentido de que o termo final das retribuições intercalares ocorre com o trânsito em julgado desse segmento condenatório. Se assim não fosse, pensamos que teria o legislador utilizado outra formulação, designadamente a de “até ao trânsito em julgado da decisão final que põe termo ao processo”. Como diz Diogo Vaz Marecos, in Código do Trabalho Anotado, Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro, Wolters Kluwer/Coimbra Editora, pág. 951 “De acordo com as regras processuais civis, em qualquer altura do processo, desde que este não tenha já terminado, pode o empregador confessar na acção judicial, que o despedimento foi ilícito, sem prejuízo de em momento anterior, ou concomitantemente com a confissão, invocar que o trabalhador auferiu outros rendimentos de trabalho, após o despedimento, os quais, por força do nº 2 deste artigo, devem ser deduzidos. Quando assim for, e se a acção judicial tiver de prosseguir, para apurar o montante em dívida pelo empregador, deve entender-se que o momento que fixa o direito do trabalhador a receber os salários intercalares é o trânsito em julgado da sentença homologatória de confissão(…)”. E em sentido similar, o Acórdão do STJ 28.05.2008 (Conselheiro Mário Pereira), in www.dgsi.pt, Proc. 07S4217, ainda que no âmbito da então LCCT, em cujo sumário se diz que: “III - Nada obsta a que uma sentença homologatória de confissão, ainda que parcial, tenha a virtualidade de valer como a “sentença” prevista na al. a) do n.º 1 do art.º 13.º da LCCT, na interpretação que lhe foi dada pelo acórdão uniformizador de jurisprudência n.º 1/2004, de 20-11-2003, publicado no DR I-Série A, de 09-01-2004 (nos termos do qual, na acção de impugnação do despedimento, o momento final relevante para a definição dos direitos do art. 13.º da LCCT, é não necessariamente a sentença da 1.ª instância, mas a sentença ou acórdão que, declarando ilícito o acto de despedimento, transite em julgado). IV - A aludida sentença homologatória de Janeiro de 2006 - que declarou a ilicitude do despedimento e condenou o empregador a pagar uma indemnização de antiguidade na sequência da opção feita pelo autor na petição inicial e transitou em julgado - marcou, reportando-o à data em que foi proferida, o termo da relação laboral que ligara as partes e, em conformidade com a orientação firmada no AUJ n.º 1/2004, marcou também o limite temporal final a atender para a definição do direito às retribuições intercalares, não obstante a acção tenha prosseguido para apuramento do montante em dívida a esse título.”, E aduzindo-se na respetiva fundamentação o seguinte: “Como vimos, a mencionada sentença homologatória de 4 de Janeiro de 2006 – que não foi objecto de recurso, tendo transitado em julgado –, na parte que aqui interessa, declarou ilícito o despedimento da A. e condenou a R. a reconhecer tal ilicitude e a pagar à A. a denominada indemnização de antiguidade, na sequência de opção nesse sentido feita pela A. logo na petição inicial. E ao fazê-lo – e para usar as palavras do acórdão deste STJ, de 9 de Outubro de 2002, proferido no processo n.º 3848/2002, desta 4ª Secção, em cuja orientação e fundamentação o mencionado acórdão uniformizador se baseou na fixação da posição firmada – marcou, reportando-o à data em que foi proferida, o termo da relação laboral que ligara as partes. E, assim, em conformidade com a orientação jurisprudencial firmada no acórdão uniformizador e respectiva fundamentação, a data dessa sentença marca o limite temporal final a atender para a definição do direito às retribuições intercalares pela A., previsto na al. a) do n.º 1 do art.º 13º da LCCT, não obstante a acção ter prosseguido para julgamento para apuramento do montante em dívida pela R., a esse título, já que esta invocara, na contestação, ao abrigo da al. b) do n.º 2 do referido art.º, que a A. havia auferido outros rendimentos de trabalho, após o despedimento. Sendo que, nada obsta a que uma sentença homologatória de confissão, ainda que parcial (prevista nos art.ºs 293º, n.ºs 1 e 300º do CPC), como a que está em causa nos presentes autos, tenha a virtualidade de valer como a “sentença” prevista na al. a) do n.º 1 do art.º 13º da LCCT, na interpretação que lhe foi dada no dito acórdão uniformizador.” É de referir, embora no caso tal questão não se coloque, que se poderia ainda equacionar que o termo do direito às retribuições intercalares poderia ainda ocorrer com o trânsito em julgado da decisão final (que põe termo ao processo), se nesta estivesse em causa questão que pudesse contender com o direito às retribuições intercalares, designadamente com o seu cálculo (por exemplo, determinação do montante da retribuição) que extravasassem a finalidade/âmbito do incidente de liquidação a que se reportam os arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, do CPC [estando em causa, apenas, a liquidação das quantias devidas a esse título, afigura-se-nos que o tal liquidação, face ao trânsito em julgado nessa parte da sentença, sempre poderia ter lugar nos respetivo incidente ainda que a ação prosseguisse para as demais questões que são independentes das retribuições intercalares]. Importa também referir que a situação subjacente ao Acórdão uniformizador nº 1/2004, publicado no DR, I Série, de 09.01.2004, tinha por objeto a querela jurisprudencial que então se colocava com fundamento ou por causa da letra do então art. 13º, nº 1, al. a), da LCCT, que se reportava, como termo final das retribuições intercalares,” à data da sentença”, interpretando, uns, literalmente este limite temporal e, outros, considerando que tal não tinha necessariamente que se reportar à sentença da 1ª instância, mas sim à data da decisão final, sentença ou acórdão, que declarasse ou confirmasse a ilicitude. E, daí, surgiu o referido Acórdão 1/2004, que veio adotar este último entendimento, Acórdão esse no qual se refere que “Declarada judicialmente a ilicitude do despedimento, o momento a atender como limite temporal final, para a definição dos direitos conferidos ao trabalhador pelo artigo 13.º, n.ºs 1, alínea a), e 3, do regime jurídico aprovado pelo Decreto-Lei n.º 64-A/89, de 27 de Fevereiro, é, não necessariamente a data da sentença da 1.ª instância, mas a data da decisão final, sentença ou acórdão, que haja declarado ou confirmado aquela ilicitude.”. Neste acórdão se inspirou o legislador do CT/2003 Aprovado pela Lei 99/2003, de 27.08. (art. 437º, nº 1) e, posteriormente, o art. 390º, nº 1, do CT/2009, neste se acrescentando todavia e expressamente (que não constava do art. 437º, nº 1), a referência ao transito em julgado da decisão do tribunal “que declare a ilicitude do despedimento.” [sublinhado nosso]. E, no caso, a decisão que declarou a ilicitude do despedimento e condenou nas retribuições intercalares não foi impugnada em sede de recurso, mormente pela Ré, que a aceitou, inexistindo razão que obstasse a tal aceitação e/ou para que, querendo recorrer de outros segmentos decisórios que com aquele em nada colidem, fosse, não obstante, obrigada a recorrer da parte com que se conformou e/ou que, não recorrendo nesta parte, não pudessem ser extraídos os correspondentes efeitos do trânsito em julgado da parte não impugnada no recurso, onerando-a com os efeitos perniciosos e graves de ver agravada a sua responsabilidade no que toca às retribuições intercalares por virtude do exercício do seu direito ao recurso sobre questão que nada tem a ver com essas retribuições. E, também, não se afigura ser-lhe exigível que se veja constrangida a ter que optar entre renunciar ao exercício do direito ao recurso relativamente a um outro segmento condenatório que não colide com a declaração da ilicitude do despedimento e com as retribuições intercalares ou exercer tal direito, mas, como já referido, com o peso/agravamento de as retribuições intercalares serem devidas até ao transito em julgado da decisão do recurso (o que ocorreria até mesmo quando esse recurso fosse julgado procedente, na medida em que, mesmo que assim fosse, se trata de um recurso que nada tem com tais retribuições intercalares e que em nada interferiria com o direito às mesmas, já anteriormente reconhecido e aceite) O fim visado, primeiro pelo Acórdão Uniformizador e, depois, pelo CT/2003 e de 2009, foi o de penalizar o empregador pela decisão de recorrer relativamente à declaração da ilicitude do despedimento e à condenação nas retribuições intercalares, fazendo-o assumir o risco de um aumento significativo dos montantes devidos ao trabalhador, levando a uma devida ponderação da viabilidade do recurso. Na verdade, se o empregador recorrer da decisão que declara a ilicitude do despedimento, pondo em causa essa ilicitude, é penalizado com o risco do aumento das retribuições intercalares devidas ao trabalhador pois que estas serão devidas até ao transito em julgado da decisão que a decida, o que bem se compreende. Mas não é este o caso dos autos, em que a Ré não discordou da declaração da ilicitude do despedimento, nem dos termos da condenação numa das suas consequências – retribuições intercalares, mas apenas da extensão de uma outra consequência dessa ilicitude (montante da indemnização em substituição da reintegração e da indemnização por danos não patrimoniais) que em nada contende com aquela. E, dentro do mencionado contexto e evolução histórica e visando um maior equilíbrio entre os interesses em jogo, afigura-se-nos que o art. 390º, nº 1, do CT/2009 pretendeu restringir essa “penalização” até à data do trânsito em julgado da decisão que declare a ilicitude do despedimento e não já até à data do trânsito em julgado da decisão que conheça de todas as outras eventuais questões objeto da sentença e de recurso, mas que em nada colidam com a declaração da ilicitude do despedimento e das retribuições intercalares. A assim não se considerar, tal permitiria que, pese embora aceite pelo empregador a ilicitude do despedimento e o pagamento das retribuições intercalares, pudesse ficar na mão do trabalhador, por via da interposição, por si, de um recurso que nada contendesse com o pagamento das retribuições intercalares, o retardar do trânsito em julgado com a consequente penalização injustificada do empregador que, não contribuindo para isso, continuaria a ver “contabilizada” e aumentada a sua obrigação de pagamento das retribuições intercalares. Diga-se também que se nos afigura que o trabalhador não ficará prejudicado caso, porventura, o empregador decida recorrer de qualquer outro segmento condenatório mas que em nada interfira com o direito ao pagamento das retribuições intercalares pois que, transitando a decisão nesta parte (por via do art. 635º, nºs 2, 4 e 5, do CPC), sempre poderá o trabalhador, salvo melhor opinião, executar a parte da sentença transitada em julgado (ou lançar mão do prévio incidente de liquidação já acima referido- arts. 609º, nº 2, e 358º, nº 2, do CPC-, se tal se mostrar necessário a tornar a obrigação líquida, esta condição da sua exequibilidade). Acresce que entendimento contrário contenderia com as regras da boa-fé, mostrando-se injustificada e contrária ao princípio geral da boa fé a continuada “contabilização” das retribuições intercalares quando a questão já se encontra resolvida em termos imutáveis, ainda que, por outras razões (apreciação de outros créditos que em nada contendem com a declaração da ilicitude do despedimento), o processo deva prosseguir. E, como já dito, mas que novamente se salienta, no caso, não estava em causa no recurso que foi interposto da sentença qualquer questão que contendesse ou interferisse com o direito e com o montante das retribuições intercalares. Diz o Recorrente que sempre seria de ponderar a possibilidade de anulação oficiosa da decisão pelo Tribunal da Relação por um qualquer vício até do conhecimento oficioso (v.g. artº 662º do CPC), caso em que “claudicava o trânsito em julgado do segmento da ilicitude do despedimento (sem prejuízo do nº 5 do artº 635º do CPC)”. Desde logo, no caso, não houve qualquer anulação oficiosa do segmento decisório constante da sentença que declarou a ilicitude do despedimento e que condenou no pagamento das retribuições intercalares. De todo o modo, e tendo em conta o art. 635º, nº 5, do CPC, não se vê como, nem que razão, determinaria a anulação da sentença quanto a esses concretos segmentos, sendo que, nos termos de tal preceito, os efeitos do julgado, na parte não recorrida, não podem ser prejudicados pela decisão do recurso nem pela anulação do processo. Por fim, quanto à invocação dos demais preceitos a que o Recorrente alude e que, segundo ele, apontariam no sentido de que a sentença apenas transitaria em julgado quando, como um todo, é insuscetível de impugnação (por recurso, arguição de nulidades de sentença ou pedido de reforma), não sendo cindível, resta remeter para a interpretação e considerações já tecidas que, a nosso ver, não é impedida ou afastada pela interpretação que o Recorrente faz dos demais preceitos que invoca, não se sufragando, embora com todo o respeito que nos merece, o douto Acórdão do STJ de 24.05.2023, mas importando, ainda quanto a argumentação deste constante, referir o seguinte: É certo que não desconhecemos a diferente terminologia legal constante do art. 390º, nº 1, e a do art. 391º, nº 2, ambos do CT: no primeiro e como já referido, as retribuições intercalares são devidas “até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento” enquanto que, no segundo, se diz que para efeitos do cálculo da indemnização em substituição da reintegração se “deve atender ao tempo decorrido desde o despedimento até ao transito em julgado da decisão judicial”, mas já sem referência ao “trânsito em julgado da decisão judicial que declare a ilicitude do despedimento”. Havendo que presumir que o legislador conhecia, ou devia conhecer, as repercussões que, em sede interpretativa, se poderiam eventualmente suscitar em face da diferente formulação e, bem assim, que, nos termos do art. 9º, nº 3, do Cód. Civil, “o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados” e admitindo-se, como hipótese de raciocínio, que a diferente formulação conduziria a diferente solução legal, afigura-se-nos, salvo melhor opinião e com o devido respeito por diferente entendimento, que essa diferente formulação não permite, seja, designadamente pelo elemento histórico, seja pela ratio legis, concluir que o legislador pretendeu fazer coincidir a formulação legal do art. 390º, nº 1, com a prevista no art. 391º, nº 2, até porque, ainda que em abstrato ou termos meramente teóricos, que se admitem também como hipótese de raciocínio, o inverso também seria possível. Mas, a verdade, é que é de admitir, pelo menos como possível, que o diferente tratamento de uma e outra situação poderá ter, face ao seu desiderato legal, uma diferente justificação. Assim, e em primeiro lugar, a sua natureza, decorrendo as retribuições intercalares da reposição da relação laboral que foi ilicitamente “interrompida” pelo despedimento e, a indemnização em substituição da reintegração (esta a reconstituição natural), de pendor mais indemnizatório decorrente da perda do emprego por causa da ilicitude do despedimento (sendo ao trabalhador facultada essa opção). De todo o modo, a diferença de regimes poderá assentar também na dimensão da gravidade de uma e outra situação, sendo a repercussão da obrigação de pagamento das retribuições intercalares, que se vencem todos os meses, de muito maior gravidade que a contabilização da antiguidade (de apenas um ano por cada ano, ou fração, a mais). Improcedem, assim e nesta parte, as conclusões do recurso. 5. Se a liquidação deveria ter incluído os proporcionais de férias e dos subsídios de férias e de Natal. Diz o Recorrente que faltam, na liquidação efetuada, os proporcionais de férias, de subsídio de férias e de natal correspondentes a 21 dias, desde a data considerada pela R., 10.2.2022, e 1.3.2022. Logo, 3.700€: 365 dias x 21 dias x 3 = 638,63€. Ou seja, o que está em causa são os proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal relativos ao período de 11.02.2022 (dia imediato a 10.02.2022. data esta até à qual a Ré lhe pagou o devido [al. H) dos factos provados] a 01.03.2022 [data esta considerada na decisão recorrida como a do trânsito em julgado da sentença que declarou a ilicitude do despedimento]. 5.1. Na contestação/reconvenção deduzida, o A., no que ora pode relevar, pediu a condenação da Ré: “a)(…) b) (…) c) (…); d) Das férias e do subsídio de férias vencidos em 01/01/2021, no montante de €7.400,00 (€3.700,00 x 2); e) Dos proporcionais de férias, de subsídio de férias e de Natal de 2021, no montante de €4.625,00 (€3.700,00: 12 x 5 x 3).” Na sentença foi referido, no que ora poderá relevar: “(…) Resultou demonstrado, no entanto, que a ré pagou ao autor a remuneração do mês de Maio de 2021 e as remunerações dos meses subsequentes, pelo menos, até à data da apresentação da resposta (12/08/2021), pelo que apenas lhe serão devidas as remunerações vencidas a partir do mês de Agosto de 2021, inclusive, até à data do trânsito em julgado da sentença. (…) Contudo, por decisão proferida em 01/07/2021, no âmbito do procedimento cautelar a estes autos apenso, foi decretada a suspensão do despedimento e, por conseguinte, sabendo-se que até Julho de 2021 as remunerações foram pagas ao autor, o termo inicial desta obrigação de pagamento situar-se-ia em Agosto desse mesmo ano, como acima afirmado. No entanto, desconhecemos se as remunerações subsequentes continuaram a ser liquidadas, em cumprimento da decisão cautelar e reintegração do trabalhador, pelo que, não dispondo neste momento o Tribunal de elementos que lhe permitam fixar o quantum devido ao autor, relega-se para incidente de liquidação posterior a sua determinação. A idêntica conclusão se chega no que toca aos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, cujo cálculo, em sede de incidente posterior, se fará também por reporte ao valor de €3.700,00 (artigo 264.º, n.º 2, do Código do Trabalho), na medida em que não tinham sido liquidados à data da resposta deduzida nos autos, mas se desconhece se o terão sido entretanto, por força da decisão cautelar e da reintegração do trabalhador. Por último, ao valor que se vier a apurar deverá ser descontado o montante das quantias que o autor eventualmente possa ter recebido e que sejam passíveis de ser descontadas nos termos do artigo 390.º, n.º 2, do Código do Trabalho. Não há nos autos elementos que permitam ao tribunal fazer este desconto, pois nada foi referido quanto aos montantes que entretanto tenham sido auferidos pelo autor. Assim, deverá a liquidação do montante devido ser relegada para liquidação posterior.” E, a final, foi decidido o seguinte: “(…) 2. Declara-se a ilicitude do despedimento do autor e, consequência, condena-se a ré a pagar ao autor: 2.1. A quantia a liquidar em incidente ulterior, correspondente ao valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença, no que se inclui os proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021, à razão de €3.700,00 (três mil e setecentos euros) mensais, acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, desde a data de vencimento de cada retribuição até integral pagamento, sem prejuízo do eventual desconto das quantias a que se refere o artigo 390.º n.º 2, do Código do Trabalho. (…) 3.4. Absolver a ré do demais contra si peticionado, sem prejuízo do decidido a respeito dos proporcionais de férias, subsídio de férias e subsídio de Natal de 2021 mencionados em 2.1.” No requerimento do incidente de liquidação, referiu o A. o seguinte: “1. A R. pagou ao A. até ao dia 10.2.2022 (doc.1). 2. Deve de remunerações desde essa data à do trânsito em julgado, 31.7.2022: - 2.333,85€ do mês de fevereiro, que lhe descontou no recibo desse mês, como faltas (doc. 1) - meses de março a julho = 3.700€ x 5 meses = 18.500€ - proporcionais de férias, de SF e de SN desses 5,5 meses = 5.087,50€ Total: 25.921,35€. 3. O A. recebeu de subsídio de desemprego, desde 8.3.2022 a 31.7.2022, 5.281,47€ - docs. 2 a 5. 4. Como tal a R. deve-lhe 20.639,88€.” Nestes termos, deve a responsabilidade da R. do ponto 2.1 da sentença (remunerações de tramitação) ser liquidada em 20.639,88€.” Da decisão ora recorrida consta o seguinte: “Posto isto, temos que a sentença foi proferida em 09/02/2022 e notificada por carta registada às partes e electronicamente aos seus Mandatários no dia 10/02/2022, pelo que se considera notificada no dia 14/02/2022 (artigos 248.º e 249.º, do Código de Processo Civil), tendo assim transitado na parte que se aprecia em 01/03/2022. (…) logo em Fevereiro – sem esperar pela decisão deste Tribunal – a ré lhe ter pago as retribuições até então devidas. Sucede que, era devida ao autor a retribuição integral correspondente ao mês de Fevereiro de 2022, no montante de €3700,00, à qual a ré descontou a quantia de €2.333,85, que lhe deve. Nada mais, porém, lhe é devido.” O A. havia pedido, na ação, as férias e os subsídios de férias e de Natal proporcionais, à data da contestação/reconvenção, ao ano de 2021, os quais, foram, todavia integrados nas retribuições intercalares subsequentes ao despedimento, sendo que os proporcionais então reclamados foram “transferidos” para os proporcionais relativos ao trabalho referente a 2022, ou seja, incluindo, não apenas até 10.02.2022, mas também o período de 11.02.2022 a 01.03.2022, esta a data, considerada na decisão recorrida, em que transitou em julgado a sentença que declarou a ilicitude do despedimento. Assim, sem prejuízo naturalmente do liquidado na decisão recorrida, liquida-se ainda em €577,81 [€300,00:365 x 19 x 3] a quantia global devida ao A. a título de férias e de subsídios de férias e de Natal proporcionais ao período de 11.02.2022, inclusive [segundo o A. no requerimento da liquidação foi pago pela Ré o devido até 10.02.2022 – cfr. também al. H) dos factos provados], até 01.03.2022, data do trânsito em julgado da decisão que declarou a ilicitude do despedimento, ou sejam, 19 dias (e não 21 dias como diz o Recorrente, sendo que o mês de fevereiro de 2022 teve 28 dias). Assim e nesta parte procedem parcialmente as conclusões do recurso. *** V. DecisãoEm face do exposto, acorda-se em, julgar o recurso parcialmente procedente e, em consequência, para além da quantia de €2.333,85 a título de retribuições em dívida já liquidada na decisão recorrida, decide-se em liquidar e condenar a Ré a pagar, ainda, ao Autor a quantia global €577,81 a título de férias e de subsídios de férias e de Natal proporcionais ao período de 11.02.2022 até 01.03.2022. No mais impugnado no recurso, julga-se o mesmo improcedente, confirmando-se a decisão recorrida. Custas pelo Recorrente e Recorrida na proporção do decaimento. Porto, 05.06.2023 Paula Leal de Carvalho Rui Penha Jerónimo Freitas _____________ [1] Qual seja, o facto de a sentença, bem ou mal, no caso concreto, não se ter socorrido da fórmula legal do artº 390º, nº 1, do CT («até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento»), antes tendo adotado no ponto 2.1 a formulação da condenação da R. no valor das retribuições que o autor deixou de auferir entre Agosto de 2021 e o trânsito em julgado da presente sentença. [2] Relatado pela Exmª Srª Desembargadora Fernanda Soares e em que a ora relatora interveio como 1ª Adjunta. [3] Aprovado pela Lei 99/2003, de 27.08. |