Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3630/15.2T8GDM.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE PERMUTA
DEFEITOS
REGIME
CADUCIDADE
RECONHECIMENTO DO DIREITO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RP201706193630/15.2T8GDM.P1
Data do Acordão: 06/19/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA PARCIALMENTE
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O regime dos defeitos instituído para a compra e venda, por força do artigo 939.º do CCivil, tem aplicação a outros contratos tipificados neste diploma, tais como o de sociedade, de doação com encargo ou de dação em cumprimento, ou regulados em diplomas avulsos (por ex., locação financeira) e mesmo contratos atípicos, como a permuta, razão pela qual é aplicável a este último contrato, verificando-se os demais requisitos, o estatuído no artigo 1225.º do CCivil.
II - Quando se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, também impede a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido (cfr. artigo 331.º, nº 2 do CCivil).
III - Todavia, esse reconhecimento deve ser expresso, concreto ou preciso, de modo a não subsistirem dúvidas sobre a aceitação, pelo devedor, dos direitos do credor, não sendo suficiente a simples admissão vaga ou genérica desse direito, não sendo, porém, exigível que tenha de revestir o mesmo valor do acto que deveria ser praticado.
IV - Verifica-se tal reconhecimento se o construtor/vendedor procede à reparação de alguns dos defeitos denunciados, ainda que frustrada, e desde a denúncia se deslocou ao imóvel todos os anos até 2015 a fim de proceder à sua eliminação.
V - Não existe fundamento para fixar um montante indemnizatório a título de danos morais se apenas ficou provado que os defeitos existentes no imóvel, adquirido pelos Autores, não lhes permitiram usufruir do conforto natural que o mesmo lhes deveria proporcionar.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 3630/15.2T8GDM. P1-Apelação
Origem-Comarca do Porto-Gondomar-Inst. Local-Secção Cível-J2
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Miguel Baldaia
2º Adjunto Des. Jorge Seabra
5ª Secção
Sumário:
I- O regime dos defeitos instituído para a compra e venda, por força do artigo 939.º do CCivil, tem aplicação a outros contratos tipificados neste diploma, tais como o de sociedade, de doação com encargo ou de dação em cumprimento, ou regulados em diplomas avulsos (por ex., locação financeira) e mesmo contratos atípicos, como a permuta, razão pela qual é aplicável a este último contrato, verificando-se os demais requisitos, o estatuído no artigo 1225.º do CCivil.
II- Quando se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, também impede a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido (cfr. artigo 331.º, nº 2 do CCivil).
III- Todavia, esse reconhecimento deve ser expresso, concreto ou preciso, de modo a não subsistirem dúvidas sobre a aceitação, pelo devedor, dos direitos do credor, não sendo suficiente a simples admissão vaga ou genérica desse direito, não sendo, porém, exigível que tenha de revestir o mesmo valor do acto que deveria ser praticado.
IV- Verifica-se tal reconhecimento se o construtor/vendedor procede à reparação de alguns dos defeitos denunciados, ainda que frustrada, e desde a denúncia se deslocou ao imóvel todos os anos até 2015 a fim de proceder à sua eliminação.
V- Não existe fundamento para fixar um montante indemnizatório a título de danos morais se apenas ficou provado que os defeitos existentes no imóvel, adquirido pelos Autores, não lhes permitiram usufruir do conforto natural que o mesmo lhes deveria proporcionar
*
I-RELATÓRIO

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B... e C..., casados, residentes na ..., .., ..., Gondomar, intentaram a presente acção declarativa de condenação contra D..., Lda., com sede na ..., n.º ..., ..., Gondomar, pedindo a sua condenação a proceder à eliminação dos defeitos de obra no imóvel propriedade dos autores, no prazo máximo de 60 (sessenta dias), bem como ser condenada a pagar a quantia de € 10 000,00 (dez mil euros), a título de danos não patrimoniais.
Alegaram, para tal e em suma, que, em 21 de Julho de 2009, através de contrato de permuta e mútuo com hipoteca, em cumprimento de contrato promessa de compra e venda anteriormente celebrado, autores e ré transferiram para os primeiros a propriedade do imóvel descrito no artigo 1.º da petição inicial, sendo que em Dezembro de 2009 o imóvel começou a evidenciar defeitos os quais foram comunicados à ré, que sempre se apresentou e assumiu como construtora do imóvel. Mais alegaram que a ré, por si ou através da sociedade E..., Lda., procedeu como achou conveniente para a eliminação dos defeitos, porém tal reparação/eliminação não se revelou adequada e suficiente, uma vez que os defeitos denunciados continuam a afectar o imóvel em crise.
*
A Ré contestou a acção nos termos e com os fundamentos que constam do articulado de folhas 107 a 110, defendendo-se por excepção e por impugnação.
Por excepção invocou a inaplicabilidade do prazo de garantia de cinco anos, por o negócio celebrado entre as partes ter consistido num contrato de permuta, excepcionou, ainda, a caducidade do direito de eliminação dos defeitos, pelo decurso do prazo previsto no artigo 1225.º do Código Civil.
Por fim, impugnou parte da factualidade alegada pelos autores.
*
Os autores responderam às excepções invocadas, pugnando pela improcedência das mesmas.
*
Foi proferido despacho saneador, despacho de enunciação do objecto do litígio e temas de prova.
*
Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais.
*
A final foi proferida sentença que, na procedência da invocada excepção peremptória de caducidade, julgou a acção parcialmente procedente por provada e, em consequência condenou a Ré D..., Lda a:
1)- no prazo de sessenta dias, proceder às seguintes reparações no prédio urbano dos autores sito na ... n.º.., ..., Gondomar:
- reparar as humidades em várias divisões da habitação, em consequência das paredes exteriores rachadas (nas duas frentes), reparando tais paredes e o peitoral da janela partido;
- reparar as infiltrações de água em várias divisões da habitação e os danos no rodapé, soalho parquet e nas paredes da habitação;
- reparar as fissuras em todas as divisões da habitação e no tecto e paredes laterais de várias divisões e pisos da habitação;
2) a pagar aos autores a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de danos não patrimoniais e
3) absolveu a Ré do demais peticionado pelos autores;.
*
Não se conformando com o assim decidido, veio a Ré interpor o presente recurso, concluindo as suas alegações nos seguintes termos:
1ª- Por escritura pública de 21 de Julho de 2009, de permuta, a Ré transferiu a propriedade do seu prédio urbano composto de casa de rés-do-chão e andar sito na ..., .., ..., Gondomar, descrito no Registo Predial sob o nº 2467, e inscrito à matriz sob o artigo 4971º, para os Autores e estes, na mesma escritura, de permuta, transferiram para a Ré, a propriedade da fracção autónoma designada pela letra “E”, correspondente a uma habitação no 1º andar esquerdo, com entrada pelo nº 932, da Rua ..., freguesia ..., concelho da Maia.
2ª- Tendo sido a transferência da propriedade da Ré para os Autores, não por compra e venda, mas por permuta, o prazo de garantia de cinco anos, previsto no nº 1 do artigo 1225º do Código Civil, não é aplicável ao caso sub judice.
3ª- O disposto nos nºs 1, 2 e 3 do artigo 1225º do Código Civil é aplicável apenas ao “vendedor de imóvel”.
4ª- O contrato de compra e venda tem uma natureza jurídica diferente da permuta. “Compra e venda é um contrato pelo qual se transmite a propriedade de uma coisa, ou outro direito, mediante um preço”, art.º 874º do C. Civil. A permuta consiste na troca de propriedade de uma coisa ou direito por outra coisa ou direito.
5ª- O disposto no artigo 1225º do Código Civil destina-se a proteger o comprador de imoveis destinados a longa duração e não os permutantes adquirentes de imoveis.
6ª- Ficou como facto não provado que: os autores nunca tiveram conhecimento do mau isolamento do imóvel, assim como a causa dos defeitos enunciados no momento da aquisição do imóvel em crise.
7ª- Razão pela qual, tratando-se, não de uma compra e venda, mas de uma permuta, cada um dos permutantes adquire a propriedade do bem permutado no estado físico em que se encontra ao momento da permuta.
8ª- O disposto no Decreto-Lei nº 67/2003 de 8 de Abril é aplicável “aos contratos de compra e venda celebrados entre profissionais e consumidores”. E define “VENDEDOR”, qualquer pessoa singular ou colectiva que, ao abrigo de um contrato, vende bens de consumo no âmbito da sua actividade profissional.
9ª- A Meritíssima Juíza do Tribunal a quo, não fez correta aplicação do disposto no artigo 1225º do Cód. Civil e Dec. Lei 67/2003 ao contrato de transferência da propriedade do imóvel para os Autores, que foi de permuta, e não de compra e venda, como referem as disposições legais enunciadas.
Por outro lado,
10ª- O imóvel foi permutado aos Autores a 21 de Julho de 2009, que tomaram posse do mesmo nessa data.
11ª- Confessam os Autores–art.º 29 da P.I.–que “Actualmente o imóvel possui os mesmos defeitos que foram comunicados em Dezembro de 2009”.
12ª- Como resulta do depoimento do sócio gerente da firma E..., Lda., construtora da obra de pedreiro e trolha do prédio em causa, depois da intervenção que fez no prédio 2010/2011, nunca mais comunicou à Ré os defeitos da obra cuja reclamação o Autor fazia.
13ª- As instâncias dos advogados e da Meritíssima Juíza, por mais que uma vez, sempre foi peremptória a dizer:
J – Pronto, e agora volto a perguntar novamente.
Quando foi lá, o senhor já disse que não reparou porque havia outras coisas é isso?
T – Sim, sim.
J – E o senhor não assumiu, mas a parte essa não reparação foi perante o Sr. B..., ou falou com a D...? (22:43 a 22:46)
T – Não, foi só perante o Sr. B.... (22:47 a 22:48)
J – Então mas porquê portanto, preciso de perceber isso.
Quem é que o chamou lá, foi o Sr. B...? (22:49 a 22:54)
T – Foi o Sr. B..., sim, sim. (22:54)
J – E ele tinha o seu contacto é isso? (22:55 a 22:56)
T – Tinha, tinha. (22:57)
J – Ou seja, quando havia esses problemas, contratava, falava consigo? (22:57 a 23:00)
T- Sim falava sim comigo, algumas vezes sim, ele ficou com o contacto a partir da 1ª intervenção.
(23:00 a 23:06)
J – E o senhor deu conhecimento à D... que ia lá tratar disso? (23:06 a 23:08)
T – Não dei não. (23:09)
J – Não deu conhecimento, pronto.
14ª- Os contactos, a partir da 1ª intervenção, 2010/2011, foram em exclusivo entre o Autor e o representante da construtora, E..., Lda. que não deu conhecimento à Ré.
15ª- A interpelação dos Autores, verificou-se logo em 2009 e com a missiva de 1 de Junho de 2015.
16ª- Não houve conhecimento e muito menos reconhecimento dos defeitos da obra, depois da intervenção em 2010/2011.
17ª- A 1 de Junho de 2015, já estavam os Autores a denunciar os defeitos para além dos 5 anos de garantia.
De qualquer modo,
18ª- Se os defeitos eram os mesmos de 2009, como alegam os Autores, se houve uma intervenção a 2010/2011, se os mesmos não foram reparados, ao proporem a acção a 15 de Dezembro de 2015, já havia caducado, nos termos do nº 2 do artigo 1225º do Código Civil, e nº 3 do artigo 5º-A do Dec. Lei nº 67/2003, de 8 de Abril, os direitos dos Autores a verem reparados os defeitos, e a pedirem indemnização.
19ª- Os factos invocados pelos Autores para fundamentar o pedido de indemnização por danos não patrimoniais foram considerados não provados.
20ª- Considerar provado que os defeitos descritos não permitiram aos Autores usufruir do conforto natural que a sua habitação lhes deveria proporcionar, impedindo-os que habitassem em imóvel com características que lhes garantissem conforto à sua pessoa, é conclusivo, sobretudo quando os factos relevantes para justificar uma indemnização por danos não patrimoniais foram todos considerados “não provado”.
21ª– Não há fundamento, por falta de prova, condenar a Ré a pagar aos Autores uma indemnização por danos não patrimoniais.
De qualquer modo,
22ª– A reclamação de uma indemnização por danos não patrimoniais já prescreveu, porquanto os Autores alegam já ter conhecimento dos defeitos desde Dezembro de 2009 e nos termos do artigo 498º do Cod. Civil, prescreveu no prazo de três anos, a contar da data em que o lesado teve conhecimento do direito que lhe compete.
Entre outros a douta sentença violou o disposto nos artigos 1225º, 498º do Cod. Civil e os artigos 5º e 5º-A do Dec.–Lei 67/2003 de 8/4.
Pelo exposto, deve o presente recurso interposto da Sentença merecer provimento, ser a mesma revogada por outra que absolva a Ré dos pedidos.
*
Devidamente notificados contra-alegaram os Autores ou concluindo pelo não provimento do recurso.
*
Após os vistos legais cumpre decidir.
*
II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635º, nº 3, e 639º, nsº 1 e 2, do C.P.Civil.
*
No seguimento desta orientação são as seguintes as questões que no recurso vêm colocadas:
a)- saber se é aplicável ao caso concreto o disposto no artigo 1225.º, nº 1 do CCivil;
b)- saber se se verifica, ou não, a caducidade do direito dos Autores de pedir a eliminação dos defeitos existentes na moradia que adquiriram à Ré.
c)- saber se existe, ou não, fundamento para a arbitrar a favor dos Autores indemnização a título por danos não patrimoniais.
*
A)-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria factual que o tribunal recorrido deu como provada:
1º)- O prédio urbano sito na ..., .., na freguesia ..., concelho de Gondomar, descrito na Conservatória do Registo Predial de Gondomar sob o n.º 2467, inscrito na matriz predial urbana da respectiva freguesia sob o n.º 11689, está registado em tal Conservatória a favor dos autores, conforme certidões de folhas 26 a 30, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
2º)- A ré é uma sociedade comercial, que se dedica à construção de edifícios e respectiva venda.
3º)- No âmbito da sua actividade comercial, a Ré, em Fevereiro de 2009, construiu o prédio identificado em 1., com licença de construção n.º 34/07- Ficha Técnica da Habitação, conforme documento de folhas 31 a 41, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
4º)- Em 17-02-2009, a Ré prometeu vender e os Autores comprar, livre de ónus ou encargos, uma habitação unifamiliar do tipo T3, com cave, rés-do-chão e 1º andar, com entrada pelo n.º .. da ..., freguesia ..., concelho de Gondomar, que corresponde ao prédio identificado em 1), celebrando o contrato escrito intitulado de contrato promessa de compra e venda, junto aos autos a folhas 42 a 44, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
5º)- A motivação para a celebração do referido contrato promessa foi o facto de, à referida data, o imóvel em crise ainda se encontrar em construção.
6º)- Uma vez terminada a construção do imóvel, e considerando os prazos convencionados, Autores e Ré, celebram em 21-07-2009 o contrato prometido.
7º)- Assim, através de contrato de permuta e mútuo com hipoteca, Autores e Ré transferiram para os primeiros a propriedade do imóvel identificado em 1., celebrando para o efeito a escritura pública cuja cópia está junta aos autos a folhas 79 a 87, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido.
8º)- Em Dezembro de 2009 os autores viram-se confrontados com inundação do imóvel em crise, provocada pelo excesso de água na caixa-de-ar do avançado da frente da casa, o que foi comunicado à ré e alvo de intervenção pela ré.
9º)-Em Dezembro de 2009 o imóvel começou a evidenciar os seguintes defeitos:
- humidades em várias divisões no 1.º andar da habitação, em consequência de paredes exteriores rachadas nas duas frentes, infiltrações de água em várias divisões no 1º andar da habitação;
- fissuras em todas as divisões da habitação no tecto e paredes laterais; o peitoral da janela de um quarto da frente partido; danos no rodapé e soalho parquet.
10º)- Tais defeitos foram comunicados verbalmente à ré em Dezembro de 2009.
11º)- A ré sempre se assumiu e apresentou como construtora do imóvel e interpelada dos defeitos assumiu-se como tal.
12º)- Após a denúncia, a ré, por si ou através da sociedade comercial E..., Lda., que subcontratou e actuava sob as suas ordens, deslocou-se, por mais que uma vez, ao imóvel dos autores a fim de proceder à eliminação dos defeitos que o imóvel apresentava, realizando as tarefas que entendeu necessárias para eliminar os defeitos.
13º)- Porém, apesar de tal reparação, os defeitos não foram eliminados, mantendo-se, o seguinte, a saber:
1) Humidades em várias divisões da habitação, em consequência de: a) Paredes exteriores rachadas (nas duas frentes); b) Peitoral da janela partido;
2) Infiltrações de água em várias divisões da habitação, com danos no rodapé, soalho parquet e nas paredes da habitação;
3) Fissuras em todas as divisões da habitação e no tecto e paredes laterais de várias divisões e pisos da habitação;
4) Portão exterior inacabado.
14º)- Desde o ano de 2009, a Ré deslocou-se ao imóvel, propriedade dos Autores, todos os anos, pelo menos uma vez por ano, a fim de proceder à eliminação de defeitos da obra, até ao presente ano de 2015.
15º)- Para a eliminação dos defeitos que a obra padece, é necessário realizar os seguintes trabalhos:
a) Revestir as paredes exteriores a capoto de 5 cm;
b) Limpeza da cobertura do imóvel e aplicação de duas camadas de tela e isolamento coberto a godo;
c) Reparação das paredes interiores para eliminação de fissuras e consequente pintura;
d) Substituição de soleiras danificadas;
e) Reparação do soalho danificado.
16º)- Os defeitos encontrados na obra e supra discriminados importam a realização de trabalhos quantificados no valor de cerca de € 14.173,00, acrescido de IVA à taxa legal e executáveis num prazo máximo de 60 dias.
17º)- Tais defeitos de obra, em grande parte, resultam de mau isolamento da cobertura da habitação dos Autores.
18º)- Os autores em 1 de Junho de 2015 enviaram à ré a missiva junta aos autos a folhas 53 a 54, da qual se retira, além do mais, o seguinte teor «(…) os vícios detectados na habitação do n/constituinte, sita na ... n.º.. (…), construída por V. exas por conta do contrato de empreitada em tempo celebrado, ainda não foram reparados, definitivamente, não obstante as diversas interpelações para o efeito. Os defeitos que a obra padece, e oportunamente comunicados a V. Exas, em Dezembro de 2010, nunca foram eliminados, são os seguintes:
1. Humidades em várias divisões da habitação, em consequência de:
a) paredes exteriores rachadas (nas duas frentes);
b) peitorais da janela partido;
c) telhado placa betão;
2) Infiltrações de água em várias divisões da habitação, com danos no soalho parquet, outros revestimentos em madeira e nas paredes e tectos da habitação;
3-Fissuras em todas as divisões da habitação e outros danos, a saber:
a) tecto e paredes laterais de todas as divisões e pisos da habitação;
b) portão exterior inacabado após reparação das dobradiças no mesmo;
c) reparação inacabada após intervenção na parede do avançado na parte da frente da casa após inundação;
d) odor a mofo e bolor no interior dos roupeiros nos quartos.
19º)- A ré não respondeu à missiva referida em 8).
20º)- Nos dias subsequentes, os autores continuaram a tentar contactar com a ré, ainda que telefonicamente, a fim de esta assumir os defeitos da obra e proceder à sua reparação e não obteve qualquer resposta 21- Os defeitos descritos em 13) não permitiram aos Autores usufruir do conforto natural que a sua habitação lhes deveria proporcionar, impedindo-os que habitassem em imóvel com características que lhes garantissem conforto à sua pessoa.
22º)- A presente acção deu entrada em juízo no dia 15 de Dezembro de 2015.
Factos não provados:
1º)- Em Dezembro de 2009 o imóvel começou a evidenciar a falta de pintura no portão, o que foi comunicado à ré.
2º)- O descrito em 8) dos factos provados ocorreu no natal do ano de 2012.
3º)- Para reparação do descrito em 8) dos factos provados a ré procedeu à realização de dois furos na base do avançado para que a água saísse e para evitar mais acumulação e maior inundação do interior do imóvel.
4º)- Após a solução de urgência, por insistência dos Autores, a Ré deslocou-se ao imóvel em crise em finais de Fevereiro, inícios de Março de 2013 a fim de realizar a intervenção profunda que a eliminação deste defeito impunha.
5º)- A referida intervenção não foi concluída, isto é, a Ré apenas procedeu ao levantamento do granito do avançado da parte da frente da casa e revestiu de novo a parede com um produto isolante, mas mais uma vez não finalizou a intervenção ficando o novo granito no exterior sem qualquer operação de isolamento.
6º)- Actualmente a ligação entre a parede frontal da casa e o avançado continua a ser permeável, causando infiltrações no interior do imóvel.
7º)- A Ré também não procedeu à pintura das paredes exteriores após a referida intervenção.
8º)- Actualmente, ainda restam nas paredes da frente e traseira o silicone colocado pela Ré nas várias fissuras para atenuar um pouco a infiltração da água aquando as suas várias deslocações, ficando sempre para depois a resolução do problema.
9º)- Os autores estão privados do uso dos dois roupeiros em quarto da parte de traz da casa, atenta a destruição da madeira e os consequentes odores causados pela humidade e infiltrações.
10º)- As fortes humidades que se manifestam no imóvel em crise levam a que os autores e o seu agregado familiar, durante os sucessivos invernos, não usem as divisões mais afectadas, como quartos e roupeiros, atentos os fortes odores.
11º)- Levando os Autores a socorrer-se de familiares para que estes guardem grande parte dos seus pertences, tais como roupa e calçado, durante o inverno.
12º)- Os Autores nunca tiveram conhecimento do mau isolamento do imóvel, assim como da causa dos defeitos enunciados supra, no momento da aquisição do imóvel em crise.
*
III- O DIREITO

Questão prévia
Para a apreciação das questões colocada no recurso e atrás enunciadas este tribunal irá apenas ter em conta o quadro factual que o tribunal recorrido deu como assente, pois que, a Ré recorrente não o impugnou no respectivo recurso.
Efectivamente, embora no corpo alegatório a Ré faça referência à impugnação do ponto 11. da fundamentação factual o certo é que nas conclusões que formulou nada refere quanto à referida impugnação não tendo dado, assim, cumprimento ao estatuído no 640.º do Civil, nomeadamente ao consignado nas als. a) a c) do seu nº 1.
Como ensina o Conselheiro Amâncio Ferreira[1] “Expostas pelo recorrente, no corpo da alegação, as razões de facto e de direito da sua discordância com a decisão impugnada, deve ele, face à sua vinculação ao ónus de formular conclusões, terminar a sua minuta pela indicação resumida, através de proposições sintéticas, dos fundamentos, de facto e/ou de direito, por que pede a alteração ou anulação da decisão”.
As conclusões são “proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação”.[2]
Como refere Abrantes Geraldes[3], quando sintetiza o regime que agora vigora sempre que o recurso respeite à impugnação da decisão da matéria de facto:
“a) Em quaisquer circunstâncias, o recorrente deve indicar sempre os concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, com enunciação na motivação do recurso e síntese nas conclusões;
(…).
Diga-se, aliás, que a alusão aos “concretos pontos de facto”, contida na alínea a) do nº 1 do artigo 640.º já citado visa acentuar o carácter atomístico, sectorial e delimitado que o recurso ou impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto em regra deve revestir.
*
Feito este breve esclarecimento cumpre, pois, entrar na apreciação da primeira questão colocada no recurso e que consiste em:
a)- saber se é aplicável ao caso concreto o disposto no artigo 1225.º, nº 1 do CCivil.
Como flui das alegações recursivas a Ré recorrente entende, ao contrário do plasmado na sentença recorrida, que no caso em apreço não é aplicável o disposto no artigo 1225.º, nº 1 do CCivil pela simples razão que não ocorreu qualquer venda mas sim uma permuta.
Será que assim é?
Analisando.
Dispõe este normativo sob a epígrafe “Imóveis destinados a longa duração”que:
1- Sem prejuízo do disposto nos artigos 1219º e seguintes, se a empreitada tiver por objecto a construção, modificação ou reparação de edifícios ou outros imóveis destinados por sua natureza a longa duração e, no decurso de cinco anos a contar da entrega, ou no decurso do prazo de garantia convencionada, a obra, por vício do solo ou da construção, modificação ou reparação, ou o erros na execução dos trabalhos ruir total ou parcialmente, ou apresentar defeitos, o empreiteiro é responsável pelo prejuízo causado ao dono da obra ou a terceiro adquirente.
2- A denúncia em qualquer dos casos, deve ser feita dentro do prazo de um ano e a indemnização deve ser pedida no à no seguinte à denúncia.
3- Os prazos previstos no número anterior são igualmente aplicáveis ao direito à eliminação dos defeitos, previstos no artigo 1221.º.
4– O disposto nos números anteriores é aplicável ao vendedor de imóvel que o tenha construído, modificado ou reparado (negrito e sublinhados nossos).
Como supra se referiu a Ré invocou a inaplicabilidade do prazo de cinco anos previsto no transcrito nº 1 do artigo 1225.º com fundamento que o prédio em causa não foi vendido mas sim permutado pelo prédio pertença dos Autores, inscrito na matriz sob o artigo 5564 e descrito na 2.ª Conservatória de Registo Predial da Maia.
Efectivamente, como se mostra assente nos autos, através de contrato de permuta e mútuo com hipoteca Autores e Ré fizeram permuta dos imóveis descritos na escritura junta aos autos a fols. 79 a 87 tendo a Ré transferido para os Autores a propriedade do imóvel descrito no ponto 1) do elenco dos factos provados e objecto da discussão dos autos.
O contrato de permuta, troca ou escambo era um contrato legalmente típico regulado nos artigos 1592.º e seg. do Código Civil de 1867, não tendo sido seleccionado para o elenco dos contratos tipificados no Código Civil de 1966, embora o seu homólogo comercial se mantenha previsto no artigo 480.º do Código Comercial, com remissão para as regras do contrato de compra e venda.
Portanto, no quadro da lei actual, o contrato de permuta é um contrato atípico, cuja fundamentação legal se escora no artigo 405.º, nº 1 do Código Civil, no quadro do princípio da liberdade contratual.
Este contrato atípico funciona em termos de dois recíprocos contratos de compra e venda, em que o objecto mediato de um deles constituiu, total ou parcialmente, a contrapartida económica em relação ao outro.
Todavia, apesar de ser um contrato atípico face ao disposto no artigo 939.º do Código Civil que manda aplicar as normas que regem a compra e venda aos outros contratos onerosos pelos quais se alienam bens, onde se inclui o negócio de permuta, o regime deste contrato é o da compra e venda e no caso tratando-se de bem imóvel seria aplicável o prazo do artigo 916.º, n.º 3 do Código Civil que, como é sabido, prevê os mesmos prazos do artigo 1225.º, nº 1 do Código de Processo Civil.
No mesmo sentido vai Pedro Romano Martinez[4] quando refere “Por sua vez, o regime dos defeitos instituído para a compra e venda, por força do artigo 939.º, tem aplicação a outros contratos tipificados no Código Civil, tais como o de sociedade, de doação com encargo ou de dação em cumprimento ou regulados em diplomas avulsos (por ex., locação financeira) e mesmo contratos atípicos, como a permuta”( negrito e sublinhados nossos).
Contudo, há que ter em consideração que também nos autos resultou assente que a Ré é uma sociedade comercial que se dedica à construção de edifícios e respectiva venda e no âmbito da sua actividade comercial a ré em Fevereiro de 2009 construiu o prédio identificado no facto descrito em 1º) da fundamentação factual, com licença de construção e ficha técnica de habitação [factos descritos em 2º e 3º da fundamentação factual].
Daqui resulta, portanto, que o regime dos defeitos da obra realizada com origem nesse período, é o previsto para o contrato de empreitada de imóveis de longa duração, por força do disposto no artigo 1225.º, n.º 4, do Código Civil.
Aliás, sob este conspecto importa ainda ter presente que como estamos perante um contrato celebrado entre um profissional que é a Ré que como sociedade comercial que se dedica, designadamente, à reparação, à construção e à compra e venda de imóveis com intuito lucrativo, e uns consumidores que são os Autores que destinaram a moradia adquirida à sua habitação, é também aplicável o regime do Decreto-Lei n.º 67/2003, de 8 de Abril, nos termos do Artigo 1.º - A, n.º 1, e 1.º - B, a), deste diploma, na redacção conferida pelo Decreto-Lei n.º 84/2008, de 21 de Maio, o qual rege certos aspectos da venda de bens de consumo e das garantias a ela relativas, com vista a assegurar a protecção dos interesses dos consumidores, sendo também aplicável aos contratos de empreitada, nos termos do n.º 2, do artigo 1.º-A, deste diploma.
*
Diante do exposto nada temos a censurar à decisão recorrida quando considerou ser aplicável à situação dos autos o prazo de garantia a que se refere o artigo 1225.º, nº 1 do CCivil.
*
Improcedem, assim, as conclusões 1ª a 9ª formuladas pela Ré recorrente.
*
A segunda questão coloca no recurso prende-se com:
b)- saber se se verifica, ou não, a caducidade do direito dos Autores de pedir a eliminação dos defeitos existentes na moradia que adquiriram à Ré.
Na decisão recorrida propendeu-se para o entendimento de que tal excepção não se verificava, com base em que a Ré procedeu ao reconhecimento do direito dos Autores de pedirem a eliminação dos defeitos nos termos preceituados no artigo 331.º, nº 2 do CCivil.
Com o assim decidido não concorda a Ré recorrente que propugna pela verificação da excepção da caducidade.
Quid iuris?
Tendo em conta o acima referido, a propósito da análise da questão anterior, os prazos a considerar para a apreciação da invocada excepção de caducidade são os previstos no artigo 1225.º do Código Civil e nos artigos 5.º e 5.ºA do Decreto-Lei 67/2003 de 08/04, sendo que, também neste último diploma o regime jurídico da venda de bens de consumo prevê o prazo de cinco anos como prazo de garantia a contar da entrega do bem e, para que haja responsabilidade por cumprimento defeituoso, é necessário que previamente seja denunciado o defeito pelo comprador no prazo de um ano a contar da data em que o tenha detectado, tendo o consumidor três anos a contar da denúncia para propor a acção (cfr. artigos 5.º e 5.º-A do citado diploma).
Ora, refere a Ré recorrente que estando provado nos autos que a entrega do imóvel aos Autores ocorreu em 21 de Julho de 2009 com a celebração da escritura pública, deixaram estes precludir o direito de reparação do imóvel em 20 de Julho de 2014, verificando-se a caducidade, porquanto a acção deu entrada em juízo em 15 de Dezembro de 2015, isto é, muito para lá dos cinco anos a que se refere o nº 1 do artigo 1225.º do CCivil.
Analisando.
Dúvidas não existem de que, tendo a entrega do imóvel ocorrido em 21 de Julho de 2009, o prazo de cinco anos a que se referem os artigos 1225.º, nº 1 do CCivil e 5.º, nº 1 do D.Lei 67/2003 de 08/04, terminava no dia 20 de Julho de 2015, pelo que, tendo a acção dado entrada em juízo no dia 15/12 de 2015, tal prazo já se encontrava exaurido.
Todavia, não obstante o decurso do referido prazo de cinco anos, o tribunal recorrido entendeu, como já noutro passo se assinalou, que a Ré reconheceu o direito de eliminação dos defeitos nos termos estatuídos no artigo 331.º, nº 2 do CCivil o que impediu a verificação da invocada excepção de caducidade.
Vejamos, então, se assim é.
Dispõe o artigo 328.º do CCivil que o prazo de caducidade não se suspende nem se interrompe senão nos casos em que a lei o determine.
E nos termos do artigo 331.º do mesmo diploma:
1. Só impede a caducidade a prática, dentro do prazo legal ou convencional, do acto a que a lei ou convenção atribua efeito impeditivo.
2. Quando, porém, se trate de prazo fixado por contrato ou disposição legal relativa a direito disponível, impede também a caducidade o reconhecimento do direito por parte daquele contra quem deva ser exercido.
Como é sabido, a caducidade pode ser impedida, mas não interrompida. O impedimento corresponde à efectivação do direito, não gera novo prazo, ficando o direito definido sujeito às disposições que regem a prescrição.
Para que o reconhecimento constitua causa impeditiva da caducidade, é preciso, segundo Vaz Serra, que este seja tal que tenha o mesmo efeito que teria a prática do acto sujeito a caducidade. Assim, se se trata de prazo de propositura de uma acção judicial, deve ser tal que torne o direito certo e faça as vezes da sentença, porque tem o mesmo efeito que a sentença pela qual o direito fosse reconhecido.[5]
Todavia, como afirma P. Romano Martinez[6], esta interpretação restritiva não está de acordo com a letra da lei e leva a salvaguardar situações abusivas. O artigo 331.º, nº 2 fala só em reconhecimento do direito, não exigindo que tal confirmação revista o mesmo valor do acto que deveria ser praticado em seu lugar. Se assim fosse, as situações de impedimento da caducidade seriam diminutas; mas mais importante que a questão literal é o facto de aquela interpretação restritiva levar a aceitar como válidas situações de manifesto abuso do direito.
Acrescenta o mesmo Autor que se deverá admitir que o reconhecimento do defeito, com promessas de solucionar o diferendo, constitui um impedimento da caducidade, pois não está em contradição com a letra do artigo 331.º, nº 2 e permite evitar que se considerem válidas situações violadoras do princípio da boa fé, designadamente da regra do não venire contra factum proprium.[7]
Contudo, não é qualquer atitude do vendedor ou do empreiteiro que pode ser reputada como sendo um reconhecimento: o procedimento do responsável tem de ser claro, no sentido de aceitar que o cumprimento se apresenta como defeituoso.
Neste sentido se pronuncia também J. Cura Mariano[8], ao afirmar, no âmbito da empreitada, que se é o empreiteiro quem, de forma inequívoca, reconhece a existência do direito no decurso do prazo de caducidade, mesmo que não pratique os actos equivalentes à sua realização, não há razão nenhuma para manter a protecção a uma situação de incerteza que já não se verifica pelo reconhecimento efectuado.
O reconhecimento deve, pois, ser expresso, concreto ou preciso, de modo a não subsistirem dúvidas sobre a aceitação, pelo devedor, dos direitos do credor, não sendo suficiente a simples admissão vaga ou genérica desse direito[9]; mas não será exigível que tenha de revestir o mesmo valor do acto que deveria ser praticado.
Isto dito, vejamos, então, o que resulta do quadro factual que nos autos ficou assente em termos da verificação da factie species do citado artigo 331.º, nº 2 do CPCivil.
Ora a este respeito mostra-se provado que:
- Em Dezembro de 2009 os autores viram-se confrontados com inundação do imóvel em crise, provocada pelo excesso de água na caixa-de-ar do avançado da frente da casa, o que foi comunicado à ré e alvo de intervenção pela ré;
- Em Dezembro de 2009 o imóvel começou a evidenciar os seguintes defeitos:
- humidades em várias divisões no 1.º andar da habitação, em consequência de paredes exteriores rachadas nas duas frentes, infiltrações de água em várias divisões no 1º andar da habitação;
- fissuras em todas as divisões da habitação no tecto e paredes laterais; o peitoral da janela de um quarto da frente partido; danos no rodapé e soalho parquet;
- Tais defeitos foram comunicados verbalmente à ré em Dezembro de 2009;
- Após a denúncia, a ré, por si ou através da sociedade comercial E..., Lda., que subcontratou e actuava sob as suas ordens, deslocou-se, por mais que uma vez, ao imóvel dos autores a fim de proceder à eliminação dos defeitos que o imóvel apresentava, realizando as tarefas que entendeu necessárias para eliminar os defeitos.
- Porém, apesar de tal reparação, os defeitos não foram eliminados, mantendo-se, o seguinte, a saber:
- humidades em várias divisões da habitação, em consequência de: a) Paredes exteriores rachadas (nas duas frentes); b) Peitoral da janela partido;
- infiltrações de água em várias divisões da habitação, com danos no rodapé, soalho parquet e nas paredes da habitação;
- fissuras em todas as divisões da habitação e no tecto e paredes laterais de várias divisões e pisos da habitação;
- portão exterior inacabado.
- Desde o ano de 2009, a Ré deslocou-se ao imóvel, propriedade dos Autores, todos os anos, pelo menos uma vez por ano, a fim de proceder à eliminação de defeitos da obra, até ao presente ano de 2015.
Perante este quadro factual, resulta de modo inequívoco ter a Ré reconhecido que o imóvel padecia de defeitos.
Efectivamente, a reparação pela Ré vendedora/construtora de alguns dos defeitos denunciados, ainda que frustrada, configura, sem margem para qualquer dúvida, o reconhecimento da Ré recorrente perante os Autores do direito destes à respectiva eliminação, sendo, aliás, sintomático desse reconhecimento, a circunstância de a Ré desde 2009 de se deslocar ao imóvel todos os anos e até 2015 a fim de proceder à eliminação de defeitos da obra.
Como assim, a reparação frustrada dos defeitos, realizada pela Ré em data anterior a Dezembro de 2010, ou seja, quando ainda não tinha decorrido um ano sobre a data de detecção dos defeitos (Dezembro de 2009) (cfr. no nº 3 do artigo 1225º, por remissão para o nº 2 do mesmo preceito, conforme resulta do seu nº 4, que manda aplicar àquela situação específica o regime do contrato de empreitada) artigo equivale, assim, a reconhecimento do direito do Autores, efectuada no decurso do prazo, pelo que impede a caducidade.
A partir daquela data Dezembro de 2010 não se gerou novo prazo de caducidade, pois que, como acima se referiu, o impedimento correspondendo à efectivação do direito, não gera novo prazo, ficando o direito definido sujeito às disposições que regem a prescrição, ou seja, o direito dos Autores ficou sujeito apenas ao prazo ordinário de prescrição.
*
Diante do exposto tona-se evidente ter sido a acção intentada dentro do prazo de prescrição a que alude o artigo 303.º do CCivil.
*
Improcedem, desta forma, as conclusões 10ª a 18ª formuladas pela Ré recorrente.
*
A terceira questão colocada no recurso consiste em:

c)- saber se existe, ou não, fundamento para a arbitrar a favor dos Autores indemnização a título de danos não patrimoniais.

Como se evidencia da decisão recorrida aí se fixou em € 2.000,00 o montante indemnizatório a titulo de danos não patrimoniais sofridos pelos Autores.
Deste segmento decisório dissente também a Ré recorrente por não estar provado nos autos qualquer realidade factual que suporte a referida indemnização.
Que dizer?
Cremos, salvo o devido respeito que, sob este conspecto, a razão está do lado da Ré recorrente.
Atentemos.
Pela acção, os Autores ao pedirem a eliminação dos defeitos exerceram o direito preferencial estatuído por lei, traduzido num verdadeiro direito de indemnização, na sua modalidade de reconstituição natural, através do qual se visa remover o prejuízo causado, estabelecendo-se a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação (artigo 562º do Código Civil).
É o modo ideal de ressarcimento que mais afinidade tem com o próprio cumprimento da prestação, actuando como seu equivalente.
Todavia, a par dos diversos direitos conferidos ao dono da obra, admite-se a possibilidade do direito geral de indemnização relativamente aos prejuízos que não obtiverem reparação através dos demais mecanismos de compensação do cumprimento defeituoso, como a eliminação dos defeitos, ou se esse for o único meio capaz de reparar o prejuízo resultante do defeito.
Neste âmbito estão em causa os danos colaterais derivados para os Autores do cumprimento defeituoso da obra, de índole não patrimonial, e que serão indemnizáveis se assumirem um grau de gravidade que justifique a sua compensação (artigo 496º do Código Civil).
É hoje maioritária a posição da doutrina e da jurisprudência no sentido da indemnização dos danos de índole não patrimonial no âmbito da responsabilidade contratual.
Não ignoramos a controvérsia gerada à cerca dessa questão, pois o Prof. Antunes Varela defendeu a não ressarcibilidade dos danos não patrimoniais em matéria de responsabilidade contratual, propugnando a reparabilidade dos danos dessa natureza apenas em sede de responsabilidade civil extracontratual.[10]
Não cremos sustentável esse posicionamento, até pela inserção sistemática da regulação da matéria da matéria da responsabilidade civil, aplicável, em geral, às duas formas de responsabilidade civil-contratual ou extracontratual-sem que haja exclusão da ressarcibilidade dos danos não patrimoniais para a contratual.
Assim, aderimos à tese sustentada pela maioria e defendemos que, mesmo na responsabilidade contratual, são indemnizáveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito (artigo 496º do Código Civil).
Acontece que, em termos factuais, e quanto a esta questão apenas está provado que:
- Os defeitos descritos em 13) não permitiram aos Autores usufruir do conforto natural que a sua habitação lhes deveria proporcionar, impedindo-os que habitassem em imóvel com características que lhes garantissem conforto à sua pessoa- (ponto 21º da fundamentação factual).
Ora, tal como refere a Ré recorrente o referido ponto da fundamentação factual mais não é do que uma mera conclusão.
Efectivamente, aí não se concretiza qualquer dano que os Autores tenham sofrido decorrente dessa falta de conforto.
É certo que essa falta de conforto poderia seria apta a gerar danos morais na pessoa dos Autores, porém, nada está provado nos autos.
Diga-se, aliás, que lendo a petição inicial nem sequer foram alegados, pois que, o vertido nos artigos 40º a 45º da referida peça, apenas descreve a privação que os Autores sofreram de alguns dos cómodos do imóvel em consequência dos defeitos (factos que até não resultaram provados-cfr. matéria factual dada como não provada) mas nada se alega e concretiza relativamente a danos daí decorrentes, sendo que, o vertido no artigo 46º é manifestamente conclusivo.
*
Assim, não estando provados os danos, falha, como é evidente, um dos pressupostos da obrigação de indemnizar.
*
Procedem, assim, as conclusões 19ª a 21ª formuladas pela recorrente havendo, pois, que revogar a decisão recorrida nesse segmento.
*
IV-DECISÃO
Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação parcialmente procedente por provada e, consequentemente, revogam a decisão recorrida na parte em que condenou a Ré a pagar aos Autores a quantia de € 2.000,00 (dois mil euros), a título de danos não patrimoniais, mantendo-se quanto ao mais.
*
Custas por apelante e apelados na proporção do respectivo decaimento (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).

Porto, 19 de Junho de 2017.
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
Jorge Seabra
____________
[1] Manual dos Recursos em Processo Civil”, 7ª Ed., págs. 172 e 173
[2] Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, vol. V, pág. 359.
[3] In “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2014, 2ª Ed., pág. 132.
[4] In “Cumprimento defeituoso Em Especial na Compra e Venda e na Empreitada”, Almedina pág. 174.
[5] Vaz Serra, Prescrição Extintiva e Caducidade, BMJ 107-233 e 234; Aníbal Castro, A Caducidade, 2ª ed., 144 e 145.
[6] Obra citada pag. 427/428.
[7] Refere ainda o mesmo autor-obra citada pág. 48-que noutros ordenamentos jurídicos, mesmo quando não se considere que os prazos sejam de prescrição, como no direito francês, aceita-se o seu prolongamento sempre que se entabulam negociações entre as partes, com vista à supressão dos defeitos do cumprimento defeituoso. E até a participação do sinistro à respectiva seguradora tem sido considerado um indício de que o faltoso assumiu a sua responsabilidade.
[8] Responsabilidade Contratual do Empreiteiro pelos Defeitos da Obra, 123.
[9] Ac. do STJ de 25.11.98, BMJ 481-430; também Menezes Cordeiro, Tratado de Direito Civil Português, I, Tomo IV, 225.
[10] In “Das Obrigações em Geral”, I, 9ª ed., pág. 627.