Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
6820/19.5T8VNG-D.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CARLOS GIL
Descritores: ADMINISTRADOR DA INSOLVÊNCIA
RESPONSABILIDADE DO ADMINISTRADOR
DESTITUIÇÃO DE ADMINISTRADOR
Nº do Documento: RP202101256820/19.5T8VNG-D.P1
Data do Acordão: 01/25/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: Inexiste fundamento legal para que sejam declarados sem efeito os atos praticados pelo Administrador da Insolvência desde a votação maioritária dos credores que deliberou a sua substituição e até à efetivação dessa cessação de funções por efeito da nomeação do administrador da insolvência eleito pela maioria dos credores.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Acordam os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto:

1. Relatório
Em 17 de fevereiro de 2019, B… e C… instauraram processo especial para acordo de pagamento indicando como administrador judicial provisório o Sr. Dr. D….
Recebido o processo especial para acordo de pagamento, nomeado o Sr. Administrador Judicial Provisório indicado e cumpridas as demais formalidades legais, expirou o prazo para o processo negocial, o que determinou a declaração do seu encerramento em 23 de julho de 2019 por não ter sido apresentado qualquer acordo de pagamento e mostrar-se ultrapassado o prazo para o efeito, sendo o Sr. Administrador Judicial Provisório notificado para apresentar parecer nos termos previstos no artigo 222º-G, nº 4, do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas[1].
Em 28 de julho de 2019, o Sr. Administrador Judicial Provisório apresentou parecer no sentido de B… e C… se acharem em situação de insolvência atual, devendo ser decretada a insolvência de ambos.
Observado o disposto no nº 5, do artigo 222º-G do CIRE, B… e C… vieram requerer a exoneração do passivo restante, ordenando-se seguidamente a extração de certidão do processado pertinente e a sua distribuição como processo especial de insolvência.
Em 26 de setembro de 2019 foi declarada a insolvência de B… e C…, sendo nomeada Administradora da Insolvência a Sra. Dra. E…, nomeação precedida, alegadamente[2], de sorteio informático, funções que a nomeada aceitou desempenhar.
Em 14 de novembro de 2019 realizou-se assembleia de credores, para apreciação do relatório da Sra. Administradora da Insolvência, tendo ficado exarado na ata desta diligência, além do mais, o seguinte:
Entrando-se na ordem dos trabalhos, a Sra. Administradora de Insolvência pediu
a palavra e, no uso da mesma, fez uma descrição das diligências por si realizadas que levaram às conclusões apresentadas no Relatório.
Mais informou que o imóvel indicado já foi vendido no processo de execução, pelo que, propõe seja ordenada a transferência do produto da venda para os N/ autos.
Colocada a proposta de liquidação à apreciação dos credores presentes, foi votada favoravelmente, mais tendo sido por todos os Credores declarado, prescindirem da constituição da Comissão de Credores.
A Sra. Juíza proferiu o seguinte:
D E S P A C H O
Atenta a deliberação da presente assembleia de credores, não se procederá à constituição da Comissão de Credores.
Os autos prosseguem para a liquidação, sendo que no caso concreto dos autos, esta passará pela transferência do valor do produto da venda do imóvel do processo executivo 761/17.8TOAZ, para a conta da Massa Insolvente, ficando desde já notificada a Sra. A.I., para em dez dias vir indicar o nº da conta da M.I..
Desde já, ficam todos os presentes notificados para em 15 dias requererem, querendo, a abertura do incidente de qualificação da insolvência.
Ainda no decurso da assembleia de credores, o credor F…, Lda, requereu o seguinte:
Considerando que o meio aleatório de designação do administrador de insolvência possibilitou a nomeação da administradora aqui em funções, a qual é sedeada em …, o que, salvo o devido respeito, dificulta ou impossibilita o cabal exercício do cargo, e, comprovando a aceitação do cargo de administrador desta insolvência com a declaração subscrita pelo administrador judicial constante da lista oficial desta comarca, Sr. Dr. G…, que agora se junta, vem, ao abrigo do disposto no nº 1, do artº 53º, do CIRE, requerer que a Assembleia delibere eleger o Sr. Dr. G…, melhor identificado na declaração referida, como administrador de insolvência nestes autos, cessando assim funções a Sra. Dra. E….
Posta a proposta que antecede à votação, os credores H…, I…, J…, K…, F…, Lda. e L…, Lda. votaram favoravelmente, pedindo o Banco M…, S.A. o prazo de cinco dias para se pronunciar por escrito, pretensão que foi deferida.
Com data de 14 de novembro de 2019, a Sra. Administradora da Insolvência lavrou auto de apreensão e arrolamento para a massa insolvente do seguinte bem:
VERBA ÚNICA
Quantia de 125.000,00€ (cento e vinte e cinco mil euros) depositada na conta executados Agente de Execução com o IBAN PT .. …. …. …. …. …. ., relativa ao produto da
venda da fracção autónoma designada pela letra “F”, sita na Rua…, nº …., habitação no …
andar direito, que faz parte integrante do prédio urbano constituído em regime de propriedade
horizontal, descrito na Conservatória do Registo Predial de Espinho sob o nº 586 da freguesia
de … e inscrito na matriz sob o artigo 2355-F da freguesia …, realizada em 25.10.2019 no âmbito do processo executivo nº 761/17.8T8OAZ do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro, Oliveira de Azemeis- Juízo de Execução-Juiz 1.
Em 19 de novembro de 2019, o Banco M…, S.A. pronunciou-se contra a proposta de substituição da Sra. Administradora da Insolvência,
Em 20 de novembro de 2019, a Sra. Administradora da Insolvência, E… ofereceu o seguinte requerimento:
1. No relatório apresentado pela A.I. na Assembleia de Credores de 14 de Novembro, para apreciação do relatório a que faz referência o artigo 155.º do CIRE, o mesmo foi antes dado a conhecer aos senhores credores por e-mail de 6 de Novembro de 2019, cfr. doc. 1, que aqui considera como integralmente reproduzido e se anexa para todos os efeitos legais.
2. E a Assembleia de Credores tinha como ordem de trabalho a apreciação do Relatório da A.I. e não outras questões, nomeadamente para a destituição ou substituição da A.I.
3. Ora, com surpresa e estranheza, foi apresentado na Assembleia de Credores para apreciação do relatório a que faz referência o art.º 155.º do CIRE, um pedido para a substituição da actual A.I. onde foi declarado pelo apresentante, que o motivo era da actual A.I. não ser da zona da residência dos insolventes, e que por tal motivo foi apresentada uma declaração de aceitação de um Senhor Administrador, de nome, G…, que declara aceitar o cargo de administrador que vier a ser proposto na Assembleia de Credores, sem nada especificar quanto à sua remuneração, nem nenhum dos senhores mandatários representantes dos senhores credores, também nada disseram, quanto à remuneração do eventual A.I. substituto que irão suportar,
4. Verificando-se ainda que as procurações passadas aos senhores mandatários que exigem poderes especiais para os actos, a participar em assembleia de credores, nenhuma atribui poderes para a substituição da A.I.
5. O motivo pelo qual foi justificado, declarado, para a substituição da A.I. viola o princípio constitucional da igualdade, com reflexo, na segurança e direito ao trabalho, previstas no art.º 13.º n.º 2, 53.º , 58.º n.º 2 al. b) e 59.º n.º 1 da Constituição da Republica Portuguesa, pelo qual ninguém pode ser prejudicado nem privado de qualquer direito em razão de território de origem, por outro lado, em especial por a A.I. ter domicilio profissional no distrito de Lisboa.
6. Concomitantemente, a nomeação dos A.I. tem regras próprias, e imperativas, não estando na disponibilidade das partes em as dispor, e a questão da origem ou zona profissional dos Administradores Judiciais, conforme resulta da lei, não são óbice à sua nomeação e cabal exercício das funções que lhe sejam confiadas.
7. Pelo que só nesta parte, tal pretensão para a substituição da actual A.I. além de ofender a ordem pública, ser contraria à lei e ofensiva aos bons costumes, viola também normas e princípios constitucionais, onde o poder jurisdicional está limitado a respeitar, conforme previsto nomeadamente nos artigos 202.º n.º 2 e 204.º da CRPortuguesa, pelo que a pretensão da substituição da A.I. é nula.
8. Pelo supra, para a substituição da A.I. também existe um vício quanto ao objecto da A.C. que foi para apreciar o Relatório e não para a substituição da A.I.
9. E ainda a declaração de aceitação de outro A.I para substituir a actual A.I. deveria ter sido apresentada aos autos antes da Assembleia de Credores e não com surpresa durante a Assembleia de Credores, para além de também como exige a lei de nada terem provido, declarado sobre a remuneração respectiva, ao A.I. substituto, condições que apenas nesta parte, por imperativo legal, salvo melhor entendimento, obsta a nomeação de outro A.I. – art.º 53.º n.º 1 e 3 do CIRE e 24.º n.º 1 do EAJ.
Face ao somatório das razões acima descritas se requer a V/Exa. com o douto suprimento, que a actual A.I. nomeada para as funções de Administradora da Insolvência, se mantenha nas
funções não sendo substituída.
Em 05 de dezembro de 2019, a Digna Procuradora da República emitiu parecer no sentido de estarem reunidas as condições legais para a pretendida substituição da Sra. Administradora da Insolvência.
Em 18 de dezembro de 2019, F…, Lda. requereu o seguinte:
A requerente compulsou agora os autos para verificar se o requerimento que apresentou na Assembleia de Credores de 14/11/2019 para substituição da Srª Administradora da Insolvência já tinha despacho e constatou, que consta da ata da Assembleia de Credores, um despacho que não foi notificado às partes e com o seguinte teor: « ( … ) no caso concreto dos autos, esta passará pela transferência do valor do produto da venda do imóvel do processo executivo nº 761/17.8TOAZ, para a conta da massa insolvente, ficando desde já notificada a Srª A.I., para em dez dias vir indicar o nº da conta da M.I. ».
Atento o supra exposto,
Requer a V. Exª. se digne ordenar a notificação aos credores do teor de tal despacho.
Em 16 de janeiro foi proferido o seguinte despacho[3]:
Requerimento ref.ª 34350883, de 18.12.2019:
Salvo o devido respeito, não se compreende o requerimento ora apresentado.
Na verdade, a questão em causa foi apresentada na assembleia de credores e debatida pelos presentes, os quais nada opuseram ao proposto pela A.I., tendo todos os presentes tido
conhecimento da proposta e notificados de tudo o que se passou.
Deste modo, notifique o credor para em 10 dias esclarecer o que pretende.
Em 30 de janeiro de 2020, F..., K…, J…, I… e Outros[4], vieram dizer que mantinham a pretensão de substituição da Sra. Administradora da Insolvência, requerendo também K…, J…, I… que face à deliberação tomada em 14 de novembro de 2019 sejam dados sem efeito todos os atos processuais praticados pela anterior Administradora da Insolvência no processo principal e nos seus apensos.
Em 18 de fevereiro de 2020, K… e outros ofereceu o seguinte requerimento[5]:
Os credores votaram favoravelmente a substituição da Srª Administradora da Insolvência.
Contudo, verificam que ela mantém-se em funções mais de três meses passados após a votação dos credores.
E a Srª A.I., a substituir, continua a praticar atos que incluem a aceitação de alienação de imóvel que deve ser apreendido para a massa.
Assim, pedem a V.Exª se digne proceder à substituição da Srª A.I.
Em 20 de fevereiro de 2020, o Banco M…, S.A. requereu o seguinte:
Em sede de assembleia de credores, realizada no passado dia 14.11.2019, foi proferido o
seguinte despacho: “prosseguem para a liquidação, sendo que no caso concreto dos autos, esta
passará pela transferência do valor do produto da venda do imóvel do processo executivo
761/17.8TOAZ, para a conta da Massa Insolvente, ficando desde já notificada a Sra. A.I., para
em dez dias vir indicar o nº da conta da M.I.” (sublinhado nosso) – cfr. acta constante de fls. dos autos.
Assim, o Credor não deixa de manifestar a sua estranheza pelo facto de, volvidos mais de três
meses desde a data da assembleia de credores, o “Credor K… e Outros” virem
alegar que a “Srª A.I., a substituir, continua a praticar atos que incluem a aceitação de alienação de imóvel que deve ser apreendido para a massa.”
Saliente-se que o bem imóvel foi vendido em sede de execução, através da plataforma e-leiloes,
pelo valor de €125.000,00, valor bastante superior ao valor mínimo (€88.975,17) e ao VPT do
respetivo imóvel (€61.394,48).
Por uma questão de economia processual, e em respeito pelo decidido na referida assembleia de credores, deverá o produto da venda do bem imóvel ser transferido para a massa insolvente.
No que respeita ao pedido de substituição da Senhora Administradora da Insolvência, o Credor
vem reiterar a posição já assumida: manifesta-se desfavoravelmente à sua substituição.
Caso a substituição venha a ser determinada, deverá recorrer-se ao meio aleatório de designação do Administrador de Insolvência, uma vez que a nomeação do Senhor Dr. G… como Administrador da Insolvência, votada favoravelmente pelo Credor que impugnou a Lista de Credores Reconhecidos (artigo 129.º do CIRE), poderá revelar-se parcial e conivente com a alegada estratégia conjunta dos Credores H…, I… e J… e K…, F…, Lda e L…, Ldª..
Em 27 de abril de 2020, a Sra. Administradora da Insolvência ofereceu o seguinte requerimento:
1. A A.I. mantém a posição assumida no requerimento que juntou aos autos em 20/11/2011,
com a refª Citius 24279234; e
2. Adere aos argumentos invocados pelo credor hipotecário Banco M…, S.A.,
discordando totalmente da posição manifestada dos demais credores.
Em 13 de julho de 2020, foi proferido o seguinte despacho[6]:
Substituição da A.I. em funções – artº 53º do CIRE:
Na assembleia de credores realizada em 14.11.2019, o credor “F…, Lda. requereu nos termos do disposto no artº 53º do CIRE, a substituição da A.I. nomeada por sorteio na sentença, Dra. E…, que decretou a insolvência de B… e C, com fundamento em que a A.I. nomeada é de … o que dificulta ou impossibilita o cabal exercício do cargo. Juntou a documento de aceitação do A.I. proposto, cfr. artº 53º, n.º 1 do CIRE.
Posta à votação aos credores presentes, a requerida substituição, os credores H…, J…, K… e L…, Lda., votaram favoravelmente; o Banco M…, após lhe ter sido concedido prazo para votar por escrito, votou contra e, caso a substituição venha a ser determinada, deverá recorrer-se ao meio aleatório de designação.
A A.I. respondeu em 21.11.2019, concluindo que deve ser mantida em funções.
Com vista nos autos, o MºPº pronunciou-se em 05.12.2019.
Em 30.01.2020, os credores K… e outros vieram requerer fossem dados sem efeito todos os actos processuais praticados pela A.I. desde a deliberação.
Vejamos.
Dispõe o artº 53º do CIRE que:
“1 - Sob condição de que previamente à votação se junte aos autos a aceitação do proposto,
os credores, reunidos em assembleia de credores, podem, após a designação do administrador da insolvência, eleger para exercer o cargo outra pessoa, inscrita ou não na lista oficial, e prover sobre a remuneração respetiva, por deliberação que obtenha a aprovação da maioria dos votantes e dos votos emitidos, não sendo consideradas as abstenções.
2 - A eleição de pessoa não inscrita na lista oficial apenas pode ocorrer em casos devidamente justificados pela especial dimensão da empresa compreendida na massa insolvente, pela especificidade do ramo de actividade da mesma ou pela complexidade do processo.
3 - O juiz só pode deixar de nomear como administrador da insolvência a pessoa eleita pelos credores, em substituição do administrador em funções, se considerar que a mesma não tem
idoneidade ou aptidão para o exercício do cargo, que é manifestamente excessiva a retribuição aprovada pelos credores ou, quando se trate de pessoa não inscrita na lista oficial, que não se verifica nenhuma das circunstâncias previstas no número anterior.”
De acordo com o preceito legal citado, são dois os pressupostos para que a escolha proceda:
- que conste previamente dos autos documento comprovativo da aceitação, pelo proposto, da nomeação para o cargo para que é indigitado; e
- uma deliberação favorável da assembleia.
No caso da deliberação é exigido um duplo quórum: aprovação pela maioria dos credores votantes que sejam, simultaneamente, titulares da maioria dos votos emitidos. Não são consideradas as abstenções.
Não se exige a maioria absoluta de votantes nem dos créditos que representam. A diferença reside apenas no facto de não bastar a maioria dos créditos, sendo necessário que ela seja também encabeçada pela maioria dos credores que votam.
No caso presente, verificando-se que a maioria dos credores presentes, os quais são, simultaneamente, titulares da maioria dos votos emitidos, votaram favoravelmente a substituição da A.I. em funções pelo A.I. proposto e que subscreveu o termo de aceitação junto aos autos, conclui-se ter sido aprovada a proposta sujeita a deliberação – artºs 53º, n.º 1 in fine e 77º do CIRE.
Deste modo e pelo exposto, ao abrigo do disposto no artº 53º, n.ºs 1 e 3 do CIRE, nada mais resta a este tribunal, senão proceder à substituição da A.I. nomeada, nos termos requeridos.
Quanto à questão levantada pelo Banco M…, no sentido de, caso a substituição venha a ser determinada, deverá recorrer-se ao meio aleatório de designação,
decorre do citado artº 53º n.º 3 citado que “O juiz só pode deixar de nomear como administrador da insolvência a pessoa eleita pelos credores, em substituição do administrador
em funções, se considerar que a mesma não tem idoneidade ou aptidão para o exercício do
cargo (…)”, o que, no caso presente não se verifica, pelo que, nada a opor ao A.I. indicado.
Assim sendo e concluindo, nos termos do disposto no artº 53º do CIRE, declaro cessadas as funções da A.I. nomeada na sentença que decretou a insolvência, Sra. Dra. E… e, em substituição nomeia-se o indicado pelos credores, ou seja, Sr. Dr. G…, id. nos autos.
Notifique.
Publicite.
D.N.
Relativamente à remuneração do A.I. ora nomeado, importa clarificar que no processo apenas se pode/deve pagar uma remuneração fixa e um valor de provisão para despesas, a serem repartidas pela Sr.ª A.I. que já desempenhou funções até ao momento e pelo A.I. que vai agora assumir funções no processo.
Quanto ao requerido pelos credores K… e outros em 30.01.2020 nosentido de serem dados sem efeito todos os actos processuais praticados pela ex-A.I., s.m.o., os mesmos não foram postos em causa por nenhum credor, pelo que, entendemos que, por questões de economia e celeridade processual, devem os mesmos ser aproveitados, devendo a ex-A.I. fornecer todos os elementos em sua posse e prestar todos os esclarecimentos tidos por necessários ao A.I. ora nomeado
Notifique.
Em 29 de julho de 2020, K…, J…, I… e Outros[7], inconformados com a decisão que antecede na parte em que indeferiu o seu requerimento de 30 de janeiro de 2020, interpuseram recurso de apelação terminando as suas alegações com as seguintes conclusões:
1. Os recorrentes pretendem ver reapreciada a douta decisão recorrida no que concerne à solução de direito encontrada quanto aos atos processuais praticados pela A.I. substituída após a eleição pela assembleia de credores do novo administrador da insolvência.
2. É questão saber se após a deliberação de eleição de um novo administrador e cessação de funções do anterior, no âmbito do disposto no artigo 53º do CIRE, é admissível ao anterior administrador praticar atos processuais, designadamente atos de liquidação do património do insolvente;
3. É o juiz quem nomeia o administrador, e deve obedecer a critérios de aleatoriedade da escolha e da equitabilidade, com uma relevante exceção: o caso do nº1 do artigo 53º do CIRE.
4. Aqui, o juiz não nomeia, mas o administrador é eleito pelos credores, sob condição de prévia aceitação do eleito;
5. Neste caso, o juiz pode unicamente recusar a “homologação” da eleição, mas apenas nos únicos e taxativos casos de o eleito não ter “ idoneidade ou aptidão para o exercício do cargo”, “se for manifestamente excessiva a retribuição aprovada pelos credores” ou “se o eleito não estiver inscrito na lista oficial e a dimensão da empresa, a especificidade do ramo da atividade ou a complexidade do processo, não justifiquem a nomeação”;
6. No caso concreto, a eleição do novo administrador ocorreu em 14-11-2019, no momento e local próprios, deliberando ainda a assembleia de credores que a anterior administradora cessava funções, surpreendendo que o Mº Julgador se tivesse pronunciado acerca dessa eleição tão somente pelo douto despacho de 9-7-2020;
7. Os credores, designadamente os recorrentes, manifestaram oposição a que a anterior administradora praticasse atos no processo após ter sido deliberada a sua cessação de funções, o que expressamente disseram no requerimento de 30-1-2020.
8. As razões de celeridade processual não podem justificar, e não avalizam por certo, a manutenção de facto no exercício do cargo de um administrador para o qual ele já fora
destituído.
9. É de primordial justiça dar sem efeito os atos praticados pela administradora cuja cessação de funções fora deliberada pelos credores em 14-11-2019, e a partir desta data, revogando-se, pois, o douto despacho em crise e consequentemente deferindo a pretensão dos recorrentes formulada no requerimento de 30-1-2020.
A Digna Procuradora da República ofereceu contra-alegações pugnando pela total improcedência do recurso.
Sendo o objeto do recurso constituído exclusivamente por matéria de direito de fácil dilucidação, com o acordo dos restantes membros do coletivo, dispensaram-se os vistos, cumprindo apreciar e decidir de imediato.
2. Questões a decidir tendo em conta o objeto do recurso delimitado pelos recorrentes nas conclusões das suas alegações (artigos 635º, nºs 3 e 4 e 639º, nºs 1 e 3, ambos do Código de Processo Civil, na redação aplicável a estes autos), por ordem lógica e sem prejuízo da apreciação de questões de conhecimento oficioso, observado que seja, quando necessário, o disposto no artigo 3º, nº 3, do Código de Processo Civil
A única questão a decidir é a do destino dos atos praticados pela Sra. Administradora da Insolvência após ter sido votada pela maioria dos credores a sua substituição.
3. Fundamentos de facto
Os fundamentos de facto necessários e pertinentes para o conhecimento do objeto do processo constam do relatório deste acórdão, resultam dos próprios autos, nesta parte com força probatória plena e, por óbvias razões de economia processual, não se reproduzem neste momento.
4. Fundamentos de direito
Do destino dos atos praticados pela Sra. Administradora da Insolvência após ter sido votada pela maioria dos credores a sua substituição
Os recorrentes pugnam pela revogação do segmento da decisão recorrida proferida em 13 de julho de 2020, argumentando para tanto, em síntese, que após a votação maioritária da substituição da Sra. Administradora da Insolvência, o juiz recorrido está vinculado à sua “homologação”, só a podendo recusar nos taxativos casos previstos na lei, que os recorrentes manifestaram oposição a que a anterior administradora praticasse atos no processo após ter sido deliberada a sua cessação de funções, o que expressamente disseram no requerimento de 30-1-2020 e que é de primordial justiça dar sem efeito os atos praticados pela administradora cuja cessação de funções fora deliberada pelos credores em 14-11-2019, e a partir desta data, revogando-se, pois, o douto despacho em crise e consequentemente deferindo a pretensão dos recorrentes formulada no requerimento de 30-1-2020.
Na decisão recorrida indeferiu-se o requerimento de 30 de janeiro de 2020, nos termos que seguem:
Quanto ao requerido pelos credores K… e outros em 30.01.2020 no sentido de serem dados sem efeito todos os actos processuais praticados pela ex-A.I., s.m.o.,
os mesmos não foram postos em causa por nenhum credor, pelo que, entendemos que, por questões de economia e celeridade processual, devem os mesmos ser aproveitados, devendo a ex-A.I. fornecer todos os elementos em sua posse e prestar todos os esclarecimentos tidos por necessários ao A.I. ora nomeado”.
Cumpre apreciar e decidir.
De acordo no artigo 36º, nº 1, alínea d), do CIRE na sentença que declarar a insolvência, o juiz nomeia o administrador da insolvência, com indicação do seu domicílio profissional.
Em consonância com a previsão antes citada dispõe-se no nº 1, do artigo 52º do CIRE que a nomeação do administrador da insolvência é da competência do juiz.
No entanto, o CIRE possibilita a escolha de outro administrador pelos credores, após a designação do administrador da insolvência, em assembleia de credores, bem como a fixação da sua remuneração, mediante eleição que reúna a maioria dos votantes e dos votos emitidos, não se considerando as abstenções e sob condição de previamente à votação se juntar aos autos a aceitação do proposto pelos credores (artigo 53º, nº 1, do CIRE).
O juiz só pode deixar de nomear como administrador da insolvência a pessoa eleita pelos credores, em substituição do administrador em funções, se considerar que a mesma não tem idoneidade ou aptidão para o exercício do cargo, que é manifestamente excessiva a retribuição aprovada pelos credores ou, quando se trate de pessoa não inscrita na lista oficial, que essa nomeação não é justificada nem pela especial dimensão da empresa compreendida na massa insolvente, nem pela especificidade do ramo de atividade da mesma, nem pela complexidade do processo (artigo 53º, nº 3, do CIRE).
A assunção de funções por parte do Administrador da Insolvência dá-se com a notificação da nomeação (artigo 54º do CIRE).
No caso dos autos, a única censura que se pode dirigir à Sra. Juíza a quo tem a ver com a demora na apreciação da eleição de novo administrador da insolvência, pois que, expirado o prazo para o Banco M…, S.A. emitir o seu voto ou logo que fosse emitido, se antes do decurso da totalidade do prazo concedido, devia logo ter sido proferida decisão.
No entanto, deve dizer-se que esta demora não implicou qualquer prejuízo para os ora recorrentes pois que pretendendo eles colocar em causa a aceitação de alienação de imóvel que deve ser apreendido para a massa”[8], devem revoltar-se contra si mesmos, já que votaram favoravelmente na assembleia de credores a proposta de liquidação da Sra. Administradora da Insolvência em que se dava conta da venda judicial do único imóvel que podia eventualmente vir a integrar na massa insolvente, propondo a transferência do produto dessa venda para o processo de insolvência.
Na sequência da aprovação dessa proposta de liquidação, na própria assembleia de credores, foi proferido despacho da Sra. Juíza recorrida no sentido de os autos prosseguirem para a liquidação, o que no caso concreto dos autos, passaria pela transferência do valor do produto da venda do imóvel do processo executivo 761/17.8TOAZ, para a conta da Massa Insolvente, decisão que não mereceu qualquer reação ou censura por parte dos recorrentes, aliás destituídos de legitimidade para tanto, pois que haviam votado favoravelmente a aludida proposta de liquidação.
Ainda que assim não fosse, se por hipótese a Sra. Administradora da Insolvência se tivesse no desempenho das suas funções afastado da legalidade, o processo propiciava aos recorrentes meios de reação de que deviam ter feito atempadamente uso.
Porém, sublinhe-se que mesmo relativamente a atos praticados em sede de liquidação pelo administrador da insolvência e que careçam de prévio consentimento, nos termos previstos no artigo 161º do CIRE sem que o mesmo haja sido obtido ou no caso de alienação de empresa que não observe o disposto no artigo 162º do CIRE, só quando as obrigações assumidas pelo administrador da insolvência excedam manifestamente as da contraparte fica prejudicada a eficácia dos atos (artigo 163º do CIRE).
Assim, face ao que precede, bem se vê que não existe qualquer fundamento legal para que sejam declarados sem efeito os atos praticados pela Sra. Administradora da Insolvência após a votação dos credores que deliberou a sua substituição e até à efetivação dessa cessação de funções por efeito da nomeação do administrador da insolvência eleito pela maioria dos credores.
Improcede assim o recurso de apelação interposto por K…, J…, I… e a que aderiram H… e F…, Lda., sendo a responsabilidade pelo pagamento das custas do recurso da responsabilidade dos recorrentes e aderentes (artigo 527º, nºs 1 e 2, do Código de Processo Civil).
5. Dispositivo
Pelo exposto, os juízes subscritores deste acórdão, da quinta secção, cível, do Tribunal da Relação do Porto acordam em julgar totalmente improcedente o recurso de apelação interposto por K…, J…, I… e a que aderiram H… e F…, Lda. e, em consequência, confirma-se a decisão recorrida proferida em 13 de julho de 2020, no segmento impugnado.
Custas do recurso a cargo dos recorrentes e aderentes, sendo aplicável a secção B, da tabela I, anexa ao Regulamento das Custas Processuais, à taxa de justiça do recurso.
***
O presente acórdão compõe-se de doze páginas e foi elaborado em processador de texto pelo primeiro signatário.

Porto, 25 de janeiro de 2021
Carlos Gil
Mendes Coelho
Joaquim Moura
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[1] Doravante identificado com o acrónimo CIRE.
[2] Alegadamente porque não está documentada no processo eletrónico a realização de qualquer sorteio para determinação do administrador da insolvência a nomear.
[3] Notificado às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 17 de janeiro de 2020.
[4] Não se divisam quaisquer “outros” nestes autos patrocinados pela Sra. Advogada que representa K…, J…, I…, pelo que se trata de uma referência sem qualquer alcance. No entanto, também em 30 de janeiro de 2020, a Sra. Advogada que patrocina H… e o Sr. Advogado que patrocina F…, Lda. declararam aderir ao requerimento de K…, J…, I….
[5] Este requerimento mereceu a adesão de H… e de F…, Lda. em 19 de fevereiro de 2020.
[6] Notificado às partes mediante expediente eletrónico elaborado em 14 de julho de 2020.
[7] Em 30 de julho de 2020, a Sra. Advogada que patrocina H… e o Sr. Advogado que patrocina F…, Lda. declararam aderir ao requerimento de interposição de recurso de K…, J…, I… e Outros.
[8] Porção de frase retirada do requerimento de 18 de fevereiro de 2020 apresentado por K… e outros.