Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2368/12.7JAPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FÁTIMA FURTADO
Descritores: HOMICÍDIO QUALIFICADO
PROIBIÇÃO DE DUPLA AGRAVAÇÃO
ARMA DE FOGO
Nº do Documento: RP201501142368/12.7JAPRT.P1
Data do Acordão: 01/14/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A proibição da dupla agravação existe apenas quando as agravações correspondem a uma mesma dimensão da ilicitude ou da culpa, em violação do principio ne bis in idem.
II – O que não ocorre quando a concorrência se dá entre a circunstância qualificativa do nºs 1 e 2 al. e) do artº 132º CP e a circunstância qualificativa de carácter geral do artº 86º3 da Lei 5/2006 de 23/2 (Lei das armas), pois a 1ª assenta numa culpa acrescida na prática do homicídio revelando uma especial perversidade ou crueldade com que o crie foi em concreto cometido, e a 2ª advém exclusivamente de razões de prevenção geral, e está apenas dependente da ilicitude revelada pela existência da arma na prática do crime.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 2368/12.7JAPRT.P1
Peso da Régua

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto
(2ª secção criminal)

I. RELATÓRIO
No processo comum coletivo nº 2368/12.7JAPRT, do extinto 1º juízo, do Tribunal Judicial de Peso da Régua, foi submetido a julgamento o arguido B…, com os demais sinais dos autos.
O acórdão, proferido a 9 de abril de 2014 e depositado no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo:
“Por todo o exposto, acordam os juízes que compõem o tribunal colectivo em:
A. Parte Criminal.
1. Condenar o arguido B… pela prática, em concurso real, dos seguintes crimes:
- um crime de homicídio qualificado “agravado”, p. e p. pelos arts. 131.º e 132.º n.os 1 e 2 al. e) do Código Penal, com a agravação prevista no n.º 3 do art. 86.º do Regime Jurídico das Armas e Munições (aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção introduzida pela Lei n.º 17/2009, de 6 de Maio), na pena de 20 anos de prisão;
- um crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º n.º 1 al. d) do Código Penal, por referência ao art. 255.º al. a) do mesmo diploma, na pena de 10 meses de prisão;
- um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º n.os 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, por referência aos arts. 121.º n.º 1 e 123.º do Código da Estrada, na pena de 6 meses de prisão;
- um crime de receptação, p. e p. pelo art. 231.º n.º 1 do Código Penal, na pena de 1 ano e 6 meses de prisão; e
- um crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelos arts. 2.º n.º 1 al. az), 3.º n.º 4 al. a), 6.º, 12.º al. a), 13.º e 86.º n.º 1 al. c) do Regime Jurídico das Armas e Munições (aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção introduzida pela Lei n.º 12/2011, de 27 de Abril), na pena de 2 anos de prisão.
2. Operando o cúmulo jurídico, vai o arguido condenado na pena única de 22 (vinte e dois) anos de prisão.
3. Condenar o arguido pela prática das seguintes contra-ordenações:
- uma contra-ordenação (transposição de linha longitudinal contínua), p. e p. pelos arts. 60.º n.º 1 (marca M1) e 65.º al. a) do Regulamento de Sinalização de Trânsito (aprovado pelo Decreto Regulamentar n.º 22-A/98, de 1 de Outubro), por referência também ao art. 146.º al. o) do Código da Estrada, na coima de €100,00 (cem euros); e
- uma contra-ordenação (detenção ilegal de arma de alarme), p. e p. pelos arts. 2.º n.º 1 al. e), 3.º n.º 9 als. g) e h), 11.º e 97.º do Regime Jurídico das Armas e Munições (aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro, na redacção introduzida pela Lei n.º 12/2011, de 27 de Abril), na coima de €600,00 (seiscentos euros).
4. Absolver o arguido da prática do crime de tráfico de estupefacientes de menor gravidade pelo qual vinha também pronunciado.
*
Objectos apreendidos:
O tribunal declara perdida a favor do Estado a arma de alarme e demais munições apreendidas nos autos, devendo as mesmas ser entregues às competentes autoridades policiais, a quem competirá promover e decidir do respectivo destino – arts. 109.º do Código Penal e 78.º da Lei n.º 5/2006, de 23 de Fevereiro.
A pistola de calibre 6,35mm deverá ser restituída ao seu legítimo proprietário, conquanto, claro está, se mostrem reunidas todas as condições legalmente exigidas para a respectiva detenção; caso contrário, declara-se igualmente a mesma perdida a favor do Estado, com a consequente entrega às autoridades policiais.
Os demais objectos descritos na lista de fls. 370 estão directa ou indirectamente relacionados com a prática dos crimes, pelo que se deverão manter apreendidos.
*
Responsabilidade tributária:
Nos termos dos arts. 374.º n.º 4, 513.º e 514.º do Código de Processo Penal, bem como dos arts. 3.º e 8.º n.º 9 e Tabela III do Regulamento das Custas Processuais, condena-se o arguido no pagamento das custas criminais do processo, fixando-se a taxa de justiça em 5UC.
B. Parte Civil:
Julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização civil deduzido pelos demandantes C…, por si e em representação dos seus filhos menores D… e E…, bem como F… e G…, e, em consequência, condenar o arguido/demandado B… a pagar-lhes a quantia global de €560.000,00 (quinhentos e sessenta mil euros), tal como se discrimina:
Danos patrimoniais (€420.000,00)
- perda de rendimento, €420.000,00, quantia que será repartida nos seguintes termos:
€301.200,00 para a viúva C…;
€10.800,00 para a filha F…;
€46.800,00 para o filho D…;
€61.200,00 para o filho E….
A estas quantias, acrescem juros legais, contabilizados à taxa legal, desde a data da citação (notificação para contestar) até integral pagamento.
Danos não patrimoniais (€140.000,00)
- perda do direito à vida, €60.000,00, quantia que será repartida entre os demandantes de acordo com as regras próprias da sucessão;
- angústia sofrida pelos herdeiros do falecido, €80.000,00, sendo €20.000,00 para a viúva e €15.000,00 para cada um dos quatro filhos.
A estas quantias, acrescem juros legais, contabilizados à taxa legal, desde a data da prolação do presente acórdão até integral pagamento.
*
Responsabilidade tributária:
As custas serão suportadas pelos demandantes e arguido/demandado na proporção do vencimento – cfr. os arts. 523.º do CPP e 527.º do NCPC.
*
Situação do arguido:
Por força do disposto no art. 213.º n.º 1 al. b) do Código de Processo Penal, dir-se-á que se mantêm inalterados, e até reforçados por força da presente condenação, os pressupostos de facto e de direito que determinaram a aplicação e manutenção da prisão preventiva, pelo que continuará o arguido sujeito a tal medida de coacção.
*
Notifique.
*
Após trânsito:
- remeta boletim à DSIC;”
*
Inconformado, o arguido B… interpôs recurso do acórdão, apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões:
“1. O inconformismo do recorrente com o d. Acórdão, determinante do presente recurso, tem incidência sobretudo ao nível da aplicação da medida da pena.
Pois, sempre será de considerar que a pena aplicada é severa, excessiva e desproporcional se considerada a medida da culpa, devendo a mesma ser reduzida.
2. A pena efetivamente aplicada ao recorrente no d. Acórdão recorrido foi de 22 anos prisão.
3. Na fixação da medida da pena é necessário ordenar, relacionando-as, a culpa, a prevenção geral e a prevenção especial, tendo-se, para isso, em conta os quadros agravativos e atenuativos, sob pena de se frustrarem as finalidades da sanção, ou seja, a protecção dos bens jurídicos e a reintegração do arguido na sociedade.
4. Assim, na determinação da medida da pena há que, num primeiro momento, escolher o fim da pena, depois há que fixar os factores que influem no seu doseamento, tecendo-se, por fim, os considerandos que fundamentam a pena concreta aplicável.
5. O Tribunal "a quo' relativamente ao crime de homicídio, no que à medida da pena diz respeito, teve em conta o grau de ilicitude do facto, bem como as consequências do crime, alegando ainda que "são elevadíssimas as necessidades de prevenção geral, sendo que este tipo de crimes provoca na comunidade um inigualável sentimento de receio e, concomitantemente, de repulsa, tornando-se absolutamente essencial que a sociedade sinta que determinados comportamentos sofrem uma adequada punição".
6. No que concerne ao crime de detenção ilegal de arma considerou o tribunal "a quo” que as "exigências de prevenção geral positiva são também muito elevadas, visto que as armas são por todos consideradas como potenciadoras de receios e grave criminalidade”
7. Quanto ao crime de falsificação de documento considerou que "é necessária a manutenção da confiança geral na veracidade dos documentos”.
8. Quanto ao crime de recetação considerou o Tribunal "a quo" que "é indiscutivelmente visto como um dos comportamentos que fomentam a prática de crimes contra o património.
9. E quanto ao crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal considerou que é ... "mais um daqueles crimes que importa combater, visto que são frequentes as vezes que indivíduos conduzem os mais diversos veículos sem possuírem a devida habilitação, com evidente perigo para todos aqueles que circulam nas estradas.”
10. O Tribunal "a quo" esqueceu as circunstâncias que militam a favor do arguido: o facto de o mesmo ter confessado integralmente e sem reservas os crimes de detenção de arma proibida, o crime de falsificação de documento, o crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, bem como as duas contra-ordenações, de cuja confissão deveria ter beneficiado quanto à aplicação da medida da pena.
11. O que não sucedeu, bem pelo contrário, o Tribunal "a quo" aplicou a cada uma das penas parcelares uma pena bem mais superior ao limite mínimo.
12. O Tribunal "a quo" por um lado, não valorou devidamente, a juventude do arguido (apenas com 21 anos de idade à data da prática dos factos) e a circunstância de não ter antecedentes criminais, por outro lado, não era de menosprezar a circunstância que decorre da fragilidade de o arguido ter crescido num contexto educativo muito permissivo, de o arguido residir num bairro habitualmente conotado com a problemática da toxicodependência, pois terá contribuído para o "amolecimento" da sua capacidade de determinação.
13. Estas circunstâncias atenuantes que decorrem dos factos dados como provados e não provados, militam a favor do arguido e, por isso, deveriam ter sido tomadas em linha de conta na dosimetria da pena a aplicar ao mesmo.
14. No entanto, tal não sucedeu, urna vez que, o que o Tribunal “a quo” ponderou tais elementos não como atenuantes, mas sim como forma de condenar severamente o arguido.
15. For tudo o que ficou dito, ao condenar o arguido, ora recorrente, em vinte e dois anos o Tribunal "a quo" violou, por conseguinte, o disposto no artigo 71º do Código Penal, traduzindo-se as penas aplicadas numa pena demasiado severa, atenta a factualidade considerada.
16. Cumpre ainda, fazer referência à agravação da pena do crime de homicídio qualificado por detenção de arma proibida.
17. A norma do nº 3 do artigo 86° da Lei nº 5/2006, de 23/02, na redação introduzida pela Lei nº 17/2009, de 06/05, é uma norma geral, para o crime de homicídio, a lei prevê um regime especial de agravação quando aquele tenha sido cometido em circunstâncias que revelem especial censurabilidade ou perversidade, exemplificando no nº 2 do artigo 132º do Código Penal, quais as circunstâncias suscetíveis de revelar especial censurabilidade e perversidade (os chamados exemplos padrão).
18. Daí que a norma geral constante do artigo 86º, nº 3, da referida lei tenha sempre de ceder face ao regime especial previsto pelo Código Penal para o crime de homicídio, pois estaríamos a agravar um crime que já é agravado, o que constituiria uma dupla agravação.
19. O nº 3 do artigo 86º não pode ser aplicado ao tipo de crime de homicídio qualificado do artigo 132º do Código Penal, assim sucedendo independentemente da circunstância ou do exemplo-padrão que a qualificação resultar ser ou não o previsto na alínea e), por assim o impõem exigências de compatibilização lógico-valorativa.
20. O artigo 86º nº3 do RJAM dispõe que: "as penas aplicáveis a crimes cometidos com arma são agravadas de um terço nos seus limites mínimo e máximo, excepto se o porte ou uso de arma for elemento do respectivo tipo de crime ou a lei já previr agravação mais elevada para o crime, em função do uso e porte de arma.”
21. Independentemente de ser ou não feita aplicação do exemplo padrão em causa, a partir do momento em que se procede à integração da conduta delituosa no tipo de homicídio qualificado, fazendo-o apenas à luz do nº1 ou ainda por qualquer das alíneas do n°2, deixa de fazer sentido lógico-valorativo o acionamento da agravante da lei das Armas.
22. Para realidades reveladoras de maior ilicitude e/ou de major culpa, o Código Penal prevê uma pena específica, logicamente a mais grave (homicídio qualificado). E sendo esta já a pena aplicável a uma determinada realidade, não haverá lugar à aplicação do nº 3 do artigo 86º (a incidir sobre o tipo-base), pois já ocorreu agravação por via do próprio tipo (qualificado).
23. A "ratio legis" da Lei 17/2009 de 06 de Maio vai no sentido, da prevenção geral, agravando os tipos simples cometidos com recurso ao uso de armas, veja-se neste sentido o recente Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 2014-01-07.
24. É, pois, exagerada a pena que foi aplicada ao arguido, ora recorrente, por se ter valorado acentuadamente as agravantes e desconsiderado as atenuantes.
25. O Tribunal "a quo "ao condenar o arguido, ora recorrente, no cúmulo jurídico das penas parcelares em 22 anos de prisão violou, o disposto no artigo 71º do Código Penal, traduzindo-se a pena aplicada numa pena demasiado severa, atenta a factualidade considerada.
Nestes termos e nos demais de direito aplicáveis, deve o presente recurso merecer provimento e, consequentemente, alterar-se a decisão recorrida por outra que aplique ao arguido, ora recorrente, uma pena de prisão mais próxima do limite mínimo imposto por lei.”
*
O Digno Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo respondeu, pugnando pela manutenção do acórdão recorrido, concluindo da seguinte forma:
“I.
Não se vislumbra razão legal, ou imperativo constitucional, que proíba uma dupla agravação da pena, decorrente do funcionamento da qualificativa do n.º 2 do art. 131º, do Código Penal, juntamente com a agravação da pena prevista na norma do n.º 3, do art. 86.º da Lei 5/2006.
II.
Enquanto que a qualificativa do homicídio tem como fundamento a culpa agravada que o agente revela com a sua actuação sendo um tipo de culpa, já a agravação do art. 86º, n.º 3, da Lei das Armas se prende com a maior ilicitude da conduta e com razões de prevenção, inexistindo para estes casos critério ou fundamento legal que impeça a dupla agravação.
III.
O arguido recorrente não colocou em causa a natureza das penas aplicadas aos crimes de falsificação de documentos, de condução sem habilitação legal, de receptação e de detenção de arma proibida, pelos quais foi condenado, e que admitiam a pena de multa em alternativa à prisão, mas somente o respectivo "quantum".
IV.
O Tribunal "a quo" respeitou o disposto nos arts. 40º e 71º, do Código Penal na determinação da medida de cada uma das penas aplicadas.
V.
Em cada uma das penas considerou a culpa como fundamento e limite da pena a aplicar, e afastou quaisquer considerações retributivas.
VI.
O Tribunal "a quo" deixou às exigências de prevenção o papel de funcionarem como critério da medida da pena.
VII
O grau de culpa e as exigências de prevenção foram correlacionados e apreciados tendo em conta as circunstâncias gerais do artigo 71º, n.º 2, do Código Penal, sem as fazer coincidir com as circunstância modificativas, enquanto elementos do tipo.
VIII.
O Tribunal "a quo" teve na devida conta as exigências de prevenção geral, tanto no crime de homicídio (que considerou elevadíssimas dado os sentimentos de medo e repulsa provocados, assim como), como no crime de detenção ilegal de arma (considerando muito elevadas as exigências de prevenção geral positiva, atento o potencial danoso do uso de armas), quer quanto ao crime de falsificação de documento, quer quanto ao crime de receptação (por ser visto, como um dos comportamentos que fomentam a prática de crimes contra o património), bem como em relação ao crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal.
IX.
Além disso, contrariamente ao defendido pelo recorrente, o Tribunal atendeu às exigências de prevenção especial, lançando mo e considerando, a jovem idade do arguido, a ausência de antecedentes criminais e o seu percurso de vida, fazendo inclusivamente alusão e transcrevendo parte do relatório social elaborado.
X.
Não valorou qualquer confissão parcial do arguido, dado que o recorrente somente admitiu o inegável, tentando, no espaço consentido pelas provas que o incriminavam, eximir-se às suas responsabilidades e assacando culpas ao próprio ofendido.
XI.
O Tribunal "a quo" respeitou integralmente os critérios legalmente previstos para a determinação das penas concretas aplicadas, as quais se mostram proporcionais e adequadas, realizando de forma óptima as finalidades da punição.
O acórdão recorrido não enferma de qualquer vício nem viola qualquer norma legal, ou princípio estrutural do Direito Processual Penal, designadamente no que concerne à determinação da medida da pena e à subsunção jurídica dos factos.”
*
O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação do Porto.
*
Nesta Relação, a Exma. Senhora Procuradora-Geral Adjunta emitiu douto parecer, igualmente no sentido da improcedência do recurso, subscrevendo a resposta apresentada na primeira instância.
Foi cumprido o artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, sem resposta.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
*
II. FUNDAMENTAÇÃO
Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (artigo 412º, nº 1 do Código de Processo Penal).
*
1. Questões a decidir
Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, as questões a decidir são:
A) Possibilidade de agravação de 1/3 da moldura legal do crime de homicídio qualificado, por força do disposto no nº 3, do artigo 86º da Lei 5/2006 de 23 de fevereiro;
B) Quantum das penas parcelares e única.
*
2. Factos Provados
Segue-se a enumeração dos factos provados e não provados, constantes do acórdão recorrido:
“Discutida a causa, resultaram provados os seguintes factos:
1. No dia 19 de Outubro de 2012, pelas 01h05, no entroncamento junto à pastelaria denominada “I…”, na Rua …, Peso da Régua, o arguido ao volante do veículo automóvel, ligeiro de passageiros, matrícula ..-..-QH, pisou e transpôs a linha longitudinal contínua – marca M1 – separadora de sentidos de trânsito, aí existente.
2. Nessa sequência, o arguido foi interceptado por uma patrulha da Guarda Nacional Republicana, que lhe pediu os documentos do veículo e, bem assim, os pessoais, em concreto a carta de condução e o bilhete de identidade, ao que o arguido respondeu que não os detinha naquele momento.
3. Em acto contínuo, e a fim de ser preenchido o aviso de apresentação de documentos com o n.º …….-C, o arguido foi questionado acerca, designadamente, do seu nome completo, data de nascimento e morada, ocasião em que forneceu verbalmente a identidade de J….
4. Disse ainda, que nasceu a 22.02.1987 e que residia residente no …, Bloco ., Entrada ., cave ., …, Peso da Régua, o que ficou a constar do referido documento.
5. De seguida, o arguido com o seu punho assinou o documento tendo para o efeito manuscrito o nome de J….
6. Nessas circunstâncias de tempo e lugar, o arguido conduzia o referido veículo automóvel sem que estivesse habilitado por carta de condução, emitida pela autoridade competente.
7. O arguido ao fornecer uma identidade que não correspondia à verdade à GNR, informação que ficou a constar do referido aviso, sabia que punha em causa a fé pública do documento, o que quis. 8. Ao actuar nos termos supra descritos, o arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, bem sabendo que não possuía licença legal que o habilitasse a tripular veículos automóveis na via pública e que a sua conduta era proibida e punida por lei.
9. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente com o propósito concretizado de eximir-se à responsabilidade penal decorrente da falta de habilitação legal para conduzir viaturas, o que constituiria, como anteviu, uma vantagem que sabia não ser legítima pela qual prejudicava o interesse punitivo do Estado relativamente aos autores de factos qualificados pelo nosso ordenamento jurídico como crime.
*
10. Em dia não concretamente apurado do mês de Dezembro de 2012, mas em dia anterior a 19.12.2012, desconhecidos subtraíram do interior da habitação sita a Rua …, …, Moimenta da Beira, uma pistola semiautomática, de calibre 6,35mm Browing - .25ACP ou .25 AUTO na designação anglo-americana -, de marca SM – Rhoner Sportwaffen -, de modelo 115 com o número de série ….., de origem na Antiga Alemanha Ocidental., munida de carregador, propriedade de K….
11. No dia 19 de Dezembro de 2012, o arguido encontrava-se na posse da arma acima identificada, de que não era legítimo dono, facto que estava bem ciente, como também bem sabia que o dono de tal objecto tinha dele tinha sido desapossado ilicitamente.
12. O arguido tinha consigo a referida arma, com consciência de que o proveito por ele auferido, possibilidade de a usar ou ceder a terceiros, se devia à proveniência ilícita da mesma, a que sabia não ter direito.
*
13. Nesse mesmo dia, L…, nascido a 11.03.1971, consumidor de heroína, ao volante do veículo automóvel marca BMW, modelo …, matrícula BW-…-FX, de cor cinza, dirigiu-se a Peso da Régua, conjuntamente com o seu irmão, M…, a fim de adquirir heroína, para ambos consumirem.
14. Na concretização de tal propósito, inicialmente dirigiram-se às imediações do supermercado Intermarché, sito em Peso da Régua, mas L… não encontrou o vendedor que no dia anterior lhe cedeu estupefaciente.
15. Posto isto, deslocaram-se para o …, vulgarmente conhecido por …, sito em …, Peso da Régua, local conhecido por vender estupefacientes, e onde em tempos L… adquiriu heroína.
16. Volvidos poucos minutos, entre as 14h30 e as 15h30, L…, ao volante do seu veículo, e ainda na companhia do seu irmão, chegaram à Rua …, …, …, Peso da Régua, momento em que L… vislumbrou apeado o arguido.
17. De imediato, L… imobilizou o veículo, saiu e foi na direcção do arguido, pessoa que L… não conhecia, e questionou-o se vendia heroína e o preço que praticava.
18. O arguido respondeu-lhe que lhe poderia vender produto estupefaciente, designadamente, heroína, e que o preço da dose era €10,00 (dez euros).
19. De seguida, L… estabeleceu uma breve conversa com o arguido e tentou negociar o preço, pretendendo, ao assim proceder, que aquele lhe vendesse a dose por preço inferior.
20. A dado momento, L… ofereceu ao arguido valor não concretamente apurado por cada dose, e disse-lhe a fim de finalizar o negócio: “Queres, Queres! Não queres, vou embora”.
21. Pouco tempo depois, o ofendido, sem produto estupefaciente, encaminhou-se para o seu veículo que se encontrava estacionado a escassos metros do local onde conversou com o arguido.
22. O ofendido, ao aproximar-se do veículo, virou-se para o seu irmão que se encontrava no lugar do pendura e disse-lhe que ia tentar encontrar outro vendedor, arrancando e parando o carro mais à frente.
23. O arguido, que não logrou vender o estupefaciente a L…, apeado e com o passo apressado, foi no seu encalço, munido da pistola identificada em 10.
24. Volvidos alguns segundos, elevou-a e deu pelo menos um tiro para o ar, e de seguida direccionou a arma na direcção do veículo, lateral esquerda, que se encontrava em andamento, em concreto para o ofendido, que se encontrava no seu interior, ao volante, e de imediato fez dois disparos.
25. Os projécteis atingiram o veículo:
a. Na parte traseira/lateral, do lado esquerdo, a uma cota do solo de cerca 70 cm e 120 cm de afastamento da extremidade traseira da viatura, provocando uma perfuração circular com cerca de 15mmx8 mm;
b. No pára-choques traseiro, do lado esquerdo, a uma cota do solo de cerca de 53 cm e 160 cm de afastamento da extremidade lateral traseira, do lado direito, da viatura, provocando uma perfuração circular com cerca de 7 mm x 7 mm.
26. Perante isto e quando se apercebeu que o arguido vinha na sua direcção, empunhando uma arma de fogo, o ofendido L… tentou sair do local.
27. Nisto, o arguido, com receio que o ofendido se ausentasse, aproximou-se de forma acelerada para a porta do condutor, - que estava fechada, mas com o vidro aberto, - e virou-se para o ofendido que estava sentado no seu interior, e disse: “Aqui tu não compras nada!”.
28. De seguida, o arguido, que se encontrava a poucos centímetros do ofendido, empunhou a arma de fogo, introduziu-a ligeiramente no habitáculo do veículo e direccionou-a para a sua cabeça, momento em que o projéctil deflagrado perfurou-lhe o pescoço, lado esquerdo.
29. Depois, o arguido, a correr, ausentou-se do local.
30. Em consequência do comportamento do arguido, L… teve necessidade de ser transportado, minutos depois para o Centro de Saúde de Peso da Régua, e de seguida, L… foi encaminhando por uma equipa do INEM para Centro Hospitalar de Trás-os-Montes e Alto Douro, EPE, em Vila Real. Onde chegou pelas 16:08, tendo recebido prontamente assistência hospitalar aos ferimentos que apresentava, e onde veio a falecer dias depois, em 29.12.2012.
31. Realizada autópsia médico-legal ao corpo do falecido observou-se que:
a. No hábito externo existiam duas lesões em fase de cicatrização ao nível da hemiface esquerda e região cervical direita, as quais são compatíveis com orifícios de passagem de projéctil de arma de fogo;
b. No hábito interno, ao nível da face, existia uma fractura cominutiva do ângulo esquerdo da mandíbula, com forma de “cone de base interna”, que é compatível com orifício de passagem de projéctil de arma de fogo.
c. Atendendo às características da fractura mandibular esquerda acima identificada, é possível afirmar que tal fractura é compatível com orifício de entrada de projéctil de arma de fogo.
d. Pelo exposto, o trajecto do projéctil ao nível do corpo da vítima – face e região cervical – pode ser definido como tendo sido da esquerda para a direita, ligeiramente de trás para a frente e ligeiramente de cima para baixo, localizando-se o orifício de entrada na hemiface esquerda e o orifício de saída na região cervical direita.
32. Tais lesões foram a causa da sua morte, tudo conforme consta do relatório de autópsia a fls. 452 a 458, que aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.
33. No local onde ocorreram os factos foram encontrados no chão e apreendidos:
a. Três cápsulas deflagradas, de calibre 6,35 mm Browning, de marca Winchester - .25 ACP ou .25 AUTO, na designação anglo-americana, de marca WINCHESTER (WIN), de origem norte-americana (E.U.A.);
b. Um projéctil de calibre 6,35 mm, Browning - .25 ACP ou .25 AUTO, na designação anglo-americana – significativamente deformado lateralmente e na zona ogival – expondo inclusivamente o seu núcleo de chumbo -, com o peso aproximado de 3,23 g, não evidenciado perdas de massa, apresentando visíveis apenas quatro estrias impressas, de sentido dextrógiro, e que, pelas características física observadas – nomeadamente tipo de blindagem cobreada, peso, sulco não serrilhado e acabamento de base -, permite admitir que se constitua como elemento proveniente de uma munição de marca WINCHESTER, de origem norte- americana (E.U.A.).
34. Examinado o interior do veículo pertença de L…, foi encontrado e apreendido um projéctil, de calibre 6,35 mm Browning (.25 ACP ou .25 AUTO na designação anglo –americana –, localizado sobre o banco da frente do lado esquerdo ( banco do condutor), que se apresentava moderadamente deformado na zona ogival, como o peso aproximado de 3, 22 g, não evidenciando perda de massa, apresentando oito (8) estrias impressas, de sentido dextrógio, e que, pelas características físicas observadas (nomeadamente tipo de blindagem cobreada, peso, sulco não serrilhado e acabamento de base), permite admitir que se constitua como elemento proveniente de uma munição de marca WINCHESTER, de origem norte- americana (E.U.A.).
35. Na mesma ocasião, no interior do veículo, foram recolhidos resíduos que foram detectados no volante, tablier, travão de mão, manetes, banco do lugar dianteiro direito (assento e costas), banco traseiro (assento e costas), forra da porta dianteira, do lado direito, forra da porta dianteira, do lado esquerdo e tejadilho interior.
36. Estes, sujeitos a exame, revelaram que estávamos perante partículas genericamente constituídas por chumbo, antimónio e bário, compatíveis com resíduos de disparo de arma de fogo.
37. Mais se concluiu que a presença das partículas é compatível com disparo ou manipulação de arma de fogo efectuado no interior da viatura.
38. As partículas detectadas são do mesmo tipo das partículas detectadas nos elementos municiais deflagrados da marca Winchester calibre .25 Auto, e acima discriminados.
39. Os projécteis e cápsulas encontradas foram deflagrados pela arma que o arguido detinha aquando da prática dos factos, acima enunciados.
40. Por sua vez, as partículas encontradas no interior do veículo foram projectadas aquando do disparo que o arguido fez na direcção do ofendido, e que o atingiu.
41. Em 28 de Janeiro de 2013, em cumprimento de mandados de detenção, de busca e de apreensão, o arguido foi localizado e detido.
42. Nas mesmas circunstâncias de tempo e lugar, foram encontrados na sua posse, e apreendidos, entre outros objectos:
a. Uma pistola semi-automática, de calibre 6.35 mm, Browning (.25 ACP ou .25 AUTO na designação anglo americana), de marca SM – Rhoner Sportwaffen) modelo 115, com o número de série ….., de origem na antiga Alemanha Ocidental, munida de carregador, que corresponde a acima identificada. Esta encontrava-se em boas condições de actuação, mas em mau estado de conservação, limpeza e lubrificação.
b. Uma arma de alarme, com a configuração de uma pistola, de calibre 9 mm, P.A.K. – destinado essencialmente a deflagrar munições de alarme, mas também de gás lacrimogéneo e para lançamento de sinais luminosos, quando provida de adaptador adequado -, de marca NORICA, de modelo MADNUM M.F92, com o número de série ….., fabricada em Eibar, Espanha, munida de carregador. Esta estava em boas condições de funcionamento, sem qualquer deficiência assinalável que afecte a realização de deflagrações ou condicione a obtenção da sequência de automatismo.
43. O arguido tinha ainda em seu poder:
a. Quatro munições de alarme, calibre 9 mm P.A.K. – apenas detonantes – tampa verde – de marca UMAREX (UMA), de origem alemã. Estas testadas na arma de alarme id. nos autos, encontravam-se em boas condições de utilização, tendo deflagrado normalmente à primeira percussão.
b. Uma munição de calibre 6.35 mm, Browning, (.25 ACP ou .25 AUTO na designação anglo-americana), de marca WINCHESTER (WIN), de origem norte-americana (E.U.A.). Esta, testada na pistola acima identificada, encontrava-se em boas condições de utilização, tendo deflagrado normalmente à primeira percussão.
44. O arguido não é titular de licença de uso e porte de arma, nem detém autorização para deter armas de alarme.
45. O arguido actuou conforme descrito, após uma alteração com a vítima, que desconhecia, e que apenas o contactou com vista à aquisição de estupefaciente, que não se concretizou devido a divergências de preços.
46. Ao assim agir, por motivo fútil, o arguido demonstrou ser insensível ao valor da vida humana.
47. O arguido agiu com o propósito concretizado de tirar a vida ao ofendido, bem sabendo que ao disparar na sua direcção, a poucos centímetros deste, e na zona do pescoço atingiria, como atingiu, órgãos vitais.
48. Ao deter a arma de fogo referida, e bem assim as munições, nas circunstâncias supra descritas, o arguido agiu de forma livre, deliberada e consciente, querendo-a deter bem sabendo que não era titular de licença de uso e porte de arma, e que, por isso, a sua posse não lhe era permitida.
49. O arguido sabia, igualmente, que não podia deter, por não estar devidamente autorizado, a arma de alarme e suas munições, acima identificadas e encontradas na sua posse.
50. Em todas as circunstâncias actuou o arguido de forma livre, voluntária e consciente, sabendo que a sua conduta revelava censurabilidade e perversidade.
51. Sabia que as suas condutas eram e são proibidas e punidas por lei.
*
Quanto ao pedido cível, provou-se adicionalmente:
52. A vítima L… nasceu em 11 de Março de 1971, pelo que tinha, à data da prática dos factos, 41 anos de idade.
53. Era dinâmico, trabalhador, fisicamente bem constituído e saudável, nutrindo pela vida um elevado amor e dotado de um espírito alegre e risonho.
54. Era uma pessoa consciente dos seus deveres, enquanto pai, marido e cidadão, respeitada por todos quantos o conheciam.
55. No momento em que foi alvejado pelo arguido, sentiu dor e aflição, apercebendo-se de que iria morrer quando se viu prostrado no interior do seu veículo, a esvair-se em sangue, período em que experimentou grande sofrimento e angústia.
56. A vítima casou com a demandante C… no dia 14 de Abril de 1990.
57. A vítima faleceu no estado de casado com a demandante C…, segundo o regime de comunhão de adquiridos, tendo deixado como herdeiros legitimários, para além da sua referida esposa, os seus filhos G… (nascida a 16/6/1989), F… (nascida a 29/9/1991), D… (nascido a 30/8/2007) e E… (nascido a 20/1/2011).
58. O falecido L… estava emigrado em França há cerca de 20 anos, sendo que, desde 2003, exercia as funções de responsável técnico ao serviço da empresa “N…”, auferindo o salário mensal líquido aproximado de €2.100,00.
59. O falecido entregava o salário à sua esposa, a fim de que esta providenciasse pelo sustento do agregado familiar e pela educação da sua filha F…, a qual tinha, à data da prática dos factos, 21 anos e frequentava o 2º ano do curso de economia na Universidade ….
60. O falecido era homem de hábitos simples, que vivia para a sua família, dedicando enorme amor e carinho à sua esposa e filhos.
61. O falecido vivia com a sua esposa um casamento feliz, vendo-se esta privada da sua companhia, não apenas para educar os seus filhos, como também para a sua realização pessoal.
62. Os filhos do falecido viram-se por seu turno igualmente privados da sua figura paterna, numa fase da vida em que a sua presença era fundamental, não apenas para os ajudar financeiramente, como também para dar a sua contribuição, visando assegurar um correcto e harmonioso desenvolvimento da personalidade de cada um deles.
63. Na sequência da morte de L…, a sua esposa e filhos experimentaram pois enorme sofrimento, desgosto e saudades, sentimentos que os acompanharão durante toda a sua vida.
*
Quanto às condições pessoais do arguido, mais resultou provado que:
64. O arguido, segundo mais novo de um conjunto de cinco irmãos, provém de uma família de etnia cigana de humilde condição sócio-económica.
65. Os progenitores dedicavam-se à venda ambulante, mas de forma pouco consistente e contínua, derivado dos contactos do pai com o aparelho de justiça por crime de tráfico de estupefacientes.
66. Na verdade, o arguido, único filho do sexo masculino, confrontou-se desde os dois anos de idade, com várias reclusões do pai, o que colocava graves dificuldades de subsistência à progenitora, obrigada a repartir as tarefas educativas com as exigências de sustento económico da família.
67. Apesar do investimento afectivo por parte da progenitora, o arguido não estava sujeito a uma efectiva supervisão parental, não aceitando regras e valores de conduta, deambulando pela cidade de Peso da Régua sem qualquer ocupação.
68. O arguido concluiu o 6º ano de escolaridade, privilegiando depois a vida de rua, integrando, ainda menor, grupos de pares ligados conotados com a prática de ilícitos criminais, sendo dessa altura os primeiros consumos de haxixe.
69. Na sequência de esforços envidados pela Segurança Social, o arguido foi inscrito num curso de formação profissional que lhe daria equivalência ao 9º ano, mas apresentou um elevado absentismo e desinteresse pelas matérias leccionadas.
70. O pai do arguido saiu do estabelecimento prisional em Agosto de 2011, mas não retomou a sua actividade de vendedor ambulante, padecendo de doença do foro oncológico, que se foi agravando até à data do óbito, ocorrido em Fevereiro de 2013; a família beneficiava de rendimento social de inserção.
71. O arguido, à data da prática dos factos, residia com os seus progenitores e com a irmã mais nova numa habitação social do …, integrando uma comunidade dominada por famílias de etnia cigana, e apresentava um estilo de vida e quotidiano desestruturado.
72. O arguido está preso preventivamente no EP de Lamego desde o dia 28 de Janeiro de 2013, recebendo visitas regulares da progenitora e irmãs.
73. O arguido não tem antecedentes criminais registados.
2.1.2. Factos não provados:
Com interesse e expurgados os factos conclusivos, não resultou provado que:
Da pronúncia.
a. O arguido respondeu à vítima que tinha para vender estupefaciente, no sentido de que tinha na sua posse o produto estupefaciente.
b. O arguido elevou a arma e deu pelo menos dois tiros para o ar (o tribunal ficou-se neste caso por um tiro).
c. O ofendido L… imobilizou o carro e saiu após ter ouvido os dois disparos que atingiram o seu veículo.
d. O arguido agiu de forma livre, voluntária e consciente, com perfeito conhecimento que a detenção, designadamente, de heroína, e bem assim, a sua eventual cedência/venda a terceiros lhe estava vedada e era criminalmente censurável, e mesmo assim não se absteve de a concretizar.
Da contestação.
a. O arguido não é conhecido por actos de violência ou é pessoa bem aceite na comunidade.
b. O arguido está arrependido.”
*
3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

A) Possibilidade de agravação de 1/3 da moldura legal do crime de homicídio qualificado, por força do disposto no nº 3, do artigo 86º, da Lei 5/2006, de 23 de fevereiro.
Defende o recorrente que a agravação do nº 3, do artigo 86º, da Lei nº 5/2006, de 23 de fevereiro (com as alterações introduzidas pelas Leis nº 59/2007, de 4 de setembro, nº 17/2009, de 6 de maio, nº 26/2010, de 30 de agosto, e nº 12/2011, de 27 de abril), que aprova o novo Regime Jurídico das Armas e suas Munições (doravante designada apenas por Lei das Armas) não pode ser aplicada ao tipo de crime de homicídio qualificado, do artigo 132º, do Código Penal, sob pena de se incorrer em injustificada dupla agravação.
Apreciemos.
A questão suscitada pelo recorrente respeita à concorrência de circunstâncias qualificativas, modificativas, previstas para um tipo legal de crime e determinantes de uma moldura penal agravada, com uma outra qualificativa, de caráter geral, igualmente cominadora da agravação daquela moldura.
Efetivamente, in casu, para além da agravação da moldura penal do homicídio por força do disposto nos nºs 1 e 2, al. e), do artigo 132º, do Código Penal, que o recorrente não contesta, o Tribunal a quo procedeu, ainda, a uma agravação daquela moldura, nos termos do artigo 86º, nº 3 da Lei das Armas.
Sendo precisamente contra esta última agravação que se insurge o recorrente, fundamentando-se na proibição da dupla agravação.
Olvida, contudo, que a proibição da dupla agravação não pode ser estabelecida em termos genéricos, mas apenas quando as agravações correspondam a uma mesma dimensão da ilicitude, ou da culpa, em violação do princípio non bis in idem.
Efetivamente, é hoje ponto assente na doutrina e jurisprudência, a proibição da dupla valoração, quer no caso da concorrência de qualificativas de elementos constitutivos de mais de um exemplo padrão, qualquer um deles determinante de uma moldura penal agravada, quer na ponderação da circunstância qualificativa ao nível da medida concreta da pena, em termos globais.
Casos em que, precisamente para evitar a dupla valoração, se impõe “a eleição de uma das circunstâncias como decisiva para a determinação da moldura penal aplicável, enquanto a outra será tomada em consideração, como agravante, na fixação da medida concreta da pena” (cfr. Figueiredo Dias, in Comentário Conimbricense do Código Penal, Parte Especial, Tomo I, Coimbra Editora, 1999, § 42, pág. 45, citando Teresa Serra, Homicídio Qualificado. Tipo de Culpa e Medida da Pena, 1990, 50).
Diferente desta, é a questão que se coloca no caso sub judice, em que a concorrência se dá entre qualificativas de natureza absolutamente diversa, como o são a circunstância qualificativa dos nºs 1 e 2, al. e), do artigo 132º, do Código Penal e a qualificativa, de caráter geral, cominada no artigo 86º, nº 3, da Lei das Armas.
É que, enquanto aquela primeira qualificativa assenta numa culpa acrescida na prática do homicídio, que radica na especial perversidade ou crueldade com que ele foi em concreto cometido, já a segunda advém, exclusivamente, de razões de prevenção geral, que se fundam na necessidade de limitar o recurso às armas na prática de qualquer tipo de crime, pela sua aptidão para causar danos relevantes, em bens jurídicos penalmente tutelados.
De onde decorre que na agravação determinada pelo artigo 132º, do Código Penal, não é valorada nem considerada a razão de ser da agravação cominada do nº 3, do artigo 86º, da Lei das Armas.
Agravação esta que, aliás, e como resulta do texto do preceito, a lei apenas exclui naqueles casos em que o uso ou porte de arma seja elemento do respetivo tipo de crime ou dê lugar, por outra via, a uma agravação mais elevada.
Sendo que o uso de arma, para além de não ser elemento do crime de homicídio, também não levou, in casu, e como vimos, ao preenchimento do tipo qualificado do artigo 132º.
Nas expressivas palavras do Acórdão do STJ, de 18.01.2012, proferido no proc. nº 306/10.0JAPRT.P1.S1, disponível em www.dgsi.pt, “O repúdio da consideração em termos de pena da qualificativa constante do referido normativo da Lei das Armas ignora as razões de prevenção que lhe estão subjacentes sem qualquer razão legal atendível. Aliás, o próprio artigo 86 é expresso quando liminarmente refere que a qualificativa se refere a penas aplicáveis a crimes cometidos com arma, ou seja, num primeiro momento há que aferir dos factores relevantes em termos de medida da pena em relação a um tipo legal que é qualificado e, como é evidente, em função das circunstâncias do mesmo crime e, em seguida, modela-se a mesma pena de acordo com o normativo em causa. Este, como se referiu reflecte uma ilicitude que não tem vasos comunicantes com o tipo de homicídio e cuja existência está apenas dependente da ilicitude revelada pela existência da arma na prática do crime.”
De tudo assim decorrendo que cada uma das agravantes surge de forma perfeitamente autónoma e independente, não havendo por isso qualquer razão legal, ou imperativo constitucional, que fundamente o afastamento do funcionamento de qualquer delas.
Naufragando este ponto do recurso.
*
B) Quantum das penas parcelares e única
O recorrente insurge-se, ainda, contra as medidas concretas das penas parcelares e única que lhe foram aplicadas, que considera desadequadas, por excessivas.
Vejamos.
Os crimes pelos quais o arguido/recorrente foi condenado, são punidos, em abstrato, da seguinte forma:
o crime de homicídio qualificado, p. e p. pelos arts. 131.º e 132.º do Código Penal (com a agravação do n.º 3 do art. 86.º do Regime Jurídico das Armas e Munições, aprovado pela Lei n.º 5/2006, de 23/2, na redacção introduzida pela Lei n.º 17/2009, de 6/5) – pena de 16 a 25 anos de prisão;
o crime de falsificação de documento, p. e p. pelo art. 256.º n.º 1 al. d) do Código Penal, por referência ao art. 255.º al. a) do mesmo diploma, com pena de 1 mês a 3 anos de prisão ou 10 a 360 dias de multa;
o crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, p. e p. pelo art. 3.º n.os 1 e 2 do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, e pelos arts. 121.º n.º 1, 122.º n.º 1 e 123.º, todos do Código da Estrada – pena de 1 mês a 2 anos de prisão ou 10 a 240 dias de multa;
o crime de recetação, p. e p. pelo art. 231.º n.º 1 do Código Penal – pena de 1 mês a 5 anos de prisão ou 10 a 600 dias de multa; e
o crime de detenção de arma proibida, p. e p. pelo art. 86.º n.º 1 al. c) da citada Lei n.º 5/2006 de 23 de Fevereiro (na redacção introduzida pela Lei n.º 17/2009, de 6/5) – pena de prisão de 1 a 5 anos ou 10 a 600 dias de multa.
Apesar de os crimes de falsificação de documentos, condução sem habilitação legal, recetação e detenção de arma proibida preverem, para a sua punição, uma pena de prisão em alternativa a uma pena pecuniária, o recorrente não põe em causa a opção pela primeira, feita pelo Tribunal a quo. Apenas se insurgindo contra as respetivas medidas concretas.
Vejamos, pois, essa questão.
A concretização das penas obedece aos critérios definidos nos artigos 40º, nº 1 e nº 2 e 71º do Código Penal.
Em conformidade com o estatuído no artigo 40º, nº 1 do Código Penal, a aplicação das penas “…visa a proteção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade”, ou seja, visa fundamentalmente atingir fins de prevenção geral (proteção dos bens jurídicos) e fins de prevenção especial (reintegração do agente). Não podendo em caso algum a pena ultrapassar a medida da culpa (nº 2 do citado artigo 40º).
A quantificação da culpa e o grau de exigência das razões de prevenção, em função das quais se vão dimensionar as correspondentes molduras para o caso concreto, faz-se através da “ponderação das circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, depuseram a favor do agente ou contra ele”, tal como decorre do artigo 71º, nº2 do Código Penal.
O limite máximo da pena fixar-se-á – atendendo à salvaguarda da dignidade humana do agente – em função da medida da culpa, que a delimitará por maiores que sejam as exigências de carácter preventivo que se façam sentir.
O seu limite mínimo é dado pelo quantum da pena que, em concreto, ainda realize, eficazmente, essa proteção dos bens jurídicos penalmente protegidos.
Dentro desses dois limites, encontrar-se-á o espaço possível de resposta às necessidades de reintegração social do agente.
Revertendo ao caso sub judice, refaçamos o processo lógico e racional de concretização das penas, norteados pelos princípios a esse propósito legalmente definidos.
Como fatores de valoração que militam a favor do arguido temos:
- a sua juventude (21 anos de idade à data da prática dos factos);
- a ausência de antecedentes criminais, bem como a confissão dos crimes de falsificação de documento, condução sem habilitação legal e detenção de arma proibida (embora tal confissão assuma um muito escasso poder atenuativo, face à abundante prova existente nos autos da prática daqueles crimes).
Não se pode contudo esquecer a intensidade da culpa, atenta a modalidade de dolo direto que revestiu todas as condutas do arguido.
A ilicitude, por sua vez, é mediana em todos os crimes.
O alarme social causado pela comissão do crime de homicídio e, também, ainda que a outro nível, pelos de recetação, detenção de arma proibida e de condução sem habilitação legal é muito grande, sendo, assim, a prevenção geral elevada.
A propósito do que se escreveu no acórdão recorrido:
“As exigências de prevenção geral no crime de homicídio são elevadíssimas, sendo quase desnecessário dizer que este tipo de crimes provoca na comunidade um inigualável sentimento de receio e, concomitantemente, de repulsa, tornando-se por conseguinte absolutamente essencial que a sociedade sinta que determinados comportamentos sofrem uma adequada punição, mantendo-se assim a confiança geral no ordenamento jurídico.
No que concerne ao crime de detenção ilegal de arma, as exigências de prevenção geral positiva são também muito elevadas, visto que as armas são por todos consideradas como potenciadoras de receios e grave criminalidade, sendo urgente combater a crescente proliferação das mesmas. Com efeito, veja-se por exemplo que, não há muito tempo, se estimava existirem em Portugal cerca de 1,5 milhões de armas ilegais, o que, associado a um aumento do comércio de armas ilegais de guerra e de armas transformadas, acabam por explicar o aumento da prática de crimes com recurso a armas de fogo.
Aliás, importa não olvidar que a última alteração do regime jurídico das armas e munições se ficou a dever precisamente ao resultado do aumento da criminalidade com recurso a este tipo de armas, procurando o legislador, além do mais, agravar as penas de detenção de arma proibida e dos crimes cometidos com recurso a arma, prevendo ainda a detenção, em ou fora de flagrante delito, dos agentes de crimes de detenção de arma proibida ou de crimes cometidos com recurso a arma, bem como a aplicabilidade da prisão preventiva em todos os casos de crimes de detenção de arma proibida e de crimes cometidos com recurso a arma.
Quanto ao crime de falsificação de documento, cabe aqui reforçar a ideia de que é necessária a manutenção da confiança geral na veracidade dos documentos.
O crime de receptação é indiscutivelmente visto como um dos comportamentos que fomentam a prática de crimes contra o património. Como bem observa Eduardo Correia, “os receptadores são os grandes fautores dos crimes contra o património.” (in Actas, 1979, pág. 172)
Relativamente ao crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, é infelizmente mais um daqueles crimes que importa combater, visto que são frequentíssimas as vezes que indivíduos conduzem os mais diversos veículos sem possuírem a devida habilitação, com evidente perigo para todos aqueles que circulam nas estradas.”
Resta acrescentar que, no caso particular do crime de falsificação, sendo a sua prática motivada pelo desiderato do agente de se eximir à responsabilidade pela prática de crime de condução sem habilitação legal, as razões de prevenção geral sentidas para este último ilícito, estendem-se àquele.
Quanto à prevenção especial, verifica-se que existe uma manifesta tendência do arguido para o desrespeito de bens jurídicos fundamentais e estruturantes da sociedade, como o são, desde logo, a vida, a segurança rodoviária e o património dos outros.
De facto, embora não tenha antecedentes criminais, o arguido nunca apresentou um projeto de vida estruturado, não trabalhando nem estudando, “não aceitando regras e valores de conduta, deambulando pela cidade de Peso da Régua sem qualquer ocupação”. E, não obstante sempre ter estado familiarmente integrado, vivendo com os pais e irmãos, privilegiava “a vida de rua, integrando, ainda menor, grupos de pares conotados com a prática de ilícitos criminais, sendo dessa altura os primeiros consumos de haxixe”. Teve, inclusive, o apoio da Segurança Social, que envidou esforços para o inscrever num curso de formação profissional que lhe daria equivalência ao 9º ano, oportunidade que o arguido desperdiçou por “elevado absentismo e desinteresse pelas matérias lecionadas”. (Cfr. nºs 64 a 71 dos Factos Provados).
Sopesando todas as considerações expendidas atinentes à culpa, ilicitude, prevenção geral e especial, tem-se por equilibradas e justas as penas parcelares aplicadas pelo tribunal a quo, todas situadas ainda abaixo da metade das respetivas molduras legais.
Pelo que o recurso naufraga também nesta vertente.
*
Medida da pena única
A pena aplicável ao concurso de crimes, conforme resulta do artigo 77º, nºs 1 e 2, do Código Penal, tem como limite máximo a soma das penas concretamente aplicadas aos vários crimes, não podendo ultrapassar vinte e cinco anos de prisão e como limite mínimo a mais elevada das penas concretamente aplicadas aos vários crimes.
In casu, os limites abstratos da pena única variam entre o mínimo de vinte anos de prisão (pena parcelar mais grave) e o máximo de vinte e quatro anos e dez meses de prisão (soma das penas parcelares).
Na concretização da pena única haverá, necessariamente e por imperativo legal, de ter-se em conta o conjunto dos factos que integram os crimes em concurso, numa avaliação global da ilicitude, com base na conexão dos factos em concurso; bem como a personalidade do agente, revelada nesse conjunto dos factos, em ordem a descortinar se a prática dos vários crimes radica numa caraterística desvaliosa da personalidade do agente que o leva a repetir as condutas criminosas ou se, pelo contrário, essa repetição se fica a dever a uma pluriocasionalidade não relacionada com um desvio da sua personalidade. (Cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português – As Consequências Jurídicas do Crime, 291).
Ficando assim definitivamente afastada, nesta fase de determinação da pena única, uma visão centrada em cada crime individualmente considerado, já que o que se pretende é, pelo contrário, uma visão de conjunto de todos os factos em concurso, em ordem a relacioná-los entre si e com a personalidade do agente, que dará lugar a uma nova discussão sobre a pena, com critérios legais de determinação diferentes dos que haviam anteriormente determinado as penas parcelares por cada crime em concurso.
Tudo em ordem à avaliação do ilícito global e da “culpa pelos factos em relação”, na impressiva expressão de Cristina Líbano Monteiro (in “A Pena “Unitária” do Concurso de Crimes”, RPCC, Ano 16, n.º 1, p. 162 e ss. Cfr. também, na jurisprudência, por todos, o Acórdão do STJ de 27.02.2013, proferido no processo 455/08.5GDPTM, disponível em www.dgsi.pt/jstj).
Revertendo ao caso sub judice, do conjunto dos factos em concurso, sobressai logo a heterogeneidade da atuação do agente e dos bens jurídicos violados, posto que num período de cerca de dois meses (entre outubro de dezembro de 2012), praticou um crime de homicídio qualificado, um crime de falsificação de documento, um crime de condução de veículo automóvel sem habilitação legal, um crime de recetação e um crime de detenção de arma proibida.
Recorrendo ao uso de arma de fogo para a prática do homicídio, o qual, por sua vez, surge num contexto relacionado com o tráfico e consumo de estupefacientes.
A forma como são praticados os crimes em causa e as suas motivações, manifestam um preocupante desprezo por bens jurídicos fundamentais e estruturantes da sociedade, o que, numa visão global, agrava a ilicitude e exaspera as necessidades de prevenção geral.
Por outro lado, a personalidade do arguido, projetada nos factos em concurso, revela já caraterísticas de desestruturação pessoal, com total ausência de respeito pela vida, pela propriedade e pela segurança das pessoas.
O que, numa avaliação global, dá enquadramento ao conjunto de factos criminosos, reconduzindo-os a uma manifesta tendência que radica na personalidade do condenado, demonstradora de desprezo pelos bens jurídicos violados, intensificando as necessidades de prevenção especial.
Necessidades essas que não se atenuam com a integração familiar do arguido, que tem o apoio da mãe e irmãs, pois essa situação já existia à data da prática dos factos criminosos e não o desmotivou de os levar a cabo.
Abona no entanto a seu favor a sua juventude (21 anos à data da prática dos factos); bem como a circunstância de não se ter apurado a existência anterior de qualquer contacto com o sistema penal.
Neste contexto, a proporcionalidade entre a intensidade das consequências pessoais da pena única e o interesse social na punição, impõe que aquela se situe sensivelmente a meio da moldura legal que, no caso, e como já vimos supra, vai de um mínimo de vinte anos de prisão a um máximo de vinte e quatro anos e dez meses de prisão.
Pelo que a pena única de vinte e dois anos de prisão aplicada pelo Tribunal a quo, situada muito próximo daquele ponto médio, mostra-se equilibrada e justa, não merecendo qualquer censura.
*
III. DECISÃO
Pelo exposto, acordam as juízas desta secção do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso do arguido B….
Custas pelo recorrente, fixando-se em 5 (cinco) Ucs a taxa de justiça.
*
Comunique o teor do presente acórdão, com urgência, à 1ª instância (independentemente do respetivo trânsito em julgado), face ao efeito da confirmação do acórdão condenatório da 1ª instância no prazo máximo da prisão preventiva, nos termos do disposto no nº 6, do artigo 215º, do Código de Processo Penal.
*
Porto, 14 de janeiro de 2015
(Elaborado e revisto pela relatora)
Fátima Furtado
Elsa Paixão