Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
206/12.0GDOAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: FÁTIMA FURTADO
Descritores: AUDIÇÃO DE TESTEMUNHAS
NULIDADE SANÁVEL
Nº do Documento: RP20140924206/12.0GDOAZ.P1
Data do Acordão: 09/24/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O indeferimento da audição de testemunhas indicadas em audiência pelo mandatário da assistente constituirá a nulidade sanável do artº 120º2 d) CPP a arguir antes que o acto esteja terminado, e seria essa decisão de indeferimento da arguição que serviria de fundamento de recurso.
II - Suscitando essa nulidade apenas em recurso a eventual nulidade encontra-se sanada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 206/12.0GDOAZ.P1
Arouca

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto
2ª secção criminal

I. RELATÓRIO
No processo Comum Singular nº 206/12.0GDOAZ, do Tribunal Judicial de Arouca, foi submetida a julgamento a arguida B…, com os demais sinais dos autos.
A sentença, proferida a 17 de fevereiro de 2014 e depositada no mesmo dia, tem o seguinte dispositivo:
“A) Parte crime
Atento o exposto, decido:
1- Julgar a acusação pública improcedente por não provada e, em consequência, absolver a arguida B… da prática, em autoria material e na forma consumada, de um crime de ameaça, p. e p. pelo disposto no artigo 153º, n.º 1 do C. Penal.
2 – Sem custas na parte criminal.
B) Parte cível
Pelo exposto, decido ainda:
1- Julgar improcedente, por não provado, o pedido de indemnização civil deduzido por C… contra a demandada B… e, em consequência absolvê-la do pedido.
2 - Condenar o demandante C… nas custas devidas pelo pedido cível formulado contra B… nos termos das disposições conjugadas dos artigos 523 º do C.P.P e 527º do N.C.P.C.
*
Notifique.
Proceda ao depósito da Sentença - artigo 372º, n.º 5 do C.P.P.“
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Inconformado, o assistente C…, identificado nos autos, interpôs recurso, apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões:
“A. O assistente considera que o Tribunal a quo errou na apreciação criteriosa da prova e dos elementos processuais (documentais e outros) que devem determinar a condenação da arguida.
B. Resultam das provas testemunhais da audiência de julgamento, registadas com critério e credibilidade, e por isso devem figurar como factos provados, que: - Em dia da semana do mês de Junho de 2012, que se apurou ser o dia 15, da parte da manhã, o denunciante C… e a arguida encontravam-se perto de um imóvel, onde labora a firma/fábrica "D…, Lda.", imóvel este de valor não inferior a 70.000 euros, pertencente ao denunciante C…, e sito em …, …, Arouca; - Aí e devido a litígios anteriores, a arguida disse em voz alta e em tom sério para o denunciante que lhe dava um tiro, que este iria para o cemitério e que pegaria fogo "à merda da fabrica"; - Face a esta atitude da arguida, o denunciante ficou com receio que a arguida viesse a concretizar no futuro aquelas ameaças; - A arguida agiu voluntária e conscientemente, com intenção de causar no denunciante fundado receio, de que viesse a tentar (a arguida), contra a sua integridade física, bem como pegar fogo ao seu imóvel, provocando assim com a sua destruição prejuízos de valor não inferior a 65.000 euros, o que conseguiu; - Bem sabia a arguida, que a sua conduta era proibida e punida por lei, ao que foi indiferente; - o ofendido sentiu-se e ainda se sente profundamente magoado e revoltado em consequência da conduta da arguida; - Sente-se receoso e ameaçado; - Pediu a vizinhos e familiares que residem contiguamente à sua carpintaria (no …), para se acercarem do imóvel para o vigiarem.
C. Pelo discurso das testemunhas oculares, a arguida fê-lo voluntária e conscientemente, com intenção de causar justo receio ao assistente, o que conseguiu, tanto à sua integridade física como ao seu património, podendo causar prejuízos de valor considerável.
D. Há, portando, erro notório na apreciação da prova, nos termos do art.º 410º, n° 2, al. c) do CPP, devendo a arguida ser condenada pelo crime de ameaça, p. p pelo art.º 153º, n°1 do CP.
E. O Tribunal da Relação não deve ficar impedido de contrariar a decisão impugnada através do recurso, o que significa que tem o poder/dever de formar a sua convicção, interpretar criticamente a prova, vislumbrar com imparcialidade os depoimentos testemunhais e deles concluir o essencial para o apuramento dos factos. Neste particular a revisitação dos depoimentos testemunhais, por audio e também transcritos, levarão à conclusão que o tribunal a quo se equivocou e deve ser corrigido na sua douta decisão por uma contrária que leve à condenação da arguida.
F. Ao ser dado como provado, tendo por base os depoimentos das testemunhas E…, F…, G… e C… (este assistente), que a arguida emanou intenção de dar um tiro, que o assistente iria para o cemitério e que pegaria fogo “à merda de fábrica”, tal é suficiente para a consumação do crime de quo vem acusada a arguida.
G. Foram violados os art°s 410º, n°2, al. c) do CPP, e art.º 153º, nº1 do CP, pois há uma ERRÓNEA APRECIAÇÃO DA PROVA. A SENTENÇA RECORRIDA TRADUZ UMA DECAPITAÇÃO INCOERENTE DE ELEMENTOS PROVATÓRIOS PARA A DECISÃO DA MATÉRIA DE FACTO PROVADA.
H. Além de que o tribunal a quo também cometeu o vício de omissão no apuramento da verdade. Ao recusar a audição de duas testemunhas oculares e presenciais dos factos da acusação para apuramento da verdade e para boa decisão da causa, violou o art° 340º, nº1 do CPP, ao abrigo do qual foi requerida a audição, prescindido, com o seu comportamento, de apurar mais elementos que pudessem confirmar, ou não, a acusação que se encontrava em fase de prova.
I. É nula a sentença que condene por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia (É nula a sentença que condene por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia (art.º 379°, nº1, al. b) do CPP). Ao admitir que absolve a arguida, não fundamentando à contrário tendo em conta os factos indicados na acusação, o tribunal a quo violou também, por interpretação extensiva, o dispositivo legal mencionado.
J. O tribunal a quo ao absolver, fá-lo sem rigor, qualidade e inquestionabilidade. Errou na apreciação da prova, violou o art.º410º, n° 2, al. c) do CPP.
K. Ao admitir que absolve a arguida, não fundamentando à contrário, tendo em conta os factos indicados na acusação o tribunal a quo violou também por interpretação extensiva, o dispositivo legal mencionado. O tribunal a quo ao absolver, fá-lo sem rigor, qualidade e inquestionabilidade. Errou na apreciação da prova, violou o art.º 410º, n.° 2, al. c) do CPP.
O Recurso interposto deve, por conseguinte proceder, assim se fazendo a melhor e sã justiça.”
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O Magistrado do Ministério Público junto do Tribunal a quo, bem como a arguida B… responderam, ambos pugnando pelo não provimento do recurso.
O recurso foi admitido para este Tribunal da Relação do Porto, por despacho datado de 26 de março de 2014 (fls. 357).
Nesta Relação, o Ex.mo Senhor Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer, igualmente no sentido de que o recurso não merece provimento.
Foi cumprido o artigo 417º, nº 2 do Código de Processo Penal, sem resposta.
Colhidos os vistos, cumpre apreciar e decidir.
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II. FUNDAMENTAÇÃO
Conforme é jurisprudência assente, o âmbito do recurso delimita-se pelas conclusões extraídas pelo recorrente a partir da respetiva motivação, sem prejuízo da tomada de posição sobre todas e quaisquer questões que sejam de conhecimento oficioso e de que ainda seja possível conhecer (artigo 412º, nº 1 do Código de Processo Penal).
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1. Questões a decidir
Face às conclusões extraídas pelo recorrente da motivação apresentada, as questões a decidir são as seguintes:
A) Nulidade da sentença, por violação do disposto no artigo 379º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal.
B) Erro notório na apreciação da prova;
C) Omissão de diligências importantes para o apuramento da verdade;
D) Impugnação da decisão proferida quanto à matéria de facto não provada.
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2. Factos Provados
Segue-se a enumeração dos factos provados, não provados e respetiva motivação, constantes da sentença recorrida:
1.1 - FACTOS PROVADOS
Discutida a causa, com relevância para a decisão final, resultaram provados os seguintes factos:
1. A arguida é doméstica e foi empregada fabril durante 30 anos na Suíça.
2. A arguida reside em casa própria, com o seu marido, que está desempregado, com a sua filha, que é empregada fabril e aufere o salário mínimo nacional, e com a sua neta.
3. A arguida tem a 4ª classe de escolaridade.
4. A arguida não tem antecedentes criminais.
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1.2. FACTOS NÃO PROVADOS
Para além das formulações conclusivas, das afirmações repetidas, da matéria de direito (a que não se respondem) e dos factos que resultam logicamente excluídos dos factos anteriormente dados como provados, não se provou que:
1. Em dia de semana não apurado, mas do mês de Junho ou Julho de 2012, da parte da manhã, o denunciante C… e a arguida encontravam-se perto de um imóvel, onde labora a firma/fábrica “D…, Lda.”, imóvel este, de valor não inferior a € 70.000, pertencente ao denunciante C…, e sito em …, …, Arouca.
2. Aí, e devido a litígios anteriores, a arguida disse em voz alta e em tom sério para o denunciante que lhe dava um tiro, que este iria para o cemitério e que pegaria fogo “à merda da fábrica”.
3. Face a esta atitude da arguida, o denunciante ficou com receio que a arguida viesse a concretizar no futuro aquelas ameaças.
4. A arguida agiu voluntária e conscientemente, com intenção de causar no denunciante fundado receio, de que viesse a atentar (a arguida), contra a sua integridade física, bem como em destruir o imóvel supra-referido, provocando assim neste imóvel, prejuízos de valor não inferior a € 65.000, o que conseguiu.
5. Bem sabia a arguida, que a sua conduta era proibida e punida por lei, ao que foi indiferente.
6. O ofendido sentiu-se e ainda se sente profundamente magoado e revoltado em consequência da conduta da arguida.
7. Sente-se receoso e ameaçado.
8. Por diversas vezes pede a vizinhos e familiares que residem contiguamente à sua carpintaria (no lugar do Outeiro), para durante a noite se acercarem do imóvel para o vigiarem.
2. MOTIVAÇÃO
Para a formação da sua convicção em relação à factualidade, o tribunal teve por base a análise crítica do conjunto da prova produzida e examinada em audiência de acordo com as regras da experiência comum e a sua livre convicção, tal como preceitua o artigo 127 º do C.P.P. e como, doravante se passa a explicitar.
Quanto às condições pessoais, sociais e económicas da arguida o tribunal formou a sua convicção nas declarações por esta prestadas a seu respeito, que se mostraram credíveis.
No que se refere à ausência de antecedentes criminais da arguida, baseou-se o tribunal no C.R.C. junto aos autos na última sessão da audiência.
Os factos dados como não provados foram como tal considerados pelo Tribunal por não ter sido produzida prova com a devida consistência quanto à ocorrência dos mesmos.
Como assinala Figueiredo Dias (in Direito Processual Penal, p. 204 e ss.), a convicção do juiz há-de ser uma convicção pessoal - até porque nela desempenha um papel de relevo não só a actividade meramente cognitiva mas também elementos racionalmente não explicáveis (por exemplo, a credibilidade que se concede a um certo meio de prova), e mesmo puramente emocionais – no entanto, em todo o caso, também ela uma convicção objectivável e motivável, capaz de se impor aos outros.
Uma tal convicção existirá quando e só quando o Tribunal tenha logrado convencer-se da verdade, para além de toda a dúvida razoável.
Com efeito, a arguida não prestou declarações sobre os factos imputados, fazendo uso do direito ao silêncio que legalmente lhe assiste.
A testemunha E…, empregado do assistente entre Fevereiro de 2010 e 2012, declarou que, no dia 15 de Junho de 2011, entre as 11 horas e as 12 horas, na sequência de uma discussão ouviu a arguida dizer ao seu patrão que lhe dava um tiro e punha fogo à fábrica. Porém não conseguiu justificar como se recordava com tanta exactidão de tal data, não sabendo o que fez no mesmo dia deste ano. Ademais, referiu que nada mais aconteceu nesse dia e reconheceu, logo de seguida, que nesse dia também apresentou queixa contra a arguida e que não está “de bem” com ela, revelando falta de isenção no seu depoimento. Por outro lado também admitiu que se a fábrica explodisse podia atingir a casa da própria arguida, o que afasta a demonstração de que o ofendido tivesse acreditado em tal afirmação ainda que a arguida a tivesse proferido. Ademais, reconheceu que o ofendido continuou a sair da fábrica normalmente e à mesma hora, que a madeira permaneceu fora da fábrica como habitualmente, e que não foi tomada qualquer medida de protecção, excepto o facto de o ofendido ter pedido aos vizinhos que “olhassem pela fábrica”, segundo o que apenas o próprio lhe disse.
A testemunha I…, vizinho da arguida e do assistente, revelou que não assistiu aos factos descritos na acusação, mas que o assistente lhe disse que estava com receio de ameaça de levar um tiro e de atearem fogo à fábrica e para o avisar se visse qualquer coisa durante a noite, Todavia, das fotografias juntas a fls. 216 é perceptível que existe pouca visibilidade da sua residência para a fábrica. Ademais, esta testemunha mostrou também pouca isenção, ao referir que não fala com a arguida e que se acontecesse alguma coisa à fábrica a casa da arguida não ficaria em perigo quando o próprio reconhece que a mesma fica mesmo do outro lado da rua.
A testemunha J…, vizinha da arguida, referiu que esta deixou de falar consigo e que não assistiu aos factos. E teve também um depoimento comprometido com a posição do assistente, pois afirmou que a fábrica deve valer € 70 mil e € 75 mil euros, quando não sabe sequer quanto custaria reconstruir a casa onde mora e desconhece o valor das máquinas. Por outro lado, reconheceu que não houve qualquer alteração no comportamento do assistente nem foi tomada qualquer medida de segurança acrescida para a fábrica, excepto o arguido lhe ter pedido para o avisar se visse “alguma coisa”.
A testemunha F…, pai da arguida e do assistente disse que no dia 15 de Junho, entre as 10 e as 11:30 horas ouviu a sua filha a dirigir-se ao seu filho C… a dizer “dou-te um tiro, boto fogo à fábrica” e que este até hoje tem receio e levou a sério a ameaça. Contudo, teve contradições no seu depoimento, referindo inicialmente que o assistente ficou com medo que a arguida lhe desse um tiro, e mais tarde não saber se ele tem medo pela própria vida e que ele só tem medo “que lhe bote fogo à fábrica”. No entanto, também reconheceu que um eventual fogo poderia atingir igualmente a casa da arguida. E apesar de ter referido que o seu filho lhe pediu para ir vigiando a fábrica, admitiu que já o fazia anteriormente, pelo que não se vislumbra que tenha existido uma alteração significativa de comportamentos, Ademais, não explicou devidamente como tinha a certeza do dia e mês que indicou, referindo simplesmente que “anotou de cabeça”. Quanto ao valor das máquinas e da fábrica mostrou igualmente não ter certezas. Revelou igualmente parcialidade no seu depoimento, face ao modo como foi prestado, o que foi reforçado pelo facto de ter afirmado estar “de mal” com a sua filha.
O assistente D… declarou que no dia 15 de Junho de 2012 a arguida lhe disse “dou-te um tiro, mando-te para o cemitério, chego-te o fogo à fábrica” e que ficou com receio que ela concretizasse a ameaça. No entanto, para além de ser directamente interessado no desfecho da causa, por ser assistente e demandante, mostrou fragilidades no seu depoimento, que para além de ser pouco pormenorizado, revelou contradições com as demais testemunhas, designadamente quando disse que não anda “tão à vontade”, chega mais tarde ou sai mais cedo, o que não foi corroborado pelas testemunhas que declararam que ele manteve os mesmos horários. Também não conseguiu justificar devidamente os números que adiantou para o valor do imóvel.
A testemunha G…, filho do assistente, reconheceu estar de relações cortadas com a arguida. Declarou que no dia 15 de Junho de 2012 esta disse ao seu pai “eu meto-te uns tiros, eu mato-te, tu vais para o cemitério” e que mandava tudo “pelos ares”. Para além de parte dessas expressões nem sequer constarem da acusação, referiu ainda que quando o seu pai voltou a sair a arguida lhe disse “dou-te uns tiros, pego fogo a essa merda”, sendo que não foi mencionado pelas demais testemunhas que as expressões tivessem sido proferidas em tempos diferentes. Também referiu que o seu pai levou a sério as declarações da arguida e que o seu pai quando sai da fábrica o chama para ir com ele lá fora e que olha sempre antes de abrir a porta da carrinha e antes de sair da empresa, o que não foi referido sequer pelo próprio assistente. Disse que pediram ao vizinho, Sr. I… para ver da fábrica quando saíssem. Reconheceu a casa deste vizinho como sendo a amarela nas fotografias de fls. 216 e reafirmou que a mesma tem boa visibilidade para a fábrica, o que não parece decorrer das imagens.
A testemunha K…, marido da arguida, declarou que no dia 15 de Junho de 2012, pelas 10 horas houve uma discussão mas entre si e o seu sogro por causa de um rego. A sua esposa tinha ido caminhar com umas amigas e chegou a casa pelas 11 horas e pouco, ao que assistiu, o que foi confirmado pelas testemunhas L… e M…. Disse ainda que a sua esposa saiu de casa pelas 08:30 horas e que não estava ninguém fora da fábrica quando a sua esposa regressou. Mais referiu que nunca viu o Sr. I… a rondar a fábrica, nem qualquer protecção especial na mesma.
A testemunha N…, filha da arguida, declarou que no dia 15 de Junho, data que se recorda pelo que sucedeu à tarde e no dia seguinte com a sua mãe, esta passou junto à fábrica onde a depoente trabalha, “O…”, pelas 10:30 ou 11 horas, o que foi corroborado pelas testemunhas L… e M…. Mais disse que a sua mãe já estava em casa quando foi almoçar, pelas 12 horas. Também referiu nunca ter visto o Sr. I… a vigiar a fábrica.
As testemunhas L… e M… confirmaram que foram caminhar com a arguida no dia 15 de Junho de manhã. A primeira conseguiu precisar o dia por fazer anos dois dias depois, e a segunda por ter uma mensagem da filha da arguida datada de 17 de Junho de 2012 a dizer que a sua mãe não podia ir caminhar no dia seguinte, que era uma segunda-feira. Estas testemunhas relataram de forma, em termos gerais, coincidente, os trajectos habitualmente seguidos e que passaram nesse dia na “O…”. Ambas declararam que deixaram a arguida em casa pelas 11:30 horas e que não estava ninguém na rua e a primeira precisou que a arguida chegou ao seu encontro pelas 09:20 horas.
O documento de fls. 240 foi impugnado pela arguida e não se mostrou suficiente para infirmar os depoimentos destas duas testemunhas, até porque foi por elas referido que utilizam atalhos nos seus trajectos, não representados no aludido documento.
A testemunha P…, conhecido da arguida e do assistente, declarou que no dia 15 andava a trabalhar na “O…” e viu a arguida a passar com a M… e com a L…, a pé, pelas 10 horas. Disse saber ser esse o dia pelo que falaram que tinha sucedido nesse dia de manhã. Na semana seguinte já só viu passar as duas amigas da arguida, o que foi corroborado pelo depoimento da testemunha M…, que declarou não ter voltado a caminhar com a arguida depois desse dia 15.
Apesar de não resultar dos documentos e informações juntos aos autos pela própria testemunha e pela sociedade “O…, Lda.”, a fls. 249 a 251, que P… tivesse trabalhado nas instalações desta nesse dia 15 de Junho de 2012, aqueles também não afastam tal possibilidade, já que a referida sociedade confirma a prestação de vários serviços em 2012, de forma nem sempre continuada, e é desconhecido qual o acordo entre ambos sobre a data da facturação dos serviços. Ademais, a testemunha M… confirmou que vê várias vezes o Sr. P… a fazer trabalhos na “O…”.
O documento junto a fls. 217 e seguintes (certidão da execução comum n.º 300-A/2002) reforça a demonstração da animosidade existente entre a arguida e o assistente mas não sustenta a versão de qualquer dos sujeitos processuais no que diz respeito aos factos imputados à arguida nestes autos.
Assim sendo, não foram produzidos meios probatórios bastantes que sustentassem com a certeza exigível os factos imputados à arguida.
Por conseguinte, também resultaram como não provados os factos relativos ao elemento subjectivo do tipo. De facto, atenta a ausência de prova quanto ao preenchimento pela arguida dos elementos objectivos do tipo de crime que lhe é imputado, fica necessariamente prejudicada a verificação da consciência e vontade de realização dos mesmos.”
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3. APRECIAÇÃO DO RECURSO

A) Nulidade da sentença, por violação do disposto no artigo 379º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal
O recorrente sustenta que sentença recorrida violou, “por interpretação extensiva”, o disposto no artigo 379º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal, “ao admitir que absolve a arguida, não fundamentando à contrário tendo em conta os factos indicados na acusação” (cfr. conclusões I. e K.)
Começamos por salientar, que mesmo depois de lida atentamente a motivação (que neste ponto não vai além do constante das conclusões) e de feito o seu confronto com a sentença recorrida, não se apresenta em termos claros a concreta deficiência para que, neste particular, o recorrente pretende chamar a atenção.
Mas vejamos.
Efetivamente, nos termos do disposto no artigo 379º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal, invocado pelo recorrente, é cominada com nulidade, a sentença “que condenar por factos diversos da acusação ou da pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstas nos artigos 358º e 359º”.
A razão de ser deste preceito, assenta na natureza acusatória do nosso sistema processual penal, constitucionalmente garantida (cfr. artigo 30º, nº 5 da Constituição da República Portuguesa), que impõe a subordinação do tribunal ao princípio da vinculação temática, só podendo atender a factos novos, diversos dos constantes na acusação ou pronúncia, nos precisos termos das citadas disposições dos artigos 358º e 359º do Código de Processo Penal. Deste modo se assegurando a possibilidade de um exercício eficaz do direito de defesa do arguido, que não é compatível com o alargamento arbitrário da atividade cognitiva e decisória do tribunal.
A razão de ser da norma invocada pelo recorrente (o citado artigo 379º, nº 1, al. b) do Código de Processo Penal) está, assim, precisamente na proteção do direito de defesa do arguido, igualmente de consagração constitucional (cfr. artigos 20º, nº 4, e 32º, da Constituição da República Portuguesa), de que é corolário uma efetiva possibilidade de exercício do contraditório.
Revertendo agora ao caso sub judice, logo se infere que sendo a sentença recorrida meramente absolutória, a aplicação do regime da invocada alínea b) do nº 1 do artigo 379º do Código de Processo Penal, fica automaticamente excluída, não só pela letra, como pelo espírito da norma. Já que a prolação de sentença daquela natureza nunca pode ser considerada consequência da impossibilidade de o arguido se ter podido defender e, como tal, é a própria ratio da norma em questão que exclui a sua aplicação a esses casos.
Não se podendo por isso sequer equacionar a hipótese de aplicação do preceito, por interpretação extensiva, à sentença absolutória recorrida, como pretende o recorrente, posto é que esta interpretação mais não é do que aquela de que o intérprete se socorre quando “chega à conclusão de que a letra do texto fica aquém do espírito da lei, que a fórmula verbal adoptada peca por defeito, pois diz menos do que aquilo que se pretendia dizer. Alarga ou estende então o texto, dando-lhe um alcance conforme ao pensamento legislativo, isto é, fazendo corresponder a letra da lei ao espírito da lei.” (cfr. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, 12.ª reimpressão, Coimbra, 2000, pp. 185-186).
Situação que, como vimos, não pode ocorrer com o disposto na al. b) do nº 1 do Código de Processo Penal nos casos em que há absolvição.
De todo o modo, o certo é que a sentença recorrida se encontra devidamente elaborada e estruturada, em respeito pelo disposto no artigo 374º do Código de Processo Penal, contendo, designadamente, a enumeração dos factos provados e não provados, de entre os alegados pela acusação e pela defesa (não sendo alegada a omissão de factos relevantes resultantes da discussão da causa), bem como uma exposição percetível e completa dos motivos, de facto e de direito, que fundamentaram a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
Concluímos pois, sem necessidade de mais considerações, não se verificar a arguida nulidade da sentença.
Improcedendo totalmente este ponto do recurso.
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B) Erro notório na apreciação da prova;
Defende o recorrente que a sentença padece do vício do erro notório na apreciação da prova, previsto na alínea c) do nº 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal.
Vejamos.
O vício que o recorrente aponta à sentença, tal como os demais que integram no nº 2 do artigo 410º do Código de Processo Penal, tem de resultar “do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum”, isto é, sem recurso a quaisquer elementos que lhe sejam externos.
São “vícios ao nível da lógica jurídica da matéria de facto, da confeção técnica do decidido, apreensíveis a partir do seu texto, a denunciar incoerência interna com os termos da decisão” (in acórdão do STJ de 07.12.2005, CJ-STJ, tomo III/2005, p. 224).
Sendo o erro notório na apreciação da prova, precisamente o que se traduz numa “falha grosseira e ostensiva na análise da prova” que leva a que “um homem médio, perante o que consta do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com o senso comum, facilmente se dá conta que o tribunal violou as regras da experiência ou que se baseou em juízos ilógicos, arbitrários ou mesmo contraditórios ou se desrespeitaram regras sobre o valor da prova vinculada ou das legis artis" (Simas Santos e Leal Henriques, in Recursos em Processo Penal, Editora Rei dos Livros, 8ª ed. Lisboa, 2012 p. 80).
Retomando agora o caso sub judice, da confrontação da motivação e conclusões do recurso com as definições dos vícios do artigo 410º, nº 2 do Código de Processo Penal, logo ressalta que o recorrente alude impropriamente ao erro notório, já que o confunde manifestamente com erros na apreciação da prova relativamente ao que o tribunal deveria ou não (na sua perspetiva) ter considerado provado, criticando a convicção do tribunal.
Efetivamente, o recorrente não afirma que para uma pessoa medianamente instruída, o próprio texto da sentença recorrida, por si e ainda que conjugado com as regras da experiência comum, contenha qualquer contradição contrária à lógica ou regras da experiência da vida. Mas antes e só, que a decisão da matéria de facto não está em conformidade com a prova efetivamente produzida em audiência, designadamente que o Tribunal desconsiderou os depoimentos de certas testemunhas, o que, em face do que elas declararam, em seu entender não se justifica, indicando até as concretas passagens da gravação dos respetivos depoimentos em que se funda. Questão que tem o seu lugar apenas na impugnação da matéria de facto, por erro de julgamento, que irá ser apreciada infra, na alínea C).
Improcede pois a alegação do erro notório na apreciação da prova, que o recorrente invoca, mas nem sequer concretiza nos termos da respetiva definição legal.
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C) Omissão de diligências importantes para o apuramento da verdade
Alega também o recorrente, que no decurso da audiência requereu, nos termos do artigo 340º do Código de Processo Penal, a inquirição de duas testemunhas presenciais, cujos depoimentos eram importantes para o apuramento da verdade, o que foi indeferido pelo Tribunal, que dessa forma cometeu o “vício de omissão no apuramento da verdade”.
Vejamos.
A alegação do recorrente reporta-se à omissão pelo tribunal de julgamento, de diligências probatórias que no seu entender deviam ter sido ordenadas, por se reputarem essenciais para a descoberta da verdade.
Ora, não entrando sequer na questão da essencialidade da audição das duas testemunhas indicadas pelo mandatário do assistente, na sessão de 13.12.2013, o certo é que o indeferimento das suas inquirições configuraria sempre, e apenas, uma nulidade processual relativa (sanável) prevista no artigo 120º, nº2, alínea d), do Código de Processo Penal (“…omissão posterior de diligências que pudessem reputar-se essenciais para a descoberta da verdade”…), a arguir “antes que o ato esteja terminado” (artigo 120º, n.º3, al. a)), que servirá de eventual fundamento de recurso (cfr. art. 410º, n.º3 do Código de Processo Penal) (Neste sentido, cfr., entre outros, o acórdão do TRR de 27.04.2009, proferido no Proc. nº 12/03.2TAFAF.G1, relator Cruz Bucho, disponível em www.dgsi.pt/jtrg)
Contudo, compulsados os autos, designadamente as atas da audiência de julgamento, constata-se que embora o próprio assistente e o seu mandatário, estivessem presentes na sessão em que foi proferido o despacho de indeferimento da inquirição das testemunhas em causa (cfr. ata da sessão de 13.12.2013), não arguiram a respetiva nulidade no decurso dessa sessão, nem até ao encerramento da audiência, pelo que a mesma, a existir, considera-se sanada, nos termos do disposto nos artigos 120º, nº. 2 al. d) 2ª parte e nº. 3 al. a) e 123º, 1 do Código de Processo Penal.
Assim e sem necessidade de mais considerações, é manifesta a improcedência deste ponto do recurso.
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D) Impugnação da decisão proferida quanto à matéria de facto não provada.
Sustenta o assistente/recorrente que o Tribunal a quo, ao dar como não provada a factualidade descrita nos pontos nºs 1 a 8, inclusive, dos “Factos Não Provados”, fez incorreta apreciação da prova produzida em audiência, da qual resultou o seu apuramento.
Para tanto, alega que a análise conjunta das suas declarações e dos depoimentos das testemunhas E…, I…, J…, F… e G… (com a menção concreta das respetivas passagens da gravação), impõem decisão diversa.
Assim cumprindo os requisitos de forma estabelecidos para a impugnação da matéria de facto pelo artigo 412º nº 3, als. a), b) e c) e nº 4 do Código de Processo Penal.
Requisitos esses que se fundam na necessidade da delimitação objetiva do recurso da matéria de facto, na medida em que o recurso deste tipo não se destina a um novo julgamento com reapreciação de toda a prova, como se o julgamento efetuado na primeira instância não tivesse existido, sendo antes o recurso da matéria de facto concebido pela lei como remédio jurídico (cfr. Simas Santos e Leal Henriques, “Recursos em Processo Penal”, 7.ª edição, atualizada e aumentada, 2008, pág. 105).
Nestes casos, o Tribunal da Relação não faz um segundo julgamento, não vai à procura de uma nova convicção, antes se limitando a fazer o reexame dos erros de procedimento ou de julgamento que tenham sido referidos no recurso e das provas que imponham, e não só que permitam, decisão diferente. Pois a decisão do recurso sobre a matéria de facto não pode ignorar, antes tendo de respeitar, o princípio da livre apreciação da prova do julgador, expresso no artigo 127º do Código de Processo Penal e a sua relação com a imediação e oralidade, sobretudo quando tem que se debruçar sobre a valoração efetuada na primeira instância das declarações dos arguidos e assistentes e da prova testemunhal, face à ausência de contacto direto com esse prova, o que integra uma das grandes limitações deste tipo de recursos.
Tudo isto implicando que o tribunal de recurso só possa alterar a decisão sobre a matéria de facto em casos de erro na apreciação da prova.
Posto isto, e dentro dos limites que a lei estabelece para a apreciação do recurso da matéria de facto, vejamos pois se o Tribunal a quo errou na apreciação e valoração da prova produzida na audiência e se o resultado do processo probatório devia ser outro.
Da transcrição da motivação, já supra efetuada e para onde agora se remete, logo se alcança que a sentença recorrida expôs de forma suficiente os elementos que conduziram à dúvida insanável sobre a verificação, ou não, da factualidade considerada não apurada, explicando de modo percetível o processo lógico que a tal raciocínio conduziu, o que fez sem erro patente de julgamento.
Efetivamente, e ao contrário do que se pretende fazer crer, o Tribunal a quo pronunciou-se expressamente sobre as declarações do assistente e cada um dos depoimentos de todas as testemunhas indicadas no recurso, não camuflando as suas afirmações confirmativas da factualidade constante da acusação.
Mostrando que ponderou a versão dos factos por elas apresentada em audiência, explicando contudo que ela não lhe mereceu credibilidade, por duas ordens de razões:
● Por um lado, as declarações do assistente e depoimentos dessas testemunhas não se lhe afigurou isento, o que é justificado sempre com recurso a elementos concretos e objetivos, como se alcança das seguintes passagens da motivação:
“A testemunha E…, empregado do assistente, (…) reconheceu (…) que nesse dia também apresentou queixa contra a arguida e que não está “de bem” com ela, revelando falta de isenção no seu depoimento”; “A testemunha I… não assistiu aos factos (…) mostrou também pouca isenção, ao referir que não fala com a arguida e que se acontecesse alguma coisa à fábrica a casa da arguida não ficaria em perigo quando o mesmo reconhece que a mesma fica mesmo do outro lado da rua”; “A testemunha J…, vizinha da arguida, referiu que esta deixou de falar consigo e que não assistiu aos factos. E teve também um depoimento comprometido com a posição do assistente, pois afirmou que a fábrica deve valer € 70 mil a € 75 mil euros, quando não sabe sequer quanto custaria reconstruir a casa onde mora e desconhece o valor das máquinas”; “A testemunha F…, pai da arguida e do assistente (…) revelou igualmente parcialidade no seu depoimento, face ao modo como foi prestado, o que foi reforçado pelo facto de ter afirmado estar “de mal” com a sua filha”; “O assistente C… (…) para além de ser diretamente interessado no desfecho da causa, por ser assistente e demandante, mostrou fragilidades no seu depoimento, que para além de ser pouco pormenorizado, revelou contradições com as demais testemunhas, designadamente quando disse que não anda “tão à vontade”, chega mais tarde e sai mais cedo, o que não foi corroborado pelas testemunhas, que declararam que ele manteve os mesmos horários. Também não conseguiu justificar devidamente os números que adiantou para o valor do imóvel”; A testemunha G…, filho do assistente, reconheceu estar de relações cortadas com a arguida (…)” afirmando ter a arguida proferido algumas expressões “que nem sequer constavam da acusação” e referindo “ainda, que quando o seu pai voltou a sair a arguida lhe disse “dou-te uns tiros, pego fogo a essa merda”, sendo que não foi mencionado pelas demais testemunhas que as expressões tivessem sido proferidas em tempos diferentes”.
Por outro lado, na motivação dá-se ainda conta que as testemunhas K…, N…, L…, M… e P…, não referidas no recurso, prestaram depoimentos que contradizem as declarações do assistente e daquele outro grupo de testemunhas (E…, I…, J…, F… e G…), já que afirmam que no dia e hora indicado por estas últimas como sendo aquele em que a arguida esteve com o assistente e o ameaçou, esta encontrava-se em local diverso, na companhia de outras pessoas e não com o assistente.
Face à incompatibilidade de tais versões, à falta de isenção das declarações do assistente e depoimentos das testemunhas indicadas pela acusação, num contexto de intensa animosidade e aceso conflito entre arguida e assistente, que são irmãos, o qual se estende a outros familiares, designadamente ao pai de ambos (testemunha F…), que está de relações cortadas com a filha, e na ausência de quaisquer elementos que viessem, pelo menos reforçar, uma ou outra das versões dos factos apresentadas, o Tribunal a quo conclui que “não foram produzidos meios probatórios bastantes que sustentassem com a certeza exigível os factos imputados à arguida”.
Ou seja, o Tribunal a quo, que teve a imediação da prova, após exaustiva análise da mesma, não descortinou elementos que lhe possibilitassem dar mais credibilidade às declarações do assistente e testemunhas E…, I…, J…, F…, C… e G…, do que aos depoimentos opostos das testemunhas de defesa, motivo pelo qual ficou sem possibilidade de optar entre eles. Tudo isso explicando de modo absolutamente plausível e segundo as regras da experiência comum. Assim justificando a dúvida reputada como razoável e insuperável relativa à verificação da factualidade dada como não provada, que, em obediência ao princípio in dubio pro reo, levou a que se atribuísse à arguida o benefício da dúvida, dando toda essa matéria por inverificada.
Como ensina Figueiredo Dias (Direito Processual Penal. vol. I. ed.1974. pág. 204) a decisão sobre a matéria de facto, para além da atividade racional que envolve, tem também sempre de conter uma convicção pessoal, na qual estão presentes elementos racionalmente não explicáveis e mesmo puramente emocionais, designadamente no que respeita à credibilidade dos depoimentos.
Note-se, aliás, que o legislador, consciente das limitações que o recurso da matéria de facto necessariamente tem envolver, teve o cuidado de dizer que as provas a atender pelo Tribunal ad quem são aquelas que “impõem”e não as que “permitiriam” decisão diversa (cfr. artigo 412º, nº 3, al. b) do Código de Processo Penal).
E, in casu, é indubitável que a argumentação e prova indicadas pelo recorrente não impõem decisão diversa da proferida, nos termos da al. b) do nº 3 do artigo 412º do Código de Processo Penal, apenas sendo exemplificativas de outra interpretação da prova, que, à partida, se mostra até menos credível, por provir de uma parte interessada no desfecho da causa e não do órgão jurisdicional constitucionalmente investido da função de julgar.
A decisão do Tribunal a quo é pois inatacável neste ponto, porque proferida de acordo com a sua livre convicção, nos termos do artigo 127º do Código de Processo Penal e em absoluto respeito dos dispositivos legais aplicáveis, designadamente também pelo princípio do in dubio pro reo, que surgindo como resposta ao problema da incerteza em processo penal, impõe a absolvição sempre que a prova não permite resolver a dúvida acerca da culpabilidade ou dos concretos contornos da atuação do acusado.
Nenhuma censura merecendo assim a sentença recorrida.
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III. Decisão
Pelo exposto, acordam as juízas desta secção do Tribunal da Relação do Porto, em negar provimento ao recurso
Custas pelo recorrente, fixando-se em 5 (cinco) UCs a taxa de justiça, sem prejuízo da proteção judiciária que lhe seja concedida.
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Porto, 24 de setembro de 2014
(Elaborado e revisto pela relatora (artigo 94º, nº2, do Código de Processo Penal)
Fátima Furtado
Elsa Paixão