Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2200/22.3T8MTS-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: PRAZO PARA CONTESTAR
PRORROGAÇÃO POR ACORDO DAS PARTES
CONTAGEM
Nº do Documento: RP202304172200/22.3T8MTS-A.P1
Data do Acordão: 04/17/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O art. 141º, nº 2, do CPC aplica-se aos prazos perentórios, marcados por lei, incluindo também ao prazo para contestar, quando haja acordo das partes relativamente à sua prorrogação, contando-se a prorrogação desde termo final do prazo normal para a contestação.
II - O art. 569º, nºs 5 e 6, do CPC aplica-se à prorrogação do prazo para contestar quando não haja acordo das partes quanto a essa prorrogação, não suspendendo, o pedido de prorrogação, o prazo para contestar que esteja em curso.
III - A previsão da prolação do despacho sobre o requerimento de prorrogação do prazo a que se reporta o nº 6 do arto. 595º em 24 horas e da notificação expedita do mesmo visam proteger o contestante perante a situação em que a prorrogação seja indeferida, pois que é nesta que a contestação teria que ser apresentada dentro do prazo inicial, sem prorrogação, mas não já proteger o contestante que apresenta a contestação para além do póprio prazo da prorrogação.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 2200/22.3T8MTS-A.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1325)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório[1]

O A., AA, instaurou ação declarativa de condenação, com processo comum, contra A..., S.A., tendo formulado o seguinte pedido:
a) Deve a Ré ser condenada a pagar ao Autor, a quantia global Eur. 54.107,62, sendo Eur. 37.649,79, de capital, e relativo a diuturnidades devidas e não pagas ao Autor e discriminadas no artigo 15º, da petição inicial, e Eur. 16.457,83 de juros de mora vencidos.
b) Deve a Ré ser condenada a pagar ao Autor os juros vincendos, calculados desde esta data e até integral e efetivo pagamento, bem como nas custas, procuradoria e demais encargos legais.

Citada a Ré e realizada, aos 30.05.2022, a audiência de partes, à qual estiveram presentes as partes, designadamente a Ré, e frustrada a tentava de conciliação, foi esta notificada para contestar, tudo conforme consta da respetiva ata, na qual se refere o seguinte:
“DESPACHO
Notifique a ré para contestar a presente ação, no prazo de 10 dias, nos termos do disposto no artº 56, al. a) do C.P.T., com a advertência do artº 57º do mesmo código.
Para realização de Audiência de Julgamento, designo o dia 07/11/2022, pelas 09:30 horas (com a concordância das ilustres mandatárias das partes).
Notifique, advertindo para os termos do art.º 71.º do C.P.T..
***
Do antecedente despacho foram os presentes notificados que disseram ficar bem cientes, nomeadamente a ré, de que tem o prazo de 10 dias para contestar, sob pena de, não o fazendo, serem considerados confessados os factos alegados pelo autor.
Mais ficaram expressamente advertidos nos termos do disposto no 71º do C. P. T. e de que esta data fica já notificada às partes sem necessidade de comunicação ulterior por carta ou por qualquer outro meio de comunicação, nos termos do artº 254º do C.P.C. para todos os efeitos legais.”

Por requerimento de 08.06.2022, entrado às 17h37, veio a Ré requerer que seja admitida “a PRORROGAÇÃO DO PRAZO DE CONTESTAÇÃO por DEZ (10) dias, na medida em que ambas as partes acreditam veementemente que subsiste a possibilidade de obtenção de um acordo que coloque termo aos presentes autos, tornando-se, contudo, necessário a requerida suspensão do prazo de contestação concedido à Ré A..., S.A. pelo prazo sugerido, com vista a permitir o desenvolvimento do processualismo de conciliação”, requerimento ao qual o A. apresentou, nessa mesma data, às 18:46, adesão ao mesmo.

Aos 13.06.2022 foi proferido o seguinte despacho:
“Perante o requerido pelas partes, e ao abrigo do disposto no art. 141º, n.º 2, do Código de Processo Civil, prorrogo por 10 dias o prazo para apresentação da contestação.
Notifique”, despacho este notificado às partes, via citius, com data de elaboração de 14.06.2022.

Aos 28.06.2022, a Ré apresentou contestação.

Aberta, aos 04.07.2022, conclusão (tendo a Secção de Processos informado que a contestação se afigura extemporânea), foi, aos 20.07.2022, proferido despacho a determinar ao A. o aperfeiçoamento da p.i., ao que o A. deu cumprimento por requerimento de 03.08.2022.

Aos 29.09.2022 foi pela Mmª Juiz proferido despacho no qual, para além do mais, se refere que “Melhor analisados os autos, afigura-se que assiste razão à Ex.ª Sra. Escrivã-Adjunta (conforme informação que havia já sido dada nos autos mas que, por lapso, não se atentou)” e no qual, pelas razões que dele constam, se julgou extemporânea a contestação apresentada pela Ré e se determinou o seu desentranhamento e devolução, despacho este notificado às partes, via citius, com data de certificação de 03.10.2022.

Aos 17.10.2022, a Ré veio arguir a nulidade do referido despacho, bem como recorrer do mesmo, tendo, no que toca ao recurso, formulado as seguintes conclusões:
“1ª – Conforme melhor resulta da motivação de recurso, para a qual se remete, entende a Apelante que o despacho em que o Tribunal a quo se pronunciou quanto à prorrogação do prazo para contestar, peticionada pelas partes, está ferido de nulidade, sendo nulos todos os actos subsequentes, por o mesmo ter sido proferido em inobservância das formalidades legais previstas no n.º 6 do artigo 569º do C.P.C., aplicável subsidiariamente ao processo do trabalho.
2ª – No despacho proferido e sob pronuncia, o Tribunal a quo em arrepio de disposição legal expressa que confere ao Juiz o prazo de 24horas para se pronunciar quando ao pedido de prorrogação do prazo para contestar (cfr. n.º 6 do artigo 569º do Código Processo Civil, aplicável subsidiariamente ao Processo do Trabalho), veio a pronunciar-se volvidos 9 dias (considerando a data em que as partes se devem considerar notificadas), pelo que, o mesmo está ferido de nulidade, incluindo os actos processuais que se lhe seguiram.
3.ª – A questão essencial e exclusiva cuja apreciação se pretende com a interposição do presente recurso consiste em saber se o aludido despacho que admitiu a prorrogação do prazo para contestar padece de nulidade, por inobservância do prazo de 24 horas fixado por lei ao Juiz, e quais as consequências para a normal tramitação do processo, em consequência desta nulidade.
4ª – O Tribunal a quo ignorou a inobservância da identificada formalidade, nem declarou a
extemporaneidade da contestação, pelo contrário, através de despacho datado de 20/07/2022, em violação do princípio da confiança, considerando as questões suscitadas pela Ré na contestação – designadamente, a falta de alegação de factos por parte do Autor, susceptíveis de sustentar a reclamação de diuturnidades, por inexistência de dupla filiação exigível por lei – proferiu despacho a convidar o Autor a aperfeiçoar a petição inicial no sentido apontado na contestação. A Autora em cumprimento desse mesmo despacho apresentou requerimento aperfeiçoando o respectivo articulado. Apenas em momento ulterior vem pronunciar-se pela extemporaneidade da contestação.
5ª – Por determinação legal, a que as partes são absolutamente alheias, o pedido das partes em relação à prorrogação do prazo para contestar deverá ser decidido pelo Tribunal, porém, no prazo legalmente fixado de 24 horas, todavia, no caso concreto, o Tribunal se pronunciou-se (em violação deste prazo) apenas volvidos 8 dias. Pelo que, verifica-se a omissão de um prazo determinado na lei, que como tal é susceptível de integrar uma nulidade inominada prevista no artigo 195º do CPC, omissão que torna o despacho proferido nulo, cuja declaração de nulidade e inerentes consequências se pretende.
6ª – As nulidades de processo, importando a anulação do processado, são desvios do formalismo processual: prática de um acto proibido, omissão de um acto prescrito na lei e a realização de um acto imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido.
7ª – O vício de que padece a decisão recorrida constitui seguramente uma nulidade processual, uma vez que se traduziu na omissão de um acto determinado na lei (proferir decisão no prazo de 24 horas – cfr. n.º 6 do artigo 569º do C.P.C.), e como tal integra as nulidades inominadas previstas no artigo 195º do CPC, impondo a anulação dos termos subsequentes que dele dependam absolutamente (cfr. artigo 195º do C.P.C.), incluindo o despacho de 20/07/2022 que ordenou o aperfeiçoamento da petição inicial e o requerimento em que o Autor lhe deu cumprimento e aperfeiçoou o respectivo articulado.
8ª – E trata-se de uma nulidade que influi de forma grave e irreversível o normal decurso do processo, na medida em que determina a antecipação da causa, passando logo para a prolação de sentença condenatória, aliás o mesmo despacho já influenciou negativamente o processo, ao condicionar a apresentação da contestação, uma vez que com base no despacho sob pronuncia, (proferido excedendo em 8 dias o prazo legalmente fixado de 24 horas), a Apelante apresentou a sua contestação em respeito pelos 8 dias que, sem culpa sua, decorreram, o que culminou com a decisão de extemporaneidade que já lhe foi notificada.
9ª – Dispõe o n.º 1 do artigo 199º do C.P.C., quanto ao prazo de arguição das nulidades, que este prazo conta-se do dia em que, depois de cometida a nulidade, a parte interveio em algum acto praticado no processo ou foi notificada para qualquer termo dele, mas neste último caso só quando deva presumir-se que então tomou conhecimento da nulidade ou quando dela pudesse conhecer, agindo com a devida diligência.
10ª – A Apelante apenas tomou consciência da verificação da nulidade sob pronuncia quando foi notificada do despacho que concluiu pela extemporaneidade da contestação, uma vez que após a apresentação do pedido de prorrogação não existiu qualquer exame do processo, nem estudo do mesmo, limitando-se a Ré, aqui Apelante a elaborar a contestação, cujo estudo se cinge á factualidade e às questões suscitadas na PI.
Pelo que, não poderá considerar-se que a nulidade que através deste recurso se pretende arguir se encontra sanada com a apresentação da contestação.
11ª – Na primeira parte do n.º 1 do artigo 199º do C.P.C. quando o legislador se refere “à intervenção da parte em acto praticado no processo”, não é legítimo exigir à Apelante que arguisse a nulidade com a apresentação da contestação, quando nesta fase não há lugar a uma análise do processo, mas tão só da factualidade alegada na PI – refere-se que a lei não atende a qualquer circunstância da qual possa resultar que esse conhecimento não deverá ter tido lugar, antes pressupõe a existência de exame do processo e a verificação de que alguma nulidade foi cometida, no caso concreto não existe qualquer evidencia de que a parte poderia ter tomado conhecimento da nulidade, com o mero recebimento do despacho sob pronuncia.
12ª – Aliás, em abono desta interpretação existe o facto de a parte contrária não ter arguido a extemporaneidade na apresentação da contestação por parte da Ré – como o poderia ter feito – o mesmo se diga em relação ao despacho proferido pelo Tribunal a quo em 20/07/2022, onde também não foi suscitada a extemporaneidade, pelo contrário, o Tribunal a quo notificou a Autora para aperfeiçoar o respectivo articulado e determinou o exercício do contraditório, em relação à contestação apresentada, sem se pronunciar em relação á apresentação da contestação.
13ª – Sendo pois de considerar que a Apelante só toma conhecimento da nulidade quando é notificada do despacho que conclui pela sua extemporaneidade, em respeito pelo que dispõe a segunda parte da citada disposição legal (n.º 1 do artigo 199º do C.P.C.), de onde se extrai que a arguição da nulidade deverá ocorrer na sequência de notificação para qualquer termo do processo, em que há que atender ás circunstâncias concretas, máxime à existência duma relação de precedência entre os dois atos, para ajuizar se é razoável presumir que o conhecimento teve lugar ou se a ele levaria uma atuação normalmente diligente. (in José Lebre de Freitas, Código Processo Civil anotado, Vol. I, 4º edição, pág. 409-410)
14ª – Deverá este Venerando Tribunal declarar a nulidade do despacho proferido pelo Tribunal a quo, que, em violação da formalidade legalmente prevista, que lhe impõe o prazo de 24 horas para se pronunciar quanto ao peticionado pedido de prorrogação do prazo para apresentar a contestação, excedeu este prazo em 8 dias, e, em violação do princípio da confiança, veio a considerar extemporânea a contestação oferecida no prazo concedido pelo despacho sob pronuncia e cuja nulidade se requer.
15ª – Resulta do artigo 2° n° 1 do C.P.C. e é apanágio de todo o direito processual moderno, que o processo se destina à obtenção de decisão acerca do mérito da causa, em respeito pelo princípio da descoberta da verdade material, devendo evitar-se que a lide acabe por se resolver com fundamento em questões puramente processuais.
16ª – A ilegalidade do despacho sob pronuncia condicionou negativamente o desempenho processual da Apelante, que, induzida em erro, convencendo-se da necessidade de aguardar pela decisão do Tribunal, excedeu em igual prazo de 8 dias a apresentação da respectiva contestação, porque se convenceu da obrigatoriedade de verificação judicial do pedido de prorrogação de prazo e de que o início do novo prazo estava dependente de prévio despacho judicial nesse sentido.
17ª – O pedido de prorrogação do prazo depende de decisão judicial nesse sentido, atribuindo ao Juiz uma intervenção activa no desenrolar do processo, em que é chamado a decidir, em que as partes aguardam a decisão do Juiz a confirmar a prorrogação e é esta que define o termos processuais a seguir.
18ª – Tendo as partes apresentado requerimento a pedir prorrogação do prazo, é natural aguardarem que o Tribunal se pronuncie, sendo esta a regra do nosso sistema processual, as mesmas têm o direito de confiar que em relação ao por si peticionado será proferida decisão em tempo útil e que a mesma estabelece o caminho processual a seguir – no caso concreto o Tribunal a quo omitiu a obrigação legal de decidir em 24 horas e com a ilegalidade cometida condicionou a apresentação da contestação.
19ª – A Lei Fundamental estabelece que: “todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo”, e ainda, que a lei assegura procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade de modo a obter tutela efectiva em tempo útil. (cfr. n.º 4 e 5 do artigo 20º da Constituição da República Portuguesa), confiança que no caso concreto saiu frustrada pela omissão do Tribunal a quo, mesmo se é legitimo às partes confiarem que o Tribunal não actua em violação da lei, nem lhes acarreta consequências negativas – não foi o que sucedeu no caso concreto.
20ª – Impõe-se a paralisação da consequência que poderá advir a falta de apresentação tempestiva da contestação, que só ocorreu em consequência do despacho que deferiu a prorrogação do prazo para contestar, em violação do prazo legal de 24 horas, o que o torna ilegal/nulo, devendo declarar-se a nulidade do despacho sob pronuncia e dos demais actos praticados no processo – incluindo o despacho que convidou ao aperfeiçoamento da PI e o requerimento que se lhe seguiu – consequentemente, em respeito pelo princípio constitucional da confiança e da adequação formal, deverá considerar-se tempestiva a apresentação da contestação, ou, em alternativa, deverá determinar-se que o Tribunal a quo na decisão de direito a proferir se pronuncie sobre todas as questões suscitadas pela Apelante na sua contestação
21ª – O Douto despacho recorrido violou o disposto nos nº 4 e 5 do artigos 20º da Constituição da República Portuguesa, e n.º 6 do artigo 569º, artigo 195º e 199º e artigo 547º, todos do C.P.C.
Pelo exposto REQUER-SE A V. EXª se digne considerar procedente a presente Apelação e consequentemente, declarar nulo o despacho datado de 14/06/2022, notificado ás partes no dia 17/06/2022 que determinou a prorrogação do prazo para contestar, fazendo-o em violação do prazo legal de 24 horas a que legalmente estava obrigado, como dispõe o n.º 6 do artigo 569º do C.P.C., determinando, consequentemente, que estão feridos de nulidade os despachos seguintes, incluindo o requerimento apresentado pela Autora a aperfeiçoar a respectiva petição inicial, proferido com preterição dos formalismos exigidos pela já citada disposição legal, aproveitando-se a contestação, julgando a sua apresentação tempestiva.
A entender-se que a declaração de nulidade não afecta a tempestividade da contestação, que sempre será de considerar extemporânea, em respeito pelo princípio constitucional da confiança e princípio da adequação formal, deverá determinar-se que a contestação não será desentranhada e a decisão de direito a proferir se pronuncie sobre todas as questões suscitadas na mesma, sob pena de a ilegalidade cometida pelo Tribunal a quo não ter qualquer consequência, mesmo se condicionou negativamente o curso do processo – basta atentar que caso tivesse sido respeitado o prazo de 24 horas imposto ao Tribunal, nunca a contestação teria sido apresentada fora de prazo.
(…)”

O A. respondeu à arguição de nulidade do despacho de 29.09.2022 referindo, para além do mais, que a Ré devia ter optado por um único meio: ou reclamação ou recurso e pugnando pelo indeferimento da reclamação.

Aos 14.11.2022 a Mmª Juiz proferiu despacho sobre a arguição de nulidade do despacho de 29.09.2022, tendo-a decidido nos seguintes termos: “Assim, e com fundamento em todo o exposto, indefiro a requerida declaração de nulidade do despacho que deferiu a prorrogação do prazo para contestar.
Custas do incidente a cargo da ré, fixando em 1 UC a taxa de justiça devida.”,
Bem como proferiu despacho a admitir o recurso ora em apreço, com subida em separado.

Consigna-se ainda que aos 03.01.2022 foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pelo A. e condenou a Ré a pagar-lhe a quantia global de €33.653,81, acrescida de juros de mora à taxa de 4% contados desde o vencimento de cada uma das prestações e até efetivo pagamento, tendo ainda fixado à ação o valor de €54.107,62, sentença essa da qual foi interposto recurso pela Ré, admitido por despacho da 1ª instância de 13.03.2023.

Subidos os autos a esta Relação, o Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer:
“(…)
2. Nos presentes autos, nos termos do disposto no art.º 141º, n.º 2 do CPC, Autor e Ré, subscreveram um requerimento dirigido ao juiz do processo solicitando a prorrogação do prazo para contestar, uma vez que estavam em curso negociações com vista a chegar a acordo, o que teve lugar no dia anterior àquele em que terminava o prazo para contestar.
A Ré/recorrente, aguardou a notificação da decisão deste requerimento, e só depois contou o prazo de prorrogação que somou ao prazo inicial.
Em consequência quando a contestação foi apresentada tinha já sido ultrapassado o prazo para contestar, sendo extemporânea, e, como tal foi considerada por decisão judicial que determinou o seu desentranhamento.
3. Vem agora a Ré/recorrente alegar que a decisão judicial deveria ter sido proferida em 24 horas, como obriga o art.º 569º, n.º 6, do CPC, aqui aplicável, o que não aconteceu, e, por isso, é que a contestação foi apresentada fora de prazo.
Salvo melhor opinião não assiste razão à recorrente. Com efeito o requerimento a solicitar a prorrogação do prazo foi assinado pela Ré e Autor, nos termos do art.º 141º, n.º 2, do CPC, ou seja, havendo acordo das partes, o prazo é prorrogável por uma vez e por igual período.
De qualquer forma, salvo melhor opinião, em qualquer hipótese teria a contestação sido apresentada fora de prazo.
Na verdade, o prazo para a presentação da contestação não se suspende, pelo facto de ter sido requerida a sua prorrogação – art.º 569º, n.º 6 do CPC.
E, havendo acordo das partes, o prazo é prorrogável por uma vez e por igual período – 141º, n.º 2, do CPC.
Tinha, assim, a Recorrente de, duplicando o prazo inicial encontrar o termo do prazo para apresentar a contestação, e dar entrada desta peça processual nesse prazo (mesmo que sem ter conhecimento da decisão do requerido), pois sabia que nunca o prazo podia ir além desta prorrogação de igual período de tempo, e o prazo não se suspendia, mesmo a aguardar decisão da requerida prorrogação.
Ao apresenta-la ultrapassado este prazo, sabia que esta era extemporânea.
E não podia ser outra a decisão judicial, a não ser a de a considerar extemporânea e determinar o seu desentranhamento, como foi.
Entende-se, assim, que, ressalvando sempre diferente e melhor opinião, não podia ser outra a decisão, que deve, por isso, ser confirmada, de ordenar o desentranhamento da contestação, por extemporaneidade.
*
4. Termos em que, se emite parecer no sentido de ser negado provimento ao recurso, confirmando-se a douta decisão recorrida.”
As partes, notificadas, não responderam ao mencionado parecer.

Colheram-se os vistos legais.
***
II. Objeto do recurso

O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo porém as matérias que sejam de conhecimento oficioso, (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10, alterado, designadamente, pela Lei 107/2019).
Assim, consiste a questão suscitada pela Recorrente em saber se é nulo o despacho proferido pela 1ª instância aos 29.09.2022 que julgou extemporânea a contestação e se este deverá ser admitida.
***
III. Fundamentação de facto

Tem-se como assente o que consta do relatório precedente.
***
IV. Fundamentação de Direito

1. Como referido e tal como a Recorrente a enquadrou, a questão suscitada pela mesma consiste em saber se é nulo o despacho proferido pela 1ª instância aos 29.09.2022 que julgou extemporânea a contestação, devendo esta ser admitida, importando, previamente, referir o seguinte:
De harmonia com o art. 195º do CPC que “1 - Fora dos casos previstos nos artigos anteriores, a prática de um ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou de uma formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa. (…)”.
Como é sabido, as nulidades processuais não se confundem com erro de julgamento. Enquanto que aquelas derivam de actos ou omissões que foram praticados, ou que deveriam ter sido praticados e não foram, antes da prolação da sentença e, constituindo anomalia do processado e/ou desvios ao formalismo processual, devem ser conhecidas no Tribunal onde ocorreram, o erro de julgamento inquina a própria decisão sobre o mérito, tendo ela julgado num sentido quando, perante a factualidade provada e o Direito aplicável, o deveria ter sido de modo diferente, o que é impugnável por meio de recurso para o tribunal ad quem. Tal corresponde ao brocado de que das nulidades processuais reclama-se, dos erros de julgamento recorre-se. Não obstante, é também de referir que, quando a nulidade processual esteja coberta por decisão judicial, a forma de impugnação será já através de recurso e não de reclaamação.
Ou seja, a parte, ou considera que ocorreu nulidade procesual ou erro de julgamento. Se considera que foi cometida nulidade processual, deve dela reclamar perante o Tribunal que a cometeu e, só depois da decisão que venha a ser proferida, desta recorrer. Se considera que o que existiu foi erro de julgamento, ou nulidade processual coberta por despacho, deve então deste recorrer.
No caso, e como salienta o Recorrido, a Ré/Recorrente, perante a decisão que considerou ser a contestação extemporânea, ou arguia a nulidade processual, se considerava ser este o vício da decisão, ou dela recorria, e não já, como o fez, lançar mão simultaneamente dos dois mencionados meios de impugnação.
Considerando, todavia, que nem sempre é patente a distinção entre nulidade processual e erro de julgamento, que o meio de impugnação da nulidade processual coberta por despacho é através do recurso, que a Ré, à cautela, impugnou a decisão pelas duas vias, dela recorrendo, ainda que “por antecipação”, e que se poderá considerar que o vício em causa, assacado à decisão recorrida, consiste em saber se esta errou ao decidir como decidiu (se a contagem do prazo para a apresentação da contestação deve iniciar-se apenas com a notificação da sua prorrogação ainda que porque não tenha sido, essa prorrogação, decidida no prazo de 24 horas), ou seja, incorrendo em erro de julgamento, dizíamos, considerando o referido, entendemos ser de conhecer do recurso.

2. A questão essencial, e em retas contas, consiste em saber se a apresentação da contestação não é extemporânea e se deve ser admitida.
A sustentar a sua pretensão argumenta a Recorrente em síntese que: nos termos do art. 569º, nº 6, do CPC, a Mmª Juiz deveria ter proferido a decisão de proprrogação do prazo para contestar no prazo de 24h, o que não ocorreu, só tendo a Recorrente sido notificada de tal decisão após 8 dias, estando convicta de que o início do período da prorrogação (ou, nas suas palvaras, do “novo prazo”) estava dependente de despacho judicial nesse sentido; porque o despacho de deferimento da prorrogação do prazo foi proferido após 24horas, não observando, assim, o previsto no citado art. 569º, nº 6, foi cometida nulidade processual, devendo a contestação ser admitida; anteriormente ao despacho de 29.09.2022 (que considerou extemporânea a contestação) a Mmª juiz formulou ao A. convite ao aperfeiçoamento da p.i, ao qual o mesmo respondeu, pelo que se ela própria não atendeu a que o prazo para a contestação já havia expirado, natural é que a Ré também tivesse considerado que o mesmo apenas se iniciaria após a notificação da sua prorrogação; a decisão recorrida viola os princípios da confiança, da adequação formal, da descoberta da verdade material e o art. 20º, nºs 4 e 5 da CRP.

3. Os prazos processuais podem ser dilatórios ou perentórios, diferindo, os primeiros, para certo momento a possibilidade de realização de um ato ou o início da contagem de um outro prazo e, os segundos, extinguindo o direito de praticar o ato (art. 139º, nºs 1, 2 e 3, do CPC).
O prazo processual, mormente o prazo para contestar, é contínuo, apenas se suspendendo nas férias judiciais (art. 138º, nº1, co CPC) e, quando termine em dia em que os tribunais estejam encerrados, transfere-se para o 1º dia útil seguinte (nº 2 do mesmo), sendo a sua contagem independente de qualquer formalidade, o que vale por dizer que não é necessário um despacho do juiz para que se inicie ou para que termine a contagem do prazo, sendo, antes, essa contagem realizada de forma automática – cfr. Marco Carvalho Gonçalves, Prazos Processuais, 3ª Edição, Almedina, pág. 155.
Nos termos do art. 141º do CPC “1. O prazo processual marcado por lei é prorrogável nos casos nela previstos. 2. Havendo acordo das partes, o prazo é prorrogável por uma vez e por igual período.”
O art. 141º, nº 2, aplica-se aos prazos perentórios, marcados por lei, incluindo também ao prazo para contestar, quando haja acordo das partes relativamente à sua prorrogação, caso em que o prazo é prorrogado, por uma única vez, e por igual período.
Neste caso, cabe ao juiz, tão só, verificar se se encontram preenchidos os pressupostos previstos na citada norma, ou seja se existe acordo das partes, se foi requerido em tempo, se foi essa a única renovação e se a mesma não foi requerida por prazo superior ao prazo que está em curso, sendo que, verificados tais pressupostos, não cabe ao juiz apreciar da bondade ou não dos motivos que justifiquem a prorrogação (que até poderão não ser invocados, bastando a existência de acordo das partes quanto à prorrogação). Ou seja, verificados tais pressupostos, está o juiz vinculado a um juízo de admissibilidade da proprrogação.
É de referir que a prorrogação do prazo não consubstancia um “novo” prazo, independente do prazo prorrogado e cuja contagem se iniciaria, ex novo, a partir da notificação do despacho de prorrogação. A prorrogação é isso mesmo, uma prorrogação, ou seja, o acréscimo de um período de tempo a um prazo já existente que se encontra em curso e que em curso continua. Como se diz no Acórdão do TRE de 24.06.2014, Proc. 201/07.0GALGS.E1[2], “prorrogar significa prolongar (o tempo) para além do prazo estabelecido, pressupondo que o prazo ainda não esteja findo, pois de outro modo, não haveria lugar à sua prorrogação, mas sim a um novo prazo ou prazo sucessivo, que, assim, se iniciaria depois de esgotado o anterior e independentemente da existência de intervalos temporais entre ambos” e, no Acórdão do TRG de 20.03.2014, Proc. 310/13.7CGMR-A.G1[3] que, sendo deferido o pedido de prorrogação do prazo, “o prazo objeto de prorrogação conta-se desde o termo final do prazo normal para a contestação”.
Como se diz na ob. citada, pág. 219, a apresentação do pedido de prorrogação do prazo “não tem a virtualidade de suspender ou de interromper a contagem do prazo que se encontre em curso. Significa isto que o pedido de prorrogação do prazo deve ser apresentado antes que termine o prazo que se pretende prorrogar.
Por conseguinte, se o tribunal deferir o pedido de prorrogação do prazo, é irrelevante, para efeitos de contagem do prazo, a data da notificação do despacho que defira tal pedido, apenas se verificando um prolongamento do prazo para a parte praticar o ato em falta. Vale isto por dizer que, sendo deferido o pedido de prorrogação voluntária do prazo, “o prazo primitivo e o prazo adicionado (…) devem contar-se a partir do primitivo prazo e por forma contínua”[4], ou seja, o novo período de prazo começa a correr desde o termo do prazo objeto da prorrogação e não desde a dedução do pedido ou da notificação do despacho judicial que tenha deferido esse pedido. Assinala-se, portanto, que o prazo “primitivo” e o prazo “adicional” somam-se entre si e contam-se como um só, como se tratando de um único prazo”.
Assim também o Acórdão do STJ de 28.11.2017, Proc. 1050/09.7TBBGC.G1.S1[5], de cujo sumário consta que “A prorrogação do prazo inicial por acordo das partes – art. 141º, nº 2, do CPC – deve ser comunicada ao tribunal no seu decurso e inicia-se desde o termo daquele prazo inicial, e não do despacho que a considera verificada. (…). Prorrogado o prazo legal para a interposição do recurso de apelação, fica a haver um único prazo com a duração do tempo do prazo legal acrescido do tempo da prorrogação” e, no Acórdão do TRP de 08.02.2010, Proc. 3361/08.0TJVNF.P1 “quando as partes requerem que seja dado uso ao nº 2 do art. 147º do CPC, não devem esperar que o juiz defira ou não o seu requerimento para, a partir daí, esperarem a notificação desse despacho e prolongarem assim o prazo para contestar, antes devem contar, dado que o requerimento tem de ser apresentado antes do fim do primeiro prazo, um prazo por igual período à quele que beneficiava”.

Por sua vez, dispõe o art. 569º, nºs 5 e 6, do CPC que “5 - Quando o juiz considere que ocorre motivo ponderoso que impeça ou dificulte anormalmente ao réu ou ao seu mandatário judicial a organização da defesa, pode, a requerimento deste e sem prévia audição da parte contrária, prorrogar o prazo da contestação, até ao limite máximo de 30 dias. 6 - A apresentação do requerimento de prorrogação não suspende o prazo em curso; o juiz decide, sem possibilidade de recurso, no prazo de vinte e quatro horas e a secretaria notifica imediatamente ao requerente o despacho proferido, nos termos da segunda parte do n.º 5 e do n.º 6 do artigo 172.º.”
O art. 569º, nºs 5 e 6, aplica-se apenas ao prazo para a contestação, a requerimento do contestante e nos casos em que não haja acordo das partes quanto a essa prorrogação (havendo acordo rege o art. 141º, nº 2), cabendo ao juiz, feita a ponderação da existência (ou não) de motivo que o justifique (nos termos previstos no nº 5), a decisão da sua concessão, decisão essa que cabe nos poderes discricionários, e não vinculados, do juiz [“Quando o juiz considere (...), pode (...), prorrogar o prazo (...)”], que deve ser tomada no prazo de 24 horas e a parte notificada pela secrataria nos termos do art. 172º, nº 5, 2ª parte, e 6, ou seja, de forma expedita [por relegrama, comunicação telefónica ou outro meio análogo de telecomunicações, devendo a comunicação telefónica ser documentada nos autos e seguida de conformação por qualquer meio escrito].
E a apresentação do requerimento de prorogação do prazo não suspende o prazo para contestar que esteja em curso, como expressamente refere a 1ª parte do art. 569º, nº 6 [segmento este que, diga-se, pese embora conste também da norma invocada pela Recorrente, esta a ele não alude].
Em comentário ao citado art. 141º referem José Lebre de Freitas e Isabel Alexandre, Código de Processo Civil Anotado, Volume 1º. 4ª Edição, Almedina, pág.302, que “(...): o prazo processual (...) fixado por lei passou, de acordo com o nº 2, a ser prorrogável por acordo das partes, sem prejuízo de, na falta de acordo, só poder sê-lo quando a lei o preveja (como já antes acontecia no caso dos arts. 176-3 e 942-2, e passou a acontecer, inovadoramente, no caso dos articulados: arts. 569, nºs 4 e 5, e 586º).
E, em anotação 9 ao art. 569º, referem os mencionados autores, ob. citada, mas Volume 2, pág. 533, que “9. Além da prorrogação nos termos dos nºs 4 e 5, as partes podem, nos termos gerais do art. 141 – 2, prorrogar por acordo o prazo da contestação, (...)”, mais dizendo, na anotação 8, também a pág. 553, que:
8. A não suspensão do prazo em curso com a apresentação do requerimento de prorrogação compreende-se: se assim não fosse, bastaria ao réu requerer a prorrogação no último dia do prazo para que o indeferimento do pedido não pudesse já evitar um resultado, equivalente á prorrogação, pelo tempo que decorresse entre o pedido e a decisão.
Questão divera é a de saber se, quando o juiz exceda o prazo de 24 horas que lhe é conferido para a decisão ou a secretaria não notifique imediatamente o requerente, por meio de comunicação rápida, da decisão de indeferimento, o réu não poderá arguir nulidade processual, nos termos do art. 195, e, com base nela, apresentar a contestação em prazo ao qual se adicione os dias a mais que, sem culpa sua, tiverem decorrido. Ainda que assim se deva entender, é mais prudente que o réu apresente a contestação que lhe for possível dentro do prazo inicial, sob reserva de a substituir ou aditar no caso de ser concedida a prorrogação requerida”, salientando-se que o enquadramento processual é referido, pelos mencionados autores, a propósito do indeferimento do pedido de prorrogação, não do seu deferimento, o que não é despicidendo pois que, na melhor das hipóteses para o contestante, ponderando a possibilidade de deferimento da prorrogação do prazo e dado que o requerimento para tal não suspende o prazo para a prática do ato, prazo que é contínuo (o que contestante deverá ter em conta), deverá o mesmo contar o prazo (com a prorrogação solicitada) dessa forma e não já contando a prorrogação a partir, apenas, da data da notificação da decisão que a defira. A previsão da prolação do despacho em 24 horas e da notificação expedita do mesmo visam proteger o contestante perante a situação em que a prorrogação seja indeferida, pois que, é nesta que a contestação teria que ser apresentada dentro do prazo inicial, sem prorrogação.
Diz Marco Carvalho Gonçalves, ob. cit., pág. 215 que “(...) O requerimento de prorrogação do prazo deve ser apresentada com uma antecedêndia superior a vinte e quatro horas em relação ao rermo do prazo, não podendo, em qualquer caso, ser apresentado quando já esteja em curso o prazo de 3 dias úteis de multa a que alude o art. 139º, nº 5”, citando, a este propósito, os Acórdãos do TRP de 2105.2001, Proc. 0051217, do TRL de 19.10.2006, Proc. 6681/2006-2 e do TRE de 26.05.2011, Proc. 2574/09.1TBLLE.E1.

4. Revertendo ao caso em apreço:
A Ré, na audiência de partes que teve lugar no dia 30.05.2022, foi notificada para contestar no prazo de 10 dias (art. 56º, al. a), do CPT), prazo esse que terminava aos 09.06.2022.
Por requerimento de 08.06.2022, entrado às 17h37, a Ré requereu a prorrogação, por 10 dias, do prazo para contestar, ao qual o A. apresentou a sua adesão, nessa mesma data, às 18:46.
Aos 13.06.2022, a Mmª Juiz proferiu despacho a prorrogar o prazo, nos termos do art. 141º, nº 2, do CPC, por 10 dias, o que foi notificado às partes, mormente à Ré, através da plataforma informática citius, com data de elaboração de 14.06.2022, dele considerando-se a Ré notificada aos 17.06.2022.
E, por via da prorrogação do prazo (por igual período de 10 dias) o prazo para contestar terminava no dia 20.06.2022 [e, se acrescido dos 3 dias úteis a que se reporta o art. 139º, nº 5, do CPC, terminava aos 23.06.2022], sendo que a contestação apenas foi apresentada aos 28.06.2022.
Ou seja, a contestação foi apresentada já após o termo do prazo, perentório, para a sua apresentação, já acrescido da prorrogação dos 10 dias, o que determina a perda do direito de praticar o ato. Como acima referido, o prazo é contínuo, não se suspendendo com o requerimento para a sua prorrogação, o que deveria ter sido tido em conta pela Ré/Recorrente que, assim, deveria ter contado a prorrogação a partir do dia em que terminava o prazo inicial e não já a partir da data do despacho que a deferiu ou da sua notificação.
Salienta-se que o requerimento de prorrogação do prazo para contestar foi apresentado pela Ré, com a adesão do A., pelo que, tendo sido formulado por acordo das partes, era a situação enquadrável na previsão do art. 141º, nº 2. E, como referido no ponto anterior, o seu deferimento não estava sequer condicionado a qualquer juízo discricionário do juiz sobre a motivação subjacente à prorrogação (posto que por acordo das partes), mas sim a um juízo vinculado de deferimento (já que formulado dentro do prazo, por igual período e sem que tivesse havido prorrogação anterior).
Ou seja, não há razão alguma, face ao art. 141º, nº 2, e que era o aplicável, para que a Ré não tivesse tido em consideração, como deveria ter tido, que o prazo acrescido da prorrogação se contava de forma contínua, não se suspendendo com o requerimento a solicitá-la e, assim, nada justificando que não tivesse apresentado a contestação, como o deveria ter feito, até 20.06.2022 ou, se acrescido dos 3 dias úteis a que se reporta o art. 139º, nº 5, do CPC, até 23.06.2022, sendo que a contestação apenas foi apresentada aos 28.06.2022.

4.1. E não procedem os argumentos que, em contrário, a Recorrente aduz.
Diz esta que a Mmª Juiz não observou o prazo de 24 horas previsto no art. 569º, nº 6, do CPC, com o que teria sido cometida nulidade processual.
Desde logo, tal preceito não é aplicável, já que o requerimento para a prorrogação do prazo para a contestação foi formulado com o acordo das partes, cabendo na previsão do art. 241º, nº 2, e não já na do art. 569º, dos nºs 5 e 6, que se reporta, este, à prorrogação do prazo para contestar em situação de falta de acordo das partes.
De todo o modo, dir-se-á o seguinte:
Ainda que, porventura e como mera hipótese de raciocínio, o mencionado prazo não tivesse sido respeitado, tal em nada interferia com a data em que o prazo, com a prorrogação, sempre teria que terminar, do que a Ré, se o não sabia ou disso não estava convencida, deveria saber, não havendo motivo legítimo ou justificado que sustentasse esse (errado) convencimento.
Com efeito, o que acontece é que a Ré interpretou incorretamente a lei, o que a si é apenas imputável, pois que, erradamente, partiu do pressuposto de que o início da contagem da prorrogação do prazo por 10 dias se iniciava na data da sua notificação do despacho de prorrogação.
Ora, não é assim, como decorre do que se expôs no ponto 3, bem como no ponto 4.1., quanto à continuidade do prazo e à sua não suspensão.
O prazo para contestar que se encontra em curso não se suspende com o requerimento para a sua prorrogação, como aliás e expressamente decorre do art. 569º, nº 6, 1ª parte, pelo que o mesmo terminava aos 20.06.2022 ou aos 23.06.2022 já com o acréscimo dos 3 dias úteis a que se reporta o art. 139º, nº 5, do CPC.
Diga-se, aliás e por dever de ofício, que o termo do prazo para contestar, com a prorrogação dos 10 dias, ocorreu aos 20.06.22 (ou aos 23.06.2022, com a prorrogação dos 3 dias úteis do art. 139º nº 5 do CPC), ou seja, em data posterior à notificação do despacho de 13.06.2022, que a deferiu e do qual a Ré se considera notificada aos 17.06.2022. Ou seja, sempre poderia a Ré ter contestado dentro do prazo. De todo o modo, o que releva é que, como se disse, o requerimento de prorrogação do prazo não suspende o prazo em curso, pelo que carece de fundamento o, ao que parece, entendimento ou interpretação da Ré de que a contagem da prorrogação dos 10 dias apenas se iniciaria com a notificação do despacho de 13.06.2022.
E, por outro lado e face ao referido, não procede o argumento da Recorrente de que teria sido o alegado “atraso” na prolação desse despacho (por, segundo diz, não ter sido proferido no prazo de 24 horas, o que constituiria nulidade processual) a causa determinante da apresentação da contestação apenas aos 28.06.2022. Não se suspendendo o prazo em curso, como não se suspende, sempre deveria a Recorrente ter tido isso em conta e previsto que, se deferida a prorrogação, o prazo para contestar sempre terminaria aos 20.06.2022 ou aos 23.06.2022 já com o acréscimo dos 3 dias úteis a que se reporta o art. 139º, nº 5, do CPC.
E mesmo que se admitisse, como mera hipótese de raciocínio, que o despacho de prorrogação do prazo não teria sido proferido no prazo de 24 horas previsto no art. 569º, nº 6, e que tal constituiria desvio ao formalismo processual, tal não constituiria, no caso concreto, nulidade processual.
Com efeito, nos termos do art. 195º, nº 1, do CPC, a prática de ato que a lei não admita, bem como a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreva, só produzem nulidade quando a lei o declare ou quando a irregularidade cometida possa influir no exame ou na decisão da causa.
Ora, no caso, não se verifica nenhuma dessas situações.
Por um lado, não está expressamente previsto na lei que o incumprimento do mencionado prazo de 24 horas constitua nulidade processual.
E, por outro lado e no caso concreto, tal não influi na questão do prazo, e da sua contagem, para a apresentação da contestação, não influindo, assim, no exame e decisão dessa questão. Na verdade, e como já referido, a prolação do despacho a 13.06.2022 não determinou qualquer impossibilidade de apresentação da contestação dentro do prazo ou, dito de outro modo, não determinou, nem era ou constituía causa suscetível de determinar, a apresentação da contestação fora do prazo, nem tão pouco constituía motivo, muito menos justificado, para criar qualquer convicção fundamentada ou legítima de que a contagem do período da prorrogação apenas se iniciaria após a sua notificação. Como referido, o requerimento de prorrogação do prazo para contestar não suspende o prazo, cuja contagem é contínua, o que deveria ter sido tido em conta pela Ré e não foi, facto que apenas a si é imputável. E o mesmo se diga no que se reporta à notificação do despacho, feita no dia 14.06.2022, através da plataforma informática citius, e não já por algum dos meios mais expeditos previstos no art. 172º, nº 5, 2ª parte, do CPC.
Alude ainda a Recorrente ao facto de a Mmª juiz, em momento posterior à contestação, ter proferido despacho a determinar a notificação do A. para aperfeiçoamento da contestação, não tendo, também ela (Mmª Juiz) dado conta da extemporaneidade da contestação, pelo que seria, também, compreensível que tivesse a Recorrente apresentado a contestação no prazo em que a apresentou, argumento que não procede. O despacho de aperfeiçoamento em nada influiu na apresentação, pela Ré, da contestação na data em que esta entendeu ser de a apresentar, a qual é, aliás, anterior ao mencionado despacho de aperfeiçoamento. E a extemporaneidade da contestação decorre de forma perentória da lei, não cabendo, nem podendo, o juiz formular qualquer juízo quanto à possibilidade da sua apresentação após o termo do prazo. Como se disse, o prazo para contestar é um prazo perentório, cuja inobservância determina necessariamente a perda do direito de praticar o ato. Acresce que o mencionado despacho de aperfeiçoamento não se pronunciou sobre a questão da tempestividade, ou não, da contestação, não constituindo, assim, caso julgado formal sobre tal questão -cfr. art. 620º, nº 1, do CPC.
Invoca ainda a Recorrente a violação dos princípios da confiança, da adequação formal, da descoberta da verdade material e o art. 20º, nºs 4 e 5 da CRP que, segundo diz, teriam sido violados pela decisão recorrida.
Não assiste razão à Recorrente, não se vendo em que medida tais princípios tenham sido violados, para além de que os mesmos não são absolutos, antes tendo que ser compaginados com as regras processuais, que disciplinam a tramitação processual de um processo.
O princípio da proteção da confiança legítima é corolário do Estado de Direito Democrático e dos princípios da boa fé e da segurança jurídica, o qual depende de vários pressupostos, designadamente de uma confiança "legítima", o que passa, em especial, pela sua adequação ao Direito, não bastando a mera convicção psicológica, antes se impondo razões suficientemente concludentes para um destinatário normal e onde seja razoável ancorar a invocada confiança. – cfr. Acórdão do STA de 18.06.2003, Proc. 01188/02, in www.dgsi.pt.
Jorge Reis Novais, Princípios Estruturantes de Estado de Direito, 2ª Edição, Almedina, pág. 218/219, a propósito do princípio da confiança, refere que que “Há, em primeiro lugar, a necessária existência de uma base que tenha gerado a confiança dos particulares, ou seja, um dado, um facto ou um acto da responsabilidade ou sob o controlo dos poderes públicos com potencialidade objectiva para gerar no particular interessado uma esperança convicta de que no futuro se verificarão determinadas consequências.
No caso, não se vê, nem a Recorrente demonstra, os pressupostos da tutela conferida por tal princípio. A lei é clara em matéria de prazo de apresentação da contestação, que é de natureza perentória, contínuo e não se suspendendo com o requerimento para a sua prorrogação, e não radicando a sua extemporaneidade, pelo que já acima se deixou dito, em decisão da 1ª instância que pudesse ter induzido a Ré no sentido de que a contagem do período da prorrogação para a sua apresentação apenas se iniciaria com a notificação do despacho sobre o requerimento para essa prorrogação. A pretensão da Recorrente é contrária ao Direito e se, porventura, a mesma “confiou” que assim seria tal a ela apenas se deve, não se mostrando legitimamente fundada a sua expetativa ou convencimento de que o início do período da prorrogação estava dependente de despacho judicial nesse sentido e de que a apresentação da contestação na data em que foi apresentada seria tempestiva.
Quanto aos princípios da adequação formal e da justiça material eles não podem levar a soluções contra legem, sendo que a aplicabilidade dos mesmos deve estar em conformidade e de acordo com a disciplina processual que se imponha observar. Se a lei não permite, como não permite, que o ato, mormente a contestação, sujeito a prazo perentório seja praticado após o seu decurso (extinguindo-se o direito de o praticar), não permitem tais princípios ultrapassar tal impossibilidade legal.
Quanto aos nºs 4 e 5 do art. 20º da CRP dispõe o citado preceito que: “1. A todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos, não podendo a justiça ser denegada por insuficiência de meios económicos. 4. Todos têm direito a que uma causa em que intervenham seja objecto de decisão em prazo razoável e mediante processo equitativo. 5. Para defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, a lei assegura aos cidadãos procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil contra ameaças ou violações desses direitos.”
O acesso ao direito e a processo equitativo, onde se enquadra a possibilidade do contraditório, não excluem que tal deva ter lugar dentro do quadro legal, designadamente de acordo com a disciplina processual e, dentro desta, dentro dos prazos nela fixados. No caso, a Ré foi notificada para contestar e foi-lhe deferida a requerida prorrogação do prazo para o efeito, sendo que, se o não fez de forma atempada, como não fez, tal é, pelas razões já apontadas e para onde se remete (para não sermos repetitivos), a ela imputável. Não se verifica, pois, violação do citado preceito constitucional.
Improcedem, assim, as conclusões do recurso.
***
V. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em julgar o recurso improcedente, confirmando-se a decisão recorrida.

Custas pela Recorrente.

Porto, 17.04.2023
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Jerónimo Freitas
______________
[1] Com base nos autos bem como na consulta do processo principal através da plataforma informática citius.
[2] In www.dgsi.pt e citado por Marco Carvalho Martins, ob. cit., pág.214, nota 662.
[3] Idem, nota 663.
[4] Citando o Acórdão do TRG de 23,11.2010, Proc. 315/10.0TBBRG.G1.
[5] www.dgsi.pt e referido na ob. citada, nota 692.