Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
720/21.6GDVFR.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PEDRO VAZ PATO
Descritores: REVOGAÇÃO DA SUBSTITUIÇÃO DA PENA DE PRISÃO POR PRESTAÇÃO DE TRABALHO A FAVOR DA COMUNIDADE
PRINCÍPIO DO CONTRADITÓRIO
AUDIÇÃO PRESENCIAL DO CONDENADO
Nº do Documento: RP20230419720/21.6GDVFR.P1
Data do Acordão: 04/19/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: CONFERÊNCIA
Decisão: NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO INTERPOSTO PELO ARGUIDO.
Indicações Eventuais: 1. ª SECÇÃO CRIMINAL
Área Temática: .
Sumário: I - Tendo sido envidados todos os esforços necessários à audição presencial do condenado, e não sendo possível obter a sua comparência à diligência, o contraditório imposto pelo artigo 495.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (relativo à revogação da suspensão da pena de prisão, para que remete o n.º 3 do artigo 498.º do mesmo Código, relativo à revogação da substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade da pena de prisão) tem-se por cumprido com a notificação do condenado na pessoa do seu defensor.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. n.º 720/21.6GDVFR.P1


Acordam os juízes, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto


I – AA veio interpor recurso do douto despacho do Juiz 2 do Juízo Local Criminal de Santa Maria da Feira do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro que revogou a substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade da pena de seis meses de prisão em que foi condenado.

São as seguintes as conclusões da motivação do recurso:
«1- Por despacho datado de 25/11/2022, decidiu o Tribunal da primeira instância revogar a substituição da pena de prisão pela pena de trabalho a favor da comunidade e, consequentemente, determinar o cumprimento pelo arguido AA da pena principal de seis meses de prisão em que foi condenado, sem o arguido/condenado ser ouvido presencialmente perviamente à prolação do referido despacho.
2- O Tribunal recorrido considerou como suficiente o termo de identidade e residência prestado pelo arguido/condenado, mesmo admitindo o Tribunal a mudança de residência e eventual ausência para o estrangeiro imputando ao arguido a falta de comunicação de mudança de residência, considerando, regularmente convocado o mesmo, através de carta expedida e depositada na morada do TIR, em consequência, não considerou como exigível qualquer tentativa posterior de localização para a sua audição presencial, não determinando qualquer outra diligência tendente à notificação do condenado para comparência do condenado/arguido.
3- Ora, a convocação para audição presencial e pessoal do condenado não está totalmente impossibilitada, pois existe nos processo informação da autoridade policial que o arguido/condenado se encontra em França conforme oficio da GNR a informar o Tribunal(oficio de 16/11/2022- referência citius: 13756404), pois a sua localização pode ser efetuada por meio as embaixadas ou consulados em França por via do numero seu cartão de cidadão, pois não se limitam as diligências de localização do arguido a território nacional.
4- Pelo que, o Tribunal recorrido, apesar de ter tido conhecimento pela GNR, que o arguido/condenado se encontra no estrangeiro, em França, não encetou qualquer diligência tendente à sua audição presencial.
5- Acresce ainda que a prolação de jurisprudência largamente maioritária a no entendimento de que a revogação da suspensão que se processe, sem ter sido dada a oportunidade ao condenando, para se pronunciar pessoal e presencialmente nos termos do artigo 495.º. n.º 2 do CPP, revela-se atentatória das garantias de defesa constitucionalmente consagradas, pelo que a preterição do direito de audição prévia com as características estabelecidas no citado normativo constitui nulidade insanável cominada no artigo 119.º, alínea c), do CPP.
6- No sentido do entendimento jurisprudencial referido no artigo anterior , vejam-se os Acórdãos da Relação de Coimbra 16-01-2008 (processo n.º 21/03.1 GTGRDA.C1), 05-11-2008 (processo n.º 335/01.5TBTNV-D.C1), 03-12-2008 (processo n.º 70/97.7IDSTR.C1) e 18-05 2010 (processo n.º 200/04.4GTAVR.C1), da Relação do Porto de 03-12-2008 (processo n.º JTRP00041926), da Relação de Guimarães de 22-02-2011 (processo n.º 150/03.1TAGMR.G1) e da Relação de Lisboa de 24-09-2015 (processo n.º 4/01.6GDLSB.L1-9), bem como a jurisprudência citada nos dois últimos arestos indicados. acórdão da Relação de Évora de 12/7/2012, proferido no processo 691/09.7GFSTB.E1, rel, no acórdão da Relação de Coimbra de 9/9/2015, proferido no processo 83/10.5PAVNO.E1.C1, , no acórdão da Relação de Guimarães de 18/4/2016, proferido no processo 1629/03.0PBBRG.G1, e nos acórdãos da Relação do Porto de 6/3/2013, proferido no processo 691/05.6PIPRT.P1 e de 9/3/2016, proferido no processo 25/06.2SFPRT-A.P1, , o acórdão do Tribunal da Relação do Porto proferido no processo n.º 0810622, em 23.04.2008, e o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra proferido no processo n.º 17/06.1GBTNV.C1, em 06.07.2011 (todos acedíveis em www.dgsi.pt).
7- Neste particular, na doutrina, Paulo Pinto de Albuquerque relativamente aos casos de aplicação do art. 495º, nº 2 do CPP é da mesma opinião: «O arguido deve ser ouvido pessoal e presencialmente, sendo irrelevante o motivo da revogação da suspensão, sob pena da nulidade do artigo 119.º, al. c), uma vez que a lei não relaciona a audição do arguido com nenhum motivo especial" (in "Comentário do Código de Processo Penal", Unv. Católica Editora, 4." Edição, pág. 1252.)
8- Ao se impor que o condenado se pronuncie pessoalmente na presença do juiz, e não por meio de alegação escrita do defensor, traduz um especial acautelamento do contraditório, que, relevando do interesse em jogo — a liberdade — , tem, em coerência, de estender -se à notificação da decisão, na medida em que só o conhecimento do seu conteúdo lhe possibilita a defesa.
9- O elemento pessoal exigido em acto preparatório da decisão, porque releva da necessidade de garantir um efectivo direito de defesa, não pode deixar de ser também exigido no momento da comunicação da decisão, até por maioria de razão, uma vez que, tendo -se passado da mera possibilidade de ser determinado o cumprimento da pena de prisão à certeza, se coloca então com mais pertinência a necessidade de assegurar a defesa do condenado, designadamente o direito ao recurso, objectivo que só é efectivamente conseguido se àquele for possibilitado o conhecimento do conteúdo da decisão.
10- O paralelismo com a sentença é, nestes casos, flagrante, pois, a decisão é precedida de actos que se aproximam de um julgamento, como a produção de prova e a presença do condenado tal como esta aproximação entre a sentença e o despacho de revogação da suspensão pode ser vista na fixação de efeito suspensivo ao recurso interposto de ambas as decisões — artigo 408.º, n.ºs 1, alínea a), e 2, alínea c) CPP.
11- Pelo que, deve ser esta noma 113 nº 10 do CPP ser objecto interpretação extensiva e estender-se o sentido da palavra sentença de modo a abranger o despacho de revogação da suspensão da execução da pena, pois este tipo de despacho, ficou aquém do pensamento legislativo, devendo, em consequência, estender-se o sentido da palavra sentença de modo a abranger o despacho de revogação da suspensão da execução da pena.
12- Assim sendo, o elemento teleológico, pois as razões que conduziram à solução legislativa de impor que a sentença seja notificada tanto ao defensor, como pessoalmente ao arguido, justificam na mesma medida que esse regime de notificação seja estendido à notificação do despacho de revogação da suspensão da execução da pena.
13- Esta solução apresenta-se como a mais razoável, por ser a que assegura efectivamente o direito do condenado de recorrer de uma decisão em relação à qual, por implicar a privação da liberdade, o duplo grau de jurisdição tem de ser garantido, e na interpretação da lei deve presumir-se «que o legislador consagrou as soluções mais acertadas», nos termos do n.º 3 do artigo 9.º do Código Civil.
14- A não considerar-se esta interpretação da norma do nº 10 do artigo 113 do CPP, por decorrência do princípio da interpretação das leis em conformidade com a Constituição, significa que: “comportando a norma mais que uma possibilidade de interpretação, umas compatíveis e outras incompatíveis com a Constituição, deve escolher-se uma que seja conforme às normas constitucionais, ou, estando todas elas em conformidade com a Constituição, «a melhor orientada para a Constituição”- cfr Gomes Canotilho-Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 3.ª ed., pp. 1151 e 1152.
15- Com esta interpretação do artigo 113 nº 10 CPP garante-se efectivamente o direito ao recurso, ou, sendo embora ambas as interpretações conformes à Constituição, aquela é a mais virada para a Constituição, por assegurar mais eficazmente o referido direito, entendimento na de acordo com o proferido pelo Tribunal Constitucional no Acórdão n.º 422/2005, «surge como mais consentâneo com as garantias de defesa constitucionalmente asseguradas ao arguido o entendimento de que se impõe a notificação da decisão revogatória da suspensão da execução da pena de prisão ao arguido, e não apenas ao seu defensor».
16- No presente caso, o tribunal recorrido não deu cumprimento aos art.ºs 495º nº2 e 498º nº 3 do CPP, não esgotando as diligências necessárias para o cumprir, o que constitui nulidade insanável (art.º 119º/c) do CPP), pelo que, nos termos do art.º 122º do CPP, deve se declarado nulo o despacho recorrido e determinado que o tribunal recorrido dê cumprimento aos referidos artigos e, após, profira nova decisão sobre a questão aqui em causa.
17- Caso se considere não ser necessário a audição presencial do arguido/condenado antes do despacho a proferir, sempre se verifica a ilegalidade da notificação do arguido por via postal simples com prova de prova deposito para a morada do constante do termo de identidade e residência, pois a entender-se legal e conforme a constituição, a notificação do arguido por via postal simples com prova de prova deposito, esse procedimento processual é desproporcional e desequilibrado das garantias constitucionais do arguido em processo penal, -artigo 32 nº 1 da CRP, já que, por um lado é exigível por lei, nos caso das sentenças proferidas no caso da ausência do arguido na audiência de julgamento, que o arguido é notificado logo que seja detido ou se apresente voluntariamente .artigo 333 nº 5 do CPP, e paralelamente, num despacho de revogação da pena de prisão suspensa, convertendo numa pena de prisão efectiva, basta-se com o mero deposito do despacho na morada do TIR constante do processo.
18- Mutatis mutandis ao supra alegado nos artigos anteriores, as razoes são as mesmas, pois, considerando que o despacho que determina a revogação da pena substitutiva de trabalho a favor da comunidade e que determina o cumprimento da pena principal de prisão em causa, consubstancia uma decisão que interfere com a liberdade do arguido, reconduzido à sua privação do mesmo, tal notificação terá de ser efectuada pessoalmente ao condenado visado.
19- E assim sendo, estando em causa uma decisão que priva o condenado da sua liberdade, a notificação da mesma não se pode considerar feita na pessoa do seu defensor, dado que a isso veda a teleologia subjacente ao disposto no art. 113.º, n.º 10 do C.P.P.
20- Pelo exposto, face à interpretação dos preceitos legais supra referidos no entender do recorrente, violou o Tribunal recorrido os seguintes artigos:113º nº 10; 119 alínea c); 495º nº2; 498ºn3 e 333 nº 5 todos do Código de Processo Penal e artigo 32º nº 1 da Constituição Republica Portuguesa».

O Ministério Público junto do Tribunal de primeira instância apresentou resposta a tal motivação, pugnando pelo não provimento do recurso.

O Ministério Público junto desta instância emitiu douto parecer, pugnando também pelo não provimento do recurso.

Colhidos os vistos legais, foram os autos à conferência, cumprindo agora decidir.


II – A questão que importa decidir é, de acordo com as conclusões da motivação do recurso, a de saber se o despacho recorrido é nulo, por inobservância do contraditório, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 119.º, a); 495.º, n.º 2, e 498.º, n.º 3, do Código de Processo Penal.


III -
É o seguinte o teor do douto despacho recorrido:

«Por sentença proferida no dia 13 de Outubro de 2021, o arguido AA foi condenado, pela prática de um crime de desobediência, previsto e punido pelo artigo 348.º, n.º 1, alínea b), do Código Penal, na pena de seis meses de prisão, substituída pela pena de 180 (cento e oitenta) horas de trabalho a favor da comunidade.
Tal decisão transitou em julgado no dia 12 de Novembro de 2021.
O respectivo plano de execução do trabalho a favor da comunidade a prestar foi elaborado no dia 17 de Janeiro de 2022 (cfr. folhas 89 a 90) e devidamente homologado, por despacho proferido no dia 29 de Março de 2022 (cfr. folhas 91), tendo sido o condenado notificado de tal decisão, por carta expedida, devidamente depositada na morada constante do termo de identidade e residência prestado, no dia 31 de Março de 2022 (cfr. prova de depósito junta no dia 8 de Abril).
Não obstante regularmente notificado para iniciar a prestação do trabalho a favor da comunidade, o arguido nunca cumpriu tal pena substitutiva, nunca se apresentou na Entidade beneficiária do trabalho ou na DGRSP e nunca justificou tais omissões, sem embargo ter sido contacto telefonicamente pelos Técnicos de Reinserção social adstritos ao seu acompanhamento e das convocatórias que lhe foram endereçadas pela DGRSP, tendo, a partir de Maio, deixado mesmo de atender os contactos telefónicos dos Técnicos da DGRSP (cfr. informação prestada pela DGRSP, datada de 1 de Setembro de 2022 e depoimento da Técnica de Reinserção, nesta diligência).
Na verdade, aparentemente, o arguido abandonou a residência constante do termo de identidade e residência, existindo indicações que se terá ausentado para França (cfr. ofício do Posto territorial de Lourosa da Guarda Nacional Republicana, datado de 15 de Novembro).
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O Ministério Público sustentou a revogação da substituição e a determinação do cumprimento da pena de prisão.
A Defesa pugnou pela notificação do arguido, com vista à sua audição pessoal.
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Ora, de acordo com o que dispõe o artigo 196.º do Código de Processo Penal, estando o arguido sujeito ao termo de identidade e residência prestado, o mesmo deverá considerar-se regularmente convocado, através de carta expedida e depositada na morada que conste de tal termo, sendo apenas imputável ao arguido a falta de comunicação da mudança de residência e eventual ausência para o estrangeiro, pelo que não se crê como exigível qualquer tentativa ulterior de localização para a sua audição presencial.
Efectivamente, o que a lei impõe é que se tente tal audição, a qual, gorada pela ausência injustificada do condenado, regular e validamente convocado, através de carta depositada na morada constante do termo de identidade e residência prestado, deixa de ser obrigatória, pelo que não se determina qualquer outra diligência tendente à notificação do condenado para comparência.
Dispõe o n.º 2 do artigo 59.º do Código Penal:
O tribunal revoga a pena de prestação de trabalho a favor da comunidade e ordena o cumprimento da pena de prisão determinada na sentença se o agente, após a condenação:
a) Se colocar intencionalmente em condições de não poder trabalhar;
b) Se recusar, sem justa causa, a prestar trabalho, ou infringir grosseiramente os deveres decorrentes da pena a que foi condenado; ou
c) Cometer crime pelo qual venha a ser condenado, e revelar que as finalidades da pena de prestação de trabalho a favor da comunidade não puderam, por meio dela, ser alcançadas.
A revogação somente deverá ocorrer quando circunstâncias revelem que o diagnóstico feito no momento em que se decidiu pela substituição da pena de prisão haja falhado, ou seja, quando o arguido houver demonstrado não possuir capacidade para sentir a ameaça da pena e deixar-se influenciar pelo seu preciso efeito contentor.
É esta, segundo cremos, a situação em presença.
Na verdade, o condenado não cumpriu as obrigações decorrentes da condenação, em especial, a primordial de viabilizar a execução da pena substitutiva da prisão, revelando uma inusitada e intolerável falta de colaboração.
Com efeito, o condenado, não obstante bem saber que estaria obrigado a prestar trabalho a favor da comunidade em substituição da pena de prisão que lhe foi aplicada, saber que o respectivo plano de execução havia sido devidamente homologado pelo tribunal e de ter sido, inclusivamente, contactado para iniciar aquele trabalho comunitário, não compareceu quer na Entidade beneficiária do trabalho, quer na DGRSP e não justificou tais ausências, ausentando-se, entretanto, aparentemente, para paradeiro incerto, inviabilizando a execução de tal pena substitutiva.
Assim sendo, não obstante o juízo de censura e a ameaça de execução da pena de prisão contidos na decisão proferida nestes autos, o condenado não aderiu ao projecto de readaptação social que lhe foi proposto, não mostrou um mínimo de colaboração à sua execução, revelando um comportamento inelutavelmente displicente e relapso, não podendo deixar de reconhecer-se nesta sua actuação o insucesso do esforço de contenção e auto-responsabilização que lhe foi imposto pela anterior decisão.
Donde que, se afigura que o incumprimento do arguido já não nos permite fazer qualquer juízo positivo quanto à sua efectiva reabilitação, bem pelo contrário, afirmando-se, sobretudo, uma clara necessidade de prevenção.
Por conseguinte, o comportamento do arguido permite concluir que a substituição da pena de prisão aplicada não realizou de forma adequada e suficiente as finalidades da punição, máxime pelo facto de o mesmo ter inviabilizado a sua execução.
Por conseguinte, ao abrigo do mencionado inciso legal, considerado o documentado incumprimento do condenado, será de determinar a revogação da substituição da pena de prisão pela pena de trabalho a favor da comunidade e, consequentemente, determinar o cumprimento pelo arguido da pena de seis meses de prisão em que foi condenado.
Resta afirmar que, perante a ausência do condenado em parte incerta, impossível se mostra também a averiguação da viabilidade do cumprimento da pena de prisão em regime de permanência na habitação (até porque não é possível colher o consentimento do condenado), nos termos previstos no artigo 43.º do Código Penal.
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DECISÃO
Nos termos expostos, decido revogar a substituição da pena de prisão pela pena de trabalho a favor da comunidade e, consequentemente, determinar o cumprimento pelo arguido AA da pena principal de seis meses de prisão em que foi condenado.
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Notifique.
Comunique à D.G.R.S.P.
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Remeta, após trânsito, boletim ao registo criminal.
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Após trânsito, passe os competentes mandados de condução do condenado ao Estabelecimento Prisional.»

IV – Cumpre decidir.
Vem o recorrente alegar que o despacho recorrido é nulo, por inobservância do contraditório, nos termos das disposições conjugadas dos artigos 119.º, a); 495.º, n.º 2, e 498.º, n.º 3, do Código de Processo Penal, por não se ter procedido à sua audição presencial antes da revogação da substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade da pena de seis meses de prisão em que ele foi condenado. Alega que o Tribunal recorrido não procedeu a todas as diligências tendentes a essa audição presencial, sendo que teria sido possível a obtenção junto das representações diplomáticas portuguesas de informações sobre a sua morada em França. Alega que, ainda que não se considere necessária essa audição presencial, não poderá ele considerar-se regularmente notificado, para se pronunciar sobre essa revogação, por via postal simples na morada constante do termo de identidade e residência que prestou, pois desse modo não são salvaguardadas as garantias de defesa consagradas no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição, sendo exigível para tal a sua notificação pessoal, por interpretação extensiva e identidade de razão, das disposições conjugadas dos artigos 113.º, n.º 10, e 333.º, n.º 5, do Código de Processo Penal (disposições de onde resulta a necessidade de notificação pessoal da sentença ao arguido).
Vejamos.
É de salientar, antes de mais, que não suscita dúvidas a orientação uniforme da jurisprudência citada na motivação do recurso e de onde resulta que, em regra, constitui nulidade insanável, por inobservância do contraditório, a revogação da suspensão de execução da pena de prisão, ou da revogação da substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade da pena de prisão, sem audição presencial do condenado.
Mas também não suscita dúvidas a orientação, igualmente uniforme, da jurisprudência no sentido de que, tendo sido envidados todos os esforços necessários à audição presencial do condenado, e não sendo possível obter a sua comparência à diligência, o contraditório imposto pelo artigo 495.º, n.º 2 do Código de Processo Penal (relativo à revogação da suspensão da pena de prisão, para que remete o n.º 3 do artigo 498.º do mesmo Código, relativo à revogação da substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade da pena de prisão) tem-se por cumprido com a notificação do condenado na pessoa do seu defensor. Podem ver-se, neste sentido, entre outros, os acórdãos desta Relação de 4 de março de 2016, proc. n.º 25/06.2SFPRT-A.P1, e de 9 de dezembro de 2020, proc. n.º 556/17.9GAPFR.P1, ambos relatados por José Carreto; e de 8 de março de 2017, proc. n.º 568/11.6.PDVNG.P1, relatado por Renato Barroso; e os acórdãos da Relação de Coimbra de 9 de setembro de 2015, proc. n.º 83/10.5PAVNO.E1.C1, relatado por Orlando Nascimento; de 12 de julho de 2017, proc. n.º 2089/10.5PCCBR-A.C1, relatado por Jorge França; e de 10 de fevereiro de 2021, proc. n.º 837/17.1PAMGR-A.C1, relatado por Vasques Osório, todos acessíveis em www.dgsi.pt.
Foi isso mesmo que se verificou no caso em apreço. Antes de mais, porque é imputável ao próprio condenado a sua ausência da morada que indicou quando prestou termo de identidade e residência, sendo que não informou o Tribunal da sua nova morada, contra a obrigação que assumira ao prestar esse termo (ver artigo 196.º, n.º 3, b), do Código de Processo Penal). Para além disso, o Tribunal não deixou de tentar obter informação sobre a nova morada do condenado, tendo a autoridade policial informado que ele se ausentara para França, desconhecendo-se a sua morada nesse país. É óbvio que não seria possível, sem mais e apenas através da simples indicação do número de cartão de cidadão, como pretende o recorrente, obter a indicação dessa morada em França. Pode, pois, afirmar-se que foram, no caso em apreço, envidados todos os esforços necessários à sua audição presencial e que a ele próprio se ficou a dever a impossibilidade dessa audição. O contraditório foi respeitado com a notificação do condenado na pessoa do seu defensor.
Não foram postergadas as garantias de defesa do condenado consagradas no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição. O condenado, quando prestou termo de identidade e residência, foi, nos termos do artigo 196.º, n.º3, b), c) e d) do Código de Processo Penal, advertido de que passaria a ser notificado por via postal simples na residência que indicou e de que o incumprimento da obrigação de comunicação da sua eventual alteração de residência legitimava o julgamento na sua ausência (de onde resulta, por maioria de razão, também a legitimidade de uma decisão como a que agora está em apreço sem a sua audição presencial). A falta da sua audição presencial é-lhe, indubitavelmente, imputável. Não deixou, por outro lado e mesmo assim, de ter a sua defesa assegurada pelo seu defensor, que como tal foi notificado.
Não será de aplicar a esta situação, por interpretação extensiva e identidade de razão, o regime decorrente das disposições conjugadas dos artigos 113.º, n.º 10, e 333.º, n.º 5, do Código de Processo Penal (disposições de onde resulta a necessidade de notificação pessoal da sentença ao arguido). O que está agora em causa (porque poderia levar à nulidade do despacho recorrido) é a notificação do condenado para se pronunciar sobre a revogação da substituição por prestação de trabalho a favor da comunidade da pena de prisão, não a própria decisão dessa revogação, sendo que só em relação a esta poderia ser invocada alguma equiparação à sentença (o que também é duvidoso, pois está em causa a execução de uma condenação anterior, não outra condenação). Não é, pois, exigível a notificação pessoal do condenado para este efeito. A possibilidade de notificação por via postal simples para este efeito não está excluída da aplicação do regime decorrente do artigo 196.º do Código de Processo Penal, com os condicionalismos e advertências nele previstos, suficientes para satisfazer as garantias de defesa do condenado.
Deverá, assim, ser negado provimento ao recurso.

O recorrente deverá ser condenado em taxa de justiça (artigo 513.º, n.º 1, do Código de Processo Penal e Tabela III anexa ao Regulamento das Custas Processuais).


V – Pelo exposto, acordam os juízes do Tribunal da Relação do Porto em negar provimento ao recurso, mantendo o douto despacho recorrido.

Condenam o arguido e recorrente em três (3) U.C.s de taxa de justiça.


Notifique

Porto, 19 de abril de 2023
(processado em computador e revisto pelo signatário)

Pedro Vaz Pato
Eduarda Lobo
Castela Rio