Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
5452/20.0T8VNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: PAULA LEAL DE CARVALHO
Descritores: ASSÉDIO MORAL
DIREITO À INDEMNIZAÇÃO
Nº do Documento: RP202302275452/20.0T8VNG.P1
Data do Acordão: 02/27/2023
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - O assédio é um comportamento ilícito, que viola a dignidade e personalidade do trabalhador e que é suscetível de gerar o direito a uma indemnização pelos danos não patrimoniais (e patrimoniais) que dele resultem.
II - Porém, e pese embora o dano não patrimonial não seja recondutível apenas à ocorrência de lesão física ou psíquica do trabalhador, o direito à indemnização não constitui consequência imediata ou automática do assédio, sendo necessário, também, que ocorra um dano e que este seja consequência desse comportamento (nexo causal entre o comportamento e o dano).
III - Não tendo a A. feito prova da existência de qualquer dano não patrimonial, nem por consequência, do nexo causal entre eventual ou eventuais danos e o comportamento assediante que imputa à Ré, tanto basta para a improcedência do pedido de condenação desta em indemnização por danos não patrimoniais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Procº nº 5452/20.0T8VNG.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1318)
Adjuntos: Des. Rui Penha
Des. Jerónimo Freitas

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório

AA intentou a presente ação declarativa de condenação, com processo comum, contra A... Ldª e BB, esta litigando com o benefício de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, pedindo que:
- se condene as Rés a pagar solidariamente à Autora a quantia de 7.550,08 € acrescida de juros de mora após citação.
- se condene as Rés a pagar-lhe solidariamente à autora a título de danos não patrimoniais a quantia nunca inferior a 5.000,00 € acrescida de juros de mora após a citação.
- se condene as Rés a pagar-lhe solidariamente a quantia que vier a ser liquidada em execução de sentença, acrescida de juros de mora, relativa à diferença salarial relativa à categoria profissional desempenhada pela autora e o valor pago.
Alegou, para tanto, em suma, que foi admitida, por contrato de trabalho, para desempenhar para a A..., Ld.ª determinadas funções, contrato esse que veio a cessar por resolução do mesmo pela A. com invocação de justa causa.
A segunda Ré, sócia e única gerente da primeira Ré, após ser decretado o estado de emergência, por causa da Covid 19, não mais voltou à loja onde a autora desempenhava as suas funções, saiu de Portugal, deixando de comparecer na sede da primeira Ré, onde tinha o estabelecimento comercial.
No decurso da relação laboral, a 2ª Ré não a remunerou pelas funções de gerente que assumiu, retirou-lhe tais funções, acrescentou-lhe outras que nunca realizou, alterou-lhe o horário de trabalho, fazendo com que este não coincidisse com o horário de abertura do público do espaço onde se encontrava implantado o estabelecimento comercial no qual laborava, cancelou o seguro de saúde de que a A. beneficiava juntamente com os filhos, e não entregou a esta determinados quantitativos que recebeu do Estado a título de apoio social e que àquela se destinavam, facto que integram o conceito de assédio moral previsto no artigo 29.º n.º 1, do CT, reclamando das RR a indeminização de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
A A. passou a exercer as funções de gerente de loja em março de 2018, por determinação da Ré sociedade, cuja remuneração base é superior a 700,00 € que a Ré sociedade lhe pagou, pelo que, desde março de 2018 até à cessação do contrato em 4 de agosto de 2020 a A. tem direito a receber as diferenças salariais, cujo valor deve ser fixado em sede de liquidação em execução de sentença.
Reclama também o pagamento de 2.586,75 € relativa a férias e proporcionais de férias e de subsídios de férias e de Natal, a quantia de 3.150,00 € a título de indemnização por resolução do contrato de trabalho com justa causa e as retribuições referentes aos meses de maio a julho de 2020, quantias essas acrescidas de juros demora.
A segunda Ré é solidariamente responsável pelo pagamento das quantias em dívida, reclamadas pela autora na presente ação, pois foi ela que recebeu o subsídio do Estado para a manutenção do posto de trabalho da autora durante o Estado de Emergência a que se refere a resolução da Assembleia da República 15-A/2020, desde 18 de março de 2020 a 30 de abril de 2020 e depois deste cessar, durante o Estado de Calamidade a que se refere a resolução do conselho de ministros n.º 33-A/2020, desde 30 de abril de 2020.
Quis a segunda Ré, à revelia da decisão societária e da lei, com o intuito de privar a autora do seu salário e desta forma dar causa a cessação do contrato de trabalho por justa causa, não pagar o salário fazendo seu o subsídio do Estado e, bem assim, quis a segunda Ré, à revelia da decisão da sociedade Ré, provocar a autora, assediando-a, com o objetivo de provocar-lhe o desespero perante a privação do seu salário, deixando-a doente e incapacitada para o trabalho.

Realizou-se a audiência de partes, na qual, conforme respetiva ata de 01.10.2020, estiveram presentes a A., a Ré BB, e também em representação da 1ª Ré, bem como os respetivos mandatários, tendo-se frustrado a tentativa de conciliação e sido nela, ata, consignado, para além do mais, o seguinte:
“Declarada aberta a audiência, no âmbito do cumprimento ao disposto no art. 55.º, n.º 1, do CPT, pela Autora foi reiterada a posição vertida na petição inicial, tendo sido dito pelas Rés que há alguns salários por pagar, mas que necessita de verificar com a sua contabilista os valores, pelo que não é possível obter neste momento entendimento.”

As RR contestaram: invocaram a “ilegitimidade passiva” da Ré A... Lda., por, à data da entrada em juízo da p.i., já ter sido dissolvida e liquidada, com registo do encerramento da liquidação no dia 16.08.2020, bem como a ilegitimidade passiva da 2ª Ré, por não ter a A. alegado que a sociedade extinta possuía bens e/ou valores e que os mesmos foram distribuídos pela sócia demandada BB e invocando ainda a ineptidão da p.i. Contestou também por impugnação, concluindo no sentido da inexistência de assédio e de justa causa de resolução do contrato de trabalho e deduziu pedido reconvencional, pedindo a condenação da A. a pagar-lhe a quantia de 1.400,00€ a título de indemnização pela falta de aviso prévio, acrescida de juros de mora desde a notificação do pedido até efetivo e integral pagamento.

A A. respondeu à contestação, concluindo como na p.i. e no sentido da improcedência do pedido reconvencional, mais requerendo que os presentes autos sigam seus termos até final contra a Ré BB, nos termos do artigo 162.º n.º 2 do Código das Sociedades Comerciais.

Foi (aos 13.04.2021) proferido despacho de aperfeiçoamento da contestação, ao que a Ré respondeu conforme requerimento de 26.04.2021.

Aos 21.06.2021 foi proferido despacho a fixar o valor da ação em € 13.950,08, bem como despacho saneador em que:
i) Quanto à “Exceção de falta de personalidade judiciária – indevidamente qualificada como ilegitimidade passiva − da ré A... L.da”:
Se considerou como assente o seguinte:
“Encontra-se já documentalmente provada, com interesse para a apreciação da arguida exceção, a seguinte matéria de facto:
1 – A autora AA instaurou em 3 de setembro de 2020 a presente ação contra as rés A... L.da. e BB.
2 – Conforme inscrição efetuada pela Ap. ... de 20180810 no registo comercial da sociedade A... L.da., das alterações ao contrato de sociedade, a ré BB é a única titular das duas quotas da referida sociedade, conforme consta da certidão permanente junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
3 – Encontra-se inscrita no registo comercial da sociedade A... L.da., NIPC ..., pela inscrição 5 – Ap. ..., a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade A... L.da., conforme consta da certidão permanente do registo comercial junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
4 – Encontra-se inscrita no registo comercial da sociedade A... L.da., NIPC ..., pela inscrição 6 – Of. 1 da Ap. ..., o cancelamento da matrícula da sociedade A... L.da., conforme consta da certidão permanente do registo comercial junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
5 – O registo da dissolução e liquidação da sociedade A... L.da. foi efetuado com base na Ata n.º 8 da reunião realizada em 14/08/2020 da Assembleia Geral da sociedade A... L.da., com a presença da sócia BB, titular das duas quotas da sociedade que representam a totalidade do capital social, a qual deliberou a aprovação por unanimidade da dissolução da sociedade, tendo ainda sido aprovado por unanimidade a declaração de encerramento da liquidação, por inexistência de ativo e passivo, tudo conforme consta da cópia da referida ata junta a fls. 158 a 162 pela Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia”,
E se decidiu julgar a mencionada exeção procedente, absolvendo a 1ª Ré da instância.
ii) Quanto à “Exceção de ilegitimidade passiva da ré BB; exceção de ineptidão da petição inicial”, concluindo:
“Conclui-se, assim, que face à existência de vários pedidos e diferentes causas de pedir, a ré BB é parte legítima na ação, nomeadamente, quanto ao pedido de condenação no pagamento da quantia de € 5.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela autora, em consequência das condutas que lhe são imputadas pela autora na petição inicial”,
iii) Mais tendo decidido “Pelo exposto, julgo manifestamente improcedente o pedido deduzido nesta ação, de condenação (fundada na responsabilidade solidária desta ré com a sociedade empregadora A... L.da.) da ré BB no pagamento da quantia de € 7.550,08 respeitante a salários em atraso, férias não gozadas, subsídio de férias e proporcionais de férias e subsídios de férias e de natal devidos e não pagos pela ré sociedade A... L.da., e respeitante à indemnização devida pela sociedade A... L.da pela resolução do contrato com justa causa efetuada pela autora, fundado nos factos alegados na petição inicial), absolvendo a ré BB de tal pedido.
Custas na proporção do valor deste pedido (€ 7.550,08) a cargo da autora.”.
iv) Não admitiu a reconvenção;
v) Determinou-se o prosseguimento da ação no que se reporta ao pedido de condenação da 2ª Ré no pagamento da quantia de € 5.000,00 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos pela autora, tendo-se procedido à identificação do objeto do litígio e indicação dos temas da prova.

Realizada a audiência de discussão e julgamento foi proferida sentença, que julgou a ação improcedente, absolvendo a Ré[1] do pedido.

Inconformada, a A. recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
“1.ª) Por terem relevância para a compreensão da motivação da recorrida (intencionalidade delituosa ou mobbing) ao praticar os factos dados como provados na sentença recorrida, devem ser também dados como provados os seguintes factos
- A Ré na audiência de partes realizada em 1.10.2020 declarou ter salários por pagar à Autora. (ata de fls--.dos autos)
- Que a Ré, enquanto titular da totalidade do capital social da sociedade identificada no ponto 1) dos factos provados, deliberou em assembleia geral realizada em 14.08.2020, dissolver aquela sociedade e proceder ao encerramento da liquidação da mesma por inexistência ativo e passivo; (ata da assembleia geral junta a fls. dos autos)
- A Ré procedeu ao registo comercial de dissolução, liquidação e extinção daquela sociedade em 16 de agosto de 2020. (certidão do registo comercial junta a fls. dos autos)
2.ª) Do confronto destes factos com o factos dados como provados na sentença recorrida é possível extrair um plano desenhado pela recorrida para perturbar a recorrente, intimidando-a e hostilizando-a no seu posto de trabalho para que ela acabasse por denunciar o contrato de trabalho e permitir-lhe que dissolvesse a sociedade A... Lda. entidade patronal, como veio a fazer.
3.ª) Na verdade, a recorrida, logo que foi decretado o Estado de Emergência, abandonou o país, deixando à sua sorte os seus trabalhadores e que ignora o quadro normativo adoptado pelo Estado Português durante o Estado de Emergência, durante o Estado de Calamidade e o Estado de Alerta, nomeadamente o constante do D.L. 10-G/2020, de 26 de março - que protegia os postos de trabalhos e proibiu o despedimento dos trabalhadores e decide:
- Abandonar Portugal;
- Não pagar os salários;
- Cancela o seguro de saúde da recorrente e dos filhos;
- Determina-lhe que devolva os contactos com os fornecedores e que entregue todos os documentos à contabilista (testemunha inquirida em sede de julgamento);
- No dia 29 de junho, data em que a recorrente regressa ao local de trabalho, depois da licença para estar em casa a acompanhar os filhos menores de 12 anos, impôs um horário com início às 9h00m, e saída à 1h00m do dia seguinte, com interrupção das 12h00m até às 18h00m (quando os estabelecimentos de venda de comida em mercados, como era o caso da loja do mercado ... onde a autora trabalhava, por força dos artigos 12.º n.º 2 e 17.º n.º 1 alínea c) da Resolução do Conselho de Ministros 51-A/2020, de 26 de junho, apenas permitia a abertura do mercado às 10h00m e a proibição de admissibilidade de clientes a partir das 23h00m ).
- E que sabia que o mercado encerrava às 23 horas, hora a partir da qual ninguém podia nele permanecer.
- Que não pagou salários, nem a sociedade de que era detentora da totalidade do capital, da recorrente;
- Que fez seu o subsídio de apoio do Estado, desde abril a julho, quando sabia que era para entregar à recorrente para cuidar dos filhos menores de 12 anos, QUIS intimidade, hostilizar, humilhar e vexar a recorrente.
4.ª) É indigno impor ao trabalhador, em plena pandemia, que se desloque para a loja de venda de comida num mercado, a uma hora em que é proibido a abertura ao publico e aí permaneça quando já não é admissível receber clientes;
5.ª) É indigno para o trabalhador saber que o Estado, durante a situação de estado de emergência, de calamidade e de alerta, entregou à entidade patronal subsídio para ajuda no pagamento do salário daquele e esta fê-lo seu, não pagando o salário.
6.ª) Tal atitude é ética e moralmente reprovável.
7.ª) Levando a recorrente à doença.
8.ª) E a denunciar o contrato, fim pretendido pela recorrida para poder dissolver e extinguir a sociedade A... Lda. entidade patronal
9.ª) Estão preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do assédio moral previsto no artigo 29.º n.º 1 e 4 do Código do Trabalho.
10.ª) A quantia de 5.000,00 € peticionada a título de indemnização, face à gravidade dos factos, é equilibrada e justa, dentro do princípio da equidade, para ressarcir a pessoa da recorrente.
11.ª) O tribunal recorrido ao ter entendimento diverso fez incorreta aplicação da lei e do direito, violando as normas jurídicas previstas no artigo 29.º n.º 1 e 4 do Código do Trabalho e ainda e os artigos 483.º n.º 1, 487.º, 496.º, 562.º e 563.º todos do C.C.
TERMOS EM QUE deve ser julgada procedente, por provada, a presente apelação e a final ser proferido acórdão que, revogando a sentença recorrida, julgue a ação provada e procedente condenando a recorrida a pagar à recorrente a quantia de 5.000,00 € acrescida de juros de mora após a citação.”

A Recorrida contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
“I. O que está em causa no presente processo são simplesmente 5 dias de trabalho da ora Recorrente, isto é, entre o dia 01.07.2020 e o dia 05.07.2020, sendo que para aquela o exercício das funções no horário determinado pela Recorrida ao abrigo do poder de direção e organizativo configura uma situação de assédio laboral, o que não se concede.
II. Conforme resulta da matéria de facto provada, no dia 29 de junho de 2020, data em que terminou o período de tempo em que a Recorrente podia ficar em casa para apoio aos filhos menores de doze anos, a Recorrida determinou à Recorrente que fizesse o seguinte horário de trabalho a partir do dia 01.07.2020: de quarta-feira a domingo, com início às 9h até às 12h e das 18h às 23h, com interrupção das 12h até às 18h.
III. Importa chamar a atenção para o facto de que não se provou que o incómodo alegadamente sentido pela Recorrente tenha levado esta a recorrer a ajuda médica, porquanto os certificados de incapacidade temporária para o trabalho juntos aos autos a fls. 190 v.º a 193 nada revelam quanto a essa circunstância, e menos ainda a prova testemunhal.
IV. A alteração do horário de trabalho promovida pela Recorrida não integra uma situação de assédio laboral, pois é feito ao abrigo do poder de direção perfeitamente legítimo para além de ter sido imediatamente conformado quando alertada pela própria Recorrente quanto às restrições da COVID-19 que não eram do seu inteiro conhecimento por ser estrangeira e não se encontrar naquele momento no país.
V. A Recorrente não coloca em causa o ponto e) da matéria de factos não provados, ou seja, “A R. tenha querido intimidar a A., perturbá-la na sua dignidade, causando instabilidade emocional, obrigando-a a recorrer a apoio médico.”
VI. Salvo melhor entendimento, para que possa existir assédio laboral terão de existir comportamentos humilhantes, vexatórios, atentatórios da dignidade da Recorrente o que manifestamente não foi o caso, e a própria Recorrente concorda ao não pretender ver aditado à matéria de facto provada o referido ponto.
VII. Desta forma, não poderá existir qualquer assédio laboral pois a circunstância dada como não provada é um ponto assente e que não foi colocado em crise pela Recorrente.
VIII. Compete ao empregador estabelecer os termos em que o trabalho deve ser prestado, dentro dos limites decorrentes do contrato e das normas que o regem – artigo 97º, do CT.
IX. Uma das manifestações desse poder diretivo, e que pode verificar-se ao longo de todo o contrato, é o “jus variandi”, designado no CT por “mobilidade funcional”.
X. No entanto, nos presentes autos não se verifica qualquer situação de mobilidade funcional, porquanto do contrato de trabalho firmado entre a Recorrente e a A..., Ld.ª em 5 de dezembro de 2017, a aqui Recorrente foi contratada com a categoria de “Empregada de Bar”, não se tendo provado que alguma vez haja desempenhado as funções de gerente e, por via destas, dever ser remunerada em conformidade, estando previsto na cláusula 5.ª do contrato de trabalho a obrigatoriedade da Recorrente preparar e servir “bebidas e pequenas refeições”, bem como “preparar semi-produtos utilizados na preparação e decoração de bebidas e pequenas refeições” e “preparar bebidas, aperitivos e pequenas refeições, misturando, confecionado e decorando, em tempos e quantidades adequados, por processos manuais ou mecânicos.”
XI. Não se pode, assim, concluir que tenha existido uma atitude persecutória, por parte da Recorrida, e nem concluir pela existência de comportamentos daquela, real e manifestamente, humilhantes, vexatórios e atentatórios da dignidade desta.
XII. Por outro lado, não está demonstrado que a Recorrida tenha praticado uma sequência de comportamentos encadeados que, para além de atentatórios da dignidade da Recorrente, se traduziram num ambiente intimidativo, hostil e desestabilizador, com o objetivo de lhe causar perturbação e constrangimento.
XIII. Eventuais situações de perturbação, stress, emoção e sentimentos de tristeza resultantes de constrangimentos laborais, não são de considerar assédio laboral, uma vez que são o resultado do exercício legítimo do poder hierárquico, diretivo e organizacional da Recorrida.
XIV. Competia, assim, à Recorrente alegar e provar os facos integradores e constitutivos do direito por si invocado, ou seja, de que fora vítima de “assédio moral” não discriminatório por parte da Recorrida, como era, aliás, seu ónus, nos termos do artigo 342º, n.º 1, do Código Civil, o que manifestamente não fez.
XV. Por fim, também não provou a Recorrente, que tenham ocorrido comportamentos por parte da Recorrida que, de forma intensa e inequívoca, hajam infringido os valores protegidos pelo artigo 29º, do CT, ou seja, que tivessem tido como efeito a sua perturbação ou constrangimento, de modo a afetar a sua dignidade ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
Nestes termos e nos melhores de Direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, deverá manter-se a decisão proferida pelo tribunal a quo, julgando improcedente o recurso interposto pela Recorrente.”.

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, ao qual as partes não responderam.

Colheram-se os vistos legais.
***
II. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância:
A. Na sentença recorrida, a 1ª instância proferiu a seguinte decisão sobre a matéria de facto:
Os factos provados:
Atenta a prova produzida, considero provada, com relevo para a decisão da causa, a seguinte factualidade:
1) A A. e A..., Ld.ª celebraram, em 5 de dezembro de 2017, um contrato de trabalho a termo, pelo período de doze meses, por via do qual a primeira obrigou-se perante a segunda a prestar as tarefas contratadas, contra o pagamento da remuneração mensal ilíquida de € 693,32, conforme resulta de fls. 9 a 10 v.º dos presentes autos;
2) A A. só de quando em vez desempenhava funções no período noturno;
3) A R., sócia e única gerente da A..., Ld.ª, após ser decretado o Estado de Emergência por causa da Covid19, até julho de 2020 não mais voltou à loja onde a A. desempenhava as suas funções, saiu de Portugal, deixando de comparecer na sede da A..., Ld.ª, onde tinha o estabelecimento comercial;
4) A R. cancelou o seguro de saúde da A. e dos filhos desta, que lhes havia sido atribuído pela A..., Ld.ª;
5) A R. determinou à A. que devolvesse os números de telefone de fornecedores e que entregasse todos os documentos de contabilidade ao contabilista certificado;
6) No dia 29 de junho de 2020, data em que terminou o período de tempo em que a A. podia ficar em casa para apoio aos filhos menores de doze anos, a R. determinou à A. que fizesse o seguinte horário de trabalho: de quarta-feira a domingo, com início às 9h e saída à 1h do dia seguinte, com interrupção das 12h até às 18h;
7) A R. sabia que o local onde a A. trabalhava - Mercado da ... - encerrava às 23h, hora a partir da qual não podia ninguém nele permanecer;
8) Foi a A. que, após a fixação daquele horário, deu conta à R. daquela proibição resultante das medidas de confinamento para os estabelecimentos de comida;
9) A R. determinou que a A. procedesse à limpeza das instalações do espaço, que fizesse comida para congelar, nomeadamente croquetes;
10) A A. nunca havia confecionado croquetes, pois estes eram adquiridos, feitos, na Holanda;
11) A R., confrontada pela A. com as normas adotadas pelo Estado durante o Estado de Calamidade, fixou o horário da A. das 9h às 12h e das 18h às 23h;
12) Foi atribuída à A., pelo médico de família, incapacidade para o trabalho por doze dias, de 8 de julho de 2020 até 19 de julho de 2020, que lhe foram renovados por mais quinze dias, de 20 de julho de 2020 até 3 de agosto de 2020;
13) Entre abril e julho de 2020 a A..., Ld.ª recebeu do Estado apoio social para permitir que a A. ficasse em casa a cuidar dos filhos menores de doze anos, valor esse que se destinava a complementar o salário da A.;
14) Apesar de a R. saber que tinha de pagar parte do salário através daquele subsídio, recebeu este valor e não o entregou à A.; 15) A A., por carta datada de 3 de agosto de 2020 e cuja cópia consta de fls. 11 dos autos, resolveu, com efeitos imediatos, o contrato de trabalho que tinha com a R.
Factos não provados:
Com relevo para a decisão da causa, nada mais foi dado como provado, designadamente que:
a) A A., a partir de março de 2018, tenha exercido as funções de gerente de loja;
b) A R. tenha retirado à A. as funções de gerente de loja;
c) O mercado onde a A. trabalhava só abrisse ao público às 12h;
d) A A., antes do descrito em 9), nunca tenha procedido à limpeza do espaço em causa;
e) A R. tenha querido intimidar a A., perturbá-la na sua dignidade, causando instabilidade emocional, obrigando-a a recorrer a apoio médico.”
*
B. Aquando do despacho saneador, conforme referido no relatório do presente acórdão, para a apreciação da questão da “Exceção de falta de personalidade judiciária – indevidamente qualificada como ilegitimidade passiva − da ré A... L.da”, a 1ª instância deu como assente a seguinte factualidade, que ora se adita aos factos provados sob os nºs 16, 17, 18,19 e 20:
“16. A autora AA instaurou em 3 de setembro de 2020 a presente ação contra as rés A... L.da. e BB.
17. Conforme inscrição efetuada pela Ap. ... de 20180810 no registo comercial da sociedade A... L.da., das alterações ao contrato de sociedade, a ré BB é a única titular das duas quotas da referida sociedade, conforme consta da certidão permanente junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
18. Encontra-se inscrita no registo comercial da sociedade A... L.da., NIPC ..., pela inscrição 5 – Ap. ..., a dissolução e encerramento da liquidação da sociedade A... L.da., conforme consta da certidão permanente do registo comercial junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
19. Encontra-se inscrita no registo comercial da sociedade A... L.da., NIPC ..., pela inscrição 6 – Of. 1 da Ap. ..., o cancelamento da matrícula da sociedade A... L.da., conforme consta da certidão permanente do registo comercial junta a fls. 169 a 172 do suporte físico do processo, que aqui se dá por reproduzida.
20. O registo da dissolução e liquidação da sociedade A... L.da. foi efetuado com base na Ata n.º 8 da reunião realizada em 14/08/2020 da Assembleia Geral da sociedade A... L.da., com a presença da sócia BB, titular das duas quotas da sociedade que representam a totalidade do capital social, a qual deliberou a aprovação por unanimidade da dissolução da sociedade, tendo ainda sido aprovado por unanimidade a declaração de encerramento da liquidação, por inexistência de ativo e passivo, tudo conforme consta da cópia da referida ata junta a fls. 158 a 162 pela Conservatória do Registo Comercial de Vila Nova de Gaia.”
***
III. Fundamentação

1. O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões formuladas pelo recorrente, não sendo lícito ao tribunal ad quem conhecer de matérias nelas não incluídas, salvo porém as matérias que sejam de conhecimento oficioso, (arts. 635, nº 4, e 639º, nº 1, do CPC aprovado pela Lei 41/2013, de 26.06, aplicável ex vi do art. 1º, nº 2, al. a), do CPT aprovado pelo DL 295/2009, de 13.10, alterado, designadamente, pela Lei 107/2019).
Assim, são as seguintes as questões suscitadas pela Recorrente:
- Aditamento de factualidade à decisão da matéria de facto provada;
- Da existência de assédio moral e da indemnização por danos não patrimoniais.

2. Do aditamento de factualidade à decisão da matéria de facto provada

Pretende a Recorrente que seja aditada à matéria de facto provada o seguinte:
i) A Ré na audiência de partes realizada em 1.10.2020 declarou ter salários por pagar à Autora, o que fundamenta na ata da audiência de partes;
ii) Que a Ré, enquanto titular da totalidade do capital social da sociedade identificada no ponto 1) dos factos provados, deliberou em assembleia geral realizada em 14.08.2020, dissolver aquela sociedade e proceder ao encerramento da liquidação da mesma por inexistência ativo e passivo, o que fundamenta na ata da assembleia geral junta aos autos.
iii) A Ré procedeu ao registo comercial de dissolução, liquidação e extinção daquela sociedade em 16 de agosto de 2020, o que fundamenta na certidão do registo comercial junta aos autos.
Quanto à pretensão referida em i), como consta do relatório do presente acórdão, a Ré, na audiência de partes, declarou que “há alguns salários por pagar, mas que necessita de verificar com a sua contabilista os valores, pelo que não é possível obter neste momento entendimento.”
Assim, tem-se como assente, o que se adita à matéria de facto provada sob o nº 21, o seguinte:
21. Na tentativa de conciliação que teve lugar na audiência de partes, a Ré declarou o seguinte: “que há alguns salários por pagar, mas que necessita de verificar com a sua contabilista os valores, (…)”.

Quanto à pretensão referida nas als. ii) e iii) já ela decorre dos nºs 16 a 20 dos factos acima aditados (no ponto II.B).

3. Da existência de assédio moral e da indemnização por danos não patrimoniais

A A., alegando ter sido vítima de assédio moral, reclamou o pagamento da quantia de €5.000,00 a título de indemnização por danos não patrimoniais.
Na sentença recorrida considerou-se, por um lado, que a matéria de facto provada não consubstancia situação de assédio e por outro que não se provou que “a incapacidade temporária para o trabalho da A. tenha estado relacionada com aquela situação” (invocando o acórdão desta Relação de 01.07.2013, publicado na CJ de 2013, TIII, pág.216/217).
A Recorrente, discordando do decidido, alega no recurso que o comportamento da Ré constante da decisão da matéria de facto provada constitui “uma atitude persecutória, hostil, vexatória e antiética, dirigida pela R. à A., de forma contínua e persistente. E teve como fim ostracizar, isolar e desprezar a A. levando-a a recorrer a apoio médico”, concluindo ser o mesmo indigno e ética e moralmente reprovável, levando a A. à doença e a resolver o contrato de trabalho, este o fim pretendido pela Ré e que “9.ª) Estão preenchidos os elementos objectivos e subjectivos do assédio moral previsto no artigo 29.º n.º 1 e 4 do Código do Trabalho. 10.ª) A quantia de 5.000,00 € peticionada a título de indemnização, face à gravidade dos factos, é equilibrada e justa, dentro do princípio da equidade, para ressarcir a pessoa da recorrente.”

Dispõe o art. 29º do Código do Trabalho aprovado pela Lei 7/2009, de 12.02, com a redação introduzida pela Lei 73/2017, de 16.08, que:
1 - É proibida a prática de assédio.
2 - Entende -se por assédio o comportamento indesejado, nomeadamente o baseado em fator de discriminação, praticado aquando do acesso ao emprego ou no próprio emprego, trabalho ou formação profissional, com o objetivo ou o efeito de perturbar ou constranger a pessoa, afetar a sua dignidade, ou de lhe criar um ambiente intimidativo, hostil, degradante, humilhante ou desestabilizador.
3 – (….)
4 - A prática de assédio confere à vítima o direito de indemnização, aplicando-se o disposto no artigo anterior.
5 - A prática de assédio constitui contraordenação muito grave, sem prejuízo da eventual responsabilidade penal prevista nos termos da lei.
6 – (…)
E, por sua vez, dispõe o art. 28º do mesmo diploma que “[a] prática de ato discriminatório lesivo de trabalhador ou candidato a emprego confere-lhe o direito a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais de direito.
O assédio é um comportamento ilícito suscetível de gerar o direito a uma indemnização pelos danos, patrimoniais e não patrimoniais, que dele resultem. Mas, afigura-se-nos que, como decorre do citado art. 28º, bem como das regras gerais de direito, não basta, para que o assédio confira o direito a indemnização, a prática desse comportamento ilícito. É necessário, também, que ocorra um dano e que este seja consequência desse comportamento (nexo causal entre o comportamento e o dano).
É o que, expressamente, decorre do mencionado art. 28º, que não confere um direito a indemnização como consequência imediata ou automática do assédio, pois que o que é ressarcível é o dano que seja dele decorrente.
E é isso que, também, decorre das regras gerais, quais sejam, relativamente à constituição do direito à indemnização, o art. 483º, nº 1, do Cód. Civil, nos termos do qual “1. Aquele que, com dolo ou culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação.” Ou seja, para além de um comportamento ilícito ou violador de disposição legal que proteja o direito de alguém e da existência de dolo ou culpa, constituem também requisitos indispensáveis do direito à indemnização a existência de um dano e o nexo de causalidade entre este e o comportamento.
Diga-se que a responsabilidade indemnizatória consagrada no art. 29º, nº 4, não tem uma função ou natureza punitiva, que se verifique apenas como decorrência da existência de assédio moral e que dispense os requisitos da responsabilidade civil previstos no art. 483º do CC, mormente a existência de dano. Tem sim natureza indemnizatória, enquadrável no citado art. 483º, sendo que a função meramente punitiva do comportamento é assegurada pelo art. 29º, nº 5, do CT/2009.
É certo que o assédio moral ou mobbingé, ou pode ser, uma conduta pluriofensiva: a criação de um ambiente hostil, degradante, humilhante, para o trabalhador, seja tal criação intencional ou não, viola, em primeiro lugar, a personalidade do trabalhador, a sua dignidade como pessoa ou até, como dizem alguns autores, a sua dignidade como uma pessoa que trabalha, a sua dignidade profissional, verificando-se, amiúde a violação de outros direitos (como por exemplo o direito à saúde). A violação do direito geral de personalidade do trabalhador e da sua personalidade não são apenas ilícitas, mas são suscetíveis de produzir um dano não patrimonial mesmo que não haja lesões à saúde física ou mental do trabalhador ou danos patrimoniais”, como diz Júlio Gomes, Algumas Reflexões sobre a Evolução Recente do Conceito Jurídico de Assédio Moral (Laboral), em Prontuário de Direito do Trabalho, CEJ, nº 90, 2011, pág. 84,.
Ou seja, pese embora a violação, pelo assédio, do bem jurídico da dignidade e personalidade do trabalhador, é necessário, para que se verifique o direito indemnizatório, que ocorra um dano, embora não sendo o dano não patrimonial recondutível apenas à ocorrência de lesão física ou psíquica do trabalhador, não sendo a depressão nervosa e outras perturbações psíquicas um pressuposto necessário do ressarcimento, sendo que outros danos (não patrimoniais) poderão existir suscetíveis de o determinarem.
Com efeito, outros danos, que não necessariamente o dano biológico, poderão determinar tal ressarcibilidade, designadamente o dano existencial. Ana Cristina Ribeiro Costa, Notas sobre o ónus da prova e danos morais no assédio: caminhos a desbravar, in https://www.stj.pt/wp-content/uploads/2017/10/int_ana_costa.pdf [2], reportando-se ao dano existencial, págs. 25/26, refere que “[e]ste último foi criado como consequência de se julgarem insuficientes o dano biológico e o dano moral para dar resposta ressarcitória às manifestações do mobbing menos nocivas para a saúde, mas ainda assim lesivas da dignidade da pessoa. Assim, o dano existencial prescinde da prova de lesões concretas (exigível pelo dano biológico) e da capacidade reditícia do individuo, respeitando a todas as outras consequências danosas intrínsecas, como a perda da autoestima, perda de confiança na própria capacidade de adaptação e de reação aos desafios, otimismo nos projetos para futuro, redução da qualidade de vida e repercussões no âmbito familiar. O ónus da prova deste dano existencial é da vítima, que deve demonstrar que teve este dano, não sendo ressarcível uma mera alteração pontual do quotidiano, mas apenas aquela que incida de modo sensível no standard de vida do sujeito. Em suma, o que se visa tutelar é uma dimensão do dano que se revela independentemente da maior ou menor “robustezdo trabalhador e da sua capacidade de “escapar” sem danos à sua saúde física e mental”, citando a autora Júlio Gomes, em ob. mencionada, p. 86. [sublinhado nosso]
Ora, no caso e mesmo que, porventura, o comportamento da Ré pudesse, eventualmente, consubstanciar o alegado assédio moral, a verdade é que da matéria de facto provada não resulta a existência de qualquer dano não patrimonial, seja ele biológico, moral ou existencial, sofrido pela A., assim como não resulta o nexo causal entre eventuais danos e o comportamento da Ré.
Com efeito, por um lado e tendo em conta a parte final da al. e) dos factos não provados, que não foi impugnado pela A., não fez esta a prova de que a baixa médica haja decorrido ou sido determinada pelo comportamento da Ré, pelo que a alegação no recurso de que o comportamento desta a levou a ter que se socorrer de apoio médico não tem respaldo na matéria de facto provada; e, por outro lado, nenhum ouro facto decorre da matéria de facto provada suscetível de se configurar como um dano não patrimonial, designadamente existencial, nada decorrendo, designadamente, quanto ao estado de espírito ou sentimentos (por exemplo, vergonha, humilhação, alterações no seu quotidiano ou nas suas relações familiares) e/ou outro.
Ou seja, a A. não fez prova de dois dos requisitos indispensáveis à indemnização pelos danos não patrimoniais, que reclama, quais sejam a existência de danos e o nexo de causalidade entre os (eventuais) danos e o comportamento ilícito (assédio moral) que imputa à Ré, sendo que sobre ela, Autora, recaía o ónus de alegação e prova de tais requisitos por serem constitutivos do direito à indemnização de que se arroga titular – art. 342º, nº 1, do Cód. Civil.
Ora, assim sendo, tanto basta para que seja negado provimento ao recurso, sendo certo que o interesse a tutelar consistia nessa pretendida reparação indemnizatória por danos não patrimoniais e mostrando-se, por consequência, prejudicada a questão de saber se o comportamento da Ré consubstanciaria, ou não, o alegado assédio moral. É que, mesmo que, porventura e como hipótese de raciocínio, se entendesse que ele se verificaria, pelas razões já acima apontadas sempre soçobraria a pretensão da A. à indemnização reclamada.
Assim sendo, improcede o recurso.
***
IV. Decisão

Em face do exposto, acorda-se em julgar o recurso improcedente, confirmando-se a sentença recorrida.

Custas pela Recorrente.

Porto, 27.02.2023
Paula Leal de Carvalho
Rui Penha
Jerónimo Freitas
______________
[1] De ora em diante, quando nos reportarmos à Ré, estamos a referir-nos apenas à Ré BB.
[2] Texto que corresponde a uma súmula do estudo que foi apresentado no âmbito do IX Colóquio sobre o Direito do Trabalho, subordinado ao tema «Assédio na relação laboral», organizado pelo Supremo Tribunal de Justiça e pela APODIT, em 18.10.2017