Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1397/19.4T8MAI.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: TRANSMISSÃO DE ESTABELECIMENTO
EMPRESA DE SEGURANÇA PRIVADA
IDENTIDADE DE UMA ENTIDADE ECONÓMICA
DESPEDIMENTO ILÍCITO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
ÓNUS DA PROVA
Nº do Documento: RP202201171397/19.4T8MAI.P1
Data do Acordão: 01/17/2022
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; CONFIRMADA A SENTENÇA
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - A mera circunstância de a actividade exercida pelas Rés (empresas de segurança privada que se sucedem na prestação de serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente) serem semelhantes, senão mesmo idênticas, não permite concluir pela manutenção da identidade de uma entidade económica.
II - Uma entidade não pode ser reduzida à actividade de que está encarregada, a sua identidade resulta de uma multiplicidade indissociável de elementos como o pessoal que a compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração ou ainda, sendo caso disso, os meios de exploração à sua disposição.
III - A identidade de uma entidade económica, como a que está em causa nos autos, que assenta essencialmente na mão-de-obra, não pode ser mantida se o essencial dos seus efectivos não for retomado pelo presumido cessionário.
IV - Não ocorre uma situação de transmissão de estabelecimento e, consequentemente, tenha aplicação o regime jurídico previsto no art. 285º, do CT/ 2009, quanto aos seus efeitos, quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da actividade susceptível de consubstanciar uma “unidade económica” do estabelecimento.
V – Assim, não tendo ocorrido a transmissão de empresa ou estabelecimento ou de parte de empresa ou estabelecimento é de considerar como despedimento ilícito a comunicação endereçada pela Ré/empregadora ao A./trabalhador, que, na sequência da adjudicação da prestação de serviços de vigilância privada a outra empresa, o informa que o respectivo contrato de trabalho é automaticamente transmitido para a entidade que lhe irá suceder na referida prestação de serviços.
VI – Se na sequência daquela comunicação o A./trabalhador sofrer danos ao nível da sua integridade moral e do bem estar físico, que afectem a sua realização pessoal através do trabalho, bem com a tranquilidade do seu sono, afectando a sua capacidade de se regenerar quer física quer emocionalmente, há que concluir que aqueles se revestem da gravidade bastante para justificar a tutela do direito.
VII – E, assim, quando ocorra a violação de um qualquer dever contratual por parte do empregador, designadamente a violação da prestação efectiva de trabalho, vale a regra ínsita no art. 799°, n° 1, do CC, o que significa que, demonstrados os comportamentos que configuram, na sua materialidade, violação de deveres contratuais imputados ao empregador (cuja prova, nos termos do art. 342°, n° 1, do mesmo código, compete ao trabalhador), a culpa do mesmo presume-se, havendo de ter-se por verificada, caso a presunção não seja ilidida pelo empregador e, consequentemente deve ele ser condenado a indemnizar o trabalhador, a título de danos não patrimoniais sofridos.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. nº 1397/19.4T8MAI.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto, Juízo do Trabalho da Maia - Juiz 1
Recorrente: AA…, SA.
Recorridos: BB… e CC…, S.A.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
O A., BB…, NIF ………, residente na Rua …, nº …, Habitação ., ….-… …, Maia, instaurou acção declarativa, com processo comum contra “AA…, SA”, pessoa colectiva nº ………, com sede na Rua …, nº ., …, ….-… Linda-A-Velha e “CC…, S.A.”, pessoa colectiva nº ………, com sede na Avenida …, fracção A, com entrada pelos nºs …, …, …, ….-… Lisboa, pedindo que, “seja considerada procedente e provada a presente acção e, em consequência:
1 – A 1ª Ré ser condenada a reconhecer o A. como seu trabalhador;
2 – A declarar ilícito o despedimento do autor, realizado pela 1ª Ré e, em consequência
3 – A reintegrar o Autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade ou, subsidiariamente, caso o Tribunal exclua a sua reintegração, a pedido da 1ª Ré, nos termos do disposto no artigo 392º, do CT, a pagar-lhe uma indemnização determinada entre 30 a 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, que se computa entre € 8.853,47 e € 17.706,94, acrescida de juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
4 – A 1ª ré seja condenada a pagar ao A. as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declara a ilicitude do despedimento que, nesta data, ascendem à quantia de €1.655,42, acrescida de juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
5 – A 1ª Ré seja condenada a pagar ao Autor o montante de €10.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescido de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal supletiva (4%) e contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
6 – A 1ª Ré seja condenada a pagar ao Autor a quantia diária de € 200,00 por cada dia de atraso, a título de sanção pecuniária compulsória.
Subsidiariamente, e caso se entenda que se operou a transmissão do contrato de trabalho do Autor para a 2ª Ré, deverá ser condenada:
1 - A reconhecer o Autor como seu trabalhador;
2 - A declarar ilícito o despedimento do autor, e, em consequência
3 – A reintegrar o Autor no seu posto de trabalho, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade ou, subsidiariamente, caso o Tribunal exclua a sua reintegração, a pedido da 2ª Ré, nos termos do disposto no artigo 392º, do CT, a pagar-lhe uma indemnização determinada entre 30 a 60 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo ou fracção de antiguidade, que se computa entre € 8.853,47 e € 17.706,94, acrescida de juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
4 – A pagar ao A. as retribuições que deixou de auferir desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declara a ilicitude do despedimento que, nesta data, ascendem à quantia de €1.655,42, acrescida de juros de mora contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
5 – A pagar ao Autor o montante de €10.000,00 a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescido de juros de mora vincendos, calculados à taxa legal supletiva (4%) e contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;
6 – A pagar ao Autor a quantia diária de € 200,00 por cada dia de atraso, a título de sanção pecuniária compulsória.”.
Fundamenta a sua pretensão alegando, em síntese, que foi admitido ao serviço da 1ª Ré “AA…” no dia 04 de Maio de 2006, para desempenhar as funções de vigilante, mediante a retribuição base actual mensal de € 694,39 e que prestava essas funções nas instalações pertencentes a uma cliente da sua entidade patronal denominada “DD…, SA”, sitas na Rua …, ….-… em …, Maia, no âmbito de um contrato de prestação de serviços entre estas duas entidades.
Mais, com data de 24/01/2019, a 1ª Ré “AA…”, comunicou ao Autor que na sequência da adjudicação desta prestação de serviços à sociedade comercial denominada “CC…, S.A.”, aqui 2ª Ré, com efeitos a partir de 01 de Fevereiro de 2019, o contrato de trabalho, a partir desta data, seria transmitido a esta última, passando o Autor com a manutenção do seu posto de trabalho a ter esta última empresa como empregadora.
No dia 01 de Fevereiro de 2019, o aqui Autor e demais colegas de trabalho, compareceram nas instalações pertencentes à DD…, SA, em …, Maia, onde até então exerciam as suas funções de vigilância, afirmando querer continuar a exercer essas funções, tendo no local um representante da sociedade DD…, S.A. comunicado que não eram trabalhadores da 2ª Ré, “CC…”, que não estavam autorizados a exercer funções naquelas instalações e que a sua empregadora era a empresa “AA…, S.A.”, aqui 1ª Ré e que não havia trabalho para eles.
Surpreendidos com tal cenário, logo procuraram explicações junto da 1ª Ré, através dos seus superiores hierárquicos, que resultaram infrutíferas e tentaram ainda obter explicações junto da 2ª Ré, “CC…”, tendo esta reiterado a informação que não eram seus trabalhadores e que não havia trabalho para eles na cliente DD…, S.A.
Quer o autor quer os seus colegas de trabalho continuaram a apresentarem-se no local de trabalho, mas todas as tentativas de exercerem as funções para os quais foram contratados resultaram infrutíferas, tendo por duas vezes chamado a GNR ao local, apresentou participação junto da ACT e solicitaram ainda por escrito às duas RR. instruções do local, dia e hora onde deveriam prestar o concurso do seu trabalho.
Só obtiveram resposta por parte da 2ª Ré que reafirmou que os contratos de trabalho não haviam sido transmitidos para esta empresa e que a sua entidade empregadora era a “AA…”, aqui 1ª Ré.
A partir do dia 01/02/2019 o aqui Autor encontra-se impedido de prestar o concurso do seu trabalho, por decisão unilateral da sua entidade empregadora, sem auferir qualquer vencimento, sem auferir um qualquer subsídio e sem que lhes procedam aos descontos para a Segurança Social, com graves repercussões na sua carreira contributiva.
Invoca ainda o A. que a 1ª Ré manifestou de forma inequívoca a sua intenção de não manter o Autor ao seu serviço e a 2ª Ré, de forma inequívoca, declinou assumir a continuidade da relação laboral com o Autor, tendo-se verificado o despedimento de facto do Autor e que é ilícito por não ter sido precedido do respectivo procedimento, tendo o Autor direito à indemnização por todos os danos patrimoniais causados, bem como à sua reintegração no estabelecimento da Ré, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade, tendo ainda direito a exigir, como exige o pagamento das retribuições que deixou de auferir desde o despedimento e até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude, sem prejuízo das deduções previstas no nº2 do art.390º do CT.
Alega, também, que devido à conduta da entidade empregadora no período que mediou o despedimento (01/02/2019) e 15 de Abril de 2019 está privado de qualquer rendimento, nomeadamente, do seu salário e, em consequência directa e necessária do comportamento ilícito da entidade empregadora, sente-se triste e deprimido, vem sofrendo dificuldades em fazer face aos encargos normais da vida doméstica, sente-se humilhado, por se ver forçado a pedir auxílio financeiro a terceiros, sente-se diminuído na sua dignidade e capacidade e sente-se ferido na sua dignidade por se mostrar forçado a bater de porta em porta em procura de trabalho, sendo que a retribuição, por si, auferida era o principal meio de sustento do seu agregado familiar, provocando-lhe uma forte depressão nervosa e perdeu o sono, vendo-se acometido de desespero.
Por fim, alega que, caso se entenda que se operou a transmissão do contrato de trabalho, deverá a 2ª Ré ser condenada a reconhecê-lo como seu trabalhador e em consequência ter ele o direito a exigir da 2ª Ré o mesmo já peticionado relativamente à 1ª Ré.
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Realizada a audiência de partes, não foi possível a sua conciliação, conforme decorre da acta, datada de 16.05.2019, tendo sido ordenada a notificação das Rés para contestarem, o que fizeram, respectivamente, nos termos que constam dos articulados juntos em 20 e 27.05.2019.
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A Ré AA… alega, em síntese, que foi adjudicada à 2.ª Ré o contrato de prestação de serviço de segurança privada no espaço, locais e instalações da DD…, S.A., serviço que se iniciou em 1 de fevereiro de 2019, quando a 2.ª R. começou a prestar a sua actividade no âmbito da aludida adjudicação e, em consequência da referida adjudicação, a 2ª R. assumiu o serviço de vigilância adjudicado até então a si e manteve, na sua essência, as mesmas características em relação àquele que anteriormente vinha a ser prestado.
Mais alegando que, manteve-se a necessidade de alocar o mesmo número de vigilantes e meios afectos à prestação do serviço assegurado à DD…, o modo de exercício da actividade assente na organização e hierarquização do serviço, o local da prestação da actividade é o mesmo e corresponde ao local de trabalho do Autor, o equipamento destinado a controlar o acesso, permanência e saída das instalações de pessoas e bens, afecto ao exercício da actividade de segurança das instalações, não foi alterado.
E que, por carta datada de 21 de janeiro de 2019 informou a 2ª Ré que a partir de 1 de Fevereiro de 2019 o Autor passava a ser trabalhador desta.
Por fim. alega que prestou serviço até às 24h00 do dia 31 de janeiro de 2019, tendo a 2.ª Ré iniciado funções às 00h00 do dia 1 de fevereiro de 2019, inexistindo em qualquer momento interrupção de prestação do serviço de segurança e que o serviço prestado nas instalações da DD…, que foi por via da adjudicação à 2ª Ré transmitido, funcionava como uma verdadeira unidade autónoma de serviço de segurança e vigilância. Razão porque, considera que, com a adjudicação de tais serviços à 2ª Ré, existiu uma transmissão dessa unidade económica.
Conclui que, “deve a presente ação ser julgada improcedente quanto à 1ª Ré, por não provada, com as legais consequências.”.
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A Ré, CC…, alega, em síntese, que a “DD…”, após pesquisa de mercado, tomou a decisão de adjudicar a uma nova entidade a prestação de serviços de vigilância humana nas suas instalações sitas na Maia e na …, no Seixal e contactou a Ré, CC…, no sentido de convidar esta entidade a apresentar uma proposta para a prestação de serviços de segurança nos termos pretendidos. Tendo os serviços de vigilância humana após análise da Proposta apresentada por parte da DD… sido adjudicados à Ré, CC…, através do contrato de prestação de serviços de segurança integrada n.º …/../CO celebrado a 08 de janeiro de 2018 e que começou a produzir efeitos a 01 de fevereiro de 2019, sendo que até então os serviços de vigilância humana nas instalações da DD… eram assegurados pela AA….
Mais, alega que, os serviços de segurança privada e vigilância humana, adjudicados à Ré, CC…, foram, por solicitação da DD…, diferentes dos serviços até então assegurados pela AA…, tendo a “DD…”, em sede de processo negocial, condicionado a adjudicação dos serviços à afectação de uma equipa de vigilantes totalmente diferente da equipa afecta pela AA….
Alega, também, que a Ré “CC…” não recebeu da “AA…” quaisquer elementos necessários para a prossecução dos referidos serviços e que nenhum dos trabalhadores afectos, pela “AA…”, à prestação dos serviços de vigilância para a DD… foi admitido ao serviço da Ré, CC….
A informatização dos serviços de portaria exige que os vigilantes que os executam tenham formação para o efeito.
Refere, ainda, que o “CC…” não recebeu da “AA…” quaisquer meios, instrumentos ou equipamentos necessários para o exercício da actividade de segurança privada e vigilância humana nas instalações da DD… e que para o exercício da sua actividade, os vigilantes da CC… precisam, de fardamento, instrumentos de comunicação, serviços de alarme de ligação à central, dispositivos de transmissão, e demais equipamentos informáticos necessários para a prossecução da actividade que tiveram de ser exclusivamente facultados pela Ré CC….
Tão-pouco recebeu qualquer know-how, experiência, metodologias, processos ou informação, da AA… relativamente à prestação da actividade de segurança privada e vigilância humana para a DD….
A “CC…” teve, igualmente, de fornecer os equipamentos necessários para a instalação e operação do sistema de informatização da portaria.
Alega e defende, por isso, que uma actividade, tal como é a da segurança privada, a não transmissão dos trabalhadores enquanto elemento essencial do negócio da vigilância sempre implicaria a descaracterização do mesmo enquanto unidade económica, e consequentemente a inaplicabilidade do regime legal sobre a matéria.
Desde o primeiro momento, a Ré CC… informou a AA… de que não reconhecia legitimidade à suposta transmissão de estabelecimento, porquanto não estavam preenchidos os respectivos pressupostos legais.
A “CC…” informou o Autor – e os demais trabalhadores da AA… na mesma situação –, que a situação em apreço não reunia as condições necessárias para ser qualificada como uma transmissão de estabelecimento, razão pela qual os respectivos contratos de trabalho permaneceriam com a AA…
Salienta que a AA…, não cumpriu com o procedimento de informação e consulta legalmente obrigatório para uma situação de transmissão de empresa.
Por fim, alega que mesmo a considerar-se que ocorreu a transmissão da unidade económica e que o contrato de trabalho do Autor transitou para a “CC…” jamais poderia considerar-se que o contrato de trabalho cessou por despedimento, dado nunca ter manifestado a vontade de fazer cessar o contrato de trabalho.
Conclui que “deve:
(a) Ser a presente ação julgada improcedente, por não provada, absolvendo-se a Ré de todos os pedidos formulados pelo Autor, com fundamento na inexistência de uma transmissão de unidade económica;
(b) Subsidiariamente e por mera cautela, na eventualidade remota de se considerar que ocorreu transmissão da unidade económica e que o vínculo laboral foi transmitido para a Ré – o que não se aceita –, ser declarado que o trabalhador não foi despedido pela Ré;
(c) Residualmente, caso se considere que o Autor foi despedido pela Ré – no que não se concede – e se opte pela indemnização em substituição da reintegração ser fixada pelo mínimo, à ordem de 15 dias por ano de antiguidade;
(d) Em qualquer caso, condenar-se o Autor no pagamento das custas, procuradoria condigna e demais legais obrigações.”.
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Às contestações das Rés veio o A. responder, nos termos do articulado junto em 29.05.2019, terminando que, “Deverão as excepções aduzidas pelas RR. serem julgadas improcedentes, por não provadas, seguindo-se os ulteriores trâmites processuais até final.”.
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Findos os articulados, nos termos do despacho proferido, em 17.06.2019, foi fixado o valor da ação em € 29.362,36, proferido despacho saneador, e por se considerar revestir-se de simplicidade a enunciação dos temas de prova, a Mª Juíza “a quo” absteve-se de proferir o despacho previsto no art. 596º do C.P.C., decidindo dispensar a identificação do objeto do litígio e a enunciação dos temas da prova.
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Instruídos os autos e frustrada a conciliação, nos termos documentados nas actas datadas de 10 e 11.03.2020, 15.05.2020 e 15.07.2020, realizou-se a audiência e após, conclusos os autos, foi proferida sentença, que terminou com a seguinte DECISÃO:
“Face ao exposto julgo parcialmente procedente, por parcialmente provada a presente acção e em consequência:
I – Declaro ilícito o despedimento do Autor realizado pela 1ª Ré “AA…, SA”;
II- Em consequência condeno a 1ª Ré “AA…, SA” a pagar ao Autor uma indemnização correspondente a 35 dias de retribuição base e diuturnidades por cada ano completo de trabalho ou fração de antiguidade contada desde 04 de Maio de 2006 e até ao trânsito em julgado da sentença, estando já vencida a quantia de € 12.365,61 (doze mil, trezentos e sessenta e cinco euros e sessenta e um cêntimos), tudo acrescido de juros de mora, à taxa legal, sobre a quantia referida a partir do trânsito em julgado da presente decisão até efectivo e integral pagamento.
III – Condeno a 1ª Ré “AA…, SA” a pagar ao Autor, a título de compensação, todas as remunerações vencidas e vincendas (aí se integrando a retribuição de férias, correspondentes subsídios e subsídios de Natal) entre o 30.º dia anterior à propositura da presente ação (ou seja, 15 de Março de 2019) e o trânsito em julgado da sentença, mas com a dedução dos valores recebidos a título de subsídio de desemprego, a serem entregues pela empregadora aos serviços da Segurança Social, conforme a alínea c) do número 2 do artigo 390.º do CT, tudo a quantificar em incidente de liquidação, nos termos dos artigos 609.º, n.º 2 e 358.º e seguintes do CPC, tudo acrescido dos juros de mora à taxa legal a partir da data da liquidação até efectivo e integral pagamento.
IV –Condeno ainda a 1ª Ré “AA…, SA” a pagar ao Autor, o montante da indemnização por danos morais que se fixa em € 8.500.00 (oito mil e quinhentos euros), acrescido dos juros de mora legais devidos partir da presente decisão e até efectivo e integral pagamento.
V – Absolvo a 2ª Ré “CC…, SA.” da totalidade dos pedidos contra si formulados na presente causa.
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Custas pelo Autor e pela 1ª Ré “AA…”, na proporção de ¼ e ¾ respetivamente (art.º 527º do Código do Processo Civil), sem prejuízo do benefício do apoio judiciário de que beneficia o Autor.
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Registe e notifique, incluindo a Segurança Social face ao supra decidido em III.”.
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Inconformada com esta, nos termos que constam das alegações juntas em 27.09.2021, interpôs recurso a R., AA…, S.A., terminando com as seguintes: “CONCLUSÕES
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Notificado o A. veio apresentar contra-alegações que terminou com as seguintes Conclusões:
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A R., CC…, S.A., também, respondeu ao recurso da recorrente, terminando as suas contra-alegações com as seguintes Conclusões:
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Oportunamente, foi admitido o recurso da sentença interposto pela co-ré “AA…”, como apelação e ordenou-se a sua subida nos próprios autos a esta Relação.
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Já neste Tribunal, o Exm.o Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, nos termos do art. 87º, nº 3, do CPT, no sentido de o recurso não obter provimento, no essencial, por considerar que o Mº Juiz “a quo” em função dos factos dados como provados, fez deles correcta subsunção ao direito aplicável e por ter como “correctamente aplicado o regime previsto no artº. 285º., do Código do Trabalho”.
Notificadas deste, as partes não se pronunciaram.
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Cumpridos os vistos, há que apreciar e decidir.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso - cfr. artigo 87º do CPT e artigos 608º, nº 2, 635º, nº 4, 639º, nºs 1 e 2 e 640º, do CPC (aprovado pela Lei nº 41/2013 de 26 de Junho) e importando conhecer de questões e não de razões ou fundamentos, as questões a decidir e apreciar consistem em saber se o Tribunal “a quo” errou:
- na aplicação do direito, porque verificou-se a transmissão do estabelecimento para a 2ª Ré, como defende a, agora, recorrente;
- ao condenar a recorrente a título de compensação não patrimonial.
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II - FUNDAMENTAÇÃO:
A) – Os Factos:
O Tribunal “a quo” considerou que “Discutida a causa, resultou provada a seguinte factualidade (alinhada de forma lógica e cronológica):
A) As RR são sociedades comerciais que exercem, com carácter habitual e lucrativo, a actividade de segurança e vigilância, (artº1º da P.I.).
B) Em 04 de Maio de 2006, o Autor foi admitido ao serviço da primeira Ré, por contrato individual de trabalho, para exercer as funções de vigilante, (artº2º da P.I.).
C) O vencimento do Autor foi sujeito a aumentos, cifrando-se o ultimo vencimento mensal em €694,39, acrescido de igual montante a título de subsídios de férias e de Natal, acrescido do montante de €6,06 a título de subsidio de alimentação por cada dia efectivo de trabalho, (artº3º da P.I.).
D) O Autor prestava as funções de vigilante nas instalações pertencentes a uma cliente da sua entidade patronal, denominada “DD…, SA”, sitas na Rua …, nº…, ….-… Maia, no âmbito de um contrato de prestação de serviços entre estas duas entidades, (artº4º da P.I.).
E) O seu horário de trabalho era de 40 horas semanais, distribuídas por cinco dias de trabalho, definido pela sua entidade patronal, (artº5º da P.I.).
F) Cabia-lhe, nomeadamente, controlar as entradas e as saídas de pessoas e de mercadorias, através de dispositivos de monitorização CCTV, de acordo com as modalidades que lhes eram indicadas pela sua entidade empregadora, (artº6º da P.I.).
G) A sua empregadora também lhe fornecia indumentária identificativa e equipamentos rádios transmissores, (artº7º da P.I.).
H) Durante a execução do contrato, o Autor desempenhou todas as funções que lhe foram solicitadas pela sua entidade patronal, de forma ininterrupta, zelosa, assídua e pontual, gozando de toda a confiança e respeito por parte da entidade patronal, (artº8º da P.I.).
I) Sob a direcção, autoridade, fiscalização e no interesse da 1ª Ré bem como no âmbito da sua organização, o Autor prestou-lhe, ininterruptamente, a sua actividade profissional até 31 de Janeiro de 2019, (artº9º da P.I.).
J) A Ré AA… pagou ao Autor o vencimento relativo ao mês de Janeiro de 2019, nada mais tendo pago a partir dessa data, o qual se encontra a partir de 01 de Fevereiro de 2019 sem auferir um qualquer vencimento, (cfr. artº22º da P.I.).
K) E sem auferir um qualquer subsídio, (cfr. artº23º da P.I.).
L) Com data de 21/01/2019 a Ré AA… enviou uma carta ao Autor informando-o que o serviço de segurança do cliente “DD…, S.A.” tinha sido adjudicado por este cliente ao “CC…”, que a referida transmissão de estabelecimento ocorrerá no dia 01 de Fevereiro de 2019, data em que aquela empresa assumirá a prestação do serviço e que transmitem-se para o adquirente a posição de empregadora nos contratos de trabalho, o qual deve receber a transmissão e manutenção dos postos de trabalho e respectivos contratos de trabalho dos vigilantes que prestam funções no local, (cfr. artº12º da P.I. e cfr. fls.14 e v.).
M) A Ré AA… através da mesma carta declarou também cessado o contrato de trabalho celebrado com o autor com efeitos a partir de 31 de Janeiro de 2019, referindo ainda nessa carta “que a empresa CC…, S.A., foi informada da lista dos trabalhadores a operar no estabelecimento DD…, S.A. e informação necessária para os contratos de trabalho”, (cfr. artº12º da P.I. e cfr. fls.14 e v.).
N) A partir do dia 01 de Fevereiro de 2019 a Ré CC… passou a efetuar serviços de vigilância das instalações da “DD…, SA.”, em …, Maia, (cfr. artº53º da contestação da Ré CC… e cfr. artº11º da P.I.).
O) No dia 01 de fevereiro de 2019, o aqui Autor e demais colegas de trabalho, compareceram nas instalações pertencentes à “DD…, S.A.”, sitas em …, Maia, onde até essa data exerciam as suas funções de vigilância, afirmando querer continuar a exercer essas funções, tendo no local um representante da sociedade DD…, S.A., comunicou que não eram trabalhadores da 2ª Ré “CC…”, que não estavam autorizados a exercer as funções naquelas instalações e que a sua empregadora era a empresa “AA…, S.A.”, aqui 1ª Ré, que não havia trabalho para eles, tendo a 2ª Ré reiterado a informação de que não eram seus trabalhadores e que não havia trabalho para eles na cliente DD…, S.A., (cfr. artºs 13º, 14º e 16º da P.I.).
P) Procuraram ainda obter explicações junto da 1ª Ré, através dos seus superiores hierárquicos, que resultaram infrutíferas, (cfr. artº 15º da P.I.).
Q) Quer o Autor quer os seus colegas de trabalho continuaram a apresentarem-se no local de trabalho, mas todas as tentativas de exercerem as funções para os quais foram contratados resultaram infrutíferas, (artº 17º da P.I.).
R) Por duas vezes foi obrigado a chamar a GNR ao local, bem como apresentou participação junto da Autoridade para as Condições de Trabalho, (artº 18º da P.I.).
S) Solicitaram ainda por escrito às duas RR instruções do local, dia e hora onde deveriam prestar o concurso do seu trabalho, tendo só obtido resposta por parte da 2ª Ré “CC…” que, por carta datada de 12-2-2019, comunicou ao Autor “que não reconhecia a existência de qualquer fundamento legal, sob nenhuma perspetiva, que legitimasse a transmissão do contrato de trabalho” e que “rejeita qualquer responsabilidade sobre a relação laboral que V. Exª possui com a AA…, não lhe reconhecendo, por tal não ser devido, a qualidade de trabalhador da empresa signatária da presente missiva”, (cfr. artºs 19º e 20º da P.I. e cfr. fls.126 v.).
T) A partir de 01 de Fevereiro de 2019 o aqui Autor encontra-se impedido de prestar o seu trabalho, por decisão unilateral da sua entidade empregadora (cfr. artºs 10º e 21º da P.I.).
U) Sem auferir qualquer vencimento, sem auferir qualquer subsídio e sem que procedam aos descontos devidos para a Segurança Social relativos à sua carreira contributiva, (cfr. artºs 22º, 23º e 24º da P.I.).
V) A 1ª Ré manifestou de forma inequívoca a sua recusa de manter o Autor ao seu serviço e a 2ª Ré, de forma inequívoca, declinou assumir a continuidade da relação laboral do Autor, (cfr. artºs 25º, 26º e 74º da P.I.).
W) Em consequência directa e necessária do referido comportamento da entidade empregadora para consigo, mormente da sua decisão de não manter o Autor ao seu serviço, privando-o do seu trabalho e do seu salário, o Autor ficou triste e com uma depressão e perdeu o sono pelo facto de ter ficado sem trabalho, sofrendo dificuldades em fazer face aos encargos normais da vida doméstica, sentindo-se ferido na sua dignidade e humilhado por se ver forçado a pedir auxílio financeiro a terceiros e trabalho, sentindo-se diminuído na sua dignidade e capacidade profissional, (cfr. artºs 41º, 42º, 43º, 44º, 45º, 46º, 49º, 50º, 51º, 53º e 56º da P.I.).
X) A retribuição que o Autor auferia junto da 1ª Ré era o principal meio de sustento do seu agregado familiar, (cfr. artº48º da P.I.).
Y) O A. viu-se sem emprego, sem fonte de rendimento e sem quaisquer expectativas de futuro, (artºs 54º e 77º da P.I.).
Z) Tudo isto afectou as suas relações com familiares, amigos e colegas de trabalho, que o vêem permanentemente desalentado, com grande frustração e desânimo, (artº55º da P.I.).
AA) A “CC…” manteve o mesmo número de vigilantes que a “AA…” também alocava na prestação da atividade de segurança e vigilância nas instalações da DD…, sitas na Maia, (cfr. artº14º da Contestação da 1ª Ré).
BB) O local de prestação de serviço é o mesmo, (cfr. artº16º da Contestação da 1ª Ré).
CC) Verificou-se a substituição dos vigilantes, (cfr. artº18º da Contestação da 1ª Ré).
DD) A “AA…” enviou duas cartas ao “CC…”, a primeira datada de 21 de janeiro de 2019 e a segunda datada de 31 de janeiro de 2019, nas quais nomeadamente referia que na sequência a esta da adjudicação de vigilância e segurança das instalações da “DD…” considera que “estamos perante uma unidade económica que se transferiu para o novo operador o qual deve herdar, manter os postos de trabalho e respetivos contratos de trabalho dos vigilantes que prestam funções na DD…” enviando em anexo uma lista de tais vigilantes, que incluía o Autor, (cfr. artºs 56º, 57º e 58º da Contestação da 2ª Ré e cfr. fls.120 a 121 e 122 v.).
EE) A “CC…” enviou à “AA…” duas cartas, a primeira datada de 23-01-2019 e a segunda datada de 6 de fevereiro de 2019, na qual nomeadamente referia que “a situação em apreço não reveste as condições necessárias, por omissão de elementos essenciais, para sustentar a existência e/ou manutenção de uma unidade económica” e que não assumirá a posição de empregador relativamente aos trabalhadores identificados pela AA…, (cfr. artºs 60º, 61º e 62º da Contestação da 2ª Ré e cfr. fls.21 v., 22 e v., 123 , 124 v. e 125).
FF) A “DD…”, por pretender que os serviços de vigilância humana fossem executados de modo distinto do que sucedia até à data, pretendendo alterar o modelo, composição das equipas e tipologia dos serviços de vigilância humana que lhe eram prestados até à data, decidiu após pesquisa do mercado, adjudicar à CC… a prestação de serviços de vigilância nas suas instalações sitas na Maia e na …, no Seixal, (cfr. artºs 20º, 21º, 22º, 23º e 24º da Contestação da 2ª Ré).
GG) Após análise por parte da DD… da proposta final apresentada pelo “CC…” em 19 de dezembro de 2018, foi celebrado entre a “DD…” e o “CC…” o contrato de prestação de serviços de segurança integrada n.º …/../CO, que começou a produzir efeitos em 1 de fevereiro de 2019, (cfr. artºs 25 e 26º da Contestação da 2ª Ré).
HH) Os vigilantes da Ré CC… são responsáveis por, entre outras, no primeiro dia de cada mês, realizar uma vistoria às instalações e proceder à verificação dos equipamentos de emergência, nomeadamente dos extintores, dos carretéis, portas de emergência e bocas de incêndio, (cfr. artº31º da Contestação da 2ª Ré).
II) Os vigilantes da Ré CC… são igualmente responsáveis por, no dia quinze de cada mês, realizar a vistoria e teste aos equipamentos de segurança como, nomeadamente, os controlos de acessos, sistema de intrusão e sistema de detectação automática de incêndio, (cfr. artº32º da Contestação da 2ª Ré).
JJ) Os serviços de segurança privada e vigilância humana, adjudicados ao “CC…” passaram, desde 01.02.2019, por solicitação da DD…, nos serviços de controlo de entrada, presença e saída de pessoas e viaturas, a serem assegurados de modo informatizado, através de registos em suporte digital, (cfr. artºs 33º e 34º da Contestação da 2ª Ré).
KK) A portaria foi informatizada e o controlo e registos de controlo de acessos de pessoas, viaturas, materiais e relatórios em suporte digital passou a ser realizada pela Ré CC…, conferindo maior eficácia aos serviços de segurança privada e vigilância humana por si assegurados e facilitando o acesso à informação registada, permitindo que a “DD…” pudesse aceder à informação do registo de entradas e de saídas naquelas instalações em tempo real, bem como relatórios de serviços e controlo dos consumos de água, em tempo real (cfr. artºs 35º e 36º da Contestação da 2ª Ré).
LL) A CC… dispunha de trabalhadores próprios para assegurar a execução dos serviços contratados, desde a adjudicação dos mesmos, os quais possuem todas as qualificações correspondentes ao perfil exigido para a execução dos novos serviços contratados, atendendo às alterações introduzidas aos serviços contratados, (cfr. artºs 43º e 44º da Contestação da 2ª Ré).
MM) A informatização dos serviços de portaria exigiu que os vigilantes que os executam tenham formação para o efeito, o que não era o caso dos trabalhadores afectos pela AA… à prestação dos serviços na DD…, tendo o “CC…” de recorrer a trabalhadores próprios para assegurar a prestação dos serviços contratados, desde 01.02.2019, (cfr. artºs 45º e 46º da Contestação da 2ª Ré).
NN) A “AA…” não transmitiu qualquer tipo de equipamento que lhe pertencesse ao “CC…”, nem know-how, experiência, metodologias, processos ou informação, da “AA…” relativamente à prestação da atividade de segurança privada e vigilância humana para a DD…, (cfr. artºs 47º, 48º, 49º, 50º e 51º da Contestação da 2ª Ré).
*
Não se provaram quaisquer outros factos para além ou em contrário dos anteriormente referidos, designadamente que:
- se tenha mantido a necessidade de alocar os mesmos meios afectos à prestação do serviço assegurado à DD…, (cfr. artº14º da Contestação da 1ª Ré);
- o modo de exercício de actividade se tenha mantido, (cfr. artº15º da Contestação da 1ª Ré);
- o local da prestação da actividade correspondesse ao local de trabalho do A. (cfr. artº 16º da Contestação da 1ª Ré);
- o equipamento destinado a controlar o acesso, permanência e saída das instalações de pessoas e bens, afecto ao exercício da actividade de segurança das instalações, não tenha sido alterado, /cfr. artº17º da Contestação da 1ª Ré);
- a Ré AA… não efectuasse a verificação mensal aos sistemas de emergência, (cfr. artº37º da Contestação da 2ª Ré).”.
*
B) - O DIREITO
Analisemos a questão de saber se o Tribunal “a quo” errou na decisão de direito ao ter concluído que a posição de empregadora do A., que a Ré “AA…” detinha, não passou a partir de 01.02.2019 para a Ré “CC…”, nos termos do art. 285º do CT 2009.
Comecemos, então, por atentar na fundamentação da sentença recorrida, em que o Tribunal “a quo”, começou por dizer que, «(...) a primeira, e essencial, questão a apreciar consiste em saber se ocorreu transmissão de estabelecimento da Ré “AA…” para a Ré “CC…” e, por consequência, se a posição contratual daquela no contrato de trabalho que manteve com o A. se transmitiu para a Ré “CC…”.
(...)importa, desde logo, atender a que em termos substantivos, estando em causa nestes autos a invocada transmissão de uma unidade económica ocorrida no dia 1 de Fevereiro de 2019, aplica-se o regime jurídico acolhido no Código do Trabalho de 2009 (CT/2009), na redacção que o mesmo tinha àquela data.
Assim, estando em causa a interpretação e aplicação do artigo 285º do CT2009, é aplicável in casu, a redacção dessa norma com as alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº14/2018, de 19 de Março, mas sem as recentes alterações que lhe foram introduzidas pela Lei nº18/2021, de 8 de Abril (a esse propósito, cfr. a disposição transitória do artigo 3º da aludida Lei que restringe a aplicação das alterações introduzidas ao ano de 2021).
Com efeito, considerando a data da alegada transmissão, em 01/02/2019, não são aplicáveis no caso as alterações ao Código do Trabalho decorrentes da Lei nº 18/2021, de 08/04, uma vez que tais alterações são aplicáveis aos concursos públicos ou outros meios de seleção, no setor público e privado, cujo ato de adjudicação se encontre concretizado ou esteja em curso durante o presente ano de 2021 (cfr. artº 3º da referida Lei nº 18/2021) ou seja, já depois de ter ocorrido o alegado negócio de transmissão de estabelecimento invocado pela aqui 1ª Ré.
Assim, ao caso é aplicável o artigo 285º do CT/2009, com a redacção que lhe foi dada pela Lei nº14/2018, de 19 de Março, em vigor à data de 01/02/2019,
(...)», prosseguindo, pelas razões que invoca, com a transcrição do, «..., (Ac. RP, de 22/03/2021; www.sgsi.jtrp.pt-Proc. nº745/19.1T8VLG.P1), que, com a devida vénia, vimos citando e com jurisprudência concordamos integralmente, referindo-se o referido Acórdão a uma situação totalmente idêntica à dos presentes autos, sendo a matéria de facto provada na presente causa muito idêntica à que resultou provada no processo relativamente ao qual foi proferido tal Douto Acórdão, sufragando-se assim integralmente o aí considerado e decidido.
Com efeito, ocorre evidente similitude entre o quadro factual em que assentou o citado Acórdão e aquele que se provou nos presentes autos.
Assim, in casu provou-se a factualidade seguinte:» e enuncia os factos que se apuraram que considera com relevo para esta questão, terminando do seguinte modo:
«Assim, importa concluir, como o fez o Douto Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 22/03/2021 (www.dgsi.jtrp.pt-Proc. nº745/19.1T8VLG.P1) que in casu não ocorreu transmissão de estabelecimento da 1ª Ré “AA…” para a 2ª Ré “CC…” e, por consequência, que a posição contratual daquela no contrato de trabalho que manteve com o A. não se transmitiu para a 2ª Ré “CC…”, que assim terá de ser totalmente absolvida do contra si subsidiariamente peticionado na presente causa.».
Conclusão da decisão recorrida, de que discorda a recorrente dizendo que “não lhe assiste razão”. O que faz, argumentando e defendendo, sob a colocação da questão de que “será que no caso dos autos podemos falar de uma transmissão de uma unidade económica?”, o seguinte:
“Dos autos resultou apurado que as Rés se dedicam à prestação de serviços de segurança privada, e que a atividade exercida pelas Rés para um mesmo cliente, a DD…, era a mesma atividade de vigilância e segurança de pessoas e bens, independentemente da concretização de tal atividade, conforme adiante se verá.
Acresce que, para o exercício dessa mesma atividade, era exigido o mesmo tipo de recursos humanos em número de vigilantes, o mesmo espaço físico, e meios, como secretárias e cadeiras, balança de pesagem de camiões, pertencentes ao Cliente.
Temos pois que, para além da transmissão da atividade exercida – de vigilância – a Ré aqui recorrente abriu mão de objeto dos específicos serviços de vigilância exercidos no espaço providenciado pelo cliente, ao menos de uma secretária e de uma cadeira deste cliente e bem assim a balança de pesagem.
Dos factos atrás referidos e atendendo aos indícios a que supra se fez referência, temos que as Rés são empresas similares, no sentido de que prestam um serviço similar, a saber, a vigilância, e as Rés prestaram sucessivamente, à mesma cliente um serviço similar, usando para o efeito o mesmo número de funcionários, nas mesmas instalações e alguns dos equipamentos cedidos pela cliente.
Daqui resulta que houve uma continuidade de cliente, de espaço e de atividade exercida, sendo certo que para o seu exercício, é necessário o mesmo número de vigilantes, exercendo as mesmas funções e usando equipamento similar.”, e prossegue:
“O argumento utilizado para pretender diferenciar os serviços prestados da cedente para a cessionária, não colhe, visto que a informatização dos meios utilizados para exercer a atividade de vigilância e segurança do espaço não servem para descaracterizar essa mesma atividade. Dito de outro modo, o facto de a adjudicatária passar a recorrer a meios informáticos para desenvolver a sua atividade, não determina que tenha deixado de oferecer serviços de vigilância e segurança ao cliente, os mesmos que a aqui recorrente já oferecia.
(...)
Reportando ao caso dos autos, e sempre com referência à matéria de facto provada, afigura-se que, de forma suficientemente sustentada, se pode, efetivamente, dar como verificada a existência de uma “entidade económica”.
Com efeito, já ao tempo da prestação dos serviços de vigilância e segurança por parte da aqui recorrente, existia um conjunto de meios organizados – trabalhadores adstritos a esses serviços, e equipamento posto pelo cliente à sua disposição, e que utilizavam na execução desses serviços com suficiente autonomia para poder funcionar no dia-a-dia, portanto organizados, estruturados, tinham uma “identidade” mínima.
É certo que a montante estava todo o acervo empresarial da recorrente, desde logo os seus alvarás, e decerto que o trabalho destes trabalhadores era, de algum modo e em alguma medida, fiscalizado, que em algumas ocasiões, por este ou por aquele motivo, os trabalhadores colocados neste posto de trabalho recorriam aos seus superiores. Mas o cerne dos serviços, o seu asseguramento um dia após o outro, todos os dias do ano, consecutivamente, é essa equipa de trabalhadores que o faz, sem necessidade, como resulta evidente, de recorrerem/interagirem com a «sede», e não se descortinando dificuldade de maior em prestarem os trabalhadores o mesmo serviço, com esse mesmo elevado grau de autonomia, sob a alçada de um outro enquadramento empresarial, o que vale por dizer, outra empresa como a Ré CC….
E, por outro lado, manteve-se a identidade dos serviços prestados, não houve qualquer hiato entre a prestação dos serviços por parte de uma e outra rés, tendo a ré CC… retomado a essencialidade dos meios e equipamentos pertencentes ao cliente, (...)”, terminando:
“Pelo que, afigura-se-nos que é de concluir, por para aí confluírem os índices no caso relevantes, que ocorreu a transmissão de unidade económica propugnada pela recorrente.”.
Desta, argumentação da recorrente, discordam a recorrida co-Ré/CC…, pugnando pela confirmação da sentença e, no essencial, acompanhando a sua fundamentação, o Ex.mo Procurador que emitiu parecer em idêntico sentido e do não provimento do recurso.
Que dizer?
Verifica-se que, nesta questão a recorrente põe em causa, o entendimento expresso na sentença recorrida quanto a nela se ter considerado que, não ocorreu transferência da unidade económica, no caso de serviço de segurança e vigilância, ou seja, de uma transmissão de estabelecimento da 1ª Ré para a 2ª Ré, pelo que o contrato de trabalho que o Autor mantinha com a “AA…” não se transferiu automaticamente por força da lei para a “CC…”.
Ora, assim sendo, importa que se diga, desde logo, como bem o notou a decisão recorrida que “a questão não é nova”, bem pelo contrário, trata-se de questão, já por diversas vezes apreciada e julgada nesta secção em que todos, os subscritores deste, tiveram intervenção, quer como relatores quer como adjuntos, em concreto, por este colectivo, são exemplo os Acórdãos proferidos, nos Processos nº 892/20.7T8OAZ.P1, 935/20.4T8OAZ.P1, 601/19.3T8VLG.P1 e, bem recente, com data de 15.12.2021, no Proc. nº 5033/19.0T8PRT.P1, em todos eles se seguindo idêntica fundamentação à constante do Acórdão de 17.05.2021, Proc. nº 599/19.8T8VLG.P1, relatado pelo, aqui, 2º Adjunto.
São os fundamentos, agora, apresentados pela recorrente, neste processo, idênticos aos que foram apresentados naqueles, por outras partes, em situação idêntica, apenas, a situação factual se afigurando diversa em alguns, como agora, também acontece. No entanto, não vemos razão para deixarmos de seguir, aqui, a posição e o entendimento seguido naqueles, a nível de fundamentação de direito, já que a este nível a situação é a mesma.
E, desse modo, podemos adiantar que a recorrente não tem razão.
Justificando.
Comecemos por transcrever, aqui, o que fizemos constar daqueles:
«Entende a recorrente que, mesmo considerando os factos tal como foram assentes em 1ª instância, não estamos perante a existência de uma unidade económica.
Subjacente está o art.º 285º do Código do Trabalho (a redação então em vigor, anterior à recente Lei nº 18/2021, de 08 de abril) o qual, com a epígrafe «efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento», dispunha o seguinte:
1- Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores.
2- O disposto no número anterior é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
3- Com a transmissão constante dos n.ºs 1 ou 2, os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos
(…)
5- Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados que constitua uma unidade produtiva dotada de autonomia técnico-organizativa e que mantenha identidade própria, com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
(…)
Este art.º 285º do Código do Trabalho é um dos artigos que incorporaram a transposição para a ordem jurídica portuguesa da Diretiva 2001/23/CE do Conselho de 12 de março (relativa à aproximação das legislações dos Estados membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos).
A questão que importa resolver não é nova, pois tem-se colocado por diversas vezes, aos tribunais (quer tribunais nacionais, quer TJUE) em situações de sucessão de empresas prestadoras de serviços de vigilância e/ou segurança, situação que se pode dizer assumir alguma complexidade.
É que, trata-se de sector económico em que os elementos ativos (materiais ou não) são bastas vezes reduzidos à sua expressão mais simples, assentando a atividade essencialmente na mão-de-obra, o que, como se vai ver, requer especial atenção quando se afere da existência de uma unidade económica que tenha sido transmitida.
Não sendo a questão nova, abunda jurisprudência sobre a questão, sendo disso exemplo o recente acórdão desta Secção Social do TRP, de 21.10.2020[1], em que o agora relator teve intervenção como 2º adjunto, e em que era co Ré a também aqui Ré.
Neste aresto foi seguido o acórdão do STJ de 06.12.2017[2], proferido em recurso de revista excecional nos termos da al. a) do nº 1 do art.º 672º do Código de Processo Civil[3], o qual é muito elucidativo, e nessa medida se vai reproduzir em parte, e também aqui se vai seguir [embora em termos de factos assentes, em ambos os arestos, exista assinalável diferença, que levará a solução jurídica diversa, como se verá infra].
Escreveu-se neste acórdão do STJ, entre o mais, a propósito da transmissão de empresa ou estabelecimento, o seguinte:
«2. A Transmissão de empresa ou estabelecimento
2.1. É sabido que qualquer empresa, enquanto pessoa singular ou coletiva, pode estar sujeita a modificações de diversa índole com repercussão, na sua organização empresarial, que vão desde a mudança de identidade e titularidade do capital até à concessão de exploração, trespasse, fusão e cisão de sociedades comerciais, com o consequente reflexo na transmissão ou titularidade da empresa ou do estabelecimento e nas relações contratuais laborais do pessoal abrangido por tais alterações.
Qualquer dessas situações acaba por ter implicações no seio das estruturas económicas organizadas com projeção nas relações de trabalho até então constituídas.
Daí a necessidade sentida pelo legislador de fixar os efeitos decorrentes da transmissão de empresa ou estabelecimento de molde a proteger os trabalhadores envolvidos, mas sem coartar a iniciativa dos empresários ou limitar a vida económica das empresas integradas num sistema de funcionamento de economia do mercado.
É neste balancear de interesses resultante das vicissitudes contratuais sofridas – de acordo com a terminologia utilizada pelo próprio legislador (cf. Capítulo V, Secção I, do Código do Trabalho de 2009, arts. 285º e segts.) – que a lei procura regular e que o intérprete deve, na sua aplicação, atender.
2.2. Em matéria de efeitos de transmissão de empresa ou estabelecimento dispõe o art.º 285.º do Código do Trabalho de 2009, no que aqui releva, que:
«1- Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade da empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte da empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores, bem como a responsabilidade pelo pagamento de coima aplicada pela prática de contraordenação laboral.
2- O transmitente responde solidariamente pelas obrigações vencidas até à data da transmissão, durante o ano subsequente a esta.
3- O disposto nos números anteriores é igualmente aplicável à transmissão, cessão ou reversão da exploração de empresa, estabelecimento ou unidade económica, sendo solidariamente responsável, em caso de cessão ou reversão, quem imediatamente antes tenha exercido a exploração.
4- …
5- Considera-se unidade económica o conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
6- …»[4]
Em termos conceptuais o tratamento desta temática não constitui nenhuma novidade tanto no ordenamento jurídico Nacional como Comunitário.
Com efeito, já a Lei do Contrato de Trabalho – Decreto-Lei n.º 49408, de 24 de novembro de 1969 – regulava tal matéria no seu art.º 37º, normativo que foi, à época, erigido como pilar fulcral de proteção dos trabalhadores por garantir o direito à manutenção dos seus postos de trabalho nas circunstâncias ali previstas de transmissão do estabelecimento ou da sua exploração.
Esta finalidade foi reconhecida e plasmada nessa norma pelo legislador também com o objetivo de “tutelar o próprio estabelecimento (a continuidade do funcionamento da empresa que é objeto da transmissão)”, segundo o Acórdão desta Secção do STJ, datado de 27/05/2004.[5]
No âmbito da legislação Comunitária destaca-se a Diretiva nº 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de março, que foi transposta para o ordenamento jurídico português pelo Código de Trabalho de 2003, conforme decorre da alínea q), do artigo 2º, da Lei n.º 99/2003, de 27 de agosto, que aprovou o Código do Trabalho de 2003, vindo a matéria em questão a ter assento nos artigos 318.º e seguintes daquele Código.[6]
Diretiva essa relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, que codifica e revoga a Diretiva nº 77/187/CEE, do Conselho, de 14 de fevereiro, com a redação que lhe foi dada pela Diretiva nº 98/50/CE, do Conselho, de 29 de junho.
Foi com o advento de novas formas na constituição e transmissão das empresas, assistindo-se a mudanças sucessivas na titularidade da exploração dessas empresas, que o legislador sentiu a necessidade de introduzir alterações ao regime jurídico das referidas transmissões, tendo sido então aprovada, num contexto social e económico diferente daquele, a referida Diretiva nº 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de março.
Dando, assim, origem ao art.º 285º do Código do Trabalho de 2009 que regula os efeitos da transmissão de empresa ou estabelecimento no âmbito do Direito do Trabalho Nacional e define o conceito de “unidade económica” inerente a essa transmissão de empresa.
3. A Diretiva nº 2001/23/CE e o conceito de transmissão
3.1. Analisando o conteúdo da mencionada Diretiva verifica-se que o seu art.º 1º tem a seguinte redação:
«1. a) A presente diretiva é aplicável à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento, quer essa transferência resulte de uma cessão convencional quer de uma fusão.
b) Sob reserva do disposto na alínea a) e das disposições seguintes do presente artigo, é considerada transferência, na aceção da presente diretiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória.[7]
c) A presente diretiva é aplicável a todas as empresas, públicas ou privadas, que exercem uma atividade económica, com ou sem fins lucrativos. A reorganização administrativa de instituições oficiais ou a transferência de funções administrativas entre instituições oficiais não constituem uma transferência na aceção da presente diretiva.
2. (…).
3. (…).»
Por seu turno, o art.º 2º da Diretiva estabelece que:
«1. Na aceção da presente diretiva, entende-se por:
a) «Cedente»: qualquer pessoa, singular ou coletiva que, em consequência de uma transferência, prevista no nº 1 do art.º 1º, perca a qualidade de entidade patronal em relação à empresa ou estabelecimento ou à parte de empresa ou estabelecimento.
b) «Cessionário»: qualquer pessoa singular ou coletiva que, em consequência de uma transferência, prevista no nº 1 do art.º 1º, adquira a qualidade de entidade patronal em relação à empresa ou estabelecimento ou à parte de empresa ou estabelecimento
Resulta da alínea a), do nº 1, do artigo 1º, da Diretiva, que o regime estabelecido é aplicável «à transferência para outra entidade patronal de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento», quer essa transferência resulte de uma cessão convencional ou de uma fusão.
Por força do disposto na alínea b), do n.º 1, deve entender-se como abrangida pela transferência ali disciplinada, e respeitado «o disposto na alínea a) e das disposições seguintes deste artigo», a «transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória».
Por conseguinte, a transferência de titularidade dos contratos de trabalho prevista na presente Diretiva abrange não apenas a transferência de empresa ou de estabelecimento, mas também a parte de empresa ou de estabelecimento que se constitua como uma «entidade económica», entendida esta nos termos estabelecidos na norma citada, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica não restringida ao exercício da atividade principal.
Daqui decorre, da conjugação do regime legal previsto na Diretiva nº 2001/23/CE – arts. 1º, n.º 1, alínea a), e 2.º, n.º 1, alíneas a) e b) – com o art.º 285º, nºs 1 e 3, do Código do Trabalho de 2009, que o conceito de transmissão, para efeitos laborais, é especialmente amplo.
A amplitude desse conceito é reconhecida uniformemente, quer pela Doutrina quer pela Jurisprudência, conforme transparece dos excertos que a seguir serão reproduzidos.
3.2. Densificando o conceito, explicita Maria do Rosário Palma Ramalho[8]:
«Quanto ao âmbito do fenómeno transmissivo, é qualificada como transmissão para efeitos da sujeição a este regime legal, não apenas a mudança da titularidade da empresa ou do estabelecimento, por qualquer título (i.e., uma transmissão definitiva, por efeito de trespasse, fusão, cisão ou venda judicial), mas também a transmissão, a cessão ou a reversão da exploração da empresa ou do estabelecimento sem alteração da respetiva titularidade (i.e., uma transmissão das responsabilidades de gestão a título temporário, embora estável) – art.º 285º nºs 1 e 3 do CT.
Deste modo, o conceito de transmissão para este efeito é especialmente amplo, abrangendo todas as alterações estáveis (mas não necessariamente definitivas) na gestão do estabelecimento ou da empresa».
Também Joana Vasconcelos[9], a propósito do âmbito lato de aplicação do instituto em análise, enuncia os exemplos clássicos, como a transmissão da propriedade (trespasse, a fusão e a cisão, venda judicial ou a doação) e a transmissão da exploração de empresa ou estabelecimento, assim como as situações abrangidas pelo nº 3, do citado artigo do Código, como é o caso da cessão ou reversão da exploração de empresa ou estabelecimento, prevendo-se quanto a estas, expressamente nesse normativo, que a responsabilidade solidária recaia sobre “quem imediatamente antes tenha exercido a exploração”.
Por sua vez, a Jurisprudência desta Secção, do Supremo Tribunal de Justiça, reforçou esse entendimento, podendo ler-se no Acórdão datado de 04.05.2011, no que concerne ao regime jurídico que então enformava o art.º 318.º do Código do Trabalho, e que “corresponde, sem alterações substanciais”, à disciplina que emerge do atual art.º 285º do Código do Trabalho de 2009[10], que se (…) consagrou um conceito amplo de transmissão do estabelecimento, nele estando incluídas todas as situações em que aconteça a passagem, seja a que título for, do complexo jurídico-económico em que o trabalhador esteja integrado».[11]
Esse é também o entendimento do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE), que declarou no seu Acórdão de 09.09.2015, Processo C-160/14, disponível em www.curia.europa.eu, que:
«(…) A Diretiva 77/187, codificada pela Diretiva 2001/23, é aplicável a todas as situações de mudança, no âmbito de relações contratuais, da pessoa singular ou coletiva responsável pela exploração da empresa (…)».
Essencial é que tenha ocorrido, efetivamente, a transmissão de um negócio ou atividade, que constitua uma unidade económica autónoma na esfera do transmitente para a do transmissário, «mantendo a sua identidade» (art.º 1º, n.º 1, da Diretiva), e que demonstre o animus translativo da operação pelo facto de o primeiro ter deixado de exercer a atividade correspondente a tal unidade e o segundo passar a exercê-la nos mesmos moldes.
3.3. O conceito nuclear inserido nesta Diretiva, conforme resulta da sua análise, não é tanto o de transferência/transmissão de empresa, mas sim o de “transferência de uma entidade económica” – cf. a alínea b), do nº 1, do seu art.º 1º.
Conceito que reencontramos explicitado no art.º 285.º do Código do Trabalho, no seu n.º 5, com a noção aí consagrada de “unidade económica”, como o conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória.
Reproduzindo na nossa ordem jurídica o citado art.º 1.º, n.º 1, alínea b), da Diretiva nº 2001/23/CE, de 12 de março, em consonância com o entendimento da Jurisprudência do TJUE, segundo o qual é considerada como tal a transferência de uma unidade económica que mantém a sua identidade, entendida esta nos mesmos termos: “como um conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica, seja ela essencial ou acessória”.
Asserção vertida claramente no atrás citado Acórdão do TJUE, de 09.09.2015, com a seguinte narrativa:
«Segundo jurisprudência constante, a Diretiva 2001/23 tem em vista assegurar a continuidade das relações de trabalho existentes no quadro de uma entidade económica, independentemente da mudança de proprietário. O critério decisivo para demonstrar a existência de uma transferência, na aceção dessa diretiva, consiste na circunstância de a entidade em questão preservar a sua identidade, o que resulta, designadamente, da prossecução efetiva da exploração ou da sua retoma».[12]
Sendo considerado como elemento determinante dessa definição e reconhecimento de unidade económica, pela Jurisprudência Comunitária, a autonomia de parte da empresa ou do estabelecimento transmitidos.
Podendo ler-se, a este propósito, no Acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça da União Europeia, exarado no Proc. C-458/05 (Ac. Jouini), de 13/09/2007, que o Tribunal de Justiça acentuou a necessidade de a unidade económica manter a sua própria identidade no seio do transmissário, o que se revela pela prossecução de um objetivo próprio.[13]
Identidade a aferir pelo conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória – cf. nº 5, do art.º 285º, do Código do Trabalho de 2009.
Importa, assim, avaliar se a unidade económica mantém a sua identidade, se se mostra dotada de autonomia técnico-organizativa própria, constituindo uma unidade produtiva autónoma, com organização específica.
Neste sentido se expressou igualmente o Supremo Tribunal de Justiça, no Acórdão desta Secção, de 26.09.2012[14], quando se sintetizou nos seguintes termos, no final do ponto 3.2.:
«Em suma, a verificação da existência de uma transferência depende da constatação da existência de uma empresa ou estabelecimento (conjunto de meios organizados, com o objetivo de prosseguir uma atividade económica), que se transmitiu (mudou de titular) e manteve a sua identidade.
É, contudo, essencial que a transferência tenha por objeto uma entidade económica organizada de modo estável, ou seja, deve haver um conjunto de elementos que permitam a prossecução, de modo estável, de todas ou de parte das atividades da empresa cedente e deve ser possível identificar essa unidade económica na esfera do transmissário».
É neste fluxo Jurisprudencial que João Reis navega quando tece as seguintes considerações[15]:
«O critério decisivo é, pois, o da preservação da identidade económica transmitida. De acordo com a noção acolhida, para verificar se há transmissão, o primeiro passo é indagar se o objeto transmitido constitui uma unidade económica estável, autónoma e adequadamente estruturada, e o segundo é aferir se tal unidade económica mantém a sua identidade própria, o que deve ser visível no exercício da atividade prosseguida ou retomada. Em primeiro lugar, é necessário averiguar se existe uma unidade económica suscetível de transferência.
Digamos que, à semelhança da pessoa humana, é preciso que tal entidade seja “um ser vivente”. Isto implica uma estreita conexão entre dois aspetos: entre a transmissão de um complexo de bens e relações jurídicas e o exercício atual (ou próximo) da empresa. Portanto, a transferência de um estabelecimento que já não esteja em atividade, ainda que seja constituído por um complexo de bens potencialmente capaz para o exercício da empresa, parece não constituir transferência de estabelecimento para efeitos da diretiva.»
3.4. Aquilatar da subsistência de uma unidade económica exige a ponderação de determinados elementos indiciários, sendo frequentemente enunciados pelo TJUE, como relevantes, os seguintes:
- Avaliar o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata;
- Apurar se houve a transferência ou não de bens corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, bem como o valor dos elementos incorpóreos existentes no momento da transmissão;
- Verificar se se operou a reintegração, ou não, por parte do novo empresário, do essencial dos efetivos, v.g., no domínio dos recursos humanos;
- Confirmar se ocorreu a transmissão, entendida enquanto continuidade, da respetiva clientela;
- Comprovar o grau de similitude entre as atividades exercidas antes e depois da transmissão e a duração de uma eventual suspensão dessas atividades.
Elementos parciais indiciários a valorizar numa avaliação de conjunto, enquanto critérios orientadores e coadjuvantes da decisão a proferir, que dependerá da ponderação que se faça desses fatores em função de cada caso concreto.
Conclusão corroborada, nesta parte, por Júlio Manuel Vieira Gomes[16] quando refere que:
«Decisiva para o Tribunal de Justiça é sempre a manutenção da entidade económica, e para se verificar se essa entidade continuou a ser a mesma, o tribunal destacou que há que recorrer a múltiplos elementos cuja importância pode, de resto, variar no caso concreto, segundo o tipo de empresa ou estabelecimento, a sua atividade, ou métodos de gestão, sendo que estes elementos devem ser objeto de uma apreciação global, não sendo em princípio decisivo nenhum deles».
E explicita:
«Podem ser relevantes elementos como a transmissão de bens do ativo da entidade, designadamente, bens imóveis, ou equipamentos, mas também bens incorpóreos como a transmissão de know-how, a própria manutenção da maioria ou do essencial dos efetivos, a duração de uma eventual interrupção da atividade desenvolvida antes e a atividade desenvolvida depois da transferência».
3.5. Posto isto, vejamos agora quais os efeitos que se produzem no âmbito laboral com a transmissão da titularidade de empresa ou estabelecimento.
4. Efeitos laborais decorrentes da transmissão
4.1. Quanto aos efeitos decorrentes da transmissão da titularidade de empresa ou estabelecimento, no que respeita às relações laborais existentes àquela data, tem sido entendido jurisprudencialmente que essa transmissão não afeta, em regra, a subsistência dos contratos de trabalho, nem o respetivo conteúdo, tudo se passando, em relação aos trabalhadores, como se a transmissão não tivesse tido lugar, mantendo-se inalteráveis os respetivos contratos de trabalho e assumindo o adquirente os direitos e obrigações emergentes dos contratos de trabalho celebrados com o anterior empregador.
Assim, por força da transmissão, o adquirente fica investido na posição da entidade empregadora, relativamente aos contratos de trabalho dos trabalhadores afetos ao estabelecimento transmitido, na data da transmissão, o que implica a subsistência dos contratos de trabalho com o conteúdo que tenham, ou seja, a continuidade dos mesmos como se não tivesse ocorrido qualquer alteração do lado da entidade empregadora.
A transferência dos contratos de trabalho com o mesmo conteúdo implicará para o adquirente a transferência do complexo de obrigações deles decorrentes, que caracterizavam a posição do transmitente, dando continuidade às situações dos trabalhadores.
Entendimento consolidado e que remonta ao regime decorrente do artigo 37.º da LCT, com respaldo doutrinário.
Com efeito, sobre esta matéria, Pedro Romano Martinez[17] considera que:
«Transmitido o estabelecimento, o cessionário adquire a posição jurídica do empregador cedente, obrigando-se a cumprir os contratos de trabalho nos moldes até então vigentes. Isto implica não só o respeito do clausulado de tais negócios jurídicos, incluindo as alterações que se verificaram durante a sua execução, como de regras provenientes de usos, de regulamentos da empresa ou de instrumentos de regulamentação coletiva (…); no fundo, dir-se-á que a transmissão não opera alterações no conteúdo do contrato».
Também Maria do Rosário Palma Ramalho[18] conclui, a este propósito:
«O regime legal confirma a transmissão da posição jurídica do empregador que decorre do negócio transmissivo, como um caso de sub-rogação legal, já que o transmissário assume a posição negocial do transmitente junto da contraparte deste no contrato de trabalho, por imposição da lei e independentemente da vontade do outro contraente (no caso, o trabalhador)».
E compreende-se que assim seja, pela necessidade de compatibilizar os interesses em causa e aos quais fizemos referência ab initio:
- Por um lado, os interesses do transmitente em concretizar a mudança da titularidade da empresa ou da exploração do estabelecimento para outra entidade/adquirente, para quem se transfere a posição jurídica daquele, e,
- Por outro, a proteção dos trabalhadores envolvidos, sem que essa mudança possa acarretar prejuízos no domínio dos contratos de trabalho celebrados que, nessa medida, se mantêm na sua plenitude.
Trata-se de uma garantia assumida juslaboralmente em consonância com os princípios de Direito Comunitário e Constitucionais, v.g., o da proteção e segurança no emprego e o da livre iniciativa económica.
Pode, assim, concluir-se que:
A transmissão para o adquirente da posição do empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores, a que se refere o n.º 1, do art.º 285.º, do Código do Trabalho de 2009, inclui quaisquer direitos e obrigações do cedente emergentes de um contrato de trabalho ou de uma relação de trabalho existentes antes da data da transferência, conforme precisa o art.º 3º, n.º 1, da Diretiva.
Ponto é que a transmissão da titularidade de empresa ou estabelecimento constitua uma unidade económica e se mostre concretizada nos termos definidos pelos normativos legais citados e que resultam do Direito Nacional e Comunitário, de acordo com a interpretação que a Jurisprudência deles tem feito.
4.2. Prevê-se, paralelamente, e ao abrigo de uma permissão expressa da Diretiva (art.º 3.º, n.º 1, in fine), uma responsabilidade solidária do transmitente pelas obrigações assim transmitidas, duplamente limitada às obrigações vencidas até à data da transmissão e ao prazo de um ano subsequente à sua realização.
Princípio vertido, nos mesmos termos, no nº 2, do art.º 285º, do Código do Trabalho de 2009.
Assim, por força desta norma, durante o período de um ano subsequente à transmissão, o transmitente responde solidariamente com o transmissário pelas obrigações vencidas até à data da transmissão.
Refira-se, por fim, que a nossa legislação laboral omite qualquer referência à oposição do trabalhador à transmissão do seu contrato de trabalho.
No entanto, a nossa Doutrina admite que caso o trabalhador não queira acompanhar o estabelecimento transmitido poderá opor-se à transmissão do seu contrato de trabalho recorrendo, para o efeito, à resolução do contrato com justa causa com fundamento na alteração substancial e duradoura das condições de trabalho no exercício lícito de poderes do empregador – cf. art.º 394.º, n.º 3, alínea b), do Código do Trabalho de 2009[19] – ou com fundamento no disposto no art.º 394.º, n.º 2, alíneas b) ou e), do mesmo Código, se demonstrar que a operação de transmissão correspondeu a intuito fraudulento, com direito à indemnização correspondente (cf. art.º 396.º, n.º 1), para além de poder, ainda, denunciar o contrato com aviso prévio, nos termos do art.º 400.º, n.º 1, do mesmo Código.[20]
É que, de acordo com o entendimento expresso por Júlio Manuel Vieira Gomes, admitir a transmissão automática dos contratos de trabalho, sem que o trabalhador a isso se possa recusar, consistiria «(…) não só numa negação frontal da sua autonomia privada, como mesmo da sua dignidade fundamental enquanto pessoa, convertendo-o, de algum modo, numa coisa, num componente do estabelecimento (…)»[21], pelo que, não sendo o trabalhador «uma mercadoria» não poderá ser «(…) transferido de um empregador para outro sem o seu consenso».
(…)
5.1
Diga-se porém que, no caso em análise, a questão não se apresenta linear, porquanto somos confrontados com uma situação em que essa atividade aparenta assentar apenas no indício da mão-de-obra humana.
Sendo embora verdadeira essa constatação, tal como salienta Júlio Manuel Vieira Gomes[22] isso não significa que se reduza a transmissão de uma unidade económica à mera atividade.
Terá, assim, de se ponderar os restantes elementos disponíveis nos autos, fazendo apelo, v.g., aos métodos e organização do trabalho, aos meios colocados pela empregadora à disposição dos trabalhadores e a outros indícios que se mostrem relevantes para a aferição de identidade da unidade económica.
Igual conclusão foi vertida em Acórdão desta Secção, do Supremo Tribunal de Justiça, datado de 24.03.2011[23], onde se pode ler o seguinte:
«…A mera transmissão de uma atividade não é suficiente para configurar uma transmissão de unidade económica, como, aliás o Tribunal de Justiça da União Europeia afirmou no Acórdão de 11 de março de 1997, Processo C-13/95, em cujo ponto 15 se refere que «uma entidade não pode ser reduzida à atividade de que está encarregada. A sua identidade resulta também de outros elementos, como o pessoal que a compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração ou, ainda, (…) os meios de exploração à sua disposição».
Matéria que, contudo, no contexto dos autos não se configura fácil.
Daí que tivessem sido suscitadas as referidas questões prejudiciais e solicitado a pronúncia do Tribunal de Justiça da União Europeia.
5.2. A este propósito, o TJUE, no seu Acórdão de 19 de outubro de 2017, junto a fls. 1026-1037, do 4º Vol., quando colocado perante a factualidade provada no âmbito dos presentes autos e, bem assim, a primeira e segunda questões prejudiciais que lhe foram dirigidas, decidiu quanto a este ponto nos seguintes termos:
«O artigo 1º, nº 1, alínea a), da Diretiva 2001/23/CE, do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas, ou de estabelecimentos, ou de parte de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que está abrangida pelo conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção desta disposição, uma situação em que um contratante resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância e de segurança das suas instalações celebrado com uma empresa e, em seguida, para a execução dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa, que recusa integrar os trabalhadores da primeira, quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação foram retomados pela segunda empresa» – (sublinhado nosso).
Explicitou ainda que, no caso concreto, era necessário averiguar «(…) se a SS transmitiu à RR, direta ou indiretamente, equipamentos ou elementos corpóreos ou incorpóreos para exercer a atividade de vigilância e de segurança nas instalações em causa» – (sublinhado nosso).
Acrescentando que se deverá verificar «(…) se esses elementos foram postos à disposição da SS e da RR pela TT. A este respeito, há que recordar que a circunstância de os elementos corpóreos indispensáveis ao exercício da atividade em causa no processo principal e retomados pelo novo empresário não pertencerem ao seu antecessor, mas terem sido simplesmente disponibilizados pelo contratante, não pode levar a excluir a existência de uma transferência de empresa ou de estabelecimento na aceção da Diretiva 2001/23 (…). Contudo, só os equipamentos que são efetivamente utilizados para prestar os serviços de vigilância, com exclusão das instalações que são objeto desses serviços, devem, se for caso disso, ser tomados em consideração para determinar a existência de uma transferência de uma entidade com manutenção da sua identidade, na aceção da Diretiva 2001/23 (…)» – (sublinhado nosso).»

Da transcrição acabada de fazer, podemos concluir que, mesmo tendo subjacente uma situação de prestação de serviços de segurança (assente essencialmente na mão-de-obra, como se disse supra), para que estejamos, nos termos do citado nº 5 do art.º 285º do Código do Trabalho, perante uma unidade económica, necessária é a existência de um conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória, e é esse conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer a atividade que é suscetível de transmissão.
Os conceitos de unidade económica e de transmissão da mesma não se reconduzem apenas ao exercício da atividade, nem à continuação dessa atividade, antes exigindo também a existência de um conjunto de meios organizados, materiais e/ou humanos, para tal e que sejam transferidos para o novo adjudicatário.
Como refere Rui Carmo de Oliveira[24], embora não seja tarefa fácil, para se concluir pela transmissão ou não de um estabelecimento, o fundamental é verificar se a entidade económica se manteve a mesma após a transmissão, independentemente da forma com que esta se tenha realizado.
Dúvidas não há de não haver necessidade de que exista um vínculo contratual entre o cedente e o cessionário, o que quer dizer que em sectores de atividade, como é o caso da prestação de serviços de segurança e de limpeza, em que bastas vezes, ou mesmo por regra, não existe um contrato diretamente celebrado entre duas empresas desse sector, antes havendo uma empresa que “substituiu” outra na prestação dos serviços a outrém (que podemos apelidar como beneficiário dos serviços) na medida em que o contrato que uma celebrou com o beneficiário dos serviços cessou e este beneficiário celebrou novo contrato para a prestação de serviços com outra empresa (em regra depois de aberto concurso público), continua a ser possível estarmos perante transferência de empresa ou estabelecimento.[25] [26]
É que o foco da citada Diretiva é assegurar, a par da continuação da atividade economia, a continuidade das relações de trabalho de uma entidade económica, independentemente da mudança de titular; ponto é que se possa dizer que se manteve a identidade da empresa, que se traduz não só pela atividade que a unidade económica desenvolve, mas também (diríamos antes, mas essencialmente) pelos trabalhadores a ela afetos e pela organização do trabalho, seus meios e métodos de exploração.
Neste sentido se tem pronunciado a jurisprudência do TJUE, podendo ver-se por exemplo os acórdãos do TJUE de 24.02.2002 e de 20.01.2011, que têm subjacentes situações de prestação de serviços de limpeza mas têm aqui pleno cabimento[27].
Tem relevo citar o escrito no acórdão do TJUE de 10.12.1998[28], destacando-se o seguinte:
25. Para que a Diretiva 77/187 seja aplicável, a transferência deve todavia ter por objeto uma entidade económica organizada de modo estável, cuja atividade se não limite à execução de uma obra determinada (acórdão de 19 de setembro de 1995, Rygaard, C-48/94, Colect., p. I-2745, n° 20). O conceito de entidade remete assim para um conjunto organizado de pessoas e elementos que permitam o exercício de uma atividade económica que prossegue um objetivo próprio (acórdão Süzen, já referido, n° 13).
26. Tal entidade, embora deva ser suficientemente estruturada e autónoma, não inclui necessariamente elementos de ativos, materiais ou imateriais, significativos. Com efeito, em certos sectores económicos como a limpeza e a segurança, estes elementos são muitas vezes reduzidos à sua expressão mais simples e a atividade assenta essencialmente na mão-de-obra. Assim, um conjunto organizado de trabalhadores que são especial e duradouramente afetos a uma tarefa comum pode, na ausência de outros fatores de produção, corresponder a uma entidade económica.
27. A presença de uma entidade suficientemente estruturada e autónoma no seio da empresa titular do contrato não é, em princípio, afetada pela circunstância, aliás frequente, de esta empresa estar sujeita ao respeito de obrigações precisas que lhe são impostas pelo organismo adjudicante. Com efeito, embora possa suceder que a influência exercida por este último no serviço fornecido pelo prestatário seja alargada, este tem normalmente uma certa liberdade, ainda que reduzida, para organizar e executar o serviço em questão, sem que a sua tarefa possa ser interpretada como uma mera colocação do seu pessoal à disposição do organismo adjudicante.
(…)
29. Para determinar em seguida se se verificam as condições de uma transferência de entidade, haverá que tomar em consideração todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não dos elementos corpóreos, tais como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, o emprego ou não por parte do novo empresário do essencial dos efetivos, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de similitude das atividades exercidas antes e depois da transferência e a duração de uma eventual suspensão destas atividades. Estes elementos não passam, todavia, de aspetos parciais da avaliação de conjunto que se impõe e não poderão, por isso, ser apreciados isoladamente (v., nomeadamente, acórdãos Spijkers e Süzen, já referidos, respetivamente n.ºs 13 e 14).
30. Assim, a mera circunstância de o serviço efetuado pelo antigo e pelo novo concessionário ou pelo antigo e pelo novo titular do contrato ser semelhante não permite concluir pela transferência de uma entidade económica entre as empresas sucessivas. Com efeito, uma entidade não pode ser reduzida à atividade de que está encarregada. A sua identidade resulta também de outros elementos, como o pessoal que a compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração ou ainda, sendo caso disso, os meios de exploração à sua disposição (acórdão Süzen, já referido, n° 15).
Concluindo este aresto, entre o mais, que o conceito de entidade económica remete para um conjunto organizado de pessoas e de elementos que permitem o exercício de uma atividade económica que prossegue um objetivo próprio. A mera circunstância de os trabalhos de manutenção sucessivamente assegurados pela empresa de limpeza e pela empresa proprietária das instalações serem similares não permite concluir no sentido da transferência de tal entidade.
(...).
Explicitando melhor.
Como se disse supra, um conjunto organizado de trabalhadores especial e duradouramente afetos a uma determinada tarefa comum pode corresponder a uma unidade económica [a unidade económica reduzida à sua expressão mais simples: um grupo ou uma equipa de trabalhadores].
Retomando o referido por Rui Carmo de Oliveira[29], diz-se que há que recorrer ao método indiciário para se conseguir averiguar a efetiva manutenção de uma unidade económica, analisando de forma unitária e global se são mantidos os vários elementos corpóreos ou incorpóreos que compõem um estabelecimento comercial, que por sua vez devem ser analisados individualmente e levando em conta a natureza da atividade desenvolvida e que nem todos os elementos (instalações, equipamentos, carteiras de clientes, know how) têm o mesmo grau de importância nas diferentes entidades.
Em suma, importará dessa forma aferir se, após o “novo” prestador dos serviços assumir a atividade, identificamos uma mesma unidade económica, que em determinados casos pode corresponder à assunção de uma parte essencial do conjunto de trabalhadores, definida em termos quantitativos ou qualitativos (um conjunto que permite a unidade funcionar)[30].
Em conformidade com o que se tem vindo a expor, no acórdão desta Secção Social do TRP de 11.09.2017[31], escreveu-se que a jurisprudência nacional, admitindo embora que, para efeito de saber se estamos perante a transmissão de uma unidade económica, o que relevará será a manutenção da identidade da unidade económica, dissociando-a da necessidade de transmissão, por exemplo, de ativos corpóreos, exige, contudo, a manutenção, por quem suceda na atividade, de todo ou parte do “ativo” humano.
Todavia, isto não quer dizer que a organização hierárquica dos trabalhadores tenha que coincidir totalmente antes e depois da transmissão, nem que o “topo da hierarquia” (chefe de grupo) tenha que passar a trabalhar para a “nova” empresa prestadora dos serviços[32], pois aquilo que importa é que se possa dizer que se mantém uma organização, e que essa organização mantém identidade com a anterior, sendo que para aferir dessa identidade intervêm diversos factores[33].
Transcreve-se, a propósito, elucidativa passagem do acórdão do TJUE de 20.01.2011 (acima referido), sublinhando nós o mais relevante:
33. Contudo, para que a Diretiva 2001/23 seja aplicável, a transferência deve ter por objeto, de acordo com o artigo 1.º, n.º 1, alínea b), desta diretiva, uma entidade económica que mantém a sua identidade após a mudança de empresário.
34. Para determinar se essa entidade mantém a sua identidade, há que tomar em consideração todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, entre as quais figuram, designadamente, o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata, a transferência ou não de elementos corpóreos, como os edifícios e os bens móveis, o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência, a reintegração ou não do essencial dos efetivos pelo novo empresário, a transferência ou não da clientela, bem como o grau de similitude das atividades exercidas antes e depois da transferência e a duração da eventual suspensão destas atividades. Estes elementos constituem apenas aspetos parciais da avaliação de conjunto que se impõe e não podem, por isso, ser apreciados isoladamente (v., designadamente, acórdãos de 18 de Março de 1986, Spijkers, 24/85, Colect., p. 1119, n.º 13; de 19 de Maio de 1992, Redmond Stichting, C-29/91, Colect., p. I-3189, n.º 24; de 11 de Março de 1997, Süzen, C-13/95, Colect., p. I-1259, n.º 14; e de 20 de Novembro de 2003, Abler e o., C-340/01, Colect., p. I-14023, n.º 33).
35. O Tribunal de Justiça sublinhou anteriormente que uma entidade económica pode, em certos sectores, funcionar sem elementos do ativo, corpóreos ou incorpóreos, significativos, de tal forma que a manutenção da sua identidade para além da operação de que é objeto não pode, por hipótese, depender da cessão de tais elementos (v. acórdãos, já referidos, Süzen, n.º 18; Hernández Vidal e o., n.º 31; e UGT-FSP, n.º 28).
36. Assim, o Tribunal de Justiça declarou que, na medida em que, em certos sectores nos quais a atividade assenta essencialmente na mão-de-obra, um conjunto de trabalhadores que executa de forma durável uma atividade comum pode corresponder a uma entidade económica, essa entidade é suscetível de manter a sua identidade para além da sua transferência quando o novo empresário não se limita a prosseguir a atividade em causa mas também retoma uma parte essencial, em termos de número e de competências, dos efetivos que o seu predecessor afetava especialmente a essa missão. Nessa situação, a nova entidade patronal adquire, com efeito, um conjunto organizado de elementos que lhe permitirá a prossecução, de modo estável, das atividades ou de parte das atividades da empresa cedente (v. acórdãos Süzen, já referido, n.º 21; Hernández Vidal e o., já referido, n.º 32; de 10 de Dezembro de 1998, Hidalgo e o., C-173/96 e C-247/96, Colect., p. I-8237, n.º 32; de 24 de Janeiro de 2002, Temco, C-51/00, Colect., p. I-969, n.º 33; e UGT-FSP, já referido, n.º 29).
(…)
39. É certo que, como resulta da jurisprudência do Tribunal, uma atividade de limpeza como a que está em causa no processo principal pode ser considerada uma atividade que assenta essencialmente na mão-de-obra (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Hernández Vidal e o., n.º 27; Hidalgo e o., n.º 26; e Jouini e o., n.º 32) e, consequentemente, uma coletividade de trabalhadores que exerce duradouramente uma atividade comum de limpeza pode, na falta de outros fatores de produção, corresponder a uma entidade económica (v., neste sentido, acórdão Hernández Vidal e o., já referido, n.º 27). Porém, é ainda necessário que a identidade desta última seja mantida para além da operação em causa.
40. A este respeito, resulta da decisão de reenvio que o Ayuntamiento de Cobisa, para exercer ele próprio as atividades de limpeza das suas escolas e das suas instalações, anteriormente confiadas à CLECE, contratou pessoal novo, sem retomar os trabalhadores anteriormente afetados a essas atividades pela CLECE, nem tão-pouco nenhum elemento dos ativos corpóreos ou incorpóreos dessa empresa. Nestas condições, o único elemento que estabelece um nexo entre as atividades exercidas pela CLECE e as retomadas pelo Ayuntamiento de Cobisa é o objeto da atividade em causa, a saber, a limpeza de instalações.
41. Ora, a mera circunstância de a atividade exercida pela CLECE e a exercida pelo Ayuntamiento de Cobisa serem semelhantes, senão mesmo idênticas, não permite concluir pela manutenção da identidade de uma entidade económica. Com efeito, uma entidade não pode ser reduzida à atividade de que está encarregada. A sua identidade resulta de uma multiplicidade indissociável de elementos como o pessoal que a compõe, o seu enquadramento, a organização do seu trabalho, os seus métodos de exploração ou ainda, sendo caso disso, os meios de exploração à sua disposição (v., neste sentido, acórdãos, já referidos, Süzen, n.º 15; Hernández Vidal e o., n.º 30; e Hidalgo e o., n.º 30). Em especial, a identidade de uma entidade económica como a que está em causa no processo principal, que assenta essencialmente na mão-de-obra, não pode ser mantida se o essencial dos seus efetivos não for retomado pelo presumido cessionário.» (Fim de citação)
*
Transpondo o que se deixa exposto para o caso, podemos, reafirmar que, em nosso entender, a recorrente não tem razão.
Efectivamente, vistos os factos provados nos autos, supra transcritos e que não mereceram censura por parte daquela, constatamos que a “nova empresa”, a agora, recorrida, (diga-se, ao contrário, do que se verificou, em concreto, em alguns daqueles processos que decidimos, supra referidos) prosseguiu a actividade de segurança e vigilância nas instalações da cliente “DD…s, SA”, a partir de 01.02.2019, que até aí vinha sendo desempenhada pela, aqui, 1ª Ré, AA…, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer vigilante/trabalhador desta última e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da actividade. E, sendo, desta forma, não temos dúvidas que a sentença recorrida não merece censura. Pois, sem a verificação de nenhum daqueles elementos, pese embora, os serviços prestados serem na sua essência os mesmos, tal não é suficiente, para que se possa dizer que estamos na presença de uma entidade económica, tal como se afirmou naquela e ao contrário do que considera a recorrente.
Ou seja, o que se verifica, no caso, é precisamente, a situação, já pela, agora relatora e por este colectivo, outras vezes subscrita, em que de igual, modo, se decidiu que não ocorre transmissão de estabelecimento e por decorrência da posição de empregador em situações em que uma empresa que presta serviços de segurança num determinado cliente perde o contrato, passando aqueles mesmos serviços a ser prosseguidos por outra empresa do mesmo ramo de actividade a quem os mesmos foram adjudicados, sem que se tenha verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da actividade, vejam-se, entre outros, o (Acórdão de 15.12.2021, deste colectivo, proferido no último processo nº 5033, supra referido) e o (Acórdão de 20.09.2021, relatado pelo Desembargador, Jerónimo Freitas, Proc. nº 4004/19.1T8PRT.P1), nos quais se acolheu o entendimento, já referido, e antes afirmado nesta sessão e seguido no (Acórdão de 21.10.2020, relatado pelo Desembargador Nelson Fernandes, subscrito pelos aqui adjuntos, Proc. nº 4094/19.7T8PRT.P1, disponível in www.dgsi.pt), em cujo sumário, se lê o seguinte:
“I - Para se verificar a transmissão de uma empresa ou estabelecimento e, consequentemente, ter aplicação o regime jurídico previsto no artigo 285.º, do Código do Trabalho de 2009, quanto aos seus efeitos, importa verificar se a transmissão operada tem por objeto uma unidade económica, organizada de modo estável, que mantenha a sua identidade e seja dotada de autonomia, com vista à prossecução de uma atividade económica, ou individualizada, na empresa transmissária.
II - Não ocorre uma situação de transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da atividade suscetível de consubstanciar uma “unidade económica” do estabelecimento.
III - Em face do referido em I e II, constitui despedimento a comunicação endereçada pela empregadora a cada um dos seus trabalhadores, que, na sequência da adjudicação da prestação de serviços de vigilância privada a outra empresa, os informa que o respetivo contrato de trabalho é automaticamente transmitido para a entidade que lhe irá suceder na referida prestação de serviços.”.
E, no mesmo sentido, vejam-se ainda, dada a similitude os demais Acórdãos desta Relação de (22.03.2021, Proc. nº 745/19.1T8VLG.P1, relatado pela Desembargadora Paula Leal de Carvalho –transcrito na decisão, agora, recorrida e os recentes de 15.12.2021, Proc.s nºs 895/20.1T8OAZ.P1 e 194/20.9T8PNF.P1, relatados pelo Desembargador Jerónimo Freitas e em que, a ora, relatora interveio como Adjunta e desta mesma data, 17.01.2022, deste mesmo colectivo, Proc. nº 17370/20.7T8PRT.P1).
Assim, na consideração de terem inteira aplicação ao caso vertente, adere-se à fundamentação dos referidos Acórdãos desta Relação, em particular o de 21.10.2020 e os de 15.12.2021 cuja fundamentação, além da respeitante à aplicação do direito, a nível fáctico são muito similares à que apreciamos.
E, sendo desse modo, face à concreta factualidade que se apurou nos autos, só podemos concluir, como naqueles se concluiu que, dos factos provados não se extrai que tenha ocorrido transferência, directa ou indirecta, de quaisquer equipamentos ou bens corpóreos da Ré/AA… para a Ré/CC…, ou seja, que esta última não retomou, nem lhe foram entregues, quaisquer equipamentos da primeira indispensáveis ao exercício da prestação de serviços de vigilância e de segurança das instalações para que foi contratada e diversamente, provou-se que a primeira “não transmitiu qualquer tipo de equipamento que lhe pertencesse ao “CC…”, nem know-how, experiência, metodologias, processos ou informação, da “AA…” relativamente à prestação da atividade de segurança privada e vigilância humana para a DD…”, sendo que apenas os que eram pertença da Cliente aí se mantiveram e puderam assim ser depois utilizados, não se provando que a recorrida tivesse recebido daquela quaisquer bens que constituam indício revelador da concretização da transmissão de um estabelecimento que constitua uma unidade económica, tanto mais que, igualmente, como se disse, não se provou que tivesse sido transmitido o know-how – o conjunto de conhecimentos práticos e os meios materiais e técnicos – indissociáveis à prossecução de uma actividade económica de segurança privada.
Efectivamente, embora estejamos perante uma empresa cuja actividade assenta essencialmente na mão-de-obra prestada por aqueles que exercem a vigilância e segurança ao serviço da respectiva empresa, a mera circunstância de a Ré/AA… ter perdido para a Ré/CC…, o cliente junto do qual prestava serviços de vigilância, em virtude deste serviço ter sido adjudicado a esta, não configura, por si só, uma situação de transmissão de empresa ou estabelecimento. Como bem se refere naqueles citados Acórdãos, que se vêm seguindo “a complexidade e as exigências técnicas, materiais e de formação profissional dessa actividade de segurança privada, que são imprescindíveis para o exercício da actividade, nos termos que decorrem do respectivo enquadramento legal e se espraiam nos factos que se provaram nos autos, não permitem, em nosso entender, que se equipare esta actividade a outras exclusivamente assentes em mão de obra/no «capital humano», v.g., os serviços de limpeza de escritórios e casas particulares”.
Em suma, só podemos concluir ao contrário do que defende a recorrente e tal como bem se considerou na decisão recorrida que, no caso, não ocorreu qualquer transmissão de “unidade económica” da Ré/AA… para a Ré/CC… e, nessa medida, a posição contratual daquela no contrato de trabalho que manteve com o A. não se transmitiu para a última.
Nessa conclusão, só podemos ter por aplicável ao caso a solução de direito a que se chegou naqueles Acórdãos, antes referidos e, nessa medida, só podemos manter a decisão proferida em 1ª instância, de condenação da Ré/Recorrente por alegado despedimento ilícito do Autor, impondo-se a absolvição da Ré/CC…, com a total improcedência dos pedidos formulados pelo Autor, subsidiariamente, em relação a ela e, consequentemente, decidir pela improcedência do recurso, no que toca a esta questão.
E, quanto às consequências decorrentes da ilicitude do despedimento do A. por parte da Ré/AA…, são elas as mesmas que se declararam na decisão recorrida que, por não terem merecido reparo por parte da recorrente, nos dispensamos de repetir.
Improcedem, assim, as conclusões A a W da apelação.
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Analisemos, agora, a questão de saber se, o Tribunal “a quo” errou, ao condenar a recorrente a título de compensação não patrimonial ao Autor.
A este propósito, na sentença decidiu-se o seguinte que se transcreve: “...importa ainda apreciar o pedido de condenação da 1ª Ré “AA…” a pagar ao Autor o montante de €10.000 a título de indemnização pelos danos não patrimoniais por si sofridos.
Vejamos.
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“Efectivamente, resulta do n.º 1 do artigo 389.º do Código do Trabalho de 2009, que sendo o despedimento declarado ilícito, a entidade empregadora é condenada a indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais [alínea a)].
Por seu turno, estabelece o n.º 1 do artigo 496.º do Código Civil que na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito”, (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22-02-2017; www.dgsi.jstj.pt- Proc. nº 2236/15.0T8AVR.P1.S1).
Assim, para ser arbitrada uma indemnização por danos não patrimoniais, importa que estejam preenchidos alguns requisitos, entre os quais o da existência de um facto ilícito, a imputação do facto ao lesante e verificação de um dano não patrimonial, como resulta do disposto no art.º483 do CCivil, e nos termos do nº1 do art.º496, só são atendíveis os danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito.
Sobre a indemnização do dano moral no despedimento ilícito, como nos relata o Prof. Júlio Gomes, in Direito do Trabalho Volume I, pág. 1036, a jurisprudência italiana tem valorizado a desumanidade do despedimento e a violação do respeito pela dignidade do trabalhador em momentos da sua vida particularmente difíceis, referenciando algumas dessas decisões.
No caso em apreciação, resultou apurado, com interesse para a decisão da presente questão, que:
B) Em 04 de Maio de 2006, o Autor foi admitido ao serviço da primeira Ré, por contrato individual de trabalho, para exercer as funções de vigilante.
C) O vencimento do Autor foi sujeito a aumentos, cifrando-se o ultimo vencimento mensal em €694,39, acrescido de igual montante a título de subsídios de férias e de Natal, acrescido do montante de €6,06 a título de subsidio de alimentação por cada dia efectivo de trabalho.
D) O Autor prestava as funções de vigilante nas instalações pertencentes a uma cliente da sua entidade patronal, denominada “DD…, SA”, sitas na Rua …, nº…, ….-… Maia, no âmbito de um contrato de prestação de serviços entre estas duas entidades.
H) Durante a execução do contrato, o Autor desempenhou todas as funções que lhe foram solicitadas pela sua entidade patronal, de forma ininterrupta, zelosa, assídua e pontual, gozando de toda a confiança e respeito por parte da entidade patronal.
I) Sob a direcção, autoridade, fiscalização e no interesse da 1ª Ré bem como no âmbito da sua organização, o Autor prestou-lhe, ininterruptamente, a sua actividade profissional até 31 de Janeiro de 2019.
J) A Ré AA… pagou ao Autor o vencimento relativo ao mês de Janeiro de 2019, nada mais tendo pago a partir dessa data, o qual se encontra a partir de 01 de Fevereiro de 2019 sem auferir um qualquer vencimento.
K) E sem auferir um qualquer subsídio.
L) Com data de 21/01/2019 a Ré AA… enviou uma carta ao Autor informando-o que o serviço de segurança do cliente “DD…, S.A.” tinha sido adjudicado por este cliente ao “CC…”, que a referida transmissão de estabelecimento ocorrerá no dia 01 de Fevereiro de 2019, data em que aquela empresa assumirá a prestação do serviço e que transmitem-se para o adquirente a posição de empregadora nos contratos de trabalho, o qual deve receber a transmissão e manutenção dos postos de trabalho e respectivos contratos de trabalho dos vigilantes que prestam funções no local.
M) A Ré AA… através da mesma carta declarou também cessado o contrato de trabalho celebrado com o autor com efeitos a partir de 31 de Janeiro de 2019, referindo ainda nessa carta “que a empresa CC…, S.A., foi informada da lista dos trabalhadores a operar no estabelecimento DD…, S.A. e informação necessária para os contratos de trabalho”.
N) A partir do dia 01 de Fevereiro de 2019 a Ré CC… passou a efetuar serviços de vigilância das instalações da “DD…, SA.”, em …, Maia.
O) No dia 01 de fevereiro de 2019, o aqui Autor e demais colegas de trabalho, compareceram nas instalações pertencentes à “DD…, S.A.”, sitas em …, Maia, onde até essa data exerciam as suas funções de vigilância, afirmando querer continuar a exercer essas funções, tendo no local um representante da sociedade DD…, S.A., comunicou que não eram trabalhadores da 2ª Ré “CC…”, que não estavam autorizados a exercer as funções naquelas instalações e que a sua empregadora era a empresa “AA…, S.A.”, aqui 1ª Ré, que não havia trabalho para eles, tendo a 2ª Ré reiterado a informação de que não eram seus trabalhadores e que não havia trabalho para eles na cliente D…, S.A.
P) Procuraram ainda obter explicações junto da 1ª Ré, através dos seus superiores hierárquicos, que resultaram infrutíferas.
Q) Quer o Autor quer os seus colegas de trabalho continuaram a apresentarem-se no local de trabalho, mas todas as tentativas de exercerem as funções para os quais foram contratados resultaram infrutíferas.
R) Por duas vezes foi obrigado a chamar a GNR ao local, bem como apresentou participação junto da Autoridade para as Condições de Trabalho.
S) Solicitaram ainda por escrito às duas RR instruções do local, dia e hora onde deveriam prestar o concurso do seu trabalho, tendo só obtido resposta por parte da 2ª Ré “CC…” que, por carta datada de 12-2-2019, comunicou ao Autor “que não reconhecia a existência de qualquer fundamento legal, sob nenhuma perspetiva, que legitimasse a transmissão do contrato de trabalho” e que “rejeita qualquer responsabilidade sobre a relação laboral que V. Exª possui com a AA…, não lhe reconhecendo, por tal não ser devido, a qualidade de trabalhador da empresa signatária da presente missiva”.
T) A partir de 01 de Fevereiro de 2019 o aqui Autor encontra-se impedido de prestar o seu trabalho, por decisão unilateral da sua entidade empregadora.
U) Sem auferir qualquer vencimento, sem auferir qualquer subsídio e sem que procedam aos descontos devidos para a Segurança Social relativos à sua carreira contributiva.
V) A 1ª Ré manifestou de forma inequívoca a sua recusa de manter o Autor ao seu serviço e a 2ª Ré, de forma inequívoca, declinou assumir a continuidade da relação laboral do Autor.
W) Em consequência directa e necessária do referido comportamento da entidade empregadora para consigo, mormente da sua decisão de não manter o Autor ao seu serviço, privando-o do seu trabalho e do seu salário, o Autor ficou triste e com uma depressão e perdeu o sono pelo facto de ter ficado sem trabalho, sofrendo dificuldades em fazer face aos encargos normais da vida doméstica, sentindo-se ferido na sua dignidade e humilhado por se ver forçado a pedir auxílio financeiro a terceiros e trabalho, sentindo-se diminuído na sua dignidade e capacidade profissional.
X) A retribuição que o Autor auferia junto da 1ª Ré era o principal meio de sustento do seu agregado familiar.
Y) O A. viu-se sem emprego, sem fonte de rendimento e sem quaisquer expectativas de futuro.
Z) Tudo isto afectou as suas relações com familiares, amigos e colegas de trabalho, que o vêem permanentemente desalentado, com grande frustração e desânimo.
CC) Verificou-se a substituição dos vigilantes.
DD) A “AA…” enviou duas cartas ao “CC…”, a primeira datada de 21 de janeiro de 2019 e a segunda datada de 31 de janeiro de 2019, nas quais nomeadamente referia que na sequência a esta da adjudicação de vigilância e segurança das instalações da “DD…” considera que “estamos perante uma unidade económica que se transferiu para o novo operador o qual deve herdar, manter os postos de trabalho e respetivos contratos de trabalho dos vigilantes que prestam funções na DD…” enviando em anexo uma lista de tais vigilantes, que incluía o Autor.
EE) A “CC…” enviou à “AA…” duas cartas, a primeira datada de 23-01-2019 e a segunda datada de 6 de fevereiro de 2019, na qual nomeadamente referia que “a situação em apreço não reveste as condições necessárias, por omissão de elementos essenciais, para sustentar a existência e/ou manutenção de uma unidade económica” e que não assumirá a posição de empregador relativamente aos trabalhadores identificados pela AA….
No caso em apreciação, resultou, assim, apurada, de forma manifesta, a violação culposa por parte da 1ª Ré “AA… dos mais elementares direitos do Autor/trabalhador pois, conforme acima já se referiu e considerou, o Autor foi despedido ilicitamente pela sua empregadora aqui 1ª Ré, com um elevado grau de ilicitude por parte desta.
Com efeito, sem que nada o fizesse prever e sem que o Autor pudesse minimamente contar com a conduta da sua entidade empregadora desde há cerca de 13 anos, pois o Autor não praticou qualquer facto, nem adoptou qualquer conduta ou comportamento que pudesse sequer ser invocado como “fundamento” ou “causa” do seu despedimento, e mercê de um facto completamente alheio ao trabalhador (a cessação do contrato de prestação de serviços de vigilância e segurança entre a 1ª Ré e a cliente “DD…”) o mesmo viu-se de repente sem emprego e sem salário, em virtude da adopção pela 1ª Ré de um entendimento jurídico de transmissão de estabelecimento, no mínimo muito discutível, e muito discutido (pelo menos, à data), que conforme resulta do supra apreciado e decidido a esse propósito, foi considerado improcedente por não verificado na presente causa.
Efectivamente, não se pode deixar de considerar como temerária a conduta da 1ª Ré de, fundando-se num entendimento jurídico longe de se considerar, à data, como pacífico e inquestionável quer em face da lei nacional e da lei comunitária então vigentes, quer perante a jurisprudência e doutrina relativas a tal questão, certamente não desconhecendo a 1ª Ré o relevante, e atrás já citado, Acórdão do STJ de 06.12.2017, (www.dgsi.jsjt.pt-Proc. 357/13.3TTPDL.L1.S1) apontando em sentido totalmente oposto ao seguido pela 1ª Ré, apenas sustentada nas revisões parciais dos CCT’s celebrados pela AES publicadas no BTE nº48 de 29/12/2018 que apenas abrange parte das empresas de vigilância e segurança privada, o que não é o caso da aqui 2ª Ré, estando as restantes vinculadas aos CCT’s e suas revisões, celebrados pela AESIRF (mormente quanto à denominada “sucessão do posto de trabalho” e à “transmissão do estabelecimento”), a 1ª Ré despediu subitamente e sem qualquer motivo o Autor, invocando uma transmissão de estabelecimento que a aqui 2ª Ré não aceitou, o que também a 1ª Ré não podia desconhecer que sucederia, desde logo por a 2ª Ré não ser filiada na associação subscritora do CCT da 1ª Ré e assim não sufragar o aludido questionável entendimento de transmissão de estabelecimento por cessação de um contrato de prestação de serviços de vigilância e de segurança junto de um determinado cliente e pela contratação de uma outra empresa de vigilância e segurança privada para prestar tais serviços. Ou seja, com base num entendimento discutível e fortemente controvertido em Tribunal, e a nosso ver improcedente (pelo menos à luz da legislação laboral em vigor à data : 2018 e 2019) a 1ª Ré fez cessar o seu contrato de trabalho de forma repentina e abrupta com o Autor (sem que o mesmo tivesse praticado qualquer acto ou tido qualquer comportamento perante a 1ª Ré a que sequer pudesse ser minimamente “imputável” tal despedimento), sem qualquer garantia prévia ou sequer razoável expectativa de que a 2ª Ré aceitaria a transmissão do contrato do trabalho do Autor, forçando-o, numa posição de extrema fragilidade e vulnerabilidade, por o Autor ter ficado subitamente sem trabalho e sem a retribuição mensal, a ter de recorrer aos tribunais para fazer valer os seus direitos e garantias fundamentais ao trabalho e ao salário, onerando-o com todo o esforço, despesas e desgaste inerentes a qualquer litigância judicial.
Deste modo, terá de se considerar tal conduta temerária da 1ª Ré como tendo fortemente desconsiderado a pessoa do Autor, seu trabalhador durante cerca de 13 anos, ao subitamente ter feito cessar o seu contrato de trabalho, sem o mínimo de garantia ou segurança jurídica de que a 2ª Ré aceitaria a transmissão do seu contrato, forçando o trabalhador a uma total indefinição da sua situação, colocando-o autenticamente “entre a espada” (a invocada transmissão do seu contrato por parte da 1ª Ré para a 2ª Ré) “e a parede” (a recusa da 2ª Ré quanto a verificar-se a invocada transmissão do contrato de trabalho não podendo, assim, a 2ª Ré assumir a posição de entidade empregadora de um trabalhador que não é seu e cujo contrato não se transmitiu para a sua esfera jurídica), tendo o autor trabalhador tido necessariamente que interpor a presente acção para ver definida a sua situação, para a qual, repita-se em nada contribuiu e que resultou de circunstâncias completamente alheias à sua conduta contratual laboral para com a 1ª Ré, que se apurou ter sido exemplar ao longo de cerca de 13 anos.
Daí que se nos afigure inequívoco que tendo-se provado que em consequência directa e necessária do referido comportamento da entidade empregadora para consigo, mormente da sua decisão de não manter o Autor ao seu serviço, privando-o do seu trabalho e do seu salário, o Autor ficou triste e com uma depressão e perdeu o sono pelo facto de ter ficado sem trabalho, sofrendo dificuldades em fazer face aos encargos normais da vida doméstica, sentindo-se ferido na sua dignidade e humilhado por se ver forçado a pedir auxílio financeiro a terceiros e trabalho, sentindo-se diminuído na sua dignidade e capacidade profissional, que a retribuição que o Autor auferia junto da 1ª Ré era o principal meio de sustento do seu agregado familiar, que o A. viu-se sem emprego, sem fonte de rendimento e sem quaisquer expectativas de futuro e que tudo isto afectou as suas relações com familiares, amigos e colegas de trabalho, que o vêem permanentemente desalentado, com grande frustração e desânimo, tais sentimentos vividos e sofridos pelo Autor, pela sua gravidade, são merecedores da tutela do direito, ao abrigo do n.º1 do art.º 496 do Cód. Civil.
Na verdade, a 1ª Ré não podia desconhecer que a sua conduta de fazer cessar subitamente o seu contrato de trabalho com o Autor, invocando que tal contrato se transmitira para a 2ª Ré, sabendo da altíssima probabilidade de tal entendimento não ser aceite por esta e de o mesmo ser altamente discutível e discutido, colocaria o Autor, como colocou, numa situação pessoal, familiar e profissional comprovadamente vulnerável.
Afigura-se-nos pois que esta atitude da 1ª Ré é de uma especial censurabilidade pois fez cessar o contrato de trabalho, sem que o Autor tivesse tido sequer qualquer comportamento ou atitude que pudesse ser tida como “causadora” de tal ruptura contratual, meramente com base num entendimento promovido pela própria 1ª Ré, mas sem qualquer garantia de que o mesmo era partilhado pela 2ª Ré, sendo previsível, à luz do critério do homem médio, que o trabalhador ficaria numa situação pessoal, familiar e profissional de particular fragilidade e que o seu estado económico e financeiro seria agravado, como se verificou ter ocorrido, tendo de aguardar pela decisão de um processo judicial para ver a sua situação definida, acabando a conduta da 1ª Ré por redundar no despedimento do Autor, despedimento esse que era ilícito, razão pela qual foi declarado improcedente.
Assim, ainda que os danos morais, pelo sofrimento e instabilidade do foro psíquico, sejam de difícil quantificação, estamos perante danos morais merecedores da tutela do direito, face ao elevado sofrimento causado pelo agravamento do estado de saúde e da estabilidade familiar, social e económica do Autor; e perante uma especial censurabilidade do comportamento da 1ª Ré, que procedeu a um despedimento com a desumanidade a que alude o Prof. Júlio Gomes, in Direito do Trabalho Volume I, pág. 1036, porque violador do dever de respeito mínimo pela dignidade do trabalhador, sem atentar minimamente nas consequências que tal despedimento causaria a um trabalhador cuja relação laboral com a 1ª Ré já durava há cerca de 13 anos, face à posição de particular fragilidade e de indefinição em que colocou o Autor e que a 1ª Ré não podia desconhecer, totalmente merecedor, por isso, da tutela do direito, estando-se, por isso, longe, de se poder falar em meros incómodos, transtornos ou meras tristezas (autênticas “bagatelas emocionais”) sem gravidade bastante para serem indemnizadas.
“Atento o exposto, e tendo resultado provado que em consequência da situação de desemprego provocado pela denúncia ilícita do contrato de trabalho o trabalhador sofreu preocupação e angústia em relação ao seu futuro, situação agravada (…), temos de acompanhar a decisão (…) que considerou estes danos merecedores de tutela.
(…)
Por outro lado, sendo casado e tendo um filho a seu cargo, a angústia em relação ao futuro é perfeitamente justificada.”
“E conforme resulta do n.º 3 do mencionado preceito, a indemnização por danos não patrimoniais será fixada equitativamente, devendo o tribunal considerar as circunstâncias referidas no artigo 494.º do mesmo Código, o qual prevê que, na fixação do valor da indemnização há que ter em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso. “, (Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 22-02-2017; www.dgsi.jstj.pt-Proc. nº 2236/15.0T8AVR.P1.S1).
Deste modo, por todo o exposto, e tendo ainda em atenção o elevado estatuto económico da 1ª Ré, tratando-se consabidamente de uma das maiores empresas do ramo da actividade de vigilância e segurança privada no nosso País, julga-se adequado e equitativo fixar ao autor pelos danos morais sofridos uma indemnização no valor de €8.500.00 (oito mil e quinhentos euros), procedendo nessa parte e medida o por si peticionado a esse propósito.” (sublinhados nossos).
Discorda a recorrente, deste segmento da sentença, dizendo que aquela a condena “ao pagamento de uma indemnização no montante de €8.500,00”...”porque considera que ficou provado que o A. ficou triste e com uma depressão e perdeu o sono pelo facto de ter ficado sem trabalho, sofrendo dificuldades em fazer face aos encargos normais da vida doméstica sentindo-se ferido na sua dignidade e humilhado por se ver forçado a pedir auxílio financeiro a terceiros, sentindo-se diminuído na sua dignidade e capacidade profissional, que se viu sem emprego sem fonte de rendimento, sem quaisquer expetativas de futuro e que tudo isso afetou a sua relação com familiares, amigos e colegas de trabalho, que o vêem permanentemente desalentado, com grande frustração e desânimo.
Mais considera a sentença que a aqui recorrente teve uma conduta com especial censurabilidade porque fez cessar o contrato de trabalho meramente com base num entendimento por si promovido, sendo previsível que o A. ficaria numa situação de fragilidade”, e prossegue, dizendo:
“Ora, salvo o devido respeito, desde logo a sentença dá como provados factos para os quais não dispõe de elementos probatórios suficientes que os sustentem.
Não pode a sentença dar como provado que o A. ficou com uma depressão apenas tomando por base as declarações de parte deste e os depoimentos das testemunhas ouvidas. A depressão é uma doença que carece de comprovação clínica, não tendo o tribunal como considera a sua existência sem, ao menos, um relatório clínico que o ateste e que estabeleça uma relação causal entre a conduta da Ré e esse quadro clínico observado. Assim,
Salvo melhor opinião, é totalmente descabido dizer-se que o A. estava com uma depressão, visto inexistir qualquer elemento probatório nos autos que o sustente.
Quanto aos restantes argumentos utilizados, sempre se dirá que o A. ficar triste, perder o sono, ficar desalentado, são decorrências normais de uma situação de desemprego. Não se vislumbra que qualquer trabalhador, em face da perda do emprego pudesse manter-se com a moral em alta, feliz com a vida e cheio de esperança no futuro.
De igual modo, não pode a sentença relevar o argumento de que o A. nem seque beneficiou de subsídio de desemprego, visto que, numa situação destas, como o A. sabe, e como aliás fizeram todos os seus colegas nas mesmas circunstâncias, com a propositura da ação judicial, pode requerer o benefício do subsídio de desemprego, não podendo ser assacado à Ré que aquele tenha ficado, ainda que temporariamente sem usufruir do mesmo.
Usa ainda a sentença o argumento, segundo o qual a Ré terá sido temerária, agindo com elevado grau de censurabilidade, posto que teria promovido o despedimento com base num entendimento por si promovido. Ora,
Conforme desde logo resulta do teor da contestação apresentada, a própria Ré promoveu a transmissão de estabelecimento em situações similares, que esgrimidas em tribunal lhe foram favoráveis. Além disso,
E conforme decorre deste mesmo recurso, a posição da Ré é juridicamente defensável, olhando para as posições doutrinais e jurisprudenciais invocadas, bem como a própria alteração legislativa recentemente promovida, que amplifica, facilita a transmissão de estabelecimento na área da vigilância. Por isso,
A posição da Ré não é descabida nem pode servir como argumento a previsibilidade de o A. se ter que submeter a um pleito judicial para ver os seus direitos reconhecidos. Se assim fosse, então qualquer empresa, perante a possibilidade de uma sua congénere vir a recusar a transmissão do trabalhador, desde logo a evitaria, ainda que a mesma fosse legítima!”.
Desta discorda o A./recorrido, pugnando pela manutenção da decisão recorrida, com base na alegação de que nenhum dos argumentos invocados pela recorrente deverá merecer acolhimento, atentos os danos morais que sofreu causados pelo comportamento ilícito da mesma.
Apreciando.
Importa que se comece, pela alegação do recorrido que sintetiza na conclusão VI., já que como o mesmo bem refere e se retira das alegações e conclusões da recorrente, começa esta, no que toca a esta questão, por se insurgir contra a decisão recorrida, alegadamente por discordar da decisão quanto à matéria de facto, como se verifica das suas conclusões X e ss., mas sem que o faça do modo que lhe é exigível.
Senão, vejamos.
Dispõe o nº 1 do art. 662º, que: “a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.”.
Aqui se enquadrando, naturalmente, as situações em que a reapreciação da prova é suscitada por via da impugnação da decisão de facto feita pelos recorrentes.
Nas palavas de (Abrantes Geraldes, in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, Coimbra, 2013, págs. 221 e 222) “… a modificação da decisão da matéria de facto constitui um dever da Relação a ser exercido sempre que a reapreciação dos meios de prova (sujeitos à livre apreciação do tribunal) determine um resultado diverso daquele que foi declarado na 1ª instância”.
No entanto, como continua o mesmo autor (págs. 235 e 236), “… a reapreciação da matéria de facto no âmbito dos poderes conferidos pelo art. 662º não pode confundir-se com um novo julgamento, pressupondo que o recorrente fundamente de forma concludente as razões por que discorda da decisão recorrida, aponte com precisão os elementos ou meios de prova que implicam decisão diversa da produzida e indique a resposta alternativa que pretende obter.”.
Esta questão da impugnação da decisão relativa à matéria de facto e a sua apreciação por este Tribunal “ad quem”, conforme dispõe o art. 640º ex vi do art. 1º, nº 2, al. a) do C.P.Trabalho, impõe ao recorrente o cumprimento, que se quer integral, sob pena de rejeição, dos seguintes ónus:
1) a especificação dos concretos pontos de facto que considera incorrectamente julgados, (al. a) do nº 1);
2) a especificação dos concretos meios probatórios que impunham uma decisão diversa sobre os concretos pontos da matéria de facto impugnados, (al. b) do nº 1);
3) a decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas, (al. c) do nº 1); e
4) quando os meios probatórios invocados tenham sido gravados, a indicação, com exactidão, das passagens da gravação em que se funda, (al. a) do nº 2).
Tendo em atenção a graduação de importância dos sobreditos ónus, poder-se-á afirmar que o primeiro, a indicação concreta dos pontos de facto impugnados, é o que assume a primazia, porque ele delimita o poder de cognição deste Tribunal “ad quem”, especialmente quando estejam em discussão direitos de natureza disponível, porque é exclusivo do seu titular fazer o enquadramento fáctico do direito que pretende fazer valer.
A indicação dos concretos meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida, assim como o projecto de decisão, assentam no princípio da auto-responsabilização do recorrente e no cumprimento efectivo do dever de cooperação, que, inequivocamente, os justificam, impondo-se o cumprimento de tais ónus, ainda que se possa admitir uma menor concisão da que é exigida para o primeiro.
Ora, transpondo para o caso, analisando a alegação e conclusões da recorrente verifica-se que, como bem o disse o recorrido, aquela não cumpre os ónus que lhe são impostos, no que respeita à impugnação da decisão em matéria de facto, previstos naquele art. 640º, nºs 1 e 2, do CPC.
A forma genérica e conclusiva, como coloca a questão, quanto à impugnação que dirige àquela decisão acompanhada das considerações que tece, não tanto quanto à alteração daqueles factos, mas a respeito da sua própria interpretação e a valoração que dos mesmos deveria ter sido feita, em termos de decisão de direito, denota, essencialmente, que a Recorrente através da impugnação da matéria de facto deduzida o que põe em causa é a forma como se formou a convicção do Tribunal “a quo”, manifestando a sua discordância com a interpretação que é feita da factualidade apurada e a sua subsunção a nível de direito.
Razões, como são sabidas, insusceptíveis de determinar a alteração da matéria de facto. Além de que, a entender-se que a recorrente veio impugnar aquela, sempre, teria a mesma de ser rejeitada, por incumprimento dos ónus referidos.
Mantém-se assim, inalterada a factualidade assente, supra transcrita, em concreto, aqueles pontos dos factos provados que o Mº Juiz “a quo”, bem, considerou para fundamentar a decisão recorrida, a propósito da questão em apreço.
Importa, então, dizer.
No que respeita aos danos não patrimoniais, verifica-se que a sua ressarcibilidade em virtude de o trabalhador ser despedido ilicitamente pela sua empregadora, encontra-se expressamente prevista na al. a), do nº 1, do art. 389º, do CT, que lhe confere o direito a indemnização por danos patrimoniais e não patrimoniais, nos termos gerais de direito. Dispondo, por sua vez, o art. 323º, nº 1 do mesmo código que a parte que faltar culposamente ao cumprimento dos seus deveres é responsável pelo prejuízo causado à parte contrária, numa reafirmação ou transposição, para o contrato de trabalho, do que já se previa no demais direito contratual cível, em que o art. 798º do CC dispõe que “o devedor que falta culposamente ao cumprimento da obrigação torna-se responsável pelo prejuízo que causa ao credor”.
E, o art. 483º, nº 1, do CC dispõe que «aquele que, com dolo ou mera culpa, violar ilicitamente o direito de outrem ou qualquer disposição legal destinada a proteger interesses alheios fica obrigado a indemnizar o lesado pelos danos resultantes da violação», sendo que, o art. 496º do CC prevê, no seu nº 1, que «na fixação da indemnização deve atender-se aos danos não patrimoniais que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito» e no seu nº 3 que a indemnização por danos não patrimoniais será fixada equitativamente, devendo o tribunal atender, em qualquer caso, às circunstâncias referidas no art. 494º do mesmo Código, o qual determina, por seu turno, que na fixação do montante da indemnização se deve ter em conta «o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso».
Por outro lado, não esclarecendo a lei quais são os danos que pela sua gravidade merecem a tutela instituída, cabe ao julgador decidir caso a caso, se a gravidade é de tal ordem que justifique a tutela.
A este propósito transcreve-se a seguinte passagem do Ac. da RP de 24/09/2007, acessível em www.dgsi.pt «A gravidade tem de ser aferida por um padrão objectivo e não à luz de factores subjectivos».
Por sua vez, a indemnização deve ser fixada segundo critérios de equidade, segundo as regras do bom senso, da boa prudência e da justa medida das coisas face às realidades da vida e aos valores dominantes na sociedade, atendendo-se à gravidade do dano, ao grau de culpabilidade do agente, à situação económica deste e do lesado, e a todas as outras circunstâncias que contribuam para uma solução justa.
Competindo ao autor que invoca o direito a tal indemnização, nos termos do disposto pelo art. 342º, nº 1 do CC, alegar os factos constitutivos do seu direito, designadamente os danos sofridos e os factos demonstrativos da gravidade de tais danos.
Na situação em apreço ficou demonstrada a actuação ilícita da ré/recorrente, traduzida na decisão de não manter o Autor ao seu serviço, privando-o do seu trabalho e do seu salário, ou seja, no despedimento, que se julgou ilícito daquele, e culposa, mesmo que presumidamente, na falta de ilisão da presunção legal de culpa a que alude o art. 799º, nº 1 do CC, e que sobre aquela impendia. E ficou igualmente demonstrado o nexo entre tal actuação e os danos sofridos pelo autor.
De facto, ficou demonstrada a violação da dignidade profissional e pessoal do autor que, em consequência da actuação da ré “W)... ficou triste e com uma depressão e perdeu o sono pelo facto de ter ficado sem trabalho, sofrendo dificuldades em fazer face aos encargos normais da vida doméstica, sentindo-se ferido na sua dignidade e humilhado por se ver forçado a pedir auxílio financeiro a terceiros e trabalho, sentindo-se diminuído na sua dignidade e capacidade profissional.”, Mais se provou que, “X) A retribuição que o Autor auferia junto da 1ª Ré era o principal meio de sustento do seu agregado familiar. Y) O A. viu-se sem emprego, sem fonte de rendimento e sem quaisquer expectativas de futuro.”. Sendo que, “Z) Tudo isto afectou as suas relações com familiares, amigos e colegas de trabalho, que o vêem permanentemente desalentado, com grande frustração e desânimo”.
Cremos, assim, que a natureza das consequências suportadas pelo autor permite, pois, concluir pela gravidade bastante para justificar a tutela do direito. Veja-se que se trata de danos que se produzem ao nível da integridade moral e do bem estar físico do autor, que afectaram a sua realização pessoal através do trabalho, bem com a tranquilidade do seu sono, afectam inelutavelmente a sua capacidade de se regenerar quer física quer emocionalmente.
Subscrevemos, assim, os fundamentos e o decidido na sentença recorrida, verificando-se no caso os pressupostos da responsabilidade civil, nomeadamente a culpa que, no caso, se presume, atento o teor do disposto no art. 799° n°1 do CC, norma segundo a qual incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento da obrigação não procede de culpa sua.
Como se refere no (Ac. de 09.08.2014, desta Relação e secção), "Como princípio geral, a culpa do empregador presume-se, nos termos do artigo 799.°, n.° 1, do Código Civil, de acordo com o qual "incumbe ao devedor provar que a falta de cumprimento ou o incumprimento defeituoso da obrigação não procede de culpa sua".
Por isso, quando ocorra a violação de um qualquer dever contratual por parte do empregador, designadamente a violação da prestação efectiva de trabalho, vale a regra ínsita no art. 799°, n° 1, do CC, o que significa que, demonstrados os comportamentos que configuram, na sua materialidade, violação de deveres contratuais imputados ao empregador (cuja prova, nos termos do art. 342°, n° 1, do mesmo código, compete ao trabalhador), a culpa do mesmo presume-se, havendo de ter-se por verificada, caso a presunção não seja ilidida pelo empregador.
Em suma, o A. demonstrou ter sofrido danos morais sérios, relevantes e merecedores da tutela do direito e atentas as circunstâncias do caso, resta-nos, a este propósito confirmar, também, a sentença recorrida.
Acrescendo que, consideramos adequada a ressarci-los a quantia de € 8.500,00 fixada naquela.
Improcedem, assim, todas ou são irrelevantes as conclusões da apelação.
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III - DECISÃO
Pelo exposto, acorda-se nesta secção em julgar improcedente a apelação e, em consequência, confirmar a decisão recorrida.

Custas pela apelante.
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Porto, 17 de Janeiro de 2022
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O presente acórdão é assinado electronicamente pelos respectivos,
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes
António Luís Carvalhão
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[1] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 4094/19.7T8PRT.P1.
[2] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 357/13.3TTPDL.L1.S1.
[3] Norma que prevê caber recurso excecionalmente quando esteja em causa uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, seja claramente necessária para uma melhor aplicação do direito.
Assim, o ter sido admitida a revista excecional revela a complexidade que se referiu no texto.
[4] Está em causa a redação anterior à Lei nº 14/2018, de 19 de março.
[5] Nota de rodapé (6) do acórdão, com o seguinte teor: Cf. o referido Acórdão proferido no âmbito do processo nº 03S2467, Relatado por Vítor Mesquita, e disponível em www.dgsi.pt.
[6] Nota de rodapé (7) do acórdão, com o seguinte teor: E posteriormente reiterada a sua transposição para a ordem jurídica interna pelo art.º 2º, alínea l), da Lei nº 7/2009, de 12 de Fevereiro, que aprovou o Código do Trabalho de 2009. Para maior desenvolvimento sobre a matéria cf. Júlio Manuel Vieira Gomes, in “O conflito entre a jurisprudência nacional e a jurisprudência do TJ das Comunidades Europeias em matéria de transmissão do estabelecimento no Direito do Trabalho: o art.º 37º da LCT e a diretiva de 14 de Fevereiro de 1977, 77/187/CEE”, RDES, 1996, nºs 1-4, págs. 77 e segts.
[7] Nota de rodapé (8) do acórdão, com o seguinte teor: Sublinhado nosso.
[8] Nota de rodapé (9) do acórdão, com o seguinte teor: In “Tratado de Direito do Trabalho – Parte II – Situações Laborais Individuais”, 6ª Edição, 2016, Coimbra, págs. 644 e seguintes. Sublinhado nosso.
[9] Nota de rodapé (10) do acórdão, com o seguinte teor: In “A Transmissão da Empresa ou Estabelecimento no Código do Trabalho” – no “Prontuário de Direito do Trabalho”, CEJ, Maio-Agosto de 2005, Coimbra Editora, págs. 78-79.
[10] Nota de rodapé (11) do acórdão, com o seguinte teor: Conforme se realçou no recente Acórdão desta Secção, do STJ, de 28/09/2017, proferido no âmbito do processo nº 1335/13.8TTCBR.C1.S1, Relatado por Chambel Mourisco, e disponível em www.dgsi.pt.
[11] Nota de rodapé (12) do acórdão, com o seguinte teor: Proferido no âmbito do Proc. nº 10/11.2YFLSB, incidindo sobre estabelecimentos de ensino superior particular ou cooperativo, Relatado por Fernandes da Silva e disponível em www.dgsi.pt., com o sumário, nesta parte, do seguinte teor:
«3. O art.º 318.º do Cód. do Trabalho/2003 consagra uma noção ampla de ‘empresa/estabelecimento’, abarcando a transmissão da respetiva titularidade, a qualquer título, conquanto que a mesma, enquanto unidade económica, mantenha a sua operacionalidade e identidade.
4. A atividade prosseguida, pressuposta no escopo da unidade económica (o conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória – n.º 4 do art.º 318.º) não tem que visar necessariamente fins lucrativos».
[12] Nota de rodapé (13) do acórdão, com o seguinte teor: Sublinhado nosso.
[13] Nota de rodapé (14) do acórdão, com o seguinte teor: Acórdão disponível em www.eur-lex.europa.eu.
[14] Nota de rodapé (15) do acórdão, com o seguinte teor: Acórdão do STJ, proferido no âmbito da revista n.º 889/03.1TTLSB.L1.S1, Relatado por Pinto Hespanhol, e disponível em www.dgsi.pt.
[15] Nota de rodapé (16) do acórdão, com o seguinte teor: In “O Regime da Transmissão da Empresa no Código do Trabalho” – Coleção de Formação Inicial – Centro de Estudos Judiciários – Jurisdição do Trabalho e da Empresa, Setembro de 2014, pág. 190.
[16] Nota de rodapé (17) do acórdão, com o seguinte teor: In “Direito do Trabalho”, Coimbra Editora, Vol. I, págs. 808 e segts (821).
[17] Nota de rodapé (18) do acórdão, com o seguinte teor: In Direito do Trabalho, 5.ª Edição, 2010, Almedina, pág. 833. Sublinhado nosso
[18] Nota de rodapé (19) do acórdão, com o seguinte teor: Ibidem, obra citada, págs. 644 e segts. Sublinhado nosso.
[19] Nota de rodapé (20) do acórdão, com o seguinte teor: Cf., nesta matéria, António Monteiro Fernandes, in “Direito do Trabalho”, 1ª Edição, Almedina, págs. 233 e segts.
[20] Nota de rodapé (21) do acórdão, com o seguinte teor: Neste sentido, Maria do Rosário Palma Ramalho, ibidem, págs. 650 e 651; Joana Vasconcelos, in “A Transmissão da Empresa ou Estabelecimento no Código do Trabalho”, no Prontuário de Direito do Trabalho, Maio-Agosto de 2005, Coimbra Editora, pág. 91; e Rodrigo Serra Lourenço, in “Sobre o Direito de Oposição dos Trabalhadores na Transmissão do Estabelecimento ou Empresa”, Revista da Ordem dos Advogados, ano 69, págs. 267 e seguintes.
[21] Nota de rodapé (22) do acórdão, com o seguinte teor: Cf. Júlio Manuel Vieira Gomes, in “O conflito entre a jurisprudência nacional e a jurisprudência do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias em matéria de transmissão do estabelecimento no Direito do Trabalho: o art. 37° da LCT e a diretiva de 14 de Fevereiro de 1977, 77/187/CEE”, publicado na RDES, 1996, nºs 1-4, pág. 173 (cf. tb. págs. 77 e segts.) e “A Jurisprudência Recente do Tribunal de Justiça das Comunidades Europeias em Matéria de Transmissão de Empresa, Estabelecimento ou Parte de Estabelecimento – Inflexão ou Continuidade?”, Estudos do Instituto de Direito do Trabalho, Vol. I, I Curso de Pós-Graduação em Direito do Trabalho, Almedina, págs. 519-520.
[22] Nota de rodapé (23) do acórdão, com o seguinte teor: Cf. Júlio Manuel Vieira Gomes, Ibidem.
[23] Nota de rodapé (24) do acórdão, com o seguinte teor: Acórdão proferido no âmbito do Processo n.º 1493/07.0TTLSB.L1.S1, Relatado por Pinto Hespanhol, e disponível em www.dgsi.pt.
[24] In “Transmissão de Estabelecimento – o direito de oposição e a noção de unidade económica (Lei nº 14/2018)”, Quid Juris Sociedade Editora, 2021, pág. 29.
[25] Veja-se o acórdão do TJUE de 19.10.2017 (citado na decisão recorrida), que tem subjacente prestação de serviços de vigilância e segurança, disponível em http://curia.europa.eu, processo nº C-200/16.
[26] Entretanto foi publicada e entrou em vigor a Lei nº 18/2021, de 08 de abril (estende o regime jurídico aplicável à transmissão de empresa ou estabelecimento às situações de transmissão por adjudicação de fornecimento de serviços que se concretize por concurso público, ajuste direto ou qualquer outro meio, alterando o Código do Trabalho), que procedeu à alteração do art.º 285º do Código do Trabalho, que embora não aplicável no caso em apreço, veio clarificar ser aplicável o regime a casos como o dos autos.
[27] Disponíveis em http://curia.europa.eu, processo nº C-51/00 (caso Temco Service Industries SA contra Samir Imzilyen e outros) e processo C-463/09 (caso CLECE SA contra María Socorro Martín Valor e Ayuntamiento de Cobisa), respetivamente.
[28] Disponível em http://curia.europa.eu, processos nº C-173/96 e C-247/96 (apensados) – caso Hérnandez Vidal.
[29] Ibidem, pág. 29.
[30] Note-se que o transmissário pode dispor também de meios necessários ao funcionanamento da unidade e que complementam os recebidos, donde não se pode exigir a passagem de todas as pessoas e meios para se falar em unidade económica, mas apenas daqueles que permitem o seu funcionamento, mesmo que não pleno.
[31] Consultável em www.dgsi.pt, processo nº 6427/16.9T8PRT.P1.
[32] Como escreve David Carvalho Martins [“Novo Regime de Transmissão da Unidade Económica: algumas notas”, in Prontuário do Direito do Trabalho – Centro de Estudos Judiciários, 2018, número I, pág. 124], o intérprete-aplicador não deve centrar a sua análise para demonstrar a existência de uma unidade económica na perspetiva da sua organização, mas proceder a um exame que leve em conta as suas especificidades; por isso deve verificar se os meios de exploração transferidos pelo cedente constituíam para ele um conjunto operacional suficiente por si só para permitir a prestação dos serviços característicos da atividade económica da empresa sem recorrer a outros meios de exploração significativos ou a outras partes da empresa.
[33] Como refere António Monteiro Fernandes [“Alguns Aspetos do Novo Regime Jurídico-Laboral da Transmissão de Empresa ou Estabelecimento”, in Revista Questões Laborais, nº 53 (dezembro 2018), pág. 38] é necessário que a atividade tenha o mesmo âmbito e características no transmitente e no adquirente, ainda que sob formas organizacionais distintas, em função das diferentes natureza, dimensão e estrutura das suas entidades envolvidas.