Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1805/08.0TBVLG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MARIA JOSÉ SIMÕES
Descritores: ACIDENTE DE VIAÇÃO
NULIDADE DE SENTENÇA
OMISSÃO DE PRONÚNCIA
INTERVENÇÃO PRINCIPAL
CONCURSO DE CULPAS
AGRAVAMENTO DO DANO
EXAME DE PESQUISA DE ÁLCOOL
COLHEITA DE AMOSTRA DE SANGUE
INCONSTITUCIONALIDADES
Nº do Documento: RP201406301805/08.0TBVLG.P1
Data do Acordão: 06/30/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - A falta de apreciação do pedido relativamente ao interveniente principal constitui nulidade de sentença por omissão de pronúncia.
II - A falta de colocação do cinto de segurança por passageiro de um veículo automóvel que se despistou é culposa e deve concorrer com a culpa do condutor do mesmo veículo, por contribuir para o agravamento do dano, ainda que não seja causa adequada do acidente.
III - O exame ao sangue para pesquisa de álcool não é proibido, sendo antes permitido pela lei que até lhe dá prevalência em caso de contraprova, muito embora a pesquisa seja feita, em regra, através do teste do ar expirado.
IV - O art.º 156.º do Código da Estrada, na redacção dada pelo DL n.º 44/2005, de 28/9, não padece de inconstitucionalidade orgânica.
V - A consideração do resultado do exame ao sangue em acção cível, depois de o ter sido em processo contraordenacional, não viola a lei nem a Constituição.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Pº nº 1805/08.0TBVLG.P1
Apelação
(184)

ACÓRDÃO

Acordam os Juízes do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO

B…, intentou a presente acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinário contra “Companhia de Seguros C…, SA”, alegando, em súmula, que foi interveniente em acidente de viação ocorrido por culpa exclusiva do condutor de veículo automóvel segurado pela ré, acidente que a si, autor, causou vários danos patrimoniais e não patrimoniais, cuja liquidação pretende ver relegada para decisão ulterior.
Concluiu pedindo a condenação da ré a pagar-lhe o valor que vier a ser fixado, após liquidação, acrescido de juros de mora contados, à taxa legal, desde a citação e até integral reembolso.

Citada, a ré apresentou contestação, na qual, em súmula, começa por reconhecer a celebração do contrato de seguro invocado na petição inicial, bem como a verificação do acidente alegado pelo autor e ainda a culpa na produção do mesmo por parte do condutor do veículo segurado.
Defende, no entanto, que a gravidade e extensão dos danos ocorridos resultaram também de facto imputável ao autor (concretamente porque seguia no interior de um veículo automóvel sem ter o cinto de segurança colocado), motivo pelo qual, por apelo à regra consagrada no artigo 570º do Código Civil, entende que o valor da indemnização a atribuir ao autor deverá ser reduzida em 50%.
Afirma que, nos termos do contrato de seguro celebrado pela contestante, esta assumiu a obrigação de indemnizar terceiros até ao limite legal de € 600.000,00 próprio do seguro obrigatório, acrescido da cobertura complementar de € 49.400.000,00.
Afirma, no entanto, que a cobertura complementar facultativa, nos termos das condições gerais do seguro facultativo, estava excluída nos casos em que o condutor do veículo seguisse em contravenção da legislação aplicável à condução sob o efeito do álcool.
Defende que, no caso em apreço, tal exclusão deve ser aplicada, na medida em que o condutor do veículo seguro, no momento do acidente, seguia com uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l, o que lhe estava vedado pelos artigos 81º e 82º do Código da Estrada, bem como pela alínea l) do nº 1 do artigo 145º do mesmo diploma.
Invoca, por isso, que a responsabilidade da ré pela indemnização a atribuir ao aqui autor encontra-se limitada a € 600.000,00.
Alega ter já pago ao aqui autor, a título de adiantamentos pela indemnização a que aquele tem direito, a quantia global de € 87.948,48.
Impugna, por desconhecimento, a verificação e extensão dos danos alegados pelo autor.
Ao abrigo do disposto no artigo 330º do Código de Processo Civil, requer a intervenção provocada acessória de D…, pretendendo assegurar contra este o direito de regresso que defende assistir-lhe, atenta a condução sob o efeito de álcool por aquele protagonizada, causadora do acidente em que o autor foi interveniente.
Conclui pedindo o julgamento da acção de acordo com a prova que venha a ser produzida, com a procedência das excepções opostas e a consequente absolvição parcial da ré do pedido, e a condenação sempre sujeita ao limite legal de € 600.000,00, com consideração de todos os valores já pagos.

O autor apresentou réplica, na qual, em súmula, nega que no momento do embate não tivesse colocado o cinto de segurança.
Defende, no entanto, que, ainda que se entenda que assim não sucedeu, tal conduta não pode ser considerada como violadora do disposto no nº 1 do artigo 82º do Código da Estrada uma vez que a portaria reguladora da utilização do cinto de segurança apenas entrou em vigor em data posterior ao sinistro em apreço nestes autos.
Reconhece ter recebido quantias por parte da ré, por conta do total da indemnização, mas de valor inferior ao afirmado pela ré.
Não se opõe ao chamamento de D…, mas defende que este deve ser chamado a intervir no processo a título principal, nos termos previstos no artigo 325º do Código de Processo Civil.
Conclui como na petição inicial, requerendo ainda a intervenção principal provocada de D….

Notificada, a ré declarou não se opor à intervenção principal provocada na causa de D….

Tal intervenção foi admitida e, citado o interveniente nos termos e para os efeitos previstos no artigo 327º do Código de Processo Civil.

O interveniente apresentou articulado próprio, no qual, em súmula, começa por invocar a excepção de prescrição, afirmando que, tendo o acidente em apreço ocorrido a 16 de Maio de 2005, apenas foi citado para os termos do processo a 29 de Maio de 2009.
Reconhece a verificação do acidente invocado na petição inicial, mas nega que no momento conduzisse sob o efeito do álcool.
Afirma que o acidente de que resultaram danos para o autor B… ocorreu devido à precipitação intensa e vento que se faziam sentir na altura do sinistro que, em conjugação com as características da via, do piso, e do veículo, retiraram ao autor qualquer possibilidade de controlar o automóvel em que seguia, e no qual o autor seguia como passageiro.
Nega verificarem-se os pressupostos do direito de regresso que a ré declarou pretender fazer valer.
Conclui pedindo a procedência da excepção de prescrição, com a consequente absolvição do interveniente «da instância» (sic), ou a sua absolvição do pedido.

O autor apresentou articulado de resposta ao articulado do interveniente, no qual, em súmula, afirma que, ao caso deve aplicar-se o prazo de prescrição de 5 anos, por aplicação das normas consagradas nos artigos 118º e 148º do Código Penal e nº 3 do artigo 498º do Código Civil.
Aceita que o interveniente, no momento do embate, não seguisse sob a influência do álcool, mas impugna a descrição que o interveniente faz do acidente.
Conclui pedindo a improcedência da excepção de prescrição invocada pelo interveniente.

A ré “Companhia de Seguros C…, SA”, não apresentou articulado de resposta ao articulado do interveniente.

Foi proferido despacho saneador, que julgou improcedente a excepção peremptória de prescrição invocada pelo interveniente, do qual não foi interposto recurso.

Ainda antes de designada data para a realização da audiência de julgamento, foi determinada a apensação a estes autos da acção declarativa de condenação, sob a forma de processo ordinária, que sob o nº 2031/08.3TBVLG havia sido instaurada no 2º juízo do mesmo Tribunal Judicial de Valongo, sendo ali autor o aqui interveniente D… e ré, a “Companhia de Seguros C…, SA” (cfr. fls 319 a 321 do referido processo nº 2031/08.3TBVLG).

Nesta acção, o autor D…, em súmula, na sua petição inicial, invocou ter celebrado com a ré contrato de seguro relativo ao veículo automóvel identificado no artigo 2º daquele articulado, cobrindo, entre outras eventualidades, os danos próprios resultantes de acidente em que o referido veículo fosse interveniente.
Afirma que o dito veículo foi interveniente do qual resultou a sua perda total, tendo a ré ficado em poder do salvado, no valor de € 10.000,00.
Invoca que o valor do veículo, no momento do sinistro, ascendia a € 80.000,00.
Conclui pedindo a condenação da ré no pagamento da quantia de € 80.000,00, acrescida de juros de mora contados sobre este capital, cujo valor, à data da propositura da acção, defende ascender a € 16.800,00.

Citada, a ré apresentou contestação, na qual, em súmula, começa por reconhecer a celebração do contrato de seguro invocado pelo autor, bem como o sinistro pelo mesmo referido, afirmando, no entanto, que o proprietário do veículo seguro, à data do sinistro, não era o autor, mas sim terceira entidade, afirmando, por isso, que para o autor nenhum prejuízo decorreu do acidente em causa.
Afirma que, nos termos contratados, o valor capital seguro ascendia a € 55.000,00, sendo sempre de deduzir uma franquia, a cargo do segurado, no valor de € 500,00.
Alega que o autor, no momento do sinistro, conduzia o veículo seguro com uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l, o que traduz a prática de contraordenação por força do disposto nos artigos 81º, 82º e 145º do Código da Estrada e, por isso, os danos eventualmente verificados encontram-se excluídos da cobertura facultativa contratada com o autor por força da exclusão consagrada no artigo 5º das Condições Gerais da Apólice.
Impugna a descrição do acidente apresentada pelo autor.
Conclui pedindo a improcedência da acção, com a sua consequente absolvição do pedido.

O autor apresentou réplica, na qual, em súmula, afirma que, à data do sinistro, a posse do veículo seguro encontrava-se transferida para si por força de contrato de locação financeira que havia celebrado, nos termos do qual ao aqui autor era legítimo agir contra terceiros para obter qualquer indemnização ou compensação, sem necessidade de intervenção do locador financeiro.
Afirma que, além do mais, veio a adquirir o veículo em causa.

Requer a intervenção principal provocada de “E…, SA”, para o caso de se entender que a participação desta instituição nos autos será necessária a assegurar a legitimidade do autor para os termos da causa.
Nega que no momento do acidente conduzisse sob o efeito do álcool, e argui a falsidade de documento apresentado pela ré, alegada cópia de documento elaborado pela autoridade policial competente para a fiscalização dos ilícitos estradais.
Afirma que a ré litiga de má fé, deduzindo oposição cuja falta de fundamento não podia nem pode ignorar, assim causando prejuízos ao autor, para cujo ressarcimento entende adequada a quantia global de € 10.000,00.
Conclui como na petição inicial, requerendo ainda a intervenção principal provocada de “E…, SA”, e a condenação da ré, como litigante de má fé, no pagamento de multa e indemnização a favor do autor de valor não inferior a € 10.000,00.

A ré apresentou novo articulado, impugnando o afirmado pelo autor quanto à propriedade do veículo seguro, reafirmando que o autor, no momento do sinistro, conduzia com uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l, e pugna pelo indeferimento liminar do incidente de falsidade suscitado pelo autor.
Nega ter actuado de má fé.
Conclui pedindo a improcedência da acção, bem como a improcedência do incidente de falsidade e do pedido de condenação da ré como litigante de má fé.

Foi proferida decisão que indeferiu o pedido de intervenção principal da “E…, SA”, não tendo sido interposto recurso.

O autor na acção ordinária nº 2031/08.3TBVLG apresentou recurso da decisão de apensação, que foi admitido e foi já julgado improcedente.

Na sequência da decisão de apensação, e por forma a evitar-se contradição entre os objectos fácticos dos 2 processos, a fls 546 e 547 introduziram-se rectificações ao elenco dos factos assentes e à base instrutória das duas causas.
Instruídas as duas causas, realizou-se a audiência de julgamento, no seu âmbito sendo determinada nova alteração ao elenco dos factos assentes e nova rectificação à base instrutória, após o que foi fixada a matéria de facto relevante para a decisão a proferir, não tendo sido apresentada qualquer reclamação.

Foi proferida sentença que:
I- Julgou parcialmente procedente o pedido formulado pelo autor B…, e, em consequência, condenou a ré “Companhia de Seguros C…, SA”, a pagar àquele quantia, a liquidar em decisão ulterior, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais referidos nos pontos 13-, 15-, 16-, 17-, 18-, 19-, 20-, 21-, 22-, 28-, 29-, 30-, 31-, 32-, 33-, 34-, 36-, 37-, 44-, 45-, 46-, 47-, 48-, 49-, 50-, 58-, 61-, 62-, e 63- da matéria de facto nestes autos provada, quantia reduzida de 15% e de seguida deduzida da quantia global de € 130.701,00, sempre com o limite máximo de € 600.000,00;
II- Julgou improcedente, na parte restante, o pedido formulado pelo autor B…;
III- Julgou totalmente improcedente o pedido formulado pelo autor D…, dele absolvendo na íntegra a ré “Companhia de Seguros C…, SA”.

Inconformado, apelou o autor B…, apresentando alegações, cujas conclusões são as seguintes:
1. O Demandado D… foi chamado aos presentes autos como INTERVENIENTE PRINCIPAL associado à R. “C…, S.A.”;
2. Tal INTERVENÇÃO decorre de pedido feito pelo A., aqui Recorrente, para assegurar o seu “direito de indemnização” (contra o dito D…), esgotado que fosse o capital de seguro obrigatório pelo qual é condenada a Ré “C…, S.A.”.
3. O Tribunal “a quo” andou bem ao condenar a Ré “C…, S.A.” nos moldes em que o fez,
4. O Tribunal “a quo” andou mal ao esquecer-se de condenar o R. D… no valor que viesse/venha a ser apurado em sede de liquidação, que se constate que excede o limite máximo de seguro obrigatório vigente à data de eclosão do sinistro em causa;
5. Ao não ter tomado posição sobre a IINTERVENÇÃO PRINCIPAL DO R. D… e, ainda assim, concluindo pela sua Absolvição no PONTO II do Dispositivo, o Tribunal “a quo” não se pronunciou sobre matéria sobre a qual tinha obrigatoriamente de pronunciar-se;
6. Tal “omissão de pronúncia” constitui NULIDADE (art.º 668º, nº 1 e 4 do Código de Processo Civil);
7. A dita NULIDADE foi arguida pelo aqui Recorrente em altura e sede próprias.
8. Perante tal NULIDADE, deverá ordenar-se a REVOGAÇÃO do PONTO II do Dispositivo,
9. E a sua SUBSTITUIÇÃO por outro com o Conteúdo sugerido pelo A., aqui Recorrente, nas Alegações que aqui apresenta.
TERMOS EM QUE deverá o presente RECURSO DE APELAÇÃO ser julgado procedente sendo, em consequência, a Decisão proferida pelo Tribunal “a quo” parcialmente REVOGADA e, nessa parte, substituída por outra nos moldes sugeridos pelo Recorrente.

Por seu turno, inconformada a ré também apelou, apresentando alegações cujas conclusões são as seguintes:
1ª) Deve ser alterada para não provada a resposta dada ao quesito 36º da BI com fundamento no facto de os depoimentos testemunhais invocados das testemunha F…, G…, H…, nas passagens da gravação acima indicados, não apresentarem razão de ciência para a factualidade quesitada já que o conhecimento que têm da actividade futebolística do A. não é contemporânea dos antecedentes ao acidente;
2ª) Por outro lado, a genérica panorâmica subjectiva das testemunhas quanto ao potencial e futuro futebolístico do autor, acha-se contrariada pelos documentos de fls.372/373 que documentam a evolução da carreira do A. que tendo sido júnior no I…, após passar a sénior, não se conseguiu manter nesse clube, passando na época de 2003/2004 a representar o J… na II divisão Distrital e na de 2004/2005 (em que teve o acidente, a representar um clube amador dos Açores designado K:.., evidenciando assim uma regressão e não ascensão na carreira;
3ª) Nenhum outro meio de prova concreto foi produzido no sentido de o A. ter convites ou estar a ser solicitado por clubes sequer das divisões principais do Futebol Nacional que permitissem a resposta dada ao quesito em causa, a qual, por força do disposto no art.º 342.º do CCiv deve ser alterada para “não provado” com a consequente eliminação do ponto 42 dos factos provados na sentença.
4ª) Deve ser alterada para “não provado” a resposta dada aos quesitos 38º e 39º da BI e consequentemente eliminado o ponto 43 dos factos provados na sentença, desde logo porque os mesmos se apoiam numa conjectura retirada pelo Mmª Juiz a quo, não de factos
concretos ligados à evolução da sua carreira “Mas a tenaz força de vontade que o autor B… revelou na recuperação possível das lesões que o acidente em causa nos autos lhe provocou”, revelada nos depoimentos das testemunhas L... e M…, respectivamente, Pai e mulher do autor;
5ª) Também a contrariar o sentido de tal conjectura invoca a recorrente os contratos juntos pelo próprio A. a fls.269/272, dos quais se retira que, apesar de em 2002, ainda em júnior, o A. fizera um contrato para ingressar no I… a receber € 1250,00 por mês, a demais prova documental que os autos fornecem a fls. 372/373 dá um registo incontornável que o A. não singrou no I… e da I divisão em Juniores, passou para um clube da II divisão onde como sénior veio a continuar a sua carreira, passando depois para um clube da II divisão nos Açores – K… – clube de que o signatário, apesar de interessado no Futebol, jamais ouvira falar.
6ª) A reforçar a sustentação de uma resposta negativa ao quesito está ainda o documento de fls.375 – emitido pela ISS demonstra ainda que na data do acidente (Maio de 2005) nem sequer estava a auferir qualquer rendimento, sendo que os últimos descontos de vencimento que apresenta respeitam ao de Fevereiro de 2005 (05/2005), não apresentando quaisquer descontos depois dessa data.
7ª) Se até àquela data – Fevereiro de 2005 - apesar de não jogar já no I…, manteve o vencimento de € 1.250,00 por se manter o vínculo contratual com aquele clube (fls.270), o certo é que evoluindo para sénior e a jogar numa equipe amadora, nenhum facto concreto foi comprovado no sentido de ter clubes interessados na sua contratação e por salário sequer igual ao que auferiu até Fevereiro de 2005, pelo que não se afigura fundada a previsibilidade anunciada se um salário de 4000 euros/mês como se deu como provado;
8ª) No que respeita à redacção da resposta dada aos quesitos 42º a 45º da BI, deve ser alterada a resposta de forma a substituir o “necessita” por “Ao A. B… foi prescrita e aplicada uma prótese_____...” e consequentemente, alterar-se a redacção dos pontos respectivos do elenco dos factos provados na sentença – 46 a 49;
9ª) É que o “necessita” constante das respostas dadas, indiciando que o A. carece do seu fornecimento, quando se demonstrou que tais próteses lhe foram fornecidas pela R. e se encontram bem adaptadas – pontos 56, 60 e 65 dos factos dados como provados;
10ª) Tal sobressai ainda do depoimento da testemunha N… (médica fisiatra que trabalhou e trabalha no serviço médico que acompanhou o autor B…), a qual confirma na passagem de 13:18 a 13:30 da respectiva gravação, que ao A. foram fornecidas as próteses prescritas e efectuados os ajustamentos necessários;
11ª) Tendo em conta que na decisão deve o Tribunal atender “à situação existente no momento do encerramento da discussão” (art.º 663,º n.º1 do CPCiv na redacção à data da sentença aplicável), o “necessita” incluído na resposta aos quesitos em causa afigura-se incorrecto e susceptível de gerar contradição até com os factos provados acima assinalados, devendo ser eliminado dos factos provados respectivos;
Passando às questões de direito,
12ª) Tendo em consideração se provou – pontos 56, 60 e 65 dos factos provados na douta sentença recorrida – a R. já procedeu ao fornecimento das prótese prescritas ao A., não pode ser condenada a fornecer ao A. aquilo que já forneceu e de que ele dispõe;
13ª) Por tal na delimitação dos danos a indemnizar após liquidação, não deveriam ser indicados os dos pontos 49 a 49 dos factos provados na sentença, danos que a R. já reparou;
14ª) Diferente será o caso, em futura necessidade de adaptação ou substituição de alguma delas, que não era o caso à data do encerramento da discussão, o que, teria sempre de ficar relegado para execução de sentença e fica na enunciação do ponto 50 dos factos dados como provados;
15ª) Atentos os factos provados e as circunstâncias e gravidade dos danos ocorridos no A. é manifestamente desajustada a percentagem de 15% fixada para a culpa do lesado, devendo fixar-se em 50%;
16ª) No caso em apreço, o despiste do condutor nos termos em que ocorreu, num veículo moderno de elevada qualidade e segurança como era a de um BMW … praticamente novo, não tinha necessariamente como consequência previsível a projecção de um passageiro para fora do habitáculo ficando a cerca de 10 metros afastado do veículo e com o arrancamento de um membro inferior se o passageiro seguisse com o cinto de segurança apertado;
17ª) Tanto mais que se provou que, os outros 4 passageiros que seguiam no veículo, permaneceram protegidos pela respectiva carroçaria cintos e air bags dentro do habitáculo, de onde saíram pelos seus próprios meios apenas com escoriações ligeiras (cfr. pontos 13, 14, 17, 51, 52 e 53 dos factos provados na sentença);
18ª) Apenas o B…, porque não usava cinto, foi projectado;
19ª) O art.º 483.º do CCiv imputa ao lesante a obrigação de reparar os danos “resultantes da violação” consagra a necessidade do nexo causal entre o facto ilícito culposo do lesante e os danos verificados;
20ª) Se a actuação do condutor (despiste) era concretamente adequada a causar apenas escoriações ligeiras aos seus passageiros que seguiam com o cinto de segurança, já a omissão do cinto era e foi adequada a determinar a projecção do passageiro com os graves danos verificados no B…;
21ª) Por isso, foi indiscutivelmente mais relevante para o processo causal dos danos corporais emergentes para o B… a sua omissão ilícita e negligente de colocação do cinto, do que o comportamento estradal do condutor que determinou despiste do veículo;
22ª) Os arestos citados não têm paralelo com a situação dos autos pois trata-se de colisões violentas com danos aos passageiros, dentro e apesar de protegidos pelo habitáculo do veículo, diferentemente do caso do A. que ficasse no habitáculo por força da retenção do cinto, não teria sofrido os danos da gravidade dos que vieram a ocorrer;
23ª) Tendo em atenção que a R. continua a efectuar pagamentos mensais a título de reparação provisória mensal no âmbito do procedimento cautelar apenso, os quais também deverão ser considerados em abatimento da decisão a fixar nos termos do disposto no art.º 403.º n.º 3 do CPCiv deve alterar-se o segmento final da condenação para “…e de seguida, deduzida da quantia global de € 131.701,00 do total já adiantado pela R. acrescido dos valores mensais que esta venha a liquidar no apenso após 6/2/2013…”;
24ª) Trata-se de lapso manifesto por omissão material, reparável pelo próprio Juiz nos termos do disposto no art.º 667.º do CPCiv, podendo ser conhecido no recurso interposto e, não o sendo, em ultima análise, ocorre contradição entre os fundamentos e a decisão o que configura nulidade do art.º 668.º n.º 1 c) do CPCiv e violação do disposto no art.º 403.º n.º 3 do CPCiv, impondo-se a reparação;
25ª) Trata-se de lapso manifesto por omissão material, reparável pelo próprio Juiz nos termos do disposto no art.º 667.º do CPCiv, podendo ser conhecido no recurso interposto e, não o sendo, em ultima análise, ocorre contradição entre os fundamentos e a decisão o que configura nulidade do art.º 668.º n.º 1 c) do CPCiv e violação do disposto no art.º 403.º n.º 3 do CPCiv, impondo-se a reparação;
26ª) Por último, ainda por não correspondência da decisão com os fundamentos deve a decisão ser alterada para: “…e de seguida, deduzida da quantia global de € 131.701,00 do total já adiantado pela R. acrescido dos valores mensais que esta venha a liquidar não podendo exceder o total das quantias pagas e a pagar o limite máximo de € 600.000,00 ”;
27ª) Sendo de € 600.000,00 o limite do capital pelo qual a R. responde, considerando que já despendeu com o sinistro a quantia de € 131.701,00 e ainda irá despender as prestações mensais até trânsito em julgado da decisão final, o limite da indemnização exigível à R. terá de se confinar ao remanescente de capital disponível após subtracção aos € 600.000,00 de todos os valores pagos até à data da fixação final da indemnização;
28ª) Violou assim a decisão recorrida o disposto nos art.ºs 342º, 483º, 562º, 563º e 570º do CCiv e 403.º n.º 3, 663.º e 668.º n.º 1 c) do CPCiv e ainda art.º 6.º do DL 522/85 de 31/12 na redacção dada pelo DL 3/96 de 25/1.
NESTES TERMOS, DEVE SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, ALTERANDO-SE A DECISÃO RECORRIDA NOS SEGMENTOS SOBREDITOS.

Por último, apelou igualmente o autor D…, sendo as conclusões do respectivo recurso do seguinte teor:
1.- A douta sentença recorrida violou o disposto ao artigo 156.º do Código da Estrada, porquanto utilizou, na sua fundamentação e decisão, um meio de prova, correspondente ao resultado da alegada recolha de sangue do Recorrente, ilegal.
2.- Em sede de direito penal, para que o arguido acusado de conduzir com TAS possa ser condenado por tal atuação, e com fundamento em tal exame ao sangue, é necessário que se faça prova da necessidade da recolha do sangue para a realização de tal exame, que deve observar os requisitos impostos ao artigo 156.º do C.E..
3.- Constitui a nulidade prevista no art. 120.º, al. d), do CPP, a circunstância de o tribunal não ter apurado se o arguido estava ou não fisicamente impossibilitado de consentir ou dar o seu assentimento tácito à realização da análise de sangue.
4.- A determinação da taxa de álcool do autor, constante da declaração de aditamento à participação, foi realizada fora do circunstancialismo previsto no artigo 156º, n.º2 do Código da Estrada.
5.- O Autor não foi previamente informado da finalidade da colheita de sangue, para a qual não deu o seu consentimento e não teve hipótese de recusar, sendo certo que o consentimento apenas se presume quando opera em benefício da pessoa privada da capacidade de o declarar.
6.- Não está em causa um problema de nulidade ou irregularidade de um qualquer acto processual, eventualmente sanado.
“É que- lê-se recente no Ac. da Rel. de Coimbra de 19-10-2010, proc.º n.º 178/09.8GCAGD-C1, rel. Pilar Oliveira, in www. dgsi.pt- estamos no domínio da legalidade da prova e a falta de cumprimento dos trâmites legais não é susceptível de sanação, o que significa que a falta de documentação da legalidade não pode corresponder à legalidade do meio de prova, sendo sempre necessário que o processo documente essa legalidade”; e já anteriormente, o estudo dos juízes de direito Pedro Soares de Albergaria e Pedro Mendes Lima, “Condução em estado de embriaguês. Aspectos processuais e substantivos do regime vigente”, in pág. Sub Judice, n.º 17, Janeiro-/Março, 2000, pág. 60.
Sem prescindir,
7.- quando eventualmente se considerasse que o Recorrente deu o seu consentimento, expresso ou tácito, à recolha de sangue, sempre seria tal meio de prova ilegal, em virtude da inconstitucionalidade orgânica da Lei –152.°, n.° 3, art. 153.°, n.° 8, e art. 156.°, n.° 2, todos do Código da Estrada, na redação dada pelo DL n.°44/2005-A/2001, de 28 de Setembro;
8.- Para eliminar o direito de o condutor/arguido poder livremente recusar a colheita de sangue para efeitos de análise ao grau de alcoolemia, - porque a alteração legislativa tem um conteúdo inovatório, - o legislador governamental necessitava de autorização legislativa, atenta a reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, a quem cabe a decisão normativa primária, por força das alíneas b) e c), do n.° 1, do art. 165.°, da CRP.
9.- Não há na Lei n.º 53/2004, de 4 de Novembro, que concedeu ao Governo a autorização para proceder à revisão do Código da Estrada, ao abrigo da qual foi publicado o Decreto-Lei n.º 44/2005, qualquer referência à autorização legislativa concedida pela assembleia da república ao Governo.
10.- Basta comparar as versões do Código da Estrada em sucessão, (vd Ac Rel Porto de 09/12/2009) para se perceber que houve uma alteração, com a supressão dum direito do arguido, já que o legislador governamental pretendeu retirar aos condutores sujeitos aos exames para comprovação do teor de influência sob álcool o direito à recusa de colheita de sangue, mesmo nos casos em que a impossibilidade de realização de exame por método de ar expirado é apenas imputável ao Estado, quando é certo que antes qualquer condutor podia recusar a sujeição a exame mediante colheita de sangue, sem necessidade de fundamentação em razões médicas e agora exige-se que a não realização da colheita de sangue apenas possa ser justificada pela impossibilidade técnica de tal operação médica.
11.- Tendo o Decreto-Lei n.º 44/2005 sido editado ao abrigo da Lei n.º 53/2004, de 4 de Novembro, que não continha autorização ao Governo para inovar em tal matéria – vide art 3º supra transcrito - a redação dada aos artigos 152.°, n.°3, 153.°, n.°8 e 156.°, n.°2, do Código da Estrada é organicamente inconstitucional na parte em que inovatoriamente suprime o direito de o condutor/sinistrado/arguido poder livremente recusar a colheita de sangue para efeitos de análise ao grau de alcoolemia.
12.- Assim, a colheita de sangue para aqueles fins, ao abrigo dos atuais artigos 152º, nº 3, 153º, nº 8 e 156º, nº 2, todos do Código da Estrada, na redação dada pelo DL nº 44/2005, de 23 de Fevereiro – sendo a deste último preceito já desde a redacção dada pelo DL nº 265-A/2001, de 28 de Setembro – sem possibilitar ao condutor a sua recusa, está ferida de inconstitucionalidade orgânica.
Sem prescindir,
13.- O procedimento criminal contra o Recorrente extinguiu-se pelo decurso do prazo prescricional, previsto ao artigo 188.º do Código da Estrada.
14.- E não podia, nem pode, salvo o devido respeito, o Recorrente ser condenado ou julgado com recurso a um meio de prova que foi fixado para a prova em processo penal e que não serviu, nessa matéria, para a sua condenação.
Sem prescindir,
15.- Os meios de prova correspondentes à recolha e análise de sangue, e documentos que a certificam, e que serviram de fundamentação à decisão sobre a matéria de facto atinente, consubstanciam meios de prova ilegais.
16.- A matéria das proibições de prova no âmbito do Direito Processual Penal apresenta, desde logo, um fundamento jurídico-constitucional, uma vez que o art. 32.º, n.º 8 da CRP dispõe que: “São nulas todas as provas obtidas mediante tortura, coacção, ofensa da integridade física ou moral da pessoa, abusiva intromissão na vida privada, no domicílio, na correspondência ou nas telecomunicações”.
17.- Não pode a realização da justiça ser perseguida com um intolerável sacrifício para os direitos fundamentais dos cidadãos.
18.- No caso vertente, e ainda que se possa considerar estarmos perante uma exceção e uma restrição a um direito fundamental, que teve que ceder perante a relevância penal da conduta, o que é certo é que o Recorrente foi absolvido ou prescreveu o procedimento criminal que poderia ter dado origem à sua condenação, com fundamento em tal meio de prova,
19.- Tendo-se extinto a responsabilidade contraordenacional do autor, nunca poderia um meio de prova que foi eleito para proteger um interesse penal ou contraordenacional, ser utilizado para outros fins, por consubstanciar uma ilegítima ofensa aos direitos fundamentais e à reserva de vida privada do Recorrente.
Sem prescindir,
20.- Foi violado o disposto ao artigo 29.º, n.º5 da C.R.P., porquanto o Recorrente acabou por ser julgado duplamente sobre a mesma factualidade, designadamente a taxa de álcool no sangue de que alegadamente seria titular à data do acidente dos autos.
21.- O procedimento criminal instaurado contra o Recorrente, e a decisão da sua condenação, prescreveram, não tendo o Recorrente sido condenado no processo contraordenacional.
22.- Utilizar um meio de prova que não conduziu à condenação do Recorrente em processo penal, para obter a sua condenação em processo cível, ou em qualquer outro processo, consubstancia uma violação flagrante e grosseira do principio ne bis in idem.
Sem prescindir,
23.- Foram ainda violados os artigos 497 e 498, ambos do C.P.C., referentes ao caso julgado.
24.- A demonstração ou prova da TAS do Recorrente, com fundamento num meio de prova que só pode ser utilizado em processo penal, e após a absolvição ou extinção do procedimento criminal do Recorrente a esse título, configura uma violação de caso julgado, pois que o Recorrente seria julgado novamente com fundamento em factos relativamente aos quais cessou a sua perseguição criminal.
Sem prescindir,
25.- Foi violado na sua interpretação e aplicação o artigo 26.º da C.R.P..
26.- O Autor não autorizou a utilização do resultado do exame ao sangue para efeito de ser contra ele instruído qualquer processo judicial.
27.- Tendo o Recorrente visto extinta a sua responsabilidade criminal, a certidão do auto de ocorrência, com o respetivo aditamento, não podia ser utilizado pela Ré companhia de Seguros contra o Autor D….
28.- O estado de saúde do Recorrente faz parte da intimidade da sua vida privada, e portanto é matéria reservada, que a Companhia de Seguros deve respeitar.
29.- Embora sejam as maiores garantias de defesa contra a aplicação de sanções penais que determinam o princípio constitucional constante do nº 8 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, segundo o qual “São nulas todas as provas obtidas mediante (…) abusiva intromissão na vida privada (…)”, podemos, até pelo paralelismo (parente pobre e bastante menos gravoso) com a aplicação de condenação cível convocar também a mesma consequência.
30.- A prova é nula e não podia ser usada.
31.- Assim, realizada esta excursão pelo meio de prova de recolha de sangue que serviu para a prova da matéria de fato de artigos 51.º, 52.º, 108.º, do processo n.º1805/08.0TBVLG e artigo 15.º do processo n.º2031/08.3TBVLG, terá que se concluir que a mesma é ilegal e, por isso mesmo, deverá eliminar-se tal matéria dos factos dados como provados.
Sem prescindir,
32.- Foram ainda violados, na sua interpretação e integração e aplicação, os artigos 371.º e 372.º, ambos do Código Civil.
33.- A força probatória material dos documentos correspondentes ao aditamento à participação e ao resultado toxicológico de determinação da taxa de álcool etílico no sangue foi impugnada pelo recorrente com fundamento em falsidade.
34.- O Recorrente impugnou ainda a força probatória material do relatório do INML, referente quer à colheita de sangue ao recorrente, quer à sua correspondência com o Recorrente, e respetivo resultado e validade.
35.- Ora, tais documentos, conforme resulta do respetivo teor, e das declarações da testemunha 1.º Sargento O…, não foram objeto da perceção de tal agente, nem foram por ele praticados.
36.- Assim, tais documentos são falsos e, por isso mesmo, não podiam servir de meio de prova adequada e suficiente para dar como provada a factualidade correspondente à TAS do Autor/Recorrente.
Sem prescindir,
37.- Foi violado o disposto ao n.º2 do artigo 490.º, ao ser eliminada a matéria que já havia sido considerada assente, por douto despacho judicial, sob alíneas L) a X), no âmbito do processo n.º1805/08.0TBVLG.
38.- Tal matéria não havia sido impugnada pela recorrida e, por isso mesmo, e apesar da apensação de processos, não podia prevalecer-se a Recorrida da apensação de processos, para transformar em irrelevante uma revelia operante.
39.- A apensação dos processos não pode fazer excluir as regras processuais e a autonomia na tramitação de cada um dos processos, antes dessa apensação.
Sem prescindir,
40.- Foi violado o disposto ao artigo 650.º, n.º3 do C.P.C. e o Mmo. Juíz do Tribunal a quo praticou um ato nulo, porquanto ampliou a resposta à matéria da base instrutória, sem ter observado o contraditório.
41.- Com efeito, resulta do artigo 89.º da matéria de fato constante da fundamentação da sentença que “ao autor D… não foi aplicada coima ou sanção acessória pela condução de veículo automóvel com uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l, com o esclarecimento que o chamado procedeu ao pagamento voluntário, pelo mínimo legal, da coima correspondente ao auto de contraordenação levantado.”
42.- Tal esclarecimento não fazia parte da matéria a instruir e objeto do questionário.
43.- Os documentos juntos aos autos, desacompanhados de qualquer outro meio de prova, não permitiam julgar se o chamado havia efetivamente liquidado tal coima, ou sequer qualquer outra pessoa em seu nome.
Sem prescindir,
44.- Foi violado o disposto ao artigo 659.º do C.P.C., porquanto o Mmo. Juíz do Tribunal a quo deixou de pronunciar-se sobre questões de que devia tomar conhecimento e os fundamentos da decisão sobre a matéria de facto estão em contradição com a decisão.
45.- Reporta-se o recorrente, designadamente, à matéria dos pontos 54, 86 e 101 da matéria de facto constante da fundamentação da sentença.
46.- Mas o Mmo. Juíz do tribunal a quo deixou ainda de fundamentar a decisão da matéria de facto atinente à velocidade imprimida ao veículo, e que lhe permitiu concluir, contra o depoimento da testemunha P…, que o veículo do chamado ia “seguramente a uma velocidade superior a 100 km/h”, relativos aos pontos da matéria de facto constantes da douta fundamentação da sentença sob n.º87 e 104.
47.- Violou, assim, o Mmo. Juíz do Tribunal a quo, o disposto ao artigo 659.º do C.P.C., porquanto não fundamentou nem especificou devidamente a resposta à matéria dos aludidos artigos.
Sem prescindir,
48.- Existem pontos da matéria de facto incorretamente julgados e meios probatórios constantes do processo que impunham decisão diversa da recorrida sobre tal matéria.
49.- Com efeito, os depoimentos das testemunhas P…, ao minuto 01:15:26, da sessão de audiência de julgamento de 25 de Fevereiro de 2013, e de O…, ao minuto 00:27:16, da sessão de audiência de julgamento de 04 de Março de 2013, permitem reapreciar e concluir que a matéria de facto dada como provada foi incorretamente julgada.
50.- No que respeita à dinâmica do acidente e à velocidade do veículo, a testemunha P… esclareceu que o veículo podia seguir devagar e que o acidente se deveu ao facto de os rails da estrada estarem danificados e tombados e, por isso mesmo, o veículo, no primeiro embate, ter engatado nos rails e ter deslizado pelos mesmos, adquirindo natural velocidade, vindo a embater uma segunda vez num guarda-corpos da auto-estrada, até que tombou na rua do valado, num terceiro embate.
51.- Os rails danificados de anteriores acidentes fizeram de carril para o veículo do Recorrente, que, em consequência, perdeu a sua direção, controlo ou possibilidade de travagem.
52.- E mais pela referida testemunha foi afirmado que o piso da auto-estrada estava gasto e que ainda não havia sido alcatroado.
53.- Assim, tendo em consideração o depoimento de tal testemunha, outra deveria ter sido a resposta aos correspondentes artigos da Base Instrutória, e que a seguir se compõem:
No proc. 1805/08.0TBVLG
100.- Naquele local da via ocorrem diversos acidentes, mais de cinco mensais, em tempo de chuva, que se devem, entre outros fatores, ao estado do piso da estrada e à chuva e da curvatura e inclinação acentuada da estrada naquele local.
101.- Na sequência de despiste, o veículo do chamado foi embater no separador da estrada, mas, porque este se encontrava danificado e tombado, engatou no mesmo e deslizou pelo mesmo até embater uma segunda vez, no guarda-corpos da autoestrada, e, por fim, rolou e capotou, embatendo uma terceira vez na rua …, onde se imobilizou.
102.- Após o primeiro embate era impossível controlar o carro.
E a matéria de facto constante dos artigos 109.º do processo n.º1805/08.0TBVLG e 19.º do proc. n.º2031/08.3TBVLG, ou seja, que o veículo automóvel circulava, seguramente, a mais de 100 km/h, deve ser declarada não provada.
No processo n.º2031/08.3TBVLG
No que respeita à matéria de artigo 19.º, deve a mesma ser declarada não provada, nos termos supra referidos.
20.- O veículo automóvel de matrícula ..-..-VN sofreu um primeiro embate nos rails metálicos de proteção da via, do lado direito desta, atento o seu sentido de marcha; após o que deslizou em cima dos rails metálicos que se encontravam danificados e tombados, e sofreu um segundo embate, no guarda corpos da passagem inferior da auto-estrada, também do lado direito desta, atento o seu sentido de marcha; e, finalmente, sofreu um terceiro embate, no muro da passagem inferior, ainda do lado direito da auto-estrada, atento o seu sentido de marcha, percorrendo 56,7 metros entre o primeiro e o terceiro embate.
54.- Com efeito, o Tribunal não teve em consideração o depoimento e a razão de ciência da testemunha e aludido agente de autoridade na decisão da matéria de facto.
Sem prescindir,
55.- Existem ainda outros meios de prova constantes do processo que impunham decisão diversa da Recorrida, relativamente à taxa de álcool no sangue imputada ao Recorrente e à correspondência do número de selo constante do relatório do INML com o número de selo da colheita e vasilhame onde estará alegadamente contido o sangue do chamado.
56.- Por um lado, quer a testemunha P… quer a testemunha O… confirmaram que não presenciaram a recolha de sangue e que não participaram nas correspondentes diligências, destinadas a determinar a taxa de álcool no sangue do Recorrente;
57.- Por outro lado, as testemunhas P… confirmaram que têm que ser assinados pelo arguido duplicados que ficam a constar no processo, o que não aconteceu no caso em análise.
58.- Acresce ainda que quer o sangue, quer os exames foram destruídos, não tendo sido possível ao Recorrente – por causa que não lhe é imputável – confirmar ou infirmar tal correspondência ou a veracidade de tais documentos.
59.- E a data em que a entidade fiscalizadora procedeu ao aditamento à participação permite concluir que o relatório pericial foi enviado à mesma mais de oito dias posteriores à colheita operada pelo Recorrente.
60.- Por um lado, o Recorrente invocou a falsidade e impugnou a força probatória material do aditamento à participação e do relatório a que o mesmo faz referência.
61.- Por outro lado, o agente que terá alegadamente subscrito tal aditamento à participação não presenciou a realidade que certificou, sendo que nem sequer é sua a assinatura no espaço que refere o seu nome em tal participação.
62.- E ficou demonstrado que ao Recorrente não foi feita qualquer pesquisa ao ar expirado.
63.- Assim, deveria antes ter sido a seguinte, a decisão sobre a matéria de facto dos seguintes artigos:
Processo n.º 1805/08.0TBVLG
51.- Na altura do acidente o condutor do VN apresentava uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l. - NÃO PROVADO
106.- O número do selo aposto no relatório do IML corresponde ao número do selo da colheita e vasilhame onde alegadamente estará contido o sangue do chamado. – NÃO PROVADO.
107.- O atestante nunca perdeu de vista ou de contacto o sangue colhido ao chamado desde a data da sua colheita até à data da sua análise. – NÃO PROVADO.
108.- O sangue que foi analisado e que acusou o resultado de 0,6 g/l de TAS pertence ao chamado. – NÃO PROVADO
Processo n.º2031/08.3TBVLG
15.- Na altura do acidente o autor apresentava uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l – NÃO PROVADO
25.- E o INML não remeteu o relatório pericial à entidade fiscalizadora nos oito dias posteriores à colheita de sangue efetuada ao Autor. – PROVADO.
27.- Ao Autor não foi dada a possibilidade de verificar e confirmar a autenticidade do selo da colheita e no relatório.-PROVADO.
63.º- Decidindo, como decidiu, a douta sentença recorrida, sem prejuízo das invocadas nulidades, não fez correta apreciação da matéria de facto, nem interpretou e aplicou corretamente as disposições legais atinentes e supra citadas.
Dado o exposto, deve ser concedida a apelação e, em consequência, ser considerada nula a sentença recorrida, na parte condenatória da Recorrente ou, caso assim se não entenda, ser revogada a sentença recorrida, nessa mesma parte, e ainda na decisão sobre a matéria de facto, quer na que aproveita à pretensão do recorrente, quer naquela matéria impugnada, e que poderá servir para a sua eventual incriminação, e decretada a procedência da ação do Recorrente, em relação ao pedido formulado contra a Recorrida, com as legais consequências.

Foram apresentadas contra-alegações pela ré, relativamente à apelação do autor D…, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.
A fls. 1955 dos autos, o Mmº Juiz a quo, face às nulidades invocadas em sede dos recursos interpostos pelas partes, enquadráveis nas várias als. do nº 1 do artº 668º do CPC, aferiu da sua verificação, entendendo não ocorrer nenhum dos vícios apontados, mantendo, na íntegra, a decisão impugnada.

Foram colhidos os vistos legais.

II – AS QUESTÕES DO RECURSO

Como resulta do disposto nos artºs 660º nº 2, 684º nº 3 e 690º nº 1 e 4 do CPC e vem sendo orientação da jurisprudência, o objecto do recurso é balizado pelas conclusões, sem embargo de haver outras questões que sejam de conhecimento oficioso.
Ora, tendo presentes essas conclusões, as questões colocadas nos recursos interpostos são as seguintes:
Recurso do autor B…:
- Saber se a sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia, por o tribunal a quo não se ter pronunciado sobre a condenação do interveniente principal.

Recurso da ré seguradora:
1. Impugnação da matéria de facto (pontos 42, 43, 46, 47, 48 e 49 dos factos provados).
A subsunção jurídica deve ser diversa da sentenciada no que concerne:
a) À condenação em indemnização a fixar pelos danos referentes aos pontos 46 a 49 dos factos provados.
b) À redução da indemnização em 15% do valor dos danos a apurar por culpa do lesado nos termos do disposto no artº 570º do CCivil.
c) Ao abatimento dos valores a pagar.
d) Ao limite do capital seguro.

Recurso do interveniente principal:
A) A alegada violação do artº 156º do C.Estrada por consideração de meio de prova ilegal.
B) A alegada inconstitucionalidade orgânica da Lei na redacção dada pelo DL nº 44/2005 de 28/09 aos artºs 152º nº 3, 153º nº 8 e 156 nº 3 do C. Estrada.
C) A alegada violação do artº 188º do C.Estrada.
D) A alegada violação do artº 32º da CRP e 126º do CPPenal.
E) A alegada violação do artº 29º nº 5 da CRP – princípio non bis in idem.
F) A alegada violação do artº 497º e 498º do CPCivil.
G) A alegada violação do artº 26º da CRP.
H) A alegada falsidade documental e violação dos artºs 371º e 372º do CCivil ao “aditamento à participação de acidente nº 1543/05”.
I) A alegada violação do artº 490º nº 2 do CPCivil por eliminação das alíneas L) a X) do elenco dos factos assentes.
J) A alegada violação do artº 650º nº 3 do CPCivil – aditamento de factos à base instrutória sem contraditório.
K) A alegada violação do artº 659º do CPCivil.
L) Impugnação da matéria de facto.

III – FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

Foram considerados provados na 1ª instância os seguintes factos: [recorda-se que a fls 1108 foi determinada a remuneração dos pontos da base instrutória que no processo nº 1805/08.0TBVLG a fls 233-B constavam como «111º» e «112º», e a fls 1109 foi determinada a eliminação das alíneas do elenco dos factos assentes que no processo nº 1805/08.0TBVLG a fls 225-A e ss constavam sob as alíneas L) a X)]:
A) do processo nº 1805/08.0TBVLG
1- No dia 16 de Maio de 2005, pelas 00 h 15 m, na autoestrada
.., ao km 16,725, no …, no sentido … – …, ocorreu um despiste no qual foi interveniente o veículo automóvel ligeiro de passageiros de matrícula ..-..-VN, na altura conduzido por D… [alínea A) dos factos assentes, com a rectificação determinada a fls 311].
2- À data do acidente o D… havia transferido a responsabilidade civil por danos causados a terceiros emergente da circulação do veículo de matrícula ..-..-VN para a ré “Companhia de Seguros C…, SA”, através de contrato de seguro automóvel titulado pela apólice nº ……… [alínea B) dos factos assentes].
3- O local do acidente, atento o sentido … – …, é uma curva com inclinação à esquerda, a que se segue uma recta de boa visibilidade, composta por duas faixas de rodagem, no mesmo sentido, com a largura aproximada da via de 7,40 metros, estando as ditas faixas de rodagem divididas por uma linha longitudinal descontínua e ladeadas por uma berma com a largura de 2,80 m do lado direito, atento o sentido … – … [alínea C) dos factos assentes].
4- Quando o condutor do veículo de matrícula ..-..-VN se aproximava da curva à esquerda, e se preparava para iniciar a dita curva, no sentido … – …, perdeu o controlo da viatura, não conseguindo efectuar a manobra de curva prevista, seguiu em frente, não o conseguiu fazer parar no espaço livre e visível que tinha à sua frente, indo embater nas guardas de segurança da berma [alínea D) dos factos assentes].
5- A viatura foi projectada para um segundo embate, que se concretizou cerca de 50 metros mais à frente do primeiro, ao km 16,675, do mesmo lado direito, atento o seu sentido de marcha, concretizando-se no guarda-corpos de passagem inferior existente no local, e, após nova projecção, o veículo de matrícula ..-..-VN foi embater novamente do lado direito da faixa de rodagem, cerca de 7 metros mais à frente do segundo embate, sendo a distância total existente entre os 3 locais de embate de cerca de 56,70 metros, tendo depois capotado e sido projectado pelo ar, caiu da auto-estrada para a rua do Valado, de uma altura de 6,70 metros, onde se incendiou e imobilizou na berma direita da referida rua, atento o sentido Este – Oeste, tendo a dita rua a largura de 6,70 metros [alínea E) dos factos assentes, com a rectificação determinada a fls 311].
6- O local onde ocorreu o despiste está sinalizado com placas de limite de velocidade de 100 km/h [alínea F) dos factos assentes].
7- A ré já pagou ao autor a quantia de € 17.750,00, acrescida de € 1.500,00, a título de adiantamento pela indemnização a ser atribuída a final [alínea G) dos factos assentes].
8- Ao chamado foi instaurado um processo de contraordenação, que correu termos na Direcção-Geral de Viação do Norte sob o nº 243187971, com fundamento em que o mesmo foi interveniente em acidente de viação e submetido a colheita de sangue para análise toxicológica de quantificação de taxa de álcool no sangue, e acusou uma TAS de 0,63 g/l, tendo a colheita sido realizada às 03 h 05 do mesmo dia [alínea H) dos factos assentes].
9- A Direcção-Geral de Viação do Norte, por decisão de 22 de Maio de 2006, aplicou ao aqui chamado a sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 30 dias, e deveria o mesmo entregar o seu título de condução no prazo e local indicados na decisão, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência nos termos do nº 3 do artigo 160º do Código da Estrada, todavia o chamado impugnou a referida decisão [alínea I) dos factos assentes].
10- As guardas de segurança da berma, para a retaguarda das danificadas por este veículo, já se encontravam danificadas, resultante de acidentes ocorridos anteriormente [alínea Z) dos factos assentes].
11- Na altura do despiste do veículo de matrícula ..-..-VN estava a chover [resposta ao ponto 1º da base instrutória].
12- No local e no momento em que ocorreu o acidente em apreço nos autos, o piso da auto-estrada estava molhado [resposta ao ponto 2º da base instrutória].
13- O autor B… foi projectado da viatura e ficou imobilizado a cerca de 10 metros do local onde o veículo de matrícula ..-..-VN se imobilizou [resposta ao ponto 3º da base instrutória].
14- O autor B… viajava como passageiro no veículo automóvel de matrícula ..-..-VN [resposta ao ponto 4º da base instrutória].
15- O autor B… foi inicialmente assistido no serviço de urgência do Hospital São João, no Porto, onde deu entrada às 02 h 34 m do dia 16 de Maio de 2005 [resposta aos pontos 5º e 6º da base instrutória].
16- Após o que foi encaminhado para o serviço de politraumatizados e aí esteve internado no serviço de ortopedia desde o dia do acidente até 30 de Maio de 2005 [resposta ao ponto 7º da base instrutória].
17- O autor sofreu ferimento do membro inferior do qual resultou amputação traumática [resposta ao ponto 8º da base instrutória].
18- Realizou penso no dia 30 de Maio de 2005, com soro fisiológico, betadine térmico e aplicação de gaze [resposta ao ponto 9º da base instrutória].
19- Retirou os pontos da operação no dia 30 de Maio de 2005 [resposta ao ponto 10º da base instrutória].
20- E realizou novo penso no dia 02 de Junho de 2005 [resposta ao ponto 11º da base instrutória].
21- Em Junho de 2005 o autor movia-se em cadeira de rodas [resposta ao ponto 12º da base instrutória].
22- A 02 de Junho de 2005 o autor foi re-internado, por necrose do coto de amputação, internamento que durou uma semana [resposta ao ponto 13º da base instrutória].
23- À data do acidente, o autor B… tinha 21 anos de idade [resposta ao ponto 15º da base instrutória].
24- Praticava futebol no plantel sénior da equipa do “K…” [resposta ao ponto 16º da base instrutória].
25- Desde os 7 anos de idade o autor B… foi praticante de futebol em diversas agremiações desportivas, tendo iniciado o seu percurso desportivo no “Q…” [resposta aos pontos 17º e 18º da base instrutória].
26- Antes do acidente o autor não padecia de qualquer patologia, traumatismo ou deformação física ou psíquica [resposta ao ponto 19º da base instrutória].
27- Apresentava uma compleição física invejável e grande porte atlético [resposta ao ponto 20º da base instrutória].
28- Na sequência do acidente, o autor B… sofreu, entre o mais, ferida cortocontusa no couro cabeludo e região frontal, esfacelo da perna esquerda, fractura do arco posterior de C1 e do pedículo da lâmina de C6, e traumatismo do ombro esquerdo [resposta ao ponto 21º da base instrutória].
29- Actualmente, o autor B… marcha com prótese na perna esquerda, com claudicação muito ligeira (praticamente normal), ocasionalmente sentindo dores no joelho na zona de apoio [resposta ao ponto 22º da base instrutória].
30- Durante o período de recuperação, o autor apresentava dores no ombro esquerdo, com mobilidades normais, sem queixas na coluna cervical, e amputação de 1/3 da perna esquerda [resposta ao ponto 23º da base instrutória].
31- O autor B… até 15 de Maio de 2007 apresentou défice funcional temporário total até 16 de Junho de 2005, e défice funcional temporário parcial até 15 de Maio de 2007, sempre com incapacidade total para a profissão que antes exercia [resposta ao ponto 24º da base instrutória].
32- O autor esteve dependente de terceira pessoa para os seus afazeres diários, no período após o acidente [resposta ao ponto 25º da base instrutória].
33- O autor B… esteve meses sem saber se poderia voltar a andar e sem saber qual seria o seu futuro [resposta ao ponto 26º da base instrutória].
34- Por força das lesões que apresenta, o autor B… sente-se abalado e fragilizado, e sofre por estar impossibilitado de praticar futebol [resposta ao ponto 27º da base instrutória].
35- O autor pretendia seguir a carreira de futebolista [resposta ao ponto 28º da base instrutória].
36- O autor apresenta cicatrizes [resposta ao ponto 29º da base instrutória].
37- E sente-se inibido de as exibir em público, designadamente na praia e balneário frequentado por outras pessoas [resposta ao ponto 30º da base instrutória].
38- No início da época desportiva 2003/2004, o autor B… havia integrado a equipa profissional do “I…” [resposta aos pontos 31º e 32º da base instrutória].
39- O autor foi convocado para estágios da selecção nacional de futebol, nas camadas jovens [resposta ao ponto 33º da base instrutória].
40- A actividade profissional de um jogador de futebol em média prolonga-se entre os 18 e os 32 anos de idade [resposta ao ponto 34º da base instrutória].
41- O autor B…, à data do acidente, auferia a quantia mensal de € 1.250,00 como futebolista profissional [resposta aos pontos 35º e 62º da base instrutória].
42- Era um jovem promissor, com um futuro e potencial futebolístico a nível profissional [resposta ao ponto 36º da base instrutória].
43- O autor B…, ao longo da sua carreira como futebolista profissional, previsivelmente auferiria a quantia média mensal de pelo menos € 4.000,00, 12 meses por ano [resposta aos pontos 38º e 39º da base instrutória].
44- O autor actualmente encontra-se desempregado [resposta ao ponto 40º da base instrutória].
45- Sem receber qualquer rendimento mensal [resposta ao ponto 41º da base instrutória].
46- O autor B… necessita de uma prótese de uso diário cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 5.965,00 [resposta ao ponto 42º da base instrutória].
47- O autor B… necessita de uma prótese para a prática de desporto cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 7.135,00 [resposta ao ponto 43º da base instrutória].
48- O autor B… necessita de uma prótese para a prática de natação cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 5.670,00 [resposta ao ponto 44º da base instrutória].
49- O autor B… necessita de uma prótese para a prática de corrida cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 6.335,00 [resposta ao ponto 45º da base instrutória].
50- As ditas próteses terão de ser revistas e substituídas durante o tempo de vida do autor [resposta ao ponto 46º da base instrutória].
51- Na altura do acidente, para além do autor, seguiam no veículo automóvel de matrícula ..-..-VN o D…, o S…, o T… e o U… [resposta ao ponto 48º da base instrutória].
52- Estes passageiros apenas apresentavam ferimentos ligeiros [resposta ao ponto 49º da base instrutória].
53- O autor B… viajava no veículo automóvel de matrícula ..-..-VN sem haver colocado o cinto de segurança [resposta ao ponto 50º da base instrutória].
54- Na altura do acidente, o condutor do veículo automóvel de matrícula ..-..-VN apresentava uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l [resposta ao ponto 51º da base instrutória].
55- Tal facto levou a que, a 11 de Julho de 2005, fosse feito um aditamento à participação do acidente [resposta ao ponto 52º da base instrutória].
56- A ré já pagou despesas de transporte para consultas, tratamentos, fisioterapia, ginásio, próteses e despesas de tratamento hospitalar, necessárias à recuperação e tratamento do autor B…, no valor global de € 75.395,00 (no que se inclui o valor das próteses utilizadas pelo referido autor) [resposta ao ponto 53º da base instrutória].
57- O início dos tratamentos feitos ao autor B… no “V…” ocorreu a 23 de Junho de 2005 [resposta ao ponto 54º da base instrutória].
58- Em Julho de 2007, o autor B… apresentava, como sequelas, amputação do membro inferior esquerdo, pelo nível do terço proximal, com claudicação da marcha, e cicatriz no crânio com 26 cm de comprimento [resposta ao ponto 55º da base instrutória].
59- O autor B… actualmente não necessita da ajuda de terceira pessoa para os actos da vida corrente [resposta ao ponto 56º da base instrutória].
60- O autor B… actualmente apresenta boa adaptação às próteses que utiliza [resposta ao ponto 57º da base instrutória].
61- O autor B… apresenta um défice funcional permanente da integridade físicopsíquica de 30 pontos, sendo as sequelas de que padece impeditivas do exercício da actividade profissional que desempenhava antes do acidente [resposta ao ponto 58º da base instrutória].
62- A incapacidade de que o autor B… padece não o impede de exercer actividade profissional sem ser a que exercia antes do acidente em causa nos autos [resposta ao ponto 59º da base instrutória].
63- Além do mais, em consequência do acidente o autor apresenta cicatriz no crânio com 26 cm de comprimento [resposta ao ponto 60º da base instrutória].
64- À data do acidente, o autor B… representava um clube que militava na 3ª divisão nacional [resposta ao ponto 61º da base instrutória].
65- A ré suportou integralmente o custo das próteses até à data solicitadas pelo autor B…, no valor global de € 23.927,67 [resposta ao ponto 63º da base instrutória].
66- A necessidade terapêutica de recuperação do autor em ginásio está concluída [resposta ao ponto 65º da base instrutória].
67- O autor consegue correr no tapete [resposta ao ponto 68º da base instrutória].
68- Por conta da indemnização final, a ré, desde Agosto de 2005, já entregou ao autor B… a quantia global de € 55.306,00 (no que se inclui a quantia mensal de € 500,00 fixada no âmbito do apenso A) [resposta ao ponto 69º da base instrutória].
69- A colheita de sangue ao autor foi efectuada às 03 h 15 m do dia 16 de Maio de 2005 [resposta ao ponto 72º da base instrutória].
70- Na altura do acidente o autor D… deslocou-se ao Hospital São João, no Porto [resposta ao ponto 73º da base instrutória].
71- Ao saber que o autor B… iria sofrer amputação da perna, o autor D… ficou perturbado [resposta ao ponto 74º da base instrutória].
72- Só em 11 de Julho de 2005 é que a entidade fiscalizadora procedeu à declaração de «aditamento à participação» [resposta ao ponto 79º da base instrutória].
73- O chamado possuía carta de ligeiros desde o dia 20 de Setembro de 2004 [resposta ao ponto 82º da base instrutória].
74- Circulava na via de trânsito da direita, no sentido … – … [resposta ao ponto 84º da base instrutória].
75- A noite de 15 para 16 de Maio de 2005 foi chuvosa [resposta ao ponto 85º da base instrutória].
76- Os diferenciais do modelo do veículo automóvel de matrícula ..-..-VN eram assistidos electronicamente [resposta ao ponto 89º da base instrutória].
77- Na madrugada do dia 15 de Maio de 2005, próximo do local onde ocorreu o acidente em causa nos autos, tinham ocorrido 2 outros acidentes de viação [resposta ao ponto 94º da base instrutória].
78- A .., no local em que ocorreu o acidente em apreço nos autos, apresenta inclinação [resposta ao ponto 95º da base instrutória].
79- Na zona da auto-estrada onde ocorreu o acidente em causa nos autos, em 2005 verificaram-se, em média, 5 acidentes de viação por mês [resposta ao ponto 97º da base instrutória].
80- No local e no momento em que ocorreu o acidente em apreço nos autos, o piso da auto-estrada estava molhado [resposta ao ponto 98º da base instrutória].
81- No local em que ocorreu o acidente em apreço nos autos, o piso da auto-estrada era em asfalto [resposta ao ponto 99º da base instrutória].
82- O agente de autoridade O…, atestante do documento nº 3 junto com a contestação da ré, não assistiu à colheita de sangue e não assistiu à obtenção do resultado do exame toxicológico de determinação da taxa de álcool etílico no sangue referente ao chamado [resposta ao ponto 103º da base instrutória].
83- O mesmo agente de autoridade não assistiu e não participou na verificação do resultado da TAS de 0,63 g/l do chamado, e não presenciou que a mesma e o resultado correspondem à colheita de sangue do chamado [resposta ao ponto 104º da base instrutória].
84- O 1º sargento O… não procedeu à análise do sangue recolhido ao autor D... [resposta ao ponto 105º da base instrutória].
85- O número do selo aposto no relatório do IML corresponde ao número de selo da colheita e vasilhame onde alegadamente estará contido o sangue do chamado [resposta ao ponto 106º da base instrutória].
86- O sangue que foi analisado e que acusou o resultado de 0,6 g/l de TAS pertence ao chamado [resposta ao ponto 108º da base instrutória].
87- O veículo automóvel de matrícula ..-..-VN, no momento do acidente, seguramente circulava a mais de 100 km/h [resposta ao ponto 109º da base instrutória].
88- A decisão referida em 9- não se tornou definitiva nem exequível, não tendo sido o chamado condenado pela prática de qualquer contra-ordenação decorrente da condução sob efeito de álcool [resposta ao ponto 112º da base instrutória, com a rectificação determinada a fls 1108].
89- Ao autor D… não foi aplicada coima ou sanção acessória pela condução de veículo automóvel com uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l, com o esclarecimento que o chamado procedeu ao pagamento voluntário, pelo mínimo legal, da coima correspondente ao auto de contra-ordenação levantado [resposta ao ponto 113º da base instrutória, com a rectificação determinada a fls 1108º].
B) do processo nº 2031/08.3TBVLG
90- No dia 16 de Maio de 2005, pelas 00 h 15 m, ocorreu um despiste na auto-estrada .., ao km 16,7, no qual foi interveniente o veículo automóvel de passageiros de matrícula ..-..-VN, pertença de D… e por este conduzido [alínea A) dos factos assentes].
91- Em consequência do sinistro o veículo automóvel de matrícula ..-..-VN ficou totalmente destruído, não sendo a sua reparação economicamente viável [alínea B) dos factos assentes].
92- O autor D… e a ré celebraram contrato de seguro, sob a apólice nº ………, tendo por objecto o veículo automóvel de marca “BMW”, modelo “…”de matrícula ..-..-VN [alínea C) dos factos assentes].
93- Foi ainda contratado entre ambos um seguro facultativo que, entre outras coberturas, abrangia as de choque, colisão e capotamento do veículo seguro, com o capital seguro de € 55.000,00, e com uma franquia a cargo do segurado de € 500,00 por sinistro [alínea D) dos factos assentes].
94- Ao autor D… foi instaurado um processo de contra-ordenação, que correu termos na Direcção Regional de Viação do Norte, sob o nº ………, com fundamento em que o mesmo foi interveniente em acidente de viação e submetido a colheita de sangue para análise toxicológica de quantificação de taxa de álcool no sangue, acusou uma TAS de 0,63 g/l, tendo a colheita sido realizada às 03 h 05 m do mesmo dia [alínea E) dos factos assentes].
95- A Direcção Regional de Viação do Norte, por decisão de 22 de Maio de 2006, aplicou ao autor D… a sanção acessória de conduzir pelo período de 30 dias, deveria o mesmo entregar o seu título de condução, no prazo e local indicados na decisão, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, nos termos do nº 3 do artigo 160º do Código da Estrada [alínea F) dos factos assentes].
96- Foram remetidas pelo autor à ré as chaves e parte da documentação solicitada pela ré, mas nunca lhe foi entregue o salvado, dado que o veículo ficou totalmente destruído e impossibilitada a sua reparação [alínea G) dos factos assentes].
97- No local e no momento em que ocorreu o acidente em apreço nos autos, o piso da auto-estrada estava molhado [resposta ao ponto 1º da base instrutória].
98- O veículo automóvel de matrícula ..-..-VN embateu nos rails da auto-estrada, capotou e só parou num terreno situado numa cota inferior, abaixo da auto-estrada cerca de 5 metros [resposta ao ponto 2º da base instrutória].
99- O veículo do autor D… foi adquirido no estado de novo [resposta ao ponto 6º da base instrutória].
100- A ré “C… Companhia de Seguros, SA”, não efectuou qualquer pagamento ao autor D… [resposta ao ponto 10º da base instrutória].
101- Na altura do acidente o autor D… apresentava uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l [resposta ao ponto 15º da base instrutória].
102- Por tal circunstancialismo, a ré comunicou ao autor D… que declinava a responsabilidade e nada iria pagar ao autor [resposta ao ponto 16º da base instrutória].
103- No local do acidente, a via descreve uma curva inclinada, e está sinalizada a proibição de circular a mais de 100 km/h [resposta ao ponto 18º da base instrutória].
104- O autor D… seguia a velocidade superior a 100 km/h quando perdeu o controlo do veículo automóvel de matrícula ..-..-VN [resposta ao ponto 19º da base instrutória].
105- O veículo automóvel de matrícula ..-..-VN sofreu um primeiro embate nos rails metálicos de protecção da via, do lado direito desta, atento o seu sentido de marcha; após o que sofreu um segundo embate, no guarda corpos da passagem inferior da auto-estrada, também do lado direito desta, atento o seu sentido de marcha; e finalmente sofreu um terceiro embate, no muro da passagem inferior, ainda do lado direito da auto-estrada, atento o seu sentido de marcha; percorrendo 56,7 metros entre o primeiro e o terceiro embate [resposta ao ponto 20º da base instrutória].
106- Posteriormente galgou as protecções e precipitou-se na rua …, caindo num desnível de cerca de 6,70 metros [resposta ao ponto 21º da base instrutória].
107- O autor D… impugnou a decisão da Direcção Regional de Viação do Norte referida em 94- [resposta ao ponto 22º da base instrutória].
108- A colheita de sangue ao autor D… foi efectuada às 03 h 15 m do dia 16 de Maio de 2005 [resposta ao ponto 24º da base instrutória].
109- Só a 11 de Julho de 2005 é que a entidade fiscalizadora procedeu à declaração de «aditamento à participação» [resposta ao ponto 26º da base instrutória].

IV – FUNDAMENTAÇÃO DE DIREITO

Recurso do autor B…:
- Saber se a sentença recorrida é nula, por omissão de pronúncia, por o tribunal a quo não se ter pronunciado sobre a condenação do interveniente principal.

O recorrente insurge-se quanto ao decidido no ponto II do dispositivo da sentença recorrida, ao “Julgar improcedente, na parte restante, o pedido formulado pelo autor B…”, porque, em seu entender, o Tribunal a quo se esqueceu de condenar o interveniente principal no valor que viesse a ser apurado em sede de liquidação, que se constatasse exceder o limite máximo de seguro obrigatório vigente à data da eclosão do acidente em causa.
Vejamos se lhe assiste razão.
Ab initio, ao abrigo do disposto no artº 330º do CPC, a ré seguradora requereu a intervenção provocada acessória de D…, tendo em vista um eventual direito de regresso sobre aquele como condutor da viatura interveniente no acidente, pelo facto de o mesmo estar a conduzir, no momento do sinistro, como se veio a apurar, com taxa de álcool no sangue superior à permitida por lei.
O autor, chamado a pronunciar-se sobre tal intervenção, não se opôs ao requerido chamamento, mas defendeu que o mesmo deveria intervir no processo não a título acessório mas a título principal, nos termos previstos no artº 325º do CPC, tendo em vista, agora, o seu direito de indemnização, esgotado que fosse o capital do seguro obrigatório (cfr. artigos 21º e 22º da réplica apresentada pelo autor a fls. 139 e segs. dos autos).
A ré declarou não se opor à requerida intervenção principal provocada de D….
Tal intervenção foi admitida e tendo o interveniente sido citado nos termos e para os efeitos do disposto no artº 327º do CPC não deduziu qualquer oposição.
Não tendo sido interposto, quer antes quer agora, recurso do referido despacho que admitiu D… como parte principal passiva, ao lado da ré seguradora, transitou o mesmo em julgado e tornou-se estável o que dele resultou, ou seja, que o D… intervém nos autos como interveniente principal.
Como dissemos, o autor apelante sustenta que, ao não ter sido condenado o interveniente principal D… a pagar-lhe todo e qualquer valor que, após liquidação, se venha a constatar superar o limite máximo de seguro obrigatório previsto na lei, ou seja, € 600.000,00, incorreu o tribunal a quo em omissão de pronúncia e está eivada do vício de nulidade previsto na al. d) do nº 1 do artº 668º do CPC, a que corresponde o actual artº 615º nº 1 al. d) do NCPC.
De facto, D… foi chamado ao abrigo do incidente de intervenção principal provocada previsto no artº 325º do CPC, sendo a sua intervenção admitida à luz deste incidente.
Ora, a intervenção principal provocada corresponde, em termos processuais, a uma forma de litisconsórcio sucessivo, permitindo ao chamado que faça valer um direito próprio, paralelo ao do autor ou do réu, in casu, ao da ré, direito esse que deve ser apreciado na sentença, a qual fará, consequentemente, caso julgado em relação a ele – artº 328º nº 1 do CPC.
Intervindo no processo, passa a ser, parte principal na acção, no caso, parte principal passiva, ao lado da primitiva ré seguradora (neste sentido, vide Salvador da Costa, in os “Incidentes da Instância”, 2ª ed., pag. 112/113) e a sentença deve incluí-lo no que decidir, ou seja, condená-lo com a primitiva ré se a pretensão do A. proceder total ou parcialmente e absolvê-lo e à primitiva ré se a pretensão do A. improceder.
Argumenta o Mmº Juiz a quo quando aprecia esta concreta nulidade (fls. 1955/1996) que existe a necessidade de formular “um concreto pedido submetido à apreciação do Tribunal (nº 1 do artigo 3º do Código de Processo Civil) em que a decisão judicial (de procedência ou improcedência) se baseie, pedido que, no caso, manifestamente não foi feito”.
É verdade que na réplica apresentada pelo autor B…, onde o mesmo requer o chamamento aos presentes autos do condutor do veículo, não se formula nenhum pedido em concreto contra este na parte final de tal peça processual, mas o mesmo, em nosso entender, decorre do que foi explanado/articulado em tal incidente pelo autor.
Relembremos o que aí foi dito.
“Artº 20º
O chamamento aos presentes autos do condutor do veículo, D…, deverá ser na qualidade interveniente principal provocado (artº 325º do CPC)
Artº 21º
Dado que fixando a ré a sua responsabilidade ao montante do limite legal de € 600.000,00
Artº 22º
O chamado será necessariamente responsável pelo restante valor da indemnização que a final venha a ser atribuída ao aqui Autor.
Termos em que concluiu conforme exposto em sede de petição inicial
(…).”
Cremos, deste modo, que com a intervenção do chamado na presente acção, houve como que um “arrastamento” do pedido que o autor formulou contra a ré inicial, também relativamente a ele próprio, chamado, passando este a estar abrangido por esse mesmo pedido [neste sentido, vide Ac. do TRP de 13/12/2011 (relator M. Pinto dos Santos) consultável em www.dgsi.pt].
E, tanto assim é que o chamado o contestou e pugnou, para além do mais, pela sua absolvição do pedido.
Portanto, mesmo que não haja um pedido concreto contra o chamado, a nosso ver, sempre deveria o Tribunal a quo pronunciar-se sobre a factualidade que é imputada e sobre a existência ou não de responsabilidade sua nos presentes autos.
Não o tendo feito, incorre a sentença recorrida na nulidade prevista no artº 668º nº 1 al. d) do CPC (actual artº 615º nº 1 al. d) do NCPC).
De acordo com este preceito legal, é nula a sentença quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar.
É o caso.
O Mº Juiz a quo, até ao valor de € 600.000,00 condenou a ré seguradora, mas omitiu, de todo, a condenação do chamado, quando deveria ter condenado o chamado a pagar ao autor o valor que vier a ser liquidado ulteriormente, acima do valor de € 600.000,00.
Nestes termos, procede a apelação do autor B…, revogando-se o teor do ponto II da parte dispositiva da sentença recorrida, o qual se substitui por outro, nos seguintes moldes:
“Julga-se procedente o pedido formulado pelo A. B… contra o chamado D… no montante que, em sede de ulterior incidente de liquidação venha a apurar-se ser superior ao valor limite máximo de seguro obrigatório previsto na Lei (600.000,00), sempre após a verificação das condições descritas em I do dispositivo desta decisão”.

Recurso da ré seguradora:
1.Impugnação da matéria de facto (pontos 42, 43, 46, 47, 48 e 49 dos factos provados).
A recorrente entende que a matéria de facto deverá ser reapreciada por este Tribunal, no tocante às respostas dadas aos pontos 42, 43, 46, 47, 48 e 49 dos factos provados.
Ora, como é sabido, fixada a matéria de facto, através da regra da livre apreciação das provas consagrada, com ressalva dos factos para cuja prova a lei exija formalidade especial, ou aqueles que só possam ser provados por documentos ou que estejam plenamente provados, quer por documentos, quer por acordo ou confissão das partes, nos termos do artº. 607º n° 5 do Novo Código Processo Civil, em princípio essa matéria de facto é inalterável.
A decisão da lª instância sobre a matéria de facto só pode ser alterada pela Relação nos casos previstos no artº. 662º do Novo Código Processo Civil, ou seja:
1. A Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto, se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa.
2. A Relação deve ainda, mesmo oficiosamente:
a) Ordenar a renovação da produção da prova quando houver dúvidas sérias sobre a credibilidade do depoente ou sobre o sentido do seu depoimento;
b) Ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova;
c) Anular a decisão proferida na 1.ª instância, quando, não constando do processo todos os elementos que, nos termos do número anterior, permitam a alteração da decisão proferida sobre a matéria de facto, repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta;
d) Determinar que, não estando devidamente fundamentada a decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, o tribunal de 1.ª instância a fundamente, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
Estas constituem as excepções à regra básica da imodificabilidade da decisão de facto proferida na lª instância.
No caso em apreço, não é aplicável a previsão contida na parte final do n°. 1 do artº. 662º do Novo Código Processo Civil, pois que não foi apresentado documento novo superveniente, tão pouco os factos assentes impõem decisão diversa, conforme estabelecido no consignado n° 1 do artº. 662º do Novo Código Processo Civil.
Tendo ocorrido, na presente acção, a gravação dos depoimentos prestados, este Tribunal de recurso tem a prerrogativa legal, ditada pelo normativo consignado, de apreciar não só da credibilidade do(s) depoente(s) ou sobre o sentido do respectivo depoimento, mas também sobre a prova realizada, bem como, da necessidade da produção de novos meios de prova, caso repute deficiente, obscura ou contraditória a decisão sobre pontos determinados da matéria de facto, ou quando considere indispensável a ampliação desta, outrossim, apreciar da fundamentação da decisão proferida sobre algum facto essencial para o julgamento da causa, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados, concebendo-se que foi cumprido o preceituado no artº. 640º do Novo Código Processo Civil.
Importa ter presente, que a finalidade do aludido dispositivo da lei adjectiva civil (artº. 662º do Novo Código Processo Civil) é garantir a correcção do apuramento da matéria de facto, sendo que tal possibilidade tem de ser levada a cabo tendo sempre presente e em momento algum desprezar as normas jurídicas e processuais atinentes.
A sindicância à convicção do julgador da 1ª instância, a realizar por este Tribunal de recurso, tem de se mostrar adequada, isto é, não poderá permitir, em caso algum, que a mesma se apresente manifestamente contrária às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos, de tal sorte que possamos afirmar sem reservas que a reapreciação da prova configura, efectivamente, um novo julgamento.
Na verdade, no que tange aos concretos poderes de reapreciação da prova nesta 2ª instância, dominou, até há pouco tempo, uma tese restritiva que sustentava que os Tribunais da Relação não podiam procurar uma nova convicção, antes deviam limitar-se a apreciar se a do julgador “a quo”, vertida nos factos provados e não provados e na fundamentação desse seu juízo valorativo, tinha suporte razoável no que a gravação permitiria percepcionar e em conjugação com os demais elementos probatórios que os autos fornecessem. Ou seja, o Tribunal da Relação teria que cingir a sua actividade (de reapreciação da matéria de facto) ao apuramento da razoabilidade da convicção do julgador da 1ª instância, reduzindo os poderes de alteração da matéria fáctica às situações que se apresentassem manifestamente contrárias às regras da experiência, da lógica e dos conhecimentos científicos, aos casos de flagrante desconformidade com os elementos de prova disponíveis.
Imediatamente antes da nova reforma do direito adjectivo civil, ganhou força uma perspectiva mais ampla relativamente à reapreciação da prova, a qual, embora reconheça que a gravação dos depoimentos áudio ou vídeo não consegue traduzir tudo quanto pôde ser observado no tribunal “a quo”, nomeadamente, o modo como as declarações são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória e que existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas são percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia, entende, ainda assim, que na reapreciação da prova, as Relações têm a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos ou fazer incidir as regras da experiência, como efectiva garantia de um segundo grau de jurisdição.
Quando um Tribunal de 2ª instância, ao reapreciar a prova, valorando-a de acordo com o princípio da livre convicção, a que também está sujeito, conseguir formar, relativamente aos concretos pontos impugnados, uma convicção segura acerca da existência de erro de julgamento da matéria de facto, deve proceder à modificação da decisão, afirmando os reconhecidos poderes que lhe foram atribuídos enquanto tribunal de instância que garante um segundo grau de jurisdição - cfr. neste sentido, Abrantes Geraldes, in “Recursos em Processo Civil – Novo Regime”, 2008, págs. 279 a 286; idem, mesmo Autor, in “Reforma dos Recursos em Processo Civil”; Revista Julgar, nº. 4, Janeiro-Abril/2008, págs. 69 a 76; Amâncio Ferreira, in “Manual dos Recursos em Processo Civil”, 2008, pág. 228, e Acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça de 25/11/2008 (Processo 08A3334), de 12/03/2009 (Processo 08B3684), de 28/05/2009 (Processo 4303/05.0TBTVD.S1) e de 01/06/2010 (Processo 3003/04.2TVLSB.L1.S1), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
Com a introdução de novas regras sobre o regime legal disciplinador da admissão e reapreciação da prova feita em Juízo ditadas pelo Novo Código Processo Civil continuamos a reconhecer, como suporte essencial do nosso ordenamento jurídico, os princípios da imediação, oralidade e concentração, e da livre apreciação da prova, assumindo-se, inquestionavelmente, como princípios proeminentes na apreciação da matéria de facto, sendo que na reapreciação da prova, as Relações têm a mesma amplitude de poderes que tem a 1ª instância, devendo proceder à audição dos depoimentos gravados e analisar a documentação apresentada em Juízo, fazendo incidir as regras da experiência, como efectiva garantia de um segundo grau de jurisdição, permitindo-nos sublinhar que a reapreciação da prova configura, efectivamente, um novo julgamento.
Sem deixar de reconhecer que, em regra, a convicção do julgador da 1ª instância resulta da experiência, prudência e saber deste, sendo certo que é no contacto pessoal e directo com as provas, designadamente, com a testemunhal e no depoimento de parte, que aquelas qualidades de julgador mais são necessárias, pois é com base nelas que determinado depoimento pode ou não convencer quanto à veracidade ou probabilidade dos factos sobre que recai, constituindo uma das manifestações dos princípios da oralidade e da imediação, em razão das quais o julgador tem a possibilidade de se aperceber da frontalidade, lucidez, rigor e firmeza com que os depoimentos são prestados, mesmo do confronto imediato entre os vários depoimentos, do contraditório formado pelos intervenientes, advogados e juízes, do interrogatório do advogado que a apresenta, do contraditório do outro mandatário e das dúvidas do próprio tribunal, não podemos deixar de enfatizar que o Tribunal de recurso tem agora prerrogativas legais que, sem quaisquer reservas, lhe permitem melhor ajuizar e aquilatar da decisão de facto, e, sendo caso disso, ordenar a renovação da produção da prova, ordenar a produção de novos meios de prova, ou mesmo em casos extremos anular a decisão proferida na 1.ª instância, ou determinar que o tribunal de 1.ª instância fundamente a decisão proferida, tendo em conta os depoimentos gravados ou registados.
Dito isto, passemos à análise da possibilidade de alteração da decisão sobre a matéria de facto.
Os artigos da BI cujas respostas agora vêm impugnadas são do seguinte teor:
Ponto 42 da matéria de facto provada (artº 36º da BI)
Perguntava-se o seguinte:
…Era um jovem promissor com um futuro e potencial futebolístico a nível profissional?
A resposta obtida foi a de “provado”.
O Mmº Juiz a quo fundamentou a sua resposta a esta concreta matéria nos depoimentos das “testemunhas F… (futebolista profissional, amigo e colega do autor B… nas camadas jovens de clubes de futebol a que ambos estiveram vinculados), G… (agente desportivo que, à data do acidente que nos ocupa estava atento ao percurso do autor B… no âmbito do futebol profissional) e H… (futebolista profissional, amigo e colega do autor B…), em audiência de julgamento sem qualquer dúvida referiram-se ao enorme potencial futebolístico que o autor B… detinha, às suas perspectivas de carreira e às possibilidades que provavelmente se lhe abririam, tanto desportiva como profissionalmente – o que sem dúvida fundou a resposta ao ponto 36º da base instrutória” – cfr. fls. 1525/1526.
A recorrente seguradora entende, contudo que a resposta deveria ser a de “não provado”.
Cremos assistir razão à recorrente.
De facto, nenhuma das referidas testemunhas apresenta uma razão de ciência contemporânea com a data do acidente (16/05/2005). Por outro lado, pese embora refiram que o autor tinha talento futebolístico que o fez passar da fase juvenil e júnior para clubes de maior prestígio como o W… e o I…, não conseguiram concretizar quaisquer factos que indiciassem um futuro promissor do autor no campo futebolístico.
Com efeito, pese embora se reconheça que o autor foi convocado para estágios da selecção nacional de futebol, nas camadas jovens (ponto 39 da mat. de facto provada), o certo é que tal não mais voltou a acontecer, como júnior e sénior.
Tendo em conta o percurso profissional do autor patenteado através do doc. de fls. 372/373 emitido pela Federação Portuguesa de Futebol facilmente se constata que, aquele ingressou no I… enquanto júnior na época de 2002/2003, mas logo na época seguinte, ou seja, 2003/2004, já sénior ingressou no J.., um clube da II divisão distrital da Associação de Futebol do Porto e deste clube transferiu-se para o “K…” de …/Açores, onde jogou na época 2004/2005, o qual disputava o campeonato de futebol amador.
Este percurso não revela, como é óbvio, um percurso a nível futebolístico ascendente, antes pelo contrário, pois, tendo deixado de fazer parte de clubes com alguma dimensão a nível nacional para ingressar noutros pouco ou nada conhecidos é bem revelador de que não houve progressão na carreira do jogador e como tal não se percebe qual seria o seu “futuro promissor”, tanto mais que à data do acidente já tinha 21 anos de idade (ponto 23 da mat. de facto provada).
Decide-se, assim, alterar a resposta dada ao quesito 36 da BI para “não provado” e, em consequência, eliminar tal matéria do acervo fáctico provado (artº 712º nº 1 als. a) e b) do CPC a que corresponde o actual artº 662º nº 1 do NCPC).

Ponto 43 da matéria de facto provada (artºs 38º e 39º da BI)
Perguntava-se o seguinte nestes artºs da BI:
Artº 38º - …Onde iria a ter uma retribuição média mensal na ordem dos 10.000,00?
Artº 39º - …E receberia prémios de jogos no montante de € 3.500,00 mensais?
A resposta conjunta a estes artºs foi a seguinte: provado que o autor B…, ao longo da sua carreira como futebolista profissional, previsivelmente auferiria a quantia média mensal de, pelo menos € 4.000,00, 12 meses por ano.
A convicção do julgador para assim responder retratada na fundamentação foi a seguinte:
Mas a tenaz força de vontade que o autor B… revelou na recuperação possível das lesões que o acidente em causa nos autos lhe provocou (no fundo, na superação do infortúnio que sobre si infelizmente se abateu), perseguindo o desporto de alto rendimento como se essa realidade lhe estivesse no sangue (o que foi esclarecedoramente relatado em audiência de julgamento pelas testemunhas L… e M…), não permite outra conclusão sem ser que, não fora o acidente que nos ocupa, certamente continuaria a praticar futebol profissional com a vontade e tenacidade que evidenciou na recuperação que felizmente lhe foi possível, atingindo um estatuto remuneratório de pelo menos mais do triplo do que auferia no momento do acidente – o que se verteu na resposta aos pontos 38º e 39º da base instrutória do processo nº 1805/08.0TBVLG.”.
A recorrente seguradora pugna para que a resposta a esta matéria destes dois artºs da BI seja a de “não provado”.
Vejamos, então, o que resulta da prova testemunhal e documental.
Não se questionam os depoimentos das duas testemunhas referenciadas, respectivamente pai e mulher do autor, quanto à tenacidade demonstrada pelo mesmo na sua recuperação, após o acidente. Porém, nada adiantam quanto à sua perseverança anterior como futebolista.
De qualquer modo, teremos de nos socorrer da documentação junta aos autos, mais concretamente dos contratos juntos pelo próprio autor, a fls. 290/300.
Assim, extrai-se que o autor em 2002, enquanto júnior, celebrou um contrato para ingressar no I…, auferindo € 1.250,00/mês.
Sucede, porém, que parecendo que o autor teria uma carreira futebolística de carácter ascendente veio a verificar-se precisamente o contrário, celebrando contratos com clubes de futebol de menor renome e categoria a nível nacional.
Com já acima mencionámos, o autor passou da I Divisão em juniores para um clube da II Divisão onde como sénior foi emprestado ao J… na época de 2003/2004. Deste clube transitou para o “K…”, na época 2004/2005, equipa esta que apenas disputava o campeonato de futebol amador.
Por outro lado, constata-se do extracto de remunerações (doc. de fls. 375) do Instituto de Segurança Social, SA, que o autor à data do acidente (Maio/2005) não auferia qualquer rendimento, aí se dando conta de que o último desconto efectuado foi no mês de Fevereiro/2005, com uma remuneração de € 625,00/mês.
Daqui se extrai que, atento este percurso profissional do autor e não se vislumbrando nos autos, elementos documentais e/ou depoimentos testemunhais coadjuvantes que nos pudessem convencer com maior certeza que o autor, no futuro, auferiria, em média € 4.000,00/mês, 12 vezes ao ano, teremos de alterar a resposta àqueles artºs da BI para “não provado”, eliminando-se o ponto 43 dos factos dados como provados.

Pontos 46, 48 e 49 dos factos dados como provados (artºs 42º a 45º da BI)
Perguntava-se o seguinte nestes artºs da BI:
Artº 42º - O autor terá de despender a quantia de 106.585,00 € na aquisição de uma prótese que utiliza diariamente?
Artº 43º - Terá despendido ainda a quantia de 257.110,00 € na aquisição de uma prótese para a prática de desporto?
Artº 44º - …Despendeu ainda a quantia de 259.090,00 € na aquisição de uma prótese de natação e banho?
Artº 45º - …E ainda a quantia de 310.060,00 € na aquisição de uma prótese para correr?
As respostas obtidas foram as seguintes:
Artº 42º - O autor B… necessita de uma prótese de uso diário cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 5.965,00.
Artº 43º - O autor B… necessita de uma prótese para a prática do desporto cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 7.135,00.
Artº 44º - O autor B… necessita de uma prótese para a prática de natação cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 5.670,00.
Artº 45º - O autor B… necessita de uma prótese para a prática de corrida cujo valor de aquisição em 2008 ascendia a € 6.335,00.
A convicção do julgador para assim decidir resultou da análise dos “documentos. de fls. 37 a 39 e ainda em depoimentos testemunhais, de entre estes sobressai o da testemunha N… (médica que trabalhou e trabalha no serviço médico que acompanhou o autor B… no período do início da utilização de próteses por aquele”.
A ré/recorrente entende que se deve substituir a palavra “necessita” por “foi prescrita e aplicada” nas respostas aos quesitos mencionados, por melhor traduzir a realidade, já que as próteses já foram fornecidas ao autor.
Vejamos se lhe assiste razão.
Mostra-se inquestionável que o autor necessita de cada uma das próteses referidas ao longo da sua vida e que as mesmas lhe foram prescritas e fornecidas, como referiu a mencionada testemunha.
Não menos inquestionável é que a ré, ora recorrente já pagou o valor das próteses utilizadas pelo autor. Isso mesmo resulta da matéria dada como provada nos pontos 56 e 65.
Porém, como também resulta da matéria dada como provada no ponto 50, as ditas próteses terão de ser revistas e substituídas durante o tempo de vida do autor e decorre dos docs. de fls. 37 a 39 que a durabilidade de alguns materiais que constituem as próteses são de pouca resistência e durabilidade, necessitando de ser substituídos em curtos períodos de tempo.
É verdade que a palavra “necessita” inculca a ideia de que as próteses ainda não foram fornecidas, o que não corresponde, de todo, à verdade, como vimos.
Deste modo, para que não se gere alguma contradição com a restante matéria dada como provada, decide-se, mais uma vez, atender ao pretendido pela recorrente e, em consequência, alterar a redacção dos pontos da matéria de facto supra aludidos no que concerne à palavra “necessita” constante dos mesmos, substituindo-a por “Ao autor B… foi prescrita e aplicada uma prótese …”.

2. A subsunção jurídica deve ser diversa da sentenciada no que concerne:
a) À condenação em indemnização a fixar pelos danos referentes aos pontos 46 a 49 dos factos provados.
Como vimos na abordagem anterior da impugnação da matéria de facto, foi alterada a redacção da mesma quanto aos pontos 46 a 49 de modo a que a mesma ficasse mais de acordo com a situação actual do autor, uma vez que já lhe foram aplicadas as próteses mencionadas, após lhe terem sido prescritas.
Assim sendo, sustenta a recorrente nenhuma indemnização deve ser fixada a este título.
Vejamos se será assim.
De acordo com o disposto no artº 562º do CCivil “quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação”.
A indemnização visa, assim, colocar o autor na situação em que estaria se não fosse a lesão e, não sendo possível a reconstituição in natura, deve o lesante cuidar de, em sucedâneo, dentro do possível reconstituir essa situação anterior.
Reportando-nos à situação dos autos, tendo em conta que o autor sofreu ferimento do membro inferior do qual resultou amputação traumática (ponto 17) e que não é possível a sua reconstrução física, deve proceder-se à reparação desse dano através do fornecimento de próteses, que irão na medida do possível minorar os danos causados e permitir ao autor quer andar quer praticar desportos.
Ora, como ficou demonstrado, a ré, ora recorrente já procedeu a essa reconstituição, pois já pagou integralmente as próteses que o autor já utiliza, num montante global de € 23.927,67, às quais actualmente apresenta boa adaptação (cfr. pontos 56, 60 e 65 da matéria provada), não podendo, em consequência, ser condenada novamente a fornecer as próteses que o autor já utiliza.
Coisa diferente será a indemnização a pagar pela ré recorrente relativamente à revisão e substituição das mencionadas próteses, o que o autor terá de fazer periodicamente ao longo da sua vida, conforme matéria provada no ponto 50, indemnização essa a apurar em sede de execução de sentença.
Deste modo, decide-se eliminar a referência no ponto I do Dispositivo da sentença recorrida à indemnização a relegar para execução de sentença relativa aos pontos 46 a 49 dos factos provados.

b) À redução da indemnização em 15% do valor dos danos a apurar por culpa do lesado nos termos do disposto no artº 570º do CCivil.

Decorre da factualidade apurada que à data do acidente, o autor B… viajava no veículo automóvel como passageiro sem haver colocado o cinto de segurança (ponto 53 dos factos provados).
O Mmº Juiz a quo tendo entendido que a não colocação do cinto de segurança por parte do autor constituía uma omissão culposa e “se traduziu indiscutivelmente numa conduta criadora de perigo para os seus próprios interesses, nessa medida se podendo falar em exposição descuidada e injustificada ao perigo de sofrer um dano”, muito embora não tivesse concorrido para o despiste do veículo, limitou a redução da responsabilidade da ré, ora recorrente por concurso de culpa do lesado, a 15%.
A ré recorrente sustenta que, a parcela de responsabilidade a atribuir ao lesado não deve ser inferior a 50%, a fim de reduzir a indemnização, ao abrigo do disposto no nº 1 do artº 570º do CCivil.
Vejamos.
Tendo em conta a factualidade provada respeitante a esta matéria, verificamos que tendo o A. sido projectado do habitáculo do veículo (ponto 13) e que os restantes 4 ocupantes do mesmo veículo permaneceram no seu interior apenas tendo sofrido ferimentos ligeiros, dado terem colocados os respectivos cintos de segurança (pontos 51 e 52), conclui-se que essa falta contribuiu para o agravamento do dano causado pelo acidente.
Esta omissão de cuidado é claramente culposa, ostensivamente reveladora da inobservância do cuidado e diligência exigíveis a uma pessoa medianamente diligente e cuidadosa, colocada na situação da lesado, sendo do conhecimento geral que é perigoso fazer-se transportar num veículo automóvel sem ter o cinto de segurança colocado [neste sentido, vide o Ac. do STJ de 21/02/2013 (relatora Maria dos Prazeres Pizarro Beleza), disponível em www.dgsi.pt].
Ainda secundando o vertido neste mencionado Ac. do STJ, dir-se-á que “É indiscutível que a falta de colocação do cinto de segurança – cuja obrigatoriedade protege, em primeiro lugar, o próprio passageiro, mas tem igualmente em vista o interesse público de minorar as consequências dos acidentes de viação e as suas repercussões, por exemplo, no sistema de saúde, e não só –, no sentido do artigo 563º do Código Civil, não é causa adequada do acidente e, portanto do dano; não se pode falar, assim, de uma situação de concorrência de causas do dano.”
O artº 563º do CCivil prevê ao consagrar a teoria da causalidade adequada que “A obrigação de indemnização só existe em relação aos danos que o lesado provavelmente não teria sofrido se não fosse a lesão”.
Portanto o que aqui interessa aferir do ponto de vista da contribuição de cada um para o dano concretamente sofrido, é a respectiva culpa.
In casu, é óbvio que a culpa do condutor do veículo que se despistou - único responsável pela produção do acidente - é incomparavelmente maior do que a do autor que seguia como passageiro no veículo sem ter colocado o cinto de segurança, em nada tendo contribuído para a produção daquele evento, ou seja, caso não tivesse ocorrido tal conduta ilícita e culposa por parte do condutor do veículo, o autor não teria sofrido quaisquer danos, usando ou não cinto de segurança.
A culpa do autor circunscreve-se, assim, à falta de colocação de cinto de segurança, que devia ter colocado sendo, por isso, reduzida no contexto causal do acidente.
No entanto, não há dúvida que a sua conduta - o não uso de cinto de segurança – potenciou o agravamento das lesões sofridas, tanto mais que todos os outros ocupantes do veículo sofreram lesões ligeiras ao usarem cinto de segurança e não terem saído do habitáculo da viatura.
Assim, tendo em conta o reduzido grau de gravidade da culpa do autor mas também o circunstancialismo supra apontado, entende-se alterar a indemnização a arbitrar ao autor, a qual deve ser reduzida em 25%, por aplicação do disposto no artº 570º, nº 1 do CCivil.

c) Ao abatimento dos valores a pagar.

No ponto I da parte decisória da sentença recorrida foi relegado para liquidação ulterior a fixação do quantum indemnizatório a pagar ao autor a título de danos patrimoniais e não patrimoniais, quantia que deverá ser reduzida em 15% (ora alterada para 25%) pela quota-parte de culpa atribuída ao lesado e de seguida deduzida da quantia global de € 130.701,00, sempre com o limite máximo de € 600.000,00.
A ora recorrente entende que, certamente, por lapso, na sentença recorrida não se levou em conta o facto de no apenso cautelar, se manter o pagamento mensal da quantia de € 500,00 fixada, a qual, no seu entender, deverá na decisão final fixada ser abatida ao valor da indemnização.
De facto, no procedimento cautelar de arbitramento de reparação provisória, foi em 18/08/2008 realizada transação que foi homologada, em que a ré se obrigou a pagar mensalmente ao autor uma renda no valor de € 500,00.
É entendimento da sentença recorrida que todas as despesas suportadas pela ré com os tratamentos médicos e medicamentosos, com os adiantamentos parciais por conta da indemnização e bem assim “todas as quantias que a ré venha a pagar ao autor B… após o encerramento da audiência de julgamento [isto é, após 06 de Maio de 2013 (parte final do nº 1 do artigo 663º do Código de Processo Civil) – mas os pagamentos posteriores ao encerramento da discussão nestes autos naturalmente têm de ser expressamente invocados e considerados na liquidação que venha a ter lugar], devem ser contabilizadas para fazer diminuir o valor final a pagar pela ré (nº 2 do artigo 566º do Código Civil)” – cfr. pag. 1166/1167 dos autos.
Efectivamente, na parte dispositiva da sentença não se faz qualquer referência aos pagamentos futuros (após 06/05/2013), isto é, aos pagamentos mensais que a ré vem efectuando ao autor.
Cremos ter-se tratado, como bem refere a recorrente, de lapso manifesto por omissão material, que pode ser reparado em sede recursiva ao abrigo do disposto no artº 667º do CPC, a que corresponde actualmente o artº 614º do NCPCivil.
Por conseguinte, decide-se alterar o decidido no ponto I do dispositivo da sentença recorrida, acrescentando-se o seguinte: “… e de seguida, deduzida da quantia global de € 130.701,00, acrescida dos valores mensais que esta venha a liquidar no apenso após 06/05/2013, …”.

d) Ao limite do capital seguro.

Já sabemos que, em face da TAS de 0,63 g/l do condutor D… está a transferência da responsabilidade civil transferida para a R. circunscrita ao capital seguro obrigatório então de € 600.000,00.
Sustenta a recorrente que não se mostra clara a redacção na parte dispositiva da sentença quando se diz “… deduzida da quantia global de € 130.701,00, sempre com o limite máximo de € 600.000,00”, sugerindo que esse valor a pagar depois dessas deduções se poderia estender aos € 600.000,00, o que constituiria uma violação do disposto no artº 6º do DL 522/85 de 31/12 na redacção dada pelo DL nº 3/96 de 25/01.
Ora bem, em nós não se suscitou qualquer dúvida de que os valores a liquidar pela ré ao autor quer a título de danos patrimoniais quer a título de danos não patrimoniais não poderia exceder os € 600.000,00.
No entanto, para que não se construam “teorias” pretendendo-se que se exceda tal montante, entendemos ser melhor clarificar a redacção da parte dispositiva da sentença no seu ponto I, a fim de ficar em perfeita sintonia com os fundamentos na mesma exarados e, tendo ainda em conta que à data do encerramento da audiência de discussão e julgamento, a ré comprovou ter já despendido com o sinistro, entre adiantamentos prestados ao A. e outras despesas com tratamentos, hospitalização, próteses e outros a quantia global de € 130.701,00, sem prejuízo dos valores que lhe continuará a pagar a título de reparação mensal provisória à razão de 500,00 por mês.
Nestes termos, atendendo a que esta é a última questão suscitada no recurso da recorrente, iremos em face do decidido supra alterar o ponto I do dispositivo da sentença recorrida, passando o mesmo a ter a seguinte redacção definitiva:
I – Julga-se parcialmente procedente o pedido formulado pelo autor B…, e, em consequência, condena-se a ré “Companhia de Seguros C…, SA”, a pagar àquele quantia, a liquidar em decisão ulterior, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais referidos nos pontos 13-, 15-, 16-, 17-, 18-, 19-, 20-, 21-, 22-, 28-, 29-, 30-, 31-, 32-, 33-, 34-, 36-, 37-, 44-, 45-, 46-, 50-, 58-, 61-, 62-, e 63- da matéria de facto nestes autos provada, quantia reduzida de 25% e de seguida deduzida da quantia global de € 130.701,00, acrescida dos valores mensais que esta venha a liquidar no apenso após 06/05/2013, não podendo exceder o total das quantias pagas e a pagar o limite máximo de € 600.000,00”.
Procedem, assim, parcialmente as conclusões do recurso da ré apelante.

Recurso do interveniente principal:
A) A alegada violação do artº 156º do C.Estrada por consideração de meio de prova ilegal.

Sustenta o ora recorrente que a sentença recorrida utilizou e aplicou, na prova dos factos constantes dos artºs 51º e 108º do Pº nº 1805/08.0TBVLG e artº 15º do Pº nº 2031/08.3TBVLG respectivamente os pontos 54, 85 e 101 da fundamentação da matéria de facto, meios de prova ilegais, designadamente o recurso ao exame do sangue do autor e, como tal daí resultou uma violação do artº 156º do C.Estrada.
Vejamos se é assim.
Em caso de acidente, dispõe o artº 156º do Cód. da Estrada, sob a epígrafe “Exames em caso de acidente” o seguinte:
“1. Os condutores e os peões que intervenham em acidente de trânsito devem, sempre que o seu estado de saúde o permitir, ser submetidos a exame de pesquisa de álcool no ar expirado, nos termos do artº 153º.
2.Quando não tiver sido possível a realização do exame referido no número anterior, o médico do estabelecimento oficial de saúde a que os intervenientes no acidente sejam conduzidos deve proceder à colheita da amostra de sangue para posterior exame de diagnóstico do estado de influenciado pelo álcool.
3.Se o exame de pesquisa de álcool no sangue não puder ser feito, deve proceder-se a exame médico para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool.
4.Os condutores e peões mortos devem também ser submetidos ao exame previsto no nº 2”.
Refere o recorrente que, em primeiro lugar deve ser sempre efectuado o teste de ar expirado e que só no caso de tal não ser possível por os condutores e peões terem falecido é que se procede à colheita de sangue.
Salvo o devido respeito, não é essa a interpretação que deve ser retirada do preceito acabado de transcrever.
Com efeito, os condutores e os peões que intervenham em acidente de trânsito devem, sempre que o seu estado de saúde o permitir, ser submetidos a exame de pesquisa de álcool no ar expirado, mas quando esse exame não tiver sido possível por qualquer razão, deve proceder-se à colheita de amostra de sangue.
Portanto, a regra é que a detecção de álcool no sangue seja efectuada através de teste ao ar expirado, efectuado com alcoolímetros, sendo excepcional a análise de sangue, que só acontecerá em caso de impossibilidade de efectuar o teste em analisador quantitativo e em caso de contraprova, quando o examinado requeira e opte pelo método de análise de sangue.
No caso concreto, não foi efectuado teste de ar expirado ao condutor da viatura sinistrada, desconhecendo-se por que motivo mas poderá ter a ver com o facto de o mesmo se apresentar ferido e ter de ser encaminhado para o Hospital onde aí se faria como acabou por se fazer a análise ao sangue para detectar a presença de álcool.
Não se vê como possa este exame ser desconsiderado em relação ao exame efectuado através de ar expirado, uma vez que o alcoolímetro, como qualquer instrumento de medição, não tem uma fiabilidade absoluta, ao contrário do exame ao sangue para detectar a presença de álcool e tanto assim é que o resultado da contraprova, caso seja pedida pelo condutor, prevalece sobre o exame ao ar expirado – cfr. artº 153º/6 do Cód. da Estrada – procurando o legislador garantir a verdade com tal exame.
Portanto, deve considerar-se o exame ao sangue uma garantia de defesa do condutor e não o contrário, já que o exame ao sangue é mais rigoroso, mais fiel e a sua realização encontra-se prevista não só para o exame inicial mas para a contraprova – artº 153º/3 do Cód. da Estrada.
O recorrente faz uso nas suas alegações a preceitos de processo penal e a arestos de natureza criminal onde estava em causa o julgamento de condutores acusados de crime de condução sob o efeito do álcool para dizer que existe um primado do teste ao ar expirado.
Ora, aos presentes autos de natureza cível, como bem sabe o recorrente não se aplicam as regras de processo penal.
Na presente acção, o que interessa é saber se o condutor da viatura interveniente no acidente conduzia ou não sob o efeito do álcool para efeitos de natureza contratual, isto é, saber se os danos resultantes do sinistro estão ou não incluídos na cobertura do contrato de seguro.
Em matéria cível rege o disposto nos artºs 515º (actual artº 413º do NCPC) e 655º nº 1, do CPC (actual artº 607º nº 5 do NCPC), ou seja, o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas e apreciá-las livremente segundo a sua prudente convicção acerca de cada facto, desde que se observe o respeito pelo contraditório e não haja norma que proiba o meio de prova.
In casu, a lei não proíbe, como vimos, que seja efectuado o exame para apurar da presença de álcool através de exame ao sangue, antes o permite e até lhe dá prevalência, no caso da contraprova.
Por outro lado, segundo o depoimento da testemunha O…, na altura chefe da secção de acidentes, o teste ao ar expirado não é obrigatoriamente feito numa situação em que o condutor vai ser transportado ao hospital, como foi o caso, porque uma vez ali vai ser-lhe recolhido sangue e portanto não se justifica o exame com o aparelho de ar expirado.
De resto, o Mmº Juiz a quo teve em conta na fundamentação da matéria de facto provada, não só o relatório médico-legal do exame ao sangue (fls. 105) mas também os documentos de fls. 516 a 520 do Pº nº 1805/08.0TBVLG e de fls. 247 a 255 do Pº nº 2013/08.3TBVLG,
De tudo quanto vem de ser exposto, não temos dúvidas em afirmar que o exame ao sangue realizado na pessoa do condutor do veículo é perfeitamente legal e, como tal, não foi violado o artº 156º do Cód. da Estrada, improcedendo, deste modo, as conclusões do recurso, nessa parte.

B)A alegada inconstitucionalidade orgânica da Lei na redacção dada pelo DL nº 44/2005 de 28/09 aos artºs 152º nº 3, 153º nº 8 e 156º nº 3 do C. Estrada.

Sustenta o recorrente que, na redacção dada aos supra referidos preceitos, tendo estes natureza inovatória, o legislador extravasou o conteúdo da Lei de autorização legislativa – Lei n.º 52/2004 de 4/11 – assim ocorrendo inconstitucionalidade orgânica por violação do disposto no art.º 65.º n.º 1 alíneas b) e c) da CRP, o que determinaria que o exame de TAS por recolha de sangue redundaria num meio de prova ilegal.
Vejamos.
Durante algum tempo, numa fase inicial, quer os Tribunais comuns quer o Tribunal Constitucional decidiram declarar a inconstitucionalidade dos referidos preceitos do Código da Estrada por inconstitucionalidade orgânica, quando estava em causa a condenação do arguido pelo crime de condução sob o efeito do álcool ou de desobediência por recusa, sujeitos a pena de prisão [vide, entre outros os acs. do TRP de 09/12/2009 (também citado pelo recorrente) e de 14/07/2010 e do TRC de 19/10/2010, os quais se estribaram no decidido pelo Tribunal Constitucional no ac.n.º 275/09, todos disponíveis em www.dgsi.pt e www.tribunalconstitucional.pt, respectivamente].
In casu, está em questão a conjugação dos artigos 152.º, n.º 3 e 156.º, n.º 2, ambos do C.E. que regulam a situação específica de controle do estado de influenciado pelo álcool de pessoa que interveio em acidente de viação.
No entanto, no caso que nos ocupa, a prova determinada com a consideração do resultado do exame de sangue ao arguido, não só não se destinou à sua condenação criminal, nem mesmo contra-ordenacional, como não se funda em nenhumas disposições julgadas inconstitucionais.
O recorrente, ao socorrer-se da alegada inconstitucionalidade, faz uso de normas que não têm qualquer aplicação ao caso dos autos.
O art.º 152.º n.º 3 do CE, respeita ao caso em que os condutores recusam submeter-se às provas estabelecidas para a detecção do estado de influenciado pelo álcool ou por substâncias psicotrópicas e respectiva punição por crime de desobediência, circunstância que nenhum interesse tem para os presentes autos.
Os art.º 153.º n.º 8 do CE, respeita aos procedimentos normais de fiscalização de trânsito e álcool na condução.
Assim, apenas o artº 156.º nº 1 do C.E., respeita à situação do caso em apreço – fiscalização do TAS do condutor em caso de acidente.
Iremos agora analisar se o legislador de 2005 em tal preceito, inovou o regime jurídico relativamente ao regime anterior e, em caso afirmativo, se ao fazê-lo, extravasou a autorização legislativa do parlamento.
A resposta ao primeiro não pode deixar de ser negativa, prejudicando a questão do segundo.
Fazendo uma breve resenha da história da norma em questão temos de reportar a análise ao regime resultante do Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, proferido ao abrigo de autorização legislativa (Lei n.º 97/97, de 23 de Agosto) e de que resultou a seguinte redacção:
Artigo 162º
Exames em caso de acidente
1- Os condutores e quaisquer pessoas que intervenham em acidente de trânsito devem, sempre que o seu estado de saúde o permitir, ser submetidos ao exame de pesquisa de álcool no ar expirado nos termos do artigo 159º.
2- Quando não tiver sido possível a realização do exame no local do acidente, deve o médico do estabelecimento hospitalar a que os intervenientes no acidente sejam conduzidos proceder aos exames necessários para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool.
3- No caso referido no número anterior, o exame para pesquisa de álcool no sangue só não deve ser realizado se houver recusa do doente ou se o médico que o assistir entender que de tal exame pode resultar prejuízo para a saúde.
4- Não sendo possível o exame de pesquisa de álcool nos termos do número anterior deve o médico proceder aos exames que entender convenientes para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool.
Este regime manteve-se em vigor desde 1998 até 2001, ano em que sofreu uma ligeira alteração na sua redacção por força do DL nº 265-A/2001 de 28/9, como passamos a constatar:
Artigo 162º
Exames em caso de acidente
1 - Os condutores e os peões que intervenham em acidente de trânsito devem, sempre que o seu estado de saúde o permitir, ser submetidos a exame de pesquisa de álcool no ar expirado, nos termos do artigo 159.º
2 - Quando não tiver sido possível a realização do exame referido no número anterior, o médico do estabelecimento oficial de saúde a que os intervenientes no acidente sejam conduzidos deve proceder à colheita da amostra de sangue para posterior exame de diagnóstico do estado de influenciado pelo álcool.
3 - Se o exame de pesquisa de álcool no sangue não puder ser feito, o médico deve proceder a exame pericial para diagnosticar o estado de influenciado pelo álcool.
Como se pode constatar a única alteração foi a eliminação da possibilidade antes prevista no número 3 de não realização da colheita de sangue apenas por recusa do doente ou por razões médicas atinentes à saúde do doente.
Ora, o DL nº 44/2005 manteve a redacção do preceito em causa, limitando-se a renumerá-lo agora como art.º 156.º.
Como resulta evidente, a realização do exame de sangue para determinação do TAS em caso de acidente de que resultasse a condução de intervenientes a estabelecimento hospitalar já existia e estava prevista na legislação anterior à que se limitou a renumerar o preceito que o recorrente pretende seja considerado inconstitucional.
O próprio TC veio esclarecer que:
“em relação aos exames a realizar em caso de acidente, manteve-se, no entanto, a anterior redacção do artigo 162º, n.º 2, em que já não se fazia alusão à possibilidade de recusa a exame através da colheita de sangue, tendo-se procedido apenas à renumeração desse preceito (artigo 156º, n.º 2)” - (cfr. Ac. do TC n.º 15/2011 in www.tribunalconstitucional.pt).
A preocupação constitucional centrou-se sobretudo na penalização por crime de desobediência quando o condutor recusava o exame de sangue ou exame médico alternativo no domínio da validade do meio de prova em sede de processo penal.
Mas, mesmo aí o legislador veio resolver o problema da alegada inconstitucionalidade orgânica com a publicação e entrada em vigor da Lei n.º 18/2007, de 17 de Maio, que aprovou o “Regulamento de Fiscalização da Condução sob influência do Álcool ou de Substâncias Psicotrópicas”.
Este diploma visou revogar e substituir o Decreto-Regulamentar n.º 24/98, de 30 de Outubro, que regulamentava o regime jurídico da fiscalização da condução sob a influência do álcool e de substâncias estupefacientes ou psicotrópicas, que então constava do Código da Estrada com as alterações que lhe foram introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro e, desse modo, toma implicitamente como base o novo regime legal que decorre das sucessivas alterações que foram introduzidas pelos diplomas legislativos posteriores, incluindo as resultantes dos Decretos-Lei n.ºs 265-A/2001 e 44/2005.
Aí se prevê o exame de sangue como meio adequado de detecção da TAS sem a possibilidade sequer de recusa por parte do condutor, ou necessidade da sua autorização, exame esse que só é afastado e substituído por exame médico quando “após repetidas tentativas, não se lograr retirar ao examinando uma amostra de sangue em quantidade suficiente.” - (cfr. art.º 7.º n.º 1 da Lei n.º 18/2007 de 17/5).
De facto, como vem entendendo o próprio Tribunal Constitucional:
“À norma do artigo 7º da Lei n.º 18/2007 pode, por conseguinte, atribuir-se um efeito equivalente ao de uma lei interpretativa, nos termos do artigo 13º do Código Civil, embora se não possa considerar a retroacção de efeitos à data da entrada em vigor das normas legais interpretadas, em face do princípio da não retroactividade da lei penal, que impede que possam ser qualificadas como crime condutas que, no momento da sua prática, eram tidas como irrelevantes - artigo 29º, n.º 1, da CRP (cfr. Baptista Machado, Introdução ao Direito e ao Discurso Legitimador, Coimbra, 1993, pág. 245).
É ainda de salientar que o Tribunal Constitucional já considerou que a inconstitucionalidade orgânica não é pertinentemente invocável quando a Assembleia da República, em processo de apreciação parlamentar de decreto-lei, manifesta inequívoca vontade política de manter na ordem jurídica as normas organicamente inconstitucionais que foram submetidas à sua apreciação (acórdão n.º 415/89), ou, de outro modo, quando revela uma vontade positiva através da aprovação de alterações ao diploma ou rejeição de propostas de alteração relativamente às normas cuja inconstitucionalidade orgânica vem questionada (acórdão n.º 786/96).” - (cfr. Ac. do TC n.º 15/2011 in www.tribunalconstitucional.pt).
No mesmo sentido, vejam-se ainda os Acórdãos n.ºs 487/10 e 479/10, também disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt. e citados pela recorrida seguradora nas suas contra-alegações de recurso.
Este último – 479/10 – em particular pela sua abordagem exaustiva do problema com a mais completa análise histórica da penalização da recusa do condutor em sujeitar-se aos exames de sangue conclui pela ausência de caracter inovador do legislador de 2005, afastando a alegada inconstitucionalidade orgânica do seguinte modo:
“Assim sendo, verifica-se que, independentemente da interpretação infraconstitucional que se prefira, relativamente à solução que resultou da redacção dos artigos 158.º, n.º 3, e 162.º, n.º 3, do Código da Estrada, introduzida pelo Decreto-Lei n.º 2/98, de 3 de Janeiro, a conclusão é precisamente a mesma – o conteúdo do disposto nos artigos 152.º, n.º 3, e 156.º, n.º 2, do Código da Estrada, não regista qualquer inovação relativamente à legislação anteriormente vigente, aprovada com a devida autorização do legislador parlamentar.” - (Ac. do TC 479/2010, proc.n.º 471/10 in www.tribunalconstitucional.pt).
Subsequentemente, já veio este Tribunal da Relação do Porto, em situação inteiramente aplicável à dos autos, actualizar a jurisprudência sobre o tema em conformidade com a do TC, determinando que:
“A norma do nº 2 do art. 156º do Código da Estrada (na redação dada pelo DL 44/05, de 23/02), não padece de inconstitucionalidade orgânica nem de inconstitucionalidade material.” – [Ac. do TRP de 02/05/2012 (relator Melo Lima) in www.dgsi.pt]
Não ocorre, por isso, qualquer inconstitucionalidade orgânica que determine a invalidade dos exames de TAS efectuados ao autor e que o Mmº Juiz a quo atendeu na decisão proferida, improcedendo as conclusões respeitantes a esta concreta matéria das alegações de recurso do recorrente.

C)A alegada violação do artº 188º do C.Estrada.

Vem agora o recorrente dizer que tendo ocorrido prescrição do procedimento contraordenacional, ficou sem efeito a sua condenação naqueles autos e, como tal não poderá agora nestes autos ser condenado ou julgado recorrendo-se a um meio de prova daquele processo.
Nos termos do artº 188º nº 1 do C.Estrada, o procedimento por contraordenação rodoviária extingue-se por efeito de prescrição logo que, sobre a prática da contraordenação tenham decorrido dois anos.
Neste contexto, dir-se-á, em primeiro lugar que nestes autos, o ora recorrente não foi condenado e, em segundo lugar que, atendendo a que o que importa saber nestes autos é se os danos ocorridos com a perda da viatura do autor interveniente no acidente de viação estão ou não excluídos do seguro pelo facto de aquele se encontrar a conduzir sob a influência do álcool, é completamente irrelevante que o procedimento contraordenacional esteja ou não prescrito.
Por conseguinte, não ocorre qualquer violação do artº 188º do C. Estrada.

D)A alegada violação do artigo 32º da CRPortuguesa e 126º do CPPenal.

Vem o recorrente invocar novamente preceitos atinentes ao processo penal que não são de todo aqui aplicáveis, dado estarmos perante uma acção cível, para novamente alegar que o meio de prova de recolha de sangue não pode ser aproveitado neste âmbito do processo cível, já que o recorrente viu a sua responsabilidade penal ser extinta no processo contraordenacional.
Já vimos na abordagem das questões anteriores que o exame de sangue para averiguação de álcool no sangue é um meio de prova legal e que foi obtido de acordo com os procedimentos constantes do Cód. da Estrada, sendo essencial valorar tal meio de prova, pois esse elemento é determinante para se aferir se os danos ocorridos com a perda da viatura do autor interveniente no acidente de viação estão ou não excluídos do seguro.
Aliás, como também já foi frisado anteriormente, o juiz valora livremente as provas recolhidas e, concretamente o exame de sangue efectuado ao condutor do veículo, ora recorrente em que foi detectado que conduzia sob a influência do álcool.
Como tal, não ocorre qualquer ilegalidade ao fazer-se uso de tal meio de prova no âmbito deste processo cível, sendo destituído de qualquer interesse/relevância que o recurso interposto pelo ora recorrente no processo contraordenacional não tenha tido seguimento, conforme é alegado.
Não se verifica, assim, a violação dos preceitos legais apontados.

E) A alegada violação do artº 29º nº 5 da CRPortuguesa – princípio non bis in idem.

Dispõe o mencionado artº da Constituição o seguinte:
“Ninguém pode ser julgado mais do que uma vez pela prática do mesmo crime”.
Volta novamente o recorrente com a mesma argumentação, ou seja, que tendo sido extinto por prescrição o processo contraordenacional em que foi condenado, não pode nestes autos ser julgado por ela.
Pensamos que o recorrente faz alguma confusão entre processo cível e processo contraordenacional.
Um nada tem a ver com o outro.
Nestes autos, o ora recorrente não está a ser julgado por nada e muito menos por um qualquer crime.
Naquele outro processo contraordenacional o ora recorrente era arguido e nos presentes autos é autor e o objecto dos mesmos é completamente diferente daquele outro.
Nestes termos, é nosso entendimento, como é óbvio, não se verificar qualquer violação do preceito constitucional invocado.

F) A alegada violação dos artºs 497º e 498º do CPCivil – Caso julgado.

Desta vez, argumenta o recorrente que, tendo-se extinguido a decisão e o procedimento criminal instaurado contra o ora recorrente, arguido nos autos de contraordenação instaurados por virtude de condução sob o efeito de álcool, não pode agora estar a ser julgado nas instâncias cíveis, designadamente nos pontos 8, 54, 55, 86 e 88 do Pº nº 1805/08.0TBVLG e nos pontos 94, 95 e 107 do Pº nº 2031/08.3TBVLG, sobre um comportamento ou uma taxa de alcoolémia de que foi extinta a sua responsabilidade criminal, sob pena de violação de caso julgado.
De acordo com aqueles preceitos legais, a excepção de caso julgado pressupõe a repetição de uma causa e esta repete-se quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir.
Por aqui já se antevê que não assiste qualquer razão ao recorrente.
De facto, os sujeitos processuais no processo contraordenacional não são os mesmos desta acção cível, pois naquela, o Estado é a parte acusadora e o ora recorrente é arguido.
Nesta acção cível, desde logo o Estado não intervém a qualquer título.
Quanto à causa de pedir: nos presentes autos, é o contrato de seguro e os danos emergentes do acidente de viação; no processo contraordenacional, o objecto da causa foi a ocorrência de um ilícito de mera ordenação social a que corresponde a aplicação de uma coima.
Igualmente no que concerne ao pedido não há qualquer identidade, já que no processo contraordenacional, o pedido consubstancia-se numa sanção punitiva ao arguido pelo Estado enquanto nesta acção, o pedido diz respeito a uma indemnização peticionada pelo autor.
Não tendo, assim, ocorrido violação do caso julgado, improcedem, também, nesta parte, as conclusões do recurso.

G) A alegada violação do artº 26º da CRPortuguesa.

Invoca agora o recorrente que não autorizou a recorrida companhia de seguros a utilizar o resultado do exame ao sangue por si efectuado através do qual se determinou a TAS, para efeito de ser contra ele instruído qualquer processo judicial, o que torna o meio de prova nulo, por violação do artº 26º da CRP, invocando para o efeito um Ac. deste TRP de 10/07/2013, transcrevendo do mesmo uma passagem de onde consta que o empregador não podia recorrer a informação de um teste de TAS sem ser o trabalhador a permitir esse acesso.
Ora, dispõe este preceito legal que:
“1. A todos são reconhecidos os direitos à identidade pessoal, ao desenvolvimento da personalidade, à capacidade civil, à cidadania, ao bom nome e reputação, à imagem, à palavra, à reserva da intimidade da vida privada e familiar e à protecção legal contra quaisquer formas de discriminação.
2. A lei estabelecerá garantias efectivas contra a obtenção e utilização abusivas, ou contrárias à dignidade humana, de informações relativas às pessoas e famílias.
3. A lei garantirá a dignidade pessoal e a identidade genética do ser humano, nomeadamente na criação, desenvolvimento e utilização das tecnologias e na experimentação científica.
4. A privação da cidadania e as restrições à capacidade civil só podem efectuar-se nos casos e termos previstos na lei, não podendo ter como fundamento motivos políticos”.
Como bem refere a recorrida, a partir do momento em que o recorrente conduz um veículo automóvel e é interveniente num acidente de viação, o estado de alcoolémia do mesmo deixa de pertencer à reserva da vida privada, pois a lei prevê que nesses casos há a obrigatoriedade de detectar se os condutores intervenientes num acidente são portadores de TAS.
Por outro lado, tendo o recorrente participado a ocorrência do acidente à seguradora para quem havia transferido, mediante um contrato de seguro, a responsabilidade civil emergente da circulação do veículo que conduzia, obviamente que é do interesse da seguradora o apuramento dos factos que possam determinar (ou não) o pagamento da indemnização contratualmente prevista.
Por isso, não há qualquer impedimento, mormente legal, que impeça a seguradora de aceder a tal dado.
De resto, os documentos constantes de fls. 513 a 520 foram requisitados pelo próprio Tribunal, conforme se extrai do of. de fls. 503.
E, assim sendo, não se trata de nenhum elemento de prova que seja ilegal e muito menos que esteja vedado à seguradora utilizá-lo sem ser com autorização do autor/recorrente.
Não foi, assim, violado o disposto no artº 26º da CRP e, consequentemente improcedem, mais uma vez, as conclusões do recurso a propósito desta matéria.

H) A alegada falsidade documental e violação dos artºs 371º e 372º do CCivil quanto ao “aditamento à participação de acidente nº 1543/05”.

Sustenta o recorrente que o doc. de fls. 518 dos autos – aditamento à participação de acidente, subscrito pelo chefe da secção de acidentes, O… – é falso por não ter sido assinado por quem o presenciou.
Porém, analisado o referido documento, constata-se que no fim do mesmo tem a menção manuscrita “Pel´” seguida do seguinte “O chefe da secção de acidentes” e a seguir o nome de “O…”.
Ora, o agente de autoridade O… depôs em audiência de julgamento, tendo sido transcrito o seu depoimento pelo recorrente.
Em audiência de julgamento, foram exibidos à testemunha os documentos de fls. 514 e segs., tendo aquela referido que à data dos factos era o chefe da secção de acidentes da GNR do Porto, competindo à sua secção receber os resultados dos exames de TAS pedidos ao INML e quando eram recebidos, era emitido um aditamento à participação de acidente como aconteceu neste caso relativamente ao doc. de fls. 518.
Portanto, de acordo com o depoimento da testemunha este era o procedimento habitual nestes casos, confirmando ainda a correspondência do selo da colheita com as guias relativas à pessoa do autor/recorrente e que uma vez recebido o resultado do exame é emitido o tal aditamento pelos serviços, embora a assinatura não seja sua e por isso mesmo se encontra a palavra “Pel´o chefe …”, que era ele próprio.
Este procedimento, conforme referiu a testemunha é autorizado e é o habitual.
De facto, este procedimento é dos mais correntes em qualquer repartição pública de um qualquer organismo deste país.
Não ocorre, por isso, a nosso ver, qualquer ilegalidade ou falsidade quando um documento é emitido de acordo com as regras estabelecidas e autorizadas pelos serviços, como é o caso, já que o resultado ao exame de sangue do ora recorrente efectuado pelo INML foi remetido posteriormente à recolha de sangue e, como tal é perfeitamente natural que o mesmo seja remetido em aditamento àquele.
De resto, trata-se de um documento que foi remetido pela GNR a pedido do Tribunal e a circunstância de não ter sido assinado pela testemunha, chefe de serviço de acidentes da GNR do Porto mas por um outro agente da autoridade desse mesmo serviço não faz dele um documento falso.
Aliás, do referido aditamento consta que o mesmo é feito “em virtude de o Instituto de Medicina Legal do Porto ter feito chegar a este comando o resultado do exame toxicológico de DETERMINAÇÃO DA TAXA DE ÁLCOOL ETÍLICO NO SANGUE/CONFIRMAÇÃO DE PRESENÇA DE PSICOTROPICOS referente ao Sr. D… tendo acusado uma TAS de 0,63 g/l”.
De qualquer forma, temos de convir, o que determinou que o Mmº Juiz a quo desse como provada a matéria da TAS foi seguramente o doc. remetido pelo INML, este assinado pelo director do serviço competente deste organismo, que consubstancia um exame pericial fidedigno e que não foi posto em causa e para o qual aquele aditamento apenas remete.
In casu, o INML no doc. de fls. 517, atesta que na amostra de sangue que lhe foi enviada com o selo nº …… colhida no dia 16/05/2005 pelas 3,05h no Hospital de S. João foi medida uma TAS de 0,63 g/l, amostra essa que como se verifica do doc. de fls. 520, respeita ao sangue recolhido ao ora recorrente, no dia, hora e local acima mencionados, a qual foi remetida ao INML pelo Hospital para análise sendo, por isso, um documento autêntico com força probatória plena quanto aos factos que nele estão exarados como praticados pela entidade emitente (artºs 369º e 371º ambos do CCivil).
E, como já se disse foi com base no envio desse resultado remetido pelo INML aos serviços de acidentes da GNR que posteriormente o encaminharam para o Tribunal, através do mencionado aditamento à participação anteriormente elaborada constante de fls. 518.
Tendo em conta a TAS do ora recorrente foi, de resto, levantado um auto de contra-ordenação constante de fls. 251, tendo-lhe sido aplicada uma coima de € 250,00 pela infração ao artº 81º nº 1 do Cód. Estrada, a qual veio a ser paga (cfr. of. da ANSR junto aos autos a 29/06/2011 e de fls. 281).
Isto quer dizer que todo o conteúdo desse aditamento tem a sua origem no documento enviado pelo INML de fls. 517 e está conforme com o mesmo, logo não está eivado de qualquer falsidade formal ou material.
Improcedem, mais uma vez as conclusões do recurso a esta matéria atinentes.

I)A alegada violação do artº 490º nº 2 do CPCivil por eliminação das alíneas L) a X) do elenco dos factos assentes.

Discorda o recorrente com a decisão recorrida de 06/05/2013 quando decidiu eliminar da matéria assente a factualidade constante das alíneas L) a X).
Vejamos se lhe assiste razão.
De facto, na audiência de discussão e julgamento realizada a 06/05/2013 (cfr. fls. 1107 e segs), o Mmº Juiz a quo dando conta de que a matéria a que se referem as alíneas L) a X) dos factos assentes no Pº nº 1805/08.0TBVLG apenas traduziam a posição do autor D…, mas que havia sido oportunamente impugnada pela ré seguradora na contestação que apresentou no âmbito do Pº nº 2031/08.3TBVLG, decidiu determinar a sua exclusão do elenco dos factos assentes, atenta a determinada apensação de processos anteriormente realizada.
Há que salientar que da decisão de exclusão dessa factualidade da matéria assente não reclamou o ora recorrente nem apresentou recurso autónomo.
Mas, assiste inteira razão ao Mmº Juiz a quo.
Na verdade, aquela factualidade reconduzia-se a factos alegados pelo A. D… no Pº nº 1805/09.0TBVLG, os quais se encontravam em contradição não só com a contestação apresentada pela ré seguradora no Pº nº 2031/08.3TBVLG mas também com o requerimento de intervenção de terceiro apresentado pela ré no Pº nº 1805/09.0TBVLG.
Por isso, tais factos haviam, desde logo, sido incorrectamente dados como assentes, dado não terem sido admitidos por acordo.
Pretende agora o ora recorrente que essa mesma factualidade seja dada como assente.
Mas, não pode ser.
É que tais factos foram alegados pelo ora recorrente na contestação que apresentou como chamado ao lado da primitiva ré no Pº nº 1805/09.0TBVLG.
Mais, nesses mesmos autos, a ré seguradora já havia apresentado contestação impugnando esses mesmos factos e não havendo qualquer outro articulado subsequente apresentado pela ré seguradora, não poderiam aqueles factos ter sido dados como assentes como o foram e daí o acerto da decisão que decidiu eliminar da factualidade assente a matéria incluída nas alíneas L) a X).
Alega, contudo, o recorrente que tal constitui uma violação do disposto no artº 490º nº 2 do CPCivil, o qual dispõe que se consideram admitidos por acordo os factos articulados na petição que não forem impugnados na contestação.
Ora, como acabámos de dizer tais factos nem sequer haviam sido articulados na petição inicial, mas sim na contestação do interveniente, pelo que, e desde logo, nem sequer poderá ter aplicação este preceito legal.
Improcedem, assim, mais uma vez, as conclusões do recurso respeitantes a esta matéria.

J) A alegada violação do artº 650º nº 3 do CPCivil – aditamento de factos à base instrutória sem contraditório.

Sustenta o recorrente que o Mmº Juiz a quo praticou um acto que lhe estava vedado, porquanto na resposta à matéria de facto constante do artº 113º do Pº nº 1805/08.0TBVLG, acrescentou matéria que não estava quesitada, tendo ultrapassado o mero esclarecimento e tendo-se pronunciado sobre matéria que não foi objecto de prova e que não constava da Base Instrutória.
Diz o recorrente, por um lado, que tal esclarecimento não fazia parte da matéria a instruir e objecto do questionário e, por outro que, os documentos juntos aos autos desacompanhados de qualquer outro meio de prova não permitiam julgar se o chamado havia efectivamente liquidado tal coima, ou sequer qualquer outra pessoa em seu nome.
Ora bem, vejamos o que vinha quesitado:
“O chamado foi absolvido dos autos de contra-ordenação que lhe foram instaurados com fundamento em condução sob efeito de álcool, não lhe tendo sido aplicada qualquer coima ou sanção acessória, não tendo incorrido em contravenção à legislação aplicável, no momento em que conduzia o veículo automóvel que também não foi demonstrada ou provada?”
No ponto 89 da matéria de facto constante da fundamentação da sentença resultou provado o seguinte:
“Ao autor D… não foi aplicada coima ou sanção acessória pela condução de veículo automóvel com uma taxa de álcool no sangue de 0,63 g/l, com o esclarecimento que o chamado procedeu ao pagamento voluntário, pelo mínimo legal, da coima correspondente ao auto de contra-ordenação levantado [resposta ao ponto 113º da base instrutória, com a rectificação determinada a fls 1108º]”.
Salvo o devido respeito, não se concorda com a argumentação expendida pelo recorrente.
De facto, contendo os autos elementos de prova sobre o pagamento voluntário da coima pelo mínimo legal (não interessa se foi o próprio ou alguém em seu nome a efectuar o pagamento, o que interessa é que foi paga a coima) é mais que justo que tal elemento conste na resposta onde se perguntava se o chamado foi ou não objecto de sanção em virtude de conduzir com TAS, já que ao contrário do alegado pelo recorrente existem nos autos meios de prova mais que suficientes para que tal matéria seja considerada provada (dos documentos de fls. 251 e 280/281 resulta que o autor foi objecto de autuação e liquidou a coima voluntariamente pelo mínimo legal).
Aliás, do doc. nº 2 junto com a contestação do chamado, consta a decisão da DGV que além de considerar provada a prática pelo então arguido, ora recorrente, da contra-ordenação p. e p. pelo artº 81º nº 1 do C.E. condenou-o na sanção de inibição de conduzir por 30 dias.
Dessa mesma decisão resulta que se torna definitiva se não for objecto de impugnação judicial no prazo de 15 dias úteis.
Conforme resulta de fls. 280 e 284, o então arguido, ora recorrente foi notificado da decisão administrativa que lhe aplicou a sanção de inibição de conduzir em 05/12/2006, pelo que decorridos que sejam 15 dias úteis, a decisão transita, ou seja, a decisão transitou em 27/12/2006 ou caso se considere ter de ser efectuado o desconto de férias judiciais de Natal, transitou em 08/01/2007.
Ora, tendo sido apresentado recurso de impugnação pelo então arguido, ora recorrente apenas em 03/04/2007 na delegação do Norte da DGV, há muito que havia transitado a decisão, razão pela qual a mesma já havia transitado em julgado (cfr. of. de fls. 280).
Por isso, a resposta mais adequada, como correctamente sustenta a recorrida teria sido a de “Não Provado”.
De qualquer modo, não foi, em nosso entender cometida qualquer nulidade ao ter-se incluído na resposta ao quesito em causa um esclarecimento sobre o pagamento da coima, pois tal facto não extravasa de modo algum aquilo que estava contido no quesito.
Alega ainda o recorrente que, a entender-se que tal matéria deveria ser acrescentada à factualidade em causa, então deveria ser reaberta a audiência de modo a permitir o contraditório.
Não se vê razão para tal, pois como já dissemos supra, tal matéria está perfeitamente enquadrada na matéria quesitada no artº 113º da BI, mas mesmo que não estivesse sempre poderia tal matéria ser tida em conta ao abrigo do disposto no artº 264º nº 2 parte final do CPCivil, já que se trata de um facto instrumental resultante da instrução, provado por documento proveniente de organismo público e não impugnado ou arguido de falso, pelo que sempre seria de conhecimento oficioso em sede de decisão final.
Improcedem, assim, as conclusões de recurso respeitantes a esta concreta matéria.

K) A alegada violação do artº 659º do CPCivil.

Vem agora o recorrente alegar por um lado que, na fundamentação da decisão quanto aos pontos da matéria de facto provada na sentença sob os nºs 54, 86 e 101, o Mmº Juiz a quo deixou de se pronunciar sobre questões que devia tomar conhecimento e que os fundamentos da matéria de facto estão em contradição com a decisão.
Vejamos se lhe assiste razão.
No que concerne a esta alegada contradição entre os fundamentos da matéria de facto e a decisão, o recorrente entende que a mesma reside na circunstância de nenhum dos agentes que depuseram como testemunhas, P… e O… terem presenciado a colheita de sangue nem terem acompanhado a instrução.
A nosso ver, nem seria necessário.
É que os documentos de fls. 247 a 255 do Pº nº 2031/08.3TBVLG e os de fls. 516 a 520 do Pº nº 1805/08TBVLG, comprovam a regularidade da colheita de sangue efectuada ao ora recorrente, que a mesma pertence a este e constitui o procedimento habitual em casos semelhantes.
De resto, a testemunha O…, então chefe da secção de acidentes que emitiu a documentação confirmou em audiência de julgamento que é esse o procedimento habitualmente adoptado em casos de acidentes de viação e confirmou a inexistência de qualquer irregularidade com a colheita efectuada que colocasse em causa a correspondência da colheita com a pessoa do ora recorrente.
Por outro lado, o recorrente sustenta que o Mmº Juiz a quo violou o disposto no artº 659º do CPC ao não fundamentar a decisão proferida quanto à velocidade nos pontos 87 e 104 dos factos provados na sentença.
Estes pontos da matéria de facto resultam das respostas dadas aos quesitos 109º do Pº nº 1805/08 e 19º do Pº nº 2031/08 respeitantes à velocidade do veículo do recorrente.
Porém, ao contrário do que sustenta o recorrente, entendemos que o Mmº Juiz a quo fundamentou suficientemente a sua convição sobre esta matéria, conforme a seguir se transcreve (cfr. fls. 1122):
“Atenta a dinâmica do acidente (diversos embates ao longo de mais de 50 metros da auto-estrada; ultrapassagem das guardas de segurança da auto-estrada; queda a uma estrada situada mais de 6 metros abaixo do nível da auto-estrada), com toda a segurança podemos afirmar que a velocidade que o veículo automóvel conduzido pelo autor D… não poderia seguir a velocidade inferior a 90 Km/h, e que seguiria seguramente a mais de 100 Km/h”.
Donde se infere que não ocorre qualquer omissão de fundamentação ou contradição entre os fundamentos de facto e a decisão, improcedendo, por isso, as correspondentes conclusões do recurso.

L) Impugnação da matéria de facto.

Começa o recorrente por questionar a resposta aos quesitos 100, 101 e 102 da BI do Pº nº 1805/08.0TBVLG, a que o Tribunal a quo respondeu “Não Provado” entendendo, contudo, o recorrente que a resposta aos mesmos deveria ter sido a de “Provado”.
Vejamos.
Quesito 100 – Naquele local da via ocorrem acidentes que se devem ao estado do piso da estrada, à acumulação de águas decorrente de deficiente drenagem da mesma e da curvatura e inclinação acentuada da estrada naquele local?
Quesito 101 – Na sequência da formação do lençol de água, decorrente de deficiente drenagem da estrada, o veículo do chamado perdeu a aderência e foi embater no separador da estrada por duas vezes e capotou?
Quesito 102 – Era impossível controlar o carro?
Para fundamentar a alteração das respostas, invoca o recorrente o depoimento da testemunha P….
Ora, esta testemunha, cabo da GNR não assistiu ao acidente, apenas foi chamado ao local, tendo elaborado a participação do acidente, pelo que o que relatou do acidente apenas tem a ver com possíveis suposições sobre o que terá acontecido.
Esta testemunha referiu que, a viatura terá saído na curva a direito, desconhecendo o motivo e onde ela ficou imobilizada foi por a mesma ter escorregado por cima dos rails, que estavam caídos de um outro acidente e que deduziu que a viatura ficou engatada por baixo, fez carril até bater no guarda corpos da ponte, que será o segundo embate e haverá um terceiro que é quando a viatura é projectada para fora da auto-estrada, para um caminho que passa em baixo. Referiu que o piso da estrada estava gasto e que era drenante e que a acumulação de águas no local do acidente era difícil, dado a curva ser inclinada.
Como se vê, esta testemunha apenas pôde fazer deduções sobre o modo como terá ocorrido o acidente.
Ora, sendo os factos que o recorrente quer ver dados como provados reportados ao momento que antecede o embate nos rails, ou seja, saber qual foi a causa do despiste não é seguramente com o depoimento desta testemunha que o recorrente o consegue, tanto mais que à maior parte da matéria quesitada, a testemunha respondeu precisamente de modo não afirmativo
Neste contexto, decide-se manter inalterável a resposta de “Não Provado” aos mencionados quesitos.

De seguida, o recorrente impugna a resposta dada aos quesitos 109 da BI do Pº nº 1805/08 e 19 da BI do Pº nº 2031/08.3TBVLG que dizem respeito à velocidade que o condutor imprimia à sua viatura na altura do acidente.
A resposta obtida foi que o veículo automóvel de matrícula ..-..-VN, no momento do acidente, seguramente circulava a mais de 100 Km/h.
Como se sabe esta questão da determinação da velocidade é de difícil determinação, dado um veículo ligeiro de passageiros não dispor de mecanismo para registar a velocidade no momento do acidente (tacógrafo) nem a mesma ter ficado registada por nenhum radar.
Assim, para a determinação da velocidade aproximada teremos de nos socorrer de outros elementos de prova (testemunhais), factos que foram presenciados no local e apelar às regras da lógica e da experiência comum.
Desde logo, teremos de ter em atenção ter ocorrido um despiste, circunstância confirmada pelo próprio condutor, não ter existido qualquer travagem, ter o veículo efectuado três embates numa extensão de 56,70 metros, ter colidido com o guarda corpos de proteção em betão e ainda com o muro de passagem inferior e bem assim que caiu para uma rua que passa a 6,7 metros abaixo da auto-estrada.
O Mmº Juiz a quo fundamentou da seguinte forma esta resposta respeitante à velocidade:
“Atenta a dinâmica do acidente (diversos embates ao longo de mais de 50 metros de auto-estrada; ultrapassagem das guardas de segurança da auto-estrada; queda a uma estrada situada a mais de 6 metros abaixo do nível da auto-estrada, com toda a segurança podemos afirmar que a velocidade que o veículo automóvel conduzido pelo autor D… não poderia seguir a velocidade inferior a 90 Km/h e que seguiria seguramente a mais de 100 Km/h – o que fundou a resposta aos pontos 83º e 109º da base instrutória do processo nº 1805/08.0TBVLG e 19º da base instrutória do processo nº 2031/08.3TBVLG”
Acresce que, não podemos esquecer que o autor na acção nº 1805/08.0TBVLG B… era passageiro do veículo e veio a juízo alegar que o veículo do recorrente, no qual seguia como passageiro, circulava a cerca de 140 Hm/h - (cfr. artº 10º da p.i.).
A testemunha P…, sobre esta concreta matéria da velocidade aludiu a uma hipotética velocidade de 60 Km/h. No entanto, não poderemos dar credibilidade a esta testemunha nesta concreta matéria da velocidade, porque não presenciou o veículo a circular. São novamente deduções que efectuou.
Por isso, decide-se novamente manter inalterável a resposta sobre a velocidade a que seguiria o veículo interveniente no acidente.

Por último, impugna o recorrente a resposta à matéria dos quesitos 51, 78, 106 e 108 da BI do Pº nº 1805/080TBVLG e 15, 25, 26 e 27 da BI do Pº nº 2031/08.3TBVLG.
Tal matéria respeita à questão da TAS do ora recorrente.
Por um lado, o recorrente pretende que seja dado como não provado o facto de o autor apresentar uma TAS de 0,63 g/l (resposta afirmativa aos quesitos 51 da BI do Pº nº 1805/08 e 15 da BI do Pº nº 2031/08) e, o facto de o selo do relatório do INML corresponder ao selo da colheita efectuada ao A. e de o sangue analisado pertencer ao autor (resposta afirmativa aos quesitos 106 e 108 da BI do Pº nº 1805/08).
Por outro lado, o recorrente pretende que seja dado como provado o facto de não ter sido dada possibilidade ao autor de verificar e confirmar a autenticidade do selo da colheita (resposta negativa ao quesito 27 da BI do Pº nº 2031/08) e, o facto de o INML não ter remetido o relatório pericial nos oito dias após a colheita (resposta negativa ao quesito 78 da Bi do Pº nº 1805/08 e 25 da BI do Pº nº 2031/08).
Sustenta o recorrente que, pelo facto de a testemunha J… ter respondido que não assistiu à colheita de sangue ao autor no hospital, não ter verificado o selo do kit e desconhecer se o autor foi informado do tipo de exame, se deveria ter dado resposta de “Não Provado” a essa matéria ao contrário do que fez o Tribunal a quo.
No entanto, in casu, nesta matéria de pouco ou nada valem os depoimentos testemunhais porque não presenciais, dado existirem documentos autênticos que atestam a mesma.
De facto, colhe-se de fls. 513 e segs. que houve colheita de sangue ao autor, condutor do veículo interveniente no acidente, não só para determinação de TAS mas também para substâncias psicotrópicas.
Colhe-se igualmente do relatório do INML constante de fls. 517 que, a amostra de sangue com o selo nº …… revelou uma TAS de 0,63 g/l. Esse nº do selo corresponde ao nº que consta do registo de colheita de sangue referente ao autor, ora recorrente (cfr. fls. 520).
E, foi precisamente com base no relatório do INML de fls. 517 que foi redigido o aditamento de fls. 518 ao auto de participação policial, como veio a confirmar a testemunha P… no depoimento que prestou em audiência de julgamento.
Isto quer dizer que não é pelo facto de a testemunha P… não ter presenciado a colheita de sangue ao autor e de se ter assegurado de que o sangue colhido correspondia ao selo aposto no recipiente de colheita que essa correspondência não deixa de ser verdadeira.
Por isso não tendo o autor alegado e muito menos provado que se opôs à recolha de sangue, não podemos deixar de a considerar como correspondente ao sangue do autor, ora recorrente, tanto mais que em casos de acidentes de viação tem vindo a ser considerado que não é exigível o consentimento expresso do interveniente para a recolha [neste sentido, vide entre outros, porque é o mais recente, o ac. do TRP de 21/03/2013 (relator Rodrigues Pires), consultável em www.dgsi.pt, também citado nas contra-alegações apresentadas pela recorrida].
Donde se conclui que, mesmo que o autor não tivesse dado o seu consentimento expresso para a referida colheita, nem mesmo assim a mesma deixava de ser válida.
Por outro lado, como não poderá a mesma ser considerada válida se não ficou demonstrada qualquer irregularidade na colheita de sangue ou na sua correspondência com o selo correspondente?
A resposta é óbvia.
Relativamente à questão das datas de remessa do exame do INML à autoridade policial, alega o recorrente que se deveria dar como provado que não foi remetido à autoridade policial nos oito dias após a colheita.
Ora, de fls. 517 extrai-se que, em 24/05/2005 o relatório do exame toxicológico já estava efectuado, ou seja oito dias após a colheita.
Todavia, não se apurou qual a data em que foi remetido ou recebido tal exame na autoridade policial competente, razão mais que suficiente para que o Mmº Juiz a quo não pudesse dar como provado que o relatório não foi remetido nos oito dias seguintes à colheita.
De resto, os depoimentos dos agentes da autoridade nada adiantam a este respeito, porque não presenciaram a colheita de sangue.
Quanto à prova de TAS do autor à data do acidente, remete-se para tudo quanto já foi dito anteriormente pelo que aqui nos dispensamos de repetir tal argumentação.
Os agentes de autoridade acabaram por confirmar, confrontados em audiência de julgamento com os documentos de fls.513 e segs, a regularidade e normalidade da documentação, com a ressalva que nenhum deles acompanhou a diligência de colheita de sangue, pois foi assegurada pela patrulha que se deslocou ao hospital.
É assim por demais evidente que os depoimentos das testemunhas P… e O…, não podiam sustentar a pretendida alteração das respostas aos quesitos supra dados como não provados.
Nestes termos, decide-se manter inalteráveis as respostas dadas pelo Tribunal a quo também quanto a esta concreta matéria de facto impugnada.
Improcedem, assim, in totum, as conclusões do recurso do interveniente.

A apelação do recorrente, cingiu-se à impugnação da decisão quanto à matéria de facto, conformando-se no demais, com a aplicação do direito aos factos efectuada na sentença, a qual se mantem na parte pertinente.

V – DECISÃO

Pelo exposto, acordam os Juízes que constituem este Tribunal da Relação do Porto, em julgar:
1. Procedente o recurso de apelação interposto pelo autor B… e, consequentemente, revogar o teor do ponto II da parte dispositiva da sentença recorrida, o qual se substitui por outro, nos seguintes moldes:
- “Julga-se procedente o pedido formulado pelo A. B… contra o chamado D… no montante que, em sede de ulterior incidente de liquidação venha a apurar-se ser superior ao valor limite máximo de seguro obrigatório previsto na Lei (600.000,00), sempre após a verificação das condições descritas em I do dispositivo desta decisão”.
2. Parcialmente procedente o recurso de apelação da ré Companhia de Seguros C…, SA e, em consequência, revogar o teor do ponto I da sentença recorrida, o qual se substitui por outro nos seguintes moldes:
- “Julga-se parcialmente procedente o pedido formulado pelo autor B…, e, em consequência, condena-se a ré “Companhia de Seguros C…, SA”, a pagar àquele quantia, a liquidar em decisão ulterior, a título de indemnização pelos danos patrimoniais e não patrimoniais referidos nos pontos 13-, 15-, 16-, 17-, 18-, 19-, 20-, 21-, 22-, 28-, 29-, 30-, 31-, 32-, 33-, 34-, 36-, 37-, 44-, 45-, 46-, 50-, 58-, 61-, 62-, e 63- da matéria de facto nestes autos provada, quantia reduzida de 25% e de seguida deduzida da quantia global de € 130.701,00, acrescida dos valores mensais que esta venha a liquidar no apenso após 06/05/2013, não podendo exceder o total das quantias pagas e a pagar, o limite máximo de € 600.000,00”.
3. Julgar totalmente improcedente o recurso de apelação do interveniente D… e, em consequência, confirmar na parte pertinente a sentença recorrida.

Custas:
- apelação de B…, a pagar pelo interveniente principal na proporção do respectivo decaimento e a serem concretizadas após o incidente de liquidação de sentença.
- apelação da ré seguradora, a pagar pelo autor e pela ré na proporção do respectivo decaimento e a serem concretizadas após o incidente de liquidação de sentença.
- apelação do interveniente principal, a pagar pelo D….

(Processado por computador e integralmente revisto pela Relatora)

Porto, 30/06/2014
Maria José Simões
Abílio Costa
Augusto de Carvalho