Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
554/09.6TVPRT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: MANUEL DOMINGOS FERNANDES
Descritores: CONTRATO DE ADMINISTRAÇÃO
DESTITUIÇÃO
JUSTA CAUSA
ÓNUS DA PROVA
INDEMNIZAÇÃO
DANOS
Nº do Documento: RP20160111554/09.6TVPRT.P1
Data do Acordão: 01/11/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 615, FLS.41-82)
Área Temática: .
Sumário: I - Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II - A relação de administração assume natureza contratual, mesmo nos casos em que, por imposição legal ou estatutária, a escolha dos titulares da gestão ou de algum deles não é feita pelo colectivo dos sócios.
III - A acção destinada a obter a indemnização a que um gerente destituído se julga com direito invocando a inexistência de justa causa, é uma acção condenatória que comporta uma apreciação negativa acerca dessa inexistência, pelo que, face ao disposto no artigo 343º do Código Civil, compete à sociedade a invocação e prova dos factos que fundamentam o afastamento compulsivo do gerente.
IV - É em concreto, e objectivamente, que se afere se a conduta imputada ao gerente constitui motivo de destituição com justa causa, isto é, se o facto ou situação imputados prejudicam de tal modo o interesse social que impõem a ruptura do vínculo, se afrontam a actuação de um gestor criterioso e ordenado, em benefício do interesse social e tendo em conta o interesse dos sócios.
V - A justa causa de destituição dos gerentes, administradores e directores não tem, necessariamente, que traduzir-se num comportamento culposo àqueles imputável, ainda que este também a possa determinar, aliás, por assim ser é que a incapacidade por impedimento físico justifica a destituição (artigos 257.º, nº 6 e 403.º, nº 4 do CSComerciais).
VI - A indemnização quando a destituição seja sem justa causa não é uma consequência automática desta, por isso se tem julgado que o direito de indemnização implica forçosamente a comprovada existência de danos, exigindo-se a demonstração de factos reveladores de que a situação real do lesado é, após a destituição, mais gravosa do que aquela em que se encontraria sem ela.
VII - O simples cômputo das remunerações e prémios que, não fora a destituição, seriam auferidas até ao termo do mandato do administrador, é insuficiente para caracterizar danos passíveis de serem objecto de indemnização devida.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo nº 554/09.6TVPRT.P1-Apelação
Origem: Varas Cíveis do Porto-2ª Vara Cível
Relator: Manuel Fernandes
1º Adjunto Des. Rita Romeira
2º Adjunto Des. Caimoto Jácome
Sumário:
I- Na reapreciação da prova a Relação goza da mesma amplitude de poderes da 1.ª instância e, tendo como desiderato garantir um segundo grau de jurisdição relativamente à matéria de facto impugnada, deve formar a sua própria convicção.
II- A relação de administração assume natureza contratual, mesmo nos casos em que, por imposição legal ou estatutária, a escolha dos titulares da gestão ou de algum deles não é feita pelo colectivo dos sócios.
III- A acção destinada a obter a indemnização a que um gerente destituído se julga com direito invocando a inexistência de justa causa, é uma acção condenatória que comporta uma apreciação negativa acerca dessa inexistência, pelo que, face ao disposto no artigo 343º do Código Civil, compete à sociedade a invocação e prova dos factos que fundamentam o afastamento compulsivo do gerente.
IV- É em concreto, e objectivamente, que se afere se a conduta imputada ao gerente constitui motivo de destituição com justa causa, isto é, se o facto ou situação imputados prejudicam de tal modo o interesse social que impõem a ruptura do vínculo, se afrontam a actuação de um gestor criterioso e ordenado, em benefício do interesse social e tendo em conta o interesse dos sócios.
V- A justa causa de destituição dos gerentes, administradores e directores não tem, necessariamente, que traduzir-se num comportamento culposo àqueles imputável, ainda que este também a possa determinar, aliás, por assim ser é que a incapacidade por impedimento físico justifica a destituição (artigos 257.º, nº 6 e 403.º, nº 4 do CSComerciais).
VI- A indemnização quando a destituição seja sem justa causa não é uma consequência automática desta, por isso se tem julgado que o direito de indemnização implica forçosamente a comprovada existência de danos, exigindo-se a demonstração de factos reveladores de que a situação real do lesado é, após a destituição, mais gravosa do que aquela em que se encontraria sem ela.
VII- O simples cômputo das remunerações e prémios que, não fora a destituição, seriam auferidas até ao termo do mandato do administrador, é insuficiente para caracterizar danos passíveis de serem objecto de indemnização devida.
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I-RELATÓRIO

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

B…, residente na Rua …, …, …, Coimbra, veio instaurar a presente acção, inicialmente sob a forma ordinária, contra C…, S.A., C1…, S.A., ambas com sede na Rua …, …, Porto, D…, S.A., com sede na Rua …, .., ...º, Lisboa, e E…, S.A., com sede na Av.ª …, …, Porto, pedindo que:
- se considere que a destituição do A. pela Ré C… ocorreu sem justa causa;
- se condene a Ré C… a pagar ao A. a quantia de € 441.428,52, relativa à indemnização pelos danos sofridos nos termos previstos pelo Contrato de Administração;
- se condene as RR. a pagar ao A. a quantia de € 163.200,00 relativa ao prémio anual de 2008 previsto na Side Letter;
- se condene as RR. a pagar ao A. o prémio anual de 2009 (proporcional) previsto na Side Letter, a liquidar em execução de sentença;
- se condene as RR. no pagamento dos juros sobre as quantias referidas, à taxa legal, desde 10.03.2009, até efectivo ou integral pagamento, e que, até ao presente momento, liquida em € 5.234,54;
- se condene as 2ª, 3ª e 4ª RR. a pagar ao A. o valor previsto no Contrato de Ratchet, a liquidar em execução de sentença;
- se condene as 2ª, 3ª e 4ª RR. no pagamento dos juros, à taxa legal, também sobre esse montante desde a data da alienação destas RR. na Ré C…, e até efectivo ou integral pagamento;
- se condene as RR. a pagar ao A. a quantia de € 25000,00 a título de danos morais, acrescida de juros, à taxa legal, desde a data da citação e até efectivo ou integral pagamento.
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Alega, em suma, que a requerida C…, enquanto sociedade cuja actividade consiste na aquisição e gestão de participações de outras sociedades de torrefacção, comercialização e distribuição de cafés, foi constituída com o objectivo de congregar, por intermédio de múltiplas aquisições, numa única organização (a C…), uma série de pequenos intervenientes no mercado dos cafés até alcançar uma fatia significativa do mercado e, atingido esse objectivo, vender a Ré C…, e que, por sua vez, as restantes Rés são as suas únicas accionistas.
Refere, ainda, que, no âmbito da sua actividade a Ré C… necessitou de contratar um administrador, responsável por toda a sua actividade operacional, pelo que, para esse efeito, contactou o A. tendo ambos celebrado, em 12.12.2007, um contrato denominado de “contrato de administração”, passando, assim, por essa via, o A. a integrar o conselho de administração daquela, mais subscrevendo um complemento ao contrato referido, no qual foi atribuído ao A. o direito a receber parte das mais-valias que aquelas RR. receberiam pela venda das suas participações na Ré C…, conforme estava por elas planeado, que denominaram de “Contrato de Ratchet”.
Por outro lado, invoca que foi ainda celebrado entre A. e Rés um acordo anexo ao contrato de administração celebrado, denominado de side letter, onde eram previstas algumas regalias e prémios para o A., sendo, entre outros benefícios, atribuído ao A. um prémio anual, caso atingisse uma determinada percentagem dos objectivos estabelecidos.
Prémio esse que, alega, consiste no pagamento de um montante variável, indexado à percentagem de cumprimento do rendimento bruto (EBITDA) da requerida C…, e relativo ao montante que auferia anualmente.
Menciona também que, ao longo do tempo em que esteve na administração da Requerida C…, foi cumprindo as suas funções e tarefas com zelo, diligência e com a competência que a sua experiência profissional lhe conferia, nada justificando a sua destituição, por acta da Assembleia Geral da Ré C… de 10.03.2009, comunicada por carta de 11.3.2009, apenas querendo e visando afastar o A. da sua função sem suportarem os encargos, o que os constituiu, segundo invoca, na obrigação de o indemnizarem pelos prejuízos para si decorrentes dessa destituição ilícita, ou seja, nomeadamente:
- pela indemnização prevista na cl.ª 5.ª do dito contrato de administração, no valor de € 441.428,52;
- pelo prémio pelo cumprimento dos objectivos referente ao ano de 2008, constante da side letter , no montante de € 163.200,00;
- pelo prémio pelo cumprimento dos objectivos referente ao ano de 2009, constante da side letter , determinável aquando da aprovação de contas de 2009; e
- pelo valor atribuído ao Rachet, correspondente a uma percentagem pelas mais valias recebidas pelas 2.ª, 3.ª e 4.ª RR. aquando da venda das suas participações na requerida C…, só determinável nessa altura, e a quantia não inferior a € 25.000,00, a título de danos morais.
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Citadas previamente, as Rés, vieram contestar, arguindo, para além da ilegitimidade da Ré E…, a inexistência de qualquer dos direitos invocados, por considerar que, relativamente ao denominado contrato de administração, em que é parte a Ré C…, a indemnização prevista na sua cl.ª 5.ª, apenas seria devida em caso de renúncia com justa causa ou de destituição sem justa causa, pelo que, tendo-se alegadamente verificado uma conduta do autor consubstanciadora de uma violação grave e reiterada dos seus deveres de administrador e uma inaptidão para o exercício normal das respectivas funções, com prejuízos económicos e financeiros nas sociedades em que a referida demandada é a única accionista, directa ou indirectamente, conclui pela existência de justa causa para a destituição do direito e, assim, pela inexistência de qualquer direito seu a qualquer indemnização a tal título.
Nessa conformidade, invoca que o A. nunca teria direito a mais do que as remunerações que lhe seriam pagas entre Março e Dezembro de 2009, na medida em que foi eleito para o triénio 2007/2009, terminando o mandato a 31.12.09, e recebeu as remunerações mensais e subsídios vencidos entre 7.1.08 e 2.3.09.
No que respeita à side letter, refere que o compromisso de pagamento do prémio anual aí referido só existiria se e enquanto se mantivesse o vínculo de administração, pelo que, tendo sido destituído, extinguiu-se o vínculo de administração e, assim, o seu direito a qualquer prémio anual, para além de, igualmente considerarem que, de qualquer das formas, nunca o mesmo ser devido, por não cumpridos os mencionados objectivos de EBITDA e de cobranças.
Quanto ao contrato de ratchet, de que a Ré C… não é parte, invocam que o direito ao ratchet só se constitui com a alienação por cada das accionistas da respectiva participação, o que diz não se ter verificado, e depender de, no momento da alienação da participação por uma ou mais das accionistas, o A. ainda ser administrador da C…, pelo que, no momento em que essa alienação ocorrer, o A. não será já o administrador da C…, assim nunca se constituindo esse direito na sua esfera jurídica.
Relativamente à matéria factual articulada pelo A., as Rés vieram impugná-la, pedindo a absolvição da instância da Ré E…, por ilegítima, e, a final, a improcedência da acção, com a consequente absolvição das Rés do pedido.
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Replicou o A., pronunciando-se quanto à excepção de ilegitimidade invocada, pugnando pela sua improcedência e pela procedência da acção, mantendo o peticionado, em suma, referindo que o EBITDA só pode ser elaborado com todas as participadas da C…, a partir do momento em que foram adquiridas, e o Business Plan só pode ser considerado como válido considerando como ano em que efectivamente a F… e a G… foram adquiridas, defendendo que os objectivos propostos no Business Plan deviam ser corrigidos, considerando a realidade do mercado e a actividade das próprias participadas, nomeadamente a perda do seu principal cliente por motivos alheios ao trabalho do A., pelo que, conclui, não se verificar justa causa de destituição e, assim, o direito do A. à indemnização, face à destituição ilícita e ilegal do A., porque sem justa causa, que lhe confere o direito a ser ressarcido das remunerações referidas pelas Rés, bem como o direito ao prémio previsto na side letter resultante dos objectivos do EBITDA durante a vigência do seu mandato, ou seja, dos créditos vencidos durante o período em que se encontrava em exercício de funções e não em momento posterior, e, ainda, ao prémio resultante do contrato de ratchet, do qual, a assim não se entender, o A. se veria espoliado pela conduta ilícita das Rés, para além dos prejuízos sofridos com a sua conduta.
Para o caso de procedência da excepção de ilegitimidade arguida, o A. veio, a fls. 124, do p.p., requerer a citação da Ré E…, na qualidade de legal representante dos E1… e E2…, enquanto SCR administradora destes.
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Citada a E…, na qualidade de legal representante dos E1… e E2…, vieram estes apresentar o seu articulado a fls. 221, do p.p., declarando, nos termos e para os fins do disto no anterior art.n 327.º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil, fazerem seu o articulado das Rés.
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Em sede de despacho saneador, foi a Ré E… considerada parte ilegítima, dado que se considerou não ter a mesma actuado por si e no seu interesse, mas sim em representação dos fundos e, assim, face ao incidente de intervenção deduzido, de chamamento dos referidos Fundos, aqui representados pela dita Ré E…, ultrapassada a excepção de legitimidade arguida e que ao tribunal, mesmo oficiosamente, cumpria acautelar, ou seja, reconheceu-se a ilegitimidade dessa demandada, por si, em seu nome próprio.
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Procedeu-se a julgamento com observância das formalidades legais, como da respectiva acta consta.
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A final foi proferida sentença que julgou improcedente, por não provada, a acção e consequentemente absolveu as Rés do pedido.
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Não se conformando com o assim decidido veio o Autor interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte:
1. Conforme resulta do ponto 24 da sentença, o Recorrente foi destituído em 10.03.2009 do seu cargo de CEO da Recorrida C… pelos seguintes fundamentos:
- incumprimento dos objectivos, de acordo com a “análise de contas”;
- gastos excessivos em investimentos nos pontos de venda;
- prática de descontos não autorizados;
- perda dos clientes da H… e efeitos da perda desse distribuidor;
- não realização de reuniões de coordenação;
- cedência de uma marca detida pela F… a uma concorrente;
- não elaboração de um plano de integração; e
- atraso na venda dos imóveis e equipamentos pertencentes à F….
2. Deve considerar-se justa causa de destituição o comportamento culposo desde que, pela sua gravidade e consequências, torne praticamente impossível a sua manutenção em funções, conforme refere António Menezes Cordeiro (in Direito das Sociedades, Tomo I, pág. 950): “A noção mais laboral”–portanto mais restritiva, que tem, na lei, uma base susceptível de alargamento, merece ser acolhida. Além do exposto, há boas razões de fundo para dispensar, aos administradores das sociedades, uma certa protecção semelhante à que a lei concede aos trabalhadores subordinados. Não pode ter a mesma intensidade, sob pena de subverter a própria lógica intrínseca do Direito societário; mas sempre será alguma: a total desprotecção dos administradores iria repercutir-se no seu profissionalismo, com danos para a própria sociedade. É sintomático, alias, que a experiência alemã tenha sido a primeira a trilhar essa via. A jurisprudência portuguesa surge, maioritariamente, sensível a este ponto, sobretudo a nível do Supremo.”.
3. Conforme as palavras de Coutinho de Abreu “Pedindo judicialmente um administrador destituído indemnização, pertence a ele alegar e provar a inexistência de justa causa? Ou incumbe à sociedade, como contestante do pedido, alegar e provar situação que consubstancie justa causa e exclua a indemnização? Parece mas razoável a segunda alternativa (cfr. artº 342º. 2 do CCiv).”–Código das Sociedades Comerciais em Comentário, vol. VI, Almedina, pág. 389.
4. Pelo que competia às Recorridas provar o comportamento culposo do Recorrente consubstanciador dos fundamentos de justa causa de destituição que invocam.
5. Os objectivos a que o Recorrente se obrigou foi um rácio de 55% do rácio “EBITDA objectivo do Plano de Negócios (Acquisition Finance)/EBITDA Real da Recorrida C…”.
6. Para os objectivos do Plano de Negócios (Acquisition Finance) serem concretizáveis era necessário o cumprimento dos seus pressupostos.
7. Da prova constante dos autos e explicitadas na motivação destas alegações resulta que ao quesito 6º seja dada a resposta de “Provado apenas que para o Plano de Negócios ser cumprido, as aquisições referidas em P) teriam que estar finalizadas em finais de 2006/inícios de 2007, por forma a dar cumprimento às previsões para 2007 que o contrato de administração refere na cláusula 5ª do contrato referido em C).”.
8. Aquela mesma prova obriga ainda a que ao quesito 7º deveria ter sido dada a resposta de “Provado apenas que os pressupostos em que o Plano de Negócios se baseou só se cumpriram pelo menos seis meses depois da data prevista”.
9. Os pressupostos do Plano de Negócios, constante do documento denominado Acquisition Finance, além do já referido em 7. destas Conclusões, eram:
a) a aquisição da G…, da F…, de mais um interveniente no sector (a I…/J…) e de uma carteira de clientes de uma marca de referência nosector (a K…) (pág. 2);
b) a aquisição da F… por € 12.500.000,00–pág. 3;
c) a aquisição da G… por € 9.000.000,00–pág. 3;
d) a integração das duas unidades de torrefacção (da F… e da G… pois o terceiro interveniente não a tinha) numa só unidade em 2007 (pág. 23 e 28);
e) a extinção da sociedade M…–pág. 23;
f) a redução do pessoal em 2007–págs. 24 e 26;
g) a constituição de um fundo de maneiro nos termos da pág. 27;
h) a amortização dos suprimentos realizados pelo Sr. L… na G… (€ 286000,00) em 2007 com a transacção (pág. 29);
i) a amortização dos suprimentos existentes na F… e na M… (€ 332000,00) com a transacção–pág. 29;
j) a manutenção do nível de endividamento da G… e da K… (€ 2400000,00)–pág. 29;
k) um superavit de tesouraria em 2007 e 2008–pág. 29;
l) a fusão das empresas (pág. 3);
m) o crescimento das vendas em 2007 de 12,6%-pág. 28;
n) a actualização do preço médio de venda dos produtos G… em 4%-pág. 23.
10. Os pressupostos das alíneas a), b) e c) eram condição sine qua non das restantes.
11. Os pressupostos das alíneas a), b) e c) da conclusão 9. eram da exclusiva responsabilidade das Rés, que os não cumpriram.
12. Pelo que não era possível cumprir o Plano de Negócios (Acquisition Finance) sem alterações, sendo os objectivos dele constantes, sem correcção, inexigíveis pelas Recorridas, porquanto foram estas que incumpriram.
13. Para a determinação do EBITDA Real da Recorrida C… contribuem todas as participadas daquela SGPS, nomeadamente as sociedades M… e J…/I….
14. A J… deve constar do EBITDA Real da C… para efeitos do cumprimento dos objectivos porque:
- a sua aquisição estava prevista no Acquisition Finance;
- sem a inclusão daquela sociedade, os objectivos do EBITDA são impossíveis de atingir;
- o trabalho realizado pelo Recorrente incluía todas as participadas da Recorrida C… pelo que a J… também reflecte o seu trabalho.
15. A análise de contas constante da Acta da Assembleia Geral (AG) da C… não reflecte a situação económica e financeira da sociedade porque:
- não inclui as sociedades M… e J…;
- aquela análise tem diferenças entre valores apresentados “e as demonstrações financeiras apresentadas pelas Empresas nos Relatórios e Contas de 2008 em 29 de Julho de 2009 (auditados)” – fls. 26 do Relatório Pericial;
- aquela análise não constituía as demonstrações financeiras apresentadas pelas Empresas nos Relatórios e Contas de 2008 em 29 de Julho de 2009 (auditados), que seriam os valores que permitiriam a justa causa de destituição, pois o EBITDA Real teria que resultar destes Relatórios e Contas – ponto 22 dos factos provados na sentença;
- aquela análise foi feita quatro meses antes do final do primeiro ano de Administração do Recorrente das sociedades F… e G…, face ao atraso de seis meses naquelas aquisições, da responsabilidade exclusiva das Recorridas.
16. Assim sendo, como é, o EBITDA Real da Recorrida C… é de € 3.671.232,00 conforme resulta do relatório pericial, sendo o rácio de cumprimento mínimo dos objectivos a que o Recorrente se obrigou de 91%, inexistindo assim justa causa de destituição.
17. Pelo que ao quesito 9º deveria ter sido dada a resposta de “Provado que o Recorrente obteve um rácio mínimo de cumprimento de EBITDA de pelo menos 91%”.
18. Na sentença, o Tribunal entendeu privilegiar a dicotomia “provado/não provado”, nos quesitos pertencentes às Recorridas, em todos os momentos em que tal era possível, foram dados como parcialmente provados os respectivos quesitos.
19. Tal diferença nos critérios de reposta, apenas negativa nos factos quesitados invocados pelo Recorrente, quando prova existe que justifique uma resposta restritiva ou explicativa, dada nos factos quesitados invocados pelas RR., é constatável no confronto entre os quesitos 4º, 6º, 7º, 8º, 9º, 11º, 12º, 13º, 15º, 16º, 19º, 21º, 22º, 23º, 24º, 48º e 49º (todos referentes a matéria de facto alegada pelo Recorrente) e os quesitos 51º, 52º, 56º, 57º, 58º, 59º e 72º, entre outros.
20. As respostas aos quesitos 4º e 72º são contraditórias entre si.
21. Da prova produzida resulta inequivocamente que a Recorrida C… tinha dificuldades de tesouraria resultantes do elevado preço das aquisições das participadas F… e G…, muito superior ao previsto no Acquisition Finance (o Plano de Negócios da Recorrida C…).
22. O Tribunal a quo não teve em consideração a totalidade da prova produzida, nomeadamente a prova documental e os esclarecimentos à prova pericial, apesar de, como consta da fundamentação, aceitou como verdadeiros, violando assim o artº 607º, nº 4 do CPC.
23. A prova constante dos autos e explicitada nestas alegações, obriga, salvo o devido respeito, a que os quesitos 2, 3, 4, 8, 10, 11, 12, 13, 14, 15, 16, 17, 18, 19, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28, 29, 30, 32, 33, 36, 43, 47, 48 e 49 da Base Instrutória constante dos autos tivessem como resposta “Provado”.
24. E a resposta ao quesito 37º deveria ser corrigida, para “Provado que o investimento da Recorrida C… junto deste cliente é de € 31239,76 (sem IVA), e não os € 72.105,00 que constam da acta referida em X),”.
25. Também por causa da prova constante dos autos, e da regra respeitante ao ónus de prova, aos quesitos 50, 51, 52, 53, 56, 57, 58, 59, 61, 69, 72, 78, 79, 81, 82, 84, 85, 86 e 88 da Base Instrutória devem ser julgados “Não provados”.
26. Da alteração das respostas aos referidos quesitos, impostas pela prova produzida nos autos, resulta que nenhum dos fundamentos invocados pelas Rés como justa causa de destituição existiu.
27. Tendo o Tribunal a quo, na sua sentença, violado os artºs 275º, 277º e também o artº 762º, nº 2 do Código Civil.
28. Fez ainda incorrecta interpretação ou aplicação do artº 403º, nº 4 do Código das Sociedades Comerciais, violando-o.
29. Ao apreciar a matéria como fez, conforme consta da matéria de facto dada como provada na sentença, o Tribunal a quo fez ainda incorrecta aplicação do ónus de prova, violando o artº 342º, nº 2 do CCivil.
30. A inexistência de justa causa de destituição implica o pagamento de uma indemnização pelas Recorridas ao Recorrente–artº 403º, nº 5 do Código das Sociedades Comerciais.
31. Essa indemnização, quando é colocada em causa a competência do administrador, é correspondente às retribuições e prémios devidos até ao fim do contrato, bem como a indemnização pelos danos morais resultantes da imputação dessa conduta sem justificação–nesse sentido, cfr. Paulo Olavo Cunha, Direito das Sociedades Comerciais, Almedina, Coimbra, págs. 753-754.
32. Com a alteração das respostas, estão integralmente provados os danos materiais e morais sofridos pelo Recorrente.
33. Face ao exposto, deve a sentença recorrida ser revogada e proferido Acórdão que julgue a acção totalmente provada e procedente.
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Devidamente notificadas as Rés contra-alegaram concluindo pelo não provimento do recurso, solicitando ainda nos termos do artigo 636.º a sua ampliação.
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Corridos os vistos legais cumpre decidir.
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II- FUNDAMENTOS
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.
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No seguimento desta orientação são as seguintes as questões que importa apreciar e decidir:
a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.
b)- decidir em conformidade face à alteração, ou não, da matéria factual e, mesmo não se alterando esta, se a subsunção jurídica se encontra correctamente feita.
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A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO

É a seguinte a matéria de facto que vem dada como provado pelo tribunal recorrido:
1-A Ré C…, S.A. é uma sociedade que tem por objecto a gestão de participações sociais noutra sociedade, como forma indirecta de exercício de actividades económicas–cfr. doc. de fls. 40, da providência apensa, aqui dado por reproduzido–al. A), da matéria de facto assente;
2-No âmbito da sua actividade, a Ré C… necessitou de contratar um administrador, responsável por toda a sua actividade operacional, tendo, para o efeito, apresentado ao A. o Plano de Negócios da Ré C…, contendo, em pormenor, os principais alvos de aquisição por parte desta, bem como a previsão da evolução dos negócios e resultados financeiros da mesma, ano por ano, ou seja, o planeamento de como iriam atingir os objectivos pretendidos–cfr. doc. de fls. 45 a 77, da providência apensa, aqui dado por reproduzido–al. B), da matéria de facto assente;
3-Após os esclarecimentos recíprocos, A. e Ré C… celebraram, em 12.12.2007, o contrato denominado de “contrato de administração”, passando o A. a integrar o conselho de administração daquela–cfr. doc. de fls.78, da providência apensa, aqui dado por reproduzido–al. C), da matéria de facto assente;
4-Por documento igualmente datado de 12.12.07, denominado como “side letter”, com referência ao contrato referido em C), a 1.ª Ré obrigou-se a conceder ao A., para além de outros benefícios, o direito a um prémio entre 70% a 150% do VAB, indexado ao cumprimento entre 85% a 120% do Business Plan (para 2008 e na proporção dos meses efectivos de serviço) e do orçamento anual (para os anos seguintes), calculado com base nos pressupostos aí definidos, concretamente:
“(i) A % de cumprimento dos objectivos calculada para o rácio real/objectivo do objectivo do EBITDA; e
(ii) O % do prémio, a partir do exercício de 2008, ponderado pelo cumprimento dos objectivos de cobranças nos termos aqui dados por reproduzidos–cfr. doc. de fls.271 a 274, da providência apensa, aqui dado por integralmente reproduzido–al. D), da matéria de facto assente;
5-Mais se consignou, nesse documento, que os compromissos dele decorrentes só seriam válidos pelo tempo que se mantivesse o contrato de administração–al. E), da matéria de facto assente;
6-Por sua vez, com data de 25.01.09, foi celebrado um outro contrato entre A., 2.ª, 3.ª Rés e E…, S.A., em nome e representação das intervenientes E1… e E2…, como accionistas da 1.ª Ré, em que estas acordaram atribuir ao A. o direito a participar nas mais valias que cada um deles viesse a realizar com a alienação, por cada um deles, da totalidade da participação respectivamente detida no capital social da 1.ª Ré, cabendo ao A. o direito a receber de cada um dos accionistas vendedores, na proporção da sua participação na 1.ª Ré, o valor bruto correspondente a 40% do split das mais valias registadas numa tal alienação por cada um dos accionistas de acordo com os princípios definidos nas alíneas da cl.ª 1.º desse acordo e desde que as mesmas excedam uma rentabilidade anual equivalente a 15% sobre o investimento por aqueles efectuado e o encaixe resultante da venda seja, no mínimo, igual ou superior, ao dobro do investimento–al. F), da matéria de facto assente;
7-Como forma alternativa de pagar o valor do ‘Ratchet’ aludido no acordo referido em F), ficou estipulado no ponto 2, da sua cl.ª 1.ª, que “…os accionistas poderão optar por alienar ao primeiro contraente que aceita comprar, pelo preço simbólico de € 1 (um euro) acções representativas do capital social da C…, com a obrigação de que as mesmas serão por estes alienadas a quem os accionistas indicarem a um preço igual àquele que receberiam se o ‘Ratchet’ fosse pago em numerário”–al. G), da matéria de facto assente;
8- Mais se consignou no ponto 5, da cl.ª 1.ª, que o direito a receber o ‘Racchet’ se vence apenas após a verificação da efectiva alienação da totalidade da participação detida por cada um dos accionistas e do integral recebimento do preço correspondente a essa alienação, extinguindo-se em 31.12.2012, desde que o A., no momento em que tal alienação ocorra, se mantenha no exercício de funções para as quais foi designado–al. H), da matéria de facto assente;
9- O A. foi eleito em reunião de Assembleia Geral de 7 de Janeiro de 2008, com término do mandato em Dezembro de 2009, ficando acordado que o A. seria o Presidente da Comissão Executiva do grupo, sendo o responsável pela coordenação, acompanhamento e controlo de toda a actividade operacional, incluindo actividade comercial, produção, qualidade e marketing, devendo ainda assegurar a execução das deliberações do Conselho de Administração que lhe fossem delegadas e as deliberações do órgão a que pertencia–al. I), da matéria de facto assente;
10- Com data de 2009.02.05, a C… remeteu ao A. uma carta com o conteúdo seguinte:
“1. Como é do seu conhecimento, em 12 de Dezembro de 2007 celebrou com a “C…, SA” (doravante C…) um contrato de administração, no âmbito do qual, entre outros, ficou acordado que aceitaria desempenhar o cargo de membro do Conselho de Administração desta sociedade.
2. Ficou, igualmente, acordado no n.º 3 da Cláusula Quinta do referido contrato de administração que “caso ao longo do exercício do primeiro mandato os objectivos estabelecidos de acordo com o Business Plan para 2008 e do Orçamento Anual para os anos seguintes não se encontrem cumpridos em pelo menos 55%, anualmente, o Segundo Contraente obriga-se a apresentar a sua renúncia ao cargo, sem que lhe assista o direito a qualquer indemnização ou compensação pelo período de tempo do mandato não efectivamente exercido”. A % de cumprimento destes objectivos é calculada pelo rácio real/objectivo de EBITDA.
3. Ora, no Business Plan para 2008 encontra-se como objectivo um rácio real/objectivo de EBITDA de 4,032 milhões de euros nos termos do documento que se envia (Doc.º n.º 1), tendo o mesmo sido do valor de 2,052 milhões de euros, nos termos do documento que igualmente se envia (Doc.º n.º 2). Assim, o rácio real/objectivo de EBITDA de 2008 foi de 50,9% não cumprindo o mínimo de 55% estabelecido.
4. Nesta conformidade, solicitamos que, no prazo máximo de 3 dias, apresente a respectiva renúncia ao exercício do cargo de administrador da “C…, SA”.
Findo o mencionado prazo de 3 dias sem que tal renúncia seja apresentada, a C… é livre de considerar definitivamente incumprido o mencionado contrato de administração, podendo proceder, de imediato, à destituição com justa causa de V. Ex.ª do exercício do mencionado cargo, não lhe sendo devido o pagamento de qualquer compensação ou indemnização.
5. Informamos que a C… não prescinde de invocar outros factos que justificam a sua destituição com justa causa, não prescindindo, igualmente, de ser indemnizada por todos os prejuízos que um eventual incumprimento contratual de V. Ex.ª lhe causar.
6. Finalmente, no que se refere às sociedades participadas directa ou indirectamente pela C… em que V. Ex.ª exerce cargos sociais (“F…”, “G…”, “J…”, “N…” e “M…”), alertamos que, como é do seu perfeito conhecimento, ficou acordado no momento das nomeações para estes cargos que o exercício destas funções pressuponha o efectivo exercício do cargo de administrador da C1…
II.”–doc. de fls. 84, da providência apensa cujo teor aqui se reproduziu–al. J), da matéria de facto assente;
11- O Autor recebeu a mencionada carta em 2009.02.10, tendo a mesma sido respondida através do seu Ilustre Mandatário, mediante carta datada de 13.2.09, com o teor que consta de fls. 89, da providência apensa, aqui dado por reproduzido–al. L), da matéria de facto assente;
12- Conforme consta do n.º 3, da cl.ª 5.ª, do contrato referido em C), “caso ao longo do exercício do primeiro mandato os objectivos estabelecidos de acordo com o Business Plan para 2008 e do Orçamento anual para os anos seguintes não se encontrem cumpridos em pelo menos 55%, anualmente, o Segundo Contraente obriga-se a apresentar a sua renúncia ao cargo, sem que lhe assista o direito a qualquer indemnização ou compensação pelo período de tempo do mandato não efectivamente exercido”–al. M), da matéria de facto assente;
13- Em 26 de Fevereiro de 2009, foi enviada pela C… ao Autor uma carta com o conteúdo seguinte:
“1. Acusamos a recepção da carta que nos foi remetida pelo seu advogado, Dr. O…, datada de 13/02/2009, que mereceu a nossa melhor atenção.
2. Relativamente ao conteúdo da mesma, informamos que, como V. Ex.ª bem sabe, é absolutamente falso o alegado na mencionada carta, no sentido de que a actividade prevista no Business Plan só se iniciou em 2008 e não em 2007.
3. Por outro lado, embora os documentos que lhe foram oportunamente remetidos sejam absolutamente claros, junto enviamos, para conhecimento, cópia da acta da reunião do Conselho de Administração desta sociedade de 23/02/2008, na qual foi aprovado um documento referente à situação económico financeira das sociedades “C…, S.A.”, “F…, S.A.”, “G…, S.A.” e “N…, LDA.” E respectivas performances no exercício de 2008 (que igualmente enviamos cópia).
4. Do mencionado documento resulta, de forma clara, que o rácio real/objectivo de EBITDA de 2008 foi de 2,052 milhões de euros, ou seja, o rácio real/objectivo de EBITDA de 2008 foi de 50,9%, não cumprindo o mínimo de 55% estabelecido no contrato de administração.
5. Nesta conformidade e por a isso V. Ex.ª estar obrigado, voltamos a solicitar que, no prazo máximo de 3 dias, apresente a respectiva renúncia ao exercício do cargo de administrador da “C…, SA”.
Findo o mencionado prazo de 3 dias sem que tal renúncia seja apresentada, a C… é livre de considerar definitivamente incumprido o mencionado contrato de administração, podendo proceder, de imediato, à destituição com justa causa de V. Ex.ª do exercício do mencionado cargo, não lhe sendo devido o pagamento de qualquer compensação ou indemnização.
6. Finalmente e tal como lhe foi oportunamente transmitido, informamos que a C… não prescinde de invocar outros factos que justificam a sua destituição com justa causa, não prescindindo, igualmente, de ser indemnizada por todos os prejuízos que um eventual incumprimento contratual de V. Ex.ª lhe causar.”–al. N), da matéria de facto assente;
14- O Autor recebeu esta carta em 2009.03.02, tendo a mesma sido respondida através do seu Ilustre Advogado, mediante carta recebida na C…, S.A., em 2009.03.03–al. O), da matéria de facto assente;
15- O Plano de Negócios baseava-se em duas aquisições: a da N…, S.A. e a da F…, S.A.–doc. de fls. 45, da providência apensa cujo teor aqui se reproduziu–al. P), da matéria de facto assente;
16- A F… foi adquirida em 18.12.2007 e a G… em 30.06.2008–al. Q), da matéria de facto assente;
17. O EBITDA referida na carta aludida em N), cifrado em 2.052 milhões de euros, para o ano de 2008, foi apresentado ainda antes da aprovação do relatório e contas da Ré C…–al. R), da matéria de facto assente;
18- Conforme consta nº4 da Cl.ª 5., aludido Contrato de Administração, “caso ao longo do exercício do primeiro mandato os objectivos estabelecidos de acordo com o Business Plan para 2008 e do Orçamento anual para os anos seguintes se encontrem cumpridos em pelo menos 90%, anualmente a primeira outorgante, obriga-se a reconduzir o segundo outorgante para um segundo mandato, igualmente de 3 anos, mantendo-se o presente contrato de administração validamente eficaz durante esse período”–al. S), da matéria de facto assente;
19- No decorrer do primeiro ano de actividade da Ré C…, esta perdeu o principal cliente da F…: a H…–al. T), da matéria de facto assente;
20- Com a carta referida em J), o A. ficou muito perturbado e triste, tendo ficado diversas noites sem dormir–al. U), da matéria de facto assente;
21- Face ao certificado de incapacidade temporária para o trabalho por doença do A., com início em 4.2.09 e termo em 15.2.09, de que a Sr.ª Presidente do CA deu conhecimento, pelo fiscal único da Ré, em 20.02.2009, foi determinada a suspensão do A., apartir dessa data, de exercer as suas funções como membro do CA da C….–doc. de fls. 92/93, da providência apensa cujo teor se dá aqui por reproduzido–al. V), da matéria de facto assente;
22- A Ré C… enviou ao A. carta datada de 23.02.2009, nela reafirmando tudo quanto já constava da sua carta anterior, anexando no entanto, uma acta de uma reunião do Conselho de Administração realizada a 23.02.2009, onde se consignou ter sido apresentado um documento que, embora “não correspondendo à prestação de contas do exercício de 2008, encerra uma avaliação aproximada dos valores” demonstrativo “de forma clara” o não cumprimento dos objectivos por parte do A.–doc. de fls. 95 a 106, da providência apensa cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido–al. X), da matéria de facto assente;
23. O A. foi destituído por unanimidade entre todos os representantes das 2ª, 3ª RR. e das intervenientes, por acta da Assembleia Geral da Ré C… de 10.03.2009, anexa à carta de 11.3.09 – docs. de fls. 109 a 127, da providência apensa cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido–al. Z), da matéria de facto assente;
24. Para o efeito, fundamentam a destituição do A. em:
- incumprimento dos objectivos, de acordo com a “análise de contas”;
- desvios (negativos) de cumprimento dos contratos por parte dos clientes;
- gastos excessivos em investimentos nos pontos de venda;
- prática de descontos não autorizados;
- perdas dos clientes da H… e efeitos da perda desse distribuidor;
- não realização de reuniões de coordenação;
- cedência de uma marca detida pela F… a uma concorrente;
- não elaboração de um plano de integração; e
- atraso na venda dos imóveis e equipamentos pertencentes à F…–al. A1), da matéria de facto assente;
25. Era hábito da Ré C… marcar as suas reuniões com cerca de uma semana de antecedência–al. B1), da matéria de facto assente;
26. Do universo de empresas da Ré C…, constam, ainda, as seguintes sociedades:
- I…, SA.; e-M…, Ldª–al. C1), da matéria de facto assente;
27. A denominada “Análise de Contas” anexa ao documento referido em X), denominada como “Análise de Contas do Exercício de 2008 da F…, G… e N…”, e não “Análise de Contas da C…”, não tem em conta os resultados de todas as participadas, directa ou indirectamente, da Ré C…–al. D1), da matéria de facto assente;
28. Na tabela anexa à referida acta do Conselho de Administração de 23.02.2009 é apresentado, na segunda coluna, um EBITDA da F…, em 31.12.2008, de € 899142,00 e, na terceira coluna, é introduzido o efeito da aquisição de uma carteira de clientes (K…), com um valor negativo de € - 55073,00–al. E1), da matéria de facto assente;
29. O limite existente à contratação pelo A. ficou consignado na reunião do Conselho de Administração de 21.06.2008, aconselhando uma taxa de rentabilidade mínima (TIR) de 35% em novos clientes–al. F1), da matéria de facto assente;
30. Relativamente ao cliente ”P…” o A. enviou “mail” a solicitar parecer, aí referindo enviar orçamento de mobiliário para remodelação de uma das casas desse cliente, sendo alertado para a necessidade de envio de proposta fundamentada (rentabilidade esperada, riscos associados ao incumprimento do contrato e impacto na tesouraria) e para o facto da empresa não ter disponibilidade financeira para realizar mais investimentos no curto prazo, não podendo o CA continuar a tomar este tipo de decisões sem um mapa de tesouraria, solicitando, no entanto, a opinião do A., que foi no sentido de fazer e manter a relação com o cliente– docs. de fls. 130 a 134, cujo teor integral se dá aqui por integralmente reproduzido–al. G1), da matéria de facto assente;
31. Com data de 8.10.08, o A. enviou lista de investimentos em publicidade efectuados em clientes da H…, bem como um report/plano de acção e projecto de carta a enviar aos clientes, informação sobre investimentos efectuados, mapa resumo da evolução das vendas–doc. de fls. 136 a 235, juntos na providência apensa, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido–al. H1), da matéria de facto assente;
32. O A. faz parte da gestão executiva, mas não é o único membro deste corpo–al. I1), da matéria de facto assente;
33. Na reunião do Conselho de Administração de 21.06.2008 foi acordado por todos os membros do CA que a integração das empresas (F… e G…) teria de estar totalmente concluída até Dez./08–al. J1), da matéria de facto assente;
34- Por ”mail” datado de 2.10.08, o A. comunicou “…não termos o Plano de Integração executado apesar de já termos iniciado o mesmo…”–doc. de fls. 236, junto na providência apensa, cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido–al. L1), da matéria de facto assente;
35. O Conselho de Administração na reunião de 03.10.2008 reconheceu que a alienação (do imóvel e equipamentos da F…) ainda não era possível devido ao facto de ainda não ser possível à Ré C… prescindir destas instalações uma vez que as obras nas instalações da G…, necessárias a integração das duas participadas num só imóvel, ainda não haviam terminado–al. M1), da matéria de facto assente;
36. Prevê o contrato de administração celebrado entre A. e Ré C… que “No caso de cessação de funções por renúncia, desde que para tal haja justa causa, ou por destituição sem justa causa, o Segundo Contraente terá direito a uma indemnização pelos danos sofridos no montante equivalente às remunerações que seriam devidas até ao fim do mandato”–cláusula 5.º, n.º 1, desse contrato–al. N1), da matéria de facto assente;
37. O mandato do A. tinha a duração de 3 anos–al. O1), da matéria de facto assente;
38. Além disso, numa tentativa de minimizar os prejuízos da perda da H…, o A. tentou aliciar os clientes desta com uma política de preços atractiva–al. P1), da matéria de facto assente;
39. Na altura em que o A. foi contactado pela 1.ª Ré, o mesmo era director nacional de uma empresa do ramo líder de mercado, onde trabalhava há mais de 30 anos, tendo sido por essa sua experiência e competência profissional que aquela Ré o contratou– resposta à matéria do art. 1.º, da base instrutória.
40- O A. entendia que a maneira da C… crescer seria através da angariação de novos clientes, o que implicava um investimento inicial desta, no sentido do fornecimento do material como toldos, mesas, cadeiras, chávenas, colheres, máquina de café, moínho, etc.–resposta à matéria do art. 3.º, da base instrutória.
41. O Plano de Negócios não foi corrigido pelas oscilações de mercado verificadas– resposta à matéria do art. 14.º, da base instrutória.
42. O A. ficou num estado de profundo abatimento psicológico, com afectação para o trabalho e recurso a cuidados médicos–resposta à matéria do art. 18.º, da base instrutória.
43. Os contratos de investimento e de comodato são diferentes, dado que, nestes existe fornecimento de equipamento ou outros bens aos clientes, com os inerentes custos que tal acarreta, sem qualquer investimento acrescido como ocorre naqueles– resposta à matéria do art. 25.º, da base instrutória.
44. A área de serviço Q… não abriu na data prevista–resposta à matéria do art. 26.º, da base instrutória.
45. A área de serviço S… celebrou com a Ré um contrato de comodato– resposta à matéria do art. 28.º, da base instrutória.
46. Tanto o cliente "T…" como o cliente "U…" são clientes de distribuidores da Ré C…, sendo o primeiro um dos maiores consumidor de café da C…–resposta à matéria do art. 31.º, da base instrutória.
47. De acordo com o mapa de fls. 128/129, que tem por base um 'reporte de gestão' da F…, com referência a 31.12.08, o investimento no posto de venda acumulado representava em Julho/08, 33% das vendas de café, passando para 27%, a 31.12.08– resposta à matéria do art. 32.º, da base instrutória.
48. O "P…" é o principal cliente da Ré C…, em termos de volume de quilos vendidos de café e, como tal, um alvo apetecível de todos os seus concorrentes– resposta à matéria do art. 33.º, da base instrutória.
49. Exigindo por essa razão que o A. agisse depressa para cativar este cliente – resposta à matéria do art. 35.º, da base instrutória.
50. A competência para decidir sobre atribuição de descontos dos administradores ascendia à dos directores comerciais da empresa–resposta à matéria do art. 38.º, da base instrutória.
52. O A. visou reagir às manobras da concorrência, ajustando os preços da ré C… – resposta à matéria do art. 39.º, da base instrutória.
53. Após Maio/2008, o consumo pela H…, diminuiu, logo no mês de Junho, em 41,5%, em relação ao valor de vendas do mês anterior–resposta à matéria do art. 41.º, da base instrutória.
54. Em 8.07.2008, o A. tinha desenvolvido um plano de recuperação dos clientes e volume de negócios perdidos, sendo por ele referido na reunião do conselho de administração de 21.7.08, ter sido possivel manter 183 clientes que anteriormente estavam vinculados àquele distribuidor–resposta à matéria do art. 42.º, da base instrutória.
55. Quanto ao acompanhamento da coordenação da área comercial, o A. que tinha algumas reuniões nas participadas da Ré C…–resposta à matéria do art. 43.º, da base instrutória.
56. A "V…" era um lote que era vendido na loja da F… no Porto, que, por proposta do A., foi cedida por unanimidade do CA–resposta à matéria do art. 44.º, da base instrutória.
57. Para além do que consta da al. I), da matéria de facto assente, era 'a gestão executiva' que devia apresentar o plano de integração da F… e da G…–resposta à matéria do art. 45.º, da base instrutória.
58. Teor da acta de reunião do CA de 15.12.2008, junta a fls. 163, do p.p., da acção (não da providência), aqui dado por integralmente reproduzido–resposta à matéria do art. 46.º, da base instrutória.
59. O_documento denominado "Análise das Contas do Exercício de 2008 da F…, G… e N…-Conselho de Administração da C…, SA-Fevereiro de 2009", foi apresentado como encerrando uma avaliação aproximada da situação económico-financeira das sociedades C…, F…, S.A, G…, SA e N…, Lda e respectivas performances no exercício de 2008–resposta à matéria do art. 51.º, da base instrutória.
60. O EBITDA referenciado na acta n.º 12, de 23.2.09, apresentava um valor de € 2.052.000€ e um rácio real/ objectivo de 50,9%–resposta à matéria do art. 52.º, da base instrutória.
61. Em todas as sociedades detidas directa ou indirectamente pela C…, F…, S.A, N…, SA e “J… SA.” (anteriormente denominada I…), “N…, Lda.” e “M…, Lda.”,-a gestão executiva era efectuada pelo A. que tinha a seu cargo todas as áreas, menos a do controlo financeiro, nomeadamente a responsabilidade pela coordenação, acompanhamento e controlo de toda a actividade operacional incluindo actividade comercial, produção, qualidade e marketing–resposta à matéria do art. 53.º, da base instrutória.
62. Face aos meses de vigência dos contratos até ao termo de cada um, apura-se uma perda potencial de €1.022,098 no EBITDA de ambas as empresas, F… e G…–resposta à matéria do art. 56.º, da base instrutória.
63. Foram celebrados 186 novos contratos em 2008, dos quais apenas 35 tiveram um desvio favorável em termos de Consumo–resposta à matéria do art. 57.º, da base instrutória.
64. Desses 186 novos clientes, 11 não apresentaram consumo em 2008–resposta à matéria do art. 58.º, da base instrutória.
65. O investimento efectuado nesses 11 clientes, que não apresentaram consumo em 2008, ascende a € 19.344–resposta à matéria do art. 59.º, da base instrutória.
66. O A. assegurou aos restantes membros do Conselho de Administração que o valor de investimento seria estabilizado em 25% (das vendas) até ao final de 2008, o que não aconteceu–resposta à matéria do art. 60.º, da base instrutória.
67. Apesar de se ter comprometido a solicitar a aprovação do CA para novos investimentos a realizar em clientes, o Autor autorizou que fossem realizados investimentos superiores aos aprovados–resposta à matéria do art. 61.º, da base instrutória.
68. Quanto ao cliente 'P…' (…), foi efectuado um investimento de cerca de 17.229,76€, sem IV A incluído–resposta à matéria do art. 62.º, da base instrutória.
69. Foi celebrado um contrato pela F… com o cliente 'W…', datado de 21.1.09–resposta à matéria do art. 63.º, da base instrutória.
70. Relativamente ao cliente "W…", foi feito um investimento de € 71.271,76, não aprovado pelos restantes membros do CA–resposta à matéria do art. 64.º, da base instrutória.
71. O A, a partir de Julho de 2008, implementou uma política de preços com desconto, com vista, segundo dizia a recuperar vendas que estavam a decrescer na F…, ainda que em detrimento da rendibilidade das operações – resposta à matéria do art. 65.º, da base instrutória.
72. Na reunião do CA da C… de 2008.12.15, ao A. foram solicitados esclarecimentos em relação à quebra do preço médio líquido dos produtos F… e K…–resposta à matéria do art. 66.º, da base instrutória.
73. Face à perda do distribuidor 'H…' e por forma a assegurar a perda do menor número de clientes possível e ver os efeitos da perda do distribuidor na actividade da F… (n.º de clientes perdidos, número de clientes indecisos, quantificação da 'perda' em kg e valor, entre outros), ao A. incumbia esse trabalho, que se limitou a apresentar algumas referências, de forma vaga e verbal, sem quantificação das perdas em termos de kg e valor–resposta à matéria do art. 69.º, da base instrutória.
74. Teor da Acta de reunião do CA da C…, de 2008.07.21, junta a fls. 152, do p.p. da acção (não da providência apensa), dado aqui por integralmente reproduzido –resposta à matéria do art. 71.º, da base instrutória.
75. A alienação do imóvel da F… e seus equipamentos era relevante na medida em que, por um lado, permitia reduzir o nível de responsabilidade da empresa para com os bancos e, por outro lado, permitia a geração de liquidez da empresa quando a tesouraria era já muito limitada, tendo o A assumido a promoção dessa venda, embora só tivesse iniciado o processo em Out./08–resposta à matéria do art. 72.º, da base instrutória.
76. O A, previamente à celebração do Contrato com a C…, conhecia o Business Plan, pediu os esclarecimentos que julgou oportunos, bem sabendo que o devia executar e que à data da sua contratação a G…, F… e N… e M… não haviam sido adquiridos e que as aquisições não estavam realizadas–resposta à matéria do art. 75.º, da base instrutória.
77. Tendo em conta os valores que integram o relatório de contas de 2008, o EBITDA apresentado no orçamento 2008 da F…, relativo a 2008, foi €1.220.886, ou seja, cerca de 51,3%–resposta à matéria do art. 77.º, da base instrutória.
78. O A. foi avisado para a possibilidade de perda do cliente H… para um concorrente e não conseguiu garantir a sua permanência–resposta à matéria do art. 78.º, da base instrutória.
79. Para o valor de EBITDA relevante para aferir se o A havia ou não atingido os objectivos concorriam os valores das participadas G…, F…, M… e N…–resposta à matéria do art. 79.º, da base instrutória.
80. No cômputo do EBITDA relevante havia ainda a considerar o valor da participada M…, de € 14.086,00, e, assim, a uma percentagem de EBITDA no orçamento de 2008, de 52,4%–resposta à matéria do art. 80.º, da base instrutória.
81. De um total de 679 clientes que eram fornecidos pela H…., 105 apresentaram consumos–resposta à matéria do art. 82.º, da base instrutória.
82. A "cedência" da marca V… à X… foi efectuada sem pagar qualquer contrapartida–resposta à matéria do art. 84.º, da base instrutória.
83. O despedimento colectivo na F… devia ter sido iniciado logo que a participação na G… foi adquirida (em Junho de 2008), sendo da responsabilidade do A toda a área operacional–resposta à matéria do art. 85.º, da base instrutória.
84. Mesmo antes de o imóvel ser ou poder ser alienado, podiam ser efectuadas diligências prévias–resposta à matéria do art. 86.º, da base instrutória.
85. Um dos impedimentos dessa alienação se prendia com o facto de as obras das novas instalações estarem atrasadas–resposta à matéria do art. 87.º, da base instrutória.
86. Depois da sua destituição, o A. voltou a ser contratado pela X…, aliciando inclusivamente alguns colaboradores das participadas da C… a irem trabalhar com ele–resposta à matéria do art. 88.º, da base instrutória.
*
III. O DIREITO

Antes de entrarmos na apreciação das questões colocadas no recurso convém definir o regime legal que lhe é aplicável.
Nas normas transitórias da Lei 41/2013 de 26/06 que aprovou o Novo Código de Processo Civil, prevê-se no artigo 5.º, nº 1, que o Código de Processo Civil é imediatamente aplicável às acções declarativas pendentes, sendo que, no artigo 7.º, nº 1 apenas se prevê um regime especial no tocante aos recursos em relação às acções declarativas instauradas em data anterior a 01.01.2008, ou seja, a lei não estabeleceu um regime transitório para os recursos nos processos instaurados em data posterior a 01.01.2008, nos quais as decisões foram proferidas em data anterior à entrada em vigor do novo Código de Processo Civil.
Aplicando o regime previsto no artigo 12.º do CCivil ao processo civil resulta que na área do direito processual, a nova lei se aplica às acções futuras e também aos actos futuros praticados nas acções pendentes.
Como refere Antunes Varela: “(…) a ideia, complementar desta, de que a nova lei não regula os factos pretéritos (para não atingir efeitos já produzidos por este), traduzir-se-á, no âmbito do direito processual, em que a validade e regularidade dos actos processuais anteriores continuarão a aferir-se pela lei antiga, na vigência da qual foram praticados”.[1]
Portanto, a nova lei aplica-se imediatamente aos actos que houverem de praticar-se a partir do momento em que ela entra em vigor, pelo que os actos praticados ao abrigo da lei antiga devem ser apreciados em conformidade com esta lei.[2]
Especificamente, no que concerne às normas reguladoras dos recursos, Antunes Varela distinguia as normas que “fixam as condições de admissibilidade do recurso e as que se limitam a regular as formalidades da preparação, instrução e julgamento do recurso”, defendendo a aplicação imediata da lei nova sempre que não estejam em causa normas que “interferem na relação substantiva”.[3]
Ora, a presente acção foi instaurada em 19 de Junho de 2009 e a sentença foi proferida em 9 de Fevereiro de 2015. Como assim, proferida a sentença em data posterior a 01.09.2013, a nova lei aplicar-se-á quer ao puro formalismo processual quer quanto às condições de admissibilidade e fundamentos do recurso, nomeadamente quanto aos fundamentos e critérios de reapreciação da prova e prolação da respectiva decisão.
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Como supra se referiu a primeira questão que importa apreciar e decidir consiste em:
a)- saber se o tribunal recorrido cometeu erro na apreciação da prova e assim na decisão da matéria de facto.
Antes, porém, importa que se diga que nas alegações recursivas o recorrente deve circunscrever o objecto do recurso dentro dos limites legais.
Com efeito, nos termos estatuídos na lei adjectiva o recurso ou versa sobre matéria de direito ou sobre matéria de facto ou, simultaneamente, sobre matéria de direito e matéria de facto (artigos 639.º e 640.º do CPCivil).
Como assim, torna-se evidente, que são destituídas de qualquer fundamento as conclusões formuladas pelo recorrente sob os nºs 18ª e 19ª.
Efectivamente, as referidas conclusões reportam-se ao corpo alegatório que o recorrente designa de “questões introdutórias” onde são tecidas uma série de considerações sobre os critérios da valoração da prova feita pelo tribunal recorrido, de dualidade de critérios utilizados, assim como falta de fundamentação na motivação da decisão da matéria pela ausência de análise crítica da prova.
Curiosamente e quanto à falta de fundamentação, embora seja matéria de conhecimento oficioso [artigo 662.º, nº 2 al. d) do CPCivil], o recorrente não formula qualquer conclusão.
Todavia, importa que se diga, que não existe a aludida falta de fundamentação.
Com efeito, pese embora não seja exemplar a forma como a Srª juiz motivou a decisão da matéria de facto, sobretudo no que tange à prova testemunhal, ainda assim, não se pode dizer que não fez uma análise crítica da prova já que, dela se retira que concatenou todos os meios de prova que foram produzidos de forma coerente, bastando para o efeito ler aquilo que consta de fols. 6 a 8 e e 18 a 21 da referida decisão.
Quanto às restantes considerações aí vertidas, elas apenas poderiam ter relevo quando concatenadas com os concretos pontos de facto que o recorrente considere incorrectamente julgados, dado que a lei subordina essa impugnação aos pressupostos de natureza formal previstos no artigo 640.º.
Diga-se, aliás, que a alusão aos “concretos pontos de facto”, contida na alínea a) do nº 1 do artigo 640.º visa acentuar o carácter atomístico, sectorial e delimitado que o recurso ou impugnação da decisão proferida sobre a matéria de facto em regra deve revestir.
Com isto não se quer significar que o erro no julgamento da matéria de facto não possa derivar simplesmente do meio de prova aduzido para fundamentar a decisão do ponto de facto impugnado não conduzir a tal resultado probatório. Por exemplo, é afirmado que se julga provado o facto X, com base no depoimento da testemunha Y, quando, analisado tal depoimento, se chega à conclusão de que efectivamente essa testemunha não produziu um depoimento que permita a prova de tal facto, não tendo feito qualquer referência directa ou indirecta ao facto dado como provado.
Todavia, ainda assim, impõe-se que essa impugnação se faça com referência aos concretos pontos de facto incorrectamente julgados.
Acontece que, fora daqueles âmbitos, ou seja, matéria de direito/matéria de facto, o recurso não abrange quaisquer outras temáticas como as enunciadas naquelas conclusões 18ª e 19ª, razão pela qual se julgam improcedentes.
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Isto dito, embora de forma deficientíssima, o recorrente só em parte e no que tange a este segmento recursivo (impugnação da matéria de facto) deu cumprimento aos ónus impostos pelo artigo 640.º, nº 1 als. a), b) e c) do CPCivil, pelo que e sempre que tal se justifique, no decurso da análise da referida impugnação, se fará referência à falta de cumprimento de tais ónus.
Portanto, nada obstando ao conhecimento do objecto de recurso nesse segmento, analisemos, então, o recurso na vertente da impugnação da matéria de facto.
O controlo de facto, em sede de recurso, tendo por base a gravação e/ou transcrição dos depoimentos prestados em audiência, não pode aniquilar (até pela própria natureza das coisas) a livre apreciação da prova do julgador, construída dialecticamente na base da imediação e da oralidade.
Efectivamente, a garantia do duplo grau de jurisdição da matéria de facto não subverte o princípio da livre apreciação da prova (consagrado no artigo 607.º nº 5) que está deferido ao tribunal da 1ª instância, sendo que, na formação da convicção do julgador não intervêm apenas elementos racionalmente demonstráveis, já que podem entrar também elementos que em caso algum podem ser importados para a gravação vídeo ou áudio, pois que a valoração de um depoimento é algo absolutamente imperceptível na gravação/transcrição.[4]
Ora, contrariamente ao que sucede no sistema da prova legal, em que a conclusão probatória é prefixada legalmente, no sistema da livre apreciação da prova, o julgador detém a liberdade de formar a sua convicção sobre os factos, objecto do julgamento, com base apenas no juízo que fundamenta no mérito objectivamente concreto do caso, na sua individualidade histórica, adquirido representativamente no processo.
O que é necessário e imprescindível é que, no seu livre exercício de convicção, o tribunal indique os fundamentos suficientes para que, através das regras da ciência, da lógica e da experiência, se possa controlar a razoabilidade daquela sobre o julgamento do facto como provado ou não provado”.[5]
De facto, a lei determina expressamente a exigência de objectivação, através da imposição da fundamentação da matéria de facto, devendo o tribunal analisar criticamente as provas e especificar os fundamentos que foram decisivos para a convicção do julgador (artigo 607.º, nº 4 do CPCivil).
Todavia, na reapreciação dos meios de prova, a Relação procede a novo julgamento da matéria de facto impugnada, em busca da sua própria convicção, desta forma assegurando o duplo grau de jurisdição sobre essa mesma matéria, com a mesma amplitude de poderes da 1.ª instância.[6]
Impõe-se-lhe, assim, que “analise criticamente as provas indicadas em fundamento da impugnação, quer a testemunhal, quer a documental, conjugando-as entre si, contextualizando-se, se necessário, no âmbito da demais prova disponível, de modo a formar a sua própria e autónoma convicção, que deve ser fundamentada”.[7]
Tendo presentes estes princípios orientadores, vejamos agora se assiste razão ao recorrente neste segmento recursivo da impugnação da matéria de facto, nos termos por ele pretendido.
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Começa o apelante por se insurgir quanto à resposta dada pelo tribunal recorrido aos pontos 2º e 3º e 4º da base instrutória.
A estes quesitos deu o tribunal a resposta de não provado em relação aos pontos 2º e 4º e parcialmente provado o alegado no ponto 3º. O recorrente entende que os referidos pontos deveriam ter sido considerados provados.
Alega a este respeito que aquelas respostas estão em contradição com a alínea F1 dos Factos Assentes e com a resposta ao ponto 72º da base instrutória. Não refere, contudo, de forma expressa em que se traduz tal contradição.
Nos referidos pontos perguntava-se se, depois do primeiro ano de trabalho, entre o recorrente e os restantes administradores começaram a surgir divergências, qual a sua origem e se, nessa a sequência, lhe foi proposta a cessação dos contratos com ele celebrados e com dispensa de comparecer na sede da Ré.
Ora, o ponto 72º refere-se a alienação do imóvel F… e a matéria assente na alínea F1 refere-se ao limite à contratação pelo recorrente e taxa de rentabilidade.
Como assim, não vemos como possa existir contradição entre a resposta a esses pontos com o ponto 72º e a alínea F1 da matéria assente.
Os pontos postos em causa pelo recorrente encerravam perguntas precisas, como acima se assinalou, e que nada têm que ver com a oportunidade de venda do imóvel da F… e com o limite à sua contratação e taxa de rentabilidade, pelo que não se divisa onde possa existir a propalada contradição a que se refere o recorrente que, diga-se, não refere qual seja.
Por outro lado, o recorrente também não convoca qualquer meio probatório que sustente a alteração da resposta aos pontos em causa.
Na verdade, do depoimento da testemunha Y…, nada se retira quanto à matéria factual que estava vertido nos citados pontos.
Com efeito, mesmo que a C… estivesse em dificuldades financeiras isso em nada permitia inferir se existiam as referidas divergências e qual a sua origem.
Como se pode dar como assente a referida matéria factual apenas com o que aquela testemunha refere?
Da mesma forma que nenhuma relevância tem para o efeito pretendido o afirmado pelo recorrente quanto ao seu esvaziar de competências, além de que, relativamente aos depoimentos indicados sobre este aspecto, o recorrente não deu cumprimento ao ónus imposto pela alínea a) do nº 2 do artigo 640.º do CPCivil, pois que, não indicou a passagem das gravações relativamente aos depoimentos referidos, limitando-se a referir que tais depoimentos estão gravado nos ficheiros.
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Resulta, pois, do exposto que não existem fundamentos probatórios ou outros, convocados pelo recorrente, para que se altere a resposta dada pelo tribunal recorrido em relação aos citados pontos factuais.
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Impugna também o recorrente a resposta de não provado dada pelo tribunal recorrido aos pontos 6º, 7º, 8º, 9º e 10º da base instrutória, os quais deviam, no seu entender, merecer a resposta de provados.
Os referidos pontos dizem essencialmente respeito aos objectivos previstos no business plan e ao cálculo do EBITDA.
Os pontos 6º, 7º e 8º tinham, respectivamente, a seguinte redacção:
Para o plano de negócios ser cumprido, as aquisições referidas em P) teriam que estar finalizadas em finais de 2006, por forma a dar cumprimento às previsões para 2007 que o contrato de administração refere na clª. 5ª do contrato referido em C?”
Os pressupostos em que o Plano de Negócios de baseou só se cumpriram um ano e meio depois da data prevista?”
Assim, atendendo a esse plano, com tais correcções, o EBITDA para 2007 deveria ser de 2,495 milhos de euros?”
Como está provado nos autos o Plano de Negócios baseava-se em duas aquisições: a da G…, S.A. e a da F…, S.A. (facto descrito em 15º), da mesma forma que também esta provado que essas sociedades foram adquiridas, respectivamente, em 30.06.2008 e em 18.12.2007 (facto descrito em 16º).
Está também assente nos autos que antes da celebração do contrato intitulado “contrato de Administração” ocorrido em 12-12-2007, houve esclarecimentos recíprocos entre as partes (facto descrito em 3º).
Ora, feita a leitura do business plan em nenhures do mesmo, ou de qualquer outro documento, consta qualquer compromisso assumido pelas partes, por mais informal que fosse, que as aquisições daquelas sociedades teriam de ocorrer até à data inserta no ponto 6º.
E daí não se pode inferir, tal como se refere na motivação da decisão da matéria de facto, que o recorrente tinha conhecimento da situação real e efectiva da Ré C… objectivos a cumprir e metas a atingir?
O recorrente não aceitou que o EBITDA no final de 2008 deveria ser o que consta do plano de negócios por si assumido bem sabendo que, à data da sua contratação, a G…, a F…, não haviam sido adquiridas?
Como assim, qual ou quais elementos probatórios que o recorrente convoca para se dar como prova a matéria que consta dos citados pontos factuais?
A partir de que elemento probatório se pode extrair a conclusão de que as aquisições da G… e da F… teriam de estar finalizadas até à data referida no ponto 6º?
Invoca o recorrente um argumento lógico: se o Plano de Negócios se baseia em duas aquisições, enquanto essas duas aquisições não se verificarem não há negócios (mas só Plano).
Mas o que se pretendia saber, e era isso que se perguntava, era se aquelas aquisições deveriam ter ocorrido na data aí referida!
Então não está provado que essas aquisições ocorreram?
Porém, o cumprimento do plano estava, na versão do recorrente, dependente de que essas aquisições ocorressem na data aí referia e não na que veio a acontecer.
Seguramente que também não o é, como pretende a recorrente, com os pressupostos referidos na “Acquisition Finance” onde apenas se refere que essas aquisições deviam ocorrer até 31 de Dezembro de 2007, pelo que, tendo sido adquiridas em 18/12 e 30/06, não se pode considerar provado que os pressupostos daquele plano só se cumpriram um ano e meio depois da data prevista a que faz referência o ponto 7º.
Nem tão pouco isso resulta do conceito de “sinergias” a que o recorrente faz referência.
O que o recorrente verte nas alegações, quanto a este ponto, são apenas considerações e interpretações mas que não têm arrimo em qualquer prova seja ela documental ou testemunhal constante dos autos.
Efectivamente, quanto à prova testemunhal o recorrente convoca o depoimento da testemunha Z…, todavia, além de relativamente a esta testemunha o recorrente não cumprir o ónus imposto pela alínea a) do nº 2 do artigo 640.º do CPCivil, pois que, não indicou a passagem das gravações relativamente aos depoimentos referidos, o seu depoimento restringiu-se a descrever o processo de transição da G… para a nova proprietária e, portanto, sem qualquer relevo para a matéria factual em causa.
Face ao exposto, dúvidas não existem de que não foram convocados elementos probatórios pelo recorrente para que se alterem as respostas dadas pelo tribunal recorrido no que tange aos pontos 6º e 7º da base instrutória.
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No que concerne aos pontos 8º e 10º também cremos, salvo o devido respeito, que o recorrente não convoca quaisquer elementos probatórios para que se altere a resposta de não provado dada pelo tribunal recorrido.
Vejamos.
Desde logo, não é verdade que os senhores peritos tivessem negado peremptoriamente a necessidade realizar ajustamentos ao perímetro societário.
Para o efeito basta ouvir os esclarecimentos prestados ao minuto 8.47 ouvidos e transcritos nas contra-alegações das recorrida para verificar que assim não foi.
Por outro lado, a resposta a esse ponto no sentido pretendido pelo recorrente pressupunha a resposta positiva aos pontos 6º e 7º o que já se julgou não proceder.
Ademais, importa ter presente, quanto a essa matéria, a contra prova feita pelas recorridas ancorada nos depoimentos ouvidos e transcritos nas contra-alegações das testemunhas AB… e AC…, que afirmaram que os resultados da C… em 2008 incluem a totalidade dos resultados de todo o exercício de 2008 em ambas as sociedades, pelo que o universo temporal de actividade e de resultados obtidos é o mesmo do Business Plan, ou seja o atraso na execução da compra não tinha qualquer efeito nas vendas realizadas, nem no EBITDA atingido.
Para além disso, mesmo as sinergias que não puderam ser obtidas em 2008 pelo atraso de meio ano na aquisição da G… foram computadas em apenas 151 mil euros, tal como expressamente referido pelos senhores peritos no decurso dos esclarecimentos por si prestado na audiência de julgamento do dia 22/01/2014-o que, mesmo considerando-as, não permitiria ao Recorrente atingir o EBITDA a que se comprometeu.
Por outro lado, e no que diz respeito ao ponto 10º, constando dos autos que no dia 11 de Dezembro de 2007 foi celebrado o contrato de sociedade da “C…”, cujo registo na Conservatória do Registo Comercial data de 12/12/2007 e que em 20 de Dezembro do mesmo ano foi emitido o comprovativo da Declaração de início de actividade pela Direcção Geral dos Impostos, não se pode dar como assente que o arranque da actividade da referida Ré se tenha verificado só no ano de 2008.
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No que tange ao ponto 9º da fundamentação factual aí se perguntava:
E mesmo aceitando os números apresentados pela Ré C…, atingido, nesse ano, um rácio de cumprimento de 82,% do EBITDA?”
Na página 10 do relatório de peritagem consta de forma expressa e a este propósito que: “Considerando a informação que integra o Relatório e Contas Consolidado da C…, SA de 2008 e ajustamento de harmonização atrás apresentados como a), b) e c), os peritos apuraram uma taxa de cumprimento do EBITDA de 36%”.
E sobre este âmbito vejam-se ainda os esclarecimentos prestados pelos Srºs. peritos aos minuto 8.47, 10,17, 11,43 e 24,30 ouvidos e transcritos pelas recorridas nas respectivas contra-alegações, sendo que, do relatório pericial consta que as sinergias foram computadas, para o período de 12 meses, em € 302.036,00, o que, considerando um atraso na aquisição da G… de apenas 6 meses, corresponde a € 151.018,00, valor esse que, impactando em igual montante quer no EBITDA previsional do Acquisition Finance, quer no EBITDA real conjunto da F… e da G…, não permite, em qualquer cenário comparável, atingir um ratio de cumprimento de 55%, como resulta dos esclarecimentos dos Srºs. peritos prestados aos minuto 32.01,33,18, 34,11 e 39,23 ouvidos e transcritos pelas recorridas.
No que se refere aos relatórios contabilísticos acompanha-se o que a este respeito se refere na motivação da decisão da matéria de facto e ainda a contra-prova resultante do depoimento da testemunha AC… prestado na audiência de julgamento do dia 25/02/2014 do minuto 59:10 ao minuto 1:05:30 ouvido e transcrito pelas recorrida, quando afirma que as diferenças entre as contas previsionais que serviram de base à destituição seriam sempre melhores do que as contas finais, porque naquelas ainda faltariam incluir alguns custos, o que impactava negativamente o EBITDA.
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Decorre, assim, do exposto que também aqui o recorrente não indicou quaisquer elementos probatórios constantes dos autos que possam sustentar a alteração da resposta do ponto 9º da base instrutória dada pelo tribunal recorrido.
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Não concorda também o recorrente com a resposta dada aos pontos 11º, 12º e 13º da base instrutória.
Quanto ao ponto 11. na sua motivação a Srª juiz louvou-se no relatório pericial. Ora, nesse relatório afirma-se que a H… em 2007 era responsável por 24,6% do volume de negócios da F… e de 12,4% em 2008.
Como assim, esse relatório pericial não confirma os valores de 35% referidos no citado ponto, sendo que, nele se refere volume total de negócios sem qualquer distinção, como pretende a recorrente, entre volume de negócios em dinheiro e volume de negócios em Kgs. de café, razão pela qual não se pode dar como demonstrada certa realidade factual de acordo com a interpretação que o recorrente faça de determinados conceitos embora plasmados em documentos, mas que depois ajusta àquilo que entende que deveria ser a conclusão que deles se devia extrair, porém sem aderência ao facto constante do ponto da base instrutória em causa.
Relativamente aos pontos 12º e 13º valem mutatis mutandis as considerações feitas a propósito dos pontos 8º e 9º.
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Por conseguinte deve também permanecer inalterada a resposta dada pelo tribunal recorrido aos citados pontos factuais.
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Aqui chegados e antes de avançarmos na apreciação deste segmento recursivo o recorrente, nas suas alegações recursivas, impugna grande parte da resposta dada aos restante os pontos factuais da base instrutória, para o que convoca os depoimentos de muitas das testemunhas ouvidas.
Todavia, fá-lo, dizendo que se deve considerar a plenitude dos depoimentos das testemunhas Z…, Y… e AD….
Ora, tal não se mostra possível.
É que, como tem vindo a recordar repetidamente o STJ[8], a impugnação da decisão de facto, perante a Relação, “não se destina a que este tribunal reaprecie global e genericamente a prova valorada em primeira instância, ainda que apenas se pretenda discutir parte da decisão”, como sucede no presente caso.
Já assim era face à anterior legislação, desde 1995.
Com efeito, já se dizia no preâmbulo do Decreto-Lei nº 39/95, de 15/2, “(…) a garantia do duplo grau de jurisdição em sede de matéria de facto, nunca poderá envolver, pela própria natureza das coisas, a reapreciação sistemática e global de toda a prova produzida em audiência–visando apenas a detecção e correcção de pontuais, concretos e seguramente excepcionais erros de julgamento, incidindo sobre pontos determinados da matéria de facto, que o recorrente sempre terá o ónus de apontar claramente e fundamentar na sua minuta de recurso”.
Tal ónus manteve-se ou agravou-se com o actual CPC, cuja reforma não pretendeu alterar o sistema dos recursos cíveis, pois que teve a preocupação de “conferir maior eficácia à segunda instância para o exame da matéria de facto”, como se pode ler na Exposição de Motivos da Proposta de Lei n.º 113/XII apresentada à Assembleia da República, de cuja aprovação veio a resultar aquele Código, disponível em www.parlamento.pt.[9]
Essa maior eficácia traduziu-se no reforço e ampliação dos poderes da Relação, no que toca ao julgamento do recurso da decisão de facto; mas não trouxe consigo a eliminação ou, sequer, a atenuação do ónus de delimitação e fundamentação do recurso, introduzidos em 1995.
Na verdade, impôs ao recorrente os ónus do artigo 640.º do CPCivil para que a Relação pudesse reapreciar a matéria de facto nos termos do n.º 1 do artigo 662.º do mesmo diploma legal.
Portanto, relativamente à impugnação da decisão de facto, existe um especial ónus de alegação, no que respeita à delimitação do objecto do recurso e à respectiva fundamentação.
E não observa esse ónus o recorrente que diz que têm de ser valorados na sua plenitude dos depoimentos de certas testemunhas como, aliás, decorre do artigo 640.º, nº 2 al. a) já atrás citado, isto é, o recorrente mesmo que o depoimento tenha de ser valorado na íntegra, ele tem sempre que indicar com exactidão as passagens da gravação relativas a cada facto ou conjunto de factos com base nos quais sustenta alteração dos concretos pontos de facto impugnados.
Isto dito, analisemos, então, os citados pontos da base instrutória que foram nessas circunstâncias impugnados.
O ponto 14º da base instrutória tinha a seguinte redacção:
Por outro lado, o mercado “encolheu” 7% globalmente, o que não foi tido em conta para efeitos de correcções do Plano de Negócios, que previa a expansão do Mercado”?
A este ponto o tribunal recorrido respondeu do seguinte modo:
Provado que o Plano de Negócios não foi corrigido pelas oscilações do mercado verificadas”.
O recorrente entende que este facto devia ter sido dado como provado na sua íntegra, sendo aquela resposta contraditória com a prova produzida.
Para o efeito convoca o depoimento das testemunhas AD…, Z…, Y…, AE…, e AF….
Todavia, o recorrente não cumpre o ónus a que se refere o artigo 640.º, nº 2 al. a) do CPCivil, não indicando as passagens das gravações dos depoimentos das respectivas testemunhas em que se fundamenta para que se altere a resposta dada de não provado pelo tribunal recorrido, limitando-se quanto a alguns a indicar uma hora que será, ao que supomos, do seu início.
Para além disso, o recorrente faz também apelo ao documento junto aos autos a fols. 526.
O documento em causa refere-se a um email enviado por AB… recorrente solicitando-lhe que lhes fizesse chegar (CA) o estudo de mercado da AG… que refere o decréscimo do mercado AH… de café em 7% capeado com o próprio estudo.
Acontece que, não vemos como se pode extrair a partir desse documento, sem mais, o facto objectivo de que o mercado de café havia encolhido globalmente 7%.
Trata-se apenas de um estudo sem qualquer garantia de que ela reflicta a realidade do mercado e, portanto, sem que a partir dele se possa afirmar com o grau de certeza razoável que o decréscimo do mercado tenha sido de 7%, razão pela qual o tribunal recorrido, e bem, se limitou a concluir ter havido oscilações de mercado.
Mas mesmo que assim não fosse sempre haveria que tomar em consideração o depoimento da testemunha AC…, prestado em audiência de discussão e julgamento do dia 25/02/2014, gravado no CD do minuto 18:47 ao minuto 21:35, ouvido e transcrito pelas recorridas nas contra-alegações, que não confirma a matéria factual nele vertida.
No ponto 15º o recorrente limita-se a remeter para as explicações que diz já ter aduzido, devendo ainda ser tidos em conta os valores apresentados pelos Srs. Peritos nos esclarecimentos adicionais (fls. 1264 e seguintes dos autos).
Como nos parece evidente, este tipo de impugnação não se encontra estatuído na lei adjectiva e não cumpre qualquer dos ónus impostos pela mesma.
Ponto 16º também aqui o recorrente não cumpre tais ónus, pois que, a indicação da passagem da gravação indicada não se sabe a que testemunha se refere, se ao AE… se ao Z…, sendo que, em relação às restantes testemunhas aí referidas os referidos ónus também não foram cumpridos.
No ponto 17. o recorrente só cumpre esse ónus em relação ao depoimento da testemunha AD…, todavia, feita a sua audição só por si não se mostra suficiente para dar como provado o ponto em causa, tanto mais que a testemunha AI… porteiro do Grupo C3..., indicado à matéria deste quesito referiu não ter recebido qualquer ordem para impedir a entrada do recorrente naquelas instalações.
O ponto 18º tinha a seguinte redacção:
Todos estes acontecimentos sucederam-se no espaço de poucos dias e deixaram o A. num estado de profundo abatimento psicológico, doente e incapacitado para o trabalho, necessitando de cuidados médicos urgentes”?
A este ponto o tribunal recorrido respondeu:
Provado que o A. ficou num estado de profundo abatimento psicológico, com afectação para o trabalho e recurso a cuidados médicos”.
Para a alteração deste ponto o recorrente convoca o depoimento da testemunha AD…. Todavia, ouvido este depoimento, na parte indicada, dele não se retira qualquer elemento adjuvante para dar integralmente como provado o referido ponto.
Para além disso, não se vislumbra como a alteração das respostas aos pontos anteriores podiam levar a que se desse como provado na íntegra esse quesito a não ser quanto à sucessão temporal aí indicada.
Relativamente ao ponto 19. o recorrente só cumpre o referido ónus em relação às testemunhas AD… e Z….
Acontece que, esses depoimentos são contrariados pelo depoimento da testemunha AB… que esclareceu o tribunal sobre os motivos pelos quais o recorrente foi suspenso e dele não se retira que tal suspensão tenha tinha o propósito de pressioná-lo a apresentar renúncia (depoimento ouvido e transcrito pelas recorridas 1:58:48 ao minuto 2:02:15), razão porque, não existe fundamento para que se proceda à pretendida alteração.
Os pontos 21º e 33º tinham a seguinte redacção:
Muitos dos negócios foram acordados ainda antes da entrada em funções do A., tendo este apenas formalizado os mesmos?”
A estes pontos o tribunal respondeu não provado.
O recorrente entende que os mesmos deviam merecer a resposta de provados.
Alega a este respeito que a resposta dada ao referido ponto é contraditória com os documentos juntos aos autos a fols. 559 e ss, documentos que foram corroborados pelo depoimento da testemunha Y….
Ora, o que esta testemunha refere é apenas que havia negócios que já o Eng. AJ… e o Dr. AK… tinham acompanhado e que só faltava formalizá-los por escrito.
Contudo, este depoimento é contrariado pelo da testemunha AL… (depoimento prestado em audiência de discussão e julgamento do dia 25/02/2014 gravado no CD do minuto 26:58 ao minuto 27:58 e ainda pelo da testemunha AB…, prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 20/02/2014, gravado do minuto 1:45 ao minuto 05:49 ouvidos e transcritos pelas recorridas).
Para além disso, dos documentos de fols. 560 e 562 nada de concreto se retira para os efeitos pretendidos.
O primeiro deles trata-se de uma folha feita em excel quase imperceptível e não vemos como se pode dizer a partir dele quais dos clientes aí referidos tinham já formalizado contrato antes da entrada em funções do recorrente e quais foram formalizados por ele depois da sua entrada em funções.
O segundo refere-se a um email enviado pelo recorrente à D. AM… capeado pelos mapas corrigidos referentes aos desvios contratuais, de onde também não se retira quais os contratos que já estavam negociados e que o recorrente teve que formalizar.
Portanto, a resposta aos citados pontos factuais dada pelo tribunal recorrido deve manter-se inalterada.
Em relação aos pontos 22º, 23º, 24º e 25º o recorrente não cumpre o ónus imposto pelo artigo 640.º, nº 2 al. a) do CPCivil à excepção do AL..., pois que, os minutos 20m40s a 27m21s não sabem a que testemunhas se referem se a AE… ou AD….
Por outro lado o depoimento transcrito da testemunha Y… e da testemunha AL… é contrariado pelo das testemunhas AB… (gravado na audiência de discussão e julgamento do dia 19/02/2014, do min 2:07:06 ao minuto min 2:16:00 ouvido e transcrito pela recorridas) e AC… (depoimento prestado em audiência de discussão e julgamento do dia 25/02/2014, gravado no CD do minuto 29:37 ao minuto 32:45 ouvido e transcrito pelas recorridas).
Dos referidos depoimento resulta com evidência que os contratos tinham, estabelecido um prazo de duração, findo o qual e em caso de incumprimento, eram executados, sendo que, no que concerne aos clientes directos e indirectos, as referidas testemunhas também referiram que os chamados cientes indirectos são também clientes da C…, razão por que no seu entender, a avaliação de rentabilidades dos clientes não pode, assim, excluir os clientes indirectos.
Como assim, perante a contradição dos referidos depoimentos, não pode também a resposta aos pontos em causa ser alterada nos termos pretendidos pelo recorrente, sem qualquer outro elemento de prova coadjuvante.
No que tange aos pontos 26º, 27º, 28º, 29º e 30º o recorrente limita-se a referir que se o tribunal deu relevância ao depoimento da testemunha Y…, deveria ter dado, sem mais, os referidos pontos, também como provados.
Acontece que, também em relação aos referidos pontos a prova produzida pelo recorrente é contrariada pela prova produzida pelas recorridas.
O ponto 26º tinha a seguinte redacção:
A área de serviço Q… só abriu em 12.12.2008, o que impossibilitava qualquer análise pela C…, como o fez?”
A este ponto o tribunal respondeu:
Provado apenas que a área de serviço de Q… não abriu na data prevista”.
Ora, a restante matéria constante deste ponto é logo contrariado pelo depoimento da testemunha AB… que refere que a estação de serviço de Q… tinha consumos registados antes de 12/12/2008 (depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 19/02/2014 do minuto 12:16:21 ao minuto 12:16:40 ouvido e transcrito pelas recorridas).
Também questionada a propósito do AN…, referiu que aquele cliente tinha consumos registados; já o cliente AO… não consumia qualquer quilo de café desde Março de 2008 (pontos 27º e 30.º da base instrutória–depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 19/02/2014 ao minuto 02:17:40).
Por outro lado no ponto 28º perguntava-se:
Por sua vez, a área de serviço de S… celebrou com a Ré um contrato de comodato, tendo um TIR de 32%?
A este ponto o tribunal respondeu:
“Provado que a área de serviço de S… celebrou com a Ré um contrato de comodato”.
Quanto à restante matéria deste ponto não se divisa em que elemento probatório o recorrente a estriba.
Com efeito, o documento constante de fols. 580 (25) refere-se a um email de AL… para o recorrente a dar-lhe conhecimento da realização do contrato de comodato, e o segundo (25ª) refere-se a uma listagem de contratos em incumprimento que, diga-se, não se vê qual a sua relação com a matéria factual que encerravam os referidos pontos.
Também a testemunha AL... foi questionada a propósito do contrato com o AP… (ponto 29º da base instrutória), tendo a esse propósito e a instâncias do Ilustre Mandatário do Recorrente, referido que esse contrato foi formalizado no início de 2008 (depoimento prestado em audiência de discussão e julgamento do dia 25/02/2014 do minuto 04:00 ao minuto 06:20 ouvido e transcrito pelas recorridas)
Como assim também aqui o recorrente não invoca qualquer outro elemento probatório capaz de permitir sanar essa contra prova e dar como provada a matéria dos referidos pontos factuais.
No ponto 32º perguntava-se:
Logo em Julho de 2008 o A. começou a diminuir o investimento, conseguindo até ao fim do ano, que o mesmo passasse de 33% para 27%, tal como consta do reporte de fls. 128/129, da providência?”
Ao referido ponto o tribunal respondeu da seguinte forma:
Provado que, de acordo com o mapa de fls. 128/129 que tem por base um reporte de gestão da F…, com referência a 31.12.08, o investimento no posto de venda acumulado representava em Julho de 2008 33% das vendas de café, passando para 27%, a 31.12.08”.
Ora, analisado o ponto em causa, bem como a resposta dada pelo tribunal, não se alcança o pretendido pelo Recorrente. Com efeito, o facto que objectivamente se retira do quesito em apreço foi dado como provado–a diminuição do investimento de 33% para 27%, como resulta inequivocamente do relatório de peritagem (pág. 16)-, pelo que, não tendo o recorrente logrado demonstrar o nexo causal, o tribunal recorrido não poderia ter ido mais além na resposta ao referido ponto, pelo que a mesma deverá manter-se inalterada.
Quanto ao mais e como bem referem as recorridas nas contra-alegações, o recorrente pretende trazer para o citado ponto o que nele não está, nem cabe, que é o valor de investimento no ponto de venda previsto no Acquisition Finance e o que o compõe. Todavia, o que especificamente se perguntava no ponto 32º nada tem que ver com o Acquisition Finance, mas apenas com os resultados efectivamente atingidos, que não comparam com o Acquisition Finance, mas com o limite definido na reunião do Conselho de Administração de 2008.11.18 (acta nº. 8).
Os pontos 36º e 37º relativos aos investimentos junto do cliente W… foram ambos dados como não provados.
Ora, resulta do relatório de peritagem que o investimento total no referido cliente foi de € 71.271,76 (sem IVA) (cfr. pág. 36 do referido relatório) corroborado, aliás, pelos esclarecimentos por os mesmos prestados na audiência de julgamento do dia 22/01/2014m minutos 1.36, 1.39,15, 1.40,46, 1.41,32 e 1.42,29 (ouvidos e transcritos pelas recorridas), dos quais resulta que o valor dos mútuos também tinha que, inicialmente, ser considerado investimento e não apenas os seus custos, isto é, os juros desse capital durante o prazo de reembolso.
Com efeito, muito embora, parte da despesa seja reembolsada, a referente ao montante do mútuo, como dizer-se que o valor total investido não tenha que comtemplar aquele montante?
É que a TIR (taxa de rentabilidade) também englobava o valor do mútuo como refere o Sr. perito nos esclarecimentos prestados confirmado, quanto a este conspecto, pelo depoimento da testemunha AB….
Para a alteração pretendida convoca também o recorrente o depoimento da testemunha Y… que terá negociado com o cliente em questão.
Contudo, este depoimento é contrariado pelo produzido pela testemunha AC… (depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 25/02/2014 do minuto 35:07 ao minuto 38:45 ouvido e transcrito pelas recorridas) e ainda pelo da testemunha AB… (depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 20/02/2014, gravado do minuto 5:49 ao minuto 7:35 ouvido e transcrito pelas recorridas).
Portanto, não só resulta do relatório de peritagem que o investimento no cliente W… ascendeu a mais de € 70.000,00, como as referidas testemunhas afirmaram que o referido investimento não teve o aval do Conselho de Administração, mais tendo dito que os empréstimos concedidos aos clientes são, considerados e tratados como um investimento, contando inclusivamente para o cálculo da TIR do cliente em apreço.
Acresce que, quanto ao ponto 36º o recorrente não convoca qualquer elemento probatório para que se altere a resposta dada pelo tribunal, sendo que, o ponto 37.º está interligado com o ponto 64º, dado como provado e não impugnado pelo recorrente, razão pela qual não se vê como o recorrente pretende que se altere a resposta dada ao citado ponto.
Resulta, assim, do exposto, que não existe fundamento probatório convocado pelo recorrente para que se altere as respostas dadas a estes pontos factuais pelo tribunal recorridos.
O ponto 43º tinha a seguinte redacção:
Quanto ao acompanhamento da coordenação da área comercial, o A. tinha reuniões semanais nas participadas da Ré C…?”
A este ponto o tribunal respondeu:
Provado apenas que quanto ao acompanhamento da coordenação da área comercial, o A. tinha algumas reuniões nas participadas da Ré C…”.
Para a alteração deste ponto factual o recorrente convoca o depoimento das testemunhas Y…, AD… e Z… e ainda o depoimento de parte do representante legal da Ré C…, AK….
Acontece que, embora as referidas testemunhas tenham afirmado que as referidas reuniões fossem semanais, o certo é que no seu depoimento de parte o legal representante da Ré C…, apenas admitiu que o recorrente tinha reuniões nas diversas participadas desta.
Desta forma e perante a insociabilidade daqueles depoimentos e o referido depoimento de parte, torna-se evidente, não poder este tribunal alterar a resposta ao citado ponto factual no sentido propugnado pelo recorrente.
O ponto 47º tinha a seguinte redacção:
O Autor desde o final de 2008 estava, na prática afastado de qualquer intervenção de fundo na Ré C…?”
A este ponto o tribunal recorrido respondeu não provado.
Sobre ele responderam as testemunhas AB… e AC… e, ao contrário do referido pelo Recorrente, não afirmaram o aí alegado, antes pelo contrário, bastando para o efeito ouvir o depoimento prestado pela testemunha AB…, na audiência de julgamento do dia 20/02/2014, do minuto 39:12 ao minuto 40:50, ouvido e transcrito pelas recorridas) e, ainda, o depoimento da testemunha AC…, prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 25/02/2014 do minuto 53.51 ao minuto 54:35, ouvido e transcrito pelas recorridas) que referiram que, em Janeiro de 2009 o recorrente ainda estava em pleno exercício das suas funções.
Como assim, também a matéria desse quesito deve permanecer inalterada face às versões divergentes apresentadas pelas testemunhas arroladas pelo recorrente e recorridas.
O ponto 48º tinha a seguinte redacção:
Apesar de tudo, em meados de Dezembro já havia concluído a sua parte no plano de Integracão?”
A este ponto o tribunal respondeu não provado.
Quanto a este ponto as testemunhas AB… e AC… foram peremptórias ao afirmar que não existia qualquer plano de integração (depoimento gravados, respectivamente, em 20/02/2014 do minuto 40:51 ao minuto 41:40 e em 25/02/2014 do minuto 54:36 ao minuto 56:40 ouvidos e transcritos pelas recorridas).
Destarte, face a contra prova apresentada pelas recorridas em confronto com o depoimento da testemunha Z…, não pode a resposta dada pelo tribunal recorrido ser alterada, por não existir qualquer elemento coadjuvante para que se valore este depoimento em detrimento do das referidas.
O ponto 49º tinha seguinte redacção:
Mesmo que o Plano de Integração tivesse sido aprovado pelo CA, não seria possível colocá-lo em prática de imediato, dado que um dos pressupostos fundamentais da sua execução era a conclusão do processo de despedimento colectivo de trabalhadores da F…, da responsabilidade do Administrador Financeiro (…) da Ré C… e que não se encontrava concluído na altura da sua destituição (Março de 2009)?
A este ponto o tribunal recorrido respondeu não provado.
Relativamente a este ponto factual o recorrente, justifica a sua impugnação remetendo de forma genérica e desacompanhada de qualquer explicação para alguns documentos constantes do processo, contudo, não diz de que forma é que os referidos documentos demonstram que houve erro de julgamento por parte do tribunal a quo, o que por si só demonstra a falta de razão e sustentabilidade naquilo que alega.
O documento de fols. 673 (49) trata-se de dois emails um da D. AB… para o AK… e outro de AQ… para a D. AB….
Ora, desses emails nada se retira sobre a quem incumbia o processo do despedimento colectivo.
Na verdade, no primeiro deles apenas se faz a pergunta de como estava a decorrer esse processo.
No segundo envia-se o procedimento a seguir para tal processo.
Mas daí resulta porventura que era qualquer dessas pessoas que tinha a responsabilidade de o concluir?
A acta nº 6 do Conselho de Administração, lida, não se vê qual a sua relação com a matéria em causa.
O documento constante de fols. 804 trata-se de emails referentes a uma minuta de um contrato de trabalho por tempo indeterminado, donde não se divisa a sua relevância para a matéria factual em questão.
Por outro lado, o documento, de fls. 810, refere-se a um email enviado por AK… ao recorrente e que antes tinha sido enviado por AS…, no qual são enviados, entre outros, (i) um mapa de pessoal que se refere ter sido revisto pelo recorrente e que deverá ser por ele mantido; e (ii) uma divisão funcional do Conselho de Administração que se refere ter sido igualmente revisto pelo recorrente e no qual (fls. 813 in fine) se refere uma acção do pelouro dos recursos humanos-o despedimento colectivo–com “start day” de 2008.12.01 e que está em consonância com a afirmação da testemunha AD… de que “o pelouro dos recursos humanos foi retirado ao recorrente quando se verificou a falta de capacidade deste na gestão” infra referido.
Portanto, da leitura desse documento o que resulta é que algumas funções do departamento dos recursos humanos deixaram de estar sob a responsabilidade do Recorrente, mas apenas em Dezembro de 2008.
Acresce que, as testemunhas AB… e AC… afirmaram que quem tinha responsabilidade para levar a cabo o despedimento colectivo (depoimentos prestados na audiência de julgamento do dia 20/02/2014 e gravado do minuto 1:43:37 ao minuto 1:46:58 e depoimento prestado na audiência de julgamento do dia 25/02/2014 e gravado do minuto 56:11 ao minuto 59:35 ouvidos e transcritos pelas recorridas) era o recorrente enquanto CEO do grupo.
Por estas razões também não existe elemento fundamento probatório convocado pelo recorrente para que se altere a resposta dada pelo tribunal recorrido ao citado ponto factual.
Quanto ao ponto 50.º o recorrente limita-se a afirmar que a resposta dada é contraditória com a alínea I) dos factos assentes, sem qualquer explicação.
Acontece que, a resposta dada pelo tribunal recorrido não foi a de “provado”, mas apenas a de ”provado o que consta da alínea C da matéria assente”.
Ora, a existir alguma contradição sempre seria, então, entre a alínea “C” e a alínea “I” da matéria assente, o que nunca foi impugnado ou reclamado pelo recorrente.
Todavia, aquelas alíneas não encerram qualquer contradição em si, já que uma coisa é a data da assinatura do contrato de administração-12/12/2007–(alínea C) e outra é a data da eleição do Recorrente–07/01/2008–(alínea I).
Desta forma, tratando aquelas alíneas de duas realidades distintas não poderá haver qualquer contradição entre elas devendo, pois, manter-se a resposta restritiva dada pelo tribunal recorrido ao referido ponto.
Os pontos 51º e 52º tinham, respectivamente, a seguinte redacção:
O documento denominado “Análise das Contas do Exercício de 2008 da F…, G… e N…–Conselho de Administração da C…, SA–Fevereiro de 2009”, reflectia a situação económico-financeira das sociedades C…, S.A., F…, SA., G…, S.A. e N…, Lda e respectivas performances no exercício de 2008?
Apresentando o EBITDA de 2008 o valor de € 2.052.milhares e o seu rácio real/objectivo apenas 50,9%?”.
A estes pontos o tribunal recorrido respondeu:
O_documento denominado "Análise das Contas do Exercício de 2008 da F…, G… e N…-Conselho de Administração da C…, SA- Fevereiro de 2009", foi apresentado como encerrando uma avaliação aproximada da situação económico-financeira das sociedades C…, F…, S.A, G…, SA e N…, Lda e respectivas performances no exercício de 2008 – resposta à matéria do art. 51.º, da base instrutória”.
O EBITDA referenciado na acta n.º 12, de 23.2.09, apresentava um valor de € 2.052.000€ e um rácio real/ objectivo de 50,9%”.
Em relação aos pontos 51º e 52º refere o recorrente ter havido erro de julgamento, porquanto e cita-se: “considerando o referido pelos Sr. Peritos quanto ao quesito 51.º a resposta deve ser corrigida.”
Acontece que, o recorrente não explica o que é que, afinal, foi referido pelos peritos que leve a concluir que o tribunal tivesse dada uma resposta errada a propósito da referida matéria.
Aliás, do referido relatório resulta que “existem diferenças entre os quadros anexos à acta do Conselho de Administração de 23 de Fevereiro de 2009 e as demonstrações financeiras apresentadas pelas Empresas nos Relatórios e Contas de 2008 em 29 de Julho de 2009.”
Acresce que, não foram apenas os peritos que referiram que existiam essas diferenças, também as testemunhas AB… e AC… também o afirmaram em tribunal tendo, no entanto, e ao contrário do que decorre do relatório de peritagem explicado o motivo das referidas desconformidades (depoimentos prestados na audiência gravado do minuto 42:24 ao minuto 48:30 e gravado do minuto 59:10 ao minuto 1:10:30, respectivamente).
Como assim, também em relação a estes pontos factuais não existe fundamento probatório indicado pelo recorrente para que se altere a resposta daca pelo tribunal a quo.
Relativamente ao ponto 53º da base instrutória que o tribunal deu como provado, o recorrente limita-se a afirmar que a resposta dada pelo tribunal recorrido contraria o documento 85A junto aos autos.
Ora, valem aqui, mutatis mutandis as considerações feitas a propósito do ponto 49º.
Neste conspecto veja-se ainda o depoimento da testemunha AB… (depoimento prestado na audiência de discussão e julgamento do dia 20/02/2014 do minuto 47:56 ao minuto 52:00 ouvido e transcrito pelas recorridas) onde afirma que todas as sociedades pela C…, a F…, a G…, a J… a N… e a M…, a gestão executiva era efectuada pelo autor que tinha a seu cargo todas as áreas, menos a do controlo financeiro, nomeadamente responsabilidade pela coordenação, acompanhamento e controlo de toda a actividade operacional incluindo actividade comercial, produção, qualidade e marketing.
Também em relação a este ponto factual deve permanecer inalterada a resposta dada pelo tribunal recorrido.
Em relação ponto 56.º o recorrente diz que se deve dar como não provado, face à mesma resposta dada ao ponto 55º e por este ser consequência daquele.
Ora, não vemos como a resposta ao ponto 55º tenha que condicionar a resposta ao ponto 56º já que, tratam de realidades diversas embora se possam referir aos mesmos contratos, pois que, num caso pergunta-se o impacto positivo e negativo de todos os contratos e no outro as perdas potenciais.
Além disso, a resposta dada pelo tribunal recorrido ao citado ponto factual está em consonância com aquilo que está vertido no relatório de peritagem (cfr. fols. 29 do relatório) que, a propósito do referido quesito afirmou expressamente que se apurou uma perda potencial de € 1.022,098 no EBITDA da F… e da G…, pelo que a resposta do tribunal encontra-se perfeitamente sustentada devendo, assim, manter-se.
No que tange aos pontos 57.º, 58.º e 59.º a respeito dos contratos autorizados pelo recorrente, mereceram os mesmos, por parte do tribunal recorrido, respostas restritivas e que reproduzem na íntegra as conclusões dos peritos–cfr. pág. 29 e ss. do relatório de peritagem.
A esse propósito convoca, também o recorrente os alegados esclarecimentos prestados pelos peritos, todavia, não delimita que esclarecimento são esses nem onde se encontram registados, não cumprindo, também aqui, o ónus imposto pela lei.
Ainda assim, sempre dirá que, a propósito dos chamados contratos indirectos, quando questionados se os tinham analisado referiram que não.
Portanto, também aqui não foi indicado pelo recorrente fundamento probatório para que se altere a resposta dada pelo tribunal recorrido, nem vemos onde, sobre essa matéria, existam os propalados elementos contraditórios a que o recorrente se refere.
O ponto 61º da base instrutória tinha a seguinte redacção:
Apesar de se ter comprometido a solicitar a aprovação do CA para novos investimentos a realizar em clientes e da não aprovação de pedidos posteriormente feitos pelo A. aos restantes administradores, o Autor autorizou que fossem realizados investimentos em clientes da F…, em Novembro e Dezembro de 2008, no total de € 55.991,58?”.
A esse ponto o tribunal respondeu da seguinte forma:
“Provado que apesar de se ter comprometido a solicitar aprovação do CA para novos investimentos a realizar em clientes, o autor autorizou que fossem realizados investimentos superiores aos aprovados.”
Ora, tal resposta vai de encontro ao referido pelos peritos no respectivo relatório (cfr. pág. 31), onde se refere “que não existe evidência explícita em sede de Conselho de Administração da aprovação, case by case, dos referidos investimentos” e as referências que os mesmos fazem à alegada aprovação, por e-mail, decorre sempre que a mesma é condicional: “Face às TIR ok. Porém validar se encaixa no mapa de tesouraria”.
A este propósito, importa ainda ter presentes os esclarecimentos prestados em audiência de discussão e julgamento do dia 22/01/2014, minuto 1.21.41 por um dos peritos ouvido e transcrito pelas recorridas nas contra alegações, que refere que não havia nunca uma decisão final, o fecho do negócio era sempre condicional e ainda o depoimento da testemunha AB… (prestado na audiência de julgamento do dia 25/02/2014 do minuto 1:06:20 ao minuto 1:08:25 ouvido e transcrito pelas recorridas) que referiu um conjunto de casos de investimento em que o recorrente tendo-os submetido à aprovação não esperou pela mesma e autorizou-os.
Como assim, não existe fundamento probatório indicado pelo requerido para que se altere a resposta ao citado ponto nos termos pretendidos pelo recorrente.
O ponto 69º tinha a seguinte redacção:
Face à perda do distribuidor ‘H…’ e por forma a assegurar a perda do menor número de clientes possível e ver os efeitos da perda do distribuidor na actividade da F… (n.º de clientes perdidos, número de clientes indecisos, quantificação da ‘perda’ em kg e valor, entre outros), foi acometido ao A. esse trabalho, que se limitou a apresentar algumas referências, de forma vaga e verbal, sem quantificação das perdas em termos de kg e valor?
A este ponto o tribunal respondeu da seguinte forma:
Face à perda do distribuidor 'H…' e por forma a assegurar a perda do menor número de clientes possível e ver os efeitos da perda do distribuidor na actividade da F… (n.º de clientes perdidos, número de clientes indecisos, quantificação da 'perda' em kg e valor, entre outros), ao A. incumbia esse trabalho, que se limitou a apresentar algumas referências, de forma vaga e verbal, sem quantificação das perdas em termos de kg e valor”.
Quanto a esta matéria, o recorrente transcreve trechos do depoimento da testemunha Y… que relatam de que forma é que tentou recuperar clientes no seguimento da saída da H….
Também é verdade que o recorrente forneceu, via email 42-A, fols. 608 dos autos, ficheiros onde constam o número de clientes perdidos, clientes indecisos e clientes recuperados e ainda os consumos identificados de cada cliente em kg e que, nesse mesmo documento, constam ainda dois ficheiros, o primeiro referente aos investimentos efectuados na recuperação de clientes e o segundo quanto referente aos investimentos efectuados em clientes que não forma recuperados.
Acontece que, não era apenas esse o trabalho que foi acometido ao recorrente, ou seja, o que se pretendia era que fosse desenvolvido um trabalho não só para evitar a perda do menor número de clientes mas também verificar os efeitos da perda desse distribuidor- “H…”- na actividade da F…, o que implicava naturalmente estudar e avaliar o impacto em termos de facturação e rentabilidade dos clientes perdidos.
Aliás, que o trabalho desenvolvido nesse âmbito pelo recorrente não correspondia aquilo que lhe havia sido solicitado mostram-nos o conteúdo das actas nºs 8 e 10 juntas aos autos cujas passagens o tribunal recorrido verteu na decisão da matéria de facto, o que, diga-se, também é corroborado pelo depoimento da testemunha AB… prestado na audiência de julgamento do dia 20/02/2014, gravado do minuto 1:14:04 ao minuto 1:16:51 ouvido e transcrito pelas recorridas.
Desta forma, a resposta dada ao apontado ponto factual pelo tribunal recorrido não nos merece censura.
Os pontos 72º e 86º tinham, respectivamente, a seguinte redacção:
A alienação do imóvel da F… e seus equipamentos era de extrema relevância na medida em que, por um lado, permitia reduzir o nível de responsabilidade da empresa para com os bancos e, por outro lado, permitia a geração de liquidez da empresa com tesouraria muito limitada, tendo o A. assumido a promoção dessa venda em Ag./08, embora só tivesse iniciado o processo em Out./08?”
Na verdade, mesmo antes de o imóvel ser ou poder ser alienado, podia o Autor ter tratado da respectiva avaliação, encomendado um levantamento topográfico, estabelecido contactos com potenciais interessados e com agências imobiliárias, realizado visitas, etc?”.
A esses pontos o tribunal recorrido respondeu pela forma seguinte:
A alienação do imóvel da F… e seus equipamentos era relevante na medida em que, por um lado, permitia reduzir o nível de responsabilidade da empresa para com os bancos e, por outro lado, permitia a geração de liquidez da empresa quando a tesouraria era já muito limitada, tendo o A assumido a promoção dessa venda, embora só tivesse iniciado o processo em Out./08”.
Mesmo antes de o imóvel ser ou poder ser alienado, podiam ser efectuadas diligências prévias”.
Relativamente ao ponto 72º o recorrente diz ter enviado um email em 30 de Setembro com o relatório final de avaliação do imóvel em causa.
Como assim, a resposta ao citado ponto factual deveria ter espelhado essa realidade.
Em consonância altera-se a resposta ao citado ponto 72º pela forma seguinte:
A alienação do imóvel da F… e seus equipamentos era relevante na medida em que, por um lado, permitia reduzir o nível de responsabilidade da empresa para com os bancos e, por outro lado, permitia a geração de liquidez da empresa quando a tesouraria era já muito limitada, tendo o A assumido a promoção dessa venda, no dia 30 de Setembro de 2008 enviou à Ré C… um email com o relatório final de avaliação do imóvel em causa”.
Já quanto ao ponto 86º, torna-se evidente que antes da venda do imóvel poderiam ter sido realizadas outro tipo de diligências, como visitas, contacto com as imobiliárias, levantamentos topográficos etc., pois que, como é evidente a avaliação não pressupõe as referidas diligências.
Ora, demonstrando o recorrente que realizou apenas a avaliação do imóvel o tribunal não podia dar outro tipo de resposta ao ponto 86º a não ser aquela que deu, corroborado que foi pelo depoimento das testemunhas AB… e AC… ouvidos e transcrito pelas recorridas nas contra alegações, o que, diga-se, até já decorria das regras da experiência.
No que concerne à impugnação do ponto 77º da base instrutória, o recorrente limita-se a referir que o orçamento da F… para 2008 não foi apresentado aos peritos, o que deveria constar na resposta ao ponto em apreço.
Acontece que, não é isso que consta do seu relatório, como expressamente se infere da sua pág. 36 “(…) os peritos obtiveram troca de correspondência enviada pelo Dr. AK… no dia 7 e Maio de 2008, onde é referido tal como aprovado na última reunião de CA junto envio versão final do orçamento da F… 2008’. Os peritos obtiveram junto do R. e do A. o anexo ao referido e-mail, que consistia num ficheiro excel que integra o orçamento da F… de 2008, que apresenta um EBITDA de € 1.220.886 e um volume de vendas de € 4.009.019.”
É assim bom de ver que, a mera análise do relatório de peritagem, não corrobora a obscuridade que o recorrente assaca à resposta dada pelo tribunal recorrido ao citado ponto factual.
Perguntava-se no ponto 78º da base instrutória:
A perda do cliente H… deveu-se, em boa parte, ao Autor que, repetidamente avisado para a possibilidade de perda desse cliente para um concorrente, nada fez para garantir a sua permanência.”
A esse ponto o tribunal recorrido respondeu pela forma seguinte:
Provado que o Autor foi avisado para a possibilidade de perda desse cliente para um concorrente, nada fez para garantir a sua permanência.”
Na sua impugnação o recorrente limita-se a afirmar que nenhuma prova concreta foi produzida nesse sentido e, como tal, o referido ponto não podia ter sido considerado como parcialmente provado.
Ora, a resposta dada pelo tribunal a quo encontra-se perfeitamente sustentada, pelo menos, no depoimento da testemunha AC…, prestado na audiência de julgamento do dia 25/02/2014, gravado do minuto 1.25.40 ao minuto 1.32.15, ouvido e transcrito pelas recorridas.
Acresce que, também em relação depoimento convocado pelo recorrente para sustentar a sua versão (conflito entre as recorridas) não cumpre ele o ónus de impugnação a que se refere o artigo 640.º, nº 2 al. a) do CPCivil já abundantemente citado.
Por conseguinte não existe fundamento probatório convocado pelo recorrente para que se altere a resposta dada pelo tribunal recorrido.
Relativamente ao ponto 82º, também impugnado, no qual se perguntava “Dos 684 clientes que eram fornecidos pela H…, apenas 79 mantiveram consumos?”, o Recorrente diz que a resposta dada vai contra as conclusões dos peritos, pelo que deverá ser dado como não provado.
Ao referido quesito respondeu o tribunal: “provado que, de um total e 679 clientes que eram fornecidos pela H…, 105 apresentaram consumos.”;
Ora, quanto ao numero de clientes com consumos–105–os peritos concluíram que:
das entidades que tinham sido inicialmente identificadas (79) apenas mais 26 (em adição) tiveram pelo menos uma aquisição (consumo de café) nos anos de 2008 ou 2009, totalizando as apuradas 105 entidades que apresentaram consumos.”
Portanto, a resposta restritiva dada pelo tribunal a quo encontra arrimo nas conclusões retiradas pelos próprios peritos.
Deve, assim, manter-se a resposta dada pelo tribunal recorrido ao ponto em questão.
No que tange ao ponto 84º importa, desde logo, que se diga que o recorrente neste segmento recursivo deve limitar-se estritamente à impugnação da decisão da matéria de facto, estando a subsunção jurídica reservada para outro âmbito.
Isto dito, o ponto em causa tinha a seguinte redacção:
Por outro lado, a “cedência” da marca V…, permitiu à X… aceder ao seu uso exclusivo sem pagar qualquer contrapartida, directa ou indirecta, tendo sido um mau negócio para a C…?”.
A este ponto o tribunal respondeu da seguinte forma:
Provado que a cedência da marca V… à X… foi efectuada sem qualquer contrapartida”.
Ora, consultando “online” a base de dados de marcas INPI (cfr. http://servicosonline.inpi.pt/pesquisas/main/marcas.jsp) verifica-se que que a marca V… está registada desde 1988 em nome da “F…, Lda.”, cuja renovação foi pedida em 07-01-2002, tendo sido transmitada para a X1..., S.A. em 28/04/2008.
Por outro lado a existência dessa marca resulta evidenciada do documento junto pelo recorrente sob a designação …, em audiência de discussão e julgamento de 2014.03.10, nos termos da qual a marca nacional n.º ……, com a designação AT…, foi recusada precisamente por reclamação apresentada pela F…, em 05.11.2007, por ser titular exactamente da marca nacional V… conflituante com aquela.
Acresce que, não se percebe a impugnação formulada pelo recorrente face à resposta dada pelo tribunal recorrido, pois que, como resulta do depoimento das testemunhas AB… e AC… ouvidos e transcritos pelas recorridas, a cedência da referida marca foi feita sem qualquer contrapartida.
Nestes termos não se vêm razões para alterar a resposta dada pelo tribunal a quo em relação ao referido ponto factual.
Finalmente o ponto 88º da base instrutória tinha a seguinte redacção:
Pouco tempo após a sua destituição, o A. voltou a ser contratado pela X…, aliciando inclusivamente diversos colaboradores e clientes das participadas da C… a irem trabalhar com ele?”.
A este ponto o tribunal recorrido respondeu da seguinte forma:
Provado apenas que, depois da sua destituição o A. voltou a ser contratado pela X…, aliciando inclusivamente alguns colaboradores das participadas da C… a irem trabalhar com ele”.
A este respeito alega o recorrente que nenhuma testemunha confirmou o aliciamento de trabalhadores e clientes e, como tal, a resposta ao referido quesito devia cingir-se ao facto de o próprio ter voltado a trabalhar com a X….
Todavia, veja-se o depoimento da testemunha AU… (prestado na audiência de julgamento do dia 20/02/2014, gravado do minuto 14:31 ao minuto 16:50 ouvido e transcrito pelas recorridas) que confirma o aliciamento que o recorrente fez aos clientes da Recorrida, pelo que a resposta ao citado ponto deve manter-se, por não ter o recorrente convocado qualquer outro meio probatório que o infirme.
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Decorre do exposto que a apreciação da Mmª juiz a quo-efectivada no contexto da imediação da prova-, surge-nos assim como claramente sufragável, com iniludível assento na prova produzida e em que declaradamente se alicerçou, nada justificando por isso a respectiva alteração, excepto no que tange ao ponto 72º (facto descrito em 75º) nos termos supra indicados.
Como assim, temos de convir que, os meios probatórios indicados pelo recorrente, não são de molde a sustentar a tese que por ele vem expendida, pese embora se respeite a opinião em contrário veiculada nesta sede de recurso, havendo que afirmar ter a Mmª juiz captado bem a verdade que lhe foi trazida ao processo, com as dificuldades que isso normalmente tem.
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Improcedem, assim, as conclusões formuladas pelo recorrente no que tange à impugnação da matéria de facto.
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Permanecendo inalterada a decisão sobre a matéria de facto, excepto quanto ao facto descrito em 75º da fundamentação factual, a segunda questão que vem colocada no recurso consiste em:

b)- saber se o tribunal fez, ou não, a sua subsunção de forma correcta.

Dissente, desde logo, o recorrente quanto à qualificação da relação jurídica feita pelo tribunal recorrido e que se terá estabelecido entre aquele e a Ré C… quando celebraram o contrato intitulado “Contrato de administração”.
Todavia, não vemos qual seja a divergência entre o enquadramento feito pelo recorrente e aquele que o tribunal recorrido acolheu.
Na verdade, na referida decisão propendeu-se para o entendimento de que a relação de administração assume natureza contratual, tal qual, se bem entendemos as alegações recursivas, o recorrente defende.
Com efeito, tal como se refere na decisão recorrida face ao direito societário vigente esta é, sem dúvida, a orientação mais adequada, mesmo nos casos em que, por imposição legal ou estatutária, a escolha dos titulares da gestão ou de algum deles não é feita pelo colectivo dos sócios.[10]
Portanto, dada a natureza jurídica que intercede entre a sociedade e os seus administradores (acto de nomeação e contrato de prestação de serviços ou de emprego)[11], esta relação vem a reger-se por uma disciplina própria (a do Código das Sociedades comerciais), integrada, subsidiariamente, no caso de lacunas, pelas disposições que regem os outros tipos de sociedade e, ainda, pelas normas do mandato, dado o artigo 987.º, nº 1 do Código Civil se ter convertido em solução de direito positivo[12], sendo certo que primeiro se aplicam as normas comerciais e só depois as do civil, conforme vem do disposto no artigo 3.º do Código Comercial.
Evidentemente que, tratando-se de uma relação contratual isso significa, como defende o recorrente, que dele resultam obrigações recíprocas.
Isto dito, decorre do facto descrito em 3º da fundamentação factual que “Após esclarecimentos recíprocos, A. e Ré C… celebraram, em 12.12.2007, um contrato que denominaram de “Contrato de administração”, passando o A. a integrar o conselho de administração, conforme cópia junta, desde logo à providência cautelar, a fls. 85, do p.p., no âmbito do qual passava a ser o responsável pela coordenação, acompanhamento e controlo de toda a actividade operacional, incluindo actividade comercial, produção, qualidade e marketing, devendo ainda assegurar a execução das deliberações do Conselho de Administração que lhe fossem delegadas e as deliberações do órgão a que pertencia.
Tal mandato tinha a duração de 3 anos.
Acontece que, por deliberação unânime de todos os representantes das 2ª, 3ª RR. e das intervenientes, o A. foi destituído, conforme acta da Assembleia Geral da Ré C… de 10.03.2009, anexa à carta dessa comunicação datada de 11.3.09–cfr. docs. de fls. 109 a 127, da providência apensa.
Para o efeito, fundamentaram a destituição do A. no seguinte:
1-incumprimento dos objectivos, de acordo com a “análise de contas”;
2- desvios (negativos) de cumprimento dos contratos por parte dos clientes;
3- gastos excessivos em investimentos nos pontos de venda;
4- prática de descontos não autorizados;
5- perdas dos clientes da H… e efeitos da perda desse distribuidor;
6- não realização de reuniões de coordenação;
7- cedência de uma marca detida pela F… a uma concorrente;
8- não elaboração de um plano de integração; e
9- atraso na venda dos imóveis e equipamentos pertencentes à F… (facto descrito em 23º da fundamentação factual).
A questão que agora se coloca é se existia, ou não, fundamento para a destituição do recorrente com justa causa.
E antes de se prosseguir nessa análise importa, que se equacione uma outra questão preliminar e que tem que ver com o ónus da prova.
Em face do princípio geral consignado no artigo 342.º do CCivil, cabe a quem invoca um direito a prova dos respectivos “factos constitutivos” e, à parte contrária, a dos “factos impeditivos, modificativos ou extintivos” desse direito.
A repartição desse ónus não obedece a um puro critério de normalidade, devendo antes fazer-se de harmonia com a previsão traçada na norma jurídica que serve de fundamento à pretensão deduzida, e “não se trata de lançar o ónus da prova do facto sobre a parte que o invocou”, pois o encargo “imposto a quem alega o direito não se estende a todos os factos que interessam à vigência actual desse direito mas somente aos factos constitutivos dele”.[13]
Esses factos são os “que servem de fundamento à acção” ou os “idóneos, segundo a lei substantiva, para fazer nascer o direito que o autor se arroga (...)”[14] não importando, para este efeito, a distinção entre factos positivos ou negativos.
Ora, não tem sido unânime a resposta dada pela jurisprudência sobre a questão a quem cabe o ónus da prova da existência de justa para a destituição.
Com efeito, uma vezes foi entendido que a falta de justa causa se trata de elemento constitutivo do direito invocado pelo autor, competindo a este a sua prova; outras vezes seguiu-se a orientação de que configurando a justa causa de destituição do gerente como circunstância impeditiva do direito à indemnização pelo gerente destituído, o ónus da prova dos respectivos factos caberia à sociedade.
Na doutrina cabe mencionar a posição de João Labareda[15] que refere que, em seu entender, ao destituído basta “invocar a inexistência de justa causa na acção ressarcitória movida contra a sociedade, cabendo a esta destruir a pretensão através da invocação e prova de factos que fundamentem o afastamento compulsivo do gestor”.
Salienta este autor que sendo embora a acção destinada a obter a indemnização a que o gestor se julga com direito uma acção condenatória, ela comporta uma apreciação negativa acerca da inexistência de justa causa e, por outro lado, se for posto a cargo do destituído o ónus de demonstrar não ter havido fundamento para a destituição, estaremos, pela própria natureza da situação e atendendo à multiplicidade de eventos que nas circunstâncias da vida societária pode constituir justa causa para a cessação unilateral da relação de administração, a exigir uma prova excepcionalmente difícil, quando não mesmo impossível.
No nosso entendimento será de seguir a corrente jurisprudencial mencionada supra em segundo lugar.
Como se refere no acórdão do STJ de 1-6-1999[16] “a própria letra da lei aponta no sentido de a justa causa dever ser qualificada como facto impeditivo do direito a indemnização, por ter a expressão «destituído sem justa causa» o significado de a destituição haver sido deliberada sem a efectiva existência desse fundamento ou sem a sua prova; e mostra-se irrelevante o facto de, no acto da deliberação, se ter invocado algum motivo que poderia integrar justa causa, uma vez que isso não pode alterar as regras do ónus da prova, sob pena de estas ficarem na livre dependência da vontade dos sócios”.
No acórdão do STJ de 10-2-2000[17] conclui-se, igualmente, que o “sem justa causa” não é facto negativo a provar pelo autor; ao autor cumprirá provar que era gerente e foi destituído e «à ré cumpre provar que foi com razões para isso, para impedir que sobre ela recaia o dever de indemnizar”.
Também no acórdão do STJ de 15-2-2000[18], desta feita quanto a administrador de sociedade anónima, se considerou sumariamente o seguinte: “o administrador (ou o gerente) da sociedade pode ser livremente destituído, mas a deliberação pode ser tomada com invocação de justa causa ou sem invocação de qualquer fundamento; esta última hipótese dá lugar a indemnização, isto porque o «largo direito de a sociedade fazer cessar por acto unilateral seu, a relação de administração, não pode desconsiderar os interesses dos administradores gestores e directores das sociedades que, em resultado da destituição ficariam no desemprego, sem que lhes fosse dito, na destituição ad nutum, porquê»; daí que se venha entendendo que «embora a destituição unilateral pela sociedade da relação de administração seja um acto lícito, não é um acto isento de responsabilidade civil, fazendo antes nascer o direito de indemnização para os destituídos»; a ser o dever de indemnização «a consequência natural, normal, lógica, da destituição ad nutum, pelo que cumpre à sociedade invocar e provar a justa causa de destituição”.
Mais recentemente, no acórdão de 11-7-2006 o S.T.J.[19] reafirmou que “o dever de indemnizar é a consequência natural da destituição ad nutum, pelo que cumpre à sociedade invocar e provar a justa causa da destituição, como matéria de excepção que é, nos termos do art. 342, nº 2 do CC»; o que veio a repetir no acórdão de 26-10-2010 ([11]), dizendo que no caso concreto «importa referir que não ficou demonstrada a existência de justa causa da destituição do autor, cujo ónus competia à ré, na qualidade de facto impeditivo do direito à indemnização do gerente destituído, nos termos do disposto pelos artigos 257º, nº 7, do CSC, e 342º, nº 2, do Código Civil”.
Como já supra se referiu, é esta a corrente jurisprudencial que nos parece ser de seguir.
Com efeito, a acção destinada a obter a indemnização a que um gerente destituído se julga com direito invocando a inexistência de justa causa, é uma acção condenatória que comporta uma apreciação negativa acerca dessa inexistência, pelo que, face ao disposto no artigo 343º do Código Civil, compete à sociedade a invocação e prova dos factos que fundamentam o afastamento compulsivo do gerente.
Decorre, pois, do exposto que impendia sobre as Rés recorridas a prova de que a destituição do Autor recorrente ocorreu com justa causa.
Mas, no que vem a traduzir-se o conceito de justa causa para estes efeitos?
Como se verifica do artigo 257.º, nº 6 do C.S.Comerciais no caso das sociedades por quotas (tal como o artigo 430.º-para os directores das sociedades anónimas), a lei não fornece a definição ou um conceito de justa causa nem sequer enumera casuisticamente as situações susceptíveis de constituírem justa causa, antes formula exemplos genéricos e vagos, cujas valorações ajudarão, no entanto, a delimitar e a apreender o conteúdo desse conceito indeterminado.
Salvo situações específicas–violação da proibição de concorrência (artigo 254.º, nº5 do CSC)–não se descrevem os comportamentos que constituem razão para a exoneração do gerente.
Estabelece o artigo 259.º do mesmo diploma que “os gerentes devem praticar os actos que forem necessários ou convenientes para a realização do objecto social, com respeito pelas deliberações dos sócios”.
E prescreve o artigo 64.º do CSC que:
Os gerentes ou administradores da sociedade devem observar:
a) Deveres de cuidado, revelando a disponibilidade, a competência técnica e o conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções e empregando nesse âmbito a diligência de um gestor criterioso e ordenado; e
b) Deveres de lealdade, no interesse da sociedade, atendendo aos interesses de longo prazo dos sócios e ponderando os interesses dos outros sujeitos relevantes para a sustentabilidade da sociedade, tais como os seus trabalhadores, clientes e credores.
Entre outros, o gerente está vinculado aos deveres de cuidado [tem que revelar disponibilidade, competência técnica e conhecimento da actividade da sociedade adequados às suas funções,][20], de diligência [deve ser um gestor criterioso e ordenado dentro das suas atribuições de gestão tal como actuaria um homem de negócios de prudência razoável] e de lealdade [deve zelar pelos interesses da sociedade e dos seus sócios e cuidar da sustentabilidade daquela e não quebrar os laços de confiança ou fudicia nele depositados, actuando em conformidade com ela] e à proibição de concorrência [não pode, sem o consentimento dos sócios, exercer, por conta própria ou alheia, actividade concorrente com a da sociedade, entendendo-se como tal “qualquer actividade abrangida no objecto desta, desde que esteja a ser exercida por ela ou o seu exercício tenha sido deliberado pelos sócios]–cfr. arts. 64.º nº 1 als. a) e b) e 254.º nºs 1 e 2 do CSC.
O art.º 64 tem sido entendido, pela doutrina nacional, como a norma jurídica que fundamenta a existência de prosseguir o “interesse social”, na condução os negócios societários, interesse que se não esgota na mera recondução aos interesses da sociedade, dos sócios e/ou dos trabalhadores.
Distingue o legislador agora, como já se referiu os deveres de cuidado (alínea a), dos deveres de lealdade (alínea b); de algum modo a obrigação de diligência prescrita na anterior redacção reconduz-se ao actual dever de cuidado, enquanto que a obrigação de prosseguir o interesse social. Uma aproximação, segundo alguns autores às doutrinas de Common Law de inspiração anglo-saxónica e norte americana.[21]
Não basta, porém, a simples violação de algum desses deveres para que o gerente possa ser judicialmente destituído; é necessário que se trate de uma violação grave que comprometa a confiança dos sócios no gerente.
Como já se referiu, apesar da menção genérica constante do nº 6 do indicado artigo 257.º, (430.º para as sociedades anónimas) não contem a lei [o CSC] qualquer definição dogmática do conceito de “justa causa” de destituição do gerente.
Têm sido a jurisprudência e a doutrina a levar a cabo tal tarefa, indicando como justa causa:
● qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual e segundo a boa fé, não seja exigível à sociedade a continuação da relação contratual com o seu gerente;
● todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim;
● qualquer conduta que possa fazer desaparecer os pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento da relação contratual societária;
● toda a actuação que, pela sua gravidade, importe, por razões justificadas, a quebra de confiança entre a sociedade e o gerente.
Na jurisprudência, podem ver-se, entre outros, os Acórdãos do STJ de 11/07/2006, desta Relação do Porto de 30/03/2006, proc. 0536255, de 01/02/2011, de 12/05/2008.[22]
Na doutrina, destacam-se Menezes Cordeiro[23] que, depois de enumerar vários exemplos de comportamentos geradores de justa causa de destituição apreciados pelos Tribunais Portugueses, defende que a justa causa exige um comportamento culposo do gerente que, “pela sua gravidade e consequências, torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação contratual com a sociedade”, acrescentando que aquela pode analisar-se em dois pressupostos: a ilicitude que engloba “a violação dos deveres de gerência, sejam eles deveres específicos legais (por ex., a proibição de concorrência ou o dever de relatar a gestão), deveres específicos estatutários (por ex., convocar os sócios com certa periodicidade) ou deveres genéricos (por ex., actuar com lealdade, com urbanidade e com respeito pela integridade patrimonial da empresa ou dos seus sócios” e a culpa que se traduz no “juízo de censura inerente às violações perpetradas; esta, perante a violação de deveres específicos, presume-se, nos termos do artigo 799º/1 do Código Civil”.
Por sua vez João Labareda[24], refere que “o traço essencial caracterizador da ideia de justa causa de destituição … é a inexigibilidade à sociedade de, face a circunstâncias entretanto verificadas, manter os laços que a ligam ao gestor nessa qualidade, o que a ter de acontecer sacrificaria os seus interesses de modo não razoável e transcenderia os ditames da boa fé”.
Já Raul Ventura[25], não fornece nenhuma definição jurídica de justa causa, limitando-se a reconhecer que “o art. 257º não define justa causa, mas aponta, exemplificativa e genericamente, como tal a violação grave dos deveres do gerente e a sua incapacidade para o exercício normal das respectivas funções”, e a dar vários exemplos de comportamentos que podem reconduzir-se a tal conceito, alguns deles também indicados por António Caeiro.[26]
Como refere Baptista Machado[27] a justa causa será “qualquer circunstância, facto ou situação em face da qual e segundo a boa fé, não seja exigível a uma das partes a continuação da relação contratual; todo o facto capaz de fazer perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim, qualquer conduta que possa fazer desaparecer os pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento da relação”.
Resulta, assim, do exposto que nos parece evidente que é, em concreto, e objectivamente que se afere se a conduta imputada ao gerente constitui motivo de destituição com justa causa, isto é, se o facto ou situação imputados prejudicam de tal modo o interesse social que impõem a ruptura do vínculo, se afrontam a actuação de um gestor criterioso e ordenado, em benefício do interesse social e tendo em conta o interesse dos sócios.
Feitos estes breves considerandos teóricos importa, agora, que desçamos novamente ao caso concreto que nos ocupa, perscrutando se, da matéria factual que nos autos resultou demonstrada (só essa e não qualquer outra), ocorria justa causa para a destituição do Autor recorrente, ou o mesmo é dizer se as recorridas fizeram, ou não, prova da existência de justa causa para aquela destituição nos vários fundamentos que alinharam na acta da Assembleia Geral da C… de 10/03/2009 e que anexaram à carta enviada ao recorrente com data de 11/03/2009.
Como resulta dos autos, o mandato conferido ao Autor recorrente visava alcançar os objectivos pretendidos pelas Rés plasmados no plano de negócio delineado, mais concretamente os estabelecidos de acordo com o Business Plan para 2008 e do Orçamento anual para os anos seguintes.
No Plano de negócios da Ré C…, os principais alvos de aquisição por parte daquela, bem como a previsão da evolução dos negócios e resultados financeiros da mesma, ano por ano, ou seja, o planeamento de como iriam atingir os objectivos pretendidos foram apresentados ao A., à data da sua contratação para administrador (facto descrito em 2º da fundamentação factual).
Perante esse documento, ficou o recorrente a conhecer, de forma prévia e esclarecida, o projecto de investimento pretendido que tinha que promover, executar e implementar, no âmbito das suas funções.
Como tal, definido estava, no Business Plan para 2008, como objectivo um rácio real de EBITDA de 4.032 milhões de euros, como consta do documento de fls. 87, do p.p., junto com a providência apensa.
Acontece que, tendo em conta esse objectivo, as recorridas por o mesmo não se encontrar cumprido como era devido e exigido, alegando o facto de apenas ter sido alcançado um EBITDA de € 2.052.000€ e, como tal, um rácio real/objectivo de 50,9%, invocaram esse motivo como fundamento para um pedido de renúncia do recorrente o qual, por não concordar com a posição das demandadas, se recusou a apresentar a mesma, dando lugar, então, à destituição dele por parte das demandadas, com fundamento em justa causa.
Ora, na acta do Conselho de Administração n.º 12, de 23.02.09, foi apresentado um documento referente à situação económico-financeira das sociedades C…, F…, S.A, G…, SA e N…, Lda e respectivas performances no exercício de 2008, que encerrava uma avaliação aproximada dos valores que iriam ser apurados (não incluindo a sociedade J…, S.A.), reflectindo a situação económica e financeira, bem como os resultados do exercício de 2008 da C…, F…, S.A, G…, SA e N…, Lda (facto descrito em 59º).
Está também provado nos autos que o EBITDA referenciado na acta n." 12, de 23.2.09, apresentava um valor de € 2.052.000€ e um rácio real/ objectivo de 50,9% (facto descrito em 60º).
Daqui resulta não ter ficado demonstrada nos autos a versão alegada pelo recorrente de que havia atingido os objectivos os objectivos do plano, concretamente atingindo um EBITDA superior a 55%.
E, embora para o cômputo do EBITDA relevante, se tivesse de considerar o valor da participada M…, o facto é que o mesmo é de € 14.086,00, o que representa uma percentagem de EBITDA no orçamento de 2008, de 52,4% (facto descrito em 80º).
Acresce que, considerando os valores constantes do relatório de contas de 2008 quanto ao EBITDA apresentado no orçamento 2008 da F…, relativo a 2008, constata-se que o mesmo é de € 1.220.886, ou seja, cerca de 51,3% (facto descrito em 71º).
Por outro lado, como se deu como provado, ao nível dos contratos vigentes, foi também apurada uma perda potencial de € 1.022,098 no EBITDA de ambas as empresas, F… e G… (facto descrito em 62º).
Destarte, dúvidas não existem de que o Autor recorrente incumpriu os objectivos do acordo a que se havia vinculado, sendo que, não resultou provado que o cumprimento desses objectivos dependia das aquisições da F… e da G… estarem finalizadas dentro de determinado limite temporal, como o recorrente havia alegado, não obstante ter ficado demonstrado que o plano de negócios se baseava em duas aquisições: a da G…, S.A. e a da F…, S.A. o que se veio a verificar, respectivamente em 30.06.2008 e 18.12.2007.
Para além do referido incumprimento, ficou também demonstrado que relativamente ao cliente “P…” o recorrente enviou “mail” a solicitar parecer, aí referindo enviar orçamento de mobiliário para remodelação de uma das casas desse cliente, tendo sido alertado para a necessidade de envio de proposta fundamentada (rentabilidade esperada, riscos associados ao incumprimento do contrato e impacto na tesouraria) e para o facto de a empresa não ter disponibilidade financeira para realizar mais investimentos no curto prazo, daí que o A. não pudesse continuar a tomar este tipo de decisões sem um mapa de tesouraria e, após, solicitação da sua opinião, o A., manifestou ser de fazer e manter a relação com o cliente (facto descrito em 30º da fundamentação factual).
Mais se apurou que:
- a área de serviço Q… não abriu na data prevista (facto descrito em 44º);
- foram celebrados 186 novos contratos em 2008, dos quais apenas 35 tiveram um desvio favorável em termos de Consumo (facto descrito em 63º);
- desses 186 novos clientes, 11 não apresentaram consumo em 2008 (facto descrito 64º);
- o investimento efectuado nesses 11 clientes, que não apresentaram consumo em 2008, ascende a € 19.344 (facto descrito em 65º);
- apesar do A. ter assegurado aos restantes membros do Conselho de Administração que o valor de investimento seria estabilizado em 25% (das vendas) até ao final de 2008, o facto é que tal não aconteceu (facto descrito em 66º);
- acresce que, igualmente, apesar de se ter comprometido a solicitar a aprovação do CA para novos investimentos a realizar em clientes, o Autor autorizou que fossem realizados investimentos superiores aos aprovados (facto descrito em 67º);
concretamente:
- quanto ao cliente 'P…' (…), foi efectuado um investimento de cerca de 17.229,76€, sem IVA incluído (facto descrito em 68º);
- relativamente ao cliente "W…", foi feito um investimento de € 71.271,76, não aprovado pelos restantes membros do CA (facto descrito em 70º);
- a partir de Julho de 2008, o A. implementou uma política de preços com desconto, com vista, segundo dizia a recuperar vendas que estavam a decrescer na F…, ainda que em detrimento da rendibilidade das operações (facto descrito me 71º);
Por outro lado, na reunião do Conselho de Administração de 21.06.2008 foi acordado por todos os membros do CA que a integração das empresas (F… e G…) teria de estar totalmente concluída até Dez./08, verificando-se que, pelo menos, em Out./08, o A. ainda não tinha executado esse plano de integração, como resulta do seu email datado de 2.10.08, em que comunica “…não termos o Plano de Integração executado apesar de já termos iniciado o mesmo…” (factos descritos em 33º e 34º).
Pese embora, o Conselho de Administração na reunião de 03.10.2008 tivesse reconhecido que a alienação (do imóvel e equipamentos da F…) ainda não era possível devido ao facto de ainda não ser possível à Ré C… prescindir destas instalações uma vez que as obras nas instalações da G…, necessárias a integração das duas participadas num só imóvel, ainda não haviam terminado, o facto é que a alienação do imóvel da F… e seus equipamentos era relevante na medida em que, por um lado, permitia reduzir o nível de responsabilidade da empresa para com os bancos e, por outro lado, permitia a geração de liquidez da empresa quando a tesouraria era já muito limitada, tendo o A assumido a promoção dessa venda, embora só tivesse enviado em 30 de Setembro de 2008 o relatório de avaliação do imóvel, quando nada obstava a que tivesse procedido bem antes a diligências preparativas e prévias na medida em que o despedimento colectivo na F… devia ter sido iniciado logo que a participação na G… foi adquirida (em Junho de 2008), quando é certo que todas essas incumbências cabiam ao A. (factos descritos em 33º, 35º, 75º, 83º e 84).
Já quanto ao acompanhamento da coordenação da área comercial, apurou-se tão só que, pelo menos, algumas reuniões o A. realizava nas participadas da Ré C… (facto descrito em 55º).
No tocante à “H…”, apurou-se que, após Maio/2008, o consumo pela H…, diminuiu, logo no mês de Junho, em 41,5%, em relação ao valor de vendas do mês anterior e que o A., apesar de avisado para a possibilidade de perda do referido cliente para um concorrente, não conseguiu garantir a sua permanência, apenas tendo, em 8.07.2008, desenvolvido um plano de recuperação dos clientes e volume de negócios perdidos (factos descritos 53º, 54º e 78º).
Face à perda do distribuidor H… e por forma a assegurar a perda do menor número de clientes possível e ver os efeitos da perda do distribuidor na actividade da F… (número de clientes perdidos, número de clientes indecisos, quantificação da perda em kg e valor, entre outros), ao A. incumbia esse trabalho, que se limitou a apresentar algumas referências, de forma vaga e verbal, sem quantificação das perdas em termos de kg e valor (facto descrito em 73º).
No tocante à marca “V…” provado ficou que era um lote que era vendido na loja da F… no Porto, que, por proposta do A., foi cedida por unanimidade do CA, à “X…” sem pagar qualquer contrapartida (factos descritos em 56º e 82º).
Ora, respigando este quadro factual, salvo o devido respeito, parece-nos, sem qualquer margem para tergiversações que a destituição do recorrente ocorreu com justa causa.
Efectivamente, face aos factos elencados como dizer que era exigível às recorridas continuar a manter a relação contratual?
Então os factos referidos não são de molde a poder-se afirmar que eles faziam perigar o fim do contrato ou de dificultar a obtenção desse fim e que eles fizeram desaparecer os pressupostos, pessoais ou reais, essenciais ao desenvolvimento da relação contratual estabelecida com o Autor?
Efectivamente, para além de não atingidas as metas propostas subjacentes ao nascimento da relação contratual, a actuação do Autor recorrente, quanto os maus resultados em termos de consumo nos contratos celebrados, a omissão de uma atitude pronta, imediata e eficaz na intervenção que se exigia para não se perder a ”H…”, falta de diligência no tratamento atempado de alguns assuntos, nomeadamente apresentação de estudos e análises quanto a algumas questões que importava decidir e falta de cumprimentos, inclusivé de algumas deliberações, etc. são situações que demonstram não ter o recorrente cumpridos os seu deveres de cuidado, diligência e lealdade a que atrás se fez referência e que prejudicam de tal modo o interesse social que impõem a ruptura do vínculo.
Destarte, não pode deixar de se considerar ter existido um comportamento do Autor susceptível de consubstanciar justa causa na sua destituição, independentemente de esse comportamento ter sido culposo.
Na verdade, como já tivemos ensejo de referir, embora a destituição com justa causa seja aquela que tenha por fundamento a verificação de um motivo grave, de tal modo que não seja exigível à sociedade manter a relação de administração, ela não tem, necessariamente, que traduzir-se num comportamento culposo que pela sua gravidade e consequências, torne praticamente impossível a sua manutenção.
A justa causa de destituição em apreço não pressupõe sequer a culpa do administrador, ainda que esta também a possa determinar.
É, por conseguinte, verdadeira a afirmação de que a culpa do gestor não é essencial à verificação de justa causa.[28]
Aliás, por assim ser é que a incapacidade por impedimento físico justifica a destituição (artigos 257.º, nº 6 e 403.º, nº 4 do CSC).
Em contrapartida, podem verificar-se condutas culposas, sem que tal consubstancie justa causa, exactamente por faltar uma violação grave de deveres cometidos ao gestor.
*
Aqui chegados e tendo o recorrente sido destituído com justa causa, torna-se evidente, estarem as recorridas exonerados do dever de indemnizar.
*
Mas mesmo que assim não se entendesse, isto é, que o recorrente foi destituído sem justa causa, a acção não teria melhor sorte.
Analisando.
Dúvidas não existem de que, constitui, entre nós, doutrina e jurisprudência, que podem dizer-se unânimes, o entendimento de que o gerente destituído sem justa causa tem direito ao pagamento de indemnização pelos danos sofridos.[29]
A indemnização, porém, não é uma consequência, por assim dizer, automática da destituição.
Na verdade, o CSC não estabelece a indemnização devida na falta de estipulação contratual; apenas fixa um limite máximo para ela ao dizer que se entende que o gerente destituído não se manteria no cargo por mais de quatro anos ou do tempo que faltar para perfazer o prazo por que fora designado.
Por isso se tem julgado que o direito de indemnização implica forçosamente a comprovada existência de danos, exigindo-se a demonstração de factos reveladores de que a situação real do lesado é, após a destituição, mais gravosa do que aquela em que se encontraria sem ela (artigos 562.º e 566.º, nº 2, do CCivil), ou seja, tem-se julgado quanto à questão em análise, não bastar à atribuição da indemnização a mera invocação da perda da remuneração devida pelo exercício da gerência; é preciso, para além disso, demonstrar ainda que o gerente destituído não teve a oportunidade de exercer outra actividade remunerada de idêntico nível económico, social e profissional.[30]
Aliás, o preceito legal directamente aplicável nesta matéria–o nº 5 do artigo 403.º do CSC–preceitua que: “Se a destituição não se fundar em justa causa, o administrador tem direito a indemnização pelos danos sofridos, pelo modo estipulado no contrato com ele celebrado ou nos termos gerais de direito, sem que a indemnização possa exceder o montante das remunerações que presumivelmente receberia até ao final do período para que foi eleito.”
Também daqui se extrai a confirmação da ideia segundo a qual o simples cômputo das remunerações que, não fora a destituição, seriam auferidas até ao termo do mandato do administrador, é insuficiente para caracterizar danos passíveis de serem objecto de indemnização devida.
Não se desconhece a posição sustentada por Pinto Furtado[31] que refere: “(…) não tem de se aplicar os princípios gerais da responsabilidade civil, porque temos, para as sociedades de quotas (para as sociedades anónimas, cfr. o preceituado no art. 403º CSC) o preceito especial determinando que, fora da justa causa, haverá sempre indemnização, e qual o montante a indemnizar”, acrescentando, tal autor, explicitamente, “não concordamos, pois, minimamente, com a jurisprudência que tem excluído, nas sociedades de quotas, o dever de indemnizar sempre que o destituído não tenha provado danos sofridos, ou que tem aferido o respectivo montante pelo dano provado. O valor a atribuir, salvo estipulação constante do contrato é o referido no nº 7 do art 257º CSC”.
Não se concorda, porém, com este autor, nem mesmo para as sociedades por quotas, a que directamente respeita.
Exprimindo o ponto de vista de Raul Ventura e também Brito Correia[32] e o da jurisprudência que se tem como constante (citada na nota 30), entende-se que o valor a que hoje o artigo 403.º,nº 5 CSComerciais, ou o valor a que se refere o artigo 430.º do mesmo diploma legal, para os directores nas sociedades anónimas-norma que, anteriormente à acima referida redacção do art 430º CSCom, se tinha como aplicável por analogia aos administradores destas sociedades-como decorre da própria expressão empregue nessas normas, “sem que o montante da indemnização possa exceder o montante das remunerações que presumivelmente receberia até ao final do período para que foi eleito”, é um valor máximo, e não necessário, para a indemnização em causa, cujo montante tendo aquele tecto, se há-de encontrar “nos termos gerais de direito”, como sucede no mandato civil, cfr. 1172.º al c) CCivil (norma esta que se deverá aplicar a todos os contratos de prestação de serviços ex vi artigo 1156.º do CCivil e para o mandato comercial o artigo 425.º CComercial, bem como para o contrato de agência).
E, note-se, que é o próprio artigo 430.º, nº 3 e hoje–depois da redacção que lhe conferiu o referido DL 76-A/2006 de 29/3-o nº 5 do artigo 403.º CSC que referem expressamente “nos termos gerais de direito”.
Deste modo, exclui-se que a indemnização ao administrador de sociedade anónima destituído sem justa causa corresponda necessariamente ao montante dos proventos que o mesmo receberia até ao final do mandato, não estando em causa nas disposições atrás referidas, estabelecer uma cláusula penal, ou mesmo uma cláusula de limitação de responsabilidade através da fixação de um montante certo a atribuir àquele administrador, caso a sociedade não viesse a provar a inexistência total de prejuízos provocados pela destituição, ou a sua existência, mas em montante inferior àquele.
Mas, não apenas o elemento literal exclui tal interpretação–e lembre-se o disposto no nº 2 do artigo 9.º CCivil, segundo o qual não pode ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei o mínimo de correspondência verbal–são também razões de justiça que assim a excluem.
É que, se é verdade que a destituição do gerente satisfaz o interesse da sociedade, permitindo que esta seja gerida por quem mereça confiança aos sócios detentores da maioria dos votos, mas que tal não deverá implicar o completo sacrifício dos interesses pessoais do gerente, que, por isso, deve ser indemnizado quando seja destituído sem justa causa, não há já razões de justiça para o beneficiar com uma liquidação antecipada de prejuízos em seu benefício, antes esse entendimento redundaria no que se quis evitar: que a sociedade se sinta livre para na expressão da sua vontade maioritária destituir quem a administra.
Conclui-se, pois, no sentido de que a indemnização ao administrador destituído de sociedade anónima se há-de encontrar nos termos gerais de direito, isto é, em função dos prejuízos (danos emergentes e lucros cessantes) que forem efectivamente provados, incumbindo o ónus da prova ao administrador.
Decorre do exposto que o Autor recorrente tinha o ónus de alegar e provar a destituição, os danos sofridos e o nexo de causalidade entre aquela e estes, coisa que ele, manifestamente, não satisfez, pois que, se quedou pela mera alegação das remunerações e dos prémios que auferiria se não tivesse sido destituído.
Por isso, e uma vez que nos termos gerais de direito, nomeadamente do disposto no nº 2 do artigo 566.º do CCivil, a medida da indemnização é constituída pela diferença entre a situação patrimonial actual real e a situação patrimonial actual hipotética, o desconhecimento desta diferença e, até, da sua existência, embora não quantificada, sempre impediria que se reconhecesse ao Autor recorrente o direito que a este propósito se arrogava.
Sobre o assim, defendido, veja-se, o recente acórdão do STJ de 29.05.2014.[33]
Aliás, importa ainda que se diga, sob este conspecto, que resultou provado nos autos que, depois da sua destituição, o Autor voltou a ser contratado pela X…, aliciando inclusivamente alguns colaboradores das participadas da C… a irem trabalhar com ele (facto descrito em 86º).
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Improcedem, assim todas as conclusões formuladas pelo recorrente (excepto quanto à alteração do ponto factual descrito sob o nº 75º) e, com elas, o respectivo recurso, tornando-se, por isso, desnecessário apreciar a sua ampliação solicitada pelas recorridas
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IV-DECISÃO

Pelos fundamentos acima expostos, acordam os Juízes deste Tribunal da Relação em julgar a apelação interposta improcedente por não provada e, consequentemente, confirmar a decisão recorrida.
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Custas da apelação pelo Autor apelante (artigo 527.º nº 1 do C.P.Civil).
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Porto, 11 de Janeiro de 2016.
Manuel Domingos Fernandes
Rita Romeira
Caimoto Jácome
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[1] Antunes Varela, J. Miguel Bezerra e Sampaio da Nora in Manual de Processo Civil, 2ª Almedina, pág. 49.
[2] Antunes Varela, ob. citada pág. 54.
[3] Obra citada pág. 55.
[4] De facto, “é sabido que, frequentemente, tanto ou mais importantes que o conteúdo das declarações é o modo como são prestadas, as hesitações que as acompanham, as reacções perante as objecções postas, a excessiva firmeza ou o compreensível enfraquecimento da memória, etc.”-Abrantes Geraldes in “Temas de Processo Civil”, II Vol. cit., p. 201) “E a verdade é que a mera gravação sonora dos depoimentos desacompanhada de outros sistemas de gravação audiovisuais, ainda que seguida de transcrição, não permite o mesmo grau de percepção das referidas reacções que, porventura, influenciaram o juiz da primeira instância” (ibidem). “Existem aspectos comportamentais ou reacções dos depoentes que apenas podem ser percepcionados, apreendidos, interiorizados e valorados por quem os presencia e que jamais podem ficar gravados ou registados para aproveitamento posterior por outro tribunal que vá reapreciar o modo como no primeiro se formou a convicção dos julgadores” (Abrantes Geraldes in “Temas…” cit., II Vol. cit., p. 273).
[5] Miguel Teixeira de Sousa in Estudos Sobre o Novo Processo Civil, Lex, 1997, p. 348.
[6] Cfr. acórdãos do STJ de 19/10/2004, CJ, STJ, Ano XII, tomo III, pág. 72; de 22/2/2011, CJ, STJ, Ano XIX, tomo I, pág. 76; e de 24/9/2013, processo n.º 1965/04.9TBSTB.E1.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[7] Cfr. Ac. do S.T.J. de 3/11/2009, processo n.º 3931/03.2TVPRT.S1, disponível em www.dgsi.pt.
[8] Cfr., por exemplo, o acórdão de 4 de Novembro de 2010, proc. n.º 7006.05.1TBBRG.G1.S1 e jurisprudência nele citada, e ainda os acórdãos de 29 de Novembro de 2011, proc. n.º 39/2002.E1.S1, de 30 de Junho de 2011, proc. 6450/05.9TBSXL.L1.S1 e de 19 de Fevereiro de 2015, proc. n.º 405/09.1TMCBR.C1.S1, todos disponíveis em www.dgsi.pt.
[9] Cfr. “Notas sobre o novo regime dos recursos no Código de Processo Civil”, in O Novo Processo Civil, Contributos da doutrina para a compreensão do novo Código de Processo Civil, caderno I, Centro de Estudos Judiciários, Dezembro de 2013, pág. 395 e segs. e citado acórdão do STJ de 19/2/2015, processo n.º 405/09.1TMCBR.C1.S1.
[10] Cfr. João Labareda, Direito Societário Português, Algumas Questões, Quid Juris, pág. 68/69.
[11] Cfr. Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, volume II, página 331.
[12] Ferrer Correia, obra citada pág. 331.
[13] Cfr. Antunes Varela, na Rev. Leg. J., 116, p.346.
[14] Cr. Alberto dos Reis, no CPC Anot., III, p. 282.
[15] Obra citada pág. 92.
[16] BMJ nº 488, pag. 361.
[17] BMJ nº 494, pag. 353.
[18] BMJ nº 494, mas na pag. 358.
[19] In Colectânea de Jurisprudência, Acórdãos do STJ, ano XIV, Tomo II, pag. 141.
[20] Na doutrina e na jurisprudência norte americana do Estado de Delaware este de dever comportamental relaciona-se com o regime da designada business judgment rule, devendo apurar-se a conformidade dos comportamentos em face do conceito de negligência grosseira, o que faz com que sejam escassos os casos de julgamento por violação desse dever, isto porque nos Estados Unidos e também por cá se entender que os juízes por não estarem preparados nessa matéria não devem intrometer-se na determinação da política empresaria, estando assim impedidos de definirem o que se deve entender por interesse social
[21] Fátima Gomes, no estudo Reflexões em Torno dos Deveres Fundamentais dos Membros dos órgãos de Gestão e Fiscalização das Sociedades Comerciais à Luz da Nova Redacção do art.º 64 do CSC publicado pela Coimbra Editora, 2007, “Nos 20 anos do Código das Sociedades Comerciais(…)”, pág. 554, onde também cita Paula Cristina Raposo Domingues Cabriz Simões em “Os deveres(…)”, que já no domínio da legislação anterior procurara encontrar semelhanças entre os dois ordenamentos.
[22] In www.dgsi.pt.
[23] In “Manual de Direito das Sociedades – Das Sociedades em Especial”, II, 2006, pg. 413-419.
[24] In “Direito Societário Português–Algumas Questões”, 1998, pg. 80,
[25] In “Sociedades por Quotas–Comentário ao Código das Sociedades Comerciais”, vol. III, 1996, pgs. 91 a 94.
[26] In “Temas de Direito das Sociedades”, pg. 165.
[27] In Pressupostos da Resolução por Incumprimento, em Obra Dispersa, Vol. I/143.
[28] Cfr. Ilídio Duarte Rodrigues, in “A Administração da Sociedade por Quotas e Anónimas”, 1990, pg. 245.
[29] Cfr. Raul Ventura, Sociedades por Quotas, III, pág. 118; Luís Brito Correia, Os Administradores das Sociedades Anónimas pág. 705 e segs; João Labareda, A Cessação da Relação de Administração, Direito Societário Português, págs 72 e segs; A. Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, págs 122/123; Código das Sociedades Comerciais Anotado, coordenação de Menezes Cordeiro, pág. 675; Acórdãos do STJ de 15-2-00, BMJ 494º, 359, de 14/12/04 (Revª 4701/04-6ª), de 11/7/06 (Revª1884/06-6ª) e de 14/12/06 (Revª 063803).
[30] Cfr. entre, outros, os acórdãos do STJ de 23.06.1992, BMJ nº 418, pág. 473, de 27.10.1994, Col. Jur.– STJ, II, 3º, pág. 112, de 20.05.2004, Relator Conselheiro Neves Ribeiro, de 11.07.2006 e 14.12.2006, relator Conselheiro Azevedo Ramos, de 11.07.2006, Relator Pereira da Silva, e de 7.07.2010, relator Conselheiro Nuno Cameira–estes últimos disponíveis em www.dgsi.pt.
[31] In Curso de Direito das Sociedades, 5ª ed, 369.
[32] Obra citada pág. 709.
[33] In www.dgsi.pt