Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
233/13.0TTSTS.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: CONTRATO DE TRABALHO
DESPEDIMENTO
DANOS NÃO PATRIMONIAIS
Nº do Documento: RP20180124233/13.0TTSTS.P1
Data do Acordão: 01/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO 2ª
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 4ªSECÇÃO (SOCIAL),(LIVRO DE REGISTOS N.º268, FLS.128-131)
Área Temática: .
Sumário: Em direito laboral para haver direito à indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá o trabalhador que provar que houve violação culposa dos seus direitos, causadora de danos que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º Nº 233/13.0TTSTS.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
I. RELATÓRIO
I.1 Na Comarca do Porto / Juízo do trabalho da Maia - B…, veio intentar acção especial de impugnação de despedimento colectivo, a qual veio a ser distribuída ao Juiz 2, demandando “C…, SA”, pedindo que julgada a acção procedente seja declarada a ilicitude do seu despedimento sendo a Ré condenada no seguinte:
- a reintegrá-la, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
- a pagar-lhe sanção pecuniária compulsória no valor de €1.000,00 por cada dia de atraso nessa reintegração;
- a pagar-lhe as retribuições perdidas desde a data do despedimento até ao trânsito em julgado da decisão final;
- a pagar-lhe uma indemnização por danos não patrimoniais no valor de €10.000,00;
- tudo com juros legais a partir do vencimento das obrigações respetivas.
O processo seguiu a sua tramitação, tendo sido já objeto de decisões transitadas em julgado os pedidos atinentes à declaração da ilicitude do despedimento, à reintegração, às retribuições intercalares, à sanção pecuniária compulsória e ao crédito de formação. Com efeito, por Acórdão deste Tribunal da Relação do Porto datado de 18-01-2016, transitado em julgado, constante do apenso A – recurso de apelação em separado - foi já declarado ilícito o despedimento da Autora e, em consequência, condenada a Ré no seguinte:
- Reintegrar a Autora no mesmo estabelecimento da empresa, sem prejuízo da sua categoria e antiguidade;
- Pagar à Autora as retribuições que esta deixou de auferir desde 27 de abril de 2013 até ao trânsito em julgado desse Acórdão, com desconto dos valores que se venha a apurar ter auferido em atividades iniciadas posteriormente ao despedimento e por causa dele, quer dos valores que se venha a apurar ter auferido a título de subsídio de desemprego, valores estes a entregar pela Ré à Segurança Social, relegando-se o apuramento destas retribuições para liquidação daquele Acórdão, com juros de mora à taxa legal desde a data da liquidação;
- Pagar à Autora a sanção pecuniária compulsória de €500,00 por cada dia de atraso na reintegração determinada.
Por outro lado, por decisão de fls. 190 e ss., datada de 1-09-2015, foi apreciado o pedido formulado pela Autora a título de créditos de formação, decisão que transitou em julgado no que respeita a esse concreto pedido, tendo sido decidido que a Autora tem a esse título um crédito sobre a Ré no valor de €365,95, que esta deve pagar-lhe.
Nesse quadro, apenas ficou por decidir o pedido formulado pela Autora a título de indemnização por danos não patrimoniais no valor de €10.000,00 e respetivos juros legais peticionados, pelo que, por despacho de fls. 413-414, foi determinado o prosseguimento dos autos apenas para conhecimento desse pedido.
I.2 Subsequentemente foi proferida sentença (sobre esse pedido), concluída com a decisão seguinte:
- «Pelo exposto, na presente ação especial de impugnação de despedimento coletivo, decide-se julgar parcialmente procedente o pedido de indemnização por danos não patrimoniais formulado pela Autora e, em consequência:
A) Condenar a Ré a pagar à Autora a quantia de €2.000,00 (dois mil euros) a título de compensação pelos danos não patrimoniais sofridos, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde a presente data (17-05-2017) até efetivo e integral pagamento.
B) Absolver a Ré do demais peticionado pela Autora a título de danos não patrimoniais e que exceda o determinado na alínea antecedente.
*
Custas por Autora e Ré na proporção do respetivo decaimento.
Registe e notifique.
(..)».
I.3 Inconformada com esta decisão a R.. interpôs recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram concluídas nos termos seguintes:
1. O acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto a 18 de janeiro de 2016 (EDUARDO PEDERSEN SILVA) declarou ilícito o despedimento da Autora com fundamento no facto de a Apelante não ter pago €365,95 a título de créditos de formação profissional.
2. A causa de ilicitude não consiste numa atitude dolosa ou negligente que tenha ferido a dignidade pessoal e/ou profissional da trabalhadora, resultando antes de uma divergência sobre a existência de um prazo de caducidade para as horas de formação profissional vencidas ao abrigo do Código de Trabalho de 2003, donde se concluir que o grau de culpa da Apelante é praticamente inexistente.
3. Na sentença em crise deu-se como provado que a Autora sofreu os seguintes danos não patrimoniais: angústia, desânimo, inquietação/nervosismo, desmotivação, tristeza, repercussões no humor, no seu estado anímico e choro frequente.
4. Nas palavras da Mma. Juiz a quo “[estas] consequências decorreram do comportamento da Ré traduzido no despedimento da Autor, que foi julgado ilícito, consubstanciam dano de natureza não patrimonial, com dimensão suficientemente grave de molde a merecerem, nos termos do artigo 496.º, n.º 1, do Código Civil, a tutela do direito e devem, consequentemente, ser compensada.”
5. São, portanto, estes e apenas estes os danos que se consideraram provados e que determinaram a condenação da Apelante no pagamento de uma indemnização à Autora no valor de €2.000.
6. Ora, salvo melhor opinião, esta decisão não pode ser sufragada e deve ser revogada, na medida em que estes danos são consequência natural de um cenário de despedimento e não revestem gravidade que justifique a tutela indemnizatória conferida pelo artigo 496.º do Código Civil, sendo mesmo repudiada de forma generalizada pela jurisprudência dos tribunais superiores.
7. Com efeito, tem sido entendimento pacífico do Supremo Tribunal de Justiça que os danos não patrimoniais só merecem a tutela indemnizatória quando os danos forem particularmente graves, a culpa do empregador manifesta, os danos sofridos objetivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável.
8. Relativamente à aplicação do artigo 496.º do Código Civil, o Tribunal da Relação do Porto, em acórdão de 3 de fevereiro de 2014 (JOÃO NUNES), defendeu que “é necessário tomar em consideração, antes de mais, que é inerente à cessação da relação laboral, indesejada pelo trabalhador, que esta cessação comporte para o mesmo a lesão de bens de natureza não patrimonial. (…) não pode olvidar-se que esses danos se apresentam como uma consequência lógica, natural, do despedimento de um trabalhador, independentemente das razões do mesmo: perante a perda do trabalho e a incerteza quanto ao futuro”.
9. Os danos não patrimoniais indemnizáveis nos termos do artigo 496.º do Código Civil são os danos não patrimoniais objetivos que, pela sua gravidade, merecem a tutela do direito. Neste sentido, atente-se no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de maio de 2007 (ALVES VELHO) “o dano não patrimonial não reside em factos, situações ou estados mais ou menos abstractos aptas para desencadear consequências de ordem moral ou espiritual sofridas pelo lesado, mas na efectiva verificação dessas consequências”.
10. Recentemente, o Tribunal da Relação do Porto em acórdão de 5 de dezembro de 2016 (DOMINGOS MORAIS)15 frisou que “os simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos não patrimoniais” e que “a hipótese do desemprego é, com todo o respeito, uma contrariedade que resulta das condições e leis que regulam o trabalho subordinado, comum a qualquer cidadão nessas situações, e não, propriamente, a um comportamento grave e culposo da ré empregadora, no âmbito da previsão do artigo 496.º do Código Civil”, comparável in casu às dificuldades atravessadas pelo desemprego, agravadas pela idade, qualificação e pela conjuntura económico-social vivida e sentidas pela perda de rendimentos e pela instabilidade daí decorrente.
11. Na doutrina, ANTUNES VARELA ensina que “a gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada). Por outro lado, a gravidade apreciar-se-á em função da tutela do direito: o dano deve ser de tal modo grave que justifique a concessão de uma satisfação de ordem pecuniária ao lesado”.
12. Em particular, os tribunais superiores têm considerado que “sofrimento, inquietação, angústia, preocupação pelo futuro”, “tristeza e preocupação”, “aborrecimento, o nervosismo e a ansiedade”, “angústia, insónias e receios”, “desgastado, angustiado e afetado psicologicamente” não são danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela prevista no artigo 496.º do Código Civil.
13. É, por isso, verdadeiramente incompreensível que a Mma. Juiz a quo tenha ignorado esta jurisprudência e feito tábua rasa de um entendimento sedimentado no ordenamento jurídico nacional.
14. A sentença em crise violou o disposto no artigo 496.º do Código Civil e deverá ser alterada por outra que absolva a Apelante do pagamento de uma indemnização por danos morais.
Conclui pugnando pela procedência do recurso, revogando-se a sentença.

I.4 A A. não apresentou contra alegações.
I.5 O Ministério Público junto desta Relação teve visto nos autos, para os efeitos do art.º 87.º3 do CPT, tendo emitido parecer no sentido da procedência do recurso. No essencial, sustenta-se no parecer que “Os factos provados não têm relevância bastante, com vista a fundamentar uma condenação (..) em indemnização, por não se terem provado elementos concretos para aferir do relevo do sofrimento, da angústia”. Convoca-se, em apoio da posição emitida no parecer, os acórdãos do STJ de 25-12-2012, proc.º 4212/07.8TTLSB.L1.S1; e, desta Relação do Porto, de 05-12-2016, proc.º 20/14.8T8AVR.P1 (ambos disponíveis em www.dgsi.pt).
I.6 Foram colhidos os vistos legais e determinou-se a inscrição do processo em tabela para ser submetido a julgamento.
I.7 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso, a questão colocada para apreciação pela recorrente consiste em saber se o tribunal a quo errou o julgamento na aplicação do direito aos factos ao julgar parcialmente procedente o pedido de condenação da Ré no pagamento de indemnização por danos morais.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1 MOTIVAÇÃO DE FACTO
O Tribunal a quo, na consideração de se encontrarem definidos os factos provados e não provados, pelas decisões transitadas em julgado, nomeadamente pelo Acórdão desta Relação de 18-01-2016, com interesse para a apreciação do pedido em causa, fixou o elenco factual seguinte:
FACTOS PROVADOS
1 - A Autora nasceu no dia 28-12-1961.
2 - A Autora é solteira.
3 - A Autora sempre encarou o seu trabalho como uma solução de vida, numa boa empresa do grupo económico Cimpor, que proporcionava inclusivamente seguro de saúde e complemento de reforma.
4 - A Autora era uma trabalhadora zelosa e cumpridora e não estava à espera do seu despedimento com efeitos em 4-05-2013.
5 - Com o despedimento a Autora viu-se numa altura da vida difícil lançada no desemprego, sem perspetiva alguma de arranjar novo emprego, pela sua idade e qualificações e pela época de crise que atravessamos.
6 - O despedimento e a situação de perda de rendimentos e instabilidade daí decorrente, provocou à Autora nervosismo, desânimo, desmotivação, fragilidade, motivando-lhe grande insegurança, angústia e tristeza.
7 - Em consequência do despedimento em referência e dos sentimentos vivenciados pela Autora nessa sequência referidos em 6, a Autora chora frequentemente.
*
FACTOS NÃO PROVADOS
a) A Autora é uma pessoa sozinha.
b) A Autora foi ofendida e mal tratada pela Ré, sentindo-se ferida na sua dignidade pessoal e profissional.
II.2 Motivação de direito
Começando por atentar no essencial da fundamentação da decisão recorrida, dela consta o seguinte.
« (..)
No caso, atenta a factualidade provada nessa matéria, consideramos, salvo o devido respeito por opinião contrária, que a angústia, desânimo, inquietação/nervosismo, desmotivação, tristeza a que a autora foi submetida, com repercussões no seu próprio humor, no seu estado anímico e ao ponto daquela chorar frequentemente, configuram danos não patrimoniais suficientemente relevantes para merecerem a tutela do direito.
Tais consequências que decorreram do comportamento da Ré traduzido no despedimento da Autora, que foi já julgado ilícito, consubstanciam dano de natureza não patrimonial, com dimensão suficientemente grave de molde a merecerem, nos termos do artigo 496º, nº 1, do Código Civil, a tutela do direito e devem, consequentemente, ser compensadas [cfr. ainda o artigo 389º, nº 1, al. a)].
Estão preenchidos os requisitos para que exista essa obrigação por parte da Ré (cfr. artigo 483º do Código Civil).
Nos termos do nº 3 do artigo 496º do Código Civil, deve ser fixado equitativamente o quantum indemnizatório a arbitrar à Autora, tendo em conta o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias do caso.
Nesta consonância, ponderando as circunstâncias apuradas no caso dos autos, entende-se que a quantia de €2.000,00 constitui compensação adequada, proporcional, equitativa e suficiente à dimensão dos apontados danos de natureza não patrimonial sofridos pela Autora.
Sobre esta quantia de €2.000,00 arbitrada a título de compensação por danos não patrimoniais, nos termos do disposto nos artigos 804º, 805º, nº 1, e 806º, nºs 1 e 2 do Código Civil e da jurisprudência fixada no Acórdão Uniformizador de Jurisprudência nº 4/2002, de 9/05, in DR, I-Série A, de 27 de junho de 2002, acrescem juros de mora à taxa legal de 4%, a calcular a partir da data da prolação da presente sentença até integral e efetivo pagamento.».
A recorrente insurge-se contra esta decisão, alegando, no essencial:
- O despedimento foi declarado ilícito com fundamento no facto de a Apelante não ter pago €365,95 a título de créditos de formação profissional, resultando de uma divergência sobre a existência de um prazo de caducidade para as horas de formação profissional vencidas ao abrigo do Código de Trabalho de 2003, concluindo-se que o grau de culpa da Apelante é praticamente inexistente.
- Os danos considerados na sentença são consequência natural de um cenário de despedimento e não revestem gravidade que justifique a tutela indemnizatória conferida pelo artigo 496.º do Código Civil, sendo esse o entendimento pacífico da jurisprudência, nomeadamente do Supremo Tribunal de Justiça.
- Em particular, os tribunais superiores têm considerado que “sofrimento, inquietação, angústia, preocupação pelo futuro”, “tristeza e preocupação”, “aborrecimento, o nervosismo e a ansiedade”, “angústia, insónias e receios”, “desgastado, angustiado e afetado psicologicamente” não são danos que, pela sua gravidade, mereçam a tutela prevista no artigo 496.º do Código Civil.
- A sentença em crise violou o disposto no artigo 496.º do Código Civil.
Vejamos então.
Começaremos por assinalar que, tal como invoca a recorrente, o despedimento da autora foi considerado ilícito na consideração de ser requisito de licitude do despedimento colectivo a colocação à disposição do trabalhador da totalidade da compensação e demais créditos devidos, estando em falta o valor de €365,95. Para que fique mais claro, sobre o valor devido a esse título concluíra-se na sentença: “Assim, ascendendo o valor por hora da retribuição da autora a €4,55 e correspondendo o seu crédito de horas de formação a 252, deveria a ré ter pago à autora a quantia de €1.146,60. Tendo procedido ao pagamento de apenas €780,65, deverá a ré pagar à autora a quantia em falta de €365,95”.
Com o Código do Trabalho de 2003, o legislador veio pôr termo à dúvida que porventura ainda subsistisse de que o despedimento ilícito conferia ao trabalhador o direito a ser indemnizado pelos danos não patrimoniais decorrentes do despedimento ilícito (art.º 436.º 1 do CT/03).
Aquela norma consta actualmente no art.º 389.º 1 do CT/09, dispondo que [1]Sendo o despedimento declarado ilícito, o empregador é condenado: [a] A indemnizar o trabalhador por todos os danos causados, patrimoniais e não patrimoniais”.
Contudo, a condenação nessa indemnização dependerá sempre da verificação dos respectivos pressupostos da responsabilidade civil, nomeadamente, para além do facto ilícito e culposo (o despedimento ilícito), a verificação de danos não patrimoniais com gravidade bastante para serem merecedores da tutela do direito (art.º 496º nº 1 do CC) e o respectivo nexo de causalidade.
Sobre o que se deve entender por danos não patrimoniais, elucida Antunes Varela que, ao lado dos danos pecuniariamente avaliáveis “há outros prejuízos (como as dores físicas, os desgostos morais, os vexames, a perda de prestígio ou de reputação, os complexos de ordem estética) que, sendo insusceptíveis de avaliação pecuniária, porque atingem bens (como a saúde, o bem estar, a liberdade, a beleza, a honra, o bom nome) que não integram o património do lesado, apenas podem ser compensados com a obrigação pecuniária imposta ao agente, sendo esta mais uma satisfação do que uma indemnização” [Das Obrigações em geral, Vol. I., 3.ª Edição, Almedina, Coimbra, 1980, p. 496].
O Código Civil admite a ressarcibilidade dos danos não patrimoniais, mas limitando-a àqueles “que, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito” [art.º 496.º/1 CC].
Em anotação ao artigo 496.º do CC, Pires de Lima e Antunes Varela, observam que “[A] gravidade do dano há-de medir-se por um padrão objectivo (conquanto a apreciação deva ter em linha de conta as circunstâncias de cada caso), e não à luz de factores subjectivos (de uma sensibilidade particularmente embotada ou especialmente requintada)”, deixando igualmente nota, em linha com o entendimento da jurisprudência do STJ que sinalizam, que “[O]s simples incómodos ou contrariedades não justificam a indemnização por danos morais” [Código Civil Anotado, Volume I, 4.ª Edição revista e actualizada, Coimbra Editora, Coimbra, 1987, p. 499].
Atendendo a este quadro legal, conforme é entendimento pacífico da jurisprudência, mormente do Supremo Tribunal de Justiça, “em direito laboral para haver direito à indemnização com fundamento em danos não patrimoniais, terá o trabalhador que provar que houve violação culposa dos seus direitos, causadora de danos que, pela sua gravidade mereçam a tutela do direito, o que se verificará, em termos gerais, naqueles casos em que a culpa do empregador seja manifesta, os danos sofridos pelo trabalhador se configurem como objectivamente graves e o nexo de causalidade não mereça discussão razoável” [Ac. STJ de 15-12-2011, Recurso n.º 588/08.87TTVNG.P1.S1 - 4.ª Secção, Conselheiro Pereira Rodrigues, disponível em sumários de acórdãos de 2011,www. stj.pt.; e, Ac. STJ de 19 de Abril de 2012, proc.º 1210/06.2TTLSB.L1.S1 , Conselheiro Gonçalves Rocha, disponível em www.dgsi.pt].
Por último, importa referir que de acordo com as regras gerais sobre o ónus de prova, sobre o trabalhador recaí o ónus de alegar provar a existência dos danos não patrimoniais, bem como a sua gravidade o nexo de causalidade com o facto ilícito (artigo 342º, nº 1 do CC), para se poder fixar o montante da indemnização segundo equidade (art.º 496.º/4 CC).
Pode afirmar-se com segurança que na generalidade dos casos, o despedimento ilícito é sempre gerador de incómodo, insegurança profissional e desconforto psicológico, designadamente, suscitando um sentimento de injustiça. É a reacção normal de qualquer trabalhador que vê ocorrer a ruptura da relação laboral e que, por múltiplos factores que variam de caso para caso, considera não haver razões que justifiquem esse desfecho e a conduta da entidade empregadora.
Contudo, como é também entendimento pacífico, quer da doutrina quer da jurisprudência, isso só por si não basta para dar direito a reparação de danos não patrimoniais, sendo sempre necessário que esses danos assumam alguma gravidade, reflectindo-se de modo relevante na estabilidade psicológica do trabalhador, de modo a consubstanciarem um dano com gravidade suficiente para ser merecedor da tutela do direito.
No caso apenas se provou que a trabalhadora “[o] despedimento e a situação de perda de rendimentos e instabilidade daí decorrente, provocou à Autora nervosismo, desânimo, desmotivação, fragilidade, motivando-lhe grande insegurança, angústia e tristeza”, sentimentos que levaram a que chorasse frequentemente.
Salvo o devido respeito, a autora sentiu o que qualquer pessoa nas mesmas circunstâncias sente perante um evento adverso, mas que não é o bastante para se considerar um dano não patrimonial que, pela sua gravidade, mereça a tutela do direito. Não há danos objectivamente graves e, de acordo com a lei, só estes são merecedores de reparação.
Neste sentido decidiu este colectivo no recente acórdão de 4 de Dezembro de 2016, proferido no processo n.º 1147/16.7T8MAI.P1 (relatado pelo aqui relator).
Igualmente nesse sentido, pronunciou-se também esta Relação, entre outros, no acórdão de 7 de Novembro de 2016 [Proc.º 659/12.6TTMTS.P2, relatado pelo Exmo Desembargador Nelson Fernandes, disponível em www.dgsi.pt], aqui adjunto.
Acresce que no caso nem pode falar-se em culpa manifesta da entidade empregadora. Sendo inquestionável que o despedimento é ilícito, o fundamento que impôs essa conclusão é imputável à recorrente mas com um grau de gravidade baixo. Estava em causa apenas um crédito laboral no valor de €365,95, resultante da diferença entre o valor que era devido colocação à autora correspondente a crédito de horas de formação e aquele que foi colocado à sua disposição pela Ré empregadora.
Concluindo, procede o recurso, devendo ser revogada a decisão, absolvendo-se a Ré do pedido de condenação em danos não patrimoniais.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso procedente, revogando a decisão recorrida e absolvendo a Ré do pedido de condenação em danos não patrimoniais.

Custas da acção (na parte em que apreciou e decidiu este pedido) e do recurso a cargo da autora, atento o decaimento (art.º 527.º CPC).

Porto, 24 de Janeiro de 2018
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Rita Romeira