Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
2200/10.6TVLSB.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: CURA MARIANO
Descritores: CONTRATO DE ABERTURA DE CONTA
APLICAÇÕES FINANCEIRAS
FALTA DE PODERES DE REPRESENTAÇÃO
RESGATE
RATIFICAÇÃO TÁCITA
APROVAÇÃO
CONCORRÊNCIA DE CULPAS
CULPA DO LESADO
Nº do Documento: RP201612152200/10.6TVLSB.P1
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 5ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 639, FLS.342-364)
Área Temática: .
Sumário: I - A existência de uma conta bancária pressupõe a celebração de um contrato denominado de abertura de conta bancária que disciplina as relações complexas que se passam a desenvolver entre o banco e o seu cliente, sendo o seu regime definido pelo acordo celebrado entre as partes, sendo um dos elementos mais comuns deste contrato a definição de quem pode movimentar essa conta, sendo preenchida pelo cliente a respetiva ficha de assinaturas
II Quando o cliente é uma associação, a não intervenção de todas as pessoas que constam da forma acordada de vinculação do cliente perante o Banco, na celebração de negócios jurídicos consistentes na subscrição de unidades de participação em fundos de investimento e na inerente ordem de movimentação de valores depositados na conta bancária aberta no Banco, integra uma situação de falta de poderes de representação do cliente por quem interveio nos referidos negócios jurídico, sendo as consequências as prescritas no artigo 268.º do Código Civil – o negócio é ineficaz se não for ratificado pelo cliente.
III O acto do cliente de proceder ao resgate das unidades de participação nos referidos fundos de investimento, corresponde à prática de atos extintivos dos negócios celebrados sem poder de representação, pelo que estamos perante a uma ratificação tácita dos mesmos, uma vez que a intervenção do cliente, apesar de extintiva desses negócios, assume a relação jurídica por eles estabelecida e nela se insere.
IV – Mas a ratificação operada apenas confere eficácia aos negócios celebrados, determinando o efeito de vinculação do cliente àqueles negócios, mas não atribui retroactivamente legitimidade a quem os celebrou sem poderes, mantendo o cliente o direito a ser indemnizado por todos os prejuízos que haja sofrido com os negócios indevidamente celebrados em seu nome, apesar de os ter ratificado.
V - Diferente seria se o cliente, além de ter ratificado o negócio celebrado em seu nome, também tivesse expressa ou tacitamente aprovado esse ato gestório.
VI – Se é certo que, em regra quem ratifica também aprova, podem resultar das circunstâncias que no caso concreto apenas estamos perante uma mera ratificação motivada por razões estranhas a uma vontade de aprovação.
VII - Nas obrigações com coincidência de fins das respetivas prestações, deve considerar-se que estamos perante um quadro de uma pluralidade de obrigações independentes destinadas à satisfação do mesmo interesse do credor, sendo-lhes aplicáveis algumas regras próprias das obrigações solidárias, por analogia, sobretudo no que respeita às relações externas, como seja a possibilidade do credor reclamar de cada um dos devedores o pagamento integral de cada uma das prestações com finalidade coincidente, não podendo o devedor demandado opor o benefício da divisão.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 2200/10.6TVLSB.P1 – Comarca do Porto – Porto – Instância Central – 1.ª Secção – J2
Relator: João Cura Mariano
Adjuntos: Maria José Simões
Augusto Carvalho

Autora: B…

Réu: Banco C…, S.A.
*
A Autora intentou a presente ação declarativa comum, com processo ordinário, contra o Réu, alegando, em síntese, o seguinte:
- A Autora definiu que as eventuais disponibilidades de tesouraria decorrentes da sua atividade deveriam ser aplicadas em produtos bancários sem risco, sendo que ao longo do tempo foi fazendo aplicações dessas disponibilidades em depósitos a prazo, ou depósitos similares, de capital e juro garantido, ou apenas de capital garantido.
- Foi aberta uma conta bancária da Autora no banco Réu, tendo este solicitado àquela os seus documentos corporativos, o que satisfez, fornecendo, entre outros, os seus Estatutos e Regulamento, e identificando que, nos termos legais, a vinculação da Autora dependia sempre da intervenção conjunta de duas pessoas da sua Direção, incluindo a do substituto nomeado do Tesoureiro, que no caso era a Secretária Geral, D….
- Aquando da abertura das contas, entre a Autora e o Réu foram estabelecidas as condições de movimentação das mesmas e de todos os fundos e valores nelas depositados ou a depositar, tendo então ficado acordado e fixado que qualquer ordem ou movimento bancário deveria ser sempre realizado pela intervenção conjunta de duas pessoas de entre as várias pessoas que em cada momento, em razão das funções e cargos desempenhados na estrutura da Autora, pudessem ser por ela designados para o efeito.
- Em julho de 2005, por existirem saldos de tesouraria da Autora justificativos da realização de aplicações em produtos bancários, a referida D… contatou funcionário do Réu explicando que pretendia que a aplicação desses fundos fosse feita em produtos rentáveis, mas sempre com o capital ou capital/juro garantido, sendo que em execução dessa solicitação, esse funcionário procedeu à subscrição de aplicações financeiras do Réu, que selecionou para o efeito, procedendo ao respetivo débito na conta bancária da Autora.
- Esta subscrição de fundos voltou a ocorreu, nos mesmos termos, em outubro de 2005, março de 2006 e julho de 2007, tendo, no conjunto, sido subscritas em nome da Autora unidades de participação no valor global de €3.362.524,99, por débito na referida conta bancária.
- As subscrições de fundos realizadas pelo Réu em nome da Autora foram vertidas pelo funcionário daquele em impressos bancários próprios do mesmo banco (que estavam pré-elaborados por este, que os usa indistintamente para a generalidade dos seus clientes, sem qualquer negociação dos seus termos), e feitas assinar pela mencionada funcionária da Autora e exclusivamente usando a sua assinatura, sem que, todavia, os tenha lido ou explicado o seu conteúdo a esta funcionária, adiantando, no entanto, que os produtos financeiros que veio a subscrever eram produtos sem qualquer risco quanto ao capital despendido por o mesmo estar garantido pelo banco.
- Contrariamente ao que havia sido informado à referida funcionária da Autora, as mencionadas aplicações financeiras não tinham capital ou juro garantido, estando expostas ao risco de crédito e ao risco de taxa de juro, sendo que, à data de 2 de abril de 2010, a perda de capital da Autora era de €149.930,00 na globalidade das aplicações financeiras adquiridas.
Conclui pedindo a condenação do Réu:
a) A restituir à Autora a quantia de €3.362.524,99;
b) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre €2.450.000,00, desde 7 de julho de 2005 até 12 de outubro de 2010, no montante de €1.241.442,52, bem como juros vincendos a partir daquela data;
c) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre a quantia de €763.524,99, desde 31 de outubro de 2005 até 12 de outubro de 2010, no montante de €364.926,45, bem como juros vincendos a partir daquela data;
d) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre a quantia de €49.000,00, desde 14 de março de 2006 até 12 de outubro de 2010, no montante de €21.784,34, bem como juros vincendos;
e) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre a quantia de €100.000,00 desde 8 de outubro de 2007 até 12 de outubro de 2010, no montante de €28.572,30, bem como juros vincendos;
Fazendo o Réu suas as participações que abusivamente subscreveu/fez subscrever;
Subsidiariamente,
f) Caso assim se não entenda, deve o Réu ser condenado a resgatar as participações que subscreveu em nome da Autora, a tomá-las para si, e a entregar à Autora o valor que o Réu Banco vier a fixar às participações na data da sentença, acrescido do valor da diferença que porventura venha a existir para o montante do capital despendido pela Autora de €3.362.524,99;
g) Acrescido de juros vincendos a essa data pelo valor das taxas de juros que ao Banco Réu pratica com a autora nos depósitos a prazo a mais de um ano, com o valor de 3,5%/ano ou outro que se venha a provar existir para este tipo de operações com os seus clientes, e desde 7 de julho de 2005 quanto à quantia de €2.450.000,00, desde 31 de outubro de 2005 quanto à quantia de €763.524,99, desde 14 de março de 2006 quanto à quantia de €49.000,00 e desde 8 de outubro de 2007 quanto à quantia de €100.000,00 e até efetivo embolso,
h) Ou ainda, subsidiariamente, remunerado segundo juízos de equidade, que a sentença aplicará.
Caso assim não se entenda, e subsidiariamente ainda,
i) Seja o Réu condenado a restituir à Autora a quantia que vier a ser fixada, como justa e equitativa, em função da perda efetiva da Autora, por juízos de equidade.

Citado, o Réu apresentou contestação na qual alegou o seguinte:
- A funcionária da autora, D…, movimentava há muitos anos as contas bancárias da Autora apenas com a sua assinatura, designadamente em aplicações financeiras, subscrição de fundos e constituição de depósitos a prazo, o que era conhecido, tacitamente consentido e tacitamente ratificado pela demandante, prática essa que era igualmente conhecida por funcionários do Réu (designadamente, pelo gerente do balcão, E…).
- O referido funcionário do Réu explicou à funcionária da Autora que os produtos em questão tinham uma dupla vertente (por isso se integravam no denominado “C1…”), sendo uma vertente constituída pelos fundos e a outra vertente era constituída por depósitos a prazo, com taxas muito acima das taxas “standard”, precisamente para compensar eventuais desvalorizações nas cotações dos fundos, sendo que a subscrição dessas aplicações financeiras foi devidamente negociada, tendo sido prestadas à funcionária da Autora todas as informações referentes às mesmas, sendo-lhe entregues os impressos, folhetos e documentos dos quais constam as referidas caraterísticas, condições e termos.
- A Autora procedeu entretanto ao resgate das referidas aplicações financeiras, não registando perda de capital, posto que resgatou os fundos a cotações superiores àquelas que vigoravam à data das respetivas subscrições, existindo, nessa medida, impossibilidade ou inutilidade da lide.
- A Autora tinha conhecimento da subscrição dos fundos efetuada em seu nome e representação pela sua funcionária D…, sendo que todas essas operações, além de serem objeto de notas de lançamento que eram enviadas à demandante, eram do mesmo modo refletidas nos extratos de conta que lhe eram semanalmente remetidos, dos quais constava a identificação dos fundos, a quantidade de unidades de participação subscritas, as respetivas cotações, o seu valor de mercado, o que permitia acompanhar a sua valorização ou desvalorização, sendo que, para além disso, nas informações periodicamente fornecidas pelo Réu aos auditores da Autora, eram indicados os saldos das contas, as aplicações efetuadas, os depósitos a prazo constituídos, os fundos subscritos, bem assim os demais produtos financeiros contratos.
- Em resultado das perdas dos fundos registadas com a crise financeira motivada pelos conhecidos fenómenos de sub-prime, e com vista, em alguma medida, a compensar a Autora face à desvalorização que os fundos contratados experimentavam, foram realizadas entre as partes diversas reuniões, que culminaram com a aceitação por banda da Autora de constituição de depósitos a prazo com taxas privilegiadas, muito acima do mercado.

Replicou a Autora alegando:
- Com exceção de autorização por escrito que conferiu à sua funcionária D… para pagamentos como os da segurança social, vencimentos e impostos, jamais consentiu ou autorizou que as suas contas bancárias fossem movimentadas apenas com a assinatura dessa funcionária.
- No interim, procedeu ao resgate de fundos no valor de €3.204.795,00.
Requereu a alteração do pedido inicialmente formulado, solicitando a condenação do Réu:
a) A restituir à autora a quantia ainda em dívida de €107.730,00;
b) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre €2.450.000,00, desde 7 de julho de 2005 até 28 de outubro de 2010, no montante de €1.255.974,70;
c) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre a quantia de €763.524,99, desde 31 de outubro de 2005 até 24 de junho de 2010, no montante de €348.369,48, e sobre a quantia de €251.454,00 desde 24 de junho de 2010 até 28 de outubro de 2010, no montante de €6.944,26;
d) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre a quantia de €49.000,00, desde 14 de março de 2006 até 28 de outubro de 2010, no montante de €22.062,50;
e) Acrescida de juros legais comerciais calculados sobre a quantia de €100.000,00 desde 8 de outubro de 2007 até 28 de outubro de 2010, no montante de €29.053,00;
f) Fazendo o Réu suas as participações que abusivamente subscreveu/fez subscrever relativas à subscrição do fundo de “C8…”, subscritas em 8.10.2007;
Subsidiariamente,
g) Caso assim se não entenda, deve o Réu ser condenado a resgatar as participações que subscreveu em nome da autora, de “C8…”, subscritas em 8.10.2007, a tomá-las para si, e a entregar à Autora o valor que o Réu Banco vier a fixar às participações na data da sentença, acrescido do valor da diferença que porventura venha a existir para o montante do capital despendido pela autora para a sua aquisição e o valor da correspondente venda;
h) Acrescido de juros vincendos a essa data pelo valor das taxas de juros que ao Banco Réu pratica com a Autora nos depósitos a prazo a mais de um ano, com o valor de 3,5%/ano ou outro que se venha a provar existir para este tipo de operações com os seus clientes, e desde 7 de julho de 2005 quanto à quantia de €2.450.000,00, desde 31 de outubro de 2005 quanto à quantia de €763.524,99, desde 14 de março de 2006 quanto à quantia de €49.000,00 e desde 8 de outubro de 2007 quanto à quantia de €100.000,00 e até efetivo embolso, e subsidiariamente
i) Ou ainda, subsidiariamente, remunerado segundo juízos de equidade, que a sentença aplicará.
Caso assim não se entenda, e subsidiariamente ainda,
j) Seja o Réu condenado a restituir à Autora a quantia que vier a ser fixada, como justa e equitativa, em função da perda efetiva da Autora, por juízos de equidade.
Caso assim não se entenda, e subsidiariamente ainda,
l) deve o Réu pagar a quantia de €107.730,00 referente à diferença de capital em dívida, acrescida de juros legais vincendos;
m) bem como no pagamento da quantia de €587.680,00, referente à frutificação normal do património da Autora, enquanto esteve aplicado e gerido pelo Réu nos fundos, pela aplicação de uma taxa de rentabilidade de 3%/ano e juros vincendos sobre esta quantia, desde 18 de novembro de 2010 até ao efetivo embolso;
n) a quantia referida deverá ser descontada das efetivas mais-valias que o Réu tenha feito à Autora, e que se venha a provar terem sido realizadas, aquando do resgate dos fundos, e que na douta contestação alegou ascender a €30.282,63.

Após a realização da audiência preliminar veio a Autora reduzir o pedido quanto ao produto “C8…”, concluindo pela condenação do réu a restituir-lhe a diferença de capital entre os €50.000,00 despendidos na sua aquisição, em 8 de outubro de 2007, e os €19.381,21, recebidos do Réu, em 28 de junho de 2012, num total de €30.618,79, acrescidos dos juros legais, ou de compensação equitativa, calculada segundo equidade, desde a data da subscrição até ao efetivo embolso.
Subsidiariamente, acrescido de compensação média de 2%, para o capital de €50.000,00 entre 8 de outubro de 2007 e 28 de junho de 2012, e para o capital de €30.618,78 desde 28 de junho de 2012 até ao efetivo embolso.

Procedeu-se a audiência de julgamento, tendo sido proferida sentença que condenou o Réu a pagar à Autora:
a)- a quantia de €131.903,57, referente à diferença entre o valor aplicado nos produtos financeiros e o valor do respetivo resgate, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde que se operou o resgate até efetivo pagamento;
b)- a importância correspondente à remuneração, à taxa anual de 2,5%, do capital aplicado em cada um dos ajuizados produtos financeiros, desde a data da sua subscrição e até à data do respetivo resgate, acrescida de juros, à taxa legal, contados desde que se operou cada um dos resgates até efetivo pagamento.

O Réu recorreu desta decisão, tendo concluído as suas alegações do seguinte modo:
1- Deve o julgador, sempre e sempre, alcançar na sua análise, e deter-se nelas, as concretas circunstâncias que caracterizam o facto, nunca circunscrever-se apenas à imagem do facto, ou ao facto em abstrato.
2- Nos concretos autos de que emerge o presente recurso, nem sempre o douto tribunal se ateve às concretas circunstâncias do caso, aprofundando-as e interpretando-as, antes as ignorou, omitiu ou desvalorizou, como é o caso da averiguação da medida da responsabilidade da própria autora, ora recorrida, por não ter cumprido os mais elementares deveres de gestão e cuidado na condução da atividade da associação.
3- A norma estatutária da obrigatória intervenção de duas assinaturas veio a ser derrogada pela própria autora, que consentia, com caráter de habitualidade, quer de forma expressa, quer de forma tácita, que a sua Secretária-Geral atuasse autonomamente, e sozinha, na movimentação da conta bancária dos autos.
4- O Tribunal a quo não entendeu esta realidade em toda a sua real e quotidiana extensão, não obstante ter tido de reconhecer que, por escrito, foram dados poderes à Secretária Geral para movimentar a conta com vista ao pagamento de salários, segurança social, impostos e outros custos.
5- A Secretária-Geral da autora geria os assuntos desta ao mais alto nível, representando-a junto dos Bancos e outras entidades, tomando decisões sobre todos os assuntos da vida da autora, e isso era assim pela confiança que nela depositava a direção da autora e pela experiência e capacidade que lhe eram reconhecidas.
6- Como se mostra assente no ponto 12º da matéria de facto provada, as relações estabelecidas entre a B… e o Banco réu foram nos últimos anos conduzidas, da parte da Autora, pela sua Secretária Geral, e da parte do Banco, pelo Gestor de conta do C… do balcão do C2…, em Lisboa, Exmo. Senhor E… (Alínea M) da matéria de facto assente (sublinhado do recorrente).
7- Na condução dessas relações, era a Secretária Geral da ora recorrida quem representava esta junto do Banco, quem transmitia a este as instruções daquela, quem dispensava a segunda assinatura nos impressos ou documentos ordenando as operações, quem tomava a iniciativa de propor as próprias operações.
8- Isso mesmo decorre do teor conjugado dos pontos 38º e 39º da matéria de facto provada, a saber: 38º - Em julho de 2005 existiam saldos de tesouraria da A., tendo a Exma. Senhora Dra. D… contatado o Exmo. Senhor E… para realizar aplicações em produtos bancários das referidas disponibilidades (resposta ao facto controvertido nº4). (sublinhado do recorrente); 39º - Foram realizadas as subscrições referidas em 13º, 14º, 15º e 16º (resposta aos factos controvertidos nºs. 6 e 7).
9-Foi, pois, a Secretária-Geral da Autora quem tomou a iniciativa de contatar o Gerente do Banco réu e, sozinha, negociar com ele a subscrição dos fundos dos autos, para tanto assinando, carimbando e fotocopiando os impressos próprios, dispensando qualquer outra assinatura e dispensando mesmo o aconselhamento do gerente quanto às proporções dos fundos a subscrever em função do grau de risco (70%, 15%, 15%).
10-A Dra. D… não só era imprescindível à atividade e funcionamento da autora, como substituía naturalmente os dirigentes formais desta, que na maior parte do tempo não se encontravam nas suas instalações, uma vez que eram gestores de topo ou altos responsáveis nas empresas associadas, o que os impedia de permanecer na Associação e os levava a delegar informalmente os seus poderes na Secretária Geral.
11-O Gerente do Banco, Senhor E…, quando chegou à Sucursal em 2001, já encontrou estas práticas perfeitamente consolidadas e normalizadas.
12-Tais práticas – ordens de movimentação das contas dadas apenas pela Secretária geral, subscrição de produtos, sem risco ou com risco, feita apenas com a assinatura da Dra. D…, conhecimento e consentimento dessas situações pela direção da autora – inculcaram no gerente do Banco réu a convicção de que a autorização da autora se estendia a todas as operações bancárias.
13-As testemunhas da Autora, quando questionadas sobre se existia ou não essa autorização, desviavam a questão, evitando falar no consentimento dado pela autora à assinatura única da Dra. D…, e refugiando-se na falsa desculpa de que a autora não pretendia subscrever produtos com risco, invocando “orientações” da autora nesse sentido.
14-Não provaram, porém, que o Banco soubesse de tal orientação, antes ficou provado não ter o Banco recebido qualquer indicação, escrita ou verbal, nesse sentido.
15-Tendo inclusivamente o Dr. G…, Revisor Oficial de Contas da autora, responsável pela elaboração do relatório de auditoria junto aos autos, referido durante o seu depoimento que não existia nenhuma norma interna na Associação que determinasse que apenas seriam subscritos produtos sem risco.
16-A Direção da autora, para além dos extratos de conta que semanalmente recebia do Banco (cf. fls. 391 a 737 dos autos), era informada, a seu pedido, através de contato telefónico efetuado pelo Sr. E…, previamente às reuniões de direção quinzenais, das cotações dos fundos subscritos.
17-A informação nesses termos disponibilizada à autora permitia-lhe – e era para isso que era solicitada – ter conhecimento das oscilações do valor dos fundos, não sendo crível que não fosse percebido tratar-se de produtos de risco.
18-Os fundos de investimento mobiliário subscritos pela autora tinham à data elevadas rendibilidades, como se vê dos extratos bancários de fls. 627/628, 629/630, 631/632, 659/660, 661/662, 663/664, 665/666.
19-A autora não teria tido as perdas que teve, e teria, pelo contrário, auferido elevados ganhos, caso tivesse seguido o aconselhamento do Banco no sentido de resgatar alguns dos fundos que maiores rentabilidades apresentavam.
20-Os prospetos simplificados (juntos de fls.100 a 105) espelham a sua composição, o seu grau de risco, as suas características financeiras, e são sempre entregues aos clientes, acompanhados das explicações complementares prestadas pelos funcionários bancários, no caso o Gerente do Banco, E….
21-Para além da subscrição dos fundos de investimento mobiliário, a autora, através da sua Secretária Geral Dra. D…, subscreveu ainda outros produtos com componente de risco, como seja a C3… (vide fls. 122), só com a sua assinatura, o que não foi objeto de reclamação, certamente por ter tido boa rendibilidade.
22-E nunca foram igualmente objeto de reclamação por parte da autora os numerosíssimos depósitos a prazo efetuados ao longo de muitos anos, ordenados constituir apenas pela Dra. D… por simples ordens verbais.
23-Os fundos de investimento dos autos vieram a sofrer as consequências dos abalos financeiros ocorridos internacionalmente, a partir de 2008, com grandes Bancos e Seguradoras a serem arrastados para falências e as bolsas a descerem a pique.
24-A B…, não obstante todos os alertas, e toda a informação que lhe foi disponibilizada pelo Banco, só veio a resgatar os fundos em 2010, já depois de instaurada a presente ação.
25-A autora não pode responsabilizar o Banco pelo momento que escolheu para resgatar os fundos, apenas se pode responsabilizar a si própria por não ter observado nem cumprido os seus próprios deveres de prudência e boa gestão.
26-A autora sabia perfeitamente que os fundos que subscreveu, tal como todos os demais fundos de investimento mobiliário, eram produtos de risco, embora houvesse fundos de maior risco, de risco médio e de risco menor.
27-O douto tribunal a quo, face à provada circunstância de a autora ter concorrido em tão grande medida para a produção dos danos, e para o seu agravamento, deveria ter determinado a proporção da culpa da autora, e não ter condenado exclusivamente o Banco.
28-Da conjugação dos artigos 570º, 571º e 572º do Código Civil resulta que cabe ao tribunal determinar, face às circunstâncias do caso, a proporção das culpas de ambas as partes e, bem assim, conhecer da culpa do lesado, ainda que esta não tenha sido alegada.
29-O douto tribunal a quo não curou de observar e cumprir tais normas, reguladoras do regime da concorrência de culpas, que nunca sequer mencionou, e também por isso a sentença é errónea e injusta, desligada da realidade e da circunstância e não conforme com a lei.
30-A douta sentença recorrida reconhece que era enviada à autora, semanal, quinzenalmente e sempre que era solicitada, informação completa sobre o comportamento dos fundos e a situação das contas, mas que ainda assim a autora não ficou em condições de saber que as mencionadas operações bancárias tenham sido realizadas sem observância das condições contratualmente estabelecidas para tanto e bem assim que se tratava de operações financeiras com risco de capital.
31-A autora não só tinha conhecimento de que a sua Secretária Geral assumia sozinha a subscrição das operações financeiras da B…, como há muitos anos consentia nessa prática, justificada pela total confiança que depunha na Dra. D… e pela demonstrada experiência e competência desta na gestão e administração da associação.
32-Não só ao Banco nunca foi dada qualquer orientação de que a autora não pretendia subscrever produtos com risco de capital, como a autora, ora recorrida, sabia perfeitamente que os produtos subscritos tinham esse risco, pois acompanhava a sua movimentação e performance.
33-Para além das completas informações contidas nos extratos bancários semanais, das informações telefónicas prestadas à Direção com vista às suas reuniões quinzenais, das informações prestadas aos Auditores, pode ver-se nos Balanços, nomeadamente os relativos aos exercícios 2005 a 2007, juntos de fls. 261 a 309, aprovados nas assembleias gerais anuais, uma rubrica designada “C4…”, onde se encontravam elencados todos os fundos subscritos, sendo de sublinhar que tais documentos da vida interna da autora eram assinados pelos membros da Direção, que assim se responsabilizavam pelo respetivo conteúdo.
34-A recorrida não provou que tivesse dado instruções ao Gerente do Banco no sentido de que os produtos a subscrever teriam de ser sem risco e com capital garantido, tanto assim que da resposta ao quesito 4º foram retiradas as menções de “capital garantido” e “produtos sem risco” e o quesito 5º foi dado como “não provado”.
35-Da mesma forma, foram considerados “não provados” os quesitos 8º, 9º e 10º, os quais refletiam as falsas afirmações da autora obsessivamente repetidas para fazer crer que o Gerente E… lhe havia garantido a inexistência de risco de capital.
36-Caíram por terra os aturados esforços da autora para fazer crer ao tribunal que os seus dirigentes e gestores eram iletrados financeiramente e nem sequer sabiam ler os prospetos simplificados, dos quais literalmente constava a existência de risco nos respetivos produtos.
37-Na alínea T) dos factos assentes diz-se expressamente que as aplicações financeiras realizadas com fundos da autora nos Fundos denominados “C5…”, “C6…”, “C7…” e “C8…” ficaram subordinadas às condições estabelecidas nos documentos que se mostram juntos a fls. 97, 100 a e 107 dos autos.
38-Sendo o próprio Tribunal a reconhecer que os Fundos subscritos obedeciam às condições exaradas naqueles documentos, e sendo tais documentos do conhecimento da autora, ou devendo a autora ter deles conhecimento, como não concluir que a autora é quem falta à verdade e não o Banco?
39-Se a secretária geral não tivesse atuado dentro daquilo que lhe era normal e consentido fazer, até pelo prestígio pessoal de que gozava e pelo capital de confiança de que dispunha junto da autora, não teria sido acordada com esta a rescisão amigável do contrato de trabalho, com uma confortável indemnização a favor da Dra. D…, como afirmou o Dr. H….
40-A atuação da Dra. D… – primeiro, não acatando as orientações do senhor E… de subscrever os fundos na proporção do risco, 70%/15%/15%, depois, não procedendo ao resgate dos fundos em altura mais adequada e prudente – foi prejudicial, quando podia e devia ter sido vantajosa.
41-O douto tribunal não cuidou de avaliar concretamente as condutas dos vários intervenientes, à luz dos copiosos e relevantes elementos de prova constantes dos autos, antes privilegiou claramente as declarações da D…, feitas no fundo em causa própria, e não em prol da verdade.
42-Não é possível não criticar a posição tomada pelo douto tribunal a quo, de penalizar sistematicamente o Banco sem grandes preocupações de verificar a culpa, total ou concorrente, dos demais agentes, especialmente dos considerados lesados.
43-Os fundamentos do presente recurso reconduzem-se ao erro na apreciação da matéria de facto e da prova produzida e na violação de normas do direito civil e de processo civil já referidas e adiante elencadas.
44-Aos quesitos 11º, 15º e 28º foi dada a resposta de “não provado”, quando a resposta correta deveria ter sido a de “Provado”, uma vez que dos autos constam todos os elementos de prova, documentais e testemunhais, que impõem resposta positiva.
45-Relativamente ao quesito 11º, deveria até o mesmo ser ampliado por forma a mencionar que a D… dava igualmente instruções verbais e pelo telefone, sobretudo na constituição ou renovação de depósitos a prazo, sem necessidade de ser secundada por ninguém.
46-Relativamente ao quesito 15º, os autos mostram concludentemente, pelos documentos e pelos depoimentos das testemunhas, que a resposta a esta matéria só pode ser a de provado.
47-É surpreendente que, quanto ao tema do quesito 28º, o tribunal não tenha sabido, ou não tenha querido, interpretar a vontade das partes, Banco e autora, quando, após os resgates, os seus representantes negociaram as taxas de juro a aplicar na constituição ou renovação de depósitos a prazo, nomeadamente aqueles que eram resultantes dos próprios resgates.
48-Foram numerosas as conversações e negociações com vista a que a ora recorrida visse compensadas, ou pelo menos minimizadas, as perdas resultantes dos resgates, tendo ficado provada a aplicação de elevadas taxas de juro aos novos, ou renovados, depósitos a prazo da autora.
49-Não se pretendeu atribuir um sentido técnico-jurídico à expressão “compensação”, que foi usada no seu sentido comum de reequilibrar, contrabalançar, mas pretendeu-se, e o tribunal a isso não quis atender, negociar e acordar uma forma de compensação económica, de outra forma não seriam acordadas tão generosas taxas de juro.
50-Não é justo que o tribunal tenha sido tão pródigo a “indemnizar” a autora até por perdas que esta não teve (caso de hipotéticas frutificações de não menos hipotéticos depósitos a prazo que teria feito não fora a aplicação dos saldos disponíveis nos fundos dos autos), e seja tão omisso e avaro na contabilização dos reais ganhos que o próprio Banco proporcionou à autora.
51-Aos quesitos 16º e 17º foi dada resposta restritiva, quando dos autos resulta concludentemente que deveriam ter sido ambos considerados “provados”, como o impunham os elementos de prova, testemunhal e documental, constantes dos autos e já atrás citados.
52-Dos impressos de subscrição dos fundos mobiliários dos autos, assinados pela D…, de fls. 94, 95 e 96, bem como do documento de fls. 97, consta a menção ao C1…, cuja expressão económica não foi sequer tomada em linha de conta pelo tribunal em termos de ser a mesma deduzida ao valor da condenação.
53-Dos impressos de subscrição constam ainda declarações do subscritor em que este afirma conhecer e aceitar as condições de subscrição do respetivo fundo e ter recebido um exemplar do respetivo prospeto simplificado e/ou Completo.
54-Da mesma forma, os documentos de fls. 100 a 107, que constituem outros tantos prospetos simplificados, com total descrição das características dos produtos.
55-Os documentos de fls. 108 a 110 constituem o descritivo completo dos resgates efetuados pela autora em 2010.
56-Os documentos de fls. 111 a 113 são exemplos de extratos combinados da conta da autora cujo conteúdo tem todas as informações sobre todos os aspetos da conta e dos produtos subscritos.
57-Do acervo documental junto aos autos, além dos documentos já indicados, constam os documentos de fls. 1309 a 1394, os balanços de fls. 261 a fls. 336, as atas de fls. 337 a 357, juntas a título exemplificativo, através da leitura das quais se vê o papel fundamental que a Secretária Geral desempenhava na gestão e administração da autora, e do mesmo modo se vê como a Direção expunha e submetia aos membros da Associação os resultados dos exercícios e as performances financeiras das aplicações.
58-Os documentos de fls. 358 a fls. 389 são extratos de conta do ano de 2010, deles constando os elementos de informação referentes aos depósitos a prazo nesse ano constituídos.
59-Os documentos de fls. 391 a 630 são extratos de conta dos anos de 2005, 2006 e 2007, e evidenciam os numerosíssimos movimentos havidos na conta da autora, podendo ler-se à frente da rubrica Fundos de Investimento o valor total desses mesmos Fundos à data do extrato, bastando comparar os valores totais dos fundos de investimento desde o início até ao resgate para se ter o comportamento dos fundos ao longo desses anos.
60-A carta do Banco dirigida à ora recorrida em 8 de fevereiro de 2007, constante de fls. 587 e 588, em que o Banco responde a um pedido de informação da autora e fornece as posições das suas contas e dos fundos de investimento existentes nessa data, é bem ilustrativa de que a autora pedia e recebia informações financeiras do Banco sempre que necessitava.
61-Do relatório de auditoria constante dos autos decorre que nos diversos bancos em que a autora tem conta, as fichas não se mostram atualizadas (C…, I.., J…, K…), constando titulares com capacidade de movimentação que não figuram nos seus corpos sociais, o que revela o desinteresse com que a recorrida tratava o tema.
62-Do mesmo relatório decorre que as funções e competências da Secretária Geral se situavam ao mais alto nível da atividades e responsabilidades da B…, e incluíam a preparação e o funcionamento das assembleias gerais, a elaboração das respetivas atas, e a elaboração e apresentação do relatório anual, a levar às respetivas reuniões.
63-Nas reuniões mensais de direção eram sempre apresentados mapas de posição anexos à data de reunião de direção, o que mais uma vez significa que a Direção conhecia e acompanhava a subscrição dos produtos financeiros feita pela Secretária geral.
64-Conjugando o teor dos Estatutos e Regulamento da autora, nas partes referentes às competências, com as atas das reuniões de Direção, conclui-se que a Dra. D… desempenhava funções da mais alta responsabilidade dentro da B…, sendo ela que preparava as reuniões, quem apresentava os assuntos à assembleia, quem elaborava as atas, os relatórios anuais, quem, enfim, conduzia praticamente toda a atividade da autora.
65-Era do conhecimento público, através nomeadamente da Internet, que a Secretária Geral da recorrida, D…, se assumia como CEO da B…, e como tal se comportava, com toda a naturalidade e sem sombra de abuso ou propósito ilegítimo.
66-O douto tribunal errou nos cálculos feitos para apuramento das alegadas “perdas” da recorrida, como também errou ao não determinar o apuramento dos valores ganhos pela recorrida que considerou como não líquidos, ou não devidamente apurados, como errou ao não ordenar tal liquidação para momento posterior, designadamente em incidente de liquidação de sentença.
67-Nem a lei substantiva nem a lei processual autorizam que na sentença, desde que os autos contenham os necessário elementos para o efeito, ou que tal caiba nos poderes dispositivos do tribunal, não se faça o apuramento das quantias alegadas pelas partes como sendo devidas ou como sendo a haver.
68-Como prescreve o nº 2 do artigo 609º do Código de Processo Civil, “se não houver elementos para fixar o objeto ou a quantidade, o tribunal condena no que vier a ser liquidado, em prejuízo de condenação imediata na parte que já seja líquida.”
69- No caso dos autos, o tribunal deveria ter feito, ou mandado fazer, o apuramento de todos os valores em causa, os alegados pela autora e impugnados pelo réu, ou os alegados pelo réu, e, não sendo tal possível, deveria ter ordenado a liquidação em momento posterior.
70-A soma dos montantes investidos foi de 3.362.624,99 euros e a soma dos montantes resgatados cifrou-se em 3.230.621,42 euros, pelo que o diferencial será de 131.903,57 euros, como reza a sentença.
71-O C1… proporcionou à autora, ora recorrida, ganhos que ascenderam a 17.915,08 euros (Tabela I) o que, subtraído ou deduzido aos anteriormente referidos 131.903,57 euros, reduz desde logo para 114.088,49 euros o valor das perdas da autora.
72-As Tabelas II e III demonstram que as taxas de juro aplicadas aos depósitos a prazo em 2010 e 2011 rondavam os 2% e não os 2,5% como refere a sentença recorrida.
73-A Tabela IV mostra que os rendimentos produzidos pelos depósitos a prazo efetuados após os resgates, em circunstâncias normais de mercado, ou seja, com taxas de juro atribuídas pelas competências em vigor no Banco, ascenderiam a 73.121,98 euros.
74-A Tabela V demonstra que os depósitos a Prazo efetivamente constituídos pela recorrida com taxas de juro altamente bonificadas para efeitos de compensação ou conforto financeiro, geraram ganhos reais de 131.048,10 euros, o que gera um diferencial de 57.950,00 euros.
75-Estes 57.950,00 euros constantes da Tabela VI devem, consequentemente, ser abatidos aos 114.088,49 referidos na conclusão 71, daí resultando a quantia de 56.138,49, correspondente às reais perdas da autora, caso se entenda que tais perdas são indemnizáveis pelo recorrente.
76-De todo o modo, tal só seria aplicável se por mera hipótese académica, e sem jamais conceder, fosse mantido o entendimento de que o Banco réu seria o exclusivo culpado.
77-Foram pela sentença recorrida violadas as normas dos artigos 342º, 799º, nº2, conjugado com o nº2 do artigo 487º, 562º, 563º, 564º, 570º, 571º e 572º, todos do Código Civil, bem assim as normas dos artigos 607º, nº4, 609º nº2, 615º, nº1, alínea d), do Código de Processo Civil, mostrando-se cumpridas pelo recorrente todas as determinações legais atinentes à propositura do presente recurso.

A Autora apresentou contra-alegações em que sustentou a inadmissibilidade do recurso quanto à impugnação da decisão sobre a matéria de facto e a improcedência do mesmo quanto ao demais.
*
1. Do objeto do recurso
O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do Recorrente.
Nas conclusões apresentadas o Recorrente manifestou a sua vontade de impugnar o julgamento da matéria de facto, discordando das respostas dadas aos quesitos 11.º, 15.º, 16.º, 17.º e 28º.
A Recorrida, nas contra-alegações opôs-se ao conhecimento do recurso nesta parte.
Em primeiro lugar, entende que o recurso do julgamento da matéria de facto apenas pode ter como fundamento a existência de um meio de prova que imponha obrigatoriamente uma decisão diferente da que foi tomada e não, como pretende o Recorrente, que o tribunal de recurso proceda a uma diferente valoração das provas produzidas em 1.ª instância.
Esta visão restritiva do âmbito do recurso da matéria de facto não tem tradução nem na letra da lei, nem em qualquer outro elemento interpretativo, designadamente os trabalhos preparatórios do atual Código de Processo Civil, pelo que não é de acolher essa leitura, sendo permitido ao tribunal de recurso efetuar uma diferente valoração dos meios de prova, alterando o julgamento da 1.ª instância, sem que exista um qualquer meio de prova que vincule o tribunal a essa decisão (prova legal).
A Recorrida também alega que o Recorrente não cumpriu o ónus a que alude a alínea a) (e não b), como por lapso refere), do n.º 2, do artigo 640.º, do Código de Processo Civil – quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes.
Alega que, apesar do Recorrente ter transcrito parte dos depoimentos testemunhais e indicar os documentos que na sua perspetiva impõem um julgamento diferente da matéria de facto, não especifica quais são as concretas passagens desses depoimentos e desses documentos que fundamentam a sua discordância.
Conforme tem vindo a entender o Supremo Tribunal de Justiça, este ónus de indicação exata das passagens relevantes dos depoimentos gravados e dos documentos que na perspetiva do Recorrente impõem uma decisão diversa no julgamento da matéria de facto deve ser interpretado em termos funcionalmente adequados e em conformidade com o princípio da proporcionalidade, não sendo justificada a imediata e liminar rejeição do recurso quando, apesar de a indicação do recorrente não ser, porventura, totalmente exata e precisa, não exista dificuldade relevante na localização pela contraparte e pelo tribunal dos excertos da gravação e/ou do conteúdo dos documentos em que a parte se haja fundado para demonstrar o invocado erro de julgamento.
Ora, é precisamente o que sucede no presente caso, em que, apesar do Recorrente não ter individualizado as concretas expressões das partes dos depoimentos que invoca, nem qual o concreto conteúdo dos documentos que refere como fundamento do recurso sobre o julgamento da matéria de facto, das alegações apresentadas são facilmente percetíveis as razões pelas quais ele entende que tais depoimentos e documentos justificam uma decisão diversa, como aliás se verifica quando a própria Recorrida contesta as alegações do Recorrente.
Daí que não haja obstáculos ao conhecimento do recurso na parte em que impugna as respostas dadas aos quesitos 11.º, 15.º, 16.º, 17.º e 28.º.
São, pois, as seguintes as questões a abordar neste recurso:
a) Devem considerar-se integralmente provados os factos constantes dos quesitos 11.º, 15.º, 16.º, 17.º e 28.º?
b) A Secretária-Geral da Autora estava tacitamente autorizada a sozinha subscrever as aplicações financeiras em causa?
b) O Réu não é o único responsável pelos prejuízos sofridos pela Autora com a subscrição em seu nome de unidades de participação em fundos de investimento mobiliário?
c) O valor dos prejuízos sofridos pela Autora está incorretamente calculado?

2. Os factos
2.1. Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto
O Recorrente discorda das respostas dadas aos quesitos 11.º, 15.º, 16.º, 17.º e 28.º.
É o seguinte o conteúdo destes quesitos:
11º De há vários anos a esta parte, as contas bancárias da autora eram movimentadas apenas com a assinatura da sr.ª Dr.ª D…, o que era conhecido, consentido e autorizado pela autora ?
15º Entre autora e réu houve a negociação do investimento no regime “C1…”, como foram prestadas pelo funcionário do Banco todas as explicações sobre os Fundos, suas características, condições e termos, tendo sido entregues à Sra. Dra. D… os impressos, folhetos e documentos dos quais constam as referidas características, condições e termos?
16.º A Autora tinha conhecimento da subscrição dos Fundos efetuada em seu nome e representação pela sua Secretária Geral Dra. D…?
17º Todas essas operações, além de serem objeto de notas de lançamento que eram enviadas à Autora, eram do mesmo modo refletidas nos extratos de conta que lhe eram semanalmente remetidos, dos quais constava a identificação dos Fundos, a quantidade de Unidades de Participação subscritas, as respetivas cotações, o seu valor de mercado?
28º Ficou acordado entre as partes que o estabelecimento das taxas de juros referidas de 21º a 27º visava “compensar” a autora pela descida das cotações dos fundos?
O Tribunal da 1.ª instância respondeu do seguinte modo a estes quesitos:
11.º - Não provado.
15.º - Não provado.
16.º e 17.º: Provado que, pelo menos quinzenalmente eram remetidos à Autora extratos de conta e notas de lançamento, dos quais constava a identificação dos Fundos, a quantidade de Unidades de Participação subscritas, as respetivas cotações e o seu valor de mercado.
Quesito 28.º: Não provado.
Fundamentou estas respostas com as seguintes explicações:
No que tange à factualidade constante dos factos controvertidos nºs 4 (na parte que não logrou demonstração), 5, 8, 9, 10 e 15, da prova adrede produzida, apenas as testemunhas E… e D… prestaram depoimentos diretos, já que todas as demais pessoas inquiridas sobre tal matéria (designadamente L…, G…, H…, M… e N…) prestaram depoimento de cariz marcadamente indireto, porquanto invocaram como razão de ciência o que a esse propósito lhes foi confidenciado pelas mencionadas testemunhas E… e D…, não tendo tido, porém, qualquer participação (direta) nas conversações que culminaram na subscrição dos produtos financeiros a que se alude nas alíneas N), O), P) e Q) da matéria de facto assente.
Ora, sobre a aludida materialidade, as mencionadas testemunhas E… e D… prestaram depoimentos de sinal contrário. Com efeito, o primeiro (que trabalha para a ré desde 1990, tendo sido, como se notou, gestor da conta da autora no período compreendido entre 2001 e 2009) referiu que explicou exaustivamente à D… a natureza dos ajuizados produtos financeiros e que os mesmos tinham risco de capital, fornecendo-lhe a respetiva ficha técnica; já esta última adiantou que, em momento algum, lhe foi dito que tais produtos implicariam risco de capital, acrescentando outrossim que aquele sabia que a autora, dada a sua natureza associativa, somente efetuava aplicações financeiras sem risco de capital, afiançando ainda que nem na ocasião da subscrição dos produtos (cfr. fls. 94 a 96 dos autos) nem posteriormente lhe foi entregue qualquer informação técnica referente aos mesmos.
Perante a discrepância registada entre tais depoimentos, foi realizada acareação, diligência essa que se revelou inconclusiva, posto que, na essência, mantiveram os depoimentos inicialmente prestados.
Daí que na ausência de outros subsídios probatórios mais consistentes, mormente de natureza documental, e atentas as implicações neste domínio do princípio plasmado no art. 414º do Cód. Processo Civil, propendemos, pois, para dar como não demonstradas as afirmações de facto plasmadas nos referidos factos controvertidos.
No que concerne à matéria constante do facto controvertido nº 11, no decurso da audiência final algumas testemunhas, designadamente E…, adiantaram que as aplicações bancárias da autora eram feitas apenas com a assinatura de D…, acrescentando mesmo que algumas dessas aplicações, mormente depósitos a prazo, eram feitas verbalmente por esta última; este facto foi, aliás, confirmado por D…, que referiu efetuar depósitos a prazo sem duas assinaturas, chegando até a fazê-lo, conforme igualmente adiantou, por telefone, acrescentando que havia como que um entendimento de que para a realização dos depósitos a prazo não seria necessária a recolha de assinaturas (embora não soubesse explicar como é que internamente e para efeitos contabilísticos as operações fossem suportadas documentalmente).
O certo é que a ré não apresentou quaisquer elementos consistentes (v.g. cheques) comprovativos de que a efetiva movimentação das contas bancárias da autora (fora das situações ressalvadas na declaração escrita que se mostra junta, por cópia, a fls. 93 dos autos) fosse realizada apenas com a assinatura de D…, sendo certo que, conforme resulta da alínea F) da matéria de facto assente, esses movimentos teriam de ser efetivados por intermédio de cheque ou impressos próprios, assinados por dois diretores em exercício, sendo uma delas a do Tesoureiro ou seu substituto (determinação esta constante dos Estatutos da autora, que, como anteriormente se referiu, a ré tinha em seu poder – cfr. alínea L) da matéria de facto assente).
No que tange à facticidade vertida no facto controvertido nº 16 (na parte que não logrou demonstração), teve-se em consideração os depoimentos prestados por L…, O… e H…, que afiançaram que nem o Conselho Fiscal nem a Direção da autora foram informados da realização das ajuizadas aplicações financeiras, esclarecendo que, dada a natureza associativa da demandante, estava instituído o princípio de que as disponibilidades financeiras existentes somente poderiam ser aplicadas em produtos financeiros sem risco de capital (embora, conforme adiantou a testemunha P…, essa determinação não constasse expressamente de qualquer documento escrito emitido pela direção da autora), designadamente em depósitos a prazo. De igual modo, esta última testemunha e bem assim H… e N… (que fez parte da direção da autora entre 2000 e 2007, sendo desde 2008 trabalhadora da mesma) referiram que a demandante somente foi alertada para a existência de produtos financeiros com risco no momento em que os seus serviços constataram que as ajuizadas aplicações financeiras estavam a baixo do par (isto é, abaixo do preço de aquisição), situação essa detetada em setembro/outubro do ano de 2008, o que obrigou a uma reação da autora, mormente solicitando a realização de auditoria interna que foi levada a cabo pela testemunha P… (o qual, no seu termo, apresentou o relatório que se mostra junto de fls. 1485 a 1522 dos autos).
Ainda a este propósito, várias das testemunhas inquiridas (v.g. H…, N…, D… e P…) afiançaram que não era possível, através da análise da informação bancária que a ré regularmente remetia à autora, determinar que os ajuizados produtos financeiros fossem produtos de risco, acrescentando outrossim que a exegese das demonstrações financeiras da autora (que se mostram juntas, por cópia, de fls. 240 a 336 dos autos) não permitia outrossim evidenciar a existência de aplicações com risco de capital.

Quanto à materialidade vertida no facto controvertido nº 28, a prova adrede produzida não se revelou consistente no sentido de que as taxas de juro estabelecidas nos depósitos a prazo realizados pela autora na instituição de crédito ré tivessem sido contratadas como forma de compensar aquela pela descida da cotação dos fundos.
Com efeito, conforme referido pelas testemunhas P…, H…, M…, Q… e S…, pese embora tenham existido conversações entre representantes da autora e da ré no sentido de ser gizada uma solução para as perdas registadas nos ajuizados produtos financeiros, facto é que essas negociações não chegaram a bom porto. Daí que, como adiantou a testemunha H…, as aplicações financeiras realizadas na ré nos meses de outubro, novembro e dezembro de 2010 foram levadas a cabo não como forma de compensação da autora pelas perdas sofridas em resultado da desvalorização da cotação dos fundos, mas antes porque, nessa ocasião, era a instituição de crédito demandada a que apresentava condições mais favoráveis para depósitos a prazo, depoimento esse que, neste particular, se mostra corroborado por S… (trabalhador da ré desde 1991), segundo o qual as taxas de juro estipuladas para as referidas aplicações não se destinaram a compensar perdas, designadamente compensar a diferença registada entre o valor aplicado nos ajuizados produtos financeiros e o valor apercebido aquando do seu resgate.
Relativamente à matéria dos quesitos 11.º e 15.º, o Recorrente pretende que os mesmos sejam considerados provados, com fundamento no depoimento de E… e do teor dos doc. de fls. 94 a 97, 100 a 107, 108 a 110, 111 a 113 v.
No quesito 11.º perguntava-se se de há vários anos a esta parte as contas bancárias da Autora eram movimentadas apenas com a assinatura de D…, o que era conhecido, consentido e autorizado pela Autora.
Atento o quesitado em 12.º, os movimentos referidos em 11.º respeitavam a ordens relativas à realização de aplicações financeiras, utilizando as quantias depositadas no banco Réu.
Apesar da testemunha E…, funcionário do Réu, ter deposto neste sentido, embora acentuando, sobretudo, a circunstância de várias ordens visando a constituição de depósitos a prazo terem sido dadas verbalmente pela Secretária-Geral da Autora, o facto do Réu não ter junto nenhum documento comprovativo das alegadas ordens subscritas apenas pela Secretária-Geral, além de algumas daquelas que estão aqui em causa, desvaloriza tal depoimento, sendo o mesmo insuficiente para que se considere que tal prática tenha existido e que a mesma tivesse a concordância da Autora.
Nada esclarecendo sobre este assunto os doc. de fls. 94 a 97, 100 a 107, 108 a 110, 111 a 113 v., não deve ser alterada a resposta dada ao quesito 11.º.
No quesito 15.º perguntava-se se entre Autora e Réu houve a negociação do investimento no regime “C1…”, tendo sido prestadas pelo funcionário do Banco todas as explicações sobre os Fundos, suas características, condições e termos, tendo sido entregues a D… os impressos, folhetos e documentos dos quais constam as referidas características, condições e termos.
Quanto a este aspeto verificou-se uma contradição insanável entre os depoimentos de E… e D…, sendo certo que só estas duas testemunhas tinham um conhecimento direto do que ocorreu entre elas.
O Réu juntou aos autos três documentos de subscrição dos produtos financeiros em causa assinados por D…, em representação da Autora, nos quais constam impressos os seguintes dizeres:
O subscritor abaixo assinado declara:
“Conhecer e aceitar as condições de subscrição do(s) Fundo(s) que subscreveu, bem como ter recebido um exemplar do(s) respetivo(s)Prospeto(s) Simplificado(s) e/ou Completo(s), associados ao presente Boletim de Subscrição.”
E declara mais adiante, no mesmo boletim de subscrição: “O risco do Fundo C8… pode ser alterado devido, nomeadamente, a modificação da composição do património e da natureza dos ativos que o integram. Este Fundo está exposto ao risco de preço pelo facto de deter como seu ativo principal ações, incorporando também risco cambial através do investimento em mercados externos à Zona Euro. Pelo investimento em obrigações, o fundo poderá ficar exposto ao risco de crédito e ao risco de taxa de juro. O Fundo ao investir nos mercados dos países da OCDE e outros autorizados pela CMVM encontra-se exposto ao respetivo risco do País.”
Não sendo suficiente a assinatura da sua Secretária-Geral para vincular a Autora numa operação deste tipo, não é possível afirmar, com base nestes documentos, que o investimento ordenado foi negociado entre a Autora e a Ré, e se é certo que D… assinou documentos que continham a menção de que declarava ter recebido um exemplar dos Prospetos associados ao Boletim de Subscrição, a contradição ocorrida entre os depoimentos daquelas testemunhas não permite afirmar, com o necessário grau de certeza, que tais prospetos lhe tenham sido entregues.
Por estas razões não deve ser alterada a resposta ao quesito 15.º.
Quanto à matéria dos quesitos 16.º e 17.º o Réu defende que devem ser julgados integralmente provados.
O Tribunal recorrido apenas considerou provado que, pelo menos, quinzenalmente eram remetidos à Autora extratos de conta e notas de lançamento, dos quais constava a identificação dos Fundos, a quantidade de Unidades de Participação subscritas, as respetivas cotações e o seu valor de mercado, não tendo julgado provado que a Autora tivesse conhecimento da subscrição dos Fundos efetuada em seu nome e representação pela sua Secretária Geral D….
Conforme resulta da fundamentação da resposta dada a estes quesitos o que o Tribunal recorrido considerou que não se provou foi que a Autora conhecesse o regime dos Fundos subscritos pela sua Secretária Geral e não que a Autora não soubesse que tais Fundos haviam sido subscritos pela sua Secretária Geral. Ora, sendo isso e apenas isso que se pergunta no quesito 16.º, deveria o mesmo ter sido julgado provado, por presunção judicial, atento o teor da documentação regularmente recebida pela Autora em que era mencionada a existência dos investimentos em causa, o que tornava impossível que a Autora não soubesse que a sua Secretária-Geral havia subscrito as respetivas aplicações financeiras. Deve, pois, o quesito 16.º ser julgado provado, mantendo-se o conteúdo da resposta conjunta dada para o quesito 17.º.
O Réu defende ainda que o quesito 28.º deveria ter sido considerado provado com base no depoimento da testemunha E… e no teor dos documentos de fls. 94 a 97, 100 a 107, 108 a 110, 111 a 113 v..
Neste quesito perguntava-se se ficou acordado entre as partes que o estabelecimento das taxas de juros referidas de 21º a 27º visava “compensar” a Autora pela descida das cotações dos fundos.
Relativamente aos juros referidos nos quesitos 24.º a 27.º era impossível que tivesse existido qualquer acordo no sentido do seu estabelecimento ser uma compensação pela descida verificada na cotação dos fundos, uma vez que os mesmos foram contratados em datas anteriores a ter-se verificado essa descida.
Quanto aos juros referidos nos quesitos 21.º a 23.º, se é verdade que o depoimento de E… confirma o que consta deste quesito, o mesmo é contrariado pelos depoimentos das testemunhas T… e H… que negam a existência desse acordo, referindo esta última testemunha que tais depósitos a prazo apenas foram efetuados junto do Réu, porque era este que apresentava as taxas de juro mais atrativas no mercado bancário. Uma vez que os documentos referidos em nada ajudam a esclarecer esta matéria, não existe uma certeza sobre a efetivação do alegado acordo, pelo que não deve ser alterada a resposta dada ao quesito 28.º.
Por estas razões deve manter-se a resposta dada aos quesitos 11.º, 15.º e 28.º, alterando-se a resposta conjunta dada aos quesitos 16.º e 17.º, passando o quesito 16.º a ser considerado provado e o quesito 17.º a ser respondido nos termos da resposta conjunta dada pelo tribunal recorrido.

2.2. Da alteração oficiosa da matéria de facto
A decisão recorrida incluiu na matéria de facto considerada provada (pontos 21.º a 33.º) todo o conteúdo das alíneas X a LL que constavam da matéria de facto assente fixada no despacho saneador.
Nestas alíneas, além de se referir como factos principais os resgates de unidades de participação nos diversos fundos de investimento mobiliário, também se refere o valor do capital investido nos referidos fundos e o resultado aritmético das mais valias obtidas.
Constata-se, contudo, que o valor desses capitais já estava considerado provado, por acordo expresso das partes nos articulados, nas alíneas N a P da matéria de facto assente no despacho saneador, tendo sido transpostos para os pontos 13.º a 16.º da matéria de facto considerada provada pela sentença recorrida.
Não coincidindo os valores do capital investido constantes dos pontos 21.º a 33.º com os valores referidos nos pontos 13.º a 16.º, os quais resultaram de acordo expresso das partes nos articulados, utilizando a faculdade prevista no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, devem os primeiros serem eliminados, assim como o resultado aritmético das mais valias obtidas, sob pena de contradição intrínseca dos factos provados.
Na sentença recorrida, no ponto 34.º da matéria de facto provada que transcreveu a alínea MM dos factos assentes no despacho saneador, refere-se que a Autora, com exceção da aplicação “C8…”, subscritas pelo valor de €50.000,00, resgatou todas as demais aplicações feitas, para depois no ponto 53.º se referir que a participação na aplicação C8… também foi resgatada.
Resultando esta contradição do facto deste último facto ser superveniente, relativamente à elaboração do despacho saneador, deve ser eliminada, no uso da faculdade prevista no artigo 662.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, no ponto 34.º a menção desatualizada às aplicações “C8…”.

2.2. Os factos provados
São, pois, os seguintes os factos provados na presente ação:
1º- A B… é uma Associação sem fins lucrativos, que exerce a sua atividade desde 1985 (alínea A) da matéria de facto assente).
2º- A B… tem por objeto a gestão a nível nacional do Sistema B… (vulgarmente conhecido como código de barras), bem como o acompanhamento, investigação, estudo, formação, implementação e desenvolvimento de outros sistemas que conduzam à normalização e simplificação de procedimentos no âmbito da Indústria, Comércio e Serviços (alínea B) da matéria de facto assente).
3º- A B… tem como órgão executivo a sua Direção, estatutariamente composta por cinco membros (alínea C) da matéria de facto assente).
4º- Nos termos dos seus Estatutos, compete à Direção da Associação abrir e movimentar contas bancárias (alínea D) da matéria de facto assente).
5º- Nos termos dos seus Estatutos, a A. vincula-se com as “assinaturas conjuntas de dois membros da Direção, sendo uma delas a do Presidente ou a de outro membro em que ele delegar” (alínea E) da matéria de facto assente).
6º- Nos termos dos Estatutos, “os movimentos das contas bancárias da Associação serão satisfeitos por meio de cheque ou impressos próprios, assinados por dois Diretores em exercício, sendo uma delas a do Tesoureiro ou seu substituto” (alínea F) da matéria de facto assente).
7º- A estrutura da A. conta ainda com um funcionário superior designado Secretário-Geral, com funções internas e de coordenação dos serviços, sendo que o funcionário superior poderá ser nomeado pela Direção como substituto do tesoureiro para os efeitos do artigo 27º dos Estatutos” (alínea G) da matéria de facto assente).
8º- Há mais de 5 anos foi nomeada a Senhora Dra. D… como Secretária Geral da Associação, e como substituta Estatutária do Tesoureiro para os efeitos daquele artigo 27º dos Estatutos, passando então esta Secretária Geral, a par com os demais Diretores, a poder movimentar as contas bancárias da A. e a poder dar instruções bancárias (alínea H) da matéria de facto assente).
9º- O R. C… é um banco que opera em Portugal, e que presta serviços bancários aos seus clientes, e também à A., que é seu cliente há vários anos (alínea I) da matéria de facto assente).
10º- Foi aberta uma conta bancária da A. no Banco Réu, a que este deu o nº 118789305, a par de outras contas bancárias também aí abertas e existentes (alínea J) da matéria de facto assente).
11º- Na abertura de todas as contas da Autora no Banco Réu, e para esse mesmo efeito, este solicitou à Autora os seus documentos corporativos, tendo-lhe a A. fornecido, entre outros, os seus Estatutos e Regulamento, tendo ficado estabelecido que a vinculação da Associação dependia sempre da intervenção conjunta de duas pessoas da sua Direção, incluindo a do substituto nomeado do Tesoureiro (alínea L) da matéria de facto assente).
12º- As relações estabelecidas entre a B… e o Banco Réu foram nos últimos anos conduzidas, da parte da A., pela sua Secretária Geral, e da parte do Banco, pelo Gestor de Conta do C… do balcão C2…, em Lisboa, E… (alínea M) da matéria de facto assente).
13º- Em 7 de julho de 2005 foram subscritas em nome da A. um número de unidades de participação, num fundo de valores financeiros denominados “C9…”, no valor de €815.500,00, “C10…”, no valor de €815.500,00 e “C11…”, no valor de €819.000,00, num total de €2.450.000,00 como valor de aquisição, procedendo o Banco R. ao débito deste valor de €2.450.000,00 na conta bancária da A. (alínea N) da matéria de facto assente).
14º- Em 26 de outubro de 2005 foram subscritas em nome da A., nos mesmos termos, um número de unidades de participação, num fundo de valores financeiros denominados “C9…”, no valor de €254.508,33, “C10…”, no valor de €254.508,33 e “C11…”, no valor de €254.508,33, num total de €763.524,99 como valor de aquisição, procedendo o Banco R. ao débito deste valor de €763.524,99 na conta bancária da A. (alínea O) da matéria de facto assente).
15º- Em 14 de março de 2006 foram subscritas em nome da A., nos mesmos termos, um número de unidades de participação, num fundo de valores financeiros denominados “C9…”, no valor de €16.100,00, “C10…”, no valor de €16.100,00 e “C11…”, no valor de €16.800,00, num total de €49.000,00 como valor de aquisição, procedendo o Banco R. ao débito deste valor de €49.000,00 na conta bancária da A. (alínea P) da matéria de facto assente).
16º- Em 8 de outubro de 2007 foram subscritas em nome da A., nos mesmos termos, um número de unidades de participação, num fundo de valores financeiros denominado “C11…”, no valor de €50.000,00, e num fundo de ações denominado “C8…”, no valor de aquisição de €50.000,00, num total de €100.000,00 como valor de aquisição, procedendo o Banco R. ao débito deste valor de €100.000,00 na conta bancária da A. (alínea Q) da matéria de facto assente).
17º- As subscrições de fundos realizadas pelo Banco R. em nome da A. foram vertidas pelo funcionário do Banco R. em impressos bancários próprios do mesmo Banco, assinadas pela referida funcionária da Autora, D…, e exclusivamente usando a sua assinatura (alínea R) da matéria de facto assente).
18º- As aplicações financeiras realizadas com fundos da Autora nos Fundos denominados “C5…”, “C6…”, “C7…” e “C8…” ficaram subordinadas às condições estabelecidas nos documentos que se mostram juntos a fls. 97, 100 a e 107 dos autos (alínea T) da matéria de facto assente).
19º- Em 29.08.2008 o Banco Réu procedeu por sua iniciativa à alteração da denominação das aplicações financeiras, que passaram a designar-se respetivamente C5…, C6… e C7…, respetivamente para “C9…”, “C11…” e “C5…” (alínea U) da matéria de facto assente).
20º- Em 1 de outubro de 2009, remeteu a Autora ao Réu a missiva que se mostra junta a fls. 48 e 49, a que este respondeu em 27 de outubro, através da carta junta a fls. 50 dos autos (alínea V) da matéria de facto assente).
21º- A Autora efetuou um primeiro resgate em 24 de junho de 2010: resgatou 70.000.0000 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €512.071,00 (alínea X) da matéria de facto assente corrigida).
22º- Em 22/10/2010, efetuou novo resgate de 70.000.000 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €525.238,00, (alínea Z) da matéria de facto assente corrigida).
23º- Em 22/10/2010, a Autora resgatou igualmente 70.000.0000 Unidades de Participação no Fundo C6…, que havia subscrito em 7/7/2005, por 501.375,00 (alínea AA) da matéria de facto assente corrigida).
24º- Em 2/11/2010, a Autora resgatou 35 904.3875 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €269.692,22, (alínea BB) da matéria de facto assente corrigida).
25º- Em 2/11/2010, a Autora resgatou 32.861.4058 Unidades de Participação no C5…, que havia subscrito em 26/10/2005, por €246.935,16 (alínea CC) da matéria de facto assente corrigida).
26º- Em 2/11/2010, a Autora resgatou 2.060.2019 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 14/3/2006, por €15.475,00, (alínea DD) da matéria de facto assente corrigida).
27º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 39.108.4252 Unidades de Participação no Fundo C6…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €282.929,90, (alínea EE) da matéria de facto assente corrigida).
28º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 33.772.8642 Unidades de Participação no Fundo C6…, que havia subscrito em 26/10/2005, por €244.329,79, (alínea FF) da matéria de facto assente corrigida).
29º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 2.076.8407 Unidades de Participação no Fundo C6…do, que havia subscrito em 14/3/2006, por €15.024,90, obtendo assim uma mais-valia de €191,07 (alínea GG) da matéria de facto assente corrigida).
30º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 39.691.0353 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 7/7/2005, por € 291.633,85, (alínea HH) da matéria de facto assente corrigida).
31º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 33.745.6188 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 26/10/2005, por €247.949,31, (alínea II) da matéria de facto assente corrigida).
32º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 2 086.1210 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 14/3/2006, por €15.327,98, (alínea JJ) da matéria de facto assente corrigida).
33º- Em 18/11/2010, a Autora resgatou 5 887.3777 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 8/10/2007, por €43.258,10, (alínea LL) da matéria de facto assente corrigida).
34º- A Autora, resgatou todas estas aplicações feitas, tendo constituído, com os fundos resgatados, no valor de €3.204.795,00, depósitos a prazo no Banco Réu (alínea MM) da matéria de facto assente corrigida).
35º- As condições de movimentação das contas da Autora referidas em 11º foram anotadas pelo Réu Banco nos seus registos com vista a serem respeitadas e observadas em todos os movimentos de conta, que assim necessitavam sempre de duas assinaturas para a sua realização (resposta ao facto controvertido nº 1).
36º- Ao longo dos anos em que a Autora manteve contas bancárias no Banco Réu, a pedido da Autora B…, o Réu Banco atualizava a ficha bancária das pessoas que em cada momento tinham poderes para dar ordens bancárias relativamente às contas da sua titularidade (resposta ao facto controvertido nº 2).
37º- Anotando o Banco para o efeito a sua identificação e demais dados pessoais, e ainda guardava em arquivo documento com a sua assinatura para posterior confronto e confirmação da genuinidade das ordens recebidas (resposta ao facto controvertido nº 3).
38º- Em julho de 2005 existiam saldos de tesouraria da Autora, tendo D… contatado E… para realizar aplicações em produtos bancários das referidas disponibilidades (resposta ao facto controvertido nº 4).
39º- Foram realizadas as subscrições referidas em 13º, 14º 15º e 16º (resposta aos factos controvertidos nºs 6 e 7).
40º- A direção da autora conferiu poderes a D… para por si só ordenar o processamento do pagamento de vencimentos, contribuições para a Segurança Social, impostos, nomeadamente IRS, IRC e outros (resposta ao facto controvertido nº 12).
41º- Na ocasião da subscrição dos produtos referidos em 13º, 14º, 15º e 16º a taxa de juro de remuneração de depósitos a prazo cifrava-se num valor médio de 2,5% ao ano (resposta ao facto controvertido nº 13).
42º- Nos produtos referidos em 13º, 14º, 15º e 16º foi aplicado o valor de €3.362.524,99, mas ao mesmo tempo foram constituídos depósitos a prazo, no valor de €1.498.225,00, no âmbito do produto denominado “C1…”, ou seja, uma vertente era constituída pelos Fundos, a outra vertente era constituída por depósitos a prazo, com taxas acima das taxas “standard” (resposta ao facto controvertido nº 14).
43.º A Autora tinha conhecimento da subscrição dos Fundos efetuada em seu nome e representação pela sua Secretária Geral D… (resposta ao facto controvertido n.º 16.º)
44º- Pelo menos quinzenalmente, eram remetidos à Autora extratos de conta e notas de lançamento, dos quais constava a identificação dos Fundos, à quantidade de Unidades de Participação subscritas, as respetivas cotações e o seu valor de mercado (resposta ao facto controvertido nº 17).
45º- Nas informações periodicamente fornecidas pelo Banco aos auditores da Autora, eram indicados os saldos das contas, as aplicações efetuadas, os depósitos a prazo constituídos, os Fundos subscritos, bem assim os demais produtos financeiros contratados (resposta ao facto controvertido nº 18).
46º- O Banco fornecia, a pedido da Direção da Autora, e sempre que esta reunia, o que sucedia quinzenal ou mensalmente, informações sobre a rentabilidade dos Fundos e de outros produtos financeiros, informações que eram prestadas muitas vezes por via telefónica pelo Sr. E… (resposta ao facto controvertido nº 19).
47º- Em 28 de outubro de 2010, a Autora constituiu na Ré um depósito a prazo de um milhão de euros, à taxa de 4,6% ao ano (resposta ao facto controvertido nº 21).
48º- Em 25 de novembro de 2010, a Autora constituiu na Ré um depósito a prazo de um milhão de euros, à taxa de 4,75% ao ano (resposta ao facto controvertido nº 22).
49º- Em 30 de dezembro de 2010, a Autora constituiu na Ré um depósito a prazo a 15 dias, de €140.000,00, à taxa de 2,10% (resposta ao facto controvertido nº 23).
50º- Os três depósitos a prazo constituídos em julho de 2005 correlativamente com os Fundos subscritos na mesma altura, nos montantes de €349.500,00, €349.500,00 e €351.000,00, beneficiaram de uma taxa de juro não apurada, tendo a Autora obtido um benefício em montante concretamente não apurado (resposta ao facto controvertido nº 24).
51º- Os três depósitos a prazo constituídos em outubro de 2005 correlativamente com os Fundos subscritos na mesma altura, nos montantes de €109.075,00, €109.075,00 e €109.075,00, foram remunerados durante três meses a uma taxa não apurada, tendo a autora obtido um benefício em montante concretamente não apurada (resposta ao facto controvertido nº 25).
52º- Os restantes depósitos a prazo inseridos no produto C1… geraram para a Autora um benefício em montante concretamente não apurado (resposta ao facto controvertido nº 26).
53º- Ao longo do tempo a Autora efetuou depósitos a prazo nos termos que constam de fls. 120 e 121 dos autos (resposta ao facto controvertido nº 27).
54º- No produto “C8…” foi aplicado, em 8 de outubro de 2007, o montante de €50.000,00, produto esse que foi resgatado, em 28 de junho de 2012, pelo valor de €19.381,21.

3. O direito aplicável
3.1. Da responsabilidade do Réu
Com a presente ação a Autora pretende que o Banco Réu a indemnize dos prejuízos que sofreu por terem sido subscritas em seu nome unidades de participação em fundos de investimento mobiliários abertos de duração indeterminada, cuja entidade gestora era o próprio Banco Réu.
Fundamentou este pedido, por um lado, no facto do pedido de subscrição ter sido efetuado por uma sua funcionária que não tinha poderes para isoladamente vinculá-la, nem para movimentar a conta bancária de onde foram retirados os montantes investidos e, por outro lado, porque o Banco Réu prestou àquela funcionária a informação errada de que aqueles investimentos não importavam o risco de perda do capital investido.
A sentença recorrida condenou o Banco Réu a indemnizar a Autora com fundamento apenas no Réu ter permitido que o levantamento dos montantes investidos nos referidos Fundos se efetuasse com um pedido assinado apenas por uma funcionária da Autora, não se tendo considerado provada a existência de uma má informação por parte do Banco Réu.
A existência de uma conta bancária aberta no Banco Réu em nome da Autora pressupõe a celebração de um contrato denominado de abertura de conta bancária que disciplina as relações complexas que se passam a desenvolver entre o banco e o seu cliente, sendo o seu regime definido pelo acordo celebrado entre as partes [1].
Um dos elementos mais comuns deste contrato é a definição de quem pode movimentar essa conta, sendo preenchida pelo cliente a respetiva ficha de assinaturas.
Neste aspeto, provou-se que entre a Autora e o Réu ficou estabelecido que a vinculação da Associação perante o Réu dependia sempre da intervenção conjunta de duas pessoas da sua Direção, incluindo a do substituto nomeado do Tesoureiro.
Esta forma de vinculação mais não refletia que o disposto nos Estatutos da Autora segundo os quais os movimentos das contas bancárias da Associação serão satisfeitos por meio de cheque ou impressos próprios, assinados por dois Diretores em exercício, sendo uma delas a do Tesoureiro ou seu substituto.
A estrutura da Autora conta com um funcionário superior designado Secretário-Geral, com funções internas e de coordenação dos serviços, sendo que o funcionário superior poderá ser nomeado pela Direção como substituto do tesoureiro para os efeitos acima referidos.
Há mais de 5 anos foi nomeada D… como Secretária-Geral da Associação, e como substituta Estatutária do Tesoureiro para os referidos efeitos, passando então esta Secretária-Geral, a par com os demais Diretores, a poder movimentar as contas bancárias da Autora e a poder dar instruções bancárias.
Sucedeu que nos anos de 2005, 2006 e 2007 foram subscritas por diversas vezes em nome da Autora um número de unidades de participação em fundos de valores financeiros mobiliários.
As subscrições das unidades de participação em fundos realizadas pelo Banco Réu em nome da Autora foram vertidas por um funcionário do Banco em impressos bancários próprios do mesmo Banco, assinados exclusivamente pela referida funcionária da Autora, D…, tendo o Banco Réu procedido ao débito dos respetivos valores na conta bancária da Autora.
Ao intervir apenas a referida funcionária da Autora nos atos de subscrição de unidades de participação em fundos de investimento mobiliário, através da movimentação de quantias depositadas na conta daquela, desrespeitou-se a forma acordada de vinculação da Autora perante o Réu, carecendo a referida funcionária, isoladamente, de poderes para representar a Autora na celebração destes negócios jurídicos de intermediação financeira e na inerente ordem de movimentação de valores depositados na conta bancária aberta no banco Réu.
As consequências desta falta de poderes de representação da Autora por quem interveio nos referidos negócios jurídico são as prescritas no artigo 268.º do Código Civil – o negócio é ineficaz se não for ratificado pela representada.

Mas a Autora ao proceder ao resgate das unidades de participação nos referidos fundos de investimento, praticou atos extintivos dos negócios celebrados pela sua Secretária-Geral, pelo que estamos perante uma ratificação tácita dos negócios celebrados por aquela sem poder de representação [2], uma vez que a intervenção da Autora, apesar de extintiva desses negócios, assume a relação jurídica por eles estabelecida e nela se insere, sendo os atos de resgate praticados próprios de quem se considera parte nessa relação, equivalendo a uma denúncia de relações contratuais duradouras.
Mas a ratificação pela Autora dos negócios de intermediação financeira celebrados pela sua Secretária-Geral, desacompanhada de um elemento da Direção, apenas conferem eficácia aos negócios celebrados, determinando o efeito de vinculação da Autora àqueles negócios, mas não atribui retroactivamente à funcionária da Autora em causa legitimidade para, em seu nome, outorgar tais negócios, mantendo a Autora o direito a ser indemnizada por todos os prejuízos que haja sofrido com os negócios indevidamente celebrados em seu nome, apesar de os ter ratificado.
Como escreve Pedro Leitão Pais de Vasconcelos:
“…Só as consequências da falta dos poderes de representação são corrigidas pela ratificação. A ratificação não corrige as consequências da falta de legitimidade do representante, mas apenas da falta de poderes de representação…O representado, ao ratificar o ato quer que os efeitos sejam imputados à sua esfera jurídica, mas isso não significa que não pretenda exercer meios de defesa contra essa atuação. O representado pode ratificar o ato, mas pretender ser indemnizado pelos danos causados pela sua prática. A ratificação implica necessariamente a desativação de todos os meios de defesa na parte em que impeçam a vinculação do representado. Mas os restantes meios de defesa não são afetados pela ratificação, podendo o representado exercer esses meios de defesa...” [3]
Diferente seria se a Autora, além de ter ratificado o negócio celebrado em seu nome, também tivesse expressa ou tacitamente aprovado esse ato gestório.
Ratificação e aprovação de negócios celebrados em nome de outrem por quem não tem poderes de representação são atos distintos, com efeitos jurídicos diversos.
É certo que a aprovação pode resultar tacitamente da ratificação. Em regra quem ratifica também aprova. Normalmente quem quer receber os efeitos do ato, aceita também o comportamento de quem o representou indevidamente, não pretendendo reagir contra este comportamento. Mas não necessariamente, podendo resultar das circunstâncias que se trata de uma mera ratificação motivada por razões estranhas a uma vontade de aprovação [4].
Neste caso, não há elementos que nos permitam concluir que à decisão da Autora de proceder ao resgate das unidades de participação em fundos de investimento subscritas em seu nome tenha presidido uma vontade de aprovar os respetivos negócios ilegitimamente celebrados. Antes o teor da carta enviada pela Autora ao Banco Réu em 1 de outubro de 2009, revela claramente a sua vontade de não prescindir de ser indemnizada por tais atos, mesmo que viesse a proceder ao referido resgate como veio a suceder.
Não se mostrando aprovados, mas apenas ratificados os negócios de subscrição em nome da Autora de unidades de participação em fundos de investimento mobiliários, tem esta direito a ser indemnizada por eventuais danos que a celebração ilegítima de tais negócios lhe tenha causado.
E um dos responsáveis pela prática desse ato é o Banco Réu, o qual incumpriu o dever contratual lateral já acima referido de apenas movimentar a conta da Autora no banco Réu, mediante diretriz emitida por dois diretores da Autora em exercício, sendo um deles o Tesoureiro ou seu substituto.
Tendo as referidas subscrições e inerentes débitos dos respetivos valores na conta bancária da Autora sido efetuadas mediante simples ordem assinada apenas pela Secretária-Geral da Autora, que exercia as funções de substituta do Tesoureiro, o banco Réu incumpriu culposamente o contratado naquele item, o que o obriga a indemnizar a Autora pelos prejuízos sofridos com tal incumprimento, nos termos do artigo 798.º do Código Civil.
O Recorrente vem alegar a existência de uma autorização tácita da Autora no sentido de conceder poderes à sua Secretária-Geral para a representar junto do banco.
Contudo, apenas se provou que a direção da Autora conferiu poderes a D… para, por si só, ordenar o processamento do pagamento de vencimentos, contribuições para a Segurança Social, impostos, nomeadamente IRS, IRC e outros, não estando aí incluída a possibilidade de, sozinha, efetuar investimentos financeiros em nome da Autora, não se tendo também provado a existência de uma prática consentida nesse sentido, neste domínio.
A Recorrente também alega a verificação de uma situação de concorrência de culpas, designadamente de culpa da própria lesada.
No que respeita à eventual responsabilidade da Secretária-Geral da Autora pela prática dos atos por si celebrados em nome da Autora, sem que lhe tivessem sido conferidos poderes para sozinha os praticar, a mesma não impede, nem diminui a responsabilidade do Réu, uma vez que estando nós perante responsabilidades resultantes da violação de deveres com origem em diferentes relações contratuais, deve aplicar-se, por analogia, o regime da responsabilidade solidária.
Na verdade, nas obrigações com coincidência de fins das respetivas prestações, perfilhando-se o pensamento de Antunes Varela, deve considerar-se que estamos perante um quadro de uma pluralidade de obrigações independentes destinadas à satisfação do mesmo interesse do credor [5], sendo certo que nestas situações, apesar de não estarmos perante obrigações plurais solidárias, são-lhes aplicáveis algumas regras próprias deste tipo de obrigações, por analogia, sobretudo no que respeita às relações externas, como seja a possibilidade do credor reclamar de cada um dos devedores o pagamento integral de cada uma das prestações com finalidade coincidente, não podendo o devedor demandado opor o benefício da divisão (artigos 512.º, n.º 1, 518.º e 519.º, n.º 1, do Código Civil) [6].
Já quanto à existência de culpa da própria lesada na verificação dos danos, se não há quaisquer dados que permitam afirmar que esta concorreu para a prática dos atos geradores da responsabilidade de indemnizar por parte do Banco Réu, designadamente que esta tenha contribuído para o Réu ter procedido aos débitos na conta da Autora sem que estivesse assegurada a representação desta na emissão das respetivas diretrizes, já, porém, deve ser ponderado se o comportamento da Autora posterior à prática desses atos agravou ou causou algum dos danos pelos quais o Réu foi responsabilizado pela sentença recorrida.
Esta decisão condenou o Réu, por um lado, a pagar a diferença do capital investido do capital resgatado, e, por outro lado, a pagar a importância correspondente à remuneração, à taxa anual de 2,5%, do capital aplicado em cada uma das referidas aplicações financeiros, desde a data da sua subscrição até à data do respetivo resgate.
A sentença recorrida considerou, pois, que o incumprimento contratual do Banco Réu originou dois danos distintos: a perda de parte do capital investido nas referidas aplicações financeiras e a perda de rentabilidade desse capital durante o período em que o mesmo esteve afeto a tais aplicações.
Se quanto ao primeiro dano não há elementos que nos permitam concluir que o momento escolhido pela Autora para proceder ao resgate das aplicações financeiras foi responsável por essa perda parcial do capital investido, sendo certo que não era exigível que esta mantivesse a participação nos referidos fundos de investimento mobiliário, já quanto à falta de rentabilidade do capital investido durante o período em que o mesmo esteve afeto a esses fundos, o comportamento omissivo da Autora é causal desse dano.
Na verdade, provou-se o seguinte:
- A Autora tinha conhecimento da subscrição dos Fundos efetuada em seu nome e representação pela sua Secretária Geral D….
- Pelo menos quinzenalmente, eram remetidos à Autora extratos de conta e notas de lançamento, dos quais constava a identificação dos Fundos, à quantidade de Unidades de Participação subscritas, as respetivas cotações e o seu valor de mercado.
- Nas informações periodicamente fornecidas pelo Banco aos auditores da Autora, eram indicados os saldos das contas, as aplicações efetuadas, os depósitos a prazo constituídos, os Fundos subscritos, bem assim os demais produtos financeiros contratados.
- O Banco fornecia, a pedido da Direção da Autora, e sempre que esta reunia, o que sucedia quinzenal ou mensalmente, informações sobre a rentabilidade dos Fundos e de outros produtos financeiros, informações que eram prestadas muitas vezes por via telefónica pelo Sr. E….
Ora, apesar do conhecimento da Autora de todas estas informações que lhe eram regularmente prestadas, provou-se que apenas tomou uma primeira atitude em 1 de outubro de 2009, através duma interpelação do Banco Réu, apelando para a resolução da questão da subscrição indevida de tais participações e depois procedendo ao resgate das mesmas, face à ausência duma solução negociada. Na verdade, provou-se que a Autora procedeu aos seguintes resgates:
- Em 24 de junho de 2010 de 70.000.0000 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €512.071,00;
- Em 22/10/2010, de 70.000.000 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €525.238,00;
- Em 22/10/2010, de 70.000.0000 Unidades de Participação no Fundo C6…, que havia subscrito em 7/7/2005, por 501.375,00;
- Em 2/11/2010, de 35.904.3875 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €269.692,22;
- Em 2/11/2010, de 32.861.4058 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 26/10/2005, por €246.935,16;
- Em 2/11/2010, de 2.060.2019 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 14/3/2006, por €15.475,00;
- Em 18/11/2010, de 39.108.4252 Unidades de Participação no Fundo C5…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €282.929,90;
- Em 18/11/2010, de 33.772.8642 Unidades de Participação no Fundo C6…, que havia subscrito em 26/10/2005, por €244.329,79;
- Em 18/11/2010, de 2.076.8407 Unidades de Participação no Fundo C6…, que havia subscrito em 14/3/2006, por €15.024,90;
- Em 18/11/2010, de 39.691.0353 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 7/7/2005, por €291.633,85;
- Em 18/11/2010, de 33 745.6188 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 26/10/2005, por €247.949,31;
- Em 18/11/2010, de 2 086.1210 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 14/3/2006, por €15.327,98;
- Em 18/11/2010, de 5 887.3777 Unidades de Participação no Fundo C7…, que havia subscrito em 8/10/2007, por € 43.258,10;
- Em 28/6/2012, o produto “C8…” que havia subscrito em 8/10/2007, pelo valor de €19.381,21.
Apesar de ter sido comunicado à Autora desde cedo e regularmente que tinham sido subscritas em seu nome as participações nos fundos financeiros aqui em causa (pelo menos quinzenalmente, eram-lhe enviados extratos de conta e notas de lançamento, dos quais constava a identificação dos Fundos, a quantidade de Unidades de Participação subscritas, as respetivas cotações e o seu valor de mercado), tendo ela a possibilidade de verificar que tais subscrições não tinham sido ordenadas por quem tinha o poder de a representar perante o banco Réu, só passados uns bons anos reagiu, invocando a ilegitimidade de tal subscrição por representação indevida. É-lhe, pois, imputável, a título de culpa, o dano consistente na falta de rentabilidade do capital investido nessas subscrições durante todos esses anos, uma vez que esse prejuízo se deveu, sobretudo, à demora na tomada de uma atitude (v.g. resgate das participações ou invocação da ineficácia dos respetivos negócios por falta de representação). Se a responsabilidade pelos atos que deram origem à aplicação indevida do capital naqueles fundos financeiros recai sobre o Banco Réu, a responsabilidade pela falta de rentabilidade desse capital durante os anos em que o mesmo se manteve ali investido é, sobretudo, devido à inércia da Autora.
O artigo 570.º, n.º 1, do Código Civil, dispõe que quando um facto culposo do lesado tiver contribuído para a produção ou agravamento dos danos, cabe ao tribunal determinar, com base na gravidade das culpas de ambas as partes e nas consequências que delas resultaram, se a indemnização deve ser totalmente concedida, reduzida ou mesmo excluída.
Se é difícil, por falta de elementos fácticos, ponderar a gravidade das culpas de ambas as partes na produção deste dano, já quanto à contribuição de cada uma delas para a sua verificação é inegável que foi a conduta omissiva da Autora que determinou quase exclusivamente a sua ocorrência. Na verdade, se o Réu foi o responsável pela aplicação do capital da Autora nos referidos fundos financeiros, é imputável à inércia desta última a manutenção dessa aplicação durante vários anos, sendo ela a principal responsável pela ausência de rentabilidade daquele capital durante todo esse período.
Além desta ponderação há também que ter em consideração que se provou que, conjuntamente com as subscrições das unidades de participação em fundos de investimento mobiliário, foram constituídos depósitos a prazo, no valor de €1.498.225,00, tudo no âmbito de um produto financeiro denominado “C1…” em que uma vertente era constituída pela participação nos fundos de investimento e outra vertente era constituída por depósitos a prazo, com taxas acima das taxas “standard”. Mais se provou que as aplicações financeiras realizadas com dinheiro da Autora nos Fundos denominados “C5…”, “C6…”, “C7…” e “C8…” ficaram subordinadas às condições estabelecidas nos documentos que se mostram juntos a fls. 97, 100 a 107 dos autos, resultando do primeiro desses documentos que o denominado produto “C1…” constitui uma aplicação financeira mista, em que 70% do capital é investido em fundos de investimento mobiliário e 30% em depósitos a prazo.
O facto de estarmos perante o mesmo produto financeiro que tem duas vertentes distintas, que não podem ser dissociadas na altura da subscrição, exige que não se ignore a rentabilidade de um deles para se apurar quais foram os reais prejuízos que resultaram da subscrição do referido produto misto, no que respeita à sua rentabilidade.
Ora, apesar de não se ter apurado qual foi o valor dos juros proporcionados por aqueles depósitos a prazo, sabe-se que as taxas dos mesmos eram superiores às taxas standard, pelo que, necessariamente, terão tido um valor superior ao valor médio dos juros dos depósitos a prazo, compensando, assim, pelo menos parcialmente, em medida não apurada, a perda de rentabilidade da outra vertente do produto “C1…”.
Somando este dado ao facto de ter sido a própria Autora a principal responsável pela ausência de rentabilidade do capital investido nos fundos financeiros mobiliários durante vários anos, utilizando a larga margem de liberdade conferida ao julgador pelo disposto no artigo 570.º, n.º 1, do Código Civil, deve ser excluída a indemnização deste dano.
Assim sendo, o recurso deve ser julgado procedente nesta parte, devendo ser revogada a sentença recorrida na parte em que condenou o Réu a pagar a importância correspondente à remuneração, à taxa anual de 2,5%, do capital aplicado em cada um dos fundos financeiros mobiliários, desde a data da sua subscrição e até à data do respetivo resgate.

3.2. Do montante dos danos
O Recorrente também questiona o montante da indemnização arbitrada pelo Tribunal recorrido.
Note-se que, tendo-se concluído que não é devido o pagamento de uma indemnização pela perda de rentabilidade do capital investido, apenas está em discussão a indemnização arbitrada pela perda do valor do capital.
A sentença recorrida condenou o Réu a pagar a diferença do capital investido e o capital resgatado dos fundos de investimento mobiliário.
O Recorrente sustenta que devem abater à perda de capital os ganhos que a Autora obteve quer com os depósitos a prazo que efetivou simultaneamente com as subscrições de unidades de participação em fundos financeiros aqui em análise, quer com os depósitos a prazo efetuados com o capital que resultou do resgate daquelas unidades de participação.
Quanto a estes últimos não se provou que os mesmos tivessem qualquer relação compensatória com as perdas que resultaram para a Autora dos investimentos realizados em fundos financeiros, pelo que não há razão para que os eventuais ganhos obtidos com esses depósitos devam ser considerados na fixação da indemnização pela perda de capital.
Quanto à rentabilidade dos depósitos a prazo efetuados concomitantemente com as subscrições de unidades de participação em fundos financeiros mobiliários, a mesma já foi considerada como parcialmente compensadora, em medida não apurada, da ausência de rentabilidade do capital investido nestes fundos, determinando, conjuntamente com outro fator, a não atribuição de indemnização por aquele dano, pelo que não pode, sob pena de se verificar uma duplicação da sua relevância, funcionar também como compensação da perda do próprio capital investido.
Não sendo atendíveis as razões invocadas pelo Recorrente para não ser condenado a pagar à Autora a diferença do capital investido e o capital resgatado dos fundos de investimento mobiliário, como indemnização pelo dano da perda de capital, deve o recurso improceder nesta parte, mantendo-se a respetiva condenação.
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Decisão
Pelo exposto, julga-se o recurso parcialmente procedente e, em consequência, revoga-se a alínea b) da sentença recorrida, mantendo-se a sua alínea a).
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Custas na proporção do decaimento por Autora e Réu.
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Porto, 15 de Dezembro de 2016
Cura Mariano
Maria José Simões
Augusto de Carvalho
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[1] Sobre este contrato, Menezes Cordeiro, em Manual de direito bancário, pág. 411 e seg, 3.ª ed., Almedina.
[2] Vide, dando como exemplo de ratificação tácita da outorga de um dado contrato a sua resolução, Raul Guichard, Catarina Brandão Proença e Ana Teresa Ribeiro, no Comentário ao Código Civil – Parte Geral, pág. 654, ed. da Universidade Católica.
[3] Em A autorização, pág. 318-319, ed. de 2012, Coimbra Editora.
[4] Pessoa Jorge, em O mandato sem representação, pág. 397-399, ed. s.d, Ática., e Pedro Leitão Pães de Vasconcelos, ob. cit., pág. 320-321.
[5] Nesse sentido, Antunes Varela, em Das obrigações em geral, vol. I, pág. 791, da 9.ª ed., Coimbra Editora.
[6] Cfr., com referência à discussão sobre este tipo de obrigações, na doutrina alemã, Januário Gomes, em Assunção fidejussória de dívida. Sobre o sentido e o âmbito da vinculação do fiador, pág. 196, ed. 2000, Almedina.
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Sumário:
(da responsabilidade do relator, nos termos do artigo 663.º, n.º 7, do C.P.C.)

I - A existência de uma conta bancária pressupõe a celebração de um contrato denominado de abertura de conta bancária que disciplina as relações complexas que se passam a desenvolver entre o banco e o seu cliente, sendo o seu regime definido pelo acordo celebrado entre as partes, sendo um dos elementos mais comuns deste contrato a definição de quem pode movimentar essa conta, sendo preenchida pelo cliente a respetiva ficha de assinaturas
II – Quando o cliente é uma associação, a não intervenção de todas as pessoas que constam da forma acordada de vinculação do cliente perante o Banco, na celebração de negócios jurídicos consistentes na subscrição de unidades de participação em fundos de investimento e na inerente ordem de movimentação de valores depositados na conta bancária aberta no Banco, integra uma situação de falta de poderes de representação do cliente por quem interveio nos referidos negócios jurídico, sendo as consequências as prescritas no artigo 268.º do Código Civil – o negócio é ineficaz se não for ratificado pelo cliente.
III – O acto do cliente de proceder ao resgate das unidades de participação nos referidos fundos de investimento, corresponde à prática de atos extintivos dos negócios celebrados sem poder de representação, pelo que estamos perante a uma ratificação tácita dos mesmos, uma vez que a intervenção do cliente, apesar de extintiva desses negócios, assume a relação jurídica por eles estabelecida e nela se insere.
IV – Mas a ratificação operada apenas confere eficácia aos negócios celebrados, determinando o efeito de vinculação do cliente àqueles negócios, mas não atribui retroactivamente legitimidade a quem os celebrou sem poderes, mantendo o cliente o direito a ser indemnizado por todos os prejuízos que haja sofrido com os negócios indevidamente celebrados em seu nome, apesar de os ter ratificado.
V - Diferente seria se o cliente, além de ter ratificado o negócio celebrado em seu nome, também tivesse expressa ou tacitamente aprovado esse ato gestório.
VI – Se é certo que, em regra quem ratifica também aprova, podem resultar das circunstâncias que no caso concreto apenas estamos perante uma mera ratificação motivada por razões estranhas a uma vontade de aprovação.
VII - Nas obrigações com coincidência de fins das respetivas prestações, deve considerar-se que estamos perante um quadro de uma pluralidade de obrigações independentes destinadas à satisfação do mesmo interesse do credor, sendo-lhes aplicáveis algumas regras próprias das obrigações solidárias, por analogia, sobretudo no que respeita às relações externas, como seja a possibilidade do credor reclamar de cada um dos devedores o pagamento integral de cada uma das prestações com finalidade coincidente, não podendo o devedor demandado opor o benefício da divisão.

Cura Mariano