Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
572/16.8T8ETR-E.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: VIEIRA E CUNHA
Descritores: REGULAÇÃO DAS RESPONSABILIDADES PARENTAIS
ALTERAÇÃO DA REGULAÇÃO DE RESPONSDABILIDADES PARENTAIS
AUDIÇÃO DO MENOR
NULIDADE
Nº do Documento: RP20171026572/16.8T8ETR-E.P1
Data do Acordão: 10/26/2017
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º 791, FLS.105-108)
Área Temática: .
Sumário: I - É ao juiz que cabe, em cada situação, decidir a forma que considera adequada para realização da audição do menor em processo tutelar cível, considerando sobre o mais que, no âmbito da jurisdição voluntária, predominam os princípios do inquisitório, da equidade, da conveniência e da oportunidade, podendo o tribunal a quo ordenar as diligências que, no seu critério e tendo por subjacente as finalidades do processo, se mostrem convenientes.
II - Pode todavia afirmar-se, na ausência de outros elementos relevantes, que a presença, durante a audição da criança, do “técnico habilitado” a que se refere o artº 5º nº7 al.a) RGPTC poderá ser dispensada pelo Juiz, na medida em que as declarações da criança revelem necessária maturidade, entendida como manifestação do sentimento genuíno do interesse do próprio eu.
III - O mesmo não podemos afirmar da gravação das declarações (artº 5º nº7 al.c) RGPTC), a qual contribui para o esclarecimento total dos responsáveis parentais, designadamente com relação àquilo que o terceiro-Juiz pôde ouvir em condições de liberdade (não sugestão, não influência) do menor púbere.
IV - A nulidade encontra-se porem sujeita a prazo de arguição, nos termos do artº 199º nºs 1 e 2 CPCiv (direito subsidiário), prazo que acabava no momento em que o acto findasse, sendo que, no caso, as partes encontravam-se presentes no momento das declarações tomadas ao menor e pacificamente, sem qualquer contestação, tomaram conhecimento da ausência de gravação (foi-lhes dado conhecimento apenas verbal do que o menor havia declarado), nada tendo arguido ou contestado.
V - Na puberdade verifica-se um notório afastamento dos pais, das opiniões dos pais, dos “pedidos” ou das “sugestões” dos pais, para aparecer a vontade própria, que deve ser valorizada enquanto estrutura própria íntima, não copiada.
VI - É de valorizar sobre o mais, na regulação provisória das responsabilidades parentais, a vontade expressa do menor em passar agora a residir com o progenitor pai, isto é, junto do novo agregado familiar por este constituído.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: ● Rec. 572/16.8T8ETR-E.P1. Relator – Vieira e Cunha. Adjuntos – Des. Maria Eiró e Des. João Proença Costa. Decisão de 1ª Instância de 30/5/2017.
Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Súmula do Processo
Recurso de apelação interposto na acção com processo especial incidental de alteração da regulação das responsabilidades parentais nº572/16.8T8ETR-E, do Juízo de Família e Menores de Matosinhos, da Comarca do Porto.
Requerente – B….
Requerida – C….
Apelada – Digna Magistrada do Ministério Público.
Menor – D… (n. 10/4/2004).

Em 13/4/2010, foi inicialmente regulado por acordo o exercício das responsabilidades parentais quanto ao menor, ficando o mesmo a residir com a progenitora, sendo as responsabilidades parentais relativas a questões de particular importância para a vida da criança exercidas por ambos os progenitores.
Foi fixado um regime de convívio ao ora Requerente, compreendendo fins-de-semana (de 15 em 15 dias), férias de Verão e festividades.
O pai passou a contribuir mensalmente com a quantia de €110,00, a título de alimentos a favor da criança, acrescidos de 50% das despesas de saúde e escolares.
Tese do Requerente
O menor é filho de Requerente e Requerida, divorciados entre si. O casal possui ainda uma filha maior, E…, estudante universitária.
Desde há muito que a criança verbaliza querer residir com o pai (e frequentar a escola da área de residência deste), pois, para além do mais, possui relação de afecto próxima com os filhos da actual mulher do Requerente, conviventes com o novo casal que o Requerente integra, dois deles de 14 e 11 anos de idade (uma outra filha, mais velha, com 23 anos).
Para além do mais, a Requerida tem-se ausentado diversas vezes para o estrangeiro, ficando a criança aos cuidados directos da avó materna.
Tese da Requerida
Não reconhece que o menor manifeste vontade de ir viver com o pai.
A Requerida tem retaguarda familiar, ao contrário do Requerido.

Realizou-se conferência de pais (30/5/2017), onde foi alterado provisoriamente o regime fixado, designadamente “tendo em conta as declarações do menor e consignando que as mesmas foram prestadas com maturidade adequada à idade e devidamente fundamentadas de forma segura, considerando ainda a necessidade de garantir as diligências necessárias ao início do próximo ano lectivo”.
Desta forma, decidiu-se:
1º - O menor passará a fixar residência junto do pai, sendo o exercício das responsabilidades parentais de particular importância exercidas em comum por ambos os progenitores, cabendo ao pai a gestão das rotinas da vida do menor, ou à mãe, quando com ela se encontre temporariamente.
2º - Em período escolar, o menor passará fins-de-semana alternados com a mãe, cabendo ao progenitor conduzi-lo a casa da mãe, no final do dia de 6ª, e indo busca-lo no domingo pelas 19,30 horas.
3º - Todos os períodos de férias escolares, iniciando já nas próximas de Verão, serão repartidos igualmente por ambos os progenitores, sendo que as férias escolares de Verão serão repartidas por períodos de 15 dias com cada um dos progenitores.
4º - Relativamente a alimentos, considerando que a mãe declarou auferir salário mínimo, fixa-se provisoriamente a quantia de €100,00, a remeter ao pai por qualquer meio idóneo de pagamento, documentado, até ao final de cada mês.
Conclusões do Recurso de Apelação da Requerida:
I - Os factos articulados pelo Recorrente, de que o menor quer ir viver consigo, não colhem, sobretudo quando os motivos são o futsal.
II - A mãe sempre cumpriu com os seus deveres, nada faltando ao menor e permitindo ao progenitor estar com o filho sempre que desejasse.
III - Mesmo que o menor tenha confidenciado à Mmª Juiz ser esta a sua vontade, não estava presente nenhum técnico que pudesse aferir da veracidade das palavras do menor e da sua maturidade.
IV - Inexiste qualquer prova de que esta é a verdadeira vontade do menor, pelo facto de as declarações da criança não se encontrarem gravadas, como determina a lei.
V - Quanto ao facto de um menor de 13 anos fundamentar “muito bem”, esta decisão é deveras estranha, a menos que este tenha uma maturidade intelectual muito acima da média, o que não é o caso.
VI - Mesmo que se verifique que era essa a vontade do menor, a decisão foi tomada sem o cumprimento de requisitos legais, pelo que estamos perante uma nulidade processual.
VII - Tendo sido posto em causa o superior interesse da criança, princípio basilar deste tipo de processos e que não pode ser violado.
VIII - Devendo por esse motivo ser revogada a decisão proferida pela Mmª Juiz a quo, até serem produzidas as provas suficientes que possam sustentar a alteração da residência do menor e que o seu superior interesse está assegurado.

O Ministério Público produziu as respectivas contra-alegações, nas quais sustenta o bem fundado da sentença recorrida.
Factos Provados
Da acta da diligência de conferência de pais de 30/5/2017, onde se encontravam presentes Requerente e Requerida, os respectivos mandatários e o menor, consta o seguinte:
“Neste momento, os progenitores e seus ilustres mandatários ausentaram-se do gabinete da Srª Juíza, a fim de ser ouvido o menor.”
“Pelo menor foi dito que vive com a mãe há 13 anos na Maia. Lembra-se dos pais ainda viverem juntos quando tinha 4/5 anos. Vai para casa do pai de 15 em 15 dias, às vezes vai à 6ª e volta ao domingo. Quando está nos fins de semana da mãe, ou fica em casa com a mãe, ou vai à tia ou à avó. Anda no 7º ano, na Escola G… e, no 2º período, teve 5 negativas. Não gosta de estudar.”
“Gostava de ir viver este ano para casa do pai, mas sente-se triste porque acha que a mãe vai ficar triste por ficar sozinha, porque já lhe disse e ela ficou triste.”
“Diz que tem mais convivência em casa do pai, dá-se muito bem com os filhos da F…, de 22, 16 e 12 anos, que são como seus irmãos, e a F… trata-o bem, é simpática e é como uma “mãe do coração”. Treina futsal mas agora quer começar a treinar futebol. Refere que gostava mesmo de ir viver com o pai, e que quando disse ao pai ele lhe disse para pensar bem se é isso que quer. Já pensa há muito tempo, mas guardou sempre para si. Diz que tem amigos cá mas também tem amigos lá, por isso não se importava de mudar de escola. Nas férias de Verão, passou duas semanas de férias em Julho e uma semana em Agosto. Achava bem nas férias escolares de Verão deste ano passar metade com a mãe e outra metade com o pai.”
“Seguidamente, a Mmª Juíza deu conhecimento das declarações do menor aos progenitores e tentou o acordo entre as partes, o que não foi possível.”
Fundamentos
As questões colocadas pelo presente recurso serão as de saber:
- da existência de nulidade no acto de audição do menor em audiência de pais, porque praticada sem a presença técnico que pudesse confirmar da veracidade e maturidade do declarado e porque as declarações não foram gravadas;
- da alteração da decisão de regulação provisória das responsabilidades parentais, não existindo motivos para que a residência do menor deixe de ser com a mãe.
Vejamos pois.
I
Encontra-se hoje estabelecido na lei e na doutrina o entendimento pacífico, igualmente decorrente de regulamentos da União Europeia e de convenções internacionais vinculantes do Estado Português, que nos casos em que haja necessidade de regular o exercício de responsabilidades parentais se impõe a audição prévia da criança – cf., nesse apontado sentido, artº 4º al.i) LPPCJP ex vi artº 147º-A OTM (na redacção da Lei nº 133/99 de 29 de Agosto), artº 24º nº2 da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (aprovada em protocolo anexo ao Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, tal como resultou do Tratado de Lisboa, e com idêntica força vinculante no espaço da União) e artº 12º nº2 da Convenção sobre os Direitos da Criança das Nações Unidas.
Da conjugação dos preceitos citados, ressalta que os tribunais devem ouvir a criança, tendo em conta a sua idade e grau de maturidade.
Como se expressou este Colectivo da Relação do Porto, em 14/1/2014, no pº nº 21/05.7TBVLP-A.P1, publicado na base de dados oficial, a jurisprudência é particularmente segura acerca da necessária audição dos menores com, pelo menos, 10 anos de idade.
Em vigor para o processo tutelar cível está também o disposto no artº 10º nº2 LPPCJP, também por remissão do artº 147º-A OTM, norma essa que, quanto à intervenção para promoção de direitos de jovens em perigo, estipula que “a oposição da criança com idade inferior a 12 anos é considerada relevante de acordo com a sua capacidade para compreender o sentido da intervenção”. É esse também o critério seguido pela Lei em matéria de adopção – artºs 1981º nº1 al.a) e 1984º al.a) CCiv.
Mas como se exarou no Ac.R.L. 17/11/2015, pº 761/15.2.T8CSC.L1-7, relatado pela Consª Graça Amaral, “fora das situações em que a lei considera obrigatória a audição do menor, é a prática judiciária que assegura, no âmbito do poder discricionário que é atribuído ao julgador, a necessidade de fazer funcionar esse direito, concedendo (ou não) à criança a oportunidade de expressar as suas opiniões, tendo em conta a respectiva maturidade e capacidade de compreensão e expressão dos seus interesses. Igualmente é ao juiz que cabe, em cada situação, decidir a forma que considera adequada para realização dessa diligência”.
Na verdade, “pertencendo o processo em causa ao âmbito da jurisdição voluntária, onde predominam os princípios do inquisitório, da equidade, da conveniência e da oportunidade, podia o tribunal a quo ordenar as diligências que, no seu critério e tendo por subjacente as finalidades do processo, se mostrassem convenientes”.
É a esta luz que devem ser lidas as disposições da lei, designadamente do novel Regime Geral do Processo Tutelar Cível (Lei nº 141/2015 de 8/9).
E sendo assim, entendemos que a presença, durante a audição da criança, do “técnico habilitado” a que se refere o artº 5º nº7 al.a) RGPTC poderá ser dispensada pelo Juiz, na medida em que as declarações da criança revelem maturidade, isto é, sentimento genuíno do interesse do próprio eu, em relação esclarecida com todos os demais, designadamente os familiares próximos (esta situação habitualmente acontece já nos adolescentes com 13 anos de idade, como é o presente caso, altura em que o momento da puberdade, conduz a um afastamento gradual dos pais, ou da imagem dos pais).
Todavia, o mesmo não podemos afirmar da gravação das declarações, a qual contribui para o esclarecimento total dos responsáveis parentais, designadamente com relação àquilo que o terceiro-Juiz pôde ouvir em condições de liberdade (não sugestão, não influência) do menor púbere.
Informado o menor de que as suas declarações serão gravadas para esclarecimento de seus pais, a não correspondência entre o momento temporal das declarações e o momento da audição dos pais – e a previsível reacção imediata destes, mesmo que não verbalmente expressa – é suficiente, considerada pelo menos a generalidade dos casos, para garantir a livre expressão da opinião do menor.
Não vemos assim fundamentada nos autos, e salvo o devido respeito, uma verdadeira razão para não ter sido efectuada a gravação das declarações do menor – e pese embora a sensibilidade (escrúpulo) do menor no confronto com os pais, expressamente referindo a sua contrariedade pelo facto de a mãe poder “ficar triste” com a vontade dele menor.
Foi desta forma cometida uma nulidade, no sentido em que “a irregularidade cometida pôde influir no exame ou na decisão da causa”, tendo as declarações prestadas influenciado, como influenciaram, a convicção formada pela Mmª Juiz a quo, nos termos do disposto no artº 195º nº1 CPCiv, enquanto direito subsidiário – artº 33º nº1 LGPTC.
Porém, tal nulidade encontrava-se sujeita a prazo de arguição, nos termos do artº 199º nº1 CPCiv – tal prazo, nos termos do primeiro dos normativos citados, acabava no momento em que o acto findasse, já que as partes se encontravam presentes no momento das declarações tomadas ao menor e pacificamente, sem qualquer contestação, tomaram conhecimento da ausência de gravação (foi-lhes dado conhecimento apenas verbal do que o menor havia declarado), nada tendo arguido ou contestado; na verdade, quem deseja valer-se da nulidade, deve sindicar todos os passos de validade do acto e alertar o tribunal para que tome as providências necessárias (desde que o tribunal não supra as condições de validade oficiosamente – artº 199º nº2 CPCiv – enquanto o acto se não mostrar concluído) – neste sentido, vejam-se Ac.R.P. 6/6/06, pº nº 0621050, relator: Henrique Araújo e Ac.R.P. 7/2/00, pº nº 9951096, relator: Aníbal Jerónimo.
Não havendo qualquer reacção, a nulidade cometida ficou sanada, sendo manifesta a extemporaneidade da sua arguição apenas nas alegações de recurso, ligando à decisão provisória em matéria de regulação das responsabilidades parentais uma nulidade cometida anteriormente.
Sanada a nulidade, quer isto também dizer que, enquanto a decisão provisória em matéria de responsabilidades parentais logre exteriorizar a convicção da Mmª Juiz a quo em matéria de declarações tomadas ao menor, ou seja, aquilo que a Mmª Juiz a quo declara ter observado pessoalmente, valerá tal exteriorização como verdadeiro resultado das próprias declarações do menor.
Improcedem as doutas alegações neste segmento.
II
Quanto ao mérito da decisão provisória de alteração das responsabilidades parentais, designadamente em matéria de residência da criança.
Nada existe a dizer, nesta matéria, quanto à justeza e adequação da decisão provisória.
Por um lado, como sublinhámos, a idade púbere, encontrando-se na continuação da infância, é já um momento de identificação com grupos de pares (para além dos pais), de desenvolvimento das características faciais adultas e dos órgãos sexuais e reprodutores, do crescimento para a definitiva massa corporal do adulto.
O que é desejável, seja na criança, seja no adolescente, é que seja ele próprio a fazer a síntese da realidade trinitária que compõe, com ambos os pais, entre diversos modos de vida, entre os modelos de socialização que lhe são dados pelos progenitores.
O exercício da autodeterminação, com o custo de errar ou de pagar caro pelos próprios erros, é assim condição de crescimento interior, condição para os jovens de se tornarem autónomos e independentes (cf. Silvia Vegetti Finzi, Quando I Genitori Si Dividono, 2007, pg. 210).
Na puberdade verifica-se pois, como sublinhámos já, um notório afastamento dos pais, das opiniões dos pais, dos “pedidos” ou das “sugestões” dos pais, para aparecer a vontade própria, que deve ser valorizada enquanto estrutura própria íntima, não copiada – o prosseguimento do “destino” da pessoa, enquanto individualidade única sobre o mundo, embora imperfeita, isto é sujeita a falhas, pois que não existe o saber total, o conhecimento total, o ser humano desconhece a omnipotência ou a omnisciência, encontrando-se sujeito às limitações próprias do seu meio familiar mais próximo, mais afastado, e por vezes, também do seu meio social e social alargado (v.g., nacional).
No caso dos autos, o menor não sente atracção pelos estudos, ao menos nesta fase, como declara. Prefere o futebol, que pratica, e certamente o grupo de amigos que aí tem. Não encontrou nos seus próximos, seja na família, seja nos amigos, a confiança, o estímulo, a convicção, o “acreditar”, que o levassem ao gosto pelos estudos normais e até obrigatórios, na sua idade.
Por outro lado, o agregado familiar actual de seu pai parece mais estimulante para um pré-adolescente, pois que voltou a casar, e sua actual mulher possui três filhos, sendo dois deles de idade próxima da sua.
A família da mãe, acrescendo algumas ausências (naturais ou até necessárias, em trabalho) desta mãe, a avó e a tia, bem como uma irmã mais velha (23 anos de idade, universitária), não parecem aparentemente (sobretudo pela diferença etária) constituir o estímulo tocante do grupo e do exemplo que o menor pode encontrar junto de seu pai e do agregado familiar deste.
Facilmente se nota que o menor é, hoje, a única figura masculina do agregado familiar da mãe.
Encontrando-se o menor, na actualidade, disponível para um contacto mais estreito com seu pai, figura paterna com a qual socialmente tenderá a se identificar (e vale aqui o elogio da figura materna, que não formou no espírito do menor a “rejeição” do pai, ou a “obediência” à mãe, caso em que o vazio interior do menor se poderia acentuar ou revelar nesta ou noutra altura da vida), é justo que se satisfaça a curiosidade natural, o bem estar e a vontade do menor em integrar o actual núcleo familiar e a residência de seu pai.
É desejável que, a par da evolução na prática desportiva ou atlética, o menor consiga também, junto do agregado familiar do pai, a confiança e o “gosto” pelos estudos, como é do seu interesse, e que por ora lhe rarearam. Esse será potencialmente um item mais (entre outros) de comprovação da utilidade da mudança de residência.
A douta sentença recorrida merece assim plena confirmação.
Resumindo a fundamentação:
I - É ao juiz que cabe, em cada situação, decidir a forma que considera adequada para realização da audição do menor em processo tutelar cível, considerando sobre o mais que, no âmbito da jurisdição voluntária, predominam os princípios do inquisitório, da equidade, da conveniência e da oportunidade, podendo o tribunal a quo ordenar as diligências que, no seu critério e tendo por subjacente as finalidades do processo, se mostrem convenientes.
II - Pode todavia afirmar-se, na ausência de outros elementos relevantes, que a presença, durante a audição da criança, do “técnico habilitado” a que se refere o artº 5º nº7 al.a) RGPTC poderá ser dispensada pelo Juiz, na medida em que as declarações da criança revelem necessária maturidade, entendida como manifestação do sentimento genuíno do interesse do próprio eu.
III - O mesmo não podemos afirmar da gravação das declarações (artº 5º nº7 al.c) RGPTC), a qual contribui para o esclarecimento total dos responsáveis parentais, designadamente com relação àquilo que o terceiro-Juiz pôde ouvir em condições de liberdade (não sugestão, não influência) do menor púbere.
IV - A nulidade encontra-se porem sujeita a prazo de arguição, nos termos do artº 199º nºs 1 e 2 CPCiv (direito subsidiário), prazo que acabava no momento em que o acto findasse, sendo que, no caso, as partes encontravam-se presentes no momento das declarações tomadas ao menor e pacificamente, sem qualquer contestação, tomaram conhecimento da ausência de gravação (foi-lhes dado conhecimento apenas verbal do que o menor havia declarado), nada tendo arguido ou contestado.
V - Na puberdade verifica-se um notório afastamento dos pais, das opiniões dos pais, dos “pedidos” ou das “sugestões” dos pais, para aparecer a vontade própria, que deve ser valorizada enquanto estrutura própria íntima, não copiada.
VI - É de valorizar sobre o mais, na regulação provisória das responsabilidades parentais, a vontade expressa do menor em passar agora a residir com o progenitor pai, isto é, junto do novo agregado familiar por este constituído.
Deliberação (artº 202º nº1 CRP):
Julga-se improcedente, por não provado, o interposto recurso de apelação e, em consequência, confirma-se integralmente o douto despacho recorrido.
Custas pela Apelante.

Porto, 26/X/2017
Vieira e Cunha
Maria Eiró
João Proença