Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
328/16.8GAVLG-A.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOSÉ CARRETO
Descritores: DESPACHO DE APLICAÇÃO DE MEDIDA DE COAÇÃO
FUNDAMENTAÇÃO
NULIDADE
REGIME DE ARGUIÇÃO
Nº do Documento: RP20181031328/16.8GAVLG-A.P1
Data do Acordão: 10/31/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL (CONFERÊNCIA)
Decisão: NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO DO ARGUIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO (LIVRO DE REGISTOS Nº 46/2018, FLS 217-227)
Área Temática: .
Sumário: A eventual nulidade do despacho que aplicou a medida de coacção de prisão preventiva por insuficiência de fundamentação deve ser invocada no próprio acto sob pena de ficar sanada.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Rec 328/16.8GAVLG.P1
TRP 1ª Secção Criminal

Acordam em conferência os juízes no Tribunal da Relação do Porto

No Inquérito nº 328/16.8GAVLG dos Serviços do Mº Publico da Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo de Instrução Criminal do Porto, Juiz 5 em que com outros é arguido
B...

na sequência do 1º interrogatório judicial a que foi submetido, pelo Mº Juiz de Instrução foi proferido despacho que decidiu em relação ao arguido:
“…assim, como única medida adequada, suficiente e que se mostra necessária e proporcional é a de prisão preventiva quanto ao arguido B..., o que determino, e de apresentações periódicas quanto aos arguidos C... e D..., duas vezes por semana, no posto policial da sua área de residência, entre as 08:00 e as 20:00 horas, às terças e sextas-feiras, cumulada com a proibição de contactarem entre si e com os restantes arguidos, tudo nos termos dos artºs. 191º, 193º, 198º, 200º, nº 1, al. d), 202º, nº 1, al. a), e 204º, al. c), do C.P.P.”

Recorre o arguido o qual no final da respectiva motivação apresenta as seguintes conclusões:
“I— Vem o presente recurso interposto do despacho de fis... dos autos, que decidiu aplicar a medida de coacção de prisão preventiva ao arguido B..., ora Recorrente.
II — Despacho esse, de que ora se recorre, cuja decisão foi enunciada com fundamentos pouco ou nada sólidos, referindo, para a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva a existências de perigo concreto de continuação da actividade criminosa, o forte alarme social e a perturbação da ordem e tranquilidade pública.
III — A falta de fundamentação indicada constitui nulidade insanável do douto despacho recorrido, isto nos termos do disposto no artigo 2059 da Constituição da República Portuguesa.
IV — Fundamentação essa que deve especificar os motivos de facto e de direito que levaram à decisão proferida, conforme estipula o artigo 979 do Código de Processo Penal.
V - Sem quaisquer dados concretos que especifique em que termos tal crime era materializado pelo arguido B..., e qual os motivos que levaram á aplicação desta medida de coacção e não de outra, isto é, quais os motivos pelos quais são insuficientes as restantes medidas de coacção, toma-se necessário que se determine concreta e casuisticamente os fundamentos da determinação aplicação da medida de coacção de prisão preventiva.
VI - É entendimento do Recorrente que actualmente não subsistem as circunstâncias que justificaram a anterior aplicação de uma medida de coacção tão gravosa corno a prisão preventiva, e como tal não deve subsistir a limitação da sua liberdade.
VII - O ora recorrente está profissional, socialmente e familiarmente integrado e sempre foi pessoa muito conceituada socialmente, familiar e profissionalmente.
O arguido vive com a sua companheira e tem uma filha com apenas 7 meses de idade, sempre trabalhou na área da construção civil, com a categoria profissional de Pintor, exercendo tal actividade, na altura da aplicação desta medida de coacção, para a empresa ‘E..., Lda.’, auferindo um rendimento mensal de cerca de 580,00€.
VIII Desde a aplicação da referida medida de coacção até à presente data, o Recorrente não se tem encontrado bem de saúde, sente-se deprimido, angustiado, não vendo razões para que se mantenha a medida de coacção imposta.
IX - A aplicação da prisão preventiva, no nosso ordenamento processual, está sujeita não só às condições gerais contidas nos artigos 191º a 195° C P Penal, em que avultam os princípios da adequação e da proporcionalidade, como dos requisitos gerais previstos no artigo 204°, como ainda dos específicos atinentes àquela concreta medida de coacção, artigo 202°. Explicitando o princípio da legalidade ou da tipicidade das medidas de coacção, o artigo 191°/1 C P Penal, dispõe que a liberdade das pessoas só pode ser limitada, (total ou parcialmente, em função de exigências processuais de natureza cautelar, pelas medidas de coacção e de garantia patrimonial previstas na lei.
A prisão preventiva tem natureza residual só podendo ser aplicada quando se revelarem inadequadas ou insuficientes as outras medidas de coacção, artigo 193°/2 C P Penal
A medida de coacção prisão preventiva, como todas as outras com excepção do termo de identidade e residência, por sua vez, não pode ser aplicada se em concreto se não verificar fuga ou perigo de fuga; perigo de perturbação do decurso do inquérito e nomeadamente, perigo para aquisição, conservação ou veracidade da prova; perigo, em razão da natureza e das circunstâncias do crime ou da personalidade do arguido, de perturbação grave da ordem e da tranquilidade públicas ou de continuação da actividade criminosa, artigo 204° alíneas a), b) e c) C P Penal.
Finalmente, acresce que para aplicação desta medida extrema é ainda necessário haver fortes indícios de prática de crime doloso punível com pena de prisão de máximo superior a 5 anos, artigo 202°/1 alínea a) C P Penal.
X - Não se verificam os requisitos gerais previstos no artigo 204° C P Penal.
No que respeita ao perigo de fuga, o despacho recorrido não faz qualquer referência a tal preceito, não existindo quaisquer elementos, concretos, que permitam indiciar uma intenção ou preparação do arguido para fugir. Antes pelo contrário, o mesmo tem emprego fixo há vários anos e uma família devidamente estruturada, - com uma filha de poucos meses de idade e uma companheira também com emprego estável.
XI - O perigo de fuga há-se ser conclusão, como de resto, todos os restantes requisitos, a extrair de factos concretos, evidenciados no processo.
Este pressuposto tem por base o risco do arguido se subtrair ao exercicio da acção penal, mediante a existência de certas circunstâncias, que, de modo consistente, possam favorecer a fuga ou potenciar a mesma.
Existirá esse perigo, sempre que subsistam elementos objectivos, donde se possa aferir que o arguido em liberdade se ausentará para parte incerta, no pais ou no estrangeiro, com o propósito de se eximir à acção penal.
XII - Da mesma forma, também não existem quaisquer elementos nos autos que permitam indiciar a continuação da actividade criminosa.
Conclui-se, então, que, ainda que se entenda que existem indícios suficientes da prática do crime e que existem necessidades cautelares que exigem a aplicação de medidas de coacção, o certo é que, não existe necessidade da aplicação da medida mais gravosa — existindo outras, capazes de assegurar as necessidades cautelares do processo e que não constituem uma restrição da sua liberdade, assim permitindo que o arguido permaneça junto dos seus familiares e inserido no seu contexto social e que lhe permitam prosseguir a sua vida.
XIII - O perigo de continuação da actividade criminosa ocorre quando, em concreto, se verifica indiciação de uma situação de indigência profissional do arguido e da sua dependência do comércio de psicotrópicos.
Acontece que, no caso concreto, tais pressupostos não se verificam, uma vez que o arguido exerce uma actividade profissional há já longo tempo, a sua companheira também tem uma actividade profissional fixa e duradoura, pelo que só se pede concluir não se verificam quaisquer motivos para aplicação de medida de coacção tão gravosa vincada no pressuposto da continuação da actividade criminosa por parte do arguido.
XIV - Faz-se referência, ainda, no douto despacho que aplica tal medida de coacção, que o arguido utiliza a habitação para a sua actividade criminosa, o que obstará à aplicação da medida de coacção de obrigação de permanência na habitação.
No entanto, não temos qualquer referência que o arguido, ora recorrente usasse a sua habitação/residência habitual, para a prática deste ou de qualquer actividade ilícita.
XV - Arredados que estão os fundamentos que ditaram a aplicação da medida de prisão preventiva ao ora Requerente, cabe neste momento ao Meritíssimo Julgador, com base nos princípios da legalidade, adequação! proporcionalidade, precariedade e subsidiariedade, rever a possibilidade da alteração da medida de coacção a aplicar.
XVI - Existindo como existem outras medidas de coacção a aplicar no caso concreto, que se adequam e satisfazem as exigências cautelares que o caso requer! e proporcionais à gravidade do crime e às sanções que previsivelmente venham a ser aplicadas, como é o casa da obrigação de permanência na habitação, sob vigilância electrónica,
XVII- em ordem a uma humanização da aplicação da justiça, não deverá manter-se a aplicação da medida de coacção de prisão preventiva.
Nestes Termos,
Julgando o presente recurso procedente por provado, deve o douto despacho de que ora se recorre ser revogado e substituído por outro que, imponha ao arguido ora Recorrente uma proporcional medida de coacção, como seja a obrigação de permanência na habitação, sob vigilância electrónica …”

O Mº Pº respondeu pugnando pela manutenção da decisão;
Nesta Relação o ilustre PGA é de parecer que o recurso deve improceder.
Foi cumprido o artº 417º2 CPP

Colhidos os vistos procedeu-se à conferência com observância do formalismo legal.
Cumpre apreciar:
Consta do despacho recorrido (transcrição):
“Indiciam fortemente os autos a prática pelos arguidos de um crime de tráfico de estupefacientes, previsto e punido pelo art.º 21º, nº 1 do Dec. Lei 15/93 de 22/01, com referência à tabela I-A, I-B e I-C, anexas a tal diploma nos termos dos factos e prova produzida nos autos, constantes do despacho do Mº. Pº. a fls. 764 a 777 que foram referidas e especificadas aos arguidos em voz alta, passando a fazer parte integrante deste despacho, nos termos e efeitos no disposto no art.º 194º, nºs. 6 e 7 do C.P.P.
Como referido, tais indícios resultam da prova produzida e indicada nos autos e que foi referida aos arguidos, designadamente auto de notícia e detenção, auto de apreensão, testes rápidos efectuados a produtos estupefacientes, cessões das escutas telefónicas referidas e CRC dos arguidos.
Assim, resulta fortemente indiciado que:
Desde pelo menos 1 de Fevereiro de 2018 e até à data da sua detenção que os arguidos D..., F... e B... se vêm dedicando ao tráfico de produto estupefaciente, haxixe.
O arguido D..., conhecido pela alcunha de (D1...) dedica-se à atividade de tráfico de estupefacientes, o que o faz em colaboração e em conjunto com o seu irmão, o arguido F... e com o arguido B....
Por sua vez, o arguido C... colabora com o arguido B... na atividade que este desenvolve de tráfico de estupefaciente, nomeadamente, recebendo o produto estupefaciente a ele destinado – sessão n.º 6919 e n.º 7869 do Alvo 98267040.
O arguido F... adquire, armazena e vende o produto estupefaciente, enquanto o arguido D..., depois de o receber do seu irmão F... procede ao seu corte, doseamento e venda a terceiros consumidores do produto estupefaciente.
Para procederem à entrega de produto estupefaciente, os arguidos combinam, por contacto telefónico, a quantidade, a marca do estupefaciente e o local de entrega, sendo que para o efeito, o arguido D... utiliza o número de telefone ......... e ......... (Alvos 96828040 e 96827040), o arguido F... utiliza o número de telefone ......... (Alvo 97640060) e o número ......... e o arguido B... utiliza os números de contacto telefónico ......... (Alvo 98267040) e o número ......... (Alvo 99304040).
Durante este período de tempo, os locais de encontro entre os arguidos ocorreram no café G..., situado junto ao Campo de futebol H..., em Valongo, nos “tanques”, no “quelho”, locais situados em ... e ainda junto à residência do arguido D....
O arguido B... fornece o arguido F... com uma periocidade média de oito a dez dias, cerca de 1 a 2 quilogramas de haxixe, sendo que por sua vez o arguido F... entrega ao arguido D... cerca de 1 quilograma de pólen de haxixe entre 8 a dez dias.
Por sua vez, o arguido D... vende a terceiros pequenas doses de haxixe por 2,5 e as denominadas placas de haxixe por 140,00.
Os contactos telefónicos do arguido D... com o arguido F... são constantes, utilizando uma linguagem cuidada e codificada - autos de transcrição de conversações telefónicas sessões n.s 111, 156, 1634, 2680, 3795, 5180, referindo-se ao produto estupefaciente como “aquele bruto”, “dragões” ou “tinta”.
O arguido B... utiliza ainda a residência dos seus familiares (mãe e irmão), situada na Rua ... n.º .., em ..., Valongo a fim de guardar e receber produto estupefaciente.
O arguido B... contacta e é contactado frequentemente com e pelo arguido F... a fim de combinarem a aquisição e entrega de produto estupefaciente – cfr.- autos de transcrição de conversações telefónicas, sessões n.s. 426, 460, 466, 485, 490, 609, 1490, 1491, 2087, 2106, 2329, 2382, 3282, 3885, 3939, 4097, 4252, 4303, 5056, 5446, 6907, 6909, 7056, 7866,
No dia 23 de Março de 2018, pelas 18h, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe – autos de transcrições das sessões n.º 2969 (fls. 59) e 2986 do Alvo 97640060, anexo F.
No dia 30 de Março de 2018, pelas 17h30m, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe. – cfr. autos de transcrições das sessões n.º 3453 (fls. 63) do Alvo 97640060, anexo F.
No dia 18 de Abril de 2018, pelas 20h50m, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe – autos de transcrições das sessões n.º 1941, 2087, 2106, 2329, 2382 do Alvo 98267040.
No dia 25 de Abril de 2018, pelas 18horas, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe – autos de transcrições das sessão n.º 4303 do Alvo 98267040 e sessão n.º 5606 do Alvo 97640060.
No dia 27 de Abril de 2018, pelas 17h45m, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe. – cfr. autos de transcrições das sessões n.º 5056 e 5446 do Alvo 98267040.
No dia 05 de Junho de 2018, pelas 21h05m, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe – autos de transcrições das sessões n.º 8414 (fls. 67) e 8417 (fls. 69) do Alvo 97640060, anexo F.
No dia 07 de Junho de 2018, pelas 18h55m, na Rua ..., junto ao numero .., em ..., Valongo, o arguido B... encontrou-se com o arguido F..., ao qual entregou, mediante contrapartida monetária, não concretamente apurada, um quilograma de pólen de haxixe. – cfr. autos de transcrições das sessões n.º 21 do Alvo 99304040.
No dia 18 de Junho de 2018, o arguido B..., fazendo uso do número de telemóvel contacta com individuo desconhecido e combina com o mesmo a entrega, mediante contrapartida monetária de produto estupefaciente para o dia seguinte. – cfr. auto de transcrição telefónica sessão n.º 60 do alvo 99304040.
No dia 19 de Junho de 2018, pelas 12h.06, o arguido F... contacta o arguido B... e solicita-lhe a entrega de um quilograma de haxixe.
Nesse mesmo dia, cerca das 15h15m, indivíduo desconhecido deslocou-se para a área da freguesia ..., com o objetivo de entregar o produto estupefaciente a B..., conforme tinham combinado – auto de interceção de escuta telefónica n.º 10208 do Alvo 98267040.
Contudo, o arguido B... que naquele momento se encontrava no Hospital ..., para visitar a sua mãe, contacta com o arguido C..., seu colaborador e pede-lhe que receba do individuo de identidade desconhecida o produto estupefaciente- cfr. Auto de transcrição de conversação telefónica sessão n.º 10215 do Alvo 98267040, o que veio efetivamente a suceder, tendo o arguido C... recebido o produto estupefaciente a fim de ser entregue ao arguido B..., e que veio a ser apreendido.
No dia 19 de Junho de 2018, pelas 19horas, o arguido B... tinha na sua posse:
· - Um telemóvel de marca Alcatel, com o IMEI ..............., com o cartão da I... n.º .........;
· - Um telemóvel da marca Nokia, com o IMEI ................ . ..............., com o cartão telefónico da I... .........;
· - Dois pedaços de produto estupefaciente de cor acastanhada, canábis resina, com o peso de 39,60g;
· - A quantia de € 1.050,00 (mil e cinquenta euros), em notas do BCE.
Também, nesse dia, pelas 20h, o arguido B... tinha na residência da sua mãe, situada na Rua ..., n.º .., em ..., Valongo e onde se encontrava a residir o arguido C...:
· - num dos quartos, duas facas de cozinha, com cabo de madeira, com vestigios de produto estupefaciente na lâmina;
· - no quarto, utilizado pelo arguido C..., dois invólucros contendo, cada um, cinco placas de uma pasta prensada de cor acastanhada, canábis resina, com o peso de 1026.1 gramas.
Ainda na residência do arguido B..., situada na ..., n.º .., ..º Direito, ..., Paredes:
· - no interior de um cofre a quantia de € 1.900,00, em notas do BCE;
· - Um telemóvel da marca Samsung, com o IMEI ...............;
· - Uma arma de fogo, tipo pistola, da marca CZ, modelo ......., calibre 22, com o numero de serie ....., com dois carregadores e 16 m munições distribuídas pelos dois carregadores e um coldre.
· - uma embalagem do cartão SIM da I... do numero ..........
· - na cozinha, quinze pedaços de uma substância prensada de cor acastanhada, pólen de haxixe, com o peso de 3,8 gramas.
· - na cozinha, um saco hermético contendo no seu interior folhas e sumidades de uma planta que se veio apurar tratar-se de folhas e sumidade floridas da planta canábis, com o peso de 2,2gramas;
· - quatro pedações de uma substancia prensada de cor acastanhada, que veio-se apurar tratar-se de 1 grama de pólen de haxixe;
· - uma caixa de cigarrilhas contendo no seu interior, um saco hermético contendo no seu interior folhas e sumidades de uma planta que se veio apurar tratar-se de folhas e sumidade floridas da planta canábis, com o peso de 1,4gramas;
· - três sacos Herméticos vazios.
· - Uma faca com o cabo em madeira e com a lâmina em inox, contendo vestígios de produto estupefaciente.
· - Um saco hermético contendo no seu interior folhas e sumidades de uma planta que se veio apurar tratar-se de folhas e sumidade floridas da planta canábis, com o peso de 0,3 gramas.
· - Duas facas do tipo navalha contendo vestígios de corte de produto estupefaciente;
· - Um saco hermético contendo no seu interior uma substancia prensada de cor acastanhada, que se veio apurar tratar-se de pólen de haxixe, com o peso de 4,8 gramas de pólen de haxixe e folhas e sumidades com o peso de 2,4 gramas de folhas e sumidade floridas da planta canabis.
· - Uma faca de mato da marca “Aitor” com a seguinte gravação na lâmina “Exercito Português”, lâmina com cerca de 18cm.
No dia 19 de Junho, pelas 20horas, o arguido D... tinha na sua residência, situada na Rua ..., n.º ..., ..º esquerdo, em ..., Valongo:
· - Um telemóvel de marca Nokia, modelo ...., de cor cinzenta e branca, com o IMEI ..............., com bateria, e com cartão SIM I... ..... ............, referente ao número .........;
· - Uma faca de cozinha com cabo de madeira, contendo vestígios de uma substância estupefaciente, haxixe;
· - no quatro do arguido, um invólucro de plástico, preso com elástico, contendo oito porções de uma pasta prensada de cor acastanhada, que que se veio a apurar tratar-se de canábis resina, com o peso de 39gramas.
Nessas circunstâncias de tempo e de lugar, o arguido D... trazia ainda consigo a quantia de € 125,00, em notas do BCE.
O arguido B... já foi condenado por crime da mesma natureza, tendo sido condenado na pena suspensa pela prática de crime de tráfico e estupefacientes, já extinta em 3 de Outubro de 2008.
Os demais arguidos não possuem antecedentes criminais.
Consequentemente pelo exposto, os arguidos conjuntamente e de comum acordo dedicam-se à atividade de tráfico de estupefaciente, existe perigo concreto de continuação da atividade criminosa, face aos lucros fáceis que tal atividade acarreta e, assim, para os arguidos arranjarem mais facilmente algum dinheiro para satisfazer as necessidades da vida, sendo certo ainda que, quanto ao arguido B... as condenações a que foi já sujeito não se mostrou de forma suficiente para o afastar da prática da mesma atividade.
Acresce que o crime de tráfico provoca forte alarme social e provoca perturbação da ordem e tranquilidade pública, pois são muitos aqueles que enveredando pelo consumo, destroem a sua vida familiar e profissional, na busca de proventos para adquirirem a traficantes, as doses necessárias para o efetivo consumo, o que mina o Estado enquanto sociedade organizada e potenciadora de indivíduos que em idade para o fazer desenvolvem atividade laboral, o que não acontece quando o consumo os atinge, provocando abstinência e muitas vezes indivíduos sem-abrigo.
Neste contexto a única medida de coação adequada, necessária e proporcional atenta a pena a que previsivelmente vier a ser aplicada aos arguidos, para impedir a continuação da atividade criminosa é a prisão preventiva quanto ao arguido B..., tendo em consideração que todas as outras são ineficazes, mesmo a medida de obrigação de permanência na habitação, pois como tem vindo a ser decidido em vários Acórdãos, nomeadamente do Tribunal da Relação do Porto, o traficante, em casa, pode perfeitamente continuar a desenvolver a atividade, servindo-se dos contactos estabelecidos relativamente aos fornecedores, e angariando indivíduos para na rua procederem à venda, muitas vezes apenas a troco de doses para consumir, quando ainda é certo que o mesmo utilizava a habitação para a atividade.
Por razões de brevidade, uma vez que com elas concordamos inteiramente, damos por reproduzidas, as considerações de facto e de direito tecidas supra pela Exma. Sra. Procuradora, atenta a gravidade da infração e a personalidade demonstrada pelos arguidos, entendo, assim, como única medida adequada, suficiente e que se mostra necessária e proporcional é a de prisão preventiva quanto ao arguido B..., o que determino, e de apresentações periódicas quanto aos arguidos C... e D..., duas vezes por semana, no posto policial da sua área de residência, entre as 08:00 e as 20:00 horas, às terças e sextas-feiras, cumulada com a proibição de contactarem entre si e com os restantes arguidos, tudo nos termos dos artºs. 191º, 193º, 198º, 200º, nº 1, al. d), 202º, nº 1, al. a), e 204º, al. c), do C.P.P.
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Cumpra-se o disposto no art.º 194º, nº 10 do C.P.P
Passem-se os competentes mandados de condução do arguido B... ao Estabelecimento Prisional. …”
+
São as seguintes as questões suscitadas:
- Nulidade por falta de fundamentação
- Se há indícios suficientes da prática do crime
- Se existe perigo de fuga e de continuação da actividade criminosa
- Se a medida de OPHVE é suficiente
+
O âmbito dos recursos é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação (Ac. do STJ de 19/6/1996, in BMJ n.º 458, pág. 98), e são apenas as questões suscitadas pelo recorrente e sumariadas nas respectivas conclusões que o tribunal de recurso tem de apreciar (Prof. Germano Marques da Silva, in “Curso de Processo Penal” III, 2.ª ed., pág. 335), sem prejuízo das de conhecimento oficioso, que no caso não se suscitam nem ocorrem.
+
- Falta de fundamentação do despacho recorrido.
Apreciando.
O arguido invoca a nulidade do despacho recorrido porque diz não sabe quais os motivos de facto e de direito que levaram à aplicação da medida

Ora, o dever de fundamentar as decisões judiciais é imposto pelo artº 205º CRP, e surge no processo penal também como decorrência das garantias de defesa do arguido expressas no artº 32º1 CRP, e encontra consagração legislativa no artº 97º CPP quanto aos despachos, e especificamente quanto ao despacho judicial que aplicar medidas de coacção no artº 194º 4 CPP que estabelece o seguinte:
“4 - A fundamentação do despacho que aplicar qualquer medida de coacção ou de garantia patrimonial, à excepção do termo de identidade e residência, contém, sob pena de nulidade:
a) A descrição dos factos concretamente imputados ao arguido incluindo, sempre que forem conhecidas, as circunstâncias de tempo, lugar e modo;
b) A enunciação dos elementos do processo que indiciam os factos imputados, sempre que a sua comunicação não puser gravemente em causa a investigação, impossibilitar a descoberta da verdade ou criar perigo para a vida, a integridade física ou psíquica ou a liberdade dos participantes processuais ou das vítimas do crime;
c) A qualificação jurídica dos factos imputados;
d) A referência aos factos concretos que preenchem os pressupostos de aplicação da medida, incluindo os previstos nos artigos 193.º e 204.º “

Visto o despacho sob recurso verifica-se que no essencial e de modo sintético satisfaz aqueles requisitos embora não o faça de forma ordenada e compartimentada mas referencia os mesmos quando pertinente.
Assim indica, a qualificação jurídica dos factos: “um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º n.º 1 do Dec. Lei 15/93 de 22/01; os elementos probatórios: “os elementos de prova que constam dos autos, designadamente o auto de notícia por detenção de fls. 2 a 4, os testes rápidos de fls. 5 a 7, os autos de apreensão de fls. 8 a 11, a fls de suporte 18, a reportagem fotográfica de fls. 19 a 28, os CRC de fls. 31 e ss. e de fl. 41, e a FB de fls. 42, tudo conjugado com as declarações individuais dos arguidos, permitem sustentar as suspeitas do cometimento do ilícito vindo de enunciar”;- factos praticados: tráfico de droga, factos esses que são enunciados pelo MºPº no seu requerimento para 1º interrogatório para que o despacho expressamente remete, e procede à analise da prova, terminando por justificar a aplicação de tal medida de coação ao arguido e o afastamento de outras, nomeadamente a OPHVE, pelo que satisfaz no essencial a necessidade expressa no mencionado artigo, de modo a não ser sancionado com a nulidade cominada no mesmo normativo.
De todo o modo, mesmo que assim não ocorresse e se entendesse que o mesmo se encontrava não fundamentado, e consequentemente seria nulo, verifica-se que tal nulidade se encontra sanada. Na verdade trata-se de uma nulidade dependente de arguição (pois não faz parte do elenco das nulidades insanáveis, do artº 119º CPP) - artº 120º 1 e 2 a) CPP, - no próprio acto, porque estamos perante um acto em que o arguente se encontra presente nesse acto como resulta do autos de primeiro interrogatório e em acto seguido, e aí não foi arguida.
Improcede por isso esta arguição.
..................................................................................
..................................................................................
..................................................................................
+
Pelo exposto, o Tribunal da Relação do Porto, decide:
Negar provimento ao recurso interposto pelo arguido e em consequência confirma a decisão recorrida.
Condena o arguido recorrente no pagamento da taxa de justiça de 04 Ucs, e nas demais custas.
Notifique.
Dn
+
Porto, 31/10/2018
José Carreto
Paula Guerreiro