Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
563/13.0TBVCD.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: TELES DE MENEZES
Descritores: CONTRATO DE MEDIAÇÃO
Nº do Documento: RP20140703563/13.0TBVCD.P1
Data do Acordão: 07/03/2014
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: REVOGADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - Em princípio, no contrato de mediação, a remuneração apenas é devida ao mediador com a conclusão e perfeição do negócio.
II - Para que exista direito a remuneração, é exigível que o negócio esteja não somente perspectivado, mas acertado, isto é, que haja um interessado efectivo para o mesmo, que aceite as condições do vendedor, mesmo que se venha a frustrar por recusa do cliente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Apelação n.º 563/13.0TBVCD.P1 – 3.ª
Teles de Menezes e Melo – n.º 1485
Mário Fernandes
Leonel Serôdio

Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I.
B…, Lda instaurou a presente acção declarativa contra C… e mulher D…, pedindo a condenação destes no pagamento da quantia de € 6.150,00, acrescida de juros de mora desde a citação.
Alegou que celebrou com os RR. um contrato de mediação imobiliária, no regime de exclusividade, para venda de uma fracção autónoma pertencente aos RR., tendo angariado um cliente, mas os RR., sem lhe darem conhecimento, com a intervenção de outra mediadora imobiliária, celebraram o contrato com outro comprador.
Pretende receber a remuneração fixada no contrato.

Os RR. contestaram, suscitando a ilegitimidade da Ré mulher, dizendo que a A. não cumpriu com as obrigações assumidas, que o contrato foi apresentado ao R. marido já preenchido, não lhe tendo sido comunicadas as suas cláusulas, nomeadamente a da exclusividade, e impugnaram a matéria alegada pela A..

Realizou-se o julgamento e foi proferida sentença que condenou o R. C… a pagar à A. a quantia de € 6.150,00, acrescida de juros de mora à taxa de 4% contados desde 6/3/2013 até efectivo pagamento; e absolveu a Ré D… do pedido contra ela formulado.

II.
Recorreu o R., concluindo:
1ª - É patente a desconsideração do Tribunal “a quo” pelas circunstâncias e pelo momento em que ocorreram os factos que resumiu convenientemente para justificar a sua decisão, retirando conclusões desfasadas e fazendo uma incorrecta aplicação do direito.
2ª - O regime de exclusividade na mediação confere ao mediador, excepcionalmente, no que respeita à remuneração dos seus serviços, o direito à retribuição respectiva nos casos em que o negócio visado não seja celebrado por causa imputável ao proprietário do bem, cliente da empresa mediadora, ou seja, aos próprios vendedores.
3.ª - A Apelada obrigou-se a angariar e aproximar do Apelante interessados que reunissem as condições por ele exigidas, necessárias à conclusão do negócio, designadamente quanto ao preço indicado e condições de pagamento, e só com a conclusão e perfeição do negócio visado seria devida a remuneração dos seus serviços;
4.ª - A mediação é um contrato de resultado e não de mera actividade, compreendendo-se que, por regra, sem a obtenção do objectivo contratado não seja devida remuneração.
5.ª - A mediadora deveria angariar e aproximar do proprietário vendedor um interessado que reunisse as condições exigidas por ele, necessárias à celebração do contrato de compra e venda da fracção autónoma, designadamente quanto ao preço indicado e condições de pagamento, e só com a conclusão e perfeição do negócio visado seria devida a remuneração dos serviços da Apelada, assim, desde que houvesse também uma relação de causalidade entre a actividade dela e a conclusão do contrato procurado;
6.ª - No caso, o contrato em regime de exclusividade confere ao mediador, excepcionalmente, no que respeita à remuneração dos seus serviços, o direito à retribuição respectiva nos casos em que o negócio visado não seja celebrado por causa imputável ao proprietário do bem, cliente da empresa mediadora, ou seja, aos próprios vendedores;
7.ª – Nos presentes autos resultou óbvia da ausência de prova quanto à criação, por parte da Apelada, de condições para a concretização da venda do imóvel do Apelante;
8.ª - Em nenhum momento resultou provado que a Apelada tenha conseguido angariar e aproximar do proprietário vendedor, neste caso do Apelante, um interessado que reunisse as condições exigidas por ele, necessárias à celebração do contrato de compra e venda da fracção autónoma, designadamente quanto ao preço indicado e condições de pagamento;
9.ª - No caso concreto não resultou provado que a Apelada tivesse logrado, com os actos praticados, aproximar o comitente (Apelante) e terceiros e conseguido a adesão destes para a compra e venda do imóvel;
10.º - Nenhum dos factos elencados na fundamentação de facto da sentença em crise é bastante para que o Tribunal “a quo” pudesse ter concluído pela culpa do Apelante na falta de concretização da venda;
11.º - Não pode o Apelante provar não ter tido culpa ou responsabilidade pela não concretização de um negócio que nunca lhe foi apresentado ou angariado;
12.ª - O Apelante apenas vendeu o imóvel decorridos 5 (cinco) meses da última visita por uma interessada apresentada pela Apelada e da qual não obteve nenhum feedback;
13.ª - A sentença em crise, não se socorreu ou recorreu a factos notórios e do conhecimento público, relacionados com o estado do mercado imobiliário nos anos em causa;
14.º - Os factores relativos ao mercado imobiliário bem justificam a razão pela qual o Apelante aceitou baixar o preço de venda a publicitar e, em face de uma proposta concreta e das dificuldades económicas e financeiras em que o país se encontrava e encontra e que o Tribunal “a quo” parece ignorar;
15.ª - Para que a Autora pudesse beneficiar da remuneração prevista no contrato, exigia-se que para além da conclusão do negócio de compra e venda existisse uma relação de causalidade entre a actividade da Autora e a conclusão do contrato procurado;
16.ª – Resulta provado que, desde Novembro de 2010 a Março de 2012 a Autora apenas levou a visitar o imóvel, objecto do contrato de mediação, dois “potenciais interessados” como referido na Sentença em crise;
17.ª – Os factos provados são representativos de que o Apelante nunca impediu a Apelada de efectuar o trabalho de mediação a que se propôs, nem teve culpa ou contribuiu para que a Apelada não tivesse chegado a potenciar sequer a concretização a venda do imóvel;
18.ª - Não resultou provado, ao contrário do concluído pelo Tribunal “a quo”, que a Apelada tenha conseguido angariar verdadeiros interessados na concretização da compra do imóvel;
19.ª - Tendo o Tribunal “a quo” julgado provado que o Apelante colaborou com a Apelada na execução do contrato de mediação, acedendo na baixa do preço e autorizando a visita do imóvel em Março de 2012, nunca poderia concluir-se que a Apelada não concretizou qualquer venda por razões imputáveis ao Apelante apenas porque, em Agosto 2012 pretendia marcar uma visita;
20.ª – Resultou ainda provada a inexistência de qualquer nexo causal entre o negócio de venda do imóvel e a intervenção da Autora;
21.ª - Não tendo o Apelante impedido a concretização da venda pela Apelada e não tendo esta qualquer intervenção na venda que ocorre depois de decorridos dois anos da celebração do contrato de mediação, não poderá impender sobre o Apelante a obrigação legal ou contratual de proceder ao pagamento de qualquer comissão, a título de remuneração, ao contrário do decidido pelo Tribunal “a quo”;
22.ª - Não tendo resultado provado que a Apelada angariou e proporcionou ao Apelante a concretização da venda do imóvel, não pode concluir o Tribunal “a quo” que o Apelante impediu tal de acontecer e condená-lo;
23.ª - A eventual violação contratual decorrente do Apelante ter recorrido aos serviços de uma outra sociedade de mediação imobiliária para vendar o imóvel, cuja penalização não se encontra contratualmente prevista, não dá lugar a qualquer pagamento da remuneração, motivo pelo qual nunca poderia proceder o pedido da Apelada;
24.ª - A exclusividade no contrato de mediação imobiliária consiste no facto de só a mediadora, ora Apelada, ter o direito de sozinha promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o período de vigência do mesmo, contudo, não lhe confere per si o direito a receber a remuneração pelo simples facto de o contrato existir;
25.ª - Resultou provado que o contrato de compra e venda celebrado em Agosto de 2012 decorreu de uma nova negociação em que a Apelada não teve qualquer tipo de intervenção, máxime, de aproximação entre as partes;
26.ª - O Tribunal “a quo” julgado provado que a Apelada teve conhecimento, em Agosto de 2011, que o Apelante havia colocado o imóvel à venda numa outra imobiliária, que o advertiu disso mesmo e que nada fez;
27.ª - A Apelada optou por manter o contrato, bem sabendo do incumprimento da cláusula de exclusividade por parte do Apelante, não tendo optado pela rescisão do mesmo;
28.ª - A Apelada ao não rescindir o contrato em virtude da violação da cláusula de exclusividade, aceitou mantê-lo, ciente do risco de que poderia não ser a Apelada a intermediar a venda do imóvel, risco que aceitou, tendo compactuado com tal situação durante pelo menos durante dez meses, sem nada fazer;
29.ª - A sentença proferida pelo Tribunal “a quo”, veio erroneamente dar provimento ao pedido formulado pela Apelada com fundamento numa cláusula do contrato que se provou ter tido conhecimento não estar a ser cumprida, um ano antes da concretização da venda do imóvel por outra imobiliária, e ter compactuado com tal incumprimento ao decidir manter o contrato;
30.ª - A violação da cláusula de exclusividade na data em que a Apelada teve conhecimento apenas poderia ter como consequência a resolução do contrato e, eventualmente um pedido de compensação pelos custos associados às diligências, acções encetadas pela Apelante para a promoção da venda do imóvel;
31.ª - O facto de o Apelante ter vendido o imóvel com recurso a uma outra empresa mediadora apenas poderia configurar uma eventual violação contratual;
32.ª - O Tribunal “a quo” deveria ter concluído que, não tendo a Apelada resolvido o contrato, apesar do conhecimento do incumprimento da Clausula de Exclusividade por parte do Apelante, não poderia lograr do direito que, eventualmente lhe adviria dessa mesma cláusula contratual, por configurar um abuso de direito;
33.ª - A Apelada manteve o contrato, apesar de saber da violação da cláusula de exclusividade, por pretender beneficiar da venda do imóvel, quer por si, quer por outrem;
34.ª - Resultou provada a falta de propostas de concretização de negócio apresentadas pela Apelada e a venda do imóvel sem qualquer intervenção ou influência sua;
35.ª - Não tendo existido perfeição na conclusão do negócio, não tendo existido actuação do mediador na venda realizada, a remuneração não será nunca devida nos termos contratuais e legais;
36.ª - Impõe-se a revogação da sentença proferida, atenta a incorrecta apreciação dos factos julgados como provados e, consequentemente, incorrecta aplicação do Direito e a sua substituição por outra decisão que julgue a acção totalmente improcedente.
Termos em que, nos melhores de Direito,
Deve ser dado provimento ao recurso interposto, alterando-se a decisão recorrida, absolvendo o Apelante do pedido, fazendo-se a costumada
JUSTIÇA!

A Apelada contra-alegou, pedindo a confirmação da sentença e espraiando-se, sem fundamento, quanto à falta de cumprimento pelo Apelante do ónus de impugnação da decisão de facto, já que este não impugnou essa decisão.

III.
Questões:
- incorrecta aplicação do direito aos factos;
- natureza do contrato de mediação imobiliária;
- venire contra factum proprium pela A;
- abuso do direito.

IV.
Factos provados:
1. A autora é uma sociedade que exerce a actividade de mediação imobiliária.
2. A autora é detentora da licença AMI n º …., atribuída para o exercício daquela actividade.
3. Em 2 de Novembro de 2010, a autora, no âmbito da sua actividade comercial, e o réu C… celebraram acordo denominado de “Contrato de Mediação Imobiliária”, pelo período de seis meses, no âmbito do qual o réu declarou ser dono de uma fracção autónoma designada pelas letras “AS”, sita no .º andar direito frente, entrada . pelo nº .. na …, nº .., .º Drt F, conforme documento junto aos autos a fls. 71 e 72.
4. No âmbito de tal contrato/acordo, a autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra daquele imóvel, pelo preço de € 111.500,00 (cento e onze mil e quinhentos euros), desenvolvendo para o efeito, acções de promoção.
5. Consta do n.º 2 da cláusula 2ª do referido documento que “qualquer alteração ao preço fixado no número anterior deverá ser comunicado de imediato e por escrito à mediadora”.
6. Mais foi acordado que tal contrato era efectuado em regime de exclusividade.
7. Consta desse documento que a remuneração a atribuir à autora, seria de 5%, calculada sobre o preço, pelo qual o negócio viesse a ser efectivamente concretizado acrescido de IVA à taxa legal, nunca podendo ser inferior a € 5.000,00 acrescida de IVA.
8. A autora empreendeu esforços e diligências, no sentido de encontrar potenciais interessados para a compra do imóvel.
9. O mais tardar em Abril de 2011, a autora logrou obter interessado na compra da fracção dos réus e assim apresentou-lhes uma proposta de um potencial cliente, E…, pelo valor de 100.000,00 euros.
10. O réu C… contrapropôs um valor de 103.000,00 euros, não tendo aquele interessado aceite em subir o preço.
11. Face à dificuldade em encontrar interessados no referido imóvel, pelo preço pretendido pelos réus, o réu C… em Fevereiro de 2012, decidiram baixar o preço pelo qual pretendiam alienar o imóvel, de €111.500 para € 100.000.
12. Na sequência da baixa de valor, a autora logrou novamente angariar um potencial interessado/cliente para a compra da fracção dos réus.
13. Altura em que o réu C… lhe comunica que o referido imóvel, já tinha sido vendido, sem nunca terem comunicado nada à autora, que continuou a realizar o seu trabalho.
14. Em 22 de Agosto de 2012, os réus venderam o imóvel supra descrito, por escritura pública a F… pelo preço de € 85.155,00, tendo como intervenção de mediadora imobiliária, “G…, Lda”, com a licença AMI nº …..
15. Na altura da contratação, o Réu explicou tratar-se da casa de morada de família dele e da sua mulher, aqui 2ª Ré, e que estavam interessados em vender pelo preço mínimo de € 115.000,00.
16. Interessado em intermediar a eventual venda o “representante” da
Autora, H…, apresentou ao Réu o formulário, documento junto a fls. 71 e 72, para assinatura, pelo qual a Autora se obrigou a diligenciar no sentido de encontrar interessados para a compra da fracção autónoma.
17. Esse formulário estava já em parte preenchido, tendo o Senhor H… procedido ao preenchimento dos elementos relativos à identificação do Réu e sua mulher, identificação do imóvel, preço de venda e número de meses pelo qual este último pretendia que se mantivesse em vigor.
18. A partir de determinada altura o réu contratou outros profissionais para venderem o imóvel, o que foi publicitado no próprio imóvel e veio a ser do conhecimento da autora.
19. Com excepção dos elementos manuscritos, o contrato foi prévia e integralmente elaborado pela Autora, que fez incluir o valor e condições de remuneração.
20. Este contrato foi celebrado com uma validade de seis meses, “renovando-se automaticamente e por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo”.
21. No n.º 1 da cláusula 4ª do contrato tipo (documento de fls. 71 e 72), sob a epígrafe de “regime de contratação” consta a alternativa de regime de exclusividade e não exclusividade, a ser optado por a aposição de uma cruz na hipótese desejada.
22. A 17/3/2012 a autora acompanhou a cliente I… numa visita ao imóvel dos réus.
23. A autora publicitou a venda do imóvel dos réus na sua “revista proprietários regional” na 1ª edição de 2011.

V.
Hoje, a actividade de mediação imobiliária encontra-se sujeita à Lei n.º 15/2013 de 08.02, que conformou o respectivo regime com a disciplina constante do Decreto-Lei n.º 92/2010, de 26.07, que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva n.º 2006/123/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 12.12.2006, relativa aos serviços no mercado interno.
Do seu art. 19.º (Remuneração da empresa) consta:
1 — A remuneração da empresa é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação ou, se tiver sido celebrado contrato-promessa e no contrato de mediação imobiliária estiver prevista uma remuneração à empresa nessa fase, é a mesma devida logo que tal celebração ocorra.
2 — É igualmente devida à empresa a remuneração acordada nos casos em que o negócio visado no contrato de mediação tenha sido celebrado em regime de exclusividade e não se concretize por causa imputável ao cliente proprietário ou arrendatário trespassante do bem imóvel.
3 — Quando o cliente for um potencial comprador ou arrendatário, a empresa, desde que tal resulte expressamente do respetivo contrato de mediação imobiliária, pode cobrar quantias a título de adiantamento por conta da remuneração acordada, devendo as mesmas ser devolvidas ao cliente caso o negócio não se concretize.
4 — O direito da empresa à remuneração cujo pagamento caiba ao cliente proprietário de imóvel objeto de contrato de mediação não é afastado pelo exercício de direito legal de preferência sobre o dito imóvel.
5 — O disposto nos números anteriores aplica-se apenas a contratos sujeitos à lei portuguesa.
O art. 43.º-a) deste diploma revogou o DL 211/2004, de 20.08, alterado pelo DL 69/2011, de 15.06, que, no entanto, é aqui aplicável, por ser o que vigorava à data da celebração do contrato entre as partes.
Todavia, não existe diferença significativa, para o que nos ocupa, entre o art. 19.º da Lei 15/2013 e o art. 18.º (Remuneração) do diploma anterior, que dispunha:
1 — A remuneração só é devida com a conclusão e perfeição do negócio visado pelo exercício da mediação.
2 — Exceptuam-se do disposto no número anterior:
a) Os casos em que o negócio visado, no âmbito de um contrato de mediação celebrado, em regime de exclusividade, com o proprietário do bem imóvel, não se concretiza por causa imputável ao cliente da empresa mediadora, tendo esta direito a remuneração;
b) Os casos em que tenha sido celebrado contrato-promessa relativo ao negócio visado pelo contrato de mediação, nos quais as partes podem prever o pagamento da remuneração após a sua celebração.
3 — Sem prejuízo do disposto no n.o 4, é vedado às empresas de mediação receber quaisquer quantias a título de remuneração ou de adiantamento por conta da mesma, previamente ao momento em que esta é devida nos termos dos n.os 1 e 2.
4 — Quando o contrato de mediação é celebrado com o comprador ou arrendatário, a empresa, desde que tal resulte expressamente do contrato, pode cobrar quantias a título de adiantamento por conta da remuneração acordada, devendo as mesmas ser devolvidas ao cliente no caso de não concretização do negócio objecto do contrato de mediação imobiliária.
5 — Nos casos previstos no número anterior, os adiantamentos não poderão exceder, no total, 10% da remuneração acordada e só poderão ser cobradas após a efectiva angariação de imóvel que satisfaça a pretensão do cliente e corresponda às características mencionadas no contrato de mediação imobiliária.
6 — Caso a empresa de mediação tenha celebrado contratos de mediação com ambas as partes no mesmo negócio, cujo objecto material seja o mesmo bem imóvel, a remuneração só é devida por quem primeiro a contratou, excepto se houver acordo expresso de todas as partes na respectiva divisão.
7 — A alteração subjectiva numa das partes do negócio visado, por exercício do direito legal de preferência, não afasta o direito à remuneração da empresa de mediação.

Em princípio, pois, a remuneração apenas é devida com a conclusão e perfeição do negócio, exceptuando-se, nomeadamente, o caso de existir uma cláusula de exclusividade e a não concretização do negócio ser imputável ao cliente da empresa de mediação que, nesse contexto, terá direito a remuneração.
Para que exista, nesta hipótese, direito a remuneração, é exigível, todavia, que o negócio esteja não somente perspectivado, mas acertado, isto é, que haja um interessado efectivo para o mesmo, que aceite as condições do vendedor, o qual se vem a frustrar por recusa do cliente.

Temos, por isso, que ver o que resulta da matéria de facto provada.
São estes os factos relevantes:
4. No âmbito de tal contrato/acordo, a autora obrigou-se a diligenciar no sentido de conseguir interessado na compra daquele imóvel, pelo preço de € 111.500,00 (cento e onze mil e quinhentos euros), desenvolvendo para o efeito, acções de promoção.
6. Mais foi acordado que tal contrato era efectuado em regime de exclusividade.
20. Este contrato foi celebrado com uma validade de seis meses, “renovando-se automaticamente e por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não seja denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com aviso de recepção ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo”.
8. A autora empreendeu esforços e diligências, no sentido de encontrar potenciais interessados para a compra do imóvel.
9. O mais tardar em Abril de 2011, a autora logrou obter interessado na compra da fracção dos réus e assim apresentou-lhes uma proposta de um potencial cliente, E…, pelo valor de 100.000,00 euros.
10. O réu C… contrapropôs um valor de 103.000,00 euros, não tendo aquele interessado aceite em subir o preço.
11. Face à dificuldade em encontrar interessados no referido imóvel, pelo preço pretendido pelos réus, o réu C… em Fevereiro de 2012, decidiu baixar o preço pelo qual pretendia alienar o imóvel, de € 111.500 para € 100.000.
12. Na sequência da baixa de valor, a autora logrou novamente angariar um potencial interessado/cliente para a compra da fracção dos réus.
13. Altura em que o réu C… lhe comunica que o referido imóvel, já tinha sido vendido, sem nunca terem comunicado nada à autora, que continuou a realizar o seu trabalho.
14. Em 22 de Agosto de 2012, os réus venderam o imóvel supra descrito, por escritura pública a F… pelo preço de € 85.155,00, tendo como intervenção de mediadora imobiliária, “G…, Lda”, com a licença AMI nº …..
18. A partir de determinada altura o réu contratou outros profissionais para venderem o imóvel, o que foi publicitado no próprio imóvel e veio a ser do conhecimento da autora.
22. A 17/3/2012 a autora acompanhou a cliente I… numa visita ao imóvel dos réus.
23. A autora publicitou a venda do imóvel dos réus na sua “revista proprietários regional” na 1ª edição de 2011.

O cliente encontrado pela A. em Abril de 2011 não releva para a decisão da questão, na media em que, então, ainda o preço pretendido pelo R. era de € 111 500,00, e ele apenas estava disposto a pagar € 100.000,00.
Ainda houve uma descida do preço pelo R., mas o potencial comprador não aceitou essa contra-proposta.
Entretanto, o R. baixou o preço para € 100.000,00 e a autora logrou novamente angariar um potencial interessado/cliente para a compra da fracção dos réus, altura em que o réu C… lhe comunica que o referido imóvel, já tinha sido vendido, sem nunca ter comunicado nada à autora, que continuou a realizar o seu trabalho. A 17/3/2012 a autora acompanhou a cliente I… numa visita ao imóvel dos réus.
Pois bem, os factos apenas falam de um potencial cliente e de uma visita ao imóvel por uma cliente. Nada deles se extrai quanto à vontade manifestada pelo dito potencial cliente de comprar a fracção em venda pelo valor exigido pelo R..
A A. continuou a realizar o seu trabalho, mas nada nos diz que conseguiu obter um cliente firme para o negócio.
E só nesse circunstancialismo se pode falar de frustração do negócio por culpa do R..
Efectivamente, a existência de potencial cliente para a compra não é o mesmo que a existência de cliente seguro para o negócio, sendo que para que esta situação existisse, necessário se tornava que a A. tivesse conseguido que o cliente houvesse concordado com o preço exigido pelo R.
Não se tendo provado isso, prova que impendia sobre a A., nos termos do art. 342.º/1 do CC, a acção não pode ter sucesso.

Conforme se refere no acórdão do STJ de 12.12.2013[1], «No âmbito de um contrato de mediação celebrado em regime de exclusividade em que as partes não fazem depender o pagamento da remuneração da efectiva outorga de qualquer contrato, é a mesma devida ao mediador que tenha desenvolvido actividade que haja influído de forma decisiva para a conclusão do negócio visado, como sucede se um cliente vem a ocupar as lojas visadas, tendo ocorrido a intervenção daquele nas reuniões que ocorreram com o cliente interessado, foram por si apresentadas minutas dos contratos e foi mesmo outorgado contrato promessa, ainda que o contrato prometido se não haja realizado, por razões apenas imputáveis ao cliente.».
Ou no acórdão do mesmo Alto Tribunal de 28.04.2009[2]:
«Carlos Lacerda Barata, no estudo “Contrato de Mediação”, publicado no volume I da obra “Estudos do Instituto de Direito do Consumo” – Julho de 2002 – pág. 192 – define contrato de mediação como o – “Contrato pelo qual uma das partes se obriga a promover, de modo imparcial, a aproximação de duas ou mais pessoas, com vista à celebração de certo negócio, mediante retribuição”.
Afirmando ainda – “Da noção proposta, decorrem cinco elementos, caracterizadores do contrato: - obrigação de aproximação de sujeitos; - actividade tendente à celebração de negócio; - ocasionalidade; - retribuição”.
Mais adiante – págs. 202/203:
“O direito à retribuição depende da celebração do contrato prometido embora seja independente do cumprimento do mesmo.
Só com a verificação de um “resultado útil” – a realização do negócio – da actuação do mediador, este ganha o direito à retribuição.
Está em causa mais do que a mera exigibilidade; é da própria constituição do direito que se trata.
Pode-se, assim, afirmar que o direito à retribuição está sujeito a condição suspensiva: a celebração do negócio.
Naturalmente, que só o negócio cuja celebração advenha (exclusivamente ou não) da actuação do mediador relevará, para este efeito.
A prestação do mediador terá de ser causal, em relação ao negócio celebrado entre o comitente e o terceiro…
Em matéria de direito à retribuição, o momento relevante é o da constituição do contrato promovido, pelo que as ocorrências supervenientes que incidam sobre a execução ou o conteúdo do contrato serão, em regra, indiferentes”.
Sufragando o que fica dito (2), temos de concluir, até pela completa falência de prova – que incumbia ao Autor, nos termos do art. 342º, nº1, do Código Civil – que de modo algum resultou provado que o negócio de compra e venda, que se consumou em 17.1.1991 entre os RR. como donos e vendedores do imóvel e o seu comprador, resultou da actividade de “aproximação” entre os vendedores e o comprador, promovida por si; tão pouco existe qualquer prova da existência de nexo de causalidade entre qualquer pretensa actuação do Autor junto daquele que veio a comprar aos RR. o imóvel.
Assim, não havendo um resultado – a concretização do negócio objecto da incumbência (mediação) ao Autor, enquanto mediador ocasional – [já que a actividade de mediação profissional lhe era defesa] – não se pode afirmar que o Autor tenha jus a qualquer retribuição pela venda do imóvel, já que não resultou da sua actuação, em termos de nexo de causalidade, a celebração do negócio de compra e venda do imóvel – cfr. Acórdão deste STJ de 15.11.2007 – Proc. 07B3569 – in www.dgsi.pt – “No contrato de mediação imobiliária, a remuneração só é devida se houver uma relação causal entre a actuação do mediador e a conclusão e perfeição do contrato”.
Sendo a actividade do mediador, no essencial, e durante o iter contratual, ao menos até à obtenção de interessado com quem o incumbente celebre o negócio visado, uma obrigação de meios e, uma vez que o contrato para o mediador, comporta uma certa margem de aleatoriedade [a retribuição só será paga se o negócio se concretizar em virtude da acção do mediador] correm por sua conta as despesas feitas na busca de interessado no negócio, pelo que essas despesas, a menos que diversamente tenha sido convencionado, não são autónomas, não podendo ser exigidas ao incumbente se o negócio não foi celebrado, por mor da actuação do mediador.»
Se é verdade que estas considerações se aplicam mais ajustadamente ao regime de não exclusividade, não o é menos que, mesmo no regime de exclusividade, para que o mediador tenha direito à remuneração, o negócio tem de estar em condições de se concretizar, apenas não o sendo por causa imputável ao mandante.
Ora, o que nos revelam os factos é a existência de mero “potencial interessado/cliente”, e não de cliente disposto a aceitar as condições impostas pelo R..
Como resulta da cl.ª 5.ª/1 do contrato, «A remuneração só será devida se a Mediadora conseguir interessado que concretize o negócio visado pelo presente contrato, nos termos e com as excepções previstas no art. 18.º do DL 211/2004, de 20.08.»

Tinha, pois, a mediadora que garantir que o interessado havia aceite as condições impostas pelo cliente, o que não acontece.
E, nessa medida, a A. não tem direito à remuneração.

Outra questão é a da violação pelo R. do contrato celebrado com a A.
Com efeito, segundo a cl.ª 8.ª, o contrato foi celebrado por 6 meses, renovando-se automaticamente por iguais e sucessivos períodos de tempo, caso não fosse denunciado por qualquer das partes contratantes através de carta registada com a.r. ou outro meio equivalente, com a antecedência mínima de dez dias em relação ao seu termo.
E na cl.ª 4.ª/1 fixou-se o regime de exclusividade; dizendo-se no n.º 2 da mesma que «Nos termos da legislação aplicável, quando o contrato é celebrado em regime de exclusividade só a Mediadora contratada tem direito de promover o negócio objecto do contrato de mediação durante o respectivo período de vigência.»
Não tendo sido denunciado o contrato, quando o R. vendeu a fracção a terceiro, estava em vigor o contrato, pelo que ele não podia ter celebrado outro contrato de mediação com outra empresa, nem, consequentemente, vendido o bem ao cliente por esta angariado.
Ao fazê-lo, violou o disposto no art. 406.º/1 do CC, incorrendo em responsabilidade nos termos do art. 798.º do mesmo diploma legal.
No entanto, apesar de invocar o incumprimento do contrato por banda do R., nomeadamente aludindo ao art. 562.º e ss. do CC, o certo é que a A. nada adianta quanto aos prejuízos que esse incumprimento lhe trouxe, restringindo o pedido à remuneração que considera ser-lhe devida.
Pelo que se não podem contabilizar prejuízos que não foram alegados.

As demais questões suscitadas pelo Apelante ficam prejudicadas face à solução adiantada.

Assim sendo, julga-se a apelação procedente e revoga-se a sentença, absolvendo-se o R. do pedido.

Custas pela Apelada.

Porto, 3 de Julho de 2014
Teles de Menezes
Mário Fernandes
Leonel Serôdio
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[1] Processo: 135/11.4TVPRT.G1.S1
[2] Processo: 29/09.3YFLSB