Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
3556/20.3T8OAZ.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: RITA ROMEIRA
Descritores: JUNÇÃO DE DOCUMENTO
DECISÃO DA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA
DECISÃO JUDICIAL
FUNDAMENTAÇÃO
AUTONOMIA DO PROCESSO DE MERA ORDENAÇÃO SOCIAL
EMPRESAS DE PRESTAÇÃO DE VIGILÂNCIA E SEGURANÇA
TRANSMISSÃO DE EXPLORAÇÃO DE UNIDADE ECONÓMICA
Nº do Documento: RP202109293556/20.3T8OAZ.P1
Data do Acordão: 09/29/2021
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL; CONTRA-ORDENAÇÃO LABORAL
Decisão: RECURSO IMPROCEDENTE; MANTIDA A DECISÃO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL)
Área Temática: .
Sumário: I - Os art.s 25º e 39º da Lei nº 107/2009, de 14 de Setembro, Regime Processual das Contra-Ordenações Laborais e de Segurança Social, enunciam os elementos que a decisão da autoridade administrativa e a decisão judicial hão-de conter, não sendo as mesmas equiparáveis a uma sentença penal e não têm de conter os requisitos que a lei, nomeadamente, processual penal, impõe para aquelas.
II - A autonomia do processo de mera ordenação social face ao processo penal leva a que a aplicação subsidiária deste último não seja automática, nem conformadora ou dominante do processo contra-ordenacional.
III - A fundamentação da decisão da autoridade administrativa, proferida em procedimento de contra-ordenação laboral, deve respeitar o preceituado no art. 25º da Lei nº 107/2009 de 14 de Setembro, não fazendo sentido importar do Código Processo Penal as exigências formais atinentes às sentenças penais.
IV - Nas empresas de prestação de vigilância e segurança, fundamentalmente assentes no factor humano, há “transmissão de exploração de unidade económica” se o essencial dos efectivos, em termos de número e competências, transitar para a empresa que no local sucede na prestação do serviço, conforme (art. 285º do CT).
V – Demonstrado que a arguida/recorrente (empresa que desenvolve a actividade de vigilância privada) assumiu dezenas de trabalhadores que exerciam funções de vigilância nas entidades públicas (clientes para as quais passou a prestar serviços), pelo menos metade dos trabalhadores que a empresa anterior tinha afectos a essa prestação de serviços, existe uma transmissão da posição contratual de empregador, no âmbito daquele art. 285º, nº 1 e nº 5.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Proc. Nº 3536/20.3T8OAZ.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo do Trabalho de Oliveira de Azeméis
Recorrente: B…, S.A.
Recorrida: Act - Autoridade Para As Condições do Trabalho

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO
“B…, SA, ”, NIPC ………, (CAE …..), com sede no …, R/C, … - R. … e …, ….-… Oliveira de Azeméis, veio interpor recurso de impugnação judicial da decisão administrativa de condenação proferida, pela Autoridade para as Condições de Trabalho que a condenou pela prática de uma contraordenação muito grave prevista pelo artigo 285.º, n.º 1 e n.º 10, alínea b), do Código do Trabalho, na coima de 200 unidades de conta e uma contraordenação grave prevista nos artigos 285.º, n.º 9 e 286.º, n.º 1 a n.º 3, do Código do Trabalho, na coima de 30 unidades de conta e, em cúmulo jurídico, aplicou a coima única de 148 unidades de conta [€ 15.096].
Fundamentou a impugnação judicial, concluindo e alegando, em síntese, o seguinte:
A decisão administrativa é nula, porque não segue um raciocínio lógico e racional, é incompreensível, não indica o raciocínio lógico em que assentou para dar como provada a infração, considerando provadas afirmações vagas e genéricas, não permitindo entender o seu conteúdo, havendo ainda uma omissão de pronúncia quanto ao conhecimento da questão da inconstitucionalidade invocada;
A atuação da Ministra do Trabalho, forçando a recorrente a aceitar uma situação de facto, viola o princípio da separação de poderes, constitui um abuso de poder, cabendo apenas aos tribunais considerar se existe transmissão de estabelecimento;
A recorrente organizou logisticamente a sua prestação de serviços, nunca tendo adquirido ou recebido nenhum estabelecimento, não havendo uma unidade económica a transmitir, pois a atividade exige requisitos próprios, como um diretor de operações, alvará, licenças, seguros, não tendo os vigilantes que trabalhavam para a empresa anterior, só por si, o conhecimento e a capacidade financeira exigida para o efeito, não podendo, sozinhos, exercer a atividade; e
A coima deve ser reduzida ao mínimo legal por ausência de elementos que permitam fixar valor superior.
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Admitida a impugnação judicial, com efeito meramente devolutivo, designou-se e foi realizada a audiência de julgamento e, em 30.04.2021, foi proferida sentença, de cujo dispositivo consta a seguinte decisão:
Pelo exposto, julgo improcedente a impugnação e, em consequência, mantenho a decisão administrativa.
Custas pela recorrente, fixando a taxa de justiça em três unidades de conta.
Deposite e notifique.
Após trânsito, dê conhecimento à entidade administrativa”.
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Inconformada com esta decisão, a arguida interpôs recurso, nos termos da motivação junta que terminou com as seguintes “CONCLUSÕES:
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Admitido o recurso interposto pela recorrente, como apelação e efeito meramente devolutivo, foi notificado o Ministério Público que veio responder àquele, finalizando a sua motivação com as seguintes “CONCLUSÕES:
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Após foi ordenada a remessa dos autos a esta Relação.
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Aqui, o Ex.mº Procurador-Geral Adjunto emitiu parecer, no sentido de o presente recurso não obter provimento e ser mantida a sentença recorrida, no essencial, por considerar que, “nenhum reparo ou censura há que ser feito à douta sentença recorrida, que, deverá ser confirmada, atento o rigor dos fundamentos que nele foram consignados e que determinaram a improcedência da impugnação administrativa.
A medida concreta das coimas parcelares aplicadas próximas dos limites mínimos e a coima única aplicada em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 18.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e Coimas, não merecem reparo quanto às suas dosimetrias, tal como flui da sentença em crise, por ter sido verificada a transmissão da posição contratual de empregador, nos termos dos artigos 285.º, n.º 1 e n.º 10, alínea b), do Código do Trabalho.”.
Notificada deste, a apelante respondeu, discordando do mesmo, com base no argumento de que “os requisitos da transmissão só podem ser analisados na dependência dos requisitos impostos pela Lei da Segurança Privada” e, reiterando as suas conclusões de recurso.
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Foi cumprido o disposto no art. 418º do CPP, remetendo-se o processo aos vistos e o projecto de acórdão por via electrónica.
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Questão Prévia:
Da junção de documentos
No final das suas conclusões, consigna a recorrente que “Junta: 5 documentos”, decorrendo das suas alegações, que se trata de um Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães no Processo N.º 1028/19.2T8VRL.G1, de 08/4/2021, — doc. 1, que como diz, se refere a um “processo em que é Ré a aqui recorrente B…, que foi absolvida em primeira e segunda instâncias, numa situação idêntica à dos autos, ...” e, os demais sentenças que recebeu, “no seu caso concreto, designadamente: a) Sentença proferida no âmbito do Processo N.º 1028/19.2T8VRL do Juízo do Trabalho de Vila Real - doc. 2; b) Sentença proferida no âmbito do Processo N.º 6/20.3T8LMG do Juízo do Trabalho de Lamego - doc. 3; c) Sentença proferida no âmbito do Processo N.º 194/20.9T8PNF do Juízo do Trabalho de Penafiel - Juiz 1— doc. 4; d) Sentença proferida no âmbito do Processo N.º 3341/19.0T8PNF do Juízo do Trabalho de Penafiel - Juiz 3— doc. 5”, como a própria, diz “decisões favoráveis à sua posição, no sentido da inexistência da transmissão de estabelecimento ou unidade económica na actividade de segurança privada” e, sem que requeira a junção das mesmas aos autos, mas, fazendo-o, prossegue as suas alegações dizendo que, “Perante este cenário de decisões judiciais que abonam a favor da tese da recorrente, e perante um quadro judicial existente em Portugal de decisões contraditórias sobre esta matéria, a recorrente acha profundamente injusto a aplicação de coimas, quando ela própria se procura pautar pelo estrito cumprimento da Lei, que implica também cumprir e dar obediência às decisões dos Tribunais. E se é certo que as decisões acima referidas são posteriores aos factos aqui em causa, é também certo que a decisão do Supremo Tribunal de Justiça de 06/12/2017 é bem anterior e que constituiu à data um marco no cenário que começava a crescer em Portugal nesta actividade. Perante esta dramática situação, não se vislumbra como poderão ser as empresas, apanhadas no centro de decisões judiciais divergentes, a ter de suportar coimas que não têm reflexo nas situações de facto considerando que as decisões judiciais sobre a mesma matéria têm o valor de Lei. É profundamente injusto que a recorrente seja condenada no pagamento de uma coima quando apenas se limitou a conformar-se, num primeiro momento, com a decisão do Supremo Tribunal de Justiça por força da semelhança fáctica do caso ai tratado para as situações que vive diariamente, e, num segundo momento, considerando que também os tribunais de primeira instância e também o Tribunal da Relação de Guimarães supra referido lhe vieram a dar razão a tal conformação, no sentido da inexistência de aplicação do instituto da transmissão em situações aparentemente idênticas à dos autos e em que interveio diretamente. E diz-se aparentemente porque se entende que a matéria de fato é insuficiente à luz da matéria de facto constante das decisões ora juntas.”.
A propósito desta junção, pronunciou-se, o Ex.mº Procurador-Geral Adjunto pugnando pela sua não admissibilidade, no essencial, por considerar que a recorrente “Pugna pela revogação da sentença recorrida.
Mais juntou 4 sentenças, cujo trânsito em julgado não é mencionado, sendo que no Proc. nº 194/20.9T8PNF, emitimos o Parecer Nº. 73/2021, em 09.07.2021.
Quanto a tais sentenças, não vem apresentada adequada circunstância justificativa para a excecional junção das mesmas, para serem tidas como documentos em sede de apreciação do presente recurso – cfr. artº. 651º. do CPC.
Apenas seriam admissíveis, se em virtude do julgamento que foi proferido na primeira instância, tivesse havido fundada na surpresa relativamente ao expetável em função dos elementos que então constavam dos autos – cfr. Ac. STJ, de 26/09/2012.
Salvo melhor opinião, tal não sucede uma vez que a sentença recorrida seguiu os elementos probatórios constantes dos autos, dos quais fez devida apreciação e dos quais não divergiu.
Assim, antes de mais, sou de parecer que as mesmas sejam desentranhadas e devolvidas à recorrente, com sua condenação no incidente anómalo a que deu causa, por ocorrência estranha ao normal desenvolvimento desta lide, conforme o nº 8 do artº. 7º do RCP.”.
Há então, previamente à análise das questões colocadas no recurso, que averiguar se, será permitida à recorrente, a junção dos documentos em apreço, nesta fase processual e, ainda, se os mesmos se revestem de alguma utilidade nos presentes autos.
Dispõe o art. 651º, do CPC, que as partes apenas podem juntar documentos supervenientes às alegações, nos casos excepcionais a que se refere o art. 425º ou, no caso de a sua junção se ter tornado necessária, em virtude do julgamento proferido na 1ª instância.
Sendo princípio fundamental que os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da acção ou da defesa devem ser apresentados com os articulados em que se aleguem os factos correspondentes, ou na impossibilidade, até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final ou até ao encerramento da discussão em 1ª instância, como decorre do disposto no art. 423º, nºs 1, 2 e 3, a lei admite, igualmente, por força do estipulado pelos art.s 425º e 651º que, depois deste último momento, encerramento da discussão em 1ª instância, os documentos supervenientes possam, também, ser juntos com as alegações de recurso, mas, ainda assim, apenas, nos casos excepcionais em que a sua apresentação não tenha sido possível, até ao encerramento da discussão em 1ª instância, quando a sua apresentação se tenha tornado necessária, por virtude de ocorrência posterior, ou quando a sua junção apenas se tenha tornado necessária, em virtude do julgamento proferido em 1ª instância.
Tal como acontecia antes, actualmente, a junção de documentos deve ocorrer na 1ª instância e só pode acontecer em sede de recurso se não foi possível fazê-la em momento anterior ou quando “a junção apenas se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando este se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável”, mas não contemplando – tal como a jurisprudência anterior afirmava – a possibilidade da junção se justificar em relação a “factos que já antes da sentença a parte sabia estarem sujeitos a prova”, cfr. refere Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, 2013, págs. 184 e 185.
Assim, a regra geral quanto à oportunidade da junção de documentos posteriores ao encerramento da discussão, em 1ª instância, deve ser encontrada, através da interpretação conjugada dos citados art.s 423º e 425º.
Donde resulta que, são três os fundamentos excepcionais justificativos da apresentação de documentos supervenientes com as alegações de recurso, ou seja, quando os documentos se destinem a provar factos posteriores aos articulados, quando a sua junção se tenha tornado necessária, por virtude de ocorrência posterior e, finalmente, no caso de a sua apresentação apenas se revelar necessária, devido ao julgamento proferido em 1ª instância, cfr. Ac. STJ de 09.02.2010, in www.dgsi.pt.
Podendo as partes juntar documentos às alegações, nos casos excepcionais a que se refere o art. 425º ou, na hipótese de a sua junção apenas se tornar necessária, em virtude do julgamento proferido na 1ª instância, como decorre ainda do disposto no art. 651º, nº 1.
O Prof. Antunes Varela na RLJ, ano 115º, nº 3696, a págs. 95 e 96, na vigência do CPC de 1961, escreveu: “A junção de documentos com as alegações da apelação, afora os casos de impossibilidade de junção anterior ou de prova de factos posteriores ao encerramento da discussão de 1ª instância, é possível quando o documento só se tenha tornado necessário em virtude do julgamento proferido na 1ª instância. E o documento torna-se necessário só por virtude desse julgamento (e não desde a formulação do pedido ou a dedução da defesa), quando a decisão se tenha baseado em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado. (…)
A decisão da 1ª instância pode, por isso, criar pela primeira vez a necessidade de junção de determinado documento, quer quando se baseie em meio probatório não oferecido pelas partes, quer quando se funde em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não contavam. Só nessas circunstâncias a junção do documento às alegações da apelação se pode legitimar à luz do disposto na parte final do nº1, do artº 706 do CPC”, (que corresponde ao art. 651º do CPC, na redacção aqui aplicável).
Neste sentido tem decidido a jurisprudência do Supremo Tribunal de Justiça, cfr. entre outros, os Acórdãos de 03.03.1989, BMJ, 385º-545, de 12.01.1994, BMJ, 433º-467, de 28.02.2002, na Revista nº 296/02-6ª, Sumários, 2/2002, de 14.05.2002, na Revista nº 420/02-1ª, Sumários, 5/2002, de 30.09.2004 e de 24.02.2010, ambos disponíveis em www.dgsi.pt, defendendo-se naquele Acórdão de 28.02.2002, que a junção de documentos, com base em tal previsão, só é possível se a necessidade do documento era imprevisível antes de proferida a decisão na 1ª instância, por esta se ter baseado em meio probatório não oferecido pelas partes ou em regra de direito com cuja aplicação ou interpretação os litigantes justificadamente não contavam.
Esta última situação não ocorre, como é natural, quando a parte, conhecendo ou devendo conhecer da necessidade de apresentação de determinado documento para prova de algum facto, é confrontada com decisão que lhe é desfavorável em razão da sua não junção atempada ao processo e visa, no recurso, juntá-lo para infirmar o que decidido fora em conformidade com os factos provados.
Sendo que, como refere, novamente, o Prof. Antunes Varela e outros, agora, in “Manual de Processo Civil”, págs. 533 e 534, “…a lei não abrange a hipótese de a parte se afirmar surpreendida, com o desfecho da acção (ter perdido, quando esperava obter ganho de causa) e pretender, com tal fundamento, juntar à alegação documento….
O legislador quis manifestamente cingir-se aos casos em que, pela fundamentação da sentença ou pelo objecto da condenação, se tornou necessário provar factos com cuja relevância a parte não podia razoavelmente contar antes de a decisão ser proferida.”.
Transpondo o exposto para o caso, não se suscitam dúvidas que, nenhuma destas situações se verifica, como bem o notou o Ex.mo Procurador.
O que a recorrente pretende como se retira das suas alegações, com a junção dos documentos, é tão só que seja esta decisão revogada e nessa medida lhe seja favorável, como alegadamente, lhe foram aquelas que junta, pois que, se desconhece se as mesmas já transitaram em julgado.
No entanto, tal não configura nenhuma das situações em que é admissível a junção de documentos com as alegações de recurso, desde logo, quando os documentos se destinem a provar factos posteriores aos articulados, quando a sua junção se tenha tornado necessária, por virtude de ocorrência posterior.
E, obviamente, também não se pode considerar que os documentos só se tornaram necessários em virtude do julgamento proferido em 1ª instância pois a decisão não se baseou em meio probatório inesperadamente junto por iniciativa do tribunal ou em preceito jurídico com cuja aplicação as partes justificadamente não tivessem contado.
Assim, não se admite a junção dos documentos, devendo os mesmos, oportunamente, serem desentranhados e entregues à recorrente, se solicitados.
Custas do incidente pela recorrente, fixando-se no mínimo a taxa de justiça.
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Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso (cfr. art.s 403º, nº 1 e 412º, nº 1, do CPP), as questões colocadas pela recorrente para apreciação consistem em saber, se a decisão recorrida deve ser revogada por padecer de nulidade decorrente dos vícios de:
- inexistência da fundamentação que motiva a decisão, (art. 374º, do CPP); e
- omissão do dever de pronúncia; (al. c) do nº 1, do art. 379º, do CPP);
- errada interpretação e aplicação do direito.
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II - FUNDAMENTAÇÃO
Tribunal a quo considerou: “A] De facto.
1. Factos provados:
1)É arguida B…, S.A., NIPC ………, a qual desenvolve Atividade de Vigilância Privada (CAE …..), com sede no …, R/C, … - R. …, ….-… Oliveira de Azeméis, na qualidade de entidade empregadora.
2)Representam a arguida C…, NIF: ………, Presidente, com residência na Rua … nº .., 2º Centro/Esquerdo, …, …. - … Oliveira de Azeméis, D…, NIF: ………, Vogal, com residência na Rua … nº .., 3º Centro/Esquerdo, …, …. - … Oliveira de Azeméis e E…, NIF: ………, Vogal, com residência na Rua … nº .., 6º Centro/Sul, Edifício Camões, …. - … Oliveira de Azeméis.
3)Os trabalhadores abaixo melhor identificados laboraram ao serviço da sociedade “F…, S.A.”, até ao dia 30 de novembro de 2019 e foram transmitidos à empresa “B…, S.A” a partir do dia 03 de dezembro de 2019.
4)Com efeito, a sociedade “F…, S.A.” celebrou acordo para a prestação de serviços de vigilância e segurança preventiva nas portarias dos serviços do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, cuja execução teve início em 01 de dezembro de 2017, com adenda de renovação datada de 19 de outubro de 2018.
5)Em cumprimento do acordo, os trabalhadores exerceram as seguintes tarefas / funções (lista exemplificativa e não exaustiva): Portaria / Receção; Vigilância; Registos; Abertura e fecho do local; Atendimento telefónico e reencaminhamento de chamadas; Atendimento de utentes e encaminhamento para os funcionários respetivos, Registo de ocorrências, nas ditas portarias dos serviços do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, em diversos pontos geográficos do território de Portugal continental.
6)Os trabalhadores exerceram as funções de acordo com o horário que lhes era indicado pela “F…, S.A.” e com uso de indumentária identificativa fornecida pela “F…, S.A.”. No âmbito da execução desse contrato cumpre destacar que o desempenho de funções de atendimento e controlo de entradas saídas de pessoas é acompanhado do reencaminhamento da diversidade de utentes das entidades contratantes, de acordo com a sua organização interna, bem como a vigilância e proteção da segurança de pessoas e bens.
7)No exercício de tais funções quer a empresa F… quer a empresa B…, no serviço de vigilância, utilizam as instalações, equipamentos (designadamente as mesas, cadeiras, central telefónica, cacifos e armários) e os respetivos trabalhadores acedem e utilizam as instalações sociais da entidade a quem o serviço é prestado.
8) A arguida apresentou-se a um concurso público para prestação de serviços de vigilância e segurança preventiva nas portarias dos serviços do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, tendo sido selecionada como adjudicatária, para os Lotes “Região Norte” e “Região Centro”, de entre diversos concorrentes e assim tendo celebrado, com as respetivas entidades adjudicantes, o contrato de prestação de serviços correspondente ao objeto do concurso, cuja execução teve início em 03 de dezembro de 2019.
9)Durante o mês de novembro de 2019, momento anterior ao início da execução do contrato de prestação de serviços de vigilância e segurança preventiva nas portarias dos serviços do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social, trabalhadores / supervisores da ora autuada, dirigiram-se aos identificados vigilantes, comunicando-lhes verbalmente que haviam “ganho” o concurso público para prestação de serviços de vigilância e segurança preventiva nas portarias dos serviços do Ministério do Trabalho, da Solidariedade e da Segurança Social e questionando-os sobre se desejavam manter-se nos postos de trabalho, sem reconhecimento do instituto da transmissão, e em caso afirmativo, a B…, S.A. garantiria as condições pré-existentes, com exceção da antiguidade, razão pela teriam que celebrar contratos de trabalho a termo certo (com data de produção de efeitos a 01/12/2019).
10)No dia 02/12/2019, pelas 15:43 horas, foi efetuada uma visita inspetiva à portaria / posto de vigilância do Centro Local de Entre Douro e Vouga da ACT sito na Rua …, nº ., ….-… S. J. Madeira, sendo identificada a trabalhadora G…, com a categoria de Vigilante (Nº de Cartão M.A.I. ………), que ali se encontrava a laborar, apurando-se que:
-Transitou da F…, S.A., [sociedade para a qual exerceu funções de vigilante desde janeiro de 2019, ao abrigo de contrato sem termo, auferindo a retribuição-base mensal de €729,11 acrescida de subsídio de alimentação] para a B…, S.A. em 2019-12-01;
-Rubricou contrato de trabalho a termo certo (12 meses) com a B…, S.A. a com data de início de efeitos a 01-12-2019;
-Com a mudança de empregador, não houve quaisquer alterações de ordem retributiva;
-Antes da transferência, a vigilante usava a Farda e restante indumentária com marcas identificativas da F…, S.A. e depois da transferência usa Farda e restante indumentária com marcas identificativas da B…, S.A.;
-Cumpria e cumpre um PNT diário de 9 horas [9h – 18h, de segunda a sexta-feira], sendo “compensada” com um ou dois dias de descanso “extra” por mês, de forma a dar cumprimento ao PNT semanal de 40 horas (em regime de adaptabilidade);
-Não recebeu informação sobre a transmissão de estabelecimento / unidade económica (nem por parte da transmitente F…, S.A. nem por parte da adquirente B…, S.A.);
-A trabalhadora não é sindicalizada;
-A trabalhadora desempenhava e desempenha como (principais) atividades e tarefas (lista exemplificativa e não exaustiva): Portaria / Receção; Vigilância; Registos; Abertura e fecho do local; Atendimento telefónico e reencaminhamento de chamadas; Atendimento de utentes e encaminhamento para os funcionários respetivos e a organização e os procedimentos de trabalho utilizados são os mesmos, no momento anterior e no momento posterior à transmissão;
-A portaria / posto de vigilância manteve o mesmo horário de funcionamento: 9h – 18h (de segunda a sexta-feira) no momento anterior e no momento posterior à transmissão e não houve qualquer interrupção nem suspensão no desenvolvimento da normal atividade de vigilância no local (antes e depois da mudança de prestadores de serviços de vigilância);
-A vigilante não recebeu nenhuma informação específica quanto ao modo de execução do trabalho, nem por parte da transmitente nem por parte da adquirente;
-Não houve “substituição” do vigilante;
-A trabalhadora labora no mesmo local (posto de vigilância), utiliza os mesmos equipamentos (exs.: mesa, cadeira, computador, central telefónica, diverso material de escritório) e tem acesso às mesmas instalações sociais (exs.: WC’s, Refeitório), tudo equipamentos pertencentes ao cliente: MTSSS / ACT - Centro Local de Entre Douro e Vouga.
11)No dia 02/12/2019, pelas 14:15 horas e no dia 07/02/2020, pelas 09:30 horas, foram efetuadas visitas inspetivas à portaria / posto de vigilância do IEFP – Centro de Emprego de S. J. Madeira, sito na Av. …, ….-… São João da Madeira, sendo identificado o trabalhador H…, com a categoria de Vigilante, que ali se encontrava a laborar, apurando-se:
-Transitou da F…, S.A., [sociedade para a qual exerceu funções de vigilante desde junho de 2019, ao abrigo de contrato sem termo, auferindo a retribuição-base mensal de €729,11] para a B…, S.A. em 2019-12-01;
-Rubricou contrato de trabalho a termo certo (12 meses) com a B…, S.A. a com data de início de efeitos a 01-12-2019;
-Com a mudança de empregador, não houve quaisquer alterações de ordem retributiva;
-Antes da transferência, o vigilante usava a Farda e restante indumentária com marcas identificativas da F…, S.A. e depois da transferência usa Farda e restante indumentária com marcas identificativas da B…, S.A.;
-Não recebeu informação sobre a transmissão de estabelecimento / unidade económica (nem por parte da transmitente F…, S.A. nem por parte da adquirente B…, S.A.);
-O trabalhador não é sindicalizado;
-O trabalhador desempenhava e desempenha como (principais) atividades e tarefas (lista exemplificativa e não exaustiva): Abertura e/ou fecho do local, Portaria, Receção, Triagem e Encaminhamento dos utentes, Registos, Controlo (ligar / desligar) de Alarmes e Quadros elétricos e a organização e os procedimentos de trabalho utilizados são os mesmos, no momento anterior e no momento posterior à transmissão;
-A portaria manteve o mesmo horário de funcionamento: das 8:00h às 20:00h, de segunda a sexta-feira e das 09:00h às 13:00h ao sábado, no momento anterior e no momento posterior à transmissão e não houve qualquer interrupção nem suspensão no desenvolvimento da normal atividade de vigilância no local (antes e depois da mudança de prestadores de serviços de vigilância);
-O trabalhador H…, não recebeu nenhuma informação específica quanto ao modo de execução do trabalho, nem por parte da transmitente nem por parte da adquirente;
-Não houve “substituição” do vigilante;
-O trabalhador labora no mesmo local, utiliza os mesmos equipamentos (exs.: mesa, cadeira, computador, telefone, e diverso material de escritório) e tem acesso às mesmas instalações sociais (exs.: WC’s, Refeitório), tudo equipamentos pertencentes ao cliente MTSS / IEFP – Centro de Emprego de São João da Madeira.
12)No dia 09.12.2019 e 14.01.2020 (com início às 10h00 e 10h30, respetivamente) foram realizadas visitas inspetivas ao Serviço de Formação Profissional do Centro de Emprego e Formação Profissional, situado na Rua ., n.º …, …, …, ….-… Águeda, pelo Inspetor I…, em funções no Centro Local do Baixo Vouga, que verificou que ali se encontravam J…, contribuinte fiscal n.º, ……….., com o NISS ……….., nascida a 16.08.1960 e residente na R. …, n.º …, …, ….-… … e K…, contribuinte fiscal n.º ......... e com o NISS ……….., nascido a 21.11.1980 e residente na R. …, n.º ., ….-… …. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, ambos trabalhavam para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 1 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
13)No dia 06.12.2019 (com início às 15h30) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Centro de Formação Profissional … (e serviço de Reforço) do Instituto de Emprego e Formação Profissional de Coimbra, pelo Inspetor L…, em funções no Centro Local do Mondego que verificou que ali se encontravam M… (admitido em Abril de 2014 (primeiro, a N…, depois a O…, depois, a F…) e P… (admitido há cerca trinta anos). De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, ambos assinaram novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
14)No dia 02.12.2019 (com início às 11h40) foi realizada visita inspetiva ao Serviço de Emergência Social da Segurança Social, situado na Rua …, n.º., r/C, ….-… Coimbra, pelo Inspetor L…, em funções no Centro Local do Mondego que verificou que ali se encontrava Q…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, ambos trabalhavam para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 27 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
15)No dia 02.12.2019 (com início às 14h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional, Delegação Regional do Centro de Coimbra, pela Inspetora S…, em funções no Centro Local do Mondego que verificou que ali se encontrava T…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
16)No dia 02.12.2019 (com início às 14h00), e 10.12.2019 (com início às 15h45), foram realizadas visitas inspetivas à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional de Viseu, pela Inspetora U…, em funções na Unidade Local de Viseu que verificou que ali se encontrava V…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade. Mais e apurou que neste posto de trabalho, exercem ainda funções os seguintes trabalhadores: W…, com a categoria de vigilante, que celebrou contrato de trabalho com a empresa B…, S.A a 1/12/2019, e X…, com a categoria de vigilante, que celebrou contrato de trabalho com a empresa B…, S.A a 1/12/2019.
17)No dia 02.12.2019 (com início às 13h02), bem como nos dias 13.12.2019, 15.12.2019 e 16.01.2019, foram realizadas visitas inspetivas à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional sito na Rua …, …, n.º .., ….-… Figueira da Foz, pelo Inspetor Y…, em funções na Unidade de Apoio ao Centro Local do Mondego que verificou que ali se encontrava Z…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
18)No dia 02.12.2019 (com início às 14h41) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Instituto da Segurança Social – Centro Distrital de Viana do Castelo, sito na Rua …, n.º …, ….-… Viana do Castelo, pela Inspetora BZ…, em funções no Centro Local do Alto Minho, que verificou que ali se encontravam AB… e AC…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, estes trabalhadores trabalhavam para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
19)No dia 02.12.2019 (com início às 15h00) e 15.01.2020 (pelas 18h45m) foram realizadas visitas inspetivas à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Emprego de Viana do Castelo, sito na Rua …, .., ….-… Viana do Castelo, pela Inspetora AD…, em funções no Centro Local do Alto Minho, que verificou que ali se encontrava AE…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, estes trabalhadores trabalhavam para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
20)No dia 02.12.2019 (com início às 13h15) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Formação Profissional de Viana do Castelo, sito na Rua …, ….-… Viana do Castelo, pela Inspetora AD…, em funções no Centro Local do Alto Minho, que verificou que ali exerciam funções AF… e AG…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, estes trabalhadores trabalhavam para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
21)No dia 02.12.2019 (com início às 16h10) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Emprego de Valença. sito na Av.ª …, …, …, ….-… Valença, pela Inspetora AD…, em funções no Centro Local do Alto Minho, que verificou que ali exercia funções AH…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
22)No dia 03.12.2019 (com início às 11h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Centro Distrital da Segurança Social, sito no …, Leiria, pelo Inspetor AI…, em funções no Centro Local do Liz, que verificou que ali exercia funções AJ…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
23)No dia 02.12.2019 (com início às 12h15) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP – Serviço de Formação Profissional de Leiria, sito na Rua …, .., 1º Dto., Leiria, pela Inspetora AK…, em funções no Centro Local do Liz, que verificou que ali exercia funções AL…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
24)No dia 02.12.2019 (com início às 11h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP – Centro de Emprego de Leiria, sito na Rua …, nº ., Leiria, pela Inspetora AM…, em funções no Centro Local do Liz, que verificou que ali exercia funções AN…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
25)No dia 02.12.2019 (com início às 11h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do Pólo de Formação do IEFP, sito na Rua …, …, pelo Inspetor AI…, em funções no Centro Local do Liz, que verificou que ali exercia funções AO…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
26)No dia 02.12.2019 foi realizada visita inspetiva à Portaria do Instituto de Emprego e Formação Profissional – Centro de Formação, sito na Rua …, pelo Inspetor AP…, em funções no Centro Local do Liz, que verificou que ali exercia funções AQ…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, esta trabalhadora trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
27)Aos 3 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 15 horas e 15 minutos, foi realizada visita inspetiva no Instituto de Emprego e Formação Profissional de Vila Nova de Famalicão, sito na …, …, ….-… Vila Nova de Famalicão, pela Inspetora AS…, em funções no Centro local do AVE, que verificou que se encontrava AT…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, o trabalhador celebrou contrato por tempo indeterminado, com início de efeitos a 02/01/2012, com a entidade “F…, S.A.”, tendo celebrado um contrato a termo certo, com início a 01/12/2019, com a entidade “B…, S.A.”.
28)Aos 4 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 11 horas e 20 minutos, foi realizada visita inspetiva nas Instalações do I.S.S. de V. N. Famalicão, pelo Inspetor AU…, em funções no Centro local do AVE, que verificou que se encontrava AV… (único trabalhador identificado). De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 1 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
29)Aos 3 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 11 horas e 30 minutos, e aos catorze dias do mês de janeiro de 2020, pelas 15horas e 30 minutos foram realizadas visitas inspetivas no Serviço Local de Guimarães do Instituto da Segurança Social, sito no … ….-… GUIMARAES, pela Inspetora AW…, em funções no Centro local do AVE, que verificou que se encontrava AX…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, esta trabalhadora trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 1 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
30)Aos 3 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 10 horas e 45 minutos, foi realizada visita inspetiva no Instituto de Emprego e Formação Profissional de Guimarães, sito na Avenida …, …, ….-… Guimarães, pela Inspetora AY…, em funções no Centro local do AVE, que verificou que se encontrava AZ…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 1 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
31)Aos 2 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 14 e 30 minutos horas, foi realizada visita inspetiva na Portaria do IEFP – Serviço de Formação Profissional de Castelo Branco, pelo Inspetor BA…, em funções no Centro local da Beira Interior, que verificou que se encontrava BB… e BC…. Ambos os trabalhadores prestavam trabalho para a empresa F…, há cerca de 4 anos, tendo denunciado o contrato de trabalho e celebrado novo contrato, com a B…, por 1 ano, com efeitos a 01 de Dezembro de 2019.
32)Aos 2 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 11 e 30 minutos horas, foi realizada visita inspetiva no Centro de Contacto da Segurança Social de Castelo Branco, pela Inspetora BD…, em funções no Centro local da Beira Interior, que verificou que se encontravam BE… e BF….
33)Aos 2 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 11 e 00 minutos horas, e catorze dias do mês de janeiro de 2020, pelas 15 horas e 40 minutos, foram realizadas visitas inspetivas na Portaria do IEFP da Guarda, pelo Inspetor BG…, em funções no Centro Local da Beira Alta, que verificou que ali se encontravam, BH…, BI… e BJ…. Quer o trabalhador BH… (trabalhador da F…, SA desde abril de 2010), quer o trabalhador BI… (trabalhador da F…, SA desde junho de 2015), quer o trabalhador BJ… (trabalhador da F…, SA desde setembro de 2001), todos celebrado, em 01/12/2019, com a empresa B…, S.A., um contrato com um termo certo de um ano.
34)Aos 2 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 11 e 41 minutos horas, e catorze dias do mês de janeiro de 2020, pelas 16 horas e 05 minutos, foram realizadas visitas inspetivas na Portaria do Instituto da Segurança Social da Guarda, pelo Inspetor BG…, em funções no Centro Local da Beira Alta, que verificou que se encontrava, BK…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, BK…, foi admitido ao serviço da empresa F…, S.A. em abril de 2008 e no dia 1 de dezembro de 2019, celebrou com a empresa BK…, S.A., um contrato com um termo certo de um ano.
35)Aos 2 dias do mês de dezembro do ano 2019, pelas 14horas e 00 minutos, foi realizada visita inspetiva no Serviço de Emprego e Formação Profissional de Seia, sediado na Av.ª … – Seia, pelo Inspetor BL…, em funções no Centro local da Beira Alta, que verificou que se encontravam BM…, residente na Av.ª …, …, 2.º posterior direito – …, ….-… Seia, com NIF ……… e NISS ………..; BN…, residente na …, n.º ., ….-… Paços da Serra, com NIF ……… e NISS ……….. e BO…, residente na …, ….-… …, com NIF ……… e NISS …………. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, BM…, foi admitido ao serviço da empresa F… em 1/07/2009 em regime de contrato de trabalho sem termo e a tempo completo e em 1/12/2019 celebrou contrato com a empresa B…. O trabalhador BN…, foi admitido ao serviço da empresa F… em 25/10/2016 em regime de contrato de trabalho sem termo e a tempo completo e em 1/12/2019 (data em que passaram a ser trabalhadores da B…) e BO…, admitido ao serviço da empresa F… em 24/07/218 com contrato de trabalho a termo e a tempo parcial (15 horas semanais) celebrou em 1/12/2019 contrato com a empresa B….
36)No dia 02.12.2019 (com início às 11h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP - Amarante, sito na Rua …, Amarante, pelo Inspetor BP…, em funções na Unidade Local de Penafiel, que verificou que ali exercia funções BQ…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
37)No dia 02.12.2019 (com início às 12h30) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP - Felgueiras, sito na Rua …, Felgueiras, pelo Inspetor BP…, em funções na Unidade Local de Penafiel, que verificou que ali exercia funções BS…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
38)No dia 02.12.2019 (com início às 14h15) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP – Paços de Ferreira, sito na Av. …, …, Paços de Ferreira, pela Inspetora BT…, em funções na Unidade Local de Penafiel, que verificou que ali exercia funções BU…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
39)No dia 02.12.2019 (com início às 15h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP – Penafiel, sito na Av. …, .., Penafiel, pela Inspetora BT…, em funções na Unidade Local de Penafiel, que verificou que ali exercia funções BV…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
40)No dia 02.12.2019 (com início às 09h00) foi realizada visita inspetiva à Portaria do IEFP – Póvoa de Varzim, sito na Av. …, …, Póvoa de Varzim, pela Inspetora BW…, em funções no Centro Local do Grande Porto, que verificou que ali exercia funções BX…. De acordo com a informação recolhida no âmbito daquela intervenção inspetiva, este trabalhador trabalhava para a “F…, S.A.”, tendo assinado novo contrato de trabalho a termo com a B…, S.A., cuja vigência se iniciou a 01 de Dezembro de 2019, sem salvaguarda da respetiva antiguidade.
41)No dia 13/12/2019, pelas 14h30, foi realizada uma visita inspetiva à sede da empresa B…, S.A., sendo nosso interlocutor preferencial o legal representante da sociedade BY….
42)No âmbito e no decurso desta visita inspetiva, após ser contextualizada a razão da nossa intervenção, mormente sensibilizando os responsáveis da sociedade sobre a necessidade de assumirem os trabalhadores “transmitidos” no processo de mudança de prestadores de serviço de vigilância nas portarias do MTSSS, o nosso interlocutor manifestou claramente o entendimento de que a situação em apreço (mudança de prestação de serviços de vigilância e segurança nas portarias dos serviços do MTSSS) não configura uma transmissão, no sentido previsto no art.º 285º do CT.
43)Ainda no âmbito desta intervenção, foi entregue Notificação para Apresentação de Documentos solicitando o envio de cópias dos seguintes documentos (documentos relativos à empresa e aos trabalhadores que, no processo de transmissão das portarias dos vários serviços do MTSS, viram transferidas as suas posições contratuais para a sociedade B…, S.A.):
1 - Lista nominativa dos trabalhadores que no processo de transmissão das portarias dos vários serviços do MTSS, viram transferidas as suas posições contratuais para a sociedade ora notificada, com indicação dos seguintes itens:
Local de trabalho de colocação;
Tipo de contrato;
Antiguidade;
Categoria profissional;
Retribuição;
Horário de trabalho praticado;
2 - Fundamentação do diferencial, caso exista, entre a situação contratual anterior á transmissão e a situação atual;
3 - Informação sobre a filiação sindical dos trabalhadores abrangidos: artigo 496º do CT;
4 - Informação prestada aos trabalhadores sobre a transmissão das diferentes unidades económicas – artigo 286º, nºs 1 e 3 do CT.
5 – Documentação evidenciadora / comprovativa de ter sido dado cumprimento ao Dever de Consulta dos representantes dos trabalhadores: artigo 286º, nº 4 do CT
6 – Recibos de retribuição relativos ao pagamento do Subsídio de Natal (2019)
44)Em resposta à Notificação, o supra referido representante legal da sociedade B…, S.A. respondeu nos termos que infra se transcrevem:
Relativamente à v/ notificação acima identificada, mediante a qual nos solicitam documentos relativos “à empresa e aos trabalhadores que, no processo de transmissão das portarias dos vários serviços do MTSS, viram transferidas as suas posições contratuais para” esta empresa, antes de mais, gostaríamos de esclarecer que desconhecemos a existência, quer de qualquer transferência, quer de qualquer processo de transmissão das portarias dos vários serviços do MTSS. No que a essa matéria diz respeito, apenas podemos esclarecer que iniciámos a prestação de serviços de segurança e vigilância em várias portarias do MTSS, mas mediante trabalhadores desta empresa e outros contratados exclusivamente para esse efeito e no seguimento de contrato assinado com o cliente. Por essa razão, como compreenderá, não podemos remeter documentos que não existem, pela simples razão de não ter existido qualquer transferência ou transmissão. Contudo, afigurando-se-nos que a v/ pretensão poderá caber na análise das situações laborais dos nossos trabalhadores que prestam serviços nas várias portarias do MTSS, e no espirito de colaboração por que esta empresa sempre pautou para com as autoridades, agradecemos que nos confirme se pretende que o pedido de elementos se reporte a esta referida análise, para que possamos, aí sim, dar a competente resposta. (…)
Dr. D..
45)Mais se apurou que a sociedade “B…, S.A.” não tem informação sobre filiação sindical dos trabalhadores, de acordo com o assumido em declaração subscrita por um seu legal representante.
46)A sociedade “B…, S.A.” encontra-se filiada na Associação Nacional das Empresas de Segurança – AESIRF, de acordo com o referido no Relatório Único - Anexo 0 referente a 2018.
47)A recorrente exerce a atividade antes descrita como tendo sido exercida pela F….
48)Pelo menos entre 100 a 120 dos trabalhadores que laboravam nas portarias de receção do MTSSS (ao serviço da “F…, S.A.”), num total de cerca de 200, manteve-se ao serviço nas mesmas portarias (agora ao serviço da arguida).
49)Não houve qualquer interrupção nem suspensão no desenvolvimento da normal atividade de vigilância nas portarias (antes e depois da transferência).
50)Os utentes (clientela do MTSSS nas portarias de receção e vigilância) mantêm-se e não denotaram qualquer diferença na continuidade do serviço.
51)A recorrente agiu com a falta de cuidado para garantir aos trabalhadores os mesmos direitos que tinham no âmbito do contrato com o empregador anterior e de cumprir as formalidades exigidas na lei.
52)A empresa F… não aceitou fazer uma transferência de serviço para a recorrente;
53)A prestação do serviço em causa implicou a colocação de cerca de 200 vigilantes;
54)Durante a fase anterior à assinatura do contrato, o Ministério do Trabalho, através de vários representantes e em reuniões com os representantes da recorrente, por diversas vezes, solicitou que esta empresa aceitasse a existência de transmissão da posição de empregador dos trabalhadores que prestavam serviço nos postos onde seria prestado o serviço de vigilância;
55)Os contratos de prestação de serviços de vigilância com as várias entidades integrantes do Ministério do Trabalho, apesar de concluído o concurso público há algum tempo, foram assinados nos dias 29 de novembro de 2019 [ao final do dia] e no dia 30 de novembro de 2019;
56)Estes contratos abrangiam mais de 100 postos de prestação de serviço de vigilância situados na zona norte e centro [entre Bragança e Caldas da Rainha e Castelo Branco];
57)Para exercer serviços de vigilância, a recorrente dispõe de um diretor de operações, licenças, alvarás e seguros;
58)Para os respetivos serviços, a recorrente equipou os vigilantes com equipamentos, como bastão eletrónico e chip para execução das rondas e rádios, que não recebeu da empresa F….
2. Factos não provados:
1) A senhora Ministra do Trabalho, perante a recusa da recorrente em aceitar a transmissão da posição contratual de empregadora dos trabalhadores, iniciou uma perseguição da recorrente, ordenando à Autoridade para as Condições do Trabalho a realização das visitas inspetivas documentadas nos autos;
2) A recorrente pretendia prestar o serviço com os seus próprios trabalhadores; e
3) Quando se apresentou a concurso, a recorrente desconhecia os vínculos e as remunerações que os trabalhadores da empresa F… tinham.”.
*
B) O DIREITO
Aplica-se, ao caso, o regime processual das contra-ordenações laborais e de segurança social aprovado pela Lei nº 107/2009 (diploma a que pertencerão os artigos a seguir referidos sem outra menção de origem) e, por determinação do art. 60º, subsidiariamente, desde que o contrário dela não resulte, “…, com as devidas adaptações, os preceitos reguladores do processo de contra-ordenação previstos no regime geral das contra-ordenações.”, ou seja, no Decreto-Lei nº 433/82, de 27 de Outubro, com as alterações introduzidas pelos Decretos-Lei nº 356/89, de 17 de Outubro e nº 244/95, de 14 de Setembro, e pela Lei n.º 109/2001, de 24 de Dezembro.
Dispõe o art. 51º, sob a epígrafe, “Âmbito e efeitos do recurso”, que:
“1 – Se o contrário não resultar da presente lei, a segunda instância apenas conhece da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões.”.
Regra que acolhe o princípio já enunciado naquele Decreto-Lei nº 433/82, (RGCO), nomeadamente, no nº1 do seu art. 75º que, com redacção semelhante àquele, dispõe: “Se o contrário não resultar deste diploma, a 2ª instância apenas conhecerá da matéria de direito, não cabendo recurso das suas decisões”.
Decorre, assim, da lei que, em sede de contra-ordenações laborais, a segunda instância, por regra, tem os seus poderes de cognição limitados à matéria de direito, estando excluída a sua intervenção em sede de decisão sobre a matéria de facto.
Ou seja, este Tribunal “ad quem” não pode conhecer de impugnação da decisão fáctica e das questões probatórias, (neste sentido Ac. RE de 6.1.2015, in www.dgsi.pt (local da internet onde estão disponíveis os demais acórdãos a seguir citados, sem outra indicação)).
Contudo, apesar da ligação, “por vezes umbilical”, (como refere, António Beça Pereira in “Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas”, 2017 – 12ª ed., pág.237) com a (re)apreciação da matéria de facto, aquela regra (de conhecimento, apenas, da matéria de facto) cede nos casos em que se verifique a existência de vícios no julgamento da matéria de facto previstos no art. 410º, nº 2, do Código de Processo Penal, (aplicável ao processo contra-ordenacional ex vi do artigo 41º daquele Decreto-Lei nº 433/82 de 27.10.) que dispõe:
Mesmo nos casos em que a lei restrinja a cognição do tribunal de recurso a matéria de direito, o recurso pode ter como fundamentos, desde que o vício resulte do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum:
a) A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada;
b) A contradição insanável da fundamentação ou entre a fundamentação e a decisão;
c) Erro notório na apreciação da prova.”.
Nestes casos, ainda que, oficiosamente, a Relação deverá deles conhecer, podendo e devendo alterar a matéria de facto, se dispuser de todos os elementos probatórios necessários para o efeito, ou se não dispuser desses elementos, reenviando os autos à 1ª instância, para sanação do vício de acordo com o art. 426º daquele CPP.
Transpondo o exposto para o caso, face à factualidade que foi dada como provada e não provada na decisão recorrida, passemos à apreciação das questões que vêm colocadas no presente recurso.
A sentença recorrida julgou improcedente a impugnação judicial deduzida e manteve a decisão administrativa, vindo agora a recorrente pugnar pela sua revogação, invocando, em síntese, que “inexiste qualquer indicação do raciocínio lógico em que a decisão recorrida assentou para efeito de dar como provada a infração, até porque aquilo a que chama factos provados são apenas quadros abstractos, genéricos, e não perceptiveis, ou conclusões e questões de direito, o que confunde com factos, pelo que inexiste fundamentação da decisão como a Lei exige, pelo que, a omissão do dever de fundamentar a decisão determina a sua nulidade, por violação do art. 374º do CPP, aplicável por remissão do art. 41º do RGCO ex vi art. 60º da Lei 107/2009” que, “O Tribunal a quo deveria ter declarado a nulidade da decisão administrativa por violação do dever de fundamentação legalmente exigível, conforme disposto no art. 374º do CPP, aplicável por remissão do art. 41º do RGCO ex vi art. 60º da Lei 107/2009”, porque considera que, “Competia à entidade administrativa pronunciar-se sobre a inconstitucionalidade invocada em sede de defesa escrita, por força da aplicação subsidiária da alínea c) do nº 1 do artigo 379º do Código de Processo Penal, ex vi artigo 41º do RGCO, e art. 60º da Lei 107/2009, de 14.09, por se tratar de matéria fundamental e obrigatória a luz das referidas disposições legais, aplicáveis à mesma, padecendo de nulidade a decisão administrativa;”, e que, “A sentença recorrida ao manter a decisão administrativa e consequentemente declarar a existência da transmissão de unidade económica nos presentes autos não decidiu bem, impondo-se a sua revogação e ou alteração/substituição por outra decisão que declare a inexistência de transmissão de estabelecimento ou unidade económica nos presentes autos;” pelo que, conclui que, “ O Tribunal recorrido violou o disposto no artigo 285º e seguintes do Código do Trabalho, o disposto na alínea c) do n 3 do artigo 374º do Cód. Proc. Penal, aplicável ex vi art. 41º RGCO, aplicável ex vi art. 60º Lei 107/2009, o art. 25 da Lei 107/2009, de 14.05, os artigos 20º, 110º, 111º, 203º, 205º, n.º 2, 209º da CRP, art. 126º da Lei de Organização e Funcionamento dos Tribunais, aprovada pela Lei 62/2013, de 26.08., bem como violou a Lei da Segurança Privada e sua regulamentação, designadamente o disposto no art. 1º, 4º, 7º, nº 3, al. b), art. 14º, art. 47º, n.º 3, c), art. 20º, art. 14º e seguintes, art. 30º, n.º 1, art. 47º, 2, e), f), art. 48º, 2, d), art. 49º, 2, c), 57º, 59º, da Lei 34/2013, de 16.05, Portaria 273/2013, de 20.08, o disposto nas cláusulas 17ª e 18ª do Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a Associação Nacional das Empresas de Segurança - AESIRF e a ASSP – Associação Sindical da Segurança Privada acima identificado, e ainda o disposto no art. 7º, nº 3 do Código Civil”, terminando que, “Caso assim, não assim não se entenda, requer a aplicação da coima reduzida ao mínimo legal”.
Ora, pese embora a síntese que antecede, que a recorrente formulou nas suas conclusões, sempre com o devido respeito, por diversa opinião, analisando o caso, o que se verifica e, no essencial, das conclusões da recorrente decorre é que a sua pretensão se resume a que seja revogada a decisão recorrida, por não se conformar de nela se ter julgado improcedente o recurso judicial que interpôs da decisão administrativa como, desde logo, se retira do seu requerimento de interposição de recurso, fazendo-o, em nosso entender, através da invocação de argumentos que denotam, evidente, confusão entre, alegados, vícios da sentença e o que, eventualmente, poderá configurar irregularidades ou erro de julgamento sendo que, sem esforço, é possível, verificar que a mesma assenta a sua discordância, na alegação da sentença padecer de nulidade decorrente de ter mantido a decisão administrativa que, considera, enferma das nulidades que enuncia.
No entanto, desde já, podemos adiantar que, em nosso entender, a sentença recorrida não padece de qualquer vício gerador da sua nulidade, (decorrente de ter mantido a decisão administrativa a quem, a recorrente imputa vícios geradores de nulidade), nem de qualquer interpretação incorrecta ou indevida, quer dos factos ou da lei, susceptível de determinar a sua revogação.
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Previamente a prosseguirmos, de modo a enquadrarmos, adequadamente, o nosso entendimento face às questões suscitadas e a apreciar, afigura-se-nos oportuno tecer algumas considerações sobre os regimes que resultam por um lado, do referido RPCOL (bem como do RGCO) e por outro, do Código Processo Penal (CPP) e do Código Penal (CP) o que, sempre com o devido respeito, consideramos a recorrente não teve em conta, nas questões que coloca, ou seja, as diferenças existentes entre ambos os regimes.
Desde logo, verifica-se clara autonomia entre o direito de mera ordenação social e o direito penal, seja numa perspectiva da censura ético-penal, seja mesmo do bem jurídico protegido, mais precisamente da sua existência ou inexistência, a que se segue a gravidade das reacções sancionadoras, através da aplicação de uma coima ou diversamente de uma pena (incluindo de prisão) e por último, a natureza distinta dos órgãos que são competentes para proferir a decisão, autoridades administrativas num caso e, no outro, os tribunais.
O Supremo Tribunal de Justiça desde há muito que dá conta e reafirma essa mesma autonomia, (cfr. o Assento 1/2003, de 28 de Nov. 2002, sem prejuízo, diga-se, de ter optado pela aplicação subsidiária do Código Penal ao RGCO nos casos dos limites do prazo de prescrição (Acórdão 6/2001), nas situações que levam à sua suspensão (Acórdão n.º 2/2002) ou quanto à aplicação da lei que em concreto se mostre mais favorável ao arguido (Ac. 11/2005), da qual, do mesmo modo, faz eco o Tribunal Constitucional, afirmando a “diferente natureza do ilícito, da censura e das sanções” entre o ilícito contra-ordenacional e o ilícito penal, considerando que os princípios e as regras do direito penal não se aplicam automaticamente ao direito de mera ordenação social (cfr. Acs. 537/2011 e 85/2012).
É, assim, dentro deste enquadramento que devem ser analisadas as questões colocadas pela recorrente, ainda que, neste âmbito, se tenha de reconhecer que no RPCOL se consagram fases processuais distintas, assim uma de incidência administrativa em que se insere a decisão administrativa (art. 25º) e outra de incidência judicial (art.s 32º e ss), à semelhança do que resulta do RGCO, o que justifica que seja referenciado o processo como tendo uma natureza mista, face a tal distinção estabelecida pelo legislador, sujeitando-se a primeira dessas fases, em tudo o que não contenha disposição especial, aos princípios fundamentais de direito e ao processo administrativo e a segunda, por sua vez, aos princípios processuais penais e ao correspondente procedimento, (cfr. Ac. TC 62/2003).
Daí que tenhamos também de reconhecer, até por decorrência da autonomia a que se aludiu, como já supra referimos, que a aplicação do processo penal apenas ocorrerá nos casos em que o RGCO não seja bastante, pois que é para esse, de acordo como o art. 60º do RPCOL, que primeiramente se remete subsidiariamente.
Assim, a respeito da necessidade de fundamentação da decisão administrativa, imposta pela própria Constituição (art. 268º, nº 3) e plasmada em lei ordinária no art. 153º do Código de Procedimento Administrativo, como decorre do seu nº 1, que dispõe “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem, neste caso, parte integrante do respetivo ato”, indica-nos o art. 25º do RPCOL quais são os elementos que devem constar de uma decisão condenatória, proferida pela autoridade administrativa, em particular no seu nº 1, “A identificação dos arguidos [a)]; A descrição dos factos imputados, com a indicação das provas [b)]; A indicação das normas puníveis e a fundamentação da decisão [c)]; A coima e das sanções acessórias aplicadas [d)]”.
Do mesmo modo, agora a respeito dos vícios da decisão administrativa, teremos também que distinguir, no âmbito do processo de contra-ordenação, as decisões administrativas das decisões judiciais, sem embargo de se reconhecer que o RPCOL e o RGCO (para onde aquele remete) não estabelecem qualquer disciplina para a infracção ou inexecução dos actos processuais contra-ordenacionais, mas impondo-se sempre a sua sujeição ao princípio da legalidade (cfr. art. 43º do segundo, “ex vi” do art. 60º do primeiro), que de resto tem justificado a afirmação de que tanto o seu procedimento como os seus vícios devem resultar da lei, incluindo a transposição para a sua regulação do princípio da legalidade dos actos processuais e da tipicidade dos seus vícios que se encontra consagrado no artigo 118º do CPP, que dispõe: “1 - “A violação ou inobservância das leis do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei. 2 - Nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular”.
Ora, na medida em que as normas do processo penal apenas são chamadas subsidiariamente e mesmo assim em segunda linha (art. 60º), significando que aquelas nem sequer são preponderantes, conhecendo-se a divergência jurisprudencial sobre a transposição ou não para a decisão administrativa do enquadramento legal que o processo penal dá para as sentenças, importa então afirmar a existência de sérios obstáculos decorrentes precisamente da razão de ser do processo de contra-ordenação e da sua autonomia, como ainda do próprio enquadramento da decisão administrativa, que nos afastam do vício da nulidade, pois que, a exigir-se aqui a obrigatoriedade de serem observados e nos mesmíssimos termos os princípios e o regime legal do processo penal, tal se traduziria em transformar um regime subsidiário e auxiliar num regime predominante ou primordial, contrariando assim, afinal, a filosofia daquele e os propósitos legislativos, (cfr. Ac.s TC 469/97; 278/99 e 522/2008).
Assim, o RPCOL e o RGCO, face à sua autonomia, possibilitam a existência de desvios nos níveis de asseguramento das garantias de defesa, sendo que, a propósito do regime estabelecido no CPP para a acusação (art. 283º), tendo designadamente em conta que toda a interpretação legislativa deve preservar a integridade do Direito e a unidade do sistema jurídico (art. 9º, nº 1, do Código Civil), não se perceberia, desde logo, como é que uma decisão administrativa pudesse por um lado equivaler a uma acusação, nos termos previstos no art. 37º – “O Ministério Público torna sempre presentes os autos ao juiz, com indicação dos respectivos elementos de prova, valendo este acto como acusação” e por outro a uma sentença.
Deste modo, a fundamentação propriamente dita de uma decisão da autoridade administrativa em processo de contra-ordenação laboral passa essencialmente, atento os princípios fundamentais do direito administrativo, pela sua suficiência, clareza e congruência, podendo pois dizer-se que a exigência legal contida no art. 25º do RPCOL, apenas, impõe que a decisão condenatória obedeça aos requisitos aí descritos, não estabelecendo, desde logo, quaisquer outros requisitos de forma. Assim, atenta a autonomia do processo contra-ordenacional, não tem desde logo fundamento a importação para as decisões administrativas das imposições formais a que estão sujeitas as sentenças (art. 374º e 375º do CPP). Ou seja, o que se impõe é que a fundamentação, de facto e de direito, ainda que sucinta ou por remissão para todos os factos do processo contra-ordenacional, transcreva a respectiva factualidade, indique as normas jurídicas violadas e a coima aplicada, possibilitando, deste modo, um conhecimento perfeito dos factos e das normas imputadas.
Ainda, na consideração da diferença de regimes a que nos vimos referindo, há que salientar, quanto à sentença proferida em sede de impugnação judicial da decisão da autoridade administrativa, de ter presente que existe norma expressa no RPCOL, assim no nº 4 do seu art. 39º, devendo pois ter-se por afastado o que resultar em contrário do regime subsidiário para o qual ocorra remissão, incluindo pois também o CPP, no que aqui importa, dispõe que: “O juiz fundamenta a sua decisão, tanto no que respeita aos factos como no que respeita ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção, podendo basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa”, prescrevendo no nº 5, para os casos de absolvição que, “o juiz indica porque não considera provados os factos ou porque não constituem uma contra-ordenação”.
Ou seja, mesmo quanto aos factos que considere ou não provados, o que resulta da citada norma é sem dúvidas uma exigência de fundamentação menos intensa, podendo mesmo essa “basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa.”
Enquadrada genericamente a apreciação, passemos então, à análise das questões levantadas pela recorrente, apenas, relacionadas com a decisão do Tribunal “a quo”, ou seja, jurisdicional.
Nas suas alegações e conclusões a recorrente invoca que a sentença recorrida padece de vários vícios e, invocando o enquadramento legal, supra transcrito, considera-os e qualifica-os como causas de nulidade daquela.
No entanto, sem razão, como já referimos.
Justificando.
Dispõe o Código de Processo Penal, sobre a nulidade da sentença, no art. 379º, (aplicável ao processo contra-ordenacional ex vi art. 41º do RGCO) que, “1 - É nula a sentença:
a) Que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º ou, em processo sumário ou abreviado, não contiver a decisão condenatória ou absolutória ou as menções referidas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 389.º-A e 391.º-F;
b) Que condenar por factos diversos dos descritos na acusação ou na pronúncia, se a houver, fora dos casos e das condições previstos nos artigos 358.º e 359.º;
c) Quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento.
(…)”.
E, o art. 374º, sob a epígrafe “Requisitos da sentença”, dispõe que, “1 - A sentença começa por um relatório, que contém:
a) As indicações tendentes à identificação do arguido;
b) As indicações tendentes à identificação do assistente e das partes civis;
c) A indicação do crime ou dos crimes imputados ao arguido, segundo a acusação, ou pronúncia, se a tiver havido;
d) A indicação sumária das conclusões contidas na contestação, se tiver sido apresentada.
2 - Ao relatório segue-se a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal.
3 - A sentença termina pelo dispositivo que contém:
a) As disposições legais aplicáveis;
b) A decisão condenatória ou absolutória;
c) A indicação do destino a dar a coisas ou objetos relacionados com o crime, com expressa menção das disposições legais aplicadas;
d) A ordem de remessa de boletins ao registo criminal;
e) A data e as assinaturas dos membros do tribunal.
4 - A sentença observa o disposto neste Código e no Regulamento das Custas Processuais em matéria de custas.”.
Ora, analisados, estes dispositivos e a decisão recorrida é manifesto que a mesma não enferma de qualquer das causas de nulidade previstas no referido art. 379º, em concreto, a enunciada na al. c), do nº 1, uma vez que se encontra devidamente fundamentada, em concreto, nos termos enunciados, no nº 2, do art. 374º, mesmo que, no caso, fosse exigível a obrigatoriedade de serem observados e nos mesmíssimos termos os princípios e o regime legal do processo penal, quando é sabido que este aqui, apenas, é subsidiariamente chamado, cfr. art. 60º.
E, sabido que, a fundamentação propriamente dita de uma decisão da autoridade administrativa em processo de contra-ordenação laboral passa, essencialmente, atento os princípios fundamentais do direito administrativo, pela sua suficiência, clareza e congruência, podendo dizer-se que a exigência legal contida no art. 25º, apenas, impõe que a decisão condenatória obedeça aos requisitos aí descritos, não estabelecendo, desde logo, quaisquer outros requisitos de forma e, em concreto, no caso da decisão recorrida, nos termos prescritos no art. 39º.
Assim, atenta a autonomia do processo contra-ordenacional, não tem, desde logo, fundamento a importação para as decisões administrativas, das imposições formais a que estão sujeitas as sentenças, cfr. art.s 374º e 375º CPP. Ou seja, o que se impõe é que a fundamentação, de facto e de direito, ainda que sucinta ou por remissão para todos os factos do processo contra-ordenacional, transcreva a respectiva factualidade, indique as normas jurídicas violadas e a coima aplicada, possibilitando, deste modo, um conhecimento perfeito dos factos e das normas imputadas.
E, transpondo tais afirmações para as decisões que em sede judicial se debrucem sobre impugnação daquelas decisões administrativas, atenta a existência daquela norma, expressa no RPCOL, art. 39º, que dispõe sobre a “decisão judicial” deverá, também, quanto a estas ter-se por afastado o que resultar em contrário do regime subsidiário para o qual ocorra remissão, incluindo pois também o CPP, importando, ter em conta, em concreto, o nº 4, daquele que dispõe: “O juiz fundamenta a sua decisão, tanto no que respeita aos factos como no que respeita ao direito aplicado e às circunstâncias que determinaram a medida da sanção, podendo basear-se em mera declaração de concordância com a decisão condenatória da autoridade administrativa”.
Ora, sendo deste modo, analisada a decisão recorrida, é manifesto que a mesma se encontra devidamente fundamentada, o mesmo ocorrendo quanto à decisão administrativa, não se compreendendo, sempre com o devido respeito, os argumentos da recorrente que sintetiza nas conclusões da sua alegação que, supra transcrevemos.
Nela, em sede de fundamentação, o Tribunal “a quo” elencou os factos provados e os factos não provados, motivou esta decisão, de seguida procedeu ao enquadramento jurídico, concluindo com a decisão, não se vislumbrando a ocorrência de qualquer omissão de pronúncia ou de dever de fundamentação.
No fundo, como já referimos, salvaguardando sempre o devido respeito, os argumentos invocados pela recorrente, alegadamente, causa de nulidade da sentença, não passam de confusão com alegação de, eventuais, erros de julgamento e, essencialmente, também diferente convicção e valoração em relação às provas produzidas nos autos, aos factos provados e sua subsunção ao direito.
Pois, sem dúvida, cremos nós que a decisão recorrida não padece de qualquer vício ou omissão, nem a alegada inexistência de “qualquer indicação do raciocínio lógico” em que assentou, ao contrário do que o considera a recorrente, são causa de nulidade da mesma. Ou é nula por, manter a decisão administrativa, alegadamente, nula também, porque, atentos os argumentos invocados pela recorrente, tal não ocorre. Cremos que, tal como aconteceu com a decisão administrativa, a decisão recorrida, mais não é que uma decisão diferente da por si almejada, razão porque, como a própria considera “não decidiu bem, impondo-se a sua revogação”.
Mas, não é assim.
Temos por seguro que, a decisão recorrida não enferma de qualquer das causas de nulidade previstas no art. 379º do CPP, nem em concreto, das invocadas pela recorrente.
Até porque, como se lê no (Ac. TRG de 07.04.2016), “As nulidades não existem “a la carte”, consoante a conveniência de quem as invoca; pelo contrário, a regra é existirem apenas nas situações previstas na lei (art. 118º, nº 1 e 2 do CPP: 1 – A violação ou a inobservância das disposições da lei do processo penal só determina a nulidade do acto quando esta for expressamente cominada na lei. 2 – Nos casos em que a lei não cominar a nulidade, o acto ilegal é irregular.)”.
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Senão, vejamos.
Quanto à arguida nulidade decorrente de omissão de pronúncia.
Se bem o entendemos, ao contrário do que diz o Ex.mo Procurador, a recorrente, nos termos que constam nas suas alegações e sintetiza, nas conclusões 17ª a 25ª, imputa à decisão recorrida um concreto vício processual, seja, a nulidade da mesma por omissão de pronúncia.
Não significando isso, sempre com o devido respeito, que lhe assista razão.
Apreciando a decisão recorrida, é manifesto que o Tribunal “a quo”, não deixou de apreciar e se pronunciar quanto a nenhuma das questões que lhe foram postas, em particular, sobre o vício de inconstitucionalidade invocado, apenas, não a julgou e deferiu, nos termos pretendidos pela impugnante, como bem se verifica do seguinte, que se transcreve: «Refere ainda a recorrente que a decisão administrativa é nula por não ter decidido a questão de inconstitucionalidade invocada. Da norma em causa não resulta uma obrigação de tomada de posição sobre todas as questões suscitadas, mas sempre se diga que, na realidade, não está invocada qualquer inconstitucionalidade propriamente dita. Uma questão de inconstitucionalidade traduz-se na invocação de desconformidade de uma norma de valor não constituicional com uma norma ou um princípio constitucional e, na realidade, a recorrente não invoca a inconstitucionalidade de qualquer norma, não havendo uma questão de inconstitucionalidade a conhecer. Acresce que consideramos que não existe qualquer nulidade por não constarem factos não provados, nem se referirem na decisão administrativa os factos alegados pela recorrente, porque a maioria desses factos são irrelevantes para a decisão, ou seja, é indiferente saber quais as vicissitudes do procedimento concursal, pois não existe qualquer inspeção por a recorrente não ter, nos dias da inspeção, todas as formalidades laborais cumpridas [por exemplo, afixação de horários de trabalho, etc…]. Para este tipo de infrações, aceitamos que a alegação invocada, a existência de atrasos na adjudicação, a sua motivação determinada por pressões políticas ou de outra natureza, podiam ser relevantes, mas não é isso que está em causa, mas antes a existência de diversidade de entendimentos entre o cliente [Ministério do Trabalho], a entidade fiscalizadora e a recorrente, sobre a aplicação de um instituto jurídico e, para o conhecimento desta questão, os factos alegados não assumem relevância. É certo que alguns dos factos podiam ser relevantes para a segunda infração, designadamente para saber se a recorrente teve possibilidade de cumprimento daquelas formalidades, mas mesmo nessa matéria, consideramos que existe irrelevância da factualidade, porque a recorrente deixou claro e comunicou a sua posição de não aceitação do instituto da transmissão.
Em suma, consideramos que não existe nulidade da decisão administrativa.
1.2 Em segundo lugar, entende a recorrente que a atuação da Ministra do Trabalho, forçando a recorrente a aceitar uma situação de facto, viola o princípio da separação de poderes, constitui um abuso de poder, cabendo apenas aos tribunais considerar se existe transmissão de estabelecimento.
Em nosso entendimento, esta questão é irrelevante para se aferir se a recorrente incorreu ou não numa infração, ou melhor, nas infrações que lhe estão imputadas.
Não é relevante saber se existiam pressões ou não do cliente para a recorrente fazer as coisas de determinada forma, se existem ou não instruções para a fiscalização, pois o que é relevante é saber se a recorrente praticou as infrações e se a entidade fiscalizadora entende que os factos em causa, que se passam, inclusivamente e em parte, nas suas próprias instalações, integram uma infração, tem o dever de agir, fiscalizando e instaurando procedimento contraordenacional, independentemente de existirem motivações externas para essa ação [designadamente a pressão da comunicação social, de partidos políticos ou de outras].
Para além disso, consideramos que o que aconteceu foi ter havido movimentações das entidades representativas dos trabalhadores e de partidos políticos que fizeram com que a situação assumisse uma repercussão público e essa circunstância, colocando a questão na agenda política, leva a que as autoridades tenham necessidade de atuar, no caso, fiscalizando, mas não deixam de estar a cumprir a sua função, não se podendo falar de perseguição, nem se pode considerar que existe abuso de poder, ou que esta atuação, que em si é lícita, tem algum efeito na validade do procedimento contraordenacional.».
Dispondo o referido art. 379º, nº 1, al. c), que "É nula a sentença quando o tribunal deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento", é evidente que a sentença recorrida não padece da alegada omissão de pronúncia.
Como decorre paralelamente do disposto no art. 615º, nº 1, al. d) do CPC, onde se lê que, a sentença é nula “quando o juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar ou conheça de questões de que não podia tomar conhecimento”. O que está em causa nesta norma, é a omissão de pronúncia quanto às questões submetidas pelas partes ao Tribunal, o que não ocorreu, seguramente, no caso.
Improcede, assim, esta questão da apelação.
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Passemos, agora, à análise da questão da invocada inexistência da fundamentação que motiva a decisão administrativa.
Alega e defende a recorrente, nos termos que sintetiza nas conclusões 1ª a 10ª, que, a decisão administrativa é nula por violação do art. 25º da Lei 107/2009 e violação do disposto no art. 374º do CPP, razão pela qual “entende que a decisão recorrida deve ser revogada ou alterada no sentido de se passar a declarar tal nulidade e ou analisar a mesma, com as devidas consequências legais, como se requereu”.
A este propósito, lê-se na decisão recorrida o seguinte: «1.1 A primeira questão prende-se com a nulidade da decisão administrativa, defendendo a recorrente que a decisão administrativa é nula, porque não segue um raciocínio lógico e racional, é incompreensível, não indica o raciocínio lógico em que assentou para dar como provada a infração, considerando provadas afirmações vagas e genéricas, não permitindo entender o seu conteúdo, havendo ainda uma omissão de pronúncia quanto ao conhecimento da questão da inconstitucionalidade invocada.
Nos termos do artigo 25.º, n.º 1 e n.º 5, da Lei n.º 107/2009, de 14 de setembro, a decisão que aplica a coima e ou as sanções acessórias contém: a) A identificação dos sujeitos responsáveis pela infracção; b) A descrição dos factos imputados, com indicação das provas obtidas; c) A indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão; d) A coima e as sanções acessórias.
Em nosso entendimento, desta norma não resulta a exigência de qualquer análise crítica dos factos ou da prova, sendo que a fundamentação da decisão permite compreender perfeitamente a lógica que lhe está subjacente. Está em causa uma descrição factual que a entidade administrativa integra no conceito de transmissão de posição de empregador, mais concretamente no artigo 285.º, do Código do Trabalho, não havendo qualquer dúvida sobre a posição da entidade administrativa, apesar de se poder discordar da mesma.».
Ora, também, quanto a esta questão não cremos que assista razão à recorrente, nem fundamentos para que se altere a decisão recorrida.
A arguida, no essencial, defende que a decisão administrativa é nula porque omissa de fundamentação válida, em violação quer do disposto no nº 1 do artigo 25º da Lei nº 107/2009; quer do artigo 379º nº 1 alínea a) do Código de Processo Penal, com referência ao preceituado no nº 2 do artigo 374º do mesmo diploma (neste último caso, “ex vi” do disposto nos artigos 60º da Lei nº 107/2009 e 41º do Decreto-Lei nº 433/82).
Como já supra mencionámos, o artigo 25º da Lei nº 107/2009, de 14/09, relativo às especificidades da decisão administrativa condenatória dispõe, no seu nº 1 que tal decisão deve conter, entre outras menções, a indicação das normas segundo as quais se pune e a fundamentação da decisão.
Por outro lado, o artigo 379º do Código de Processo Penal, sob a epígrafe “Nulidades da sentença”, dispõe que:
1. É nula a sentença:
a) Que não contiver as menções referidas no n.º 2 e na alínea b) do n.º 3 do artigo 374.º ou, em processo sumário ou abreviado, não contiver a decisão condenatória ou absolutória ou as menções referidas nas alíneas a) a d) do n.º 1 do artigo 389.º-A e 391.º-F; (…)”.
Já o artigo 374º deste mesmo diploma, no seu nº 2 dispõe que a sentença deve conter “a fundamentação, que consta da enumeração dos factos provados e não provados, bem como de uma exposição tanto quanto possível completa, ainda que concisa, dos motivos, de facto e de direito, que fundamentam a decisão, com indicação e exame crítico das provas que serviram para formar a convicção do tribunal”.
Atento o que decorre destes dispositivos, não nos merece censura a decisão recorrida. Também, nós concordamos que na decisão final, a autoridade administrativa ao contrário do que sustenta a recorrente/Arguida, deu cumprimento ao disposto o artigo 25º da Lei nº 107/2009 e do mesmo modo, a referida decisão cumpriu também o preceituado nos artigos 374º nº 2 e 379º nº 1 alínea c) do Código de Processo Penal, apenas, não o fez no sentido defendido por aquela.
É certo que poderia aqui discutir-se se a decisão em causa procedeu a uma abordagem exaustiva e juridicamente válida da questão que lhe foi colocada, ou se, pelo contrário, se limitou a uma pronúncia breve e sintética sobre a mesma.
Contudo, independentemente da posição que adoptemos sobre tal matéria, a verdade é que a decisão existe e está fundamentada, pelo que sempre estaríamos perante uma questão situada no âmbito do mérito dessa mesma decisão e não perante uma nulidade processual por falta de fundamentação.
Razão porque, como se refere na decisão recorrida pode-se, eventualmente, “discordar da mesma”, mas não se pode imputar-se-lhe vícios de que não padece, nem revogar-se a decisão aqui impugnada, por desse modo o ter considerado.
Não esquecendo, que uma coisa é a nulidade decorrente da falta de fundamentação, outra bem diferente é a, eventual, insuficiência da fundamentação para decidir de mérito.
Acrescendo que, convém não esquecer a autonomia entre o RGCO e o regime processual penal, como bem se nota no (Ac. desta Relação, de 04.12.2013, Proc. nº 1080/12.1TBSJM.P1), onde se lê “A propósito convém recordar que a aplicação subsidiária do processo penal (41.º), apenas significa que o mesmo é auxiliar e não conformador ou dominante do processo contra-ordenacional, pelo que a respectiva regulação suplementar não é de aplicação automática e, sempre que se mostre necessário, está sujeita a adaptações. Tal não sucederá apenas quando o processo contra-ordenacional for convertido em processo penal (76.º) ou ocorrer o conhecimento da contra-ordenação em processo penal (77.º), pois nestes casos o regime das contra-ordenações é como que “consumido” “pelas regras mais exigentes consagradas no Código de Processo Penal” [Ac. TC 31/2000, fundamento 10, parte final].”.
Efectivamente, não podemos olvidar que estamos em face de um ilícito de mera ordenação social dotado de autonomia face ao ilícito penal propriamente dito, autonomia que o legislador instituiu no nosso ordenamento jurídico através do Dec. Lei nº 232/79, de 24 de Julho e não deixou de reafirmar com a introdução, naquele, do regime geral das contra-ordenações através do Dec.-Lei nº 433/82 de 27 de Outubro.
Na verdade, como é referido no preâmbulo deste diploma, o aparecimento do direito das contra-ordenações ficou a dever-se ao pendor crescentemente intervencionista do Estado contemporâneo, que vem progressivamente alargando a sua acção conformadora aos domínios da economia, saúde, educação, cultura, equilíbrios ecológicos, etc., afirmando-se de seguida uma necessidade de dar consistência prática às injunções normativas decorrentes deste novo e crescente intervencionismo do Estado, convertendo-as em regras efectivas de conduta com recurso a um quadro específico de sanções.
Reconhece-se, no entanto, que um tal desiderato se não pode alcançar alargando a intervenção do direito criminal, porquanto, isso significaria, para além de uma manifesta degradação do direito penal, com a consequente e irreparável perda da sua força de persuasão e prevenção, a impossibilidade de mobilizar preferencialmente os recursos disponíveis para as tarefas da prevenção e repressão da criminalidade mais grave e que de forma mais drástica põe em causa a segurança dos cidadãos, a integridade das suas vidas e bens e, de um modo geral, a sua qualidade de vida, para se concluir que o direito criminal deve ser apenas utilizado como a ultima ratio da política criminal, destinado a punir as ofensas intoleráveis aos valores ou interesses fundamentais à convivência humana, não sendo lícito recorrer a ele para sancionar infracções de não comprovada dignidade penal.
Ora, tal autonomia e pendor intervencionista do Estado a par da mencionada necessidade teve, desde logo, repercussões a nível processual, estabelecendo-se que o processo contra-ordenacional se inicia por uma fase administrativa da competência das autoridades administrativas a quem se atribuiu poderes para a aplicação de coimas, a que se pode seguir uma fase de controlo jurisdicional, mediante a possibilidade de impugnação judicial da decisão administrativa para o tribunal em cuja área se tenha consumado a infracção.
Não podendo esquecer-se, também, que à semelhança do que se estabelece no nº 1 do art. 62º do RGCO, se dispõe no art. 37º daquela Lei nº 107/2009, supra referida, que prevê o regime jurídico do procedimento aplicável às contra-ordenações laborais e de segurança social que: “O Ministério Público torna sempre presentes os autos ao juiz, com indicação dos respectivos elementos de prova, valendo este acto como acusação”. Decorrendo daqui, que qualquer omissão que, porventura, possa ocorrer no auto de notícia ou mesmo na decisão administrativa se torne irrelevante se os elementos visados constarem dos autos.
Donde, sempre com o devido respeito por diferente entendimento, como é o da recorrente, consideramos que se deve concluir não se justificar que sejam aplicáveis em processo contra-ordenacional todos os princípios que orientam o direito processual penal.
Em suma, atento o que se deixa exposto, revertendo ao caso, tal como foi decidido pela 1ª instância e, contrariamente, ao que considera a recorrente, sem que se mostre necessário discutir a dimensão da abordagem feita, verificamos que, a factualidade imputada à arguida e que foi dada como assente na decisão administrativa, (factualidade que é dada como provada na decisão, agora, recorrida e que supra transcrevemos) e consequente enquadramento jurídico, se mostra suficiente, para que a decisão administrativa e a decisão recorrida, não enfermem do vício que a recorrente lhes imputa, de falta de fundamentação.
Sem dúvida, a decisão administrativa, sendo que o argumento se aplica à decisão recorrida, existe e está fundamentada, pelo que sempre estaríamos perante uma questão situada no âmbito do mérito dessa mesma decisão e não perante uma nulidade processual por falta de fundamentação.
Improcede, também, assim, este aspecto da apelação, o qual nos leva de imediato, à análise da próxima questão colocada pela recorrente, que consiste em saber, se na decisão recorrida, como a mesma defende, foi efectuada uma errada interpretação e aplicação do direito.
Assenta a recorrente a sua discordância em relação àquela, com base nos argumentos que invoca nas suas alegações e conclusões, considerando que a decisão recorrida deve ser revogada por, no essencial, ter incorrido na violação do disposto no art. 285º, do CT.
Mas, sem razão.
Os argumentos que invoca não são susceptíveis de afastar os argumentos que, nos termos da decisão administrativa e confirmados na decisão recorrida, fundamentaram a aplicação da coima que vem impugnar, nem de demonstrar a violação de qualquer dispositivo legal.
Sem dúvida, podemos adiantar, desde já, analisadas as alegações e conclusões da recorrente, que não lhe assiste razão, como bem o considerou o Ministério Público, quer na 1ª instância quer nesta sede, afigurando-se-nos não merecer qualquer reparo ou censura o decidido na sentença recorrida, nem, na medida em que manteve a decisão administrativa, em concreto, quanto a ter decidido que ocorreu para a recorrente a transmissão da posição contratual de empregadora dos trabalhadores que laboravam ao serviço da “F…, S.A.”, nem quanto à questão de considerar que as regras relativas ao exercício de segurança privada não terem, no caso, a virtualidade de afastar a aplicação do instituto de transmissão da posição contratual de empregador e nem quanto à questão do montante da coima aplicada que considerou adequada, tendo em atenção a argumentação que naquela foi expendida, nos seguintes termos que, em síntese, se transcrevem: «1.3 A questão principal passa pela defesa da recorrente no sentido de que organizou logisticamente a sua prestação de serviços, nunca tendo adquirido ou recebido nenhum estabelecimento, não havendo uma unidade económica a transmitir, pois a atividade exige requisitos próprios, como um diretor de operações, alvará, licenças, seguros, não tendo os vigilantes que trabalhavam para a empresa anterior, só por si, o conhecimento e a capacidade financeira exigida para o efeito, não podendo, sozinhos, exercer a atividade.
Desta forma, a questão principal que se coloca nos presentes autos é a de saber se, havendo sucessão de empresas fornecedoras de um serviço de vigilância privada, por força de um novo procedimento concursal, no caso público, mas que pode igualmente ser privado, a posição contratual de empregador relativa aos trabalhadores que prestam serviço no posto de trabalho em causa se transfere para a empresa que recebe a nova adjudicação do serviço.
O artigo 285.º, n.º 1, do Código do Trabalho, insere-se no Capítulo V, dirigido às Vicissitudes do Contrato de Trabalho, Secção I, referente à Transmissão de Empresa ou Estabelecimento, estabelecendo a transmissão para o adquirente da posição de empregador dos trabalhadores de uma empresa, estabelecimento ou parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, caso ocorra uma transmissão, a qualquer título, da sua titularidade. A unidade económica é o conjunto de meios organizados que constítua uma unidade produtiva, com autonomia técnico-organizativa e identidade própria, destinada ao exercício de uma atividade económica, principal ou acessória [n.º 5]. A norma referida teve alterações recentes por força da Lei n.º 14/2018, de 19 de março, designadamente num aspeto relevante, para efeitos da nossa questão, que se prende com o conceito de unidade económica, pois na versão original do Código do Trabalho, a unidade económica integrava apenas o conjunto de meios organizados com o objetivo de exercer uma atividade económica, principal ou acessória. Se esta é a previsão normativa, a estatuição consta do n.º 3 que determina que os trabalhadores transmitidos ao adquirente mantêm todos os direitos contratuais e adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional e conteúdo funcional e benefícios sociais adquiridos. Estamos, precisamente, perante uma norma que visa a tutela dos direitos dos trabalhadores, protegendo-os de uma situação de alteração da entidade exploradora da empresa, estabelecimento ou unidade económica e evitando que, estas vicissitudes, possam conduzir a uma situação de desemprego.
(...).
Na situação que se nos apresenta, não existe propriamente uma empresa ou estabelecimento transmitido, importando saber se, um conjunto de postos de trabalho que se dividem por variadas entidades públicas integrantes dos serviços do Ministério do Trabalho, pode ser considerado, à luz do direito comunitário e do artigo 285.º, n.º 1 e n.º 5, do Código do Trabalho, uma parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica. Logo, a primeira questão reconduz-se a delimitar as situações em que estamos perante uma unidade económica.
A questão está, parcialmente, facilitada com a entrada em vigor do contrato coletivo celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e a Federação dos sindicatos da Indústria e Serviços - FETESE e outro [BTE n.º 48, de 29 de dezembro, sendo a versão mais atual a constante do BTE n.º 22/2020], pois a Cláusula 14.ª, com a Epígrafe «Sucessão do posto de trabalho», estabelece, no seu n.º 1, que «A presente cláusula regula a manutenção dos contratos individuais de trabalho em situações de sucessão de empregadores na execução de contratos de prestação de serviços de segurança privada, (...) - Esta formulação normativa, consta ainda no contrato coletivo celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e outra e o Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas – STAD [BTE n.º 22/2020].
Contudo, a recorrente não será associada da AES - Associação de Empresas de Segurança, mas antes da Associação Nacional das Empresas de Segurança – AESIRF, sendo que Contrato coletivo celebrado entre a Associação Nacional das Empresas de Segurança - AESIRF e a ASSP - Associação Sindical da Segurança Privada [BTE n.º 26/2019], contém uma Cláusula, n.º 14.ª, com a Epígrafe «Transmissão de estabelecimento, que reza o seguinte:
1- Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores.
(...)
Na realidade, esta Cláusula, tem um conteúdo semelhante à Cláusula 14.ª, anteriormente vigente entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e a Federação dos sindicatos da Indústria e Serviços - FETESE e outro [BTE n.º 38/2017], com a diferença de que não havia uma remissão para as regras do Código do Trabalho, estabelecendo o seguinte:
1- Em caso de transmissão, por qualquer título, da titularidade de empresa, ou estabelecimento ou ainda de parte de empresa ou estabelecimento que constitua uma unidade económica, transmitem-se para o adquirente a posição do empregador nos contratos de trabalho dos respetivos trabalhadores.
(...)
Nesta sede, António Gonçalves Rocha refere que para definir o que se deve entender por parte de empresa ou estabelecimento (...) [“Transmissão de Estabelecimento Manutenção dos Contratos de Trabalho, Caderno do CEJ “Transmissão de Estabelecimento”, de 2014, disponível em http://www.cej.mj.pt/, página 34]. Na base da norma nacional está, de facto, o conceito de entidade económica resultante da Diretiva. O artigo 1.º, alínea b), da Diretiva, refere que «é considerada transferência, na acepção da presente directiva, a transferência de uma entidade económica que mantém a sua identidade, entendida como um conjunto de meios organizados, com o objectivo de prosseguir uma actividade económica, seja ela essencial ou acessória». Por isso, na sequência da alteração operada pela Lei n.º 14/2018, de 19 de Março, Júlio Gomes, distinguindo o conceito de entidade económica e de unidade económica, salienta que (...). Em suma, autonomia e identidade da unidade económica não se confundem e o que se exige para que se possa falar em transmissão é que a unidade económica mantenha a sua identidade, podendo conservar, ou não, a sua autonomia” [Algumas Reflexões Críticas sobre a Lei nº 14/2018 de 19 de março, Prontuário de Direito do Trabalho, 1º semestre de 2018, nº 1, Centro de Estudos Judiciários, páginas 89 e 90]. Na realidade, a referência a uma autonomia técnico-organizativa, presente no artigo 285.º, n.º 5, do Código do Trabalho, não é evidente na norma comunitária que prefere falar em “meios organizados”, realçando a ideia, intensamente trabalhada na jurisprudência comunitária, de identidade económica. David Carvalho Martins sintetiza os requisitos resultantes das alterações efetuadas, (...).” [Novo Regime da Transmissão de Unidade Económica: Algumas Notas, Prontuário de Direito do Trabalho, 1º semestre de 2018, nº 1, Centro de Estudos Judiciários, páginas 122 a 125]. De outra forma, Pedro Romano Martínez e Pedro Madeira de Brito defendem que (...)” [O Novo Regime da Transmissão da Unidade Económica Introduzido pela Lei n.º 14/2018, de 19 de março, Revista de Direito e de Estudos Sociais, Ano LIX, janeiro-dezembro 2018, Almedina, página 29]. (...).
Para facilitar a identificação das situações em que se deve considerar existir uma transferência de entidade económica, a jurisprudência comunitária [por exemplo: acórdão Securitas – C-200/16 –, Aira Pascoal – C-509/14 e Algeposa Terminales Ferroviarios – ECLI:EU:C:2015:781] considera que é necessário levar em consideração todas as circunstâncias de facto que caracterizam a operação em causa, que devem ser objeto de uma avaliação global ou conjunta e não isolada, entre as quais figuram, designadamente os seguintes:
1. o tipo de empresa ou de estabelecimento de que se trata;
2. a transferência ou não de elementos corpóreos, como os edifícios e os bens móveis;
3. o valor dos elementos incorpóreos no momento da transferência;
4. a integração ou não do essencial dos efetivos pelo novo empresário;
5. a transferência ou não da clientela;
6. o grau de semelhança das atividades exercidas antes e depois da transferência; e
7. a duração da eventual suspensão destas atividades.
Antes de passarmos à avaliação global tendo em conta a situação concreta, é necessário ter em conta que a jurisprudência vem analisando situações semelhantes à que se nos apresenta e, por isso, consideramos pertinente fazer uma breve resenha de decisões dos Tribunais Superiores que incidiram sobre situações de sucessão de empresas de vigilância privada.
Assim: Acórdão da Relação de Évora de 28 de janeiro de 2021 [relator: Moisés Silva], numa situação semelhante à descrita nos autos, considerou que «os serviços de segurança prestados a um estabelecimento de saúde, no quadro de um modelo de organização próprio, regras próprias de funcionamento, dentro de uma unidade de saúde, constitui unidade económica, para efeitos da sua transmissão nos termos do art.º 285.º do CT», sendo que «a sucessão de empresas de segurança na prestação de serviços de segurança, no contexto referido em i), acompanhada de equipamento essencial e alguns trabalhadores da empresa anterior, constitui transferência de estabelecimento para efeitos do disposto no art.º 285.º do CT»;
Acórdão da Relação do Porto de 22 de março de 2021 [relatora: Paula Leal de Carvalho]: considerou que «os conceitos de unidade económica e de transmissão da mesma não se reconduzem apenas ao exercício da actividade, nem à continuação dessa actividade, antes exigindo também a existência de um conjunto de meios organizados, materiais e/ou humanos, para tal e que sejam transferidos para o novo adjudicatário», realçando precisamente que, apesar da atividade de vigilância privada ser uma atividade assente na mão-de-obra, tem especificidades próprias;
Acórdão da Relação do Porto de 21 de outubro de 2020 [relator: Nélson Fernandes]: tratava-se de um serviço que consistia na vigilância através de câmaras de videovigilância, controlo de acessos, rondas, deteção e registo de incidentes, controlo do alarme de deteção de incêndios, atendimento telefónico, prestação de informações e ronda às instalações, com utilização de equipamento pertencente ao cliente que, a dada altura, adjudicou o serviço a outra empresa que recusou aceitar os trabalhadores da primeira, porque considerava não existir transmissão da posição de empregador. O Tribunal da Relação do Porto considerou que “não ocorre uma situação de transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da atividade suscetível de consubstanciar uma “unidade económica” do estabelecimento.”.
Acórdão da Relação de Guimarães de 6 de fevereiro de 2020 – Processo n.º 1245/19.5T8BCL.G1 [relatora: Maria Leonor Barroso]: decidiu que «Sendo aplicável aos autos o CCT celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e a FETESE - Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços (publicado no Boletim do Trabalho e do Emprego n.º 38, de 15/10/2017, em situações de sucessão de empregadores na execução de contratos de prestação de serviços de segurança privada, a transmissão do contrato de trabalho é automática e não depende de qualquer outra formalidade ou requisito (cláusula 14.ª)».
Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6 de dezembro de 2017 – Processo n.º 357/13.3TTPDL.L1.S1 [relatora: Ana Luís Geraldes]: Estava em causa o exercício de funções de vigilância com controlo de entrada e saída de pessoas e mercadorias, monitorização CCTV e registo de ocorrências, nas portarias das instalações pertencentes a “(...)”. Em dado momento, na sequência de um procedimento concursal, o cliente adjudica o mesmo serviço a outra empresa, que não aceitou qualquer trabalhador, tendo sido entregue à nova empresa os rádios utilizados e pertencentes à anterior empresa que, a nova empresa, entregou nas instalações do cliente. O Supremo Tribunal de Justiça considerou que «para se verificar a transmissão de uma empresa ou estabelecimento e, consequentemente, ter aplicação o regime jurídico previsto no art. 285.º, do Código do Trabalho de 2009, quanto aos seus efeitos, importa verificar se a transmissão operada tem por objecto uma unidade económica, organizada de modo estável, que mantenha a sua identidade e seja dotada de autonomia, com vista à prossecução de uma actividade económica, ou individualizada, na empresa transmissária», sendo que «não ocorre uma situação de transmissão de estabelecimento quando uma empresa deixa de prestar serviços de vigilância e segurança junto de determinado cliente, na sequência de adjudicação, por este, de tais serviços de vigilância a outra empresa, sem que se tivesse verificado a assunção de qualquer trabalhador da anterior empresa e tão pouco qualquer transferência de bens ou equipamentos de prossecução da actividade susceptível de consubstanciar uma “unidade económica” do estabelecimento».
Acórdão da Relação de Lisboa de 15 de fevereiro de 2006 – Processo n.º 12108/2005-4 [relator: Ferreira Marques]: uma empresa prestava serviços de vigilância e segurança estática a outra, no Edifício Visconde de Alvalade, desde 5/10/2002, vinte e quatro horas por dia, todos os dias do ano, e compreendiam o controlo e registo de movimento de entradas e saídas de pessoas, materiais e equipamentos no edifício e na garagem afeta ao referido edifício, a gestão do chaveiro, a vigilância do edifício e do parque de estacionamento, sendo que partir de 12/10/2004. A empresa gestora das instalações adjudicou uma terceira empresa, a prestação dos serviços de vigilância e segurança estática, até então assegurados pela Ré. O Tribunal da Relação de Lisboa considerou que este conjunto de meios organizados ou esta organização de meios humanos que tem como objetivo assegurar, de forma durável, a atividade de vigilância e segurança estática no Edifício Visconde de Alvalade (instalações do Sporting Clube de Portugal) consubstancia uma verdadeira unidade económica, nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 318º do Código do Trabalho; embora tenha entendido que não tinha ocorrido transmissão do estabelecimento por não se ter provado, nem no caso ter sido alegado, que se tenham mantido efetivos da 1ª R ao serviço da 2ª R, mais concretamente refere que «este conjunto de meios organizados ou esta organização de meios humanos que tem como objectivo assegurar, de forma durável, a actividade de vigilância e segurança estática no Edifício Visconde de Alvalade (instalações do Sporting Clube de Portugal) consubstancia uma verdadeira unidade económica, nos termos do disposto no n.º 4 do art. 318º do Código do Trabalho; contudo, neste caso, só poderia falar-se em transmissão ou em transferência desta “parte de estabelecimento” da Ré Strong para a CPS se, após o dia 12/10/2004, continuasse a manter-se a sua identidade, ou seja, se após aquela data, além da actividade de vigilância e segurança, se mantivessem os efectivos ou uma parte essencial dos efectivos que antes asseguravam aquela actividade. Poderia falar-se em transmissão ou transferência da referida unidade económica da Ré Strong para a CPS se, além da continuação da referida actividade, se mantivessem a assegurar essa actividade os colegas dos AA».
Deste conjunto de decisões resulta claro que a tendência da jurisprudência é a de considerar, fora das situações abrangidas pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e a FETESE - Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços ou com a Sindicato dos Trabalhadores de Serviços de Portaria, Vigilância, Limpeza, Domésticas e Actividades Diversas – STAD, que nas empresas cuja atividade depende, quase exclusivamente, de mão-de-obra, como sucede nos serviços de vigilância/segurança, o fator ou critério determinante é algum ou alguns dos trabalhadores da anterior empresa serem assumidos pela nova empresa. É certo que todos os outros fatores são relevantes, mas a verdade é que estas substituições de empresas implicam sempre a continuação, em regra, sem interrupção, da mesma atividade no mesmo local e com os mesmos equipamentos do próprio cliente, pelo que o que constitui um elemento distintivo, entre umas situações e outras, acaba por ser a continuação na mesma atividade de parte dos trabalhadores e a eventual transmissão, que normalmente não ocorre, de algum equipamento propriedade da empresa anterior [sendo certo que aceitamos que a jurisprudência comunitária, em alguns casos, aceita que o que é relevante não é propriamente a propriedade dos equipamentos, mas antes a identidade dos equipamentos, ainda que pertencentes a terceiro, designadamente ao cliente – neste sentido, por exemplo, o acórdão do TJ de 15 de dezembro de 2005, relativo aos processos C-232/04 e C-233/04]. Na realidade, tratando-se de uma atividade muito dependente de mão-de-obra, a posição referida tem sido igualmente assumida pelo Tribunal de Justiça da União Europeia e, noutros setores, pelos nossos Tribunais Superiores. (...).
Esta ideia resulta igualmente da nossa jurisprudência em situações em que apreciou a transmissão de empresas prestadoras de serviços de limpeza, designadamente no acórdão da Relação do Porto de 11 de setembro de 2017 [relatora: Paula Leal de Carvalho], que considerou que «nas empresas cuja atividade assenta essencialmente na mão-de-obra – como é o caso da atividade de prestação de serviços de limpeza –, o fator determinante para se considerar a existência da mesma unidade económica é saber se houve manutenção do pessoal ou do essencial deste, na medida em que é esse complexo humano organizado que confere individualidade à empresa, e não tanto se se transmitiram, ou não, ativos corpóreos». É certo que a dependência deste elemento é criticável e gerou criticas em diversos setores, porque se confunde a consequência do instituto da transmissão ou transferência de unidade económica com uma premissa da sua aplicação [sobre estas criticas: Júlio Gomes, Direito do Trabalho…, página 824/825; e Milena Silva Rouxinol, Transmissão da Unidade Económica…, página 859], mas a verdade é que, tendo em conta a natureza da atividade, a circunstância de não existir qualquer transmissão de equipamentos da propriedade da anterior empresa, de não haver, normalmente, qualquer transmissão de know how, acaba por ser o elemento essencial para indicar que a empresa que assume o serviço se apropria de algum tipo de meios de produção da empresa anterior, ainda que não assuma a maioria dos seus trabalhadores.
Na realidade, se a nova empresa não tem um quadro de pessoal próprio para assumir as obrigações contratuais e contrata novos trabalhadores para o efeito, sendo parte relevante destes novos trabalhadores alguns dos que anteriormente lá trabalhavam, fica demonstrado que, para a assunção daquela prestação de serviços, esta empresa está a utilizar os mesmos meios de produção que anteriormente já estavam afetos àquele serviço. Este critério acaba por ser, neste tipo de atividade, em nosso entendimento, o mais relevante para as situações em que estamos perante situações organizativas simples, sem complexidade e estrutura, que se limitam a poucos postos de trabalho, com presença de poucos vigilantes em simultâneo [muitas vezes é apenas um, apesar do período horário de prestação de serviço, poder exigir que exista trabalho alternado de mais de um vigilante]. Diferente será em estruturas mais complexas, em que existe uma estrutura organizativa própria direcionada para a prestação do serviço àquele cliente, num único local ou em vários locais, mas com organização de serviços própria e autónoma, com diferentes graus de hierarquia entre os trabalhadores, ainda que a estrutura hierarquica não seja muito complexa.
Aplicando estes critérios ao caso decidendo, consideramos que temos que concluir que existe uma transmissão de posição contratual de empregador, no âmbito do artigo 285.º, n.º 1 e n.º 5, do Código do Trabalho, na medida em que, apesar da recorrente poder não estar abrangida pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e a FETESE - Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços (publicado no Boletim do Trabalho e do Emprego n.º 38, de 15/10/2017), assumiu dezenas de trabalhadores que exerciam funções de vigilância nas entidades públicas referenciadas, pelo menos metade dos trabalhadores da empresa anterior tinha afetos a essa prestação de serviços. (sublinhado e negrito nossos) Acresce que existe um conjunto de elementos corpóreos propriedade do cliente, existe similitude dos serviços prestados, que são os mesmos e existe continuidade na prestação destes serviços, não foi exatamente no dia seguinte, mas no dia de funcionamento seguinte, com exceção, certamente, quanto à vigilância exercida através da própria central de alarmes. É certo que não existia uma estrutura organizativa com uma complexidade mínima dirigida a este conjunto de postos de trabalho, com um supervisor próprio, que dependiam ou dependem, em cada uma das empresas, da estrutura partilhada com a globalidade dos postos de prestação de serviços, sendo certo que, não havendo uma independência funcional dos vigilantes na organização do seu trabalho, que estava hierárquica e organizativamente dependente de um ou mais supervisores e outros elementos que exercem funções numa área geográfica abrangendo uma multiplicidade de clientes da recorrente, não existe transmissão de qualquer bem corpóreo pertencente à anterior empresa, nem houve, em qualquer momento, transferência de know how de uma empresa para a outra, mas numa atividade extremamente dependente da mão-de-obra, nos termos assinalados, consideramos que o critério essencial traduz-se efetivamente na apropriação pela recorrente da maioria dos vigilantes que a empresa anterior tinha afetos à prestação de serviços de vigilância ao cliente em causa, o que significa que a recorrente não estava preparada para assumir a prestação do serviço pelos seus próprios meios, tendo aproveitado a apropriação dos meios produtivos da empresa anterior para o efeito [diferente seria se a recorrente tivesse vigilantes no seu quadro que transitariam de outros postos de trabalho, reorganizando a sua atividade para o efeito, ainda que contratasse um conjunto de trabalhadores para complemento das necessidades de serviço]. Em nosso modesto entendimento, as regras relativas ao exercício da atividade de segurança privada, que impõem um conjunto de requisitos para esse exercício, não pode ser suficiente para afastar a possibilidade de aplicação do instituto da transmissão da posição contratual de empregador às situações como a que se nos apresenta, na medida em que essa posição, por si só, sem outros elementos de apreciação concreta, redundaria numa posição contrária ao que resulta da jurisprudência comunitária, (sublinhado e negrito nossos) designadamente do referido acórdão SECURITAS, que decidiu que: O artigo 1º, nº 1, alínea a), da Diretiva 2001/23/CE do Conselho, de 12 de março de 2001, relativa à aproximação das legislações dos Estados-Membros respeitantes à manutenção dos direitos dos trabalhadores em caso de transferência de empresas ou de estabelecimentos, ou de partes de empresas ou de estabelecimentos, deve ser interpretado no sentido de que está abrangida pelo conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção desta disposição, uma situação em que um contratante resolveu o contrato de prestação de serviços de vigilância e de segurança das suas instalações celebrado com uma empresa e, em seguida, para a execução dessa prestação, celebrou um novo contrato com outra empresa, que recusa integrar os trabalhadores da primeira, quando os equipamentos indispensáveis ao exercício da referida prestação foram retomados pela segunda empresa.
O artigo 1º, nº 1, da Diretiva 2001/23 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma disposição nacional, como a que está em causa no processo principal, que prevê que não está abrangida pelo âmbito de aplicação do conceito de «transferência […] de uma empresa [ou de um] estabelecimento», na aceção deste artigo 1º, nº 1, a perda de cliente por parte de um operador com a adjudicação de serviço a outro operador.
Daqui resulta que, se considerássemos a posição da recorrente no sentido de que a especificidade da atividade de vigilância privada, a exigir alvará, seguros, caução, uma estrutura hierárquica e, em alguns casos, uma central de alarmes, nunca haveria transmissão da posição contratual de empregador, em situações como a dos autos, o que contraria, em nosso entendimento, a abertura desta jurisprudência comunitária que visa deixar em aberto essa possibilidade, exigindo uma apreciação que tenha em conta todas as circunstâncias do caso concreto. Em suma, havendo transmissão da posição contratual de empregador, consideramos que está verificada a infração prevista no artigo 285.º, n.º 1 e n.º 10, alínea b), do Código do Trabalho. (sublinhado e negrito nossos)
1.4 Defende ainda a recorrente que a coima deve ser reduzida ao mínimo legal por ausência de elementos que permitam fixar valor superior.
Nos termos do artigo 18.º, n.º 1, do Regime Geral das Contraordenações e Coimas, a determinação da medida da coima faz-se em função da gravidade da contra-ordenação, da culpa, da situação económica do agente e do benefício económico que este retirou da prática da contra-ordenação.
No caso concreto, tendo em conta o número de trabalhadores envolvidos e o volume de negócios da recorrente, consideramos adequada a medida da coima fixada, até porque a recorrente foi condenada numa coima única que é inferior ao mínimo legal da moldura.».
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Ora, aqui chegadas, analisando o caso, a factualidade que ficou provada, especificamente, os pontos 47 a 53 e o que se fez constar da decisão recorrida, devidamente fundamentada e com referência a doutrina que acolhemos e jurisprudência, em particular, desta Relação que, temos seguido, noutras decisões, em que a questão da transmissão se coloca e o disposto no art. 285º do CT, só podemos concluir que, como antes dissemos e salvaguardando o devido respeito, por diferente opinião que, não assiste qualquer razão à recorrente. Em nosso entender, a decisão recorrida não padece de qualquer vício ou qualquer erro de direito ao nível da integração dos factos nas normas tidas por violadas, susceptível de implicar a sua alteração ou revogação, como considera e pretende a recorrente.
Subscrevemos, como já dissemos, o entendimento nela expresso que, como refere o Mº Público, “A substituição das empresas de segurança privada, em consequência de concursos públicos, implica sempre a continuação da mesma atividade no mesmo local e com os mesmos equipamentos do próprio cliente, pelo que o que constitui um elemento distintivo, entre umas situações e outras, acaba por ser a continuação na mesma atividade de parte dos trabalhadores” e como se apurou, tendo a arguida, no caso, assumido dezenas de trabalhadores (veja-se ponto 48 dos factos provados), que exerciam funções de vigilância nas entidades públicas referidas no auto de notícia e que ali presta serviço, apesar da mesma não estar abrangida, ao que tudo indica, pelo Contrato Coletivo de Trabalho celebrado entre a AES - Associação de Empresas de Segurança e a FETESE - Federação dos Sindicatos da Indústria e Serviços (publicado no Boletim do Trabalho e do Emprego n.º 38, de 15/10/2017), o certo é que a mesma, ao ficar com metade dos trabalhadores que ali exerciam funções, (veja-se facto 53) “não tendo para o efeito trabalhadores próprios, utilizou o meio de produção ali existente, numa actividade que se baseia na mão de obra”, como bem o diz, novamente, o Mª Público, não podemos concluir de outro modo que, não seja que, se verificou a infracção prevista no art. 285º, nº 1 e nº 10, alínea b), do CT e, é irrelevante para assim o considerar o apelo que a recorrente faz e reitera, nesta sede, à Lei da Segurança Privada. A que acresce, como bem na decisão recorrida se considerou, ser a coima aplicada adequada e proporcional ao caso concreto.
Assim, sem necessidade de outras considerações, entendemos que a decisão recorrida não nos merece qualquer reparo, nem poderia ser outra, na situação em apreço.
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Improcede, desta forma, o recurso interposto.
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III – DECISÃO
Por todo o exposto, acordam as Juízas desta Relação em julgar improcedente o recurso interposto pela recorrente, “B…, S.A.”, mantendo-se a decisão recorrida.
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Custas a cargo da recorrente, fixando-se a taxa de justiça em três UC’s.
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Após trânsito em julgado deste Acórdão, comunique à autoridade administrativa, com cópia certificada do mesmo.
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Porto, 29 de Setembro de 2021
Rita Romeira
Teresa Sá Lopes