Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
845/13.1GBAMT.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ALVES DUARTE
Descritores: VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
ARQUIVAMENTO DO INQUÉRITO
NOVAS PROVAS
IMPUTAÇÃO GENÉRICA
PRINCÍPIO DO ACUSATÓRIO
Nº do Documento: RP20150617845/13.1GBAMT.P1
Data do Acordão: 06/17/2015
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: REC PENAL
Decisão: PROVIDO
Indicações Eventuais: 1ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I – A ausência de novas provas que invalidem os fundamentos do despacho de arquivamento impede a reabertura do inquérito.
II – Carece de relevância jurídico-penal a imputação genérica de factos e deve considerar-se como não escrita.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 845/13.1GBAMT.P1
Instância Local Criminal de Amarante – J1

Acordam, em conferência, na 1.ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório.
B… recorreu da sentença proferida no processo em epígrafe que o condenou, como autor material e na forma consumada, de um crime de violência doméstica, previsto e punido pelo artigo 152.º, n.os 1, alínea a) e 2) do Código Penal, na pena de 2 anos e 6 meses de prisão, suspensa na execução por igual período e a pagar à demandante civil a quantia de € 1000 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros desde a notificação da dedução do pedido, à taxa legal de 4% ao ano, até efectivo e integral pagamento, concluindo a motivação com as seguintes conclusões:
1 - Tendo sido dados como provados factos que em 2004 foram objecto de inquérito, que foi arquivado, a reabertura desse inquérito fora dos termos previstos no artigo 278.º do CPP, só pode ocorrer se novos elementos de prova chegarem ao conhecimento do Ministério Público.
2 - Sob pena de violação do princípio ne bis in idem não pode o Tribunal ter em conta factos corridos até 2004, e cuja averiguação já foi feita noutros autos, para com eles, obter os elementos típicos do n.º 2 do artigo 152, na redacção emergente da citada Lei 59/2007, data em que os filhos do casal eram já de maioridade.
3 - Os factos provados nos n.os 3 a 9 e primeira parte do n.º 12, da sentença, não devem fundamentar a condenação e porque foram já objecto de inquérito em 2004, que foi arquivado, devem ser eliminados dos factos provados.
4 - Mesmo que a conduta típica seja reiterada necessita de ser concretizada para poder constituir o tipo legal, sob pena de ficar seriamente limitado o direito de defesa, por falta de explicitação dos factos imputados.
5 - No caso dos autos, a acusação e a sentença não contêm qualquer facto concreto da actuação do arguido entre Julho de 2004 e Julho de 2013, inexistindo qualquer factualidade que comprove uma unidade de actuação entre os dois períodos.
6 - Tendo os factos até 2004 sido objecto de outro inquérito que foi arquivado e, por outro lado, inexistindo qualquer elemento de ligação entre a actuação descrita como tendo ocorrido em 2003/2004 e a descrita como tendo ocorrido em 2013, impõe-se, no caso dos autos, enquadrar legalmente apenas esta última conduta.
7 - Tanto mais que o actual tipo legal de crime de violência doméstica só em 2007 se autonomizou e a previsão do n.º 2 do artigo 152 só então passou a ser punida com pena mais severa.
8 - Em Setembro de 2007 os filhos do casal do arguido e da ofendida eram já de maioridade e a filha já estava casada e em Julho de 2013 a ofendida saiu de casa.
9 - Mantendo-se aquela matéria de facto, em suporte da decisão jurídica, ocorre a violação do princípio da tipicidade.
10 - Com a eliminação dos factos provados dos n.os 3 a 9 e primeira parte do n.º 12, da sentença, impõe-se diverso enquadramento jurídico da conduta do arguido, nos termos do artigo 152.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal.
11 - Tendo em conta a respectiva moldura e atendendo ao critério estabelecido na sentença para a fixação da pena concreta, deve a pena a aplicar ao arguido ser fixada entre um ano e um ano e seis meses, suspensa por igual período.
12 - E o montante de indemnização não deve ser superior a €: 500,00, acrescido de juros de mora desde a notificação da decisão, até integral pagamento.
13 - O presente recurso funda-se de Direito, além das normas e princípios citados, no artigo 410.º, n.º 1 do CPP.

O Ministério Público respondeu ao recurso, pedindo que se lhe negue provimento e se mantenha a sentença recorrida, para o que alinhou as seguintes razões:
- O arguido conhecia os concretos factos de que era acusado não tendo sido em momento algum posto em causa o seu intangível direito de defesa;
- Não obstante o filho mais novo do arguido ter perfeito 18 anos em 09 de Outubro de 1988, mantém-se a agravante prevista no art.º 152.º, n.º2, do Código Penal na actual redacção em virtude dos factos ocorrerem no domicílio comum da vítima e do arguido;
- Os factos em causa no inquérito 618/04.2GBAMT não foram objecto de decisão jurisdicional, sentença, transitada em julgado pelo que não ocorre violação do princípio ne bis in idem;
- Inexistindo violação do princípio ne bis in idem inexiste fundamento para excluir os factos provados dos n.os 3 a 9 e primeira parte do n.º 12 da sentença recorrida;
- Carece de fundamento a pretensão de qualificar os factos como crime de violência doméstica previsto e punido nos termos do art.º 152.º, n.º 1, al. a) do Código Penal face à aplicabilidade da redacção actual do art.º 152.º, n.º 2, do Código Penal, atenta a reiteração dos factos que fundamentaram a condenação que apenas cessaram em 2013;
- Nenhum reparo merece a pena de dois anos e seis meses de prisão suspensa na sua execução a que o arguido foi condenado.

Também a assistente respondeu ao recurso, formulando as seguintes conclusões:
No caso dos autos não estão preenchidos os requisitos necessários para a admissibilidade de recurso no que ao pedido de indemnização civil diz respeito.
Pelo que, não deve ser conhecida a questão da quantificação pelo Tribunal a quo da indemnização objecto de pedido de indemnização civil.
Por tudo o exposto, entende a Recorrida que a douta decisão a quo não merece qualquer censura devendo, por isso, manter-se na íntegra e ser negado provimento ao recurso.

Nesta Relação, a Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso, para tanto louvando-se no seguinte:
As questões suscitadas pelo recorrente e a dirimir estão, a nosso ver, suficiente e adequadamente, equacionadas e debatidas na resposta do MP.
Apenas acrescentaremos.
Quanto aos factos de 13 de Junho de 2004 e de 31 de Julho de 2004 que foram objecto de investigação no inquérito 618/04.2GBAMT e quanto à violação do princípio ne bis idem invocado pelo recorrente, temos a acrescentar que surgindo novos elementos de prova, não conhecidos então na decisão de arquivamento, sem prejuízo do prazo prescricional, que no caso concreto não decorreu, pode sempre prosseguir o procedimento criminal por esses factos, documentados através da certidão extraída e junta aos autos a fls. 89 e ss, estando implícita a reabertura do inquérito.
Cremos que não assiste razão ao recorrente neste particular porquanto, fazendo parte do elenco fáctico do libelo uma conduta reiterada, que se prolongou no tempo, a emergência de uma relação de concurso aparente entre os sucessivos factos e a consideração da natureza pública do quadro infracional global descontam relevância à objecção recursória relativa arquivamento.
Os factos de 2004 mais não são do que um elemento da reiteração da prática do crime de violência doméstica e que habilitam à imputação do ilícito, tomado como crime único que se consuma com o último elemento da cadeia ofensiva.
Não faz, pois, sentido o “esquecimento” dos factos de 2004, como é pretendido pelo recorrente.
Tão pouco tais factos constantes da acusação impediram todo o direito de defesa do arguido.
Insurge-se ainda o recorrente quanto à pena que lhe foi imposta, considerando que a pena deve ser fixada entre um ano e um ano e seis meses, suspensa por igual período.
Considerado a moldura penal abstracta do crime, não se vê onde possa residir o peso da pena aplicada, sobretudo se for tido em consideração que se trata já de uma pena de substituição — art.º 50.º do C.P.
Sufragando o entendimento e considerações ali expendidas pelo MP da 1.ª instância, que aqui damos por inteiramente reproduzidas, somos de parecer que a decisão recorrida deve ser mantida, com a consequente improcedência do recurso.

Foi dado cumprimento ao disposto no art.º 417.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, sem qualquer sequela por parte do recorrente.

Efectuado o exame preliminar e colhidos os vistos, cumpre agora apreciar e decidir.
***
II - Fundamentação.
1. Da decisão recorrida.
1.1. Factos julgados provados:
1. O arguido casou catolicamente com a ofendida C… no dia 10 de Maio de 1986, na freguesia …, concelho de Amarante, tendo também fixado residência e morada de família nesta comarca.
2. Desta união nasceram D… e E…, respectivamente, a 9 de Outubro de 1998 e 13 de Julho de 1987.
3. Desde data não concretamente apurada, mas pelo menos desde o ano de 2003, que o arguido agredia com estalos na cara e insultava a ofendida, dirigindo-lhe nomes como “filha da puta”, o que fazia diariamente e na sequência de discussões que encetava com a ofendida, até à altura em que a mesma deixou de residir consigo em Julho de 2013.
4. No entanto, desde meados de 2004, altura em que sofreu um acidente de viação, que lhe determinou uma incapacidade física, que o arguido vem demonstrando perante a ofendida um comportamento e temperamento mais agressivos, sobretudo porque desde então passou também a ingerir bebidas alcoólicas em excesso.
5. Desde essa altura, e para além das agressões que perpetrava na ofendida, atingindo-a com estalos, agarrando-a pelo queixo com força e nos braços, dizendo-lhe que havia de a matar, o arguido controlava as suas saídas de casa, proibindo-a por vezes de dela se ausentar, e regressava a casa de madrugada, embriagado, altura em que começava a dirigir-lhe nomes como “filha da puta”, “vaca”, “gatuna”, e dizendo “não estás bem sai daqui para fora, a casa é minha, fui eu que a comprei, sua filha da puta”, o que fazia durante toda a noite, impedindo-a de dormir.
6. Assim, em data não concretamente apurada, mas nos primeiros dias do mês de Junho de 2004, o arguido B… bateu nas costas da ofendida, sua mulher, com as muletas com que auxiliava o seu caminhar, causando-lhe dores, não tendo a mesma no entanto recorrido a tratamento médico hospitalar.
7. Também no dia 13 de Junho de 2004, o arguido encetou uma discussão com a filha E…, tendo a ofendida C… intercedido a favor desta, altura em que o arguido, seu marido, a agrediu com um murro na cabeça e um murro no rosto, mais precisamente no lábio inferior.
8. Com esta sua conduta causou o arguido à ofendida C…, directa e necessariamente, dores, hematoma de bordos indefinidos mas com cerca de 3 cms de diâmetro na região parieto occipital esquerda (crânio), contusão no lábio inferior e três marcas ovalares, uma com 1 cm de maior diâmetro e outras duas com 1,5 cm de maior diâmetro, localizadas na face interna do braço direito, pelas quais recebeu tratamento médico hospitalar.
9. Também no dia 31 de Julho de 2004, o arguido dirigiu-se à ofendida, sua mulher, e aos seus dois filhos que se encontravam na companhia desta e encetou uma discussão com os três, tendo dito à ofendida em tom sério e agressivo que “se ela saísse de casa não voltaria a entrar porque caso o fizesse que a mataria”, chamando-a ainda de “filha da puta”, “mentirosa” e “puta”, situação que fez com que o filho mais novo pedisse auxílio à tia, irmã do arguido, F…, que o tentou acalmar e levou a cunhada e ambos os sobrinhos para pernoitarem em sua casa.
10. Em Julho de 2013 o arguido, após uma discussão que voltou a encetar com a sua mulher ora ofendida, dirigiu-se-lhe, dizendo “prepara as tuas coisas que eu quero-te daqui para fora”, tendo nessa altura obrigado a ofendida a sair de casa, durante a noite, levando consigo apenas algumas peças de roupa e lençóis de cama, bem sabendo que a mesma não tinha local para pernoitar, tendo a ofendida a partir de então sobrevivido com a ajuda de terceiros que lhe deram mobiliário, electrodomésticos.
11. Desde essa altura que o arguido tem seguido a ofendida, ainda sua mulher, pelos vários locais onde a mesma se desloca e ao redor da actual residência da mesma, altura em que a acusa de ter retirado sem autorização a mobília de casa onde ambos habitavam, situação que lhe causa medo e ansiedade.
12. Ao insultar e bater na ofendida, sua mulher, em frente dos filhos menores D… e E… e, bem assim, ao ameaça-la, sabia o arguido que lhe causava grande medo e humilhação, para além das dores decorrentes das agressões que perpetrou.
13. O arguido agiu de forma livre e consciente, com intenção de maltratar física e psicologicamente a ofendida, sua mulher, ameaçando-a, insultando-a e agredindo-a.
14. Bem sabia o arguido que não podia tratar a ofendida, sua mulher, da forma como tratou, no interior da habitação do casal e sobretudo na presença dos filhos menores, e que não tinha causa justificativa para o fazer.
15. Com o seu comportamento e não ignorando demonstrar baixeza de carácter, pretendeu e conseguiu o arguido humilhar a ofendida, assustando-a com as ameaças que lhe dirigira e as agressões com que a atingiram, conseguindo diminuí-la no respeito que lhe era devido.
16. Agiu ainda o arguido de forma livre, deliberada e conscientemente, em obediência ao mesmo desígnio de indiferença e malvadez, querendo atingir, como atingiu, a ofendida, sua mulher, na sua liberdade de autodeterminação, na sua honra e integridade física, mostrando-se indiferente pelo estado em que a deixou, mau grado saber que não podia nem devia fazê-lo.
17. Actuou sempre o arguido com a perfeita consciência de que as suas condutas eram proibidas e punidas por lei.
***
18. As lesões referidas em 8. dos factos provados, causaram à ofendida dores, desconforto, mal-estar físico e psicológico.
19. Tendo-lhe perturbado a sua actividade pessoal e profissional.
20. O arguido, ao desferir tais golpes, causou medo e pânico à ofendida, que temeu pela sua vida.
21. A ofendida sentiu-se vexada, humilhada e diminuída na sua honra e na sua aparência física.
22. O arguido ao proferir as expressões, tais como “filha da puta”, “vaca”, “gatuna”, “não estás bem sai daqui para fora, a casa é minha, fui eu que a comprei, sua filha da puta”, “se ela não saísse de casa não voltaria a entrar porque caso o fizesse que a mataria”, “mentirosa” e “puta”, “prepara as tuas coisas que eu quero-te daqui para fora”, fê-lo com o propósito conseguido de ofender a ofendida na sua honra, dignidade e consideração.
23. Fazendo com que a ofendida andasse cansada, uma vez que foram muitas as vezes que não conseguia dormir, cabisbaixa, triste e com vergonha.
24. Mais humilhada se sentiu pelo facto de os ataques, quer físicos, quer verbais, terem sido perpetrados pelo arguido, seu companheiro, pai dos seus filhos, diante dos próprios filhos.
25. Ainda hoje a ofendida, que se viu obrigada a fugir da casa de morada de família, sente medo em cruzar-se com o arguido, de quem sabe ser agressivo e, de quem se sente ser perseguida e teme que algum mal lhe aconteça.
26. Assim e, como causa directa, necessária e adequada do comportamento do arguido, sofreu a ofendida um forte abalo emocional, sentindo-se revoltada e atemorizada.
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27. O arguido é considerado uma pessoa respeitadora por quem o conhece.
28. O arguido foi condenado no âmbito do processo sumário n.º 765/12.7 GAFLG, do 3º juízo do tribunal judicial da comarca de Felgueiras, por factos praticados no dia 10 de Agosto de 2012, que integram um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, por sentença proferida no dia 10 de Agosto de 2012, na pena de 50 dias de multa à taxa diária de € 5.

1.2. Factos julgados não provados:
a) No circunstancialismo temporal referido no artigo 10. dos factos provados, terceiras pessoas emprestaram dinheiro para a mesma arrendar a casa que depois veio a habitar.
b) Sentiu a ofendida receio pelo risco de maior traumatismo e conspurcação dos ferimentos.

Não se responde aos artigos 1; 2; 16; 17 e 18, do pedido de indemnização civil deduzido pela ofendida por serem factos conclusivos ou matéria de direito.
Não se responde aos artigos 3; 4; 5; do pedido de indemnização civil deduzido pela ofendida por se tratarem de repetição do que consta da acusação.

1.3. Fundamentação da decisão da matéria de facto:
a) Quanto aos factos provados:
O tribunal formulou a sua convicção com base no depoimento da ofendida, que confirmou que cerca de um ano antes de o arguido ter tido um acidente – que ocorreu em 9 de Fevereiro de 2004, começou a houver mau relacionamento com o marido, aqui arguido, que a insultava constantemente com nomes como “puta”, “filha da puta”, “vaca” e que as agressões físicas também foram frequentes.
O marido discutia por tudo e por nada.
Começou a trabalhar porque o dinheiro em casa não chegava. Mas o arguido não queria que ela, ofendida, fosse trabalhar.
Recorda-se de um episódio em que estavam na cama e o arguido deu-lhe uma latada – isto numa altura em que estavam a viver em casa da sogra, cerca de 2 anos antes de o arguido ter tido o acidente.
Depois desse facto, o arguido agrediu-a várias vezes. Uma das vezes ele deu-lhe com um cântaro na coxa esquerda, ficando com uma nódoa negra muito grande e chamou-lhe nomes como “filha da puta”, “vaca”, “sua besta”, não tendo apresentado queixa porque tinha medo do arguido. Uma outra vez deu-lhe uma bofetada na boca, já na casa onde moravam.
O arguido insultava-a constantemente, mesmo quando não se encontrava bêbado.
O arguido recebeu cerca de cem mil euros de indemnização por causa do acidente que teve. Então saia de casa e regressava de madrugada ou pouco mais cedo e começava a fazer barulho, falava alto, não a deixando descansar, indo trabalhar sem dormir. E agredia-a, agarrando-a pelo queixo e pelos braços. E também a ameaçava, que qualquer dia a matava, a arrumava, que se pusesse bem que a casa era dele e ameaçava-a que se saísse de casa arrumava com ela.
Quando o arguido teve o acidente, andou com muletas. E um dia deu-lhe com as muletas nas costas e na cabeça, tendo ficado com marcas, mas não apresentou queixa com medo, por causa das ameaças que ele fazia.
Quando a filha teria cerca de 15/16 anos, o arguido começou a discutir com a filha para desligar o telemóvel e ia bater-lhe mas a filha meteu-se ao meio.
Há cerca de 10 anos, por altura em que o arguido teve o acidente, ele deu-lhe murros na cabeça e agarrou-lhe os lábios e os braços, tendo vindo ao hospital, tendo apresentado queixa nesse dia. Ficou com papos na cabeça e magoada nos lábios e com marcas nos braços. E chamou-lhe “filha da puta”, “és uma grande filha da puta” e ameaçou-a de que havia de a matar, que se saísse de casa não voltava a entrar. O filho ligou à tia, irmã do arguido, F…. A cunhada foi lá a casa e levou-os, a ela, à filha e ao filho, para a sua casa, durante o fim-de-semana.
Saiu de casa por já não aguentar mais esta situação, o que se verificou em 28 de Julho de 2013, tendo levado apenas algumas roupas, roupa de cama, uma televisão e um DVD.
Já após ter saído de casa, por volta do natal de 2013, o arguido seguiu-a. Na lixa, chamou-lhe “filha da puta” e “vais pagar por isto tudo”. E ele seguiu-a para o trabalho dela.
Uma outra vez, na lixa, o arguido insultou-a.
Tem medo do arguido, quando vai a algum lado não vai sozinha, porque o arguido a ameaçava que a havia de arrumar, que lhe ia fazer a vida negra.
O seu depoimento foi prestado de forma escorreita, sofrida, por recordar toda esta vivência e os vários episódios de agressões, insultos e ameaças por que passou e levadas a cabo pelo arguido, revelando-se credíveis.
O tribunal teve ainda em consideração o depoimento das testemunhas D…, E… e F…, respectivamente, filho, filha e irmã do arguido.
O filho D… afirmou que se recorda que desde 2003 havia discussões entre os pais. Em 2003, quando teria 15/17 anos, o pai agrediu a mãe e ele, D…, ligou para a tia F…, para vir ajudar. O pai chegou a casa e começou a maltratar a mãe e agrediu-a, dando-lhe latadas, empurrões e puxou-lhe os cabelos, ao mesmo tempo que a insultava de “filha da puta”, “puta” e “vaca”. A tia foi lá a casa e foram, ele, a mãe e a irmã para casa da tia, onde passaram o fim-de-semana e voltaram para casa no final desse fim-de-semana.
O pai bebia demais e frequentemente chegava a casa de madrugada ou já depois da meia-noite e passava a noite a berrar dentro de casa, não os deixando descansar. Os insultos à mãe eram frequentes, já aconteciam antes do pai ter tido o acidente, mas pioraram depois do acidente. O pai também ameaçava a mãe, que se saísse de casa a matava. A mãe ficava com medo que ele a matasse.
O pai bateu na mãe várias vezes. A mãe ficava com nódoas negras e às vezes rebentava-lhe os lábios.
Já depois de a mãe sair de casa, o pai foi a casa onde a mãe estava a viver, seguiu-a quando ela ia para o trabalho e insultou-a.
A mãe sentia vergonha em ir trabalhar com nódoas negras e com os lábios pisados.
A testemunha E… afirmou que viveu com os pais até Dezembro de 2005, data em que se casou. Recorda-se da vivência dos pais, com berros, de bater na mãe e até nos filhos. Era frequente o pai chamar nomes à mãe, como “puta”, “vaca”, “filha da puta”, “cabra amarela”. O pai bateu várias vezes na mãe, batia-lhe na cara, dava-lhe latas e agarrava-lhe o pescoço.
Depois do acidente o pai ficou pior. O pai sempre bebeu demais. Era frequente o pai sair de casa e regressar de madrugada.
Num dia, que não sabe precisar, os pais já estavam na cama e a depoente recebia muitas mensagens. O pai começou a discutir com a mãe, por esse facto. O irmão chamou a tia e foram para casa dela, passar o fim-de-semana. Recorda-se de um dia o pai estará a agredir a mãe, quando estavam na cama e foi lá desapertá-los e o pai agarrou-a no pai, à depoente. A mãe foi ao hospital.
Já depois de a mãe ter saído de casa, perto do natal de 2013, na lixa, o pai insultou a mãe de “filha da puta”, “vaca”, que as pessoas que estavam no café vieram cá fora ver o que se passava. Quando a mãe saiu de casa e foi viver uma semana para casa da filha, o pai, de manhã, quando iam apanhar a camioneta para o trabalho, chamou esses nomes à mãe.
A mãe tem uma depressão, ia para o trabalho sem dormir e tem medo do pai e de andar sozinha na rua. Mesmo à sua frente o pai ameaçou a mãe várias vezes, que a ia matar.
A testemunha F…, afirmou que o filho do arguido, o D…, lhe ligou a pedir ajuda, que o pai estava a partir tudo e a agredir a mãe e filho. Veio a casa do arguido, mas não chegou a entrar dentro de casa. Ouviu o irmão a chamar nomes à mulher, como “puta”, “filha da puta”, “que andavas com este e com aquele”, bem como a ameaça-la que a havia de matar, se não ficasse com ele não ficava com mais ninguém. Isto aconteceu há cerca de 11/12 anos, em 2003/2004, no mês de Julho, foi a um sábado à noite. Levou a cunhada e os dois sobrinhos para sua casa. Os menores estavam com medo do pai, com medo ao que o pai pudesse fazer à mãe e a eles. Da maneira que o arguido estava, era para meter medo a qualquer pessoa. A cunhada estava cheia de medo, por ela e pelos filhos, só chorava.
Mais afirmou que não era daquela data que o irmão insultava a mulher, ouvia comentários de agressões verbais. Pouco tempo antes de o arguido ter tido o acidente, presenciou uma outra situação de insultos à ofendida, por parte do irmão. O irmão teve um acidente em 2004, mas os problemas já vêem de trás. Ainda antes do acidente, o irmão já bebia demais.
As três testemunhas prestaram depoimentos serenos, seguros, isentos, objectivos e credíveis e apesar de o filho do arguido estar de relações cortadas com o pai, por causa de o pai lhe ter posto um processo crime relacionado com uns pombos e de a irmã do arguido estar chateado com ele há cerca de 12 anos, por causa do tratamento deste para com a mulher, não se vislumbrou qualquer sentimento de vingança ou manifestação de menos correcção nos seus depoimentos, só por estarem chateados com o arguido e que abalasse a credibilidade dos seus testemunhos.
Quanto ao modo de ser do arguido, o tribunal teve em consideração os depoimentos das testemunhas G… e H…, a primeira vizinha do arguido há cerca de 3 anos, a segunda conhece o arguido há cerca de 20 anos, por serem da mesma freguesia. Em relação a estes factos, os seus depoimentos foram acolhidos pelo tribunal, dado que foram prestados de forma espontânea, serena e isenta.
O tribunal teve em consideração o teor dos relatórios clínicos, referentes às lesões que a ofendida apresentou quando se deslocou ao hospital e ao gabinete médico-legal, bem como o teor dos assentos de casamento do arguido com a ofendida e de nascimento dos filhos do arguido, e ainda o teor do certificado de registo criminal do arguido, quanto aos antecedentes criminais.
Quanto às declarações prestadas pelo arguido, que tomou a posição de os negar, desvalorizando-os, não passando de uma situação de resposta a uma agressão primeira perpetrada pela ofendida, bem como negando que chamasse os nomes que constam da acusação à mulher, as mesmas não foram acolhidas pelo tribunal.
O tribunal deu credibilidade às declarações prestadas pela ofendida, pelos filhos e irmã do arguido, que esclareceram o modo como os factos se passaram, de forma serena, espontânea, objectiva, desinteressada e credível.
Em relação ao depoimento das testemunhas G…, esta em relação aos maus tratos infligidos pelo arguido à ofendida, e de I…, os mesmos não mereceram acolhimento pelo tribunal, pois só conhecem o arguido há cerca de 3 anos, quando este e a mulher foram morar para uma casa perto da das vizinhas. E só podem relatar o que viram desde há 3 anos, sendo certo que o mau relacionamento entre arguido e ofendida, com agressões físicas e verbais e ameaças, são muito anteriores a esse espaço temporal. Acresce que as agressões e insultos e ameaças geralmente ocorriam no interior da casa, pelo que não se pode afirmar, com segurança, que as testemunhas nada viram de agressões, porque estas não aconteceram, mas apenas que não presenciaram, no período temporal em que vivem perto do arguido e que nada presenciaram.

b) Quanto aos factos não provados:
Não foi feita qualquer prova sobre estes factos.
***
2. Poderes de cognição desta Relação e objecto do recurso.
2.1. O âmbito do recurso é definido pelas conclusões formuladas pelo recorrente que culminam as suas motivações e é por elas delimitado.[1] Às quais acrescem as questões que são de conhecimento oficioso desta Relação enquanto Tribunal de recurso, como no caso dos vícios ou nulidades da sentença a que se reporta o art.º 410.º, n.os 2, alíneas a), b) e c) e 3 do Código de Processo Penal.[2] Tendo isso em conta e uma vez que se não detecta qualquer vício ou nulidade na sentença recorrida de entre os que se devesse conhecer ex officio, diremos que as questões a apreciar neste recurso são as seguintes:
1.ª Os factos julgados provados enumerados de 3 a 9 e 12 (1.ª parte) haviam sido objecto de inquérito e arquivado no ano de 2004 e não surgiram novos elementos de prova e, por isso, não poderiam fundamentar a condenação, considerando o disposto no art.º 279.º, n.º 1 do Código de Processo Penal?
2.ª De todo o modo, mesmo a conduta reiterada tem que ser concretizada na acusação e na sentença para poder integrar o tipo e isso não ocorreu relativamente à actuação do recorrente entre Julho de 2004 e Julho de 2013?
3.ª Pelo que e considerando ainda que inexiste qualquer ligação entre as actuações descritas como tendo ocorrido entre os períodos de 2003 e de 2013 e que em 2007 se deu a alteração para o actual tipo legal, só a última pode legalmente relevar e juridicamente ser enquadrada no crime previsto e punível pelo art.º 152.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal e o recorrente condenado numa pena entre 1 ano e 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e em indemnização civil não superior a € 500,00, acrescida de juros de mora até integral pagamento?
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2.2. Vejamos então a primeira das questões atrás enunciadas.
Os pontos de facto enumerados de 3 a 9 e 12 (1.ª parte) foram julgados provados com base nos depoimentos da ofendida C… e das testemunhas D…, E… e F…, aqueles filhos comuns dela e do recorrente e esta irmã dele, respectivamente. E essas testemunhas já haviam sido ouvidas no inquérito que, com o n.º 618/04.2GBAMT, correu seus termos no Ministério Público junto do então Tribunal Judicial da Comarca de Amarante, conforme se constata das duas certidões de folhas 89 e seguintes dos autos.
O Exm.º Magistrado do Ministério Público titular desse inquérito proferiu nele um despacho, no dia 11-10-2004, o qual se encontra a folhas 100 dos autos, no qual considerou que «apesar da queixosa ter sido socorrida em unidade hospitalar na data dos factos e de apresentar lesões corporais, conforme resulta do relatório do exame médico-legal, a ausência de qualquer outro tipo de prova impede-nos de concluir que tais lesões são o resultado de uma acção voluntária praticada pelo arguido» e, em consequência disso, «nos termos do art.º 277.º, n.º 2 do Código de Processo Penal, ordeno o arquivamento do inquérito».

Destarte, tal como pretende o recorrente, também nos parece evidente que não existiram novos meios de prova no inquérito que originou este processo relativamente aos considerados no anterior inquérito onde foi proferido o atrás mencionado despacho de arquivamento.

Como sabemos, o art.º 279.º, n.º 1 do Código de Processo Penal estabelece que «… o inquérito só pode ser reaberto se surgirem novos elementos de prova que invalidem os fundamentos invocados pelo Ministério Público no despacho de arquivamento».
Ora, a este propósito, escreveu Paulo Pinto de Albuquerque que «o despacho final do inquérito proferido pelo MP não é uma sentença, nem beneficia da protecção a protecção constitucional do artigo 29.º, n.º 5, da Constituição da República, mas ele produz efeitos jurídicos preclusivos importantes que são protegidos pela lei processual, isto é, ele tem força de caso decidido. As disposições dos artigos 279.º, 282.º, n.º 3, e 449.º, n.º 2, prevêem o regime do caso decidido do despacho de arquivamento do Ministério Público. Deste conjunto de normas resulta claro que o legislador rejeitou a solução do artigo 385.º do Progetto preliminare de 1978, correspondente ao artigo 414.º do Código de Processo Penal Italiano, que permite a reabertura do inquérito com base na mera reavaliação pelo Ministério Público dos elementos de prova existentes nos autos».[3] Na mesma linha segue Anabela Miranda Rodrigues, quando sustentou que «tendo em vista os casos em que o Ministério Público não chega a um juízo definitivo sobre a existência ou inexistência de crime e a determinação dos seus agentes (art.º 277.º, n.º 2), esta realidade há-de limitar a eficácia processual definitiva a atribuir ao despacho do arquivamento, mantendo-se ela sob reserva da cláusula rebus sic standibus, ou seja, condicionada à superveniência de novos elementos de prova que devem considerar-se "novos" em relação aos já apreciados. Caso em que será sempre possível requerer a reabertura do inquérito (art.º 279.º), o que efectivamente terá lugar quando o Ministério Público deferir tal pedido (art.º. 279.º, n.º 2)».[4]
Deste modo, a ausência de novas provas que invalidassem os fundamentos convocados pelo Ministério Público no despacho que proferiu no sentido do arquivamento do primeiro inquérito teve por efeito precludir a possibilidade de o reabrir para uma segunda vez investigar os factos objecto daquele. Pelo que ficam resolvidas esta e a questão subsequente, pois que esta pressupunha que diferente fosse a solução encontrada para a primeira.

3. Passando agora a apreciar a terceira questão atrás enunciada, diremos, com o recorrente, que só a última conduta (praticada em Julho de 2013) pode legalmente relevar. Mas o mesmo já não poderemos dizer quanto à segunda parte da sua pretensão, a qual consistia em enquadrá-la juridicamente no crime previsto e punível pelo art.º 152.º, n.º 1, alínea a) do Código Penal e por via disso condená-lo numa pena entre 1 ano e 1 ano e 6 meses de prisão, suspensa na sua execução por igual período e em indemnização civil não superior a € 500,00, acrescida de juros de mora até integral pagamento. Antes de mais convém recordar em que consistiram esses factos:
10. Em Julho de 2013 o arguido, após uma discussão que voltou a encetar com a sua mulher ora ofendida, dirigiu-se-lhe, dizendo “prepara as tuas coisas que eu quero-te daqui para fora”, tendo nessa altura obrigado a ofendida a sair de casa, durante a noite, levando consigo apenas algumas peças de roupa e lençóis de cama, bem sabendo que a mesma não tinha local para pernoitar, tendo a ofendida a partir de então sobrevivido com a ajuda de terceiros que lhe deram mobiliário, electrodomésticos.
11. Desde essa altura que o arguido tem seguido a ofendida, ainda sua mulher, pelos vários locais onde a mesma se desloca e ao redor da actual residência da mesma, altura em que a acusa de ter retirado sem autorização a mobília de casa onde ambos habitavam, situação que lhe causa medo e ansiedade.

No que concerne ao primeiro ponto julgado provado, ficamos sem saber o que fez o recorrente para que a ofendida saísse de casa. Refere-se ali que ele a obrigou mas isso não é um facto mas uma conclusão ou uma afirmação genérica. Ora, a este propósito importa recordar que o nosso processo penal assegura todas as garantias de defesa[5] e que a acusação terá que conter, sob pena de nulidade, a narração, ainda que sintética, dos factos que fundamentam a aplicação ao arguido de uma pena ou de uma medida de segurança.[6] Dando lastro ao princípio do acusatório, constitucionalmente acolhido,[7] dele decorre que a sentença não pode, sob pena de nulidade,[8] condenar o arguido por factos diversos dos narrados na acusação, excepção feita aos casos previstos na lei.[9] Forçoso é, portanto, que ao arguido acusado de a prática de um crime seja dado conhecimento dos factos que lhe são imputados para os poder contraditar e eficazmente defender-se da acusação. O que não acontece, conforme a jurisprudência vem sustentadamente assinalando, quando as imputações que lhe são feitas são de tal modo genéricas que inviabilizam esse direito fundamental.[10] Daí que careçam de qualquer relevância jurídico-penal as imputações de carácter genérico[11] que, por isso, devem considerar-se como não escritas,[12] como ocorre com aquela que atrás referimos. Por outro lado, dizer o recorrente que queria a ofendida dali para fora não passa de uma manifestação de vontade e não chega sequer a ser uma ameaça e muito menos um acto de coacção a que se reportam os art.os 153.º e 154.º do Código Penal pois que, ao contrário do que teria que ser em face daqueles normativos, não manifestou intenção de praticar um crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal ou de determinação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor de modo a provocar-lhe medo, inquietação ou prejudicar a sua liberdade de determinação nem usou de violência física ou de ameaça com mal importante de modo a constrangê-la a uma acção ou omissão ou a suportar uma actividade.

Quanto ao segundo ponto julgado provado, vale na sua plenitude o que atrás já dissemos sobre o carácter abstracto e não concretizado no tempo e lugar onde aquela afirmação foi proferida, a qual, para além do mais, é já de si criminalmente neutra, sobretudo para o tipo de crime em causa. E caindo a conduta objectiva com ela caiem os correspondentes factos subjectivos, pois que deles eram mera decorrência ─ na verdade, sendo o dolo do domínio interior de cada pessoa, na ausência de confissão do agente ele só pode ser alcançado a partir dos elementos objectivos do tipo,[13] em resultado da conjugação de princípios de normalidade ou regras da experiência comum.[14] Daí que se imponha conceder provimento ao recurso, ainda que por razões e com efeitos parcialmente diversos e, por conseguinte, pese embora o recurso relativo ao pedido de indemnização civil fosse irrecorrível em função do se valor,[15] como de resto defende a recorrida assistente, a verdade é que, sendo a causa de pedir totalmente coincidente com os factos onde a acusação estribara a responsabilidade criminal do demandado e não se tendo demonstrado a realidade deles, o provimento do recurso impõe que daí se retirem todas as consequências legais relativamente a esse pedido, vale dizer, a absolvição do demandado do pedido.[16]
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III - Decisão.
Termos em que se acorda conceder provimento ao recurso, revogar a sentença recorrida e absolver o arguido da acusação e do pedido de indemnização civil que contra ele, respectivamente, o Ministério Público e a demandante deduziram.
Custas a cargo da demandante, sendo que o Ministério Público delas está isento (art.º 513.º, n.º 1, a contrario sensu e 515.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal).
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Porto, 17-06-2015.
Alves Duarte
Castela Rio
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[1] Art.º 412.º, n.º 1 do Código de Processo Penal. Na linha, aliás, do que desde há muito ensinou Alberto dos Reis, no Código de Processo Civil, Anotado, volume V, reimpressão, Coimbra, 1984, página 359: «Para serem legítimas e razoáveis, as conclusões devem emergir logicamente do arrazoado feito na alegação. As conclusões são as proposições sintéticas que emanam naturalmente do que se expôs e considerou ao longo da alegação.»
[2] Que assim é decidiu o Supremo Tribunal de Justiça, em acórdão do Plenário das Secções Criminais, de 19-10-1995, tirado no processo n.º 46.680/3.ª, publicado no Diário da República, série I-A, de 28 de Dezembro de 1995, mantendo esta jurisprudência perfeita actualidade, como se pode ver, inter alia, do acórdão do mesmo Supremo Tribunal de Justiça, de 18-06-2009, consultado em www.dgsi.pt, assim sumariado: «Continua em vigor o acórdão n.º 7/95 do plenário das secções criminais do STJ de 19-09-1995 (DR I Série - A, de 28-12-1995, e BMJ 450.º/71) que, no âmbito do sistema de revista alargada, decidiu ser oficioso, pelo tribunal de recurso, o conhecimento dos vícios indicados no art. 410.º, n.º 2, do CPP, mesmo que o recurso se encontre limitado à matéria de direito.» No sentido propugnado, vd. Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2007, 3.ª edição actualizada, página 1049.
[3] No Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2007, 3.ª edição actualizada, página 725.
[4] Em Jornadas de Direito Processual Penal, Almedina, 1988, página 76.
[5] Art.º 32.º, n.º 1 da Constituição da República.
[6] Art.º 283.º, n.º 3, alínea b) do Código de Processo Penal.
[7] Art.º 32.º, n.º 5 da Constituição da República.
[8] Art.º 379.º, n.º 1, alínea b) do Código de Processo Penal.
[9] Art.os 358.º e 359.º.º do Código de Processo Penal.
[10] Nesse sentido, vd. os acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça, de 06-05-2004, no processo n.º 04P908 e de 02-04-2008, no processo n.º 07P4197, da Relação de Coimbra, de 26-10-2011, no processo n.º 51/07.4GATND.C1 e de 09-05-2012, no processo n.º 222/09.9JACBR.C2 e da Relação de Évora, de 17-09-2013, no processo n.º 97/11.8PFSTB.E1 e de 01-10-2013, no processo n.º 948/11.7PBSTR.E1, publicado em http://www.dgsi.pt.
[11] Acórdão da Relação de Coimbra, de 09-05-2012, no processo n.º 222/09.9JACBR.C2, publicado em http://www.dgsi.pt.
[12] Acórdãos da Relação de Évora, de 17-09-2013, no processo n.º 97/11.8PFSTB.E1 e de 01-10-2013, no processo n.º 948/11.7PBSTR.E1, publicados em http://www.dgsi.pt.
[13] Art.º 127.º do Código de Processo Penal. Neste sentido, cfr. os acórdãos da Relação do Porto, de 08-03-1995, no processo n.º 9441049 e da Relação de Lisboa, de 14-10-1997, no processo n.º 0033945, de 28-01-1997, no processo n.º 0001015 e de 09-04-2013, no processo n.º 641/11.0 JDLSB.L1-5, publicados em http://www.dgsi.pt.
[14] Acórdãos da Relação do Porto, de 28-02-1990, no processo n.º 0123684, de 08-03-1995, no processo n.º 9441049 e de 19-12-2012, no processo n.º 497/08.0GAMCN.P1, da Relação de Lisboa, de 28-01-1997, no processo n.º 0001015, de 23-11-2000, no processo n.º 0065989 e de Guimarães, de 14-12-2005, no processo n.º 1559/05-1, publicados em http://www.dgsi.pt.
[15] Porquanto ao pedido de indemnização civil foi dado o valor € 1.500, a alçada dos tribunais judiciais de 1.ª instância era e é de € 5.000 e só acima deste valor cabe recurso da decisão sobre ele proferida, conforme se alcança dos art.os 24.º, n.º 1 da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro (na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 303/2007, de 24 de Agosto), 44.º, n.º 1 da lei 62/2013, de 26 de Agosto e 400.º, n.º 2 do Código de Processo Penal.
[16] Art.os 402.º, n.os 1 e 2, alínea b) e 403.º, n.º 3 do Código de Processo Penal. Neste sentido, Paulo Pinto de Albuquerque, no Comentário do Código de Processo Penal, Universidade Católica Editora, 2007, 3.ª edição actualizada, página 1034 e Maia Gonçalves, Código de Processo Penal - Anotado, Almedina, 2009, 17.ª edição, página 932.