Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
571/13.1TYVNG.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: ANA PAULA AMORIM
Descritores: PRINCÍPIO INQUISITÓRIO
FALTA DE ASSINATURA
GERENTE
CONVOCATÓRIA
IRREGULARIDADE
Nº do Documento: RP20180924571/13.1TYVNG.P1
Data do Acordão: 09/24/2018
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: CONFIRMADA
Indicações Eventuais: 5ªSECÇÃO, (LIVRO DE REGISTOS N.º680, FLS.91-143)
Área Temática: .
Sumário: I - Esgotadas as diligências de instrução para obter a identificação da testemunha, mostra-se preenchido o dever de cooperação que se exige do juiz, nos termos do art. 7º/ 4 CPC.
II - Ao abrigo do princípio do inquisitório, a que se alude no art. 411º CPC, o tribunal não está em condições de poder ajuizar da necessidade de promover outras diligências de instrução, enquanto não se concluir a produção de prova testemunhal indicada pelas partes.
III - A falta de assinatura do gerente na convocatória dos sócios para a assembleia geral constitui uma irregularidade que se mostra sanada com a intervenção de todos os sócios na assembleia.
IV - A ata avulsa constitui um princípio de prova da deliberação e quando assinada por apenas um sócio não perde esse valor, nos termos do art. 63º/7 do Código das Sociedades Comerciais.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: AnulDelibSociais - RMF - 571/13.1TYVNG
Comarca do Porto
Tribunal do Comércio de Vila Nova de Gaia
2º Juízo
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Juiz Desembargador Relator: Ana Paula Amorim
Juízes Desembargadores Adjuntos: Manuel Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
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Acordam neste Tribunal da Relação do Porto[1] ( 5ª secção judicial – 3ª Secção Cível )
I. Relatório
Na presente ação de anulação de deliberações sociais, que segue a forma de processo sumário, em que figuram como:
- AUTORA: “B…, S.A.”, com sede na Avenida …, n.º …, …, no Porto; e
- RÉ: “C…, Limitada”, com sede no mesmo local, pede a autora que:
a) Seja declarada anulada e de nenhum efeito a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral anual realizada a 1 de Abril de 2013, relativa ao ponto um da ordem de trabalhos, que deliberou aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2012;
b) Seja declarada anulada e de nenhum efeito a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral anual realizada a 1 de Abril de 2013, relativa ao ponto dois da ordem de trabalhos, que deliberou aprovar a proposta de aplicação dos resultados do ano de 2012;
c) Seja declarada nula e de nenhum efeito a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral realizada a 18 de Julho de 2011, relativa ao ponto um da ordem de trabalhos, que deliberou aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2010;
d) Seja declarada nula e de nenhum efeito a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral realizada a 18 de Julho de 2011, relativa ao ponto dois da ordem de trabalhos, que deliberou aprovar a proposta de aplicação dos resultados do ano de 2010;
e) Seja declarada nula e de nenhum efeito a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral realizada a 30 de Março de 2012, relativa ao ponto um da ordem de trabalhos, que deliberou aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2011;
f) Seja declarada nula e de nenhum efeito a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral realizada a 30 de Março de 2012, relativa ao ponto dois da ordem de trabalhos, que deliberou aprovar a proposta de aplicação dos resultados do ano de 2011;
g) Seja declarada a suspensão preventiva imediata de funções dos gerentes da ré, D…, E…, F…, G… e H…, até ao trânsito em julgado da sentença que decidir sobre o pedido de destituição dos referidos gerentes ou, subsidiariamente, ser exigida e fixada a cada um daqueles gerentes a prestação de uma caução de valor não inferior a 50.000,00 euros, até ao trânsito em julgado da decisão que deliberar sobre a destituição dos mesmos gerentes;
h) Seja declarado o reembolso imediato dos suprimentos que a autora efetuou à ré no montante de 40.290,00 euros, acrescido de juros à taxa legal, contados desde 31 de Dezembro de 2009, até ao seu efetivo pagamento, ou, subsidiariamente, seja fixado prazo para o reembolso desses suprimentos, ao abrigo do disposto no art. 777º, n.º 2, do Código Civil e no art. 245º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais;
i) Seja declarada válida, para todos os efeitos legais, a deliberação dos sócios da ré tomada na assembleia geral anual realizada a 1 de Abril de 2013, relativa ao ponto três da ordem de trabalhos, que deliberou destituir com justa causa os gerentes da ré D…, E…, F…, G… e H….
A autora requereu, ainda, a notificação dos réus que estiveram presentes na assembleia geral realizada a 1 de Abril de 2013 para se dirigirem à Rua …, n.º …, …, Viana do Castelo, a fim de assinarem até ao dia 31 de Maio de 2013, sob cominação de aplicação de multa, a ata avulsa daquela assembleia geral.
Alegou, para o efeito, que, é sócia da ré, sucedendo que a assembleia geral anual deveria ter sido realizada até 31 de Março de 2013, o que não foi respeitado, sendo certo que os documentos de prestação de contas não estavam disponíveis na data indicada na convocatória, a qual também não se mostra assinada pelos gerentes em exercício, assim como não contém na ordem de trabalhos a eleição da gerência. Por outro lado, as contas fazem referência à realização de trabalhos de limpeza e de vedação, os quais suscitam dúvidas, não tendo a ré prestado as informações requeridas a esse propósito. A decisão relativa a tais trabalhos visou apenas impossibilitar o reembolso dos suprimentos à autora. A contabilidade da ré não reflete a realidade, designadamente no que diz respeito ao saldo existente em contas bancárias e ao pagamento de suprimentos. Os gerentes não têm cumprido os deveres de cuidado e de lealdade a que estão sujeitos, designadamente, não promoveram que os documentos de prestação de contas fossem assinados por todos os gerentes, não promoveram o registo de atos a ele sujeitos, não corrigiram erros existentes na contabilidade e não reembolsaram os suprimentos à autora. Para além disso, as contas dos anos de 2009, 2010 e 2011 são falsas, uma vez que delas constam valores de depósitos à ordem inferiores aos que a ré possui e indicam valores em dívida à autora inferiores aos devidos, a título de suprimentos, sendo certo que a ré não cumpriu o prazo concedido para o reembolso dos suprimentos que lhe são devidos, no montante de 40.290,00 euros.
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A ré contestou, defendendo-se por exceção.
Suscita a nulidade do processado por ineptidão da petição inicial por ininteligibilidade da causa de pedir.
Invoca a exceção de ilegitimidade passiva quanto ao pedido formulado na alínea g), o erro na forma de processo quanto ao pedido formulado na alínea h), que a presente ação não é idónea a atingir os fins visados pela autora, a litispendência, considerando a pendência da ação n.º 1027/10.0TYVNG, deste Juízo de Comércio, bem como, a caducidade do direito de propor a presente ação no que diz respeito às deliberações tomadas nas assembleia gerais de 18 de Julho de 2011 e de 30 de Março de 2012.
Por impugnação, apresenta a sua versão dos factos, nomeadamente no que diz respeito aos trabalhos de limpeza e vedação a que diz respeito a fatura identificada no artigo 37º da petição inicial.
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A autora respondeu com os fundamentos constantes do articulado de fls. 104 a 111, no qual impugna a matéria das nulidades e exceções suscitadas.
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Foi realizada audiência prévia e proferido despacho saneador, no âmbito do qual se fixou à ação o valor de 30.000,01 euros, se julgou improcedente a exceção da ineptidão da petição inicial, se absolveu a ré da instância relativamente aos pedidos descritos nas alíneas g) e h), por erro na forma de processo, se absolveu a ré do pedido formulado na alínea i) e se relegou para final o conhecimento da exceção da caducidade.
Proferiu-se despacho que indicou o objeto do litígio e foram enunciados os temas da prova.
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A autora apresentou reclamação, nos termos do disposto no art. 596º, n.º 2, do Código de Processo Civil, a qual foi julgada improcedente por decisão proferida a 19 de Dezembro de 2015.
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Realizou-se a audiência de discussão e julgamento com observância de todas as formalidades legais.
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A Autora veio interpor recurso dos despachos proferidos em 12 de setembro de 2017 e 28 de setembro de 2017.
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Nas alegações que apresentou formulou as seguintes conclusões:
1ª - Vem o presente recurso dos despachos proferidos em 12/09/2017 a fls. …-… dos autos, bem assim dos despachos proferidos na audiência de julgamento de 28/09/2017, conforme ata de fls. …-… .
2ª - A assembleia-geral de 01/04/2013 é uma assembleia anual, isto é, realiza-se uma vez por ano para a apreciação e deliberação sobre as contas do último exercício económico da sociedade, para apreciar a gestão realizada no exercício, para deliberar a distribuição do resultado económico em caso de lucro ou o seu destino em caso de prejuízo e para proceder a eleições, sem prejuízo de outros pontos que, pelo seu objeto, venham a ser incluídos na ordem de trabalhos. A assembleia em causa foi presidida e secretariada pelo representante da Autora por ser titular da maior parte do capital social da Ré.
3ª - A Autora juntou com a petição inicial a minuta da ata da assembleia-geral em causa. E como se verifica dos autos, a fls. …-..., notificou o gerente da Ré, AE…, da referida minuta para os efeitos do disposto no nº 4 do artigo 59º do CSC. Nessa assembleia foi deliberada a destituição dos gerentes E…, D…, H…, G… e F…, tal como se alcança da referida ata, para os efeitos do disposto no nº 5 do artigo 59º do CSC.
4ª - A Autora requereu no final da petição inicial para que o tribunal notificasse os sócios da Ré que estiveram presentes na assembleia-geral realizada no dia 01/04/2013 para se dirigirem à Rua …, nº …, …, …. - … Viana do Castelo, a fim de assinarem até ao dia 31/05/2013, sob cominação de aplicação de multa se não o fizerem, a ata avulsa da assembleia junta aos autos sob a forma de documento nº 3. O tribunal a quo não deu cumprimento ao requerido, e a prova foi encerrada sem que a ata da assembleia-geral tivesse sido assinada pelos sócios que votaram no sentido da aprovação dos pontos um e dois da ordem de trabalhos.
5ª - Nos autos não existe qualquer documento, nomeadamente, ata elaborada nos termos do artigo 59º do CSC, que comprove que os pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos tenham sido aprovados. As deliberações dos pontos 1 e 2 só podem ser aprovadas pelas atas das assembleias assinadas por todos os sócios votantes no sentido que fez vencimento quanto àqueles pontos da ordem de trabalhos. Pelo que, no final só podem ser declaradas nulas e inexistentes aquelas deliberações, conforme o disposto nos artigo 59º nº 4 e 5 e 63º nº 1 do CSC.
6ª - A Autora alega no ponto 71 da petição inicial que tem para si a convicção de que a fatura nº …/2012. do montante de 20.117,88 euros emitida à ordem da Ré, por I… Lda., é falsa e não corresponde efetivamente às transmissões de bens e serviços.
7ª – O tribunal recorrido indeferiu os meios de prova constantes dos requerimentos probatórios de 08/11/2013 (referência 15002428, ponto 3.) e de 29/02/2016 (ponto C. 3. alínea e), onde se requisitou o fornecimento de todos os dados referentes à fatura …/2012.).
8ª - Na falta dos documentos referidos na conclusão anterior (7ª), e como os funcionários que alegadamente terão executado os trabalhos não sabiam os preços unitários dos materiais (conforme os depoimentos dos primeiros trabalhadores interrogados J…, K…, L… e M…), e em consequência dos depoimentos destas testemunhas, a Autora pretendeu juntar aos autos documentos com os preços unitários de mercado dos materiais alegadamente utilizados na construção da vedação.
9ª - Só com semelhante informação é que o tribunal, a nosso ver, estaria em condições de aquilatar se os custos da mão-de-obra somados aos custos dos materiais poderiam justificar o valor da fatura. Por isso, e na convicção de que os custos da fatura são demasiadamente excessivos, a Autora requereu que os autos fossem com vista ao Ministério Público, onde no DIAP corre uma investigação sobre um cheque emitido pela Ré a favor da empresa N… Lda., extraído dos autos de anulação de deliberações sociais que correm termos neste Juízo de Comércio, Juiz 3, sob o processo nº 1027/10.0TYVNG.
10ª - Os documentos cuja junção foi indeferida pelo despacho recorrido referem-se a preços de custo da rede ovelheira e do arame ecover de 2,20 mm, materiais que os funcionários ouvidos nos seus depoimentos indicaram ter sido usados na obra. Deles também constam um mail da empresa O…, Lda. e duas faturas de limpeza do terreno da Ré efetuadas em 28/05/2010 e 13/12/2010 por P…. Das referidas faturas verifica-se que os materiais usados na construção da vedação e o trabalho realizado na limpeza poderiam ter custado cerca de 1.000,00 euros, que acrescido da mão-de-obra poderia chegar a um máximo de 3.000,00 euros. E se considerarmos cerca de 30% de lucro para a empresa sobre os materiais e sobre a mão-de-obra, o trabalho de construção da vedação não ultrapassaria os 4.000,00 euros acrescido de IVA à taxa vigente (23 %).
11ª - Com os poderes de investigação do tribunal, eventualmente coadjuvado por inspetor tributário que procedesse à análise do ficheiro SAFT da faturação do mês de Dezembro da empresa I… Lda., certamente se concluiria que os valores da fatura em causa não correspondem ao valor médio do preço de mercado da transmissão dos bens e serviços da realização da limpeza do terreno e da construção da vedação em causa nos autos acrescida de uma taxa de lucro de 30% praticada em média nos serviços e nas transmissões de bens que aquela empresa realizou durante o ano de 2012, como se alcançaria da IES (informação empresarial simplificada) do ano de 2012 registada na conservatória do registo predial de Vila Nova de Cerveira.
12ª - No processo, e tendo em vista a descoberta da verdade sobre o custo da vedação do terreno da Ré, constante da fatura da empresa I…, Lda. nos autos, e assim se faça justiça, a Autora requereu perícias para determinar se o valor da fatura em causa é ou não simulado como alega. Tratando-se de trabalhos objetivos, através de peritagem aos materiais empregues à quantidade de horas de trabalho, ao número de trabalhadores e à qualificação dos trabalhadores, facilmente se chegaria ao custo final com elevado rigor sobre os trabalhos de limpeza e vedação do terreno da Ré. Apesar disso, e pretendendo demonstrar por outro meio que a fatura é simulada, solicitou a junção aos autos de diversos orçamentos com os preços dos materiais usados na vedação, designadamente, e em conformidade com o afirmado em julgamento pelos primeiros trabalhadores que prestaram depoimento, pilares, rede ovelheira, arame, faturas de limpeza do terreno da Ré efetuadas nos anos imediatamente anteriores de 2010 e 2011. Em vão, porque o Tribunal a quo tudo indeferiu.
13ª - Dos autos consta um desenho (ou croquis) do terreno, que a Ré na contestação discriminou a sua composição por metros lineares e indicou o perímetro do terreno que alegadamente foi vedado. Porém, não sendo assim, como poderá o tribunal, que cerceou todos os meios de prova da Autora quanto à alegação da simulação da fatura …/2012. nos autos, apreciar e analisar este documento relativamente à alegação de simulação, se não dispõe dos meios probatórios que o permitiriam fazer. Tanto mais que, tendo o Tribunal ouvido como testemunhas os trabalhadores que supostamente poderão ter participado na realização dos trabalhos de vedação em causa, poderia formar uma opinião sobre o número de horas de trabalho de cada alegado trabalhador e a sua.
14ª - De outro modo, e sempre com a devida vénia e respeito, que é muito, a Autora ficou com a impressão que o Tribunal não quis formar uma opinião sobre se o preço constante da fatura em causa é ou não excessivo e se esse fator para um bom pai de família constitui indício sério de simulação do valor facial da fatura.
Não ficamos convencidos, que o tribunal esteja apto a decidir, se não instruiu o processo com os elementos de prova que se impunham neles estivessem, desde que requeridos pelas partes, como o foram pela Autora.
A A. não tem dúvidas de que o valor do custo da vedação está excessivamente inflacionado, e não corresponde minimamente ao valor de mercado face ao volume de trabalhos que se encontram discriminados no orçamento e na fatura de fls. …-… . O que contribuiu para que a Autora esteja convencida da simulação da referida fatura.
15ª - O Tribunal, não usou da prudência que se exige para esclarecer com elevado grau de rigor o valor dos trabalhos de vedação em causa e formar a convicção da existência de valores simulados na contabilidade da Ré. E também não permitiu esclarecer ao serviço de quem estavam os trabalhadores que segundo a Ré terão realizado a vedação em causa no momento da sua realização. Não permitiu que fosse ouvido por videoconferência no Consulado da área da sua residência, a testemunha Q…, indicado pela empresa I… Lda. como tendo participado na realização da vedação. Não permitiu que a Autora apresentasse nos autos os orçamentos dos materiais usados na construção da vedação para puder determinar o custo técnico e económico dos mesmos. Em vez de solicitar a coadjuvação de outras autoridades, o tribunal recorrido com os despachos proferidos impede que a Autora possa provar que os trabalhadores que a Ré indicou como estando ao serviço dos I… Lda. não eram funcionários daquela empresa na data em que a obra terá sido realizada. Facto que é essencial para que o tribunal faça justiça.
16ª – O tribunal recorrido contrariou o decidido no acórdão proferido pela Relação do Porto, conforme fls. …-… ., pois, não permitiu que os trabalhadores S… e Q… fossem ouvidos. Depoimentos que a Autora considera essenciais, e que podem ser determinantes para que se faça justiça. Isto porque, por requerimento de 08/06/2017, a fls. …-…, a representante de Q… veio aos autos alegar por escrito que “não sabe porque foi chamado como testemunha deste processo visto não conhecer os intervenientes, nunca trabalhou com ou para eles e nunca ouviu falar das duas empresas referidas no mesmo”. Sendo assim não sabe sequer como o seu testemunho poderia ser útil. Calcula que poderá ter ocorrido algum erro na identificação de alguma testemunha (sic)”.
17ª - O tribunal a quo ao indeferir o requerido nos 2 despachos proferidos na audiência de julgamento de 12/09/2017, conforme a ata de fls. …-…, negou à Autora o direito ao exercício do contraditório, contendeu com a admissibilidade de meios probatórios imprescindíveis a que se faça justiça, e impediu que se verificasse com o rigor e a segurança que se exige, se os trabalhadores indicados (com os NISS já fornecidos) pela empresa I… Lda. Prestaram ou não trabalho para esta empresa no período a que se refere a fatura nº …./2012. de 06/12/2012, através da requisição de informação à Segurança Social.
18ª - Os despachos recorridos não concretizam nem fundamentam, de facto e de direito, as razões do indeferimento das provas requeridas pela Autora, que se mostram essenciais à descoberta da verdade e à justa composição das partes e do litígio, nomeadamente, os fundamentos de direito que lhe permitissem decidir como decidiu.
19ª - Ao indeferir as perícias e os meios probatórios solicitados no requerimento probatório de 29/02/2016 o tribunal a quo cerceou significativamente a prova da Autora, e nessa situação, sempre deveria ter-se assessorado, o que não fez, como determina o disposto no artigo 202º nº 3 da Constituição. Apesar disso, a Autora reuniu o conjunto de informações possível face às decisões proferidas, que carreou para o processo e que permitiriam ao tribunal recorrido provar a atuação da Ré, através dos seus gerentes e sócios, em manifesto abuso de poder, sempre no seu interesse e de terceiros, prejudicando os interesses da Ré e da Autora, o que é contrário ao exercício do bem social constitucionalmente protegido da administração da Justiça.
20ª - É essencial para o tribunal identificar e quantificar os erros de facto e de direito resultantes da simulação da fatura em causa, assim como para o tribunal poder decidir das questões sobre as deliberações de aprovação tomadas nos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos da assembleia-geral impugnada, é essencial a produção da prova testemunhal que foi indeferida, como também se qualifica como necessária a prova documental e pericial outrora indeferida.
21ª - Para o tribunal poder decidir das questões sobre as deliberações de aprovação tomadas na assembleia-geral impugnada no ponto 3 da ordem de trabalhos, é essencial a produção de prova documental, testemunhal e pericial que deve subsumir-se aos pressupostos do disposto no artigo 376º nº 1 alíneas c) e d) do Código das Sociedades Comerciais aplicável à assembleia-geral da R., por remissão do disposto no nº 1 do artigo 248º daquele diploma legal.
22ª - Uma das questões essenciais, é a de verificar se os documentos de prestação de contas em causa foram elaborados incorporando atos e contratos simulados pelos gerentes da R., designadamente, o elevado custo da alegada vedação do terreno a que se refere a fatura nº .../2012. de 06/12/2012 do montante de €20.117,88; e de verificar se os gerentes que elaboraram tais documentos de prestação de contas são simultaneamente sócios da R., os quais, atuando em conluio e com abuso de poder, formam a maioria que lhes permite aprovar as contas da sua própria gestão, ruinosa e simulada, praticando atos e contratos de gestão simulados quanto ao valor, a quantidade e a qualidade dos serviços prestados em prejuízo da R., dos sócios e de terceiros.
A provar-se ser verdade, estes factos violam de forma indireta preceitos legais relativos à elaboração do relatório de gestão, das contas do exercício e de demais documentos de prestação de contas da Ré e podem conduzir à anulação das deliberações sociais tomadas na assembleia geral impugnada por esta ação.
23ª – As decisões recorridas violaram o princípio do inquisitório estabelecido no artigo 411º do CPC, na medida em que “incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.”
Como exceção a este princípio, dispõe o nº 1 do artigo 412º do CPC que, “não carecem de prova nem de alegação os factos notórios, devendo considerar-se como tais os factos que são do conhecimento geral”.
Ainda como exceção ao princípio do inquisitório, dispõe o nº 2 do artº 412º do CPC que “também não carecem de alegação os factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções; quando o tribunal se socorra destes factos, deve fazer juntar ao processo documento que os comprove.”
E estabelece o artigo 413º do CPC, que foi violado, que “o tribunal deve tomar em consideração todas as provas produzidas, tenham ou não emanado da parte que devia produzi-las, sem prejuízo das disposições que declarem irrelevante a alegação de um facto, quando não seja feita por certo interessado.”
24ª - Que sentido faz confinar e limitar as partes à alegação de factos essenciais, impedindo-as assim de alegar, de forma pertinente e concisa, todos os factos relevantes para a decisão dos pedidos ou das exceções e que integram as situações da vida real em que elas próprias tiveram intervenção, e depois vir a conferir ao juiz o poder de carrear e de conhecer factos que é ele próprio quem os vem a considerar como necessários para a decisão desses mesmos pedidos e das exceções, sejam esses factos instrumentais ou factos complementares ou concretizadores dos essenciais?
Afigura-se que há aqui uma flagrante contradição, pois, o que se retira às partes, confinando-as à alegação de factos essenciais, põe-se a cargo do juiz, dando-lhe o poder de carrear, através do inquisitório, factos destinados a completar e a concretizar os que as partes alegaram, o que constitui uma entorse e um esvaziamento injustificado do princípio do dispositivo e do consequente direito de impulso processual, enquanto corolários e consequência do direito à capacidade civil, na sua dupla vertente de capacidade jurídica de gozo e de capacidade de exercício, e que o n.º 1 do art. 26.º da Constituição reconhece e consagra como um direito pessoal com a natureza de direito fundamental.
25ª - Para o tribunal se pronunciar sobre os pedidos de anulação das deliberações em causa tomadas na assembleia-geral da R. no âmbito dos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos, terá de se pronunciar não apenas sobre se existem ou não irregularidades nos documentos de prestação de contas da R. apresentados pelos gerentes em causa, mas também sobre a gravidade das irregularidades e ainda sobre se tais irregularidades são ou não de fácil correção.
No CPC de 2013, ao juiz do processo civil são conferidos mais poderes inquisitórios em matéria de produção de provas, pois, para além do poder que já lhe era conferido para realizar ou ordenar oficiosamente todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, o qual encontra agora assento no art. 411.º, são-lhe ainda conferidos poderes para:
a) Já depois de o processo lhe ter sido concluso para proferir sentença e “se não se julgar suficientemente esclarecido”, voltar a reabrir a audiência de julgamento, “ouvindo as pessoas que entender e ordenando as demais diligências necessárias” - cf. n.º 1 do art. 607º do CPC;
b) ou ainda para se impor à Relação, como resulta do disposto na alínea b) do n.º 2 do art. 662.º, o dever de “ordenar, em caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, a produção de novos meios de prova”, isto é, não a renovação dos meios de prova que as partes requereram e que se encontra prevista na alínea a) do n.º 2 do dito art. 662.º, mas sim a produção de novos meios de prova que nenhuma das partes requereu subvertendo-se, por completo, as regras substantivas sobre o ónus da prova.
26ª - Sem embargo de o juiz dever indicar, de forma prévia e fundamentada, a razão pela qual tem intenção de ordenar ex oficio diligências instrutórias e de assegurar o prévio contraditório de ambas as partes, afigura-se, no entanto, que apenas o deverá fazer para remover obstáculos ou impedimentos à produção de meios de prova que, previamente, tenham sido requeridos, por qualquer das partes. Ora, no caso dos autos, parece-nos que o juiz a quo não faz uso da tal ampliação dos poderes inquisitórios, na medida em que cerceou a prova da Autora. Ora, se é certo que a agilização processual, ou seja, a tomada de medidas que visem a tramitação célere do processo, se pode considerar, pacificamente, incluída nas matérias passíveis de ser objeto da gestão processual, já é duvidoso que as medidas de simplificação processual também façam parte da gestão do processo, pois, embora a parte final do n.º 1 do art. 6.º do CPC as considere ainda incluídas no dever de gestão processual, os atos que, num concreto processo, visem simplificar a tramitação que a lei para ele prevê, seja aligeirando, seja suprimindo atos ou formalidades que podem ser dispensáveis, já fazem parte, em bom rigor, da sua adequação formal, uma vez que envolvem a adaptação da sua tramitação.
Cumpre ao juiz, sem prejuízo do ónus de impulso especialmente imposto pela lei às partes, dirigir ativamente o processo e providenciar pelo seu andamento célere, promovendo oficiosamente as diligências necessárias ao normal prosseguimento da ação, recusando o que for impertinente ou meramente dilatório e, ouvidas as partes, adotando mecanismos de simplificação e agilização processual que garantam a justa composição do litígio em prazo razoável.
27ª - Ao indeferir a prova requerida pela Autora, não atendeu sem fundamentação de facto e de direito ou com fundamentação obscura ou incompleta as provas requeridas que constam do seu requerimento de prova. O tribunal, ao decidir como decidiu, cerceou a iniciativa da Autora e afetando brutalmente a sua prova.
Com todo o devido respeito, está-se a denegar a Justiça, podendo o tribunal a quo estar a laborar em erro, a nosso ver, grave, porquanto se discute a anulação de deliberações sociais de aprovação de contas (pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos da assembleia impugnada) onde se incluem as contas de despesas de limpezas e vedações alegadamente realizadas para a Ré por aquela sociedade, que a Autora considera ter havido simulação. Se as despesas e o contrato foram simulados, as contas da Ré (que foram aprovadas na assembleia impugnada) são, necessariamente, nulas por não refletirem a realidade económica e financeira da empresa. Tem a Autora de o provar que os alegados trabalhos foram realizados ou não e que o preço cobrado é ou não o correspondente ao preço de mercado. A Autora já pediu por diversas vezes informação sobre todas estas questões aos gerentes da Ré antes da assembleia-geral que aprovou as contas impugnadas, mas que estes não prestaram.
28ª - Não tem a Autora outra forma legal de poder sindicar a simulação desses contratos, senão através das diligências de prova que requereu tempestivamente, mas que o tribunal indeferiu. E do que, assim, está impedida e sai seriamente prejudicada na sua posição processual. Antevê, por isso, que não terá outra oportunidade de fazer a prova desses factos, neste ou noutro processo judicial, sendo seu esse ónus. A não ser que ad quem se partilhe do entendimento da Recorrente, e se vá ainda a tempo de retificar o decidido, segundo os princípios da cooperação, da adequação formal do processo, do dispositivo, da imparcialidade, da igualdade das partes, do contraditório, da equidade, da celeridade processual, entre outros preteritamente citados.
29ª - A interpretação concreta que o tribunal recorrido deu ao disposto no artigo 423º nº3 do CPC, para fundamentar que não se mostram reunidos os pressupostos para que os documentos fossem aceites nesta fase processual, ou porque estivesse vedado à Autora (conforme despacho recorrido de 12/09/2017), é inconstitucional por violar o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade, o princípio do contraditório, o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança plasmados respetivamente nos artigos 13°, 18° n.° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
30ª - Quod non est in actis non est in mundo.
Razão pela qual a Autora, e para que se faça justiça, mantém que os documentos indeferidos de fls. …-…, sejam admitidos para efeitos da apreciação da lide e da convicção do julgador na decisão que vier a ser proferida. Em função do despacho recorrido ter contendido com os princípios da igualdade e do contraditório e com a admissibilidade de meios probatório requeridos pela Autora, deve o mesmo ser revogado e substituído por outro no sentido de que seja deferido tudo quanto foi requerido pela Autora nos requerimentos que provocaram a prolação dos doutos despachos recorridos.
31ª - A nosso ver, os doutos despachos recorridos violaram as normas citadas ao longo das alegações.
Termina por pedir o provimento do recurso com a revogação da decisão recorrida.
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A Ré veio apresentar resposta ao recurso, onde em síntese refere que os recursos devem ser rejeitados, porque o recurso do despacho proferido em 12 de setembro de 2017 foi interposto depois de expirado o prazo concedido para o efeito e o recurso de um dos despachos proferidos em 28 de setembro de 2017 não é admissível, por se tratar de despacho de mero expediente.
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Os recursos foram admitidos como recursos de apelação.
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Proferiu-se sentença com a decisão que se transcreve:
“Pelo exposto, julgo improcedente a presente ação e, em consequência, absolvo a ré do pedido.
Custas a cargo da autora”.
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A Autora veio interpor recurso da sentença.
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Nas alegações que apresentou a apelante formulou as seguintes conclusões:
1ª - A decisão de mérito tomada pelo tribunal a quo não reflete o julgamento da causa. A decisão é inexpectável para a Recorrente, e traduz-se numa decisão surpresa.
2ª - A 1ª instância julgou provados os factos h), i), j) k), l) e m) relativamente ao lançamento na contabilidade da Ré, a partir da cópia de um cheque do valor facial de 5.547,20 euros, de idêntico valor como se tivessem sido pagos os suprimentos à Autora. Em consequência dessa decisão, verifica-se na contabilidade da Ré a desconformidade entre o saldo contabilístico, o saldo bancário
e o saldo de suprimentos. Com exceção da Autora, todos os restantes sócios da Ré foram reembolsados dos seus suprimentos, tendo a sociedade emitido cheques a favor destes, que os receberam. A medida de não pagar os suprimentos à Autora não tem suporte social tampouco fundamento legal, e visou o benefício de uns sócios e o prejuízo de outros, sendo concretamente para atingir a Autora. O cheque em causa que a Ré emitiu a favor da Autora para reembolso parcial dos seus suprimentos nunca foi entregue à Autora, que nunca o recebeu. Apesar disso, e conscientes dessa situação, os gerentes da Ré e o contabilista certificado mantiveram uma cópia desse cheque contabilizada a débito da conta de suprimentos da Autora, falseando a contabilidade da Ré pelo menos desde o ano de 2009. Por esse facto, a contabilidade da Ré passou a apresentar um saldo no passivo de suprimentos inferior em 5.547,20 euros, e simultaneamente a conta de depósitos bancários que integra o ativo da Ré registava um saldo inferior em 5.547,20 euros do que o saldo que o banco apresentava.
Em virtude dos mesmos factos, na contabilidade da ré, a conta de suprimentos da autora não coincide com o valor devido à mesma a esse título, sendo inferior.
Desta forma, em consequência deste lançamento ilegal, o ativo e o passivo da Ré evidenciaram valores falseados nos exercícios de 2009, 2010, 2011 e 2012.
3ª - Esta situação de facto não foi retificada até ao exercício económico de 2012. E inquinou as contas do exercício anual de 2012 da sociedade. Os extratos demonstram que o cheque nunca foi levantado no banco porque a Ré nunca o entregou à Autora, e esta nunca emitiu recibo de reembolso dos respetivos suprimentos (facto provados h), i), j) e k)).Este facto era do conhecimento da Ré, que manteve a sua contabilidade falseada nos anos de 2010, 2011 e 2012, pelo menos. O tribunal recorrido não valorou o extrato (documento nº 8 junto à petição inicial) conjugadamente com os factos que deu por provados, o que deveria ter considerado para a formação da sua convicção quanto à decisão final. Apesar de o tribunal ter valorizado que as desconformidades contabilísticas foram retificadas não se pronunciou, porém, sobre o momento em que as desconformidades foram retificadas. O que tudo decorre do texto da douta sentença (sob os capítulos “Os factos”, “Motivação” e “O direito”). E evidencia obscuridade e contradição, bem como erro de julgamento da matéria de facto por desvio da realidade factual e falsa representação da mesma.
4ª - Ao ter dado como provados os factos h), i), j) k), l) e m) relativamente ao lançamento na contabilidade da Ré, a partir da cópia de um cheque do valor facial de 5.547,20 euros, de idêntico valor como se tivessem sido pagos os suprimentos à Autora, o que causou desconformidade dos saldos da contabilidade, bancário e de suprimentos ao ponto de as contas da Ré que foram apresentadas a deliberação social de aprovação do exercício de 2012, o tribunal recorrido deveria ter declarado a nulidade ou a anulabilidade da deliberação do ponto um da ordem de trabalhos da respetiva assembleia-geral anual de sócios. Não o tendo feito, violou a lei por não ter aplicado as normas que deveria ter aplicado no enquadramento jurídico dos factos. Esta situação viola os preceitos legais relativos à elaboração do relatório de gestão, das contas do exercício e dos demais documentos de prestação de contas, nomeadamente, o disposto no Decreto-Lei nº 158/2009, de 13 de Julho, além de violar os princípios de contabilidade.
Pelo que, a deliberação social sobre o ponto um da ordem de trabalhos sofre do vício de violação da lei. E torna anuláveis as deliberações relativas aos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos da assembleia impugnada.
5ª - A interpretação que o tribunal recorrido fez do disposto nos artigos 58º nº 1 alínea a) e 69º nº 3 do CSC para fundamentar que a desconformidade dos saldos contabilístico, bancário e de suprimentos da contabilidade de sociedade comercial por quotas não é subsumível a qualquer causa de nulidade e de anulabilidade de deliberações sociais, é inconstitucional por infringir o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade, o princípio da proporcionalidade, o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança e o princípio da incumbência dos tribunais assegurarem dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos plasmados respetivamente nos artigos 13°, 18° n.° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
6ª - Não se conforma a Recorrente com o que o tribunal recorrido decidiu a propósito da falta de informação sobre a obra de limpeza e desmatação do prédio da Ré a que se refere o facto provado f) e quanto aos factos provados em y).
Do facto y) resulta que o representante da sócia B…, SA declarou que não obteve quaisquer informações sobre a origem da fatura nº …/2012. de 06/12/2012 emitida pela sociedade I… Lda. no valor total de €20.117,88, e que por isso, pretendia ser informado por escrito sobre a substância das transmissões de bens e serviços que deram origem àquela fatura, designadamente a descrição fiel e verdadeira dos eventuais trabalhos realizados, as quantidades dos materiais e de mão-de-obra aplicado e os respetivos preços unitários, as fotocópias de todos os orçamentos solicitados para a realização da obra, a cópia da ta da reunião do conselho de gerência em que foi deliberada a realização das obras, e a cópia de frente e do verso do cheque emitido para pagamento da fatura.
Resulta da petição inicial, que a Autora invocou a falta de informações prévias destinadas à aprovação das contas do exercício de 2012. Não resulta provado dos autos que os esclarecimentos solicitados pela Autora tenham sido prestados pela Ré, quer na assembleia-geral de 01/04/2013 quer posteriormente.
7ª - A Autora só teve acesso às informações que solicitou quanto à descrição dos trabalhos e a um orçamento de obra no decurso da ação (o de fls. 387 e seguintes), e somente depois do douto acórdão proferido pela Relação do Porto, a fls. …-… do Apenso de recurso, que ordenou a baixa do processo à primeira instância para a realização de outras diligências probatórias. Como consta da sentença recorrida (no capítulo “Motivação”), na contabilidade apenas existia a fatura, a propósito da fatura .../2012. nos autos a fls. 42. O que terá sido dito em julgamento, pela testemunha U…, conforme os factos provados gg) e hh) e o referido expressamente pela Meritíssima Juíza na douta sentença. Ora, se na contabilidade só constava a referida fatura (o que está assente nos autos), está claro que não foram fornecidos todos os elementos mínimos de informação previamente à assembleia-geral de 01/04/2013 para efeitos de deliberação social de aprovação da prestação de contas do exercício de 2012. Nomeadamente, os que estão consignados na ata da assembleia-geral de 01/04/2013 junta com a petição inicial sob a forma de documento nº 3 a fls. …-… , conforme o facto provado y).
Aliás, resulta da sentença (no capítulo “Motivação”) que “Aquando do seu depoimento (o da testemunha AG…) não se encontravam ainda juntos ao processo os documentos de fls. 387 e seguintes”. Esta testemunha foi inquirida antes da prolação do douto Acórdão da Relação do Porto, no Apenso de recurso. Pelo que, os documentos de fls. 387 e seguintes, que já tinham sido solicitados pela Recorrente na visita ao contabilista, e que voltaram a ser solicitados no final da petição inicial (como dela se alcança), só chegaram ao conhecimento da sócia B… Lda. no decurso do processo, mais de 3 anos depois da realização da assembleia-geral e só posteriormente à intervenção processual da empresa “I… Lda.”. O que se constata de forma clara e esclarecida nos autos.
8ª - Foi, por conseguinte, ocultada informação mínima, nomeadamente, a descrição fiel e verdadeira dos trabalhos realizados, como os orçamentos, os levantamentos topográficos, a descrição dos preços unitários, dos materiais utilizados, e cópia do cheque relacionado com a fatura …/2012. de fls. 42.
Ora, face ao que consta da douta sentença, entra em contradição quando refere (no capítulo “O Direito”) que “No caso em apreço, não resulta dos factos provados que, previamente à assembleia-geral de 1 de Abril de 2013, a autora tenha solicitado aos gerentes da ré alguma informação que não lhe tenha sido prestada (não resulta do alegado que lhe tenha sido recusada a consulta dos documentos da ré).
O que não se concebe e dá o flanco à interrogação face ao que resulta expressamente da sentença. Por conseguinte, a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento da matéria de facto por desvio da realidade e enferma da nulidade referida na alínea c) do nº 1 do artigo 615º do CPC.
9ª - A sentença recorrida considera que as informações em assembleia-geral, a que se refere o nº 1 do artigo 290º do CSC, não se reportam à entrega de documentos preparatórios da assembleia, mas sim ao esclarecimento de dúvidas durante a assembleia, à resposta a todas as questões pertinentes que forem colocados pelos sócios. Ainda assim, resulta da ata avulsa, que o tribunal recorrido valorou para efeitos da ação, o que consta do facto provado y). Da ata resultam os pedidos de informação e esclarecimentos preteritamente transcritos. Em nenhuma parte do artigo 290º do CSC se refere que a norma se refere apenas às informações ou esclarecimentos verbais ou orais. As informações e os esclarecimentos solicitados, quer os solicitados previamente à assembleia em causa, quer os solicitados na própria assembleia-geral de 01/04/2013 pela sócia B… Lda., não foram prestados pela Ré (através dos seus gerentes) à sócia. A falta de prestação das informações e dos esclarecimentos solicitados pela Recorrente não foram justificados, como resulta da respetiva ata avulsa.
10ª - E não se diga que não resulta do alegado que tenha sido recusada à Autora a consulta dos documentos relacionados com a fatura nº …/2012 ., como expressamente vem referido na sentença (no capítulo “O Direito”).Veja-se o que a Autora alegou no artigo 43º da petição inicial, alegação que foi obliterada pelo tribunal recorrido, e ainda o que resulta dos pontos 44º, 46º e 47º da petição inicial, que o tribunal recorrido deu como não provados. Não foi, por isso, por falta de alegação. O que há é falta de informação, ou informação incompleta, o que não deixa de ser contrário à lei e simultaneamente fonte de prejuízo social. A recusa injustificada das informações, assim como a informação incompleta, constitui causa de anulabilidade das deliberações dos pontos um e dois da assembleia-geral anual de 01/04/2013.
11ª - A sentença recorrida sofre do vício violação da lei, pois, não aplicou (ou aplicou mal) o que resulta do disposto nos artigos 21º nº 1 alínea b) e 290º nº 1, 2 e 3 ambos do CSC. A falta de prestação das informações e dos esclarecimentos solicitados pela Recorrente constitui causa de anulabilidade dos pontos um e dois da ordem de trabalhos, conforme o disposto no artigo 58º nº 1 alínea c) e nº 4 alíneas a) e b) do CSC.
Pelo, que deve ser revogada a decisão a quo nesta matéria.
12ª - A interpretação que o tribunal recorrido fez do disposto nos artigo 290º do CSC para fundamentar que a natureza das informações a prestar ao abrigo daquela norma se restringe a informações ou esclarecimentos oral ou verbalmente prestados, não sendo exigível a entrega ou disponibilização de informação escrita ou de documentos para consulta no próprio ato, não sendo subsumível a qualquer causa de nulidade ou de anulabilidade de deliberações sociais, é inconstitucional por infringir o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade, o princípio da proporcionalidade, o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança e o princípio da incumbência dos tribunais assegurarem dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos plasmados respetivamente nos artigos 13°, 18° n.° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
Inconstitucionalidade que invoca e deve ser declarada.
13ª - Às assembleia-gerais das sociedades por quotas aplica-se o disposto sobre as assembleia-gerais das sociedades anónimas, em tudo quanto não estiver especificadamente regulado para aquelas, conforme o disposto nos artigo 248º nº 1 do CSC.
Nesse sentido, o artigo 376º nº 1 alínea d) do CSC refere que a assembleia-geral deve reunir no prazo de 3 meses a contar da data do encerramento do exercício (que é o caso da Ré) ou no prazo de 5 meses a contar da mesma data quando se tratar de sociedades que devam apresentar contas consolidadas ou apliquem o método de equivalência patrimonial para proceder às eleições que sejam da sua competência.
O tribunal recorrido entende, porém, que o artigo 256º se sobrepõe ao estatuído no artigo 376º ambos do CSC.
Entendemos que não. Senão vejamos:
Da alínea c) resultou provado que no registo comercial da Ré consta como gerente T…, a título individual, e também como representante da sócia, B… Lda.
Da alínea n) resulta provado que T…, por carta datada de 25/02/2011, conforma cópia de fls. 56, comunicou à Ré, na pessoa do gerente H…, a renúncia à gerência, com efeitos a partir da mesma data.
E que tal facto não foi sujeito a registo, como resulta provado da alínea o).
Ora, está assente e documentado nos autos que T… renunciou às suas funções de gerente.
As funções daquela gerente cessaram na Ré por efeitos da renúncia, tal como estabelece o artigo 256º do CSC.
Ainda que se siga o entendimento da douta sentença recorrida, sempre deveria a Ré proceder a eleições por efeitos da renúncia daquela gerente na assembleia-geral anual seguinte, atento o disposto nos artigos 256º e 376º nº 1 alínea d) do CSC.
Como se verifica do que decorre das ordens de trabalhos das assembleia-gerais anuais (factos provados referidos nas alíneas ss), uu) e q)), a Ré não procedeu a eleições em qualquer das assembleia-gerais seguintes ao momento daquela renúncia de funções, que se realizaram em nos dias 18/07/2011, 30/03/2012 e 01/04/2013.
Por conseguinte, a douta sentença recorrida cometeu erro de julgamento da matéria de facto quanto a esta questão, e não subsumiu corretamente os factos que deu por provados ao que decorre do disposto nos artigos 256º e 376º nº 1 alínea d) do CSC.
14ª - Como se alcança dos factos provados q) e s) a convocatória para a assembleia-geral anual de 01/04/2013 não se encontra assinada por nenhum dos gerentes da Ré. O tribunal a quo entendeu que a falta de assinaturas dos gerentes na convocatória reveste mera irregularidade formal, sanada pelo facto de todos os sócios terem comparecido na assembleia-geral. Porém, mantemos que a convocatória assim elaborada e remetida aos sócios viola o disposto na alínea d) do nº 1 do artigo 376º do CSC por remissão do disposto no artigo 248º nº 1 do CSC. Sendo causa suscetível de anulabilidade para os efeitos do disposto na alínea a) do nº 1 do artigo 58º do CSC. O que não foi considerado pelo tribunal recorrido.
15ª - O tribunal recorrido não deu como provados os factos 35 e 36 da petição inicial, que se referem a factos objetivos, claros e preciso como sejam, os documentos de prestação de contas da Ré relativos ao ano de 2012 que constam dos autos, nomeadamente:
i) Que, em 2009 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €37.375,00;
j) Que em 2010 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €34.375,00;
k) Que em 2011 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €19.000,00;
l) Que em 2012 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €1.003,70;
m) Que em 2009 o resultado líquido foi positivo (lucro) no montante de €10.884,04;
n) Que em 2010 o resultado líquido foi positivo (lucro) no montante de e €6.880,74;
o) Que em 2011 o resultado líquido foi positivo (lucro) no montante de €2.761,95;
p) Que em 2012 o resultado líquido foi negativo (prejuízo) no montante de €16.518,89.
O tribunal recorrido deu como provados os factos cc) e dd), segundo os quais os representantes da Autora consultaram documentos de prestação de contas relativas ao ano de 2012.
Entre os quais se encontravam os documentos da contabilidade da Ré que continham os elementos descritos nos pontos 35 e 36 da petição inicial. A Ré não impugnou os referidos factos. Deveria, por isso, o tribunal a quo ter dado como provados os factos dos pontos 35 e 36 da petição inicial. Ao não o fazer, o tribunal recorrido cometeu erro de julgamento da matéria de facto por desvio da realidade factual e falsa representação da mesma.
16ª - O tribunal recorrido também não deu como provados os factos 43, 44, 45, 46 e 47 da petição inicial nos quais se alegou a dificuldade da Autora em obter as informações mínimas para efeitos de discussão dos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos da assembleia-geral de 01/04/2013. Como já se referiu preteritamente, tanto do que ficou provado nas alíneas cc), dd), ee), ff), gg), hh) e ii) como do que decorre expressamente da motivação e fundamentação da sentença, o tribunal recorrido deveria ter considerado provados os factos alegados nos pontos 43, 44, 45, 46 e 47 da petição inicial.
Porquanto resulta do que decorre expresso na sentença que as informações solicitadas pela Autora não foram prestadas pela Ré ou foram prestadas por esta de forma incompleta. Ao não decidir assim, o tribunal cometeu erro de julgamento da matéria de facto por desvio da realidade factual ou por sua deficiente interpretação. Por conseguinte, os factos 43, 44, 45, 46, e 47 da petição inicial devem ser julgados provados.
17ª - O tribunal recorrido não deu como provado o facto nº 54 da petição inicial, onde a Autora alega que os sócios gerentes em exercício, E…, D…, H…, F… e G…, já foram todos reembolsados da parte dos suprimentos que realizaram na Ré. Conforme decorre do facto provado p) a Autora pediu à Ré o pagamento ou o reembolso dos seus suprimentos por carta de 19/11/2012. Com exceção da Autora, todos os restantes sócios da Ré foram reembolsados dos seus suprimentos, tendo a sociedade emitido cheques a favor destes, que os receberam. A medida não tem suporte social tampouco fundamento legal, e visou o benefício de uns sócios e o prejuízo de outros, sendo concretamente para atingir a Autora. Por estas razões, suportadas nos autos, deveria o tribunal recorrido ter julgado provado o facto 54 da petição inicial.
18ª - Também não se concebe que o tribunal recorrido não tenha dado por provado o facto 57 da petição inicial.
Que até se encontra documentado e claramente demonstrado, conforme documentos nº 7 e 8 juntos aos autos a fls. 43 e 44.
Com efeito a Autora requereu o pagamento dos seus suprimentos, pelo menos, em 19/11/2012, em conformidade com o facto provado na alínea p). Por conseguinte, também o facto 57 da petição inicial deveria ter sido julgado provado, de modo autónomo ou conjugadamente com o facto provado p).
19ª - Não se concebe que o facto 66 da petição inicial não tenha sido julgado provado pelo tribunal recorrido. O facto deveria ter sido julgado provado, pelo menos, com a seguinte redação:
“Os dois lançamentos contabilísticos são falsos, não possuem o adequado suporte documental, não representam de forma fiel e verdadeira a situação económica e financeira da Ré.”
Com efeito, decorre de forma clara e esclarecida do documento nº 8 de fls. 45 que a contabilidade da Ré apresentava desconformidade contabilística, bancária e de suprimentos no ano de 2012 pelas razões constantes dos factos provados h), i), j), k), l) e m). Os lançamentos contabilísticos em causa não foram efetuados com o adequado suporte documental (que seria o cheque original, e não uma fotocópia do cheque, que não foi apresentado a pagamento).
Os referidos lançamentos contabilísticos são, por isso, falsos e não contribuem para a imagem fiel e verdadeira da contabilidade da Ré. Por conseguinte, o facto 66 da petição inicial deveria ter sido julgado provado, a cuja modificação se apela ad quem.
20ª - As assembleias gerais de sócios da Ré só podem ser provadas por ata como dispõe o nº 1 do artº 63º do CSC.
Tendo em conta que o contrato de sociedade da Ré não permite o voto por escrito, a ata é, pois, o único meio de prova ad substantium das deliberações tomadas nas assembleia-gerais anuais de sócios relativas aos exercícios económicos dos anos de 2010, 2011 e 2012.
As atas avulsas das assembleia-gerais realizadas nos dias 18/07/2011, 30/03/2012 e 01/04/2013 apenas se encontram assinadas pelo presidente da mesa da assembleia-geral, V…, e representante da sócia B… Lda. As atas devem ser assinadas por todos os sócios que tenham participado nas assembleia gerais de sócios das sociedades, como determina o disposto no nº 6 do artigo 248º do CSC.
Quando a ata deva ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia e alguns deles não o faça, podendo fazê-lo, deve a sociedade notificá-lo judicialmente para que, em prazo não inferior a 8 dias, a assine (artigo 63º nº 3 do CSC, 1ª parte). Decorrido esse prazo, a ata tem a força probatória referida no nº 1, desde que esteja assinada pela maioria dos sócios que tomaram parte na assembleia sem prejuízo do direito dos que a não assinaram de invocarem em juízo a falsidade da ata (artigo 63 º nº 3 do CSC, 2ª parte). Ora, decorre dos autos que no final da petição inicial a Autora requereu a notificação dos sócios da Ré que estiveram presentes na assembleia-geral realizada no dia 01/04/2013 para se dirigirem à Rua …, nº … – …, …. - … Viana do Castelo, a fim de assinarem até ao dia 31 de Maio de 2013, sob cominação de aplicação de multa se não o fizerem, a ata avulsa de fls. 35-38. A Ré não invocou a falsidade da ata como expressamente vem referido na sentença recorrida (no capítulo “O Direito”).
Resulta também expressamente da sentença (no capítulo “Motivação”) que V… elaborou as atas de fls. 35-38 e 243 e seguintes.
O tribunal a quo deu apenas provado na alínea w) que os demais sócios da Ré não aceitam assinar tal ata avulsa.
O processo findou na 1ª instância sem que os demais sócios da Ré tivessem assinado a ata em causa. O tribunal recorrido justificou-se quanto ao caso em apreço, que não foi posto em causa o facto de os pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos relativa à assembleia-geral de 01/04/2013 terem sido aprovados pela maioria dos sócios presentes. Que não foi posta em causa a aprovação dos relatórios de gestão e das contas de 2010 e 2011. Que a ação não se destina a usar do mecanismo previsto no nº 3 do artigo 63º do CSC. Que a circunstância de as atas não estarem assinadas por todos os sócios que participaram nas assembleia-gerais não possa fazer prova das deliberações sociais cuja anulação se pretende. E que, caso não fosse assim entendido, o destino da ação seria o da sua improcedência.
O que não se concebe.
21ª - A ata onde constam as deliberações sociais tomadas quanto aos pontos da ordem de trabalhos da assembleia-geral anual de 01/04/2013 não se encontra assinada pelos sócios que obtiveram a maioria nas referidas deliberações sociais. O tribunal recorrido não promoveu o requerido pela Autora quanto à notificação dos sócios presentes e representados nas assembleia-gerais em causa. A Ré foi notificada da petição inicial e exerceu o contraditório e teve oportunidade de o exercer durante o processo relativamente a tudo quanto foi requerido pela Autora. A Ré não invocou a falsidade das atas das assembleia-gerais anuais relativas aos exercícios ad Ré de 2010, 2011 e 2012. Tampouco deu cumprimento ao disposto no artigo 63º nº 3 do CSC, e não promoveu a assinatura da ata pelos seus demais sócios. Os gerentes da Ré limitaram-se a alegar que não aceitam assinar as atas em causa. Por conseguinte, coloca-se a questão de saber se as atas nestas condições são ou não juridicamente relevantes para efeitos da presente ação. Ora, a ata apenas assinada por um sócio, que não representa a maioria dos sócios, contraria o disposto nos artigos 248º nº 6 e 63º nº 3 do CSC. Nestas condições, não se pode provar a existência de deliberações tomadas nas assembleia-gerais anuais de sócios da Ré relativas aos exercícios económicos dos anos de 2010, 2011 e 2012. Porque não existem atas válidas que suportem as deliberações sociais que nelas eventualmente foram tomadas. O que não existe é nulo, e a todo o tempo pode ser requerida a declaração de nulidade ou de inexistência e a todo o tempo e por qualquer tribunal declarada. Quanto a esta questão, o tribunal recorrido violou o disposto na alínea a) do nº 1 do artº 56º e no nº 1 do artº 63º ambos do CSC. E por isso a decisão recorrida enferma de vício de violação da lei.
22ª - Assim, a interpretação concreta que o tribunal recorrido deu ao disposto no nº 6 do artigo 248º e ao nº 3 do artigo 63º ambos do CSC, para fundamentar que a ata de assembleia-geral de sociedade que não se encontra assinada pelos sócios que representam a maioria do seu capital social e que votaram a favor de deliberações sociais que foram aprovadas, deve ser considerada válida na ordem jurídica para prova de deliberações sociais tomadas, é inconstitucional porque ofende não só as referidas normas mas essencialmente porque viola o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade, assim como os princípios da segurança jurídica e da proteção jurídica, a que se referem os artigos 13° e 18°, n.° 2 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
Inconstitucionalidade que invoca e deve ser declarada.
Pelo que, deve a decisão ser revogada ad quem também quanto a esta questão.
23ª - O tribunal a quo ao indeferir o requerido nos 2 despachos proferidos na audiência de julgamento de 12/09/2017, conforme a ata de fls. …-…, negou à Autora o direito ao exercício do contraditório, contendeu com a admissibilidade de meios probatórios imprescindíveis a que se faça justiça, e impediu que se verificasse com o rigor e a segurança que se exige, se os trabalhadores indicados (com os NISS já fornecidos) pela empresa I… Lda. prestaram ou não trabalho para esta empresa no período a que se refere a fatura nº …./2012. de 06/12/2012, através da requisição de informação à Segurança Social. A Autora interpôs recurso de agravo, separadamente, sobre os 3 referidos despachos. Os despachos recorridos não concretizam nem fundamentam, de facto e de direito, as razões do indeferimento das provas requeridas pela Autora, que se mostram essenciais à descoberta da verdade e à justa composição das partes e do litígio, nomeadamente, os fundamentos de direito que lhe permitissem decidir como decidiu. Ao indeferir as perícias e os meios probatórios solicitados no requerimento probatório de 29/02/2016 o tribunal a quo cerceou significativamente a prova da Autora, e nessa situação, sempre deveria ter-se assessorado, o que não fez, como determina o disposto no artigo 202º nº 3 da Constituição.
Apesar disso, a Autora reuniu o conjunto de informações possível face às decisões proferidas, que carreou para o processo e que permitiriam ao tribunal recorrido provar a atuação da Ré, através dos seus gerentes e sócios, em manifesto abuso de poder, sempre no seu interesse e de terceiros, prejudicando os interesses da Ré e da Autora, o que é contrário ao exercício do bem social constitucionalmente protegido da administração da Justiça.
24ª - É essencial para o tribunal identificar e quantificar os erros de facto e de direito resultantes da simulação da fatura em causa, assim como para o tribunal poder decidir das questões sobre as deliberações de aprovação tomadas nos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos da assembleia-geral impugnada, é essencial a produção da prova testemunhal que foi indeferida, como também se qualifica como necessária a prova documental e pericial outrora indeferida.
Para o tribunal poder decidir das questões sobre as deliberações de aprovação tomadas na assembleia-geral impugnada no ponto 3 da ordem de trabalhos, é essencial a produção de prova documental, testemunhal e pericial que deve subsumir-se aos pressupostos do disposto no artigo 376º nº 1 alíneas c) e d) do Código das Sociedades Comerciais aplicável à assembleia-geral da R., por remissão do disposto no nº 1 do artigo 248º daquele diploma legal. Acresce que, para o tribunal se pronunciar sobre os pedidos de anulação das deliberações em causa tomadas na assembleia-geral da R. no âmbito dos pontos 1 e 2 da ordem de trabalhos, teria de avaliar não apenas se existem ou não irregularidades nos documentos de prestação de contas da Ré, mas também sobre a gravidade das irregularidades e ainda sobre se tais irregularidades são ou não de fácil correção.
25ª - Uma das questões essenciais que a A. alega em toda a sua petição inicial é a de que, os documentos de prestação de contas em causa foram elaborados incorporando atos e contratos simulados pelos gerentes da R., designadamente, o elevado custo da alegada vedação do terreno da R. a que se refere a fatura nº .../2012. de 06/12/2012 do montante de €20.117,88.
Os gerentes que elaboraram os documentos de prestação de contas são simultaneamente sócios da Ré, os quais, atuando em conluio e com abuso de poder, formam a maioria que lhes permite aprovar as contas da sua própria gestão, ruinosa e simulada, praticando atos e contratos de gestão simulados quanto ao valor, a quantidade e a qualidade dos serviços prestados em prejuízo da R., dos sócios e de terceiros. É, pois, essencial para que se faça prova sobre a existência dos atos simulados alegados na petição inicial e que, necessariamente, são essenciais para a descoberta da verdade dos factos. A Autora tem interesse e entende que nos termos do disposto no artigo 265º do CPC, o Tribunal a quo tem o dever-obrigação, de se pronunciar sobre a existência de atos e contratos de gestão simulados que inquinam, desvirtuam e não permitem que os documentos de prestação de contas apresentadas pelos gerentes da Ré reflitam de forma verdadeira e apropriada a situação económica e financeira da Ré em 31 de Dezembro de 2012. Para efeitos da prova, a lei prevê e permite que a Autora lance mão de documentos e outros meios de prova que se encontram em poder de terceiros, tanto mais que a Autora alegou a existência de simulação de faturação. Estas normas legais existem no interesse público do princípio do contraditório e, consequentemente, da aplicação da justiça, que não podem ser afastadas pela vontade das partes nem pelo livre arbítrio do tribunal.
O tribunal indeferiu grande parte do requerimento probatório, nomeadamente, a sua alteração, conforme requerimento de 29/02/2016 a fls. …-…) e despacho de fls. …-… .Além de ter coartado a prova da Autora, que reduziu significativamente, impediu-a de provar outros vícios das deliberações sociais tomadas, nomeadamente, o de simulação dos valores faturados na fatura nº …/2012. (as perícias foram indeferidas), e o de apresentar suporte documental da prestação de contas dos anos de 2010, 2011 e 2012 que se encontram apenas na posse da sociedade Ré.
26ª - Em consequência de todo o exposto, o tribunal recorrido deveria ter declarado a nulidade ou a anulabilidade das deliberações tomadas nos pontos um e dois da ordem de trabalhos, que sofrem do vício de violação da lei. E a interpretação e aplicação concreta que o tribunal recorrido fez ao validar no ordenamento jurídico estas deliberações sociais é inconstitucional, em função do preteritamente exposto quanto estas questões, na medida em que constituem violação de direitos, princípios e garantias constitucionalmente consagrados, como sejam o princípio da igualdade, o princípio da proporcionalidade, o princípio da segurança jurídica e o princípio da proteção da confiança a que se referem os artigos 13°, 18° n° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição,
27ª - O tribunal recorrido condenou a Autora nas custas, e não fundamentou a decisão em qualquer preceito legal. A Recorrente não se conforma com o assim decidido. Nos autos encontra-se junto à petição inicial a certidão comercial permanente sob a forma de documento nº 1.Nos autos está também o pacto da sociedade Ré atualizado à data da instauração da ação (documento nº 4 junto à petição inicial), pelo qual se verifica não possuir órgão de fiscalização. Nenhum dos referidos documentos foi impugnado pela Ré. Da certidão comercial permanente da Ré resulta que a Autora é gerente da Ré, sendo representada por T…; que a Ré não possui órgão de fiscalização. A fls. 245 e 249 encontram-se as atas das assembleia-gerais impugnadas assinadas pelo representante da Autora naquelas (factos ww), xx) e yy)). Tanto a ação de declaração de nulidade como a de anulação serão propostas contra a sociedade (artigo 60º nº 1 do CSC).
E a sociedade suportará todos os encargos das ações propostas pelo órgão de fiscalização ou, na sua falta, por qualquer gerente, ainda que sejam julgadas improcedentes (artigo 60º nº 3 do CSC). Esta norma de carácter geral e obrigatório foi violada pelo tribunal a quo na sua interpretação e aplicação concreta em matéria de custas. Do facto provado c) resulta que são gerentes da Ré, D…, T…, E…, H…, F…, G… e, B…, Lda., representada por T…. Em função da condenação de custas pela Autora, torna-se necessário juntar a certidão comercial da Recorrente em virtude do julgamento proferido na 1ª instância, e uma vez que a decisão se revelou de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos probatórios que já constam do processo, que junta nos termos e para os efeitos do disposto nos artigos 425º e 651º nº 1 do CPC (documento nº 1). Da referida certidão comercial verifica-se que a Autora, B…, Lda., não possui órgão de fiscalização. Por isso, não andou bem o tribunal a quo ao condenar a Autora nas custas da ação, contrariando flagrantemente o disposto no nº 3 do artigo 60º do CSC. A sentença a quo padece nesta questão de erro de julgamento da matéria de direito e de vício de violação da lei, devendo ser revogada em matéria de custas. Deve a decisão, nesta parte, ser revogada e substituída ad quem por outra que determine que as custas são a cargo da Ré, considerando as normas legais invocadas.
28ª - Para a hipótese de se entender que não foi alegado pela parte a falta de órgão de fiscalização, além do já concluído na conclusão anterior (27ª), acrescenta-se a seguinte fundamentação. Quanto ao ónus de alegação das partes e aos poderes (dever/obrigação) de cognição do tribunal recorrido, às partes cabe alegar os factos essenciais que constituem a causa de pedir e aqueles em que se baseiem as exceções invocadas, sendo ainda considerados pelo juiz, os factos notórios e aqueles de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, como dispõe o nº 1 e ainda a alínea c) do nº 2 do artigo 5º do NCPC. Ou seja, há factos que não carecem de alegação ou demonstração, nomeadamente, os factos notórios e aqueles que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções. Os atos das sociedades comerciais sujeitos a registo são públicos e notórios porque além de publicados no Diário da República, podem ser consultados por qualquer cidadão ou por qualquer entidade, incluindo os tribunais. No exercício das suas funções, o tribunal tomou conhecimento que a Ré não tinha, não tem, nunca teve órgão de fiscalização. Factos notórios são aqueles que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções nos termos do disposto no artigo 5º nº 2 alínea c) do NCPC, como é o caso da inexistência de órgão de fiscalização como órgão societário da Ré. Por isso, entende a Recorrente que a interpretação concreta que o tribunal recorrido deu ao disposto no artigo 527º do CPC para justificar a sua decisão de condenar a Autora nas custas da ação, e não condenando a Ré nas custas em conformidade com o que resulta do disposto no artigo 60º nº 3 do CSC, é inconstitucional por violar o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade, assim como os princípios da segurança jurídica e da proteção jurídica, a que se referem os artigos 13° e 18°, n.° 2 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
Pelo que, deve a decisão ser revogada ad quem também quanto a custas.
29ª - O tribunal recorrido considerou que o prazo de caducidade relativamente às assembleia-gerais da Ré de 18/07/2011 e de 30/03/2012 caducou atenta a instauração da ação em 30/04/2013 (facto provado zz) quanto à data da propositura da ação).
O prazo de caducidade é de direito substantivo (artigo 59º nº 2 do CSC).Apesar disso, a Autora considera tempestiva a impugnação das contas da Ré relativas aos exercícios de 2010 e 2011 na presente ação, pela qual também impugnou a validade das deliberações sociais tomadas na assembleia-geral anual de 01/04/2013.
Ao que se apela ad quem.
30ª - Parece-nos que a Autora fez prova cabal e suficiente da causa de pedir que alegou na petição inicial, no âmbito do objeto da ação e dos temas da prova enunciados na audiência prévia. Nomeadamente, provou que é sócia da Ré, provou a existência de deliberações sociais da sociedade Ré e a verificação dos respetivos vícios, como preteritamente demonstrou. Os meios de prova que infirmam as conclusões da Recorrente encontram-se indicados, para os efeitos do disposto nas alíneas a), b) e c) do nº 1 e na alínea b) do nº 2 do artigo 640º do CPC, quer na motivação do recurso quer nas suas conclusões. Os quais impunham decisão diversa da proferida na douta sentença recorrida. Pelo que deve o recurso proceder, em conformidade com as suas conclusões.
31ª - Relativamente às deliberações tomadas sobre os pontos um e dois da ordem de trabalhos, atentos os pedidos que a Autora formulou na presente ação, está em causa saber se as deliberações são válidas ou não. Ora, existindo matéria controvertida, consoante decorre dos temas da prova enunciados, tem de concluir-se que a Autora pretendeu, com a apresentação dos requerimentos probatórios, a prova dos factos integradores da respetiva causa de pedir invocada. Pelo que, se nos afigura resultar dos despachos preteritamente referidos sobre os quais foi instaurado recurso em separado, uma rejeição dos meios de prova da Autora, necessários para se aferir da validade e eficácia de todas as deliberações sociais tomadas na assembleia-geral da Ré de 01/04/2013. O tribunal recorrido contendeu com os princípios da igualdade e do contraditório e com a admissibilidade de meios probatórios requeridos pela Autora. Os meios de prova requeridos para prova dos temas dos autos, e outros meios que poderia requerer ainda em função dos documentos e relatórios que fossem produzidos, cercearam significativamente a prova da Autora para efeitos do objeto da ação. O tribunal recorrido cerceou o âmbito da prova da Recorrente, impedindo-a de demonstrar que as contas da Ré estão falseadas quanto ao exercício de 2012. Pelo que, para que se faça justiça, impõe-se também a ampliação da matéria de facto quanto ao objeto das perícias, concretamente sobre o valor de mercado para a cessão e arrendamento do estabelecimento da Ré, Discoteca AF…, com todos os seus equipamentos e a universalidade dos bens que o compõem, em Dezembro de 2013 data em que o contrato em causa foi celebrado. Pelo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 2 alínea c) do CPC, e subsidiariamente, deverá o tribunal da Relação anular a decisão do tribunal recorrido, por não constarem do processo todos os elementos que, nos termos do nº 1 do referido artigo, permitam a alteração da matéria de facto tendo em vista os temas da prova e o objeto da prova, ampliando-se este de modo a permitir as diligências probatórias requeridas ou que a Autora formule novo requerimento no limite das premissas que o tribunal ad quem fixar.
32ª - Ao decidir como decidiu no julgamento que proferiu, o tribunal recorrido violou princípios constitucionais como sejam, os princípios da igualdade, da proporcionalidade, da equidade, da segurança jurídica e da proteção da confiança. A interpretação concreta que o tribunal recorrido deu ao disposto no artigos 4º, 7º, 414º, 476º e 590º do CPC, para proferir o julgamento que proferiu cerceando o exercício de faculdade probatórias à Autora que se traduzem nos meios de prova que indeferiu, é inconstitucional por violar o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade, o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança plasmados respetivamente nos artigos 13°, 18°n.° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
Inconstitucionalidade que invoca, e deve ser declarada.
33ª - Por outro lado, a interpretação concreta que o tribunal recorrido deu ao disposto nos artigos 4º, 7º, 414º, 476º, 590º e 591º nº 1 alínea f) do CPC, no julgamento que proferiu para fundamentar a validação e a eficácia da deliberação social tomada no ponto um da ordem de trabalhos que aprovou o relatório de gestão e os demais documentos de prestação de contas do exercício de 2012, é inconstitucional por violar o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade, o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança plasmados respetivamente nos artigos 13°, 18° n.° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
Inconstitucionalidade que invoca, e deve ser declarada.
34ª - Por conseguinte, subsidiariamente, deverá a Relação ordenar a nova produção de meios de prova, e anular a decisão proferida na 1ª instância, por se verificar que não constam do processo todos os elementos que permitam a alteração da decisão sobre estes pontos determinantes da matéria de facto, e que deve até ser ampliada em função dos factos controversos alegados na petição inicial e na contestação, conforme acima discriminados. O que se requer ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 1 e alíneas b) e c) e nº 3 do CPC.
35ª - A douta sentença violou as normas preteritamente indicadas nos locais próprios da motivação e das conclusões do recurso.
Termina por pedir a revogação da decisão, com substituição por outra no sentido das conclusões e subsidiariamente, não se entendendo assim, mesmo oficiosamente, que se ordene a anulação da decisão proferida na 1ª instância, ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 2 alínea c) do CPC, por deficiente, obscura e contraditória sobre os pontos da matéria de facto impugnados nos pontos assinalados nas alegações e conclusões do recurso, bem como a sua ampliação conforme preteritamente alegado e concluído, no caso de se considerar necessária, com as legais consequências, e ainda, subsidiariamente, no caso de também não se entender assim, mesmo oficiosamente, que se ordene a produção de novos meios de prova, no caso de dúvida fundada sobre a prova realizada, para os efeitos do disposto no artigo 662º nº 2 alínea b) do CPC e em qualquer dos casos, a revogação da sentença.
Requereu, ainda, ao abrigo do disposto nos artigos 425º e 651º nº 1 do CPC, a junção do documento por se ter tornado necessária a sua junção em virtude do julgamento proferido na 1ª instância, e uma vez que a decisão se revelou de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos probatórios que já constam do processo quanto à matéria que justifica a sua junção.
*
A Ré veio apresentar resposta ao recurso formulando as seguintes conclusões:
I – As conclusões com que a recorrente rematou o seu recurso padecem de manifesta prolixidade e complexidade, estando formatadas em trinta e cinco (designadas) conclusões que, por sua vez, se subdividem em inúmeros parágrafos (veja-se, a título exemplificativo, a conclusão 20ª, que está subdividida em dezasseis parágrafos), conclusões essas que receberam de foram caótica preceitos jurídicos, factos, comentários, dissertações e expressões ininteligíveis.
II – A recorrente não deu cumprimento ao ónus prescrito no artigo 639º, nº 1, do CPC, o que, no mínimo, deve dar lugar ao cumprimento do disposto no nº 3 do preceito citado, sob a cominação de não se conhecer o recurso.
III – O documento junto com o recurso não deve ser admitido por não verificação dos pressupostos contidos nos artigos 651º, nº 1, e 425º do CPC.
IV – A recorrente não deu cumprimento aos ónus prescrito no artigo 640º, nº 1, alínea b), do CPC, o que impõe a imediata rejeição do recurso na parte referente à impugnação da douta decisão proferida quanto à matéria de facto.
V – A douta decisão proferida quanto à matéria de facto está fundamentada na prova produzida ou examinada em audiência, inexistindo razão para que este Venerando Tribunal altere agora essa douta decisão.
VI – A presente ação deu entrada no dia 30 de abril de 2013 (vd. alínea zz) dos factos provados), o que acarreta a caducidade do direito da recorrente de ver declarada a anulação das deliberações sociais tomadas nas assembleias-gerais da sociedade recorrida realizadas nos dias 18.11.2011 e 30.03.2012 e determina, consequentemente, a validade e eficácia dessas deliberações sociais.
VII – No tocante à invocada invalidade das deliberações sociais que aprovaram as contas de 2012, a recorrente não alega qual ou quais as disposições legais pretensamente violadas por essas deliberações.
VIII – Não estão verificadas nenhuma das causas geradoras de nulidade ou anulabilidade de deliberações sociais, previstas nos artigos 56º, 58º e 69º do CSC.
IX – A desconformidade contabilística a que a recorrente se refere radica nos factos que se deram como provados sob as alíneas h) e m) dos factos provados e assenta, essencialmente, na emissão de um cheque lançado na contabilidade da Ré a 31 de dezembro de 2009 (vd. alíneas h) e i) dos factos provados).
X – Tal desconformidade contabilística, acaso existisse, e não existe, afetaria apenas as contas sociais referentes ao exercício de 2009, não se propagando, automaticamente, às contas sociais dos exercícios económicos posteriores.
XI – Para além disso, tal como consta da fundamentação da douta decisão proferida quanto à matéria de facto – reproduzindo o depoimento prestado, nessa parte, pela testemunha U… –, a situação já foi regularizada na contabilidade, pelo que, em face do disposto no artigo 69º, nº 2, do CSC, nunca por nunca haveria motivo para anular as contas sociais de 2012 com esse fundamento.
XII – Também não existe fundamento para a anulação das deliberações sociais ajuizadas por falta de prestação de informação e esclarecimentos que a recorrente diz ter pedido previamente à assembleia-geral, mas que a matéria de facto dada como provada não demonstra.
XIII – Da ordem de trabalhos constante do aviso convocatório para a assembleia-geral de 1.04.2013 não tinha que constar o disposto no artigo 376º, nº 1, alínea d), do CSC, pelo que esse aviso convocatório e as deliberações sociais impugnadas não enfermam do vício invocado pela recorrente.
XIV – A não assinatura da convocatória configura mera irregularidade formal, irregularidade que foi sanada pelo facto de todos os sócios terem comparecido na assembleia-geral em causa, tal como flui da ata avulsa de fls. 35-38 dos autos.
XV – A questão suscitada pela recorrente nas conclusões 20ª a 22ª do seu recurso apenas o foi em sede de recurso, pelo que estamos inequivocamente perante uma questão nova, que não foi presente ao tribunal de que se recorre e que, por isso, não pode ser apreciada por este Venerando Tribunal, em face do disposto no artigo 608º,nº 2, do CPC.
XVI – Sem conceder, o facto de as atas avulsas juntas pela recorrente não estarem assinadas por todos os sócios que participaram nas assembleias gerais não invalida as deliberações sociais que foram tomadas nessas assembleias, tanto mais que a própria recorrida reconheceu que essas deliberações foram tomadas.
XVII – De todo o modo, ainda que assim não fosse, sempre o destino da presente ação seria o da sua total improcedência, à luz do disposto no artigo 342º, nº 1, do CC.
XVIII – O artigo 60º, nº 3, do CSC apenas se aplica às ações previstas no citado artigo 57º do mesmo diploma, ou seja, quando o gerente, na falta de órgão de fiscalização, depois de dar a oportunidade aos sócios de renovarem uma deliberação nula ou de promoverem, eles próprios, a respetiva declaração judicial de nulidade, se substitui aos sócios, instaurando a ação com esse fim.
XIX – A presente ação enquadra-se no disposto no artigo 59º e não no artigo 57º do CSC, tendo sido instaurada pela A. na sua qualidade de sócia da recorrida, tal como expressamente alegou no item 1º do seu douto articulado inicial, daí a sua responsabilidade pelas custas a que deu causa.
XX – A douta sentença subsumiu corretamente os factos ao direito aplicável, não incumpriu as disposições legais citadas pela recorrente nem se verificam as inconstitucionalidades por esta também suscitadas.
Termina por pedir a improcedência do recurso, mantendo-se a decisão recorrida.
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O recurso foi admitido como recurso de apelação.
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Colhidos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
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II. Fundamentação
1. Delimitação do objecto do recurso
O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente não podendo este tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, sem prejuízo das de conhecimento oficioso – art. 639º do CPC.
As questões a decidir:
- Despacho proferido em 12 de setembro de 2017 -
- recorribilidade do despacho;
- nulidade do despacho;
- preterição de diligências para notificação da testemunha S…;
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- Despacho proferido em 28 de setembro de 2017 -
- nulidade do despacho;
- admissibilidade da junção de documentos em sede de audiência de julgamento;
- da inconstitucionalidade da interpretação seguida pelo tribunal na aplicação das normas jurídicas;
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- Despacho proferido em 28 de setembro de 2017 -
- recorribilidade do despacho;
- nulidade do despacho;
- cessação do poder jurisdicional.
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- Sentença -
- aperfeiçoamento das conclusões de recurso;
- admissibilidade do documento com as alegações de recurso;
- omissão de diligências de instrução;
- nulidade da decisão, por constituir uma decisão surpresa;
- nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 c) CPC;
- reapreciação da decisão de facto;
- caducidade;
- do mérito da causa;
- inconstitucionalidade da interpretação das normas aplicadas;
- responsabilidade pelas custas da ação.
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2. Os factos
Com relevância para a apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente os seguintes factos provados no tribunal da primeira instância:
a)A ré “C…, Lda.” está registada na Conservatória do Registo Comercial com o NIPC ………, tendo por objeto a promoção de espetáculos e divertimentos públicos, restaurante, snack-bar e bar, com o capital de 20.000,00 euros;
b) São sócios da ré D…, titular de uma quota no valor nominal de 4.028,83 euros, “B…, S.A.”, titular de três quotas nos valores nominais de 2.014,41 euros, 2.014,42 euros e 4.028,83 euros, D… e E…, titular de uma quota no valor nominal de 2.789,19 euros, H…, titular de uma quota no valor nominal de 2.324,32 euros, F…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros, e G…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros;
c) Do registo comercial constam como gerentes D…, T…, D… e E…, H…, F…, G… e “B…, S.A.”, representada por T…;
d) A ré procedeu ao registo na conservatória do registo comercial da prestação de contas relativamente aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, respetivamente, a 29 de Setembro de 2011, 19 de Julho de 2012 e 18 de Julho de 2013;
e) A ré possui apenas um estabelecimento comercial de discoteca, denominado “Discoteca Y…”, equipado com todas as máquinas, equipamentos, móveis e demais instalações necessárias ao exercício de tal atividade;
f) A ré é dona do terreno e do edifício onde se encontra instalado o estabelecimento comercial;
g) A partir de 2008, por deliberação dos sócios, o estabelecimento comercial passou a ser explorado por terceiros, mediante contrato de arrendamento ou de cedência de exploração;
h) A ré emitiu um cheque no valor de 5.547,20 euros, destinado a reembolsar a autora de suprimentos realizados;
i) Tal cheque foi lançado na contabilidade a 31 de Dezembro de 2009;
j) O lançamento foi efectuado com base numa cópia do cheque, o qual nunca foi entregue à autora, nem apresentado a pagamento;
k) O valor do cheque nunca foi pago e a autora não emitiu qualquer recibo de quitação;
l) Em virtude dos factos descritos nas h) a k), na contabilidade da ré, o extrato da conta bancária não coincide com o saldo bancário efetivamente existente na instituição respetiva;
m) Em virtude dos mesmos factos, na contabilidade da ré, a conta de suprimentos da autora não coincide com o valor devido à mesma a esse título, sendo inferior;
n) T…, por carta datada de 25 de Fevereiro de 2011, cuja cópia se encontra junta a fls. 56 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, comunicou à ré, na pessoa do gerente H…, a renúncia à gerência, com efeitos a partir da mesma data;
o) Tal facto não foi sujeito a registo;
p) A autora enviou ao gerente D… e E… a carta cuja cópia se encontra junta a fls. 43 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, datada de 19 de Novembro de 2012, solicitando, para além do mais, o seguinte:
“B) Ao abrigo do disposto nos artigos 209º, 244º e 245º do CSC, requerer o reembolso no prazo máximo de 10 dias a contar da receção desta carta, sob pena da exigibilidade de juros de mora à taxa legal a contar desde a data dos suprimentos que lhe pertencem proporcionalmente ao valor das três participações do capital social de que é titular na sociedade totalizando euros vinte e três mil cento e setenta e três euros (…)”;
q) A autora recebeu, por carta registada com aviso de receção, datada de 12 de Março de 2013, a convocatória para a assembleia geral anual a realizar no dia 1 de Abril de 2013, cuja cópia se encontra junta a fls. 34 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, com a seguinte ordem de trabalhos:
“Ponto um: Deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício de 2012;
Ponto dois: Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2012;
Ponto três: Proceder a apreciação geral da gerência da sociedade no exercício de 2012”;
r) Da referida convocatória consta, para além do mais, o seguinte: “Todos os documentos e contas estão disponíveis para consulta nos escritórios da firma responsável pela contabilidade (AC…, Lda.), tal como já é do conhecimento de todos os sócios.”;
s) A referida convocatória não está assinada por nenhum dos gerentes;
t) Na assembleia geral realizada a 1 de Abril de 2013 estiveram presentes ou representados todos os sócios da ré;
u) A autora esteve representada por V…, o qual, nessa qualidade, presidiu à assembleia geral;
v) Relativamente a tal assembleia geral foi elaborada, por V…, o documento denominado “Ata Avulsa”, cuja cópia se encontra junta a fls. 35 a 38 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, o qual apenas se encontra assinado pelo próprio;
w) Os demais sócios não aceitam assinar tal “Ata Avulsa”;
x) Os pontos um e dois da ordem de trabalhos foram aprovados com os votos a favor dos sócios D…, E…, H…, F… e G… e o voto contra da sócia “B…, S.A.”;
y) No âmbito da discussão do ponto um da ordem de trabalhos, o representante da sócia “B…, S.A.” declarou, para além do mais o seguinte: “(…) não obteve quaisquer informações sobre a origem da fatura n.º …/2012., datada de 06-12-2012, emitida pela sociedade I…, Lda., no montante de €16.356,00, acrescido de IVA à taxa de 23%, no valor de €3.761,88, totalizando €20.117,88. Por isso, pretendia ser informado por escrito sobre a substância das transmissões de bens e serviços que deram origem àquela fatura, designadamente a descrição fiel e verdadeira dos eventuais trabalhos realizados, as quantidades dos materiais e de mão-de-obra aplicado e os respetivos preços unitários, bem assim fotocópias de todos os orçamentos solicitados para a realização da referida obra, a cópia da ata da reunião do conselho de gerência em que foi deliberada a realização das alegadas obras e a cópia de frente e do verso do cheque emitido para pagamento da fatura em causa, após ter sido apresentado a pagamento ao banco sacado.”;
z) Na discussão do ponto três da ordem de trabalhos, o representante da sócia “B…, S.A.” propôs a destituição com justa causa dos gerentes D…, E…, H…, F… e G…, com os fundamentos constantes da referida “ata avulsa”;
aa) Tal proposta, colocada à votação, foi rejeitada com os votos favoráveis dos sócios D…, E…, H…, F… e G… e o voto contra da sócia “B…, S.A.”;
bb) T… é administradora única da autora e V… foi revisor oficial de contas e fiscal único da autora;
cc) T…, enquanto administradora única da autora, e V…, após ter sido recebida a convocatória referida na alínea q) e antes da assembleia geral, dirigiram-se ao gabinete de contabilidade, onde foram recebidos por U…, contabilista da ré;
dd) Nessa altura, consultaram documentos de prestação de contas relativos ao ano de 2012;
ee) Verificaram que da contabilidade da ré constava a fatura n.º …/2012., datada de 6 de Dezembro de 2012, no montante de 20.117,88 euros (16.356,00 euros + 3.761,88 euros, a título de IVA), emitida pela sociedade comercial “I…, Lda.”, com o NIPC ………, com sede na E.N. …, Edifício …, n.º .., Loja …, …, Vila Nova de Cerveira, cuja cópia se encontra junta a fls. 42 e cujo teor se dá aqui por reproduzido;
ff) A fatura faz referência a serviços de “Desmatação/Limpeza de Terreno com Recolha de Resíduos e Depósito em Vazadouro”, com o preço de 4.000,00 euros, acrescido de IVA, e a serviços de “Construção de Vedação em Redor de Propriedade”, com o preço de 12.356,00 euros, acrescido de IVA;
gg) Pediram esclarecimentos ao contabilista acerca da fatura referida nas alíneas ee) e ff);
hh) Na contabilidade apenas constava tal fatura;
ii) Aquando dos factos referidos nas alíneas cc) a gg) não estava presente nenhum dos demais gerentes da ré;
jj) Anualmente era feita, pelo menos, uma limpeza ao terreno;
kk) Os trabalhos executados pela sociedade comercial “I…, Lda.” consistiram na vedação do terreno, com postes de cimento chumbados no chão, colocados a cerca de 5 metros uns dos outros;
ll) A vedação foi executada em rede ovelheira, com cerca de 1,5 m de altura;
mm) Procedeu-se também à desmatação e limpeza do terreno;
nn) A ré procedeu ao pagamento do preço acordado, constante da fatura identificada nas alíneas ee) e ff);
oo) A ré, previamente, pediu orçamento;
pp) A ré instaurou contra V… e T… uma ação declarativa, pedindo a sua condenação a entregar os livros selados, pastas, livros de atas, elementos contabilísticos e todos os demais documentos na sua posse e a ela pertencentes e a pagarem a quantia de 500,00 euros por cada dia de atraso na entrega dos aludidos documentos, a qual correu termos com o número 314/11.4TBVCT, pelo extinto 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana do Castelo;
qq) A 27 de Junho de 2012 foi proferida a sentença cuja cópia se encontra junta a fls. 91 e seguintes, cujo teor se dá aqui por reproduzido, que julgou a ação parcialmente procedente e condenou o réu V… a entregar à autora os livros selados, pastas, livros de atas e todos os elementos e documentos contabilísticos pertencentes à mesma, absolvendo a ré T… dos pedidos e o réu do pedido de pagamento da quantia de 500,00 euros, a título de sanção pecuniária compulsória;
rr) Foram dados como provados, entre outros, os seguintes factos.
“2. O réu V…, para além de outras atividades, presta serviços, como profissional liberal, na área da contabilidade;
3. A ré T… trabalha com o réu V…, compartilhando o mesmo escritório e trabalho;
4. Há alguns anos, em data não concretamente apurada, a autora celebrou com o réu V… um contrato de prestação de serviços, nos termos do qual este se obrigou a tratar contabilisticamente todos os assuntos da autora, nomeadamente organizando toda a sua contabilidade, lançando nos locais próprios todos os movimentos, preparando toda a documentação necessária a apresentar junto da administração fiscal, elaborando minutas de atas das assembleias gerais da sociedade e praticando todos os atos direta e indiretamente relacionados com a contabilidade da autora;
5. Para o efeito, foi entregue ao réu V… os livros de atas da autora e foi-lhe entregue toda a documentação relativa à escrituração da contabilidade (faturas e recibos);
6. No decorrer do ano de 2008, a autora prescindiu dos serviços do réu, tendo entregue a execução dos serviços que o réu vinha prestando à “AC…, Lda.” (…);
7. A partir daí, a autora tem vindo a solicitar ao réu que proceda à entrega de toda a documentação pertencente à sociedade, que se encontra na sua posse, nomeadamente documentos contabilísticos, livros de atas e quaisquer outros documentos pertencentes à autora;
8. O réu remeteu-se ao silêncio e não fez a entrega à autora de quaisquer documentos a esta pertencentes e que se encontram na sua posse (…).”;
ss) A assembleia geral da ré, realizada a 18 de Julho de 2011, foi convocada com a seguinte ordem de trabalhos:
- Deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2010;
- Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2010;
- Proceder à apreciação global da gerência da sociedade no exercício de 2010;
- Deliberar sobre a alteração da sede social;
tt) Foi deliberado aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2010 e a proposta de aplicação dos resultados do mesmo ano;
uu) A assembleia geral da ré, realizada a 30 de Março de 2012, foi convocada com a seguinte ordem de trabalhos:
- Deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2011;
- Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2011;
- Proceder à apreciação global da gerência da sociedade no exercício de 2011;
vv) Foi deliberado aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2011 e a proposta de aplicação dos resultados do mesmo ano;
ww) Relativamente a tais assembleias foram elaborados, respetivamente, os documentos denominados “Ata número vinte” e “Ata número vinte e dois”, cujas cópias se encontram juntas a fls. 245 a 249 e cujo teor se dá aqui por reproduzido;
xx) As assembleias gerais da ré de 18 de Julho de 2011 e de 30 de Março de 2012 foram presididas por V…, enquanto representante da autora “B…, S.A.”;
yy) Os documentos referidos na alínea ww) foram também elaborados por V…, encontrando-se apenas assinados pelo mesmo;
zz) A presente ação deu entrada em juízo a 30 de Abril de 2013.
*
- Factos não provados -
Não se provaram os demais factos alegados, designadamente, nos artigos 15º a 18º, 35º, 36º, 41º, 42º, 45º, 46º, 48º, 49º, 50º, 52º, 54º, 55º, 57º, 63º e 66º da petição inicial e nos artigos 92º, 95º, 96º, 97º, 98º, 99º, 100º, 182º, 183º, 184º e 227º da contestação.
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A demais matéria constante dos articulados constitui matéria de direito ou conclusiva ou irrelevante para a decisão da causa, tendo em conta, designadamente, os temas da prova enunciados.
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3. O direito
- APELAÇÃO DOS DESPACHOS -
- 12 SETEMBRO 2017 E 28 DE SETEMBRO DE 2017 -
Na apreciação das conclusões de recurso cumpre ter presente o teor dos despachos que são objeto do recurso:
- Despacho proferido em 12 de setembro de 2017:
“ Requerimento de 8 de Setembro de 2017.
No que diz respeito à testemunha S…, o tribunal efetuou a pesquisa nas bases de dados, sendo certo que a notificação na morada apurada, através de funcionário judicial, se frustrou.
Tendo sido realizadas as diligências que se impunham, nada mais se nos afigura dever ser determinado a tal respeito.
Por outro lado, nesta data, desconhece, ainda, o tribunal o resultado do pedido de notificação das testemunhas W… e X….
Assim, indefiro o requerido no ponto 4., alíneas a) e b), cumprindo também realçar que as diligências em curso apenas visam alcançar a notificação das testemunhas indicadas pela autora, estando vedado à mesma, a esse propósito, indicar novos requerimentos probatórios.
Nestes termos, considerando o referido no parágrafo anterior, indefiro o requerido nos pontos 5., 6. e 7. do requerimento em análise”.
- Despachos proferidos em 28 de setembro de 2017:
“Considerando o disposto no art. 423º, n.º 3, do CPC, não se mostrando reunidos os pressupostos para que fosse aceite a junção nesta fase processual, indefiro o requerido”.
*
“ Neste momento, apenas poderá a Autora, neste caso, recorrer do mesmo no momento próprio, ou seja, não existe a nosso ver qualquer requerimento pendente e que cumpra ainda apreciar.
Relativamente ao requerimento acima referido, neste sentido, porque apenas caberá à autora recorrer do despacho em causa, recurso esse que apenas terá efeito suspensivo, embora isso também não se mostre para aqui determinante, só poderá, como já se disse, recorrer desse despacho.
Nada mais tendo sido requerido, indefiro também o requerido nesta audiência de julgamento, dando como concluída a produção de prova e dando agora a palavra aos Sr.(s) Mandatários para proferirem as suas alegações, as alegações a que têm direito e que estão previstas na lei”.
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- Recorribilidade dos despachos proferidos em 12 de setembro e do segundo despacho proferido em 28 de setembro -
A apelada veio suscitar a irrecorribilidade dos despachos, porque em relação ao despacho proferido em 12 de setembro foi interposto depois de expirado o prazo de quinze dias e quanto ao despacho proferido em 28 de setembro, porque o mesmo constitui um despacho de mero expediente, que pela sua natureza não admite recurso.
O recurso foi admitido, por se entender que o despacho proferido a 12 de Setembro de 2017 foi notificado por expedição de 19 de Setembro de 2017 e tendo o recurso sido apresentado a 9 de Outubro de 2017 o mesmo foi apresentado no prazo de 15 dias, nos termos do disposto nos arts. 638º, n.º 1, e 644º, n.º 2, alínea d) do CPC.
Quanto ao despacho proferido na audiência de discussão e julgamento em 28 de setembro de 2017 considerou-se que o mesmo, ainda que interligado com o proferido a 12 de Setembro de 2017, não será um despacho de mero expediente.
Entendemos que tal apreciação não merece censura.
Em matéria de recursos a lei prevê um conjunto de pressupostos processuais, que constituem as circunstâncias de cuja verificação depende a possibilidade do tribunal superior se debruçar sobre o concreto objeto do recurso.
A doutrina[2] tem enunciado como pressupostos processuais: a recorribilidade da decisão, a tempestividade e a legitimidade.
No caso concreto está em causa a tempestividade de um dos recursos e a recorribilidade de um dos despachos.
O recurso está sujeito a um prazo de natureza perentória cujo decurso determina a definitividade da decisão decorrente da formação do caso julgado.
O despacho proferido em 12 de setembro de 2017 não admitiu a realização de diligências de prova.
Nos termos dos arts. 638º, n.º 1, e 644º, n.º 2, alínea d) do CPC o prazo para apresentar o recurso e as alegações é de 15 dias.
Nos termos do art. 638º/1 CPC, o prazo para a interposição do recurso conta-se a partir da notificação da decisão.
A decisão foi notificada em 19 de setembro de 2017. O recurso foi interposto em 09 de outubro de 2017, no termo do prazo de 15 dias.
O recurso do despacho proferido em 12 de setembro de 2017 foi tempestivamente interposto.
O segundo despacho proferido em 28 de setembro de 2017 pronunciou-se, mais uma vez, sobre a admissibilidade de prova, acabando por indeferir a requerida diligência para inquirição da testemunha S…. Não se trata de um despacho de mero expediente.
Os despachos de mero expediente são irrecorríveis.
Nos termos do art. 630º/1 CPC:
1. Não admitem recurso os despachos de mero expediente nem os proferidos no uso legal de um poder discricionário.
Define o art. 152º/4 CPC despachos de mero expediente como os que se destinam a prover ao andamento regular do processo, sem interferir no conflito de interesses entre as partes.
ALBERTO DOS REIS considerava que sendo necessária a intervenção do juiz para que o processo percorra o caminho traçado na lei, passe de um para outro ato e o habilite a decidir, sem ofender direitos processuais das partes ou de terceiros, o despacho destina-se a prover ao andamento regular do processo e reveste a natureza de despacho de mero expediente.
Os despachos de mero expediente compreendem, usando a classificação de LEBRE DE FREITAS[3]:
- os despachos internos, proferidos no âmbito das relações hierárquicas com a secretaria; e
- os despachos que digam respeito à mera tramitação do processo, não tocando em direitos das partes ou de terceiros.
No caso concreto estamos na presença de um despacho em que foi suscitada a apreciação jurisdicional de uma questão a respeito da realização de diligência de instrução, com vista a obter a notificação de uma testemunha. Não visa o despacho a mera tramitação processual ou a passagem de um ato para outro no próprio processo. O despacho recorrido interfere com direitos subjetivos das partes, na medida em que está em causa apreciar da promoção de diligências com vista a produzir um meio de prova – a inquirição de uma testemunha.
O despacho nos moldes em que foi proferido interfere no conflito de interesses entre as partes, independentemente de se saber se assiste razão à apelante.
Conclui-se, assim, que o despacho recorrido não reveste a natureza de despacho de mero expediente e por isso é um despacho recorrível.
Desta forma, os recursos foram tempestivamente interpostos e têm por objeto despachos recorríveis estando em condições de serem apreciados pelo tribunal de recurso.
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- Nulidade dos despachos -
Nas conclusões de recurso, sob o ponto 18, a apelante suscita a falta de fundamentação de facto e de direito dos despachos recorridos.
Nos termos do art. 615º/1 b) CPC, a sentença é nula, quando não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão.
Este regime aplica-se aos despachos, com as necessárias adaptações, como se prevê no art. 613º/3 CPC.
A nulidade ocorre desde que se verifique a falta absoluta de fundamentação, que pode referir-se só aos fundamentos de facto ou só aos fundamentos de direito.
A irregularidade está diretamente relacionada com o dever imposto ao juiz de motivar as suas decisões, conforme resulta do disposto no art. 607º/3 CPC[4].
Contudo, o dever de fundamentação surge mitigado em relação a despachos interlocutórios nas circunstâncias em que a contraparte não tenha apresentado oposição ao pedido e o caso seja de manifesta simplicidade. Admite-se nestas situações a justificação por simples adesão aos fundamentos alegados no requerimento ou na oposição.
No caso concreto os despachos recorridos não padecem do vício que lhes vem atribuído. Reportam-se sucintamente à questão controvertida, situando o objeto da questão a apreciar, já que não versam sobre a apreciação de factos controvertidos e fundamentam de direito a respetiva decisão. O primeiro despacho proferido em 28 de setembro indica a norma jurídica em que fundamenta a decisão e os demais, proferidos em 12 de setembro e 28 de setembro, assentam a fundamentação no princípio da cooperação, a que se reporta a apelante nos requerimentos apresentados.
O despacho proferido em 12 de setembro apreciou o requerimento apresentado pela apelante em 08 de setembro de 2017. O requerimento não mereceu oposição da ré. A apelante fundamentou a sua pretensão no princípio da cooperação, o qual está consagrado no art. 7º do CPC. O tribunal apreciou a pretensão da apelante à luz desse princípio e tanto basta para considerar que o despacho contém a fundamentação de direito.
Desta forma, os despachos não se mostram feridos de nulidade por falta de fundamentação de facto e de direito.
Improcede, nesta parte, as conclusões sob o ponto 18.
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- Despacho proferido em 12 de setembro de 2017 e segundo despacho proferido em 28 de setembro 2017 -
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 13 a 17, insurge-se o apelante contra o despacho proferido em 12 de setembro de 2017 e o segundo despacho proferido em 28 de setembro de 2017, por se impedir a inquirição da testemunha S… e se impedir a obtenção de meios de prova que permitissem demonstrar a simulação da fatura com o fatura n.º …/2012., datada de 6 de Dezembro de 2012, no montante de 20.117,88 euros (16.356,00 euros + 3.761,88 euros, a título de IVA), emitida pela sociedade comercial “I…, Lda.”, com o NIPC ………, com sede na E.N. …, Edifício …, n.º .., Loja …, …, Vila Nova de Cerveira.
Antes de prosseguir na reapreciação dos despachos, cumpre situar a questão no âmbito do processo.
Na sequência dos requerimentos de prova apresentados pelas partes em 12 de abril de 2016 proferiu-se o despacho que se pronunciou sobre tais requerimentos.
No despacho então proferido indeferiu-se, entre outras, a diligência solicitada pela apelante de notificação da sociedade “I…, Lda.” para indicar e identificar os trabalhadores que executaram os trabalhos de jardinagem, limpeza e vedação, no terreno da “Discoteca Y…”, em ….
Deste despacho foi interposto recurso e por douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 24 de outubro de 2016 foi revogado o aludido segmento do despacho.
Promoveram-se as diligências necessárias para obter a identificação dos trabalhadores que executaram os trabalhos e foram os mesmos notificados para prestarem os seus depoimentos como testemunhas, com exceção da testemunha S….
Perante a inviabilidade de notificação de tal testemunha veio a apelante em 08 de setembro de 2017 apresentar o requerimento que se transcreve:
“1. Foi a Autora notificada da certidão negativa de notificação da testemunha S…, conforme fls. …-… .
2. Dela consta a informação que o notificando é desconhecido na morada indicada.
3. Da consulta da base de dados da Segurança Social foram acrescentadas informações da entidade patronal da testemunha no ano de 2015 (Z….).
4. Apesar disso, por não prescindir da referida testemunha, imprescindível para que se faça justiça, requer a V. Ex.:
a) Se digne mandar notificar a Autoridade Tributária para vir aos autos indicar a morada que consta da sua base de dados relativa ao contribuinte nº ………., S….
b) Se digne mandar notificar a Segurança Social para vir aos autos informar quais as entidades patronais das seguintes testemunhas, no período entre 01/01/2012 e 31/12/2012 (ano a que se refere a obra e a fatura de I… Lda.):
- S…, NISS ………..
- W…, NISS ………..;
- X…, NISS ………..;
5. Com o mesmo objeto de averiguar se os outros trabalhadores do rol indicado pela empresa I…, Lda. prestaram trabalho para esta no período a que se refere a fatura nº…/2012. de 06/12/2012 do valor de €20.117,88, deverá a mesma empresa, ao abrigo do princípio da cooperação e para que se faça justiça, indicar os números de identificação da segurança social (NISS), por não constarem dos autos.
6. Por conseguinte, requer a V. Exa:
c) Se digne mandar notificar a empresa I… Lda., com sede na EN …, Edifício …, nº .., Loja …, …, …. - … Vila Nova de Cerveira, para vir aos indicar os NISS dos seguintes trabalhadores:
- J…
- K…
- L…
- Q…
- M…
7. Depois de prestada a informação requerida à empresa I… Lda., requer desde já a V. Exa:
d) Se digne mandar notificar a Segurança Social para vir aos autos informar quais as entidades patronais dos trabalhadores indicados no antecedente ponto 6. c), no período entre 01/01/2012 e 31/12/2012.
PEDE DEFERIMENTO”.
Proferiu-se o despacho recorrido em 12 de setembro de 2017, com o seguinte teor:
“ Requerimento de 8 de Setembro de 2017.
No que diz respeito à testemunha S…, o tribunal efetuou a pesquisa nas bases de dados, sendo certo que a notificação na morada apurada, através de funcionário judicial, se frustrou.
Tendo sido realizadas as diligências que se impunham, nada mais se nos afigura dever ser determinado a tal respeito.
Por outro lado, nesta data, desconhece, ainda, o tribunal o resultado do pedido de notificação das testemunhas W… e X….
Assim, indefiro o requerido no ponto 4., alíneas a) e b), cumprindo também realçar que as diligências em curso apenas visam alcançar a notificação das testemunhas indicadas pela autora, estando vedado à mesma, a esse propósito, indicar novos requerimentos probatórios.
Nestes termos, considerando o referido no parágrafo anterior, indefiro o requerido nos pontos 5., 6. e 7. do requerimento em análise”.
Na sessão de julgamento que teve lugar no dia 28 de setembro de 2017 a apelante formulou o seguinte requerimento:
“ Foi a Autora notificada do despacho proferido em 12 de Setembro de 2017, pelo qual o Tribunal indeferiu o requerido no ponto 4, alíneas a e b e os pontos 5, 6 e 7 do requerimento que a Autora apresentou em 8 de Setembro de 2017. Neste momento, encontrando-se ainda em curso o prazo de vista relativamente ao despacho proferido, uma vez que a Autora foi notificada no dia 19/09/2017, a Autora não prescinde do prazo de vista, que pelas suas contas termina no próximo dia 2/10/2017, ou seja, em data posterior à realização da presente audiência de julgamento. Por outro lado, a Autora não prescinde de ser ouvida a testemunha S… que em requerimento anterior considerou indispensável para a descoberta da verdade e para que se faça justiça também. Por esse motivo requer a V/Exª que o tribunal se pronuncie posteriormente ao decurso do prazo de vista do requerimento que referiu e que o Tribunal considere também o requerido pela Autora relativamente à audição da testemunha, S…. Pede deferimento."
Proferiu-se o seguinte despacho:
“ Neste momento, apenas poderá a Autora, neste caso, recorrer do mesmo no momento próprio, ou seja, não existe a nosso ver qualquer requerimento pendente e que cumpra ainda apreciar.
Relativamente ao requerimento acima referido, neste sentido, porque apenas caberá à autora recorrer do despacho em causa, recurso esse que apenas terá efeito suspensivo, embora isso também não se mostre para aqui determinante, só poderá, como já se disse, recorrer desse despacho.
Nada mais tendo sido requerido, indefiro também o requerido nesta audiência de julgamento, dando como concluída a produção de prova e dando agora a palavra aos Sr.(s) Mandatários para proferirem as suas alegações, as alegações a que têm direito e que estão previstas na lei”.
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A apelante confrontada com a falta de notificação da testemunha S… veio requerer a realização de diligências tendentes a obter a sua notificação e bem assim, não prescindiu do seu depoimento.
A questão que se coloca consiste assim em saber se cumpria ao tribunal promover as diligências sugeridas pela apelante.
Considerou-se no despacho recorrido que realizadas as pesquisas nas bases de dados e promovida a notificação da testemunha por contato pessoal nada mais cumpria realizar e perante a renovação do requerido, considerou-se expirado o poder jurisdicional.
As decisões não merecem censura.
Nos termos do art. 507º/2 CPC as testemunhas são apresentadas pelas partes, salvo se a parte que as indicou requerer, com a apresentação do rol, a sua notificação para comparência ou inquirição por teleconferência. Nos termos do nº3 do aludido preceito não são notificadas as testemunhas que as partes devam apresentar.
As testemunhas são notificadas, como determina o art. 251º/1 CPC por meio de aviso expedido pelo correio, sob registo.
Constitui, assim, um ónus da parte fornecer a identificação completa da testemunha cuja notificação requer, o que bem se compreende atendendo ao princípio do dispositivo. Recai sobre a parte o ónus de indicar a prova dos factos que lhe cumpre provar e por isso, tem uma posição privilegiada para indicar a identificação completa das testemunhas.
Contudo, ao abrigo do princípio da cooperação processual, nos termos do art. 7º/4 CPC, sempre que alguma das partes alegue justificadamente dificuldade séria em obter documento ou informação que condicione o eficaz exercício de faculdade ou cumprimento de ónus ou dever processual, deve o juiz, sempre que possível providenciar pela remoção do obstáculo.
No caso presente, em obediência ao douto acórdão do Tribunal da Relação do Porto, o tribunal diligenciou junto da sociedade I…, Lda por obter a identificação da testemunha – morada, número da segurança social, número do cartão de cidadão – e tais informações foram prestadas ( requerimentos juntos aos autos em 07 de julho 2017 e 21 de julho 2017 ). Consultou-se a base de dados e diligenciou-se pela notificação da testemunha por contato pessoal.
Verifica-se, assim, que contrariamente ao afirmado pela apelante, o tribunal de 1ª instância respeitou o caso julgado formado pelo acórdão do Tribunal da Relação do Porto e face às diligências promovidas nenhuma outra estava ao alcance do tribunal realizar, com fundamento no art. 7º/4 CPC. Aliás, a apelante na impugnação da decisão não se insurge contra os fundamentos da decisão limitando-se a tecer observações sobre a necessidade de produzir prova sobre certa matéria de facto.
Em relação ao segundo despacho proferido em 28 de setembro de 2017, no qual a apelante renova o requerimento anteriormente formulado, esgotado o poder jurisdicional do tribunal, nada mais cumpria decidir sobre a matéria ( art. 613º/1 e 3 CPC ).
A apelante insurge-se, ainda, contra o outro segmento do despacho proferido em 12 de setembro de 2017, que indeferiu a realização de outras diligências de instrução.
A questão que se coloca consiste em apurar se na fase de julgamento se justificava promover as diligências de prova sugeridas.
O autor deve formular o seu requerimento de provas com a petição, podendo alterar o mesmo, na audiência prévia, nos termos do art. 598º/1 CPC, quando haja lugar à sua realização.
Nos termos do art. 410º CPC a instrução tem por objeto os temas de prova enunciados ou, quando não tenha de haver lugar a esta enunciação, os factos necessitados de prova.
Contudo, como decorre do disposto no art. 411º CPC, incumbe ao juiz realizar ou ordenar, mesmo oficiosamente, todas as diligências necessárias ao apuramento da verdade e à justa composição do litígio, quanto aos factos de que lhe é lícito conhecer.
Este preceito consagra o princípio do inquisitório pelo que no domínio da instrução do processo cabe ao juiz a iniciativa e às partes incumbe o dever de colaborar na descoberta da verdade[5].
Na situação concreta, as diligências sugeridas não versavam sobre os factos objeto dos temas de prova. Algumas das informações solicitadas já tinham sido prestadas, como seja a indicação dos números de segurança social das testemunhas. Acresce que as testemunhas indicadas no requerimento prestaram os seus depoimentos nas sessões de julgamento de 08 de junho de 2017 e 28 de setembro de 2017, com exceção das testemunhas S… e Q…, porque não compareceram, nem foram notificadas. Resta referir que na fase em que foi formulado o requerimento o tribunal não estava em condições de poder ajuizar da necessidade de promover outras diligências de instrução, porque parte das testemunhas ainda não tinham sido inquiridas.
Conclui-se, assim, que não merece censura o despacho quando indefere a realização das diligências sugeridas, nem tal decisão viola o princípio do inquisitório consagrado no art. 411º CPC.
Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 13, 14, 15, 16, 17, 23, 24, 26, 28.
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- APELAÇÃO DESPACHO 28 SETEMBRO 2017 -
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Nas conclusões de recurso, sob os pontos 8 a 11, 30 e 31 insurge-se a apelante contra o despacho proferido em 28 de setembro de 2017, que indeferiu a junção de documentos.
Em sede de audiência de julgamento, na sessão de 28 de setembro de 2017, a apelante requereu:
“ Tendo em vista a prova dos temas de prova enunciados sob os nº(s) 1, 2 e 5 requeiro a junção de 5 documentos. Pede deferimento."
O requerimento mereceu oposição da ré, que se pronunciou nos seguintes termos:
“ A junção ora requerida é manifestamente intempestiva tanto mais que nem sequer foi alegada qualquer causa que tivesse impedido a junção de tais documentos na fase própria, ou seja, na fase dos articulados. Por outro lado, verifica-se que tais documentos nada têm que ver com os temas de prova a que estão definidos, reportam-se, alegadamente a preços praticados por outras empresas que se desconhecem quem sejam, sendo certo que pelo menos quanto ao documento 3, a Autora já o tinha juntado em momento anterior ao processo e essa junção foi indeferida, precisamente por não ter qualquer relevância para a boa decisão da causa, termos em que deve indeferir-se a requerida junção."
Proferiu-se o seguinte despacho:
“Considerando o disposto no art. 423º, n.º 3, do CPC, não se mostrando reunidos os pressupostos para que fosse aceite a junção nesta fase processual, indefiro o requerido”.
Argumenta a apelante que como os funcionários que alegadamente terão executado os trabalhos não sabiam os preços unitários dos materiais (conforme os depoimentos dos primeiros trabalhadores interrogados J…, K…, L… e M…), e em consequência dos depoimentos destas testemunhas, a Autora pretendeu juntar aos autos documentos com os preços unitários de mercado dos materiais alegadamente utilizados na construção da vedação. Considera que só com semelhante informação é que o tribunal estaria em condições de aquilatar se os custos da mão-de-obra somados aos custos dos materiais poderiam justificar o valor da fatura. Os documentos cuja junção foi indeferida pelo despacho recorrido referem-se a preços de custo da rede ovelheira e do arame ecover de 2,20 mm, materiais que os funcionários ouvidos nos seus depoimentos indicaram ter sido usados na obra. Deles também constam um mail da empresa O…, Lda. e duas faturas de limpeza do terreno da Ré efetuadas em 28/05/2010 e 13/12/2010 por P…. Das referidas faturas verifica-se que os materiais usados na construção da vedação e o trabalho realizado na limpeza poderia ter custado cerca de 1.000,00 euros, que acrescido da mão-de-obra poderia chegar a um máximo de 3.000,00 euros. E se considerarmos cerca de 30% de lucro para a empresa sobre os materiais e sobre a mão-de-obra, o trabalho de construção da vedação não ultrapassaria os 4.000,00 euros acrescido de IVA à taxa vigente (23 %).
A questão que se coloca consiste em apurar se podia a apelante requerer a junção dos documentos.
Em regra os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes, como decorre do art. 423º/1 CPC.
A parte pode ainda juntar documentos até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final ficando neste caso sujeito ao pagamento de multa, como se prevê no art. 423º/2 CPC.
Contudo, da conjugação do art. 423º/3, com o art. 425º CPC e art. 604º/3 e) CPC, após o limite temporal previsto no art. 423º/2 CPC e até ao encerramento da discussão em 1ª instância, concede a lei a faculdade de ser requerida a junção dos documentos cuja apresentação não tenha sido possível até àquele momento, bem como aqueles cuja apresentação se tenha tornado necessária em virtude de ocorrência posterior, mas a parte será condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
Este regime previsto no nosso sistema jurídico desde o Código de Processo Civil de 1939, assenta os seus fundamentos nos princípios da economia processual e da boa-fé processual. Pretende-se que por motivos de ordem e disciplina processual, que quem afirma um facto ofereça desde logo, se puder, a prova documental das suas afirmações, habilitando a parte contrária a tomar posição sobre os factos de forma informada[6].
A possibilidade de apresentar os documentos até ao encerramento da discussão em 1ª instância decorre do princípio de que o juiz deve julgar segundo a verdade.
Daqui resulta que não apresentando a parte o documento com o articulado, como era seu ónus, não fica impedida de o fazer em momento posterior, até ao encerramento da discussão em 1ª instância, desde que demonstre as circunstâncias supervenientes que justificam a sua junção.
No caso presente a apelante requereu a junção dos documentos em sede de sessão de julgamento, antes do encerramento da discussão, sem indicar o motivo superveniente que justificava a sua junção. Desta forma não estavam preenchidos os pressupostos do art. 423º/3 CPC para admitir a sua junção, como se decidiu no despacho recorrido.
Apenas, agora em sede de recurso, veio o apelante alegar os factos que justificam a junção extemporânea dos documentos.
Contudo, porque o recurso tem por função a reapreciação da decisão proferida e não estando em causa matéria de conhecimento oficioso, o tribunal de recurso está impedido de apreciar dos novos fundamentos de sustentação da pretensão (art. 627º/1 CPC).
Conclui-se não merecer censura o despacho que indeferiu a junção dos documentos.
Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob os pontos 8 a 11, 30 e 31.
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- Inconstitucionalidade dos despachos recorridos -
Na última questão colocada no recurso, sob o ponto 29, suscita a apelante a inconstitucionalidade da concreta interpretação do art. 423º/3 CPC.
Considera que a interpretação concreta que o tribunal recorrido deu ao disposto no artigo 423º nº3 do CPC, para fundamentar que não se mostram reunidos os pressupostos para que os documentos fossem aceites nesta fase processual, ou porque estivesse vedado à Autora (conforme despacho recorrido de 12/09/2017), é inconstitucional por violar o disposto quanto aos direitos, aos princípios e às garantias constitucionalmente consagradas, como sejam o princípio da igualdade e o princípio da proporcionalidade, o princípio do contraditório, o princípio da segurança jurídica e da proteção da confiança plasmados respetivamente nos artigos 13°, 18° n.° 2, 2º e 20º nº 4 da Constituição da República Portuguesa, bem assim as normas constitucionais constantes dos artigos 202º nº 2 e 3, 203º e 204º da Constituição.
Trata-se, assim, de aferir da alegada inconstitucionalidade na interpretação da norma.
A respeito da conformidade da interpretação das normas jurídicas com o direito constitucional refere GOMES CANOTILHO:“[o] princípio da interpretação das leis em conformidade com a constituição é fundamentalmente um princípio de controlo (tem como função assegurar a constitucionalidade da interpretação) e ganha relevância autónoma quando a utilização dos vários elementos interpretativos não permite a obtenção de um sentido inequívoco dentre os vários significados da norma. Daí a sua formulação básica: no caso de normas polissémicas ou plurisignificativas deve dar-se preferência à interpretação que lhe dê um sentido em conformidade com a constituição”[7].
A inconstitucionalidade deve ser suscitada de forma processualmente adequada junto do tribunal que proferiu a decisão, de forma a obrigar ao seu conhecimento (art. 72º LTC).
Recai sobre o recorrente o ónus de colocar a questão de inconstitucionalidade, enunciando-a de forma expressa, clara e percetível e segundo os requisitos previstos na lei.
Por outro lado, pretendendo questionar certa interpretação de um preceito legal, deverá o recorrente especificar claramente qual o sentido ou dimensão normativa do preceito ou preceitos que tem por violador da Constituição, enunciando com precisão e rigor todos os pressupostos essenciais da dimensão normativa tida por inconstitucional.
Esta tem sido a interpretação desenvolvida pelo Tribunal Constitucional, como disso dá nota, entre outros, o Ac.do Tribunal Constitucional nº 560/94 (acessível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/) quando observa:”[d]e facto, a inconstitucionalidade de uma norma jurídica só se suscita durante o processo, quando tal questão se coloca perante o tribunal recorrido a tempo de ele a poder decidir e em termos de ficar a saber que tem essa questão para resolver – o que, obviamente, exige que quem tem o ónus da suscitação da questão de constitucionalidade a coloque de forma clara e percetível.
Bem se compreende que assim seja, pois que, se o tribunal recorrido não for confrontado com a questão da constitucionalidade, não tem o dever de a decidir. E, não a decidindo, o Tribunal Constitucional, se interviesse em via de recurso, em vez de ir reapreciar uma questão que o tribunal recorrido julgara, iria conhecer dela ex novo.
A exigência de um cabal cumprimentos do ónus da suscitação atempada - e processualmente adequada – da questão de constitucionalidade não é, pois - […]-, uma “mera questão de forma secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal recorrido deva pronunciar-se, sobre a questão de constitucionalidade e para que o Tribunal Constitucional, ao julga-la em via de recurso, proceda ao reexame ( e não a um primeiro julgamento ) de tal questão”.
No caso presente a apelante indica os preceitos constitucionais que em seu entender foram violados, mas não indica o segmento interpretativo adotado e que contraria tais preceitos constitucionais, o que impede a apreciação da constitucionalidade.
Por outro lado, a mera afirmação de que existe inconstitucionalidade na aplicação de determinadas normas, não equivale a suscitar, validamente, uma questão de inconstitucionalidade normativa.
A válida imputação de inconstitucionalidade a uma norma (ou a uma sua dimensão parcelar ou interpretação), impõe, a quem pretende atacar, na perspetiva da sua compatibilidade com normas ou princípios constitucionais, determinada interpretação normativa, indicar concretamente a dimensão normativa que considera inconstitucional, o que também não ocorre no caso concreto. Acresce que a apelante não desenvolve o seu raciocínio na motivação do recurso.
Nesta perspetiva, considera-se que a apelante não suscita, validamente, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, pelo que, improcedem, nesta parte as conclusões de recurso, sob o ponto 29.
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Nas conclusões sob os pontos 12 e 19 a apelante reporta-se a requerimento e despachos que transitaram em julgado, na medida em que não foram objeto de impugnação, pelo que, o respeito do caso julgado impede a sua reapreciação (art. 620º/1, 628º CPC).
Resta referir que as conclusões de recurso, sob os pontos 1 a 7, versam sobre matéria irrelevante para reapreciar os despachos recorridos e os pontos 20, 21, 22, 25, 27 reportam-se à apreciação do mérito da causa, que não constitui objeto de análise no presente recurso.
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Em conclusão, julgam-se improcedentes as conclusões de recurso, confirmando-se os despachos recorridos.
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- APELAÇÃO DA SENTENÇA -
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- Fundamentos para rejeição do recurso -
O apelado defende, sob o ponto 1 das conclusões, que a apelante deve ser notificada para aperfeiçoar as conclusões de recurso, com a cominação de rejeição, porque se mostram prolixas e complexas, para além de se estenderem numa sucessão de parágrafos que dificultam a sua interpretação.
Prevê-se no art. 639º/3 CPC que quando as conclusões sejam obscuras e complexas o relator deve convidar o recorrente a esclarecê-las ou sintetiza-las no prazo de cinco dias, sob pena de se não conhecer do recurso na parte afetada.
A omissão de resposta por parte do apelante não importa a rejeição do recurso, como pretende o apelado, mas tão só, o não conhecimento do recurso na parte afetada.
No caso presente o juiz relator não procedeu ao convite a que se alude na lei, por entender constituir um ato inútil.
As conclusões de recurso não primam pela síntese, mas enunciam as questões a reapreciar, revelando os autos que o apelado entendeu o alcance das mesmas na resposta ao recurso que apresentou.
Considera-se, assim, que as conclusões reúnem os requisitos necessários para a apreciação do recurso.
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- Da admissibilidade da junção de documentos com as alegações de recurso -
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Nas alegações de recurso requereu a apelante a junção de um documento – certidão permanente – para prova da inexistência de órgão de fiscalização na sociedade ré, com a vista a demonstrar que as custas devem ser suportadas pela sociedade ré, nos termos do art. 60º do Código das Sociedades Comerciais.
Em regra os documentos destinados a fazer prova dos fundamentos da ação ou da defesa devem ser apresentados com o articulado em que se aleguem os factos correspondentes, como decorre do art. 423º/1 CPC.
A parte pode ainda juntar documentos até 20 dias antes da data em que se realize a audiência final ficando neste caso sujeito ao pagamento de multa, como se prevê no art. 423º/2 CPC.
Contudo, a lei, no art. 423º/3 CPC, concede a faculdade de ser requerida a junção dos documentos até ao encerramento da discussão em 1ª instância, mas a parte será condenada em multa, exceto se provar que os não pôde oferecer com o articulado.
Este regime previsto no nosso sistema jurídico desde o Código de Processo Civil de 1939, assenta os seus fundamentos nos princípios da economia processual e da boa-fé processual. Pretende-se que por motivos de ordem e disciplina processual, que quem afirma um facto ofereça desde logo, se puder, a prova documental das suas afirmações, habilitando a parte contrária a tomar posição sobre os factos de forma informada[8].
A possibilidade de apresentar os documentos até ao encerramento da discussão em 1ª instância decorre do princípio de que o juiz deve julgar segundo a verdade.
Daqui resulta que não apresentando a parte o documento com o articulado, como era seu ónus, não fica impedida de o fazer em momento posterior, até ao encerramento da discussão em 1ª instância.
Como se prevê no art. 425º CPC depois do encerramento da discussão, em sede de recurso só são admitidos os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento.
Como observava ALBERTO DOS REIS: “[c]oncilia-se assim o princípio de disciplina processual que postula o oferecimento imediato de documentos, com o princípio de justiça segundo o qual a decisão deve ser a expressão, tão perfeita e completa quanto possível, da verdade dos factos que interessam ao litígio”[9].
A junção de documentos em sede de recurso está contudo subordinada ao critério estabelecido no art. 651º CPC, no qual se determina que:
“ As partes apenas podem juntar documentos às alegações nas situações excecionais a que se refere o art. 425º ou no caso de a junção se ter tornado necessária em virtude do julgamento proferido na 1ª instância”.
Dispõe o art.425ºCPC:
“Depois do encerramento da discussão só são admitidos, no caso de recurso, os documentos cuja apresentação não tenha sido possível até aquele momento”.
Decorre deste regime que em sede de recurso, nas alegações, as partes podem juntar documentos, quando:
- a sua apresentação não tenha sido possível até esse momento – superveniência objetiva ( fundada na data do facto a provar ou do documento comprovante ) ou subjetiva ( baseada no desconhecimento da existência do documento, na indisponibilidade dele por parte do interessado ou na necessidade de alegação e prova do facto );
- se tenha revelado necessária por virtude do julgamento proferido, maxime quando esta se revele de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos já constantes do processo[10].
No caso em análise a apelante requereu a junção do documento em virtude do julgamento proferido na 1ª instância, e uma vez que a decisão se revelou de todo surpreendente relativamente ao que seria expectável em face dos elementos probatórios que já constam do processo.
Analisado o documento em confronto com os fundamentos dos articulados e com teor da decisão proferida em 1ª instância, resulta que na sentença o juiz do tribunal “a quo“ não veio invocar novos e diferentes argumentos.
A junção de documentos em sede de alegações face ao julgamento em 1ª instância, funda-se no imprevisto da decisão proferida, quer por razões de direito, quer por razões de prova[11].
No caso presente a decisão proferida não se funda em normas jurídicas com cuja aplicação a parte não contava, nem a junção da certidão permanente como meio de prova pode contribuir para apurar factos diferentes daqueles que se mostram provados, com relevância na decisão final e que não foram atendidos por omissão de prova documental.
Acresce que com a petição foi junta certidão de igual teor, constituindo esta certidão a duplicação da certidão já existente.
Conclui-se, assim, que atento o critério previsto no art. 651º/1 CPC carece de fundamento legal e não se mostra pertinente a requerida junção do documento, motivo pelo qual se determina o seu desentranhamento e devolução ao apresentante.
O incidente será tributado com custas a cargo dos apelantes, fixando-se a taxa de justiça em € 60,00 ( sessenta euro ) – art. 543º/1 CPC e art. 27º/1/3 RCJ.
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- Omissão de diligências de instrução -
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 23 e 25, insurge-se a apelante contra os despachos proferidos em 12 de setembro e 28 de setembro de 2017.
O recurso nesta parte deve ser rejeitado por intempestivo.
Os pressupostos processuais específicos em matéria de recursos constituem as circunstâncias de cuja verificação depende a possibilidade do tribunal superior se debruçar sobre o concreto objeto do recurso.
Contam-se entre tais pressupostos a tempestividade do recurso, que nos merece particular atenção, por ser esse o fundamento para a não admissão do recurso.
O recurso está sujeito a um prazo de natureza perentória cujo decurso determina a definitividade da decisão decorrente da formação do caso julgado.
Nos termos do art. 644º/1/2 d) CPC conjugado com o art. 638 o prazo de recurso de despacho que rejeite meios de prova é de 15 dias.
Na data em que foi interposto o recurso -20 de novembro de 2017 – estava já expirado o prazo de 15 dias.
Por intempestivo não se aprecia o recurso nesta parte, improcedente os pontos 23 e 25 das conclusões de recurso.
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- Nulidade da decisão, por constituir uma decisão surpresa -
No ponto 1 das conclusões de recurso argumenta a apelante que a decisão proferida constitui uma decisão surpresa, porque não reflete o julgamento da causa.
Cumpre apreciar se estamos perante uma “decisão surpresa”.
Nos termos do art. 3º/3 CPC “[o] juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem”.
Dispõe, por sua vez, o artigo 4.º do mesmo diploma legal: “[o] tribunal deve assegurar, ao longo de todo o processo, um estatuto de igualdade substancial das partes, designadamente no exercício de faculdades, no uso de meios de defesa e na aplicação de cominações ou de sanções processuais”.
Como observa LEBRE DE FREITAS[12] a consagração do princípio da proibição das decisões surpresa, resulta de uma conceção moderna e mais ampla do princípio do contraditório,“[…]com origem na garantia constitucional do Rechtiches Gehör germânico, entendido com uma garantia de participação efetiva das partes no desenvolvimento de todo litígio, mediante a possibilidade de, em plena igualdade, influírem em todos os elementos (factos, provas, questões de direito) que se encontrem em ligação com o objeto da causa e que em qualquer fase do processo apareçam como potencialmente relevantes para a decisão”.
O princípio do contraditório no plano das questões de direito exige que antes da sentença, às partes seja facultada a discussão efetiva de todos os fundamentos de direito em que a decisão se baseie[13].
Conforme resulta do regime legal o juiz deve fazer cumprir o princípio do contraditório em relação às questões de direito, mesmo de conhecimento oficioso, só estando dispensado de o fazer em casos de manifesta desnecessidade.
Pretende-se, por esta via, evitar a formação de “decisões-surpresa”, ou seja, decisões sobre questões de direito material ou de direito processual, de que o tribunal pode conhecer oficiosamente sem que tenham sido previamente consideradas pelas partes.
Dispensa-se a audição da parte contrária em casos de manifesta desnecessidade, o que pode ocorrer quando:
- “as partes embora não a tenham invocado expressamente nem referido o preceito legal aplicável, implicitamente a tiveram em conta sem sombra de dúvida, designadamente por ter sido apresentada uma versão fáctica, não contrariada, que manifestamente não consentia outra qualificação;
- quando a questão seja decidida favoravelmente à parte não ouvida; ou
- quando seja proferido despacho que convide uma das partes a sanar a irregularidade ou uma insuficiência expositiva”[14].
Na interpretação do conceito de “decisão-surpresa” o Supremo Tribunal de Justiça tem defendido que “o princípio do contraditório, na vertente proibitiva da decisão surpresa, não determina ao tribunal de recurso que, antes de decidir a questão proposta pelo recorrente e/ou recorrido, o alerte para a eventualidade de o fazer com base num quadro normativo distinto do por si invocado, desde que as normas concretamente aplicadas não exorbitem da esfera da alegação jurídica efetuada (Ac. STJ 11 de fevereiro de 2015, Proc. 877/12.7TVLSB.L1-A.S1, www.dgsi.pt ).
Por outro lado, considera-se que o cumprimento do contraditório não significa “ que o tribunal «discuta com as partes o que quer que seja» e que alivie as mesmas « de usarem a diligência devida para preverem as questões que vêm a ser, ou podem vir a ser, importantes para a decisão»”( Ac. STJ 09 novembro de 2017, Proc. 26399/09.5T2SNT.L1.S1, Ac STJ 17 de junho de 2014, Proc. 233/2000.C2.S1 www.dgsi.pt ).
Considera-se, ainda, que: “[h]á decisão surpresa se o Juiz, de forma absolutamente inopinada e apartado de qualquer aportamento factual ou jurídico, envereda por uma solução que os sujeitos processuais não quiseram submeter ao seu juízo, ainda que possa ser a solução que mais se adeque a uma correta e atinada decisão do litígio. Ou seja, apenas estamos perante uma decisão surpresa quando ela comporte uma solução jurídica que as partes não tinham obrigação de prever” (Ac. STJ 19 de maio de 2016, Proc. 6473/03.2TVPRT.P1.S1, www.dgsi.pt ).
LOPES DO REGO defende que “[…]na audição excecional e complementar das partes, fora dos momentos processuais normalmente idóneos para produzir alegações de direito, só deverá ter lugar quando se trate de apreciar questões jurídicas suscetíveis de se repercutirem, de forma relevante e inovatória, no conteúdo da decisão e quando não for exigível que a parte interessada a houvesse perspetivado durante o processo, tomando oportunamente posição sobre ela”[15].
O exercício do contraditório dependerá sempre da verificação de uma nova abordagem jurídica da questão, que não fosse perspetivada pelas partes, mesmo usando da diligência devida.
No caso presente não estamos perante uma decisão surpresa, porque o tribunal limitou-se a analisar os fundamentos do pedido em confronto com a causa de pedir, aplicando o direito aos factos, ponderando os argumentos jurídicos apresentados pelas partes nos autos.
A inconformidade com o decidido confere à parte o direito de impugnar a decisão, mas não configura uma decisão surpresa.
Acresce que a apelante não indica os motivos pelos quais considera estar perante uma decisão surpresa, nem extrai qualquer consequência da sua alegação.
A omissão do exercício do contraditório constitui uma nulidade processual.
As nulidades processuais “[…] são quaisquer desvios do formalismo processual prescrito na lei, e a que esta faça corresponder – embora não de modo expresso – uma invalidade mais ou menos extensa de aspetos processuais“[16].
Atento o disposto nos art. 195º e seg. CPC, as nulidades processuais podem consistir na prática de um ato proibido, omissão de um ato prescrito na lei ou realização de um ato imposto ou permitido por lei, mas sem o formalismo requerido.
Porém, como referia o Professor ALBERTO DOS REIS há nulidades principais e nulidades secundárias, que presentemente a lei qualifica como “irregularidades“, sendo o seu regime diverso quanto à invocação e quanto aos efeitos[17].
As nulidades principais estão previstas, taxativamente, nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC e por sua vez as irregularidades estão incluídas na previsão geral do art. 195º CPC e cujo regime de arguição está sujeito ao disposto no art. 199º CPC.
A omissão do exercício do contraditório não constitui uma nulidade principal, pois não consta do elenco das nulidades previstas nos art. 186º a 194º e 196º a 198º do CPC.
Representa, pois, a omissão de um ato ou formalidade que a lei prescreve, que cai na previsão do art. 195º CPC e por isso, configura uma irregularidade que só determina a nulidade do processado subsequente àquela omissão se influir no exame e decisão da causa, estando o seu conhecimento dependente da arguição, nos termos previsto no art. 199º CPC.
Neste sentido se pronunciaram, entre outros, o Ac. STJ 02 de julho de 2015, Proc. 2641/13.7TTLSB.L1.S1, Ac. STJ 29 de janeiro de 2015, Proc. 531/11.7TVLSB.L1.S1 (todos acessíveis em www.dgsi.pt).
A lei não fornece uma definição do que se deve entender por “irregularidade que possa influir no exame e decisão da causa”.
No sentido de interpretar o conceito o Professor ALBERTO DOS REIS tecia as seguintes considerações:“[o]s atos de processo têem uma finalidade inegável: assegurar a justa decisão da causa; e como a decisão não pode ser conscienciosa e justa se a causa não estiver convenientemente instruída e discutida, segue-se que o fim geral que se tem em vista com a regulação e organização dos actos de processo está satisfeito se as diligências, atos e formalidades que se praticaram garantem a instrução, a discussão e o julgamento regular do pleito; pelo contrário, o referido fim mostrar-se-á prejudicado se se praticaram ou omitiram atos ou deixaram de observar-se formalidades que comprometem o conhecimento regular da causa e portanto a instrução, a discussão ou o julgamento dela“[18].
Daqui decorre que uma irregularidade pode influir no exame e decisão da causa, se comprometer o conhecimento da causa, a instrução, discussão e julgamento.
Tal omissão tinha de ser arguida logo que conhecida, e no prazo previsto no art. 149º/1 CPC, ou seja, a partir da data em que as partes foram notificadas da sentença.
O recurso de apelação não constitui o meio processual próprio para conhecer das infrações às regras do processo quando a parte interessada não arguiu a nulidade perante o tribunal onde aquela alegadamente ocorreu, conforme resulta do regime previsto nos art. 196º a 199º CPC.
Improcedem, nesta parte, as conclusões de recurso sob o ponto 1.
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- Nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 c) CPC -
Nas conclusões de recurso sob o ponto 8 suscita o apelante a nulidade da sentença, com fundamento no art. 615º/1 c) CPC.
Resulta do disposto no art. 615º/1 c) CPC, que a sentença é nula quando os fundamentos estejam em oposição com a decisão.
A previsão da norma contempla as situações de contradição real entre os fundamentos e a decisão e não as hipóteses de contradição aparente, resultante de simples erro material, seja na fundamentação, seja na decisão.
Como referia o PROFESSOR ANTUNES VARELA: “a norma abrange os casos em que há um vício real no raciocínio do julgador: a fundamentação aponta num sentido; a decisão segue caminho oposto ou, pelo menos, direção diferente“[19].
No caso presente existe na sentença uma perfeita coerência no raciocínio e a decisão resulta como a conclusão lógica desse raciocínio, pois considerou-se perante os factos provados, que não estavam reunidos os pressupostos para julgar procedente a pretensão da apelante.
Perante os factos provados, a interpretação e análise dos mesmos à face do direito, apenas podia conduzir à decisão a que chegou o juiz do tribunal “a quo”, motivo pelo qual não se verifica a apontada nulidade.
Improcedem, nesta parte, as conclusões de recurso sob o ponto 8.
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Nos termos do art. 615º/1 c) CPC a sentença é ainda nula quando ocorra alguma ambiguidade ou obscuridade que torne a decisão ininteligível.
Considera-se que a sentença é obscura quando enferma de “ ambiguidade, equivocidade ou de falta de inteligibilidade”
A sentença é ambígua quando alguma das suas passagens se presta a diferentes interpretações ou pode comportar mais do que um sentido, quer na fundamentação, quer na decisão. A sentença mostra-se equívoca quando o sentido decisório se perfile como duvidoso para um qualquer destinatário normal.
Contudo, este vício apenas determina a nulidade da sentença se a decisão for ininteligível ou incompreensível[20].
A ininteligibilidade da decisão corresponde à falta ou ininteligibilidade da indicação do pedido na petição inicial (art.186º2 a)CPC)[21].
No caso concreto a sentença contém uma decisão expressa em termos inequívocos. Os fundamentos que conduziram à decisão são eles também objetivos e não são suscetíveis de várias interpretações. Acresce que a fundamentação apoia-se nos factos provados e apenas pela impugnação da decisão pode ser objeto de reapreciação.
Conclui-se que a sentença se mostra válida.
Improcedem, também nesta parte, as conclusões de recurso sob o ponto 8.
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- Reapreciação da decisão de facto -
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 15, 16, 17, 18, 19, 30, 31, 34, 35 a apelante insurge-se contra a decisão de facto, com fundamento em erro na apreciação da prova e por omissão de factos relevantes para a apreciação da prova, pretendendo a ampliação da matéria de facto.
A apelada considera que deve ser rejeitada a reapreciação da decisão de facto, porque não estão reunidos os pressupostos de ordem formal, na medida em que a apelante não indicou os meios de prova a reapreciar.
Cumpre apreciar da verificação dos pressupostos formais para proceder à reapreciação da decisão de facto.
O art. 640º CPC estabelece os ónus a cargo do recorrente que impugna a decisão da matéria de facto, nos seguintes termos:
“ 1. Quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, deve o recorrente obrigatoriamente especificar, sob pena de rejeição:
a) Os concretos pontos de facto que considera incorretamente julgados;
b) Os concretos meios probatórios, constantes do processo ou de registo ou gravação nele realizada, que impunham decisão sobre os pontos da matéria de facto impugnados diversa da recorrida;
c) A decisão que, no seu entender, deve ser proferida sobre as questões de facto impugnadas.
2. No caso previsto na alínea b) do número anterior, observa-se o seguinte:
a) Quando os meios probatórios invocados como fundamento do erro na apreciação das provas tenham sido gravados, incumbe ao recorrente, sob pena de imediata rejeição do recurso na respetiva parte, indicar com exatidão as passagens da gravação em que funda o seu recurso, sem prejuízo de poder proceder à transcrição dos excertos que considere relevantes;
b) Independentemente dos poderes de investigação oficiosa do tribunal, incumbe ao recorrido designar os meios de prova que infirmem as conclusões do recorrente e, se os depoimentos tiverem sido gravados, indicar com exatidão as passagens da gravação em que se funda e proceder, querendo, à transcrição dos excertos que considere importantes.
3. […]”
O presente regime veio concretizar a forma como se processa a impugnação da decisão, reforçando o ónus de alegação imposto ao recorrente, prevendo que deixe expresso a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação em sede de reapreciação dos meios de prova[22].
Recai, assim, sobre o recorrente, face ao regime concebido, um ónus, sob pena de rejeição do recurso, de determinar com toda a precisão os concretos pontos da decisão que pretende questionar – delimitar o objeto do recurso - , motivar o seu recurso através da indicação dos concretos meios de prova que, no seu entendimento, impunham decisão diversa sobre a matéria de facto - fundamentação - e ainda, indicar a solução alternativa que, em seu entender, deve ser proferida pela Relação.
No caso concreto, realizou-se o julgamento com gravação dos depoimentos prestados em audiência e o apelante veio impugnar a decisão da matéria de facto, com indicação dos pontos de facto impugnados – art. 35º, 36º, 43º, 44º, 45º, 46º, 47º, 54º, 57º, 66º da petição e todos julgados não provados.
Indicou a decisão que sugere, pretendendo que se julgue tal matéria como factos provados.
Contudo, apenas indicou a prova a reapreciar em relação aos factos enunciados sob os art. 35, 36, 57 e 66 da petição. Nem na motivação do recurso, nem nas conclusões indicou a prova a reapreciar e que justifica a alteração sugerida, em relação à matéria dos art. 43º, 44º, 45º, 46º, 47º, 54º da petição.
Nos termos do art. 640º/1/2 do CPC não se consideram reunidos os pressupostos de ordem formal para proceder à reapreciação da decisão de facto, quanto à matéria dos art. 43º, 44º, 45º, 46º, 47º, 54º da petição inicial e nesta parte, rejeita-se o recurso.
A reapreciação da decisão de facto prossegue apenas a respeito da matéria dos art. 35º, 36º, 57º e 66º da petição inicial.
*
Nos termos do art. 662º/1 CPC a Relação deve alterar a decisão proferida sobre a matéria de facto:
“ […]se os factos tidos como assentes, a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa”.
A respeito da matéria dos art. 35º e 36º da petição a apelante considera que os factos se encontram admitidos por acordo, porque a ré não impugnou tal matéria na contestação.
Está em causa a apreciação dos seguintes factos:
35º - No dia 21/03/2013, pelas 10h00, a administradora única e o ROC da A., apresentaram-se no gabinete de contabilidade da AC… para consultarem os documentos de prestação de contas da R. relativos ao ano de 2012 e verificaram o seguinte:
a) Em 2009 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €37.375,00;
b) Em 2010 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €34.375,00;
c) Em 2011 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €19.000,00;
d) Em 2012 os rendimentos e ganhos ascenderam ao montante de €1.003,70.
36 º - A administradora única e o ROC da A. verificaram ainda que:
a) Em 2009 o resultado líquido foi positivo (lucro) no montante de €10.884,04;
b) Em 2010 o resultado líquido foi positivo (lucro) no montante de e €6.880,74;
c) Em 2011 o resultado líquido foi positivo (lucro) no montante de €2.761,95;
d) Em 2012 o resultado líquido foi negativo (prejuízo) no montante de €16.518,89.
A matéria em causa foi expressamente impugnada pela ré no art. 189º da contestação[“A R. não sabe se corresponde ou não à verdade o alegado nos artigos 14º a 18º, 35º e 36º da douta petição, que por não serem factos pessoais ou de que a R. deva ter conhecimento, vão expressamente impugnados”].
Desta forma, não opera o efeito previsto no art. 574º/2 CPC e porque constitui matéria controvertida, a mesma devia ser submetida a julgamento, como foi.
Improcede nesta parte a impugnação.
Quanto à matéria do art. 57º e 66º da petição inicial considera a apelante que o teor dos documentos nº7 e nº8 (fls. 43 e 44), juntamente com o facto provado, sob a alínea p), justificam a alteração da decisão sobre a concreta matéria, no sentido de se julgarem provados.
No art. 57º da petição inicial alegou-se:
- A A. já solicitou à R. para ser emitido um novo cheque (do montante de €5.547,20) destinado ao reembolso dos suprimentos contabilizados na sua conta corrente (com o código contabilístico 25519, em 31/12/2009), o que a R. não fez (doc. 8).
No art. 66º da petição alegou a apelante:
- Estes dois lançamentos contabilísticos são falsos, não possuem o adequado suporte documental, não representam de forma fiel e verdadeira a situação económica e financeira da R., e são mantidos na sua contabilidade intencionalmente pelos citados gerentes em exercício, com o propósito de prejudicarem a A.
Na fundamentação da decisão considerou-se:
“ O tribunal teve em consideração os documentos juntos aos autos, o depoimento de parte prestado pelos representantes da ré, bem como os depoimentos das testemunhas inquiridas em audiência de discussão e julgamento.
Os representantes da ré, em depoimento de parte, aludiram à deslocação da administradora única da autora e do seu ROC (a testemunha V…) ao gabinete de contabilidade da ré antes da assembleia geral de 1 de Abril de 2013, à circunstância de anualmente ser feita uma limpeza no terreno onde se encontra instalada a discoteca, aos trabalhos realizados e a que diz respeito a fatura identificada nos autos e à emissão do cheque no valor de 5.547,20 euros, relativo a pagamento de suprimentos da autora, o qual não chegou a ser entregue (por divergências relativas à falta de entrega da contabilidade da ré), apesar de ter sido lançado nas contas da ré.
A testemunha AB… foi sócio da ré até 2006. Referiu que a ré não tem atividade há cerca de 4/5 anos, estando a discoteca fechada, e que, no seu tempo, iam sendo feitas obras, nomeadamente, uma limpeza anual. No entanto, quando saiu da sociedade comercial ré também de desligou dos assuntos relativos à mesma.
A testemunha U… é sócio e gerente do gabinete de contabilidade “AC…”, que trata da contabilidade da ré desde a sua constituição, com exceção do ano de 2007. Disse que o ROC da autora (a testemunha V…) e T… vão todos os anos ao seu gabinete antes das assembleias gerais anuais. Desconhece quais os elementos que foram pedidos em 2013, mas tudo o que pediam e pedem é-lhes entregue, não tendo memória de alguma vez faltarem documentos. Referiu-se à existência de obras de manutenção, de valores diferentes. No que diz respeito à fatura em causa, cujo pagamento está refletido na contabilidade, teve lugar uma fiscalização pela Autoridade Tributária e Aduaneira e nada de irregular foi detetado [o relatório consta de fls. 167 e seguintes]. Na contabilidade apenas existia a fatura. No que concerne ao cheque relativo aos suprimentos, foi o mesmo contabilizado com base numa cópia (abateu à conta de suprimentos e ao valor do depósito bancário). Tal cheque nunca foi descontado (o Sr. V… disse-lhe que o cheque nunca lhe tinha sido entregue) e a situação foi entretanto regularizada (acha que o cheque não foi entregue na sequência dos desentendimentos existentes “entre eles” por causa de documentos que o Sr. V… não entregou, relativos à contabilidade da ré). A testemunha disse, ainda, que a discoteca não é explorada pela ré desde 2008 e não é explorada por ninguém desde 2013.
[…]
A testemunha V…, ROC da autora até há 2 anos, foi contabilista da ré no ano de 2007, trabalha com T…, administradora única da autora, com quem viveu em união de facto até Junho de 2016.
[…]
A testemunha aludiu também ao cheque relativo ao reembolso de suprimentos da autora e lançado na contabilidade sem que tenha sido pago, daí decorrendo a divergência entre os extratos bancários e o extrato da contabilidade (desconformidade entre o saldo contabilístico, o saldo bancário e o saldo de suprimentos), reconhecendo, no entanto, que a situação foi entretanto regularizada”.
O doc. nº 7-1 constitui uma carta subscrita pela autora e dirigida a D… e E…, na qualidade de sócio-gerente da sociedade AD…, Lda, a qual não contém data e onde, entre outros assuntos, a apelante solicita o reembolso de suprimentos.
O doc. nº7 - 2 constituem o registo e o aviso de receção.
O doc nº 8 constitui um extrato de conta, da conta 25519 – Sócios, da sociedade ré, com vários lançamentos.
Na alínea p) dos factos provados consignou-se:
p) A autora enviou ao gerente D… e E… a carta cuja cópia se encontra junta a fls. 43 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, datada de 19 de Novembro de 2012, solicitando, para além do mais, o seguinte:
“B) Ao abrigo do disposto nos artigos 209º, 244º e 245º do CSC, requerer o reembolso no prazo máximo de 10 dias a contar da receção desta carta, sob pena da exigibilidade de juros de mora à taxa legal a contar desde a data dos suprimentos que lhe pertencem proporcionalmente ao valor das três participações do capital social de que é titular na sociedade totalizando euros vinte e três mil cento e setenta e três euros (…)”;
Os documentos em causa fundamentam apenas os factos que se julgaram provados sob a alínea p).
Através da carta subscrita pela autora constata-se que a autora solicitou o pagamento de suprimentos. Os demais documentos não permitem considerar que a autora não obteve o seu pagamento, pois o extrato de conta apenas expressa um movimento a débito no valor a que alude a apelante. Os meios de prova indicados pela apelante não permitem aferir da efetiva intenção com que agiram os gerentes da ré.
Conclui-se, que a prova indicada não se mostra idónea para fundamentar a alteração da decisão, que se mantém.
Resta apreciar dos fundamentos para ampliar a decisão de facto, como se pretende, sob o ponto 31 das conclusões de recurso.
Para justificar a ampliação alega a apelante “[p]elo exposto, ao abrigo do disposto no artigo 662º nº 2 alínea c) do CPC, e subsidiariamente, deverá o tribunal da Relação anular a decisão do tribunal recorrido, por não constarem do processo todos os elementos que, nos termos do nº 1 do referido artigo, permitam a alteração da matéria de facto tendo em vista os temas da prova e o objeto da prova, ampliando-se este de modo a permitir as diligências probatórias requeridas ou que a Autora formule novo requerimento no limite das premissas que o tribunal ad quem fixar”.
Cumpre, assim, apreciar se se justifica a anulação da decisão e a requerida ampliação da decisão de facto.
Nos termos do art. 666º/2 c) CPC mostrando-se indispensável ampliar a matéria de facto, deve o tribunal da Relação alterar a decisão da matéria de facto, se a prova produzida ou um documento superveniente impuserem decisão diversa. Não sendo possível fazer uso de tal faculdade, deve o tribunal anular a decisão.
A ampliação da matéria de facto mostra-se indispensável, quando se tenham omitido dos temas da prova factos alegados pelas partes que se revelam essenciais para a resolução do litígio, na medida em que assegurem enquadramento jurídico diverso do suposto pelo juiz do tribunal “a quo”[23].
Os factos essenciais são aqueles que permitem individualizar a situação jurídica alegada na ação ou na exceção.
Os factos complementares são aqueles que são indispensáveis à procedência dessa ação ou exceção, mas não integram o núcleo essencial da situação jurídica alegada pela parte.
Ambos integram a categoria de factos principais porque são necessários à procedência da ação ou exceção, por contraposição aos factos instrumentais, probatórios ou acessórios que são aqueles que indiciam os factos essenciais e que podem ser utilizados para a prova indiciária destes últimos[24].
Em conformidade com o critério legal, a ampliação da matéria de facto tem de ser indispensável, o que significa que cumpre atender às várias soluções plausíveis de direito, o enquadramento jurídico em face do objeto do recurso e ainda, com a possível intervenção e interpretação do Supremo Tribunal de Justiça, ao abrigo do art. 682º/3 CPC.
No caso presente a apelante não enunciada os factos essenciais e complementares que foram oportunamente alegados nos articulados e não constituem objeto dos temas de prova.
A omissão de diligências de prova não constitui fundamento de anulação da decisão, face ao critério legal.
Desta forma, não estão reunidos os pressupostos para proceder à ampliação da decisão de facto, nem se justifica a anulação da decisão com tal objeto.
Atento o exposto improcede a alteração da decisão de facto, quanto aos art. 35º, 36º, 57º e 66º da petição inicial e bem assim, a anulação da decisão, mantendo-se a decisão que julgou não provada a matéria em causa.
Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 15, 16, 17, 18, 19, 30, 31, 34, 35.
*
Na apreciação das restantes questões cumpre ter presente os seguintes factos provados e não provados:
a)A ré “C…, Lda.” está registada na Conservatória do Registo Comercial com o NIPC ………, tendo por objeto a promoção de espetáculos e divertimentos públicos, restaurante, snack-bar e bar, com o capital de 20.000,00 euros;
b) São sócios da ré AE…, titular de uma quota no valor nominal de 4.028,83 euros, “B…, S.A.”, titular de três quotas nos valores nominais de 2.014,41 euros, 2.014,42 euros e 4.028,83 euros, D… e E…, titular de uma quota no valor nominal de 2.789,19 euros, H…, titular de uma quota no valor nominal de 2.324,32 euros, F…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros, e G…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros;
c) Do registo comercial constam como gerentes AE…, T…, D… e E…, H…, F…, G… e “B…, S.A.”, representada por T…;
d) A ré procedeu ao registo na conservatória do registo comercial da prestação de contas relativamente aos exercícios de 2010, 2011 e 2012, respetivamente, a 29 de Setembro de 2011, 19 de Julho de 2012 e 18 de Julho de 2013;
e) A ré possui apenas um estabelecimento comercial de discoteca, denominado “Discoteca Y…”, equipado com todas as máquinas, equipamentos, móveis e demais instalações necessárias ao exercício de tal atividade;
f) A ré é dona do terreno e do edifício onde se encontra instalado o estabelecimento comercial;
g) A partir de 2008, por deliberação dos sócios, o estabelecimento comercial passou a ser explorado por terceiros, mediante contrato de arrendamento ou de cedência de exploração;
h) A ré emitiu um cheque no valor de 5.547,20 euros, destinado a reembolsar a autora de suprimentos realizados;
i) Tal cheque foi lançado na contabilidade a 31 de Dezembro de 2009;
j) O lançamento foi efetuado com base numa cópia do cheque, o qual nunca foi entregue à autora, nem apresentado a pagamento;
k) O valor do cheque nunca foi pago e a autora não emitiu qualquer recibo de quitação;
l) Em virtude dos factos descritos nas h) a k), na contabilidade da ré, o extrato da conta bancária não coincide com o saldo bancário efetivamente existente na instituição respetiva;
m) Em virtude dos mesmos factos, na contabilidade da ré, a conta de suprimentos da autora não coincide com o valor devido à mesma a esse título, sendo inferior;
n) T…, por carta datada de 25 de Fevereiro de 2011, cuja cópia se encontra junta a fls. 56 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, comunicou à ré, na pessoa do gerente H…, a renúncia à gerência, com efeitos a partir da mesma data;
o) Tal facto não foi sujeito a registo;
p) A autora enviou ao gerente D… e E… a carta cuja cópia se encontra junta a fls. 43 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, datada de 19 de Novembro de 2012, solicitando, para além do mais, o seguinte:
“B) Ao abrigo do disposto nos artigos 209º, 244º e 245º do CSC, requerer o reembolso no prazo máximo de 10 dias a contar da receção desta carta, sob pena da exigibilidade de juros de mora à taxa legal a contar desde a data dos suprimentos que lhe pertencem proporcionalmente ao valor das três participações do capital social de que é titular na sociedade totalizando euros vinte e três mil cento e setenta e três euros (…)”;
q) A autora recebeu, por carta registada com aviso de receção, datada de 12 de Março de 2013, a convocatória para a assembleia geral anual a realizar no dia 1 de Abril de 2013, cuja cópia se encontra junta a fls. 34 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, com a seguinte ordem de trabalhos:
“Ponto um: Deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício de 2012;
Ponto dois: Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2012;
Ponto três: Proceder a apreciação geral da gerência da sociedade no exercício de 2012”;
r) Da referida convocatória consta, para além do mais, o seguinte: “Todos os documentos e contas estão disponíveis para consulta nos escritórios da firma responsável pela contabilidade (AC…, Lda.), tal como já é do conhecimento de todos os sócios.”;
s) A referida convocatória não está assinada por nenhum dos gerentes;
t) Na assembleia geral realizada a 1 de Abril de 2013 estiveram presentes ou representados todos os sócios da ré;
u) A autora esteve representada por V…, o qual, nessa qualidade, presidiu à assembleia geral;
v) Relativamente a tal assembleia geral foi elaborada, por V…, o documento denominado “Ata Avulsa”, cuja cópia se encontra junta a fls. 35 a 38 e cujo teor se dá aqui por reproduzido, o qual apenas se encontra assinado pelo próprio;
w) Os demais sócios não aceitam assinar tal “Ata Avulsa”;
x) Os pontos um e dois da ordem de trabalhos foram aprovados com os votos a favor dos sócios AE…., D… e E…, H…, F… e G… e o voto contra da sócia “B…, S.A.”;
y) No âmbito da discussão do ponto um da ordem de trabalhos, o representante da sócia “B…, S.A.” declarou, para além do mais o seguinte: “(…) não obteve quaisquer informações sobre a origem da fatura n.º …/2012., datada de 06-12-2012, emitida pela sociedade I…, Lda., no montante de €16.356,00, acrescido de IVA à taxa de 23%, no valor de €3.761,88, totalizando €20.117,88. Por isso, pretendia ser informado por escrito sobre a substância das transmissões de bens e serviços que deram origem àquela fatura, designadamente a descrição fiel e verdadeira dos eventuais trabalhos realizados, as quantidades dos materiais e de mão-de-obra aplicado e os respetivos preços unitários,
bem assim fotocópias de todos os orçamentos solicitados para a realização da referida obra, a cópia da ata da reunião do conselho de gerência em que foi deliberada a realização das alegadas obras e a cópia de frente e do verso do cheque emitido para pagamento da fatura em causa, após ter sido apresentado a pagamento ao banco sacado.”;
z) Na discussão do ponto três da ordem de trabalhos, o representante da sócia “B…, S.A.” propôs a destituição com justa causa dos gerentes AE…, D… e E…, H…, F… e G…, com os fundamentos constantes da referida “ata avulsa”;
aa) Tal proposta, colocada à votação, foi rejeitada com os votos favoráveis dos sócios AE…, D… e E…, H…, F… e G… e o voto contra da sócia “B…, S.A.”;
bb) T… é administradora única da autora e V… foi revisor oficial de contas e fiscal único da autora;
cc) T…, enquanto administradora única da autora, e V…, após ter sido recebida a convocatória referida na alínea q) e antes da assembleia geral, dirigiram-se ao gabinete de contabilidade, onde foram recebidos por U…, contabilista da ré;
dd) Nessa altura, consultaram documentos de prestação de contas relativos ao ano de 2012;
ee) Verificaram que da contabilidade da ré constava a fatura n.º …/2012., datada de 6 de Dezembro de 2012, no montante de 20.117,88 euros (16.356,00 euros + 3.761,88 euros, a título de IVA), emitida pela sociedade comercial “I…, Lda.”, com o NIPC ………, com sede na E.N. .., Edifício …, n.º .., Loja …, …, Vila Nova de Cerveira, cuja cópia se encontra junta a fls. 42 e cujo teor se dá aqui por reproduzido;
ff) A fatura faz referência a serviços de “Desmatação/Limpeza de Terreno com Recolha de Resíduos e Depósito em Vazadouro”, com o preço de 4.000,00 euros, acrescido de IVA, e a serviços de “Construção de Vedação em Redor de Propriedade”, com o preço de 12.356,00 euros, acrescido de IVA;
gg) Pediram esclarecimentos ao contabilista acerca da fatura referida nas alíneas ee) e ff);
hh) Na contabilidade apenas constava tal fatura;
ii) Aquando dos factos referidos nas alíneas cc) a gg) não estava presente nenhum dos demais gerentes da ré;
jj) Anualmente era feita, pelo menos, uma limpeza ao terreno;
kk) Os trabalhos executados pela sociedade comercial “I…, Lda.” consistiram na vedação do terreno, com postes de cimento chumbados no chão, colocados a cerca de 5 metros uns dos outros;
ll) A vedação foi executada em rede ovelheira, com cerca de 1,5 m de altura;
mm) Procedeu-se também à desmatação e limpeza do terreno;
nn) A ré procedeu ao pagamento do preço acordado, constante da fatura identificada nas alíneas ee) e ff);
oo) A ré, previamente, pediu orçamento;
pp) A ré instaurou contra V… e T… uma ação declarativa, pedindo a sua condenação a entregar os livros selados, pastas, livros de atas, elementos contabilísticos e todos os demais documentos na sua posse e a ela pertencentes e a pagarem a quantia de 500,00 euros por cada dia de atraso na entrega dos aludidos documentos, a qual correu termos com o número 314/11.4TBVCT, pelo extinto 3º Juízo Cível do Tribunal Judicial de Viana do Castelo;
qq) A 27 de Junho de 2012 foi proferida a sentença cuja cópia se encontra junta a fls. 91 e seguintes, cujo teor se dá aqui por reproduzido, que julgou a ação parcialmente procedente e condenou o réu V… a entregar à autora os livros selados, pastas, livros de atas e todos os elementos e documentos contabilísticos pertencentes à mesma, absolvendo a ré T… dos pedidos e o réu do pedido de pagamento da quantia de 500,00 euros, a título de sanção pecuniária compulsória;
rr) Foram dados como provados, entre outros, os seguintes factos.
“2. O réu V…, para além de outras atividades, presta serviços, como profissional liberal, na área da contabilidade;
3. A ré T… trabalha com o réu V…, compartilhando o mesmo escritório e trabalho;
4. Há alguns anos, em data não concretamente apurada, a autora celebrou com o réu V… um contrato de prestação de serviços, nos termos do qual este se obrigou a tratar contabilisticamente todos os assuntos da autora, nomeadamente organizando toda a sua contabilidade, lançando nos locais próprios todos os movimentos, preparando toda a documentação necessária a apresentar junto da administração fiscal, elaborando minutas de atas das assembleias gerais da sociedade e praticando todos os atos direta e indiretamente relacionados com a contabilidade da autora;
5. Para o efeito, foi entregue ao réu V… os livros de atas da autora e foi-lhe entregue toda a documentação relativa à escrituração da contabilidade (faturas e recibos);
6. No decorrer do ano de 2008, a autora prescindiu dos serviços do réu, tendo entregue a execução dos serviços que o réu vinha prestando à “AC…, Lda.” (…);
7. A partir daí, a autora tem vindo a solicitar ao réu que proceda à entrega de toda a documentação pertencente à sociedade, que se encontra na sua posse, nomeadamente documentos contabilísticos, livros de atas e quaisquer outros documentos pertencentes à autora;
8. O réu remeteu-se ao silêncio e não fez a entrega à autora de quaisquer documentos a esta pertencentes e que se encontram na sua posse (…).”;
ss) A assembleia geral da ré, realizada a 18 de Julho de 2011, foi convocada com a seguinte ordem de trabalhos:
- Deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2010;
- Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2010;
- Proceder à apreciação global da gerência da sociedade no exercício de 2010;
- Deliberar sobre a alteração da sede social;
tt) Foi deliberado aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2010 e a proposta de aplicação dos resultados do mesmo ano;
uu) A assembleia geral da ré, realizada a 30 de Março de 2012, foi convocada com a seguinte ordem de trabalhos:
- Deliberar sobre o relatório de gestão e contas do exercício de 2011;
- Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados do exercício de 2011;
- Proceder à apreciação global da gerência da sociedade no exercício de 2011;
vv) Foi deliberado aprovar o relatório de gestão e as contas do ano de 2011 e a proposta de aplicação dos resultados do mesmo ano;
ww) Relativamente a tais assembleias foram elaborados, respetivamente, os documentos denominados “Ata número vinte” e “Ata número vinte e dois”, cujas cópias se encontram juntas a fls. 245 a 249 e cujo teor se dá aqui por reproduzido;
xx) As assembleias gerais da ré de 18 de Julho de 2011 e de 30 de Março de 2012 foram presididas por V…, enquanto representante da autora “B…, S.A.”;
yy) Os documentos referidos na alínea ww) foram também elaborados por V…, encontrando-se apenas assinados pelo mesmo;
zz) A presente ação deu entrada em juízo a 30 de Abril de 2013.
*
- Factos não provados -
Não se provaram os demais factos alegados, designadamente, nos artigos 15º a 18º, 35º, 36º, 41º, 42º, 45º, 46º, 48º, 49º, 50º, 52º, 54º, 55º, 57º, 63º e 66º da petição inicial e nos artigos 92º, 95º, 96º, 97º, 98º, 99º, 100º, 182º, 183º, 184º e 227º da contestação.
*
- Caducidade do direito -
Nas conclusões de recurso sob o ponto 29 a apelante considera tempestiva a impugnação das contas da ré relativamente aos exercícios de 2010 e 2011, argumentando para o efeito que “[o] tribunal recorrido considerou que o prazo de caducidade relativamente às assembleia-gerais da Ré de 18/07/2011 e de 30/03/2012 caducou atenta a instauração da ação em 30/04/2013 (facto provado zz) quanto à data da propositura da ação). O prazo de caducidade é de direito substantivo (artigo 59º nº 2 do CSC). Apesar disso, a Autora considera tempestiva a impugnação das contas da Ré relativas aos exercícios de 2010 e 2011 na presente ação, pela qual também impugnou a validade das deliberações sociais tomadas na assembleia-geral anual de 01/04/2013”.
Na sentença julgou-se procedente a exceção de caducidade do direito de requerer a anulação das deliberações sociais tomadas nas assembleias que se realizaram em 18 de julho de 2011 e 30 de março de 2012, com os fundamentos que se passam a transcrever:
“ A autora pretende a anulação das deliberações sociais tomadas nas assembleias gerais de 18 de Julho de 2011 e de 30 de Março de 2012.
Relativamente a tais deliberações sociais, atentos os fundamentos dos pedidos formulados nas alíneas c), d), e) e f), está em causa apurar se, nas contas da ré, relativas aos anos de 2010 e 2011, constam valores de depósitos inferiores aos que a ré efetivamente possuía depositados em instituições financeiras e se aquelas contas indicam valores em dívida à autora inferiores aos efetivamente devidos.
A questão prende-se com o cheque emitido pela ré no montante de 5.547,20 euros, destinado a reembolsar a autora de suprimentos realizados, lançado na contabilidade a 31 de Dezembro de 2009 com base numa cópia, mas que nunca foi entregue àquela, apresentado a pagamento ou pago o seu valor, não tendo a autora emitido qualquer recibo de quitação.
As sociedades comerciais são obrigadas a dispor de contabilidade organizada nos termos da lei comercial e fiscal que permita o controlo do lucro tributável, sendo certo que todos os lançamentos devem estar apoiados em documentos justificativos (art. 123º do Código do Imposto sobre o rendimento das Pessoas Coletivas).
O contrato de suprimento está previsto e regulado nos arts. 243º a 245º do Código das Sociedades Comerciais, sendo certo que a sua existência não pode deixar de ser contabilizada por influenciar, desde logo, o passivo da sociedade comercial.
No entanto, no caso em apreço, não cremos que a situação descrita seja subsumível a qualquer causa de nulidade das deliberações sociais tomadas nas assembleias gerais da ré de 18 de Julho de 2011 e de 30 de Março de 2012 (cfr. arts. 56º e 69º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais).
Os factos descritos apenas poderiam levar, eventualmente, à anulabilidade das deliberações sociais, nos termos do disposto no art. 58º, n.º 1, alínea a), do Código das Sociedade Comerciais [sendo certo que o tribunal, por sua vez, sempre poderia lançar mão do disposto no art. 69º, n.º 3, do mesmo Código].
Contudo, atenta a data da instauração da presente ação (30 de Abril de 2013), verificamos que, como defende a ré, caducou o direito substantivo de propositura da ação (arte. 59º, n.º 2, alínea a), do Código das Sociedades Comerciais e artes. 298º, n.º 2, 328º e 331º, n.º 1, do Código Civil).
De facto, as assembleias gerais realizaram-se a 18 de Julho de 2011 e a 30 de Março de 2012 e a presente ação apenas foi instaurada a 30 de Abril de 2013, muito para além do referido prazo de 30 dias, sendo certo que a autora se fez representar nas assembleias gerais e que foi o seu representante que elaborou os documentos denominados como “Ata número vinte” e “Ata número vinte e dois”.
A apelante não impugna os termos da decisão, mas considera estar em tempo a impugnação das contas da Ré relativas aos exercícios de 2010 e 2011.
Considerada procedente a exceção, improcede a pretensão da apelante de ver apreciados os fundamentos de anulação das deliberações e da sua legalidade e por isso, não cumpre apreciar da regular apresentação das contas relativas aos exercícios de 2010 e 2011.
Improcedem nesta parte as conclusões de recurso, sob o ponto 29.
*
- Mérito da causa -
- Da omissão de assinatura das atas das assembleias gerais -
Nas conclusões de recurso sob os pontos 20 a 22 suscita a apelante a questão da validade das deliberações tomadas nas assembleias 2010, 2011 e 2012 pelo facto de não se mostrarem assinadas por todos os sócios as atas das assembleias gerais.
Refere que não se pode provar a existência de deliberações tomadas nas assembleia-gerais anuais de sócios da Ré relativas aos exercícios económicos dos anos de 2010, 2011 e 2012, porque não existem atas válidas que suportem as deliberações sociais que nelas eventualmente foram tomadas. O que não existe é nulo, e a todo o tempo pode ser requerida a declaração de nulidade ou de inexistência e a todo o tempo e por qualquer tribunal declarada.
Argumenta, ainda, que a interpretação defendida na sentença se mostra ferida de inconstitucionalidade.
O recurso consiste no pedido de reponderação sobre certa decisão judicial, apresentada a um órgão judiciariamente superior ou por razões especiais que a lei permite fazer valer[25]. O recurso ordinário (que nos importa analisar para a situação presente) não é uma nova instância, mas uma mera fase (eventualmente) daquela em que a decisão foi proferida.
O recurso é uma mera fase do mesmo processo e reporta-se à mesma relação jurídica processual ou instância[26]. Dentro desta orientação tem a nossa jurisprudência[27] repetidamente afirmado que os recursos visam modificar decisões e não criar soluções sobre matéria nova.
O tribunal de recurso vai reponderar a decisão tal como foi proferida.
Podemos concluir que os recursos destinam-se em regra a reapreciar decisões proferidas e não a analisar questões novas, apenas se excetuando: o caso da verificação de nulidade da decisão recorrida por omissão de pronúncia (artigo 615º, nº 1, alínea d), do CPC); a existência de questão de conhecimento oficioso; a alteração do pedido, em segunda instância, por acordo das partes (artigo 272º do CPC); e a mera qualificação jurídica diversa da factualidade articulada.
Verifica-se que os factos e novos argumentos que os apelantes vêm introduzir nas conclusões do recurso não podem ser considerados, pois constituem factos novos, já que não fundamentam qualquer dos pedidos formulados, sendo certo que apenas está em causa apreciar da anulabilidade da primeira e segunda deliberação tomadas em assembleia realizada em 01 de abril de 2013. A questão da validade das deliberações sociais tomadas nas assembleias relativas aos exercícios económicos dos anos de 2010, 2011 e 2012 constitui uma questão nova.
Se os novos factos e os novos fundamentos de sustentação da defesa resultaram da discussão da causa, recaía sobre as partes, ao abrigo do art. 5º/3 CPC, suscitar junto do tribunal “a quo“, a sua consideração em sede de decisão, que também não ocorreu.
Conclui-se, assim, nos termos do art. 627º CPC que nenhuma relevância merece, nesta sede, os factos novos que os apelantes vêm alegar e bem assim, os novos fundamentos de sustentação da sua defesa, pois os mesmos não foram considerados na decisão objeto de recurso e não são de conhecimento oficioso, sendo certo que ao tribunal de recurso apenas cumpre reapreciar as matérias anteriormente sujeitas à apreciação do tribunal “a quo“ ficando por isso vedado a apreciação de novos fundamentos de sustentação do pedido (matéria não anteriormente alegada). Tal como o juiz da 1ª instância, em sede de recurso, o tribunal “ad quem“ está limitado pelo pedido e seus fundamentos e pela defesa tal como configurados na ação, motivo pelo qual está impedido de conhecer do objeto do recurso nesta parte.
A apelante reporta-se, ainda, aos fundamentos finais da sentença e considera que pelo facto da ata não se mostrar assinada por todos os sócios é nula, e a todo o tempo pode ser requerida a declaração de nulidade ou de inexistência e a todo o tempo e por qualquer tribunal declarada e defende que quanto a esta questão, o tribunal recorrido violou o disposto na alínea a) do nº 1 do artº 56º e no nº 1 do artº 63º ambos do CSC.
Com efeito, em sede de fundamentação de direito, a final, observa-se na sentença, como se passa a transcrever:
“ Impõe-se fazer uma última referência (apesar de a questão ter apenas sido suscitada em sede de alegações).
A “Ata Avulsa” não está assinada pelos sócios AE…, titular de uma quota no valor nominal de 4.028,83 euros, D… e E…, titular de uma quota no valor nominal de 2.789,19 euros, H…, titular de uma quota no valor nominal de 2.324,32 euros, F…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros, e G…, titular de uma quota no valor nominal de 1.400,00 euros.
O mesmo ser verifica relativamente às denominadas “Ata número vinte” e “Ata número vinte e um”.
As deliberações dos sócios são, em regra, tomadas em assembleias-gerais nas quais devem participar os sócios, presencialmente ou por representação (art. 53º do Código das Sociedades Comerciais).
Por outro lado, as deliberações tomadas em tais atos devem ser vertidas numa ata, a qual deve ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia e se algum deles o não fizer, podendo fazê-lo, a sociedade deve notifica-lo judicialmente para que, no prazo não inferior a 8 dias, a assine (cfr. arts. 248º, n.º 6, e 63º, n.º 3, do Código das Sociedades Comerciais. Decorrido tal prazo, a ata ganha a força probatória referida no n.º 1 do art. 63º do Código das Sociedades Comerciais, desde que esteja assinada pela maioria dos sócios presentes na assembleia, sem prejuízo dos que não a assinaram invocarem em juízo a sua falsidade.
No caso em apreço, não foi posto em causa o facto de os pontos um e dois da ordem de trabalhos relativa à assembleia geral de 1 de Abril de 2013 foram aprovados pela maioria dos sócios presentes.
Do mesmo modo, também não foi posto em causa a aprovação do relatório de gestão e das contas dos anos de 2010 e 2011.
Por outro lado, a presente ação não se destinaria a fazer uso do mecanismo previsto no n.º 3 do art. 63º do Código das Sociedades Comerciais (sendo certo que a ré também não alega factos concretos de onde pudesse decorrer a falsidade da referida “Ata Avulsa”, como já referimos).
Assim, no caso, não cremos que a circunstância de as “atas” não estarem assinadas por todos os sócios que participaram nas assembleias gerais não possa fazer prova das deliberações sociais cuja anulação se pretende, sendo que, caso assim não fosse entendido, o destino da presente ação seria o da sua improcedência.
De facto, à autora cumpria fazer a prova da alegada causa de pedir: a sua qualidade de socia, a existência de uma deliberação social da ré e o respetivo vício (nos termos do disposto no art. 342º, n.º 1, do Código Civil, àquele que invocar um direito cabe fazer a prova dos factos constitutivos do direito alegado).
Caso concluíssemos pela falta de prova das deliberações sociais em causa, a consequência seria, pois, e desde logo, a improcedência da presente ação”.
Ponderando as considerações finais da fundamentação da sentença, sempre se dirá que a argumentação expendida em sede de alegações finais de julgamento não constitui o meio próprio que a lei prevê para ampliar o pedido e a causa de pedir, nem reveste a natureza de articulado superveniente e por isso, não se justificava a sua apreciação.
Está em causa a interpretação das seguintes normas:
Art. 63º[28] Código das Sociedades Comerciais:
1 - As deliberações dos sócios só podem ser provadas pelas atas das assembleias ou, quando sejam admitidas deliberações por escrito, pelos documentos donde elas constem.
2 - A ata deve conter, pelo menos:
a) A identificação da sociedade, o lugar, o dia e a hora da reunião;
b) O nome do presidente e, se os houver, dos secretários;
d) Os nomes dos sócios presentes ou representados e o valor nominal das partes sociais, quotas ou ações de cada um, salvo nos casos em que a lei mande organizar lista de presenças, que deve ser anexada à ata;
e) A ordem do dia constante da convocatória, salvo quando esta seja anexada à ata;
f) Referência aos documentos e relatórios submetidos à assembleia;
g) o teor das deliberações tomadas;
h) Os resultados das votações;
i) O sentido das declarações dos sócios, se estes o requererem.
3 - Quando a ata deva ser assinada por todos os sócios que tomaram parte na assembleia e algum deles não o faça, podendo fazê-lo, deve a sociedade notificá-lo judicialmente para que, em prazo não inferior a oito dias, a assine; decorrido esse prazo, a ata tem a força probatória referida no n.º 1, desde que esteja assinada pela maioria dos sócios que tomaram parte na assembleia, sem prejuízo do direito dos que a não assinaram de invocarem em juízo a falsidade da ata.
4 - Quando as deliberações dos sócios constem de escritura pública, de instrumento fora das notas ou de documento particular avulso, deve a gerência, o conselho de administração ou o conselho de administração executivo inscrever no respetivo livro a menção da sua existência.
5 - Sempre que as atas sejam registadas em folhas soltas, deve a gerência ou a administração, o presidente da mesa da assembleia geral e o secretário, quando os houver, tomar as precauções e as medidas necessárias para impedir a sua falsificação.
6 - As atas são lavradas por notário, em instrumento avulso, quando, no início da reunião, a assembleia assim o delibere ou ainda quando algum sócio o requeira em escrito dirigido à gerência, ao conselho de administração ou ao conselho de administração executivo da sociedade e entregue na sede social com cinco dias úteis de antecedência em relação à data da assembleia geral, suportando o sócio requerente as despesas notariais.
7 - As atas apenas constantes de documentos particulares avulsos constituem princípio de prova, embora estejam assinadas por todos os sócios que participaram na assembleia.
8 - Nenhum sócio tem o dever de assinar as atas que não estejam consignadas no respetivo livro ou nas folhas soltas, devidamente numeradas e rubricadas.
Art. 248º[29] Código das Sociedades Comerciais
[…]
6 - As atas das assembleias gerais devem ser assinadas por todos os sócios que nelas tenham participado.
Art. 56º Código das Sociedades Comerciais
1 - São nulas as deliberações dos sócios:
a) Tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos os sócios tiverem estado presentes ou representados;
b) Tomadas mediante voto escrito sem que todos os sócios com direito de voto tenham sido convidados a exercer esse direito, a não ser que todos eles tenham dado por escrito o seu voto;
c) Cujo conteúdo não esteja, por natureza, sujeito a deliberação dos sócios;
d) Cujo conteúdo, diretamente ou por atos de outros órgãos que determine ou permita, seja ofensivo dos bons costumes ou de preceitos legais que não possam ser derrogados, nem sequer por vontade unânime dos sócios.
A argumentação da apelante não pode ser atendida, porque as deliberações cuja anulação se requer nesta ação estão consignadas em ata avulsa. A ata constitui um meio de prova da deliberação. Tratando-se de ata avulsa, ainda que assinada por todos os sócios, constitui um princípio de prova.
Tal como se prevê no art. 63º/1/7, conjugado com o art. 248º/6 CSC, foi feita a prova das deliberações pelo meio adequado: a ata avulsa. O facto de apenas constar da mesma a assinatura de um sócio, não lhe retira valor probatório, quando além do mais não ficou demonstrado que foi suscitado o incidente de falsidade previsto no art. 63º/3 Código das Sociedades Comerciais.
A lei não comina com nulidade, ou inexistência, a irregularidade formal da ata e o preceito do art. 56º/1 a) CSC, não prevê a nulidade da deliberação com tal fundamento.
Conclui-se que a decisão não merece censura.
Improcedem as conclusões de recurso sob os pontos 20 a 22.
*
- Dos fundamentos de anulação da primeira e segunda deliberação tomadas em sede de assembleia geral realizada em 01 de abril de 2013 -
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 9 a 14, a apelante insurge-se contra o segmento da sentença que considerou que não se verificavam os vícios apontados pela apelante à primeira e segunda deliberação tomadas em assembleia no dia 01 de abril de 2013 e julgou improcedente o pedido de anulação de tais deliberações.
A sentença apreciou dos fundamentos da anulação de tais deliberações nos termos que se transcrevem:
“ Relativamente às deliberações tomadas na assembleia geral de 1 de Abril de 2013, está em causa, essencialmente, e atentos os fundamentos dos pedidos formulados em a) e b), saber se a fatura n.º …/2012., emitida por “I…, Lda.”, datada de 6 de Dezembro de 2012, é falsa, não correspondendo a serviços efetivamente prestados à ré, afetando, desse modo, a aprovação das contas relativas ao ano de 2012, saber se a autora pediu à ré, sem sucesso, informações relativamente aos serviços constantes da referida fatura, o que não lhe permitiu participar e votar, de forma esclarecida, naquela assembleia geral.
O artigo 21.º, n.º 1, alínea b), do Código das Sociedades Comerciais dispõe que todo o sócio tem direito a obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato.
Trata-se de um direito social autónomo e não meramente instrumental, corolário do risco de entrada na sociedade, traduzindo-se uma “ferramenta de controlo social”, permitindo a reclamação de dados essenciais à salvaguarda da posição financeira e social do sócio (cfr. Código das Sociedade Comerciais em Comentário, coordenado por Jorge M. Coutinho de Abreu, Vol. I, págs. 360 e 361).
O direito à informação desdobra-se em quatro vertentes distintas e complementares, integrando: um direito a obter informações; um direito de consulta dos livros e documentos da sociedade; um direito de inspeção de bens sociais; e, embora noutro plano, um direito de requerer inquérito judicial (cfr. Carlos Pinheiro Torres, in O Direito à Informação nas Sociedades Comerciais, págs. 121 e 122).
“O direito a obter informações consiste, grosso modo, na possibilidade de solicitar ao órgão habilitado para tal, que é, normalmente, entre nós, órgão de gestão da sociedade (gerência, administração, direção), esclarecimentos, dados, elementos, notícias, descrições sobre factos, atuais e futuros, que integrem a vida e gestão da sociedade, incluindo a possibilidade de dirigir essa solicitação em assembleia geral” (cfr. mesmo autor, in ob. cit., pág. 122).
Nas sociedades por quotas, esse direito encontra-se previsto no n.º 1 e no n.º 3 do art. 214º
do Código das Sociedades Comerciais, para as informações não prestadas em assembleia geral, e no art. 290º, ex vi do n.º 7 do art. 214º, paras as informações solicitadas em assembleia geral.
Resulta do art. 214º do Código das Sociedades Comerciais que a informação prestada deve ser verdadeira, completa e elucidativa.
Informação completa é aquela que contém todos os elementos necessários para corresponder a toda a plenitude da solicitação do sócio, pelo que o critério para se distinguir a completude da incompletude da informação será fornecido pelo teor do requerimento que desencadeie a respetiva prestação (cfr. Carlos Pinheiro Torres, in ob. cit., pág. 208).
A informação deve também ser elucidativa, isto é, deve remover e esclarecer as dúvidas ou o desconhecimento acerca de factos ou razões ou justificações para a sua prática, tal como se contém na solicitação do sócio (cfr. ob. cit., pág. 209).
No que respeita à relevância da omissão ou recusa de informação, rege o artigo 58.º, do Código das Sociedade Comerciais, que estipula no n.º 1, alínea c), e no n.º 4 o seguinte:
“1 - São anuláveis as deliberações que:
[…]
a) Não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação.
[…].
4 - Consideram-se, para efeitos deste artigo, elementos mínimos de informação:
a) As menções exigidas pelo artigo 377.º, n.º 8;
b) A colocação de documentos para exame dos sócios no local e durante o tempo prescritos
pela lei ou pelo contrato”.
No caso em apreço, não resulta dos factos provados que, previamente à assembleia geral de 1 de Abril de 2013, a autora tenha solicitado aos gerentes da ré alguma informação que não lhe tenha sido prestada (não resulta do alegado que lhe tenha sido recusada a consulta de documentos da ré).
É certo que do documento denominado “Ata Avulsa” resulta que o representante da autora pediu informações relativamente aos serviços constantes da fatura n.º …/2012., emitida por “I…, Lda.”, datada de 6 de Dezembro de 2012. Contudo, para além de se ter apurado que a fatura referida corresponde, de facto, a serviços efetivamente prestados à ré, temos que a natureza das informações a prestar ao abrigo do disposto no art. 290.º do Código das Sociedade Comerciais se restringe a informações ou esclarecimentos oral/verbalmente prestados, não sendo exigível a entrega ou disponibilização de informação escrita ou de documentos para consulta no próprio ato.
As informações em assembleia geral, a que se refere o n.º 1 do artigo 290.º do Código das Sociedade Comerciais, não se reportam à entrega de documentos preparatórios da assembleia, mas sim ao esclarecimento de dúvidas durante a assembleia, à resposta a todas as questões pertinentes que forem colocadas pelos sócios/acionistas.
Não existe, pois, fundamento para a anulação das deliberações sociais tomadas na assembleia geral de 1 de Abril de 2013, no que respeito aos pontos um e dois da ordem de trabalhos.
A presente ação deve, por isso, ser julgada improcedente”.
*
Nas conclusões de recurso, sob os pontos 09 a 11, considera a apelante que a sentença fez uma indevida interpretação das normas dos art. 21º/1 b) e 290º/1/2/3 Código das Sociedades Comerciais a respeito do cumprimento do dever de informação e considera que estão reunidos os pressupostos para anulação das deliberações tomadas.
A questão colocada passa pela interpretação das seguintes normas:
- Art. 21º/1 b) Código das Sociedades Comerciais:
1 - Todo o sócio tem direito:
a) A quinhoar nos lucros;
b) A participar nas deliberações de sócios, sem prejuízo das restrições previstas na lei;
c) A obter informações sobre a vida da sociedade, nos termos da lei e do contrato
Art. 290º Código das Sociedades Comerciais
1 - Na assembleia geral o acionista pode requerer que lhe sejam prestadas informações verdadeiras, completas e elucidativas que lhe permitam formar opinião fundamentada sobre os assuntos sujeitos a deliberação. O dever de informação abrange as relações entre a sociedade e outras sociedades com ela coligadas.
2 - As informações abrangidas pelo número anterior devem ser prestadas pelo órgão da sociedade que para tal esteja habilitado e só podem ser recusadas se a sua prestação puder ocasionar grave prejuízo à sociedade ou a outra sociedade com ela coligada ou violação de segredo imposto por lei.
3 - A recusa injustificada das informações é causa de anulabilidade da deliberação.
Perante os factos provados e os fundamentos de direito invocados, entendemos que a decisão não merece censura.
A apelante veio requerer a anulação da deliberação que aprovou as contas com fundamento na falta de informação a respeito dos elementos que estão na base da emissão da factura nº …/2012., datada
de 06/12/2012, no montante de €20.117,88, emitida à ordem da R. por I…, Lda., pessoa coletiva ………, com sede na EN .., Edifício …, nº .., Loja …, …. - … Campos, Vila Nova de Cerveira à C…, Lda. (art. 38º a 50º,78º e 80º da petição inicial).
Os argumentos apresentados pela apelante não podem ser atendidos, por três motivos.
Na petição a apelante insurge-se apenas contra o facto de não lhe ter sido fornecida informação prévia, quando solicitada. Contudo, não refere que na data indicada tal informação não tenha sido fornecida.
Nos argumentos que invoca entra em consideração com factos que não foram alegados, como seja, a falta de informação solicitada em sede de assembleia geral.
Por fim, leva em consideração factos que não se mostram provados, como seja, o facto de não ter sido prestada informação e fornecidos os documentos necessários para avaliar da regular emissão da fatura.
Com efeito, apurou-se:
bb) T… é administradora única da autora e V… foi revisor oficial de contas e fiscal único da autora;
cc) T…, enquanto administradora única da autora, e V…, após ter sido recebida a convocatória referida na alínea q) e antes da assembleia geral, dirigiram-se ao gabinete de contabilidade, onde foram recebidos por U…, contabilista da ré;
dd) Nessa altura, consultaram documentos de prestação de contas relativos ao ano de 2012;
ee) Verificaram que da contabilidade da ré constava a fatura n.º …/2012., datada de 6 de Dezembro de 2012, no montante de 20.117,88 euros (16.356,00 euros + 3.761,88 euros, a título de IVA), emitida pela sociedade comercial “I…, Lda.”, com o NIPC ………., com sede na E.N. .., Edifício …, n.º .., Loja …, …, Vila Nova de Cerveira, cuja cópia se encontra junta a fls. 42 e cujo teor se dá aqui por reproduzido;
ff) A fatura faz referência a serviços de “Desmatação/Limpeza de Terreno com Recolha de Resíduos e Depósito em Vazadouro”, com o preço de 4.000,00 euros, acrescido de IVA, e a serviços de “Construção de Vedação em Redor de Propriedade”, com o preço de 12.356,00 euros, acrescido de IVA;
gg) Pediram esclarecimentos ao contabilista acerca da fatura referida nas alíneas ee) e ff);
hh) Na contabilidade apenas constava tal fatura;
ii) Aquando dos factos referidos nas alíneas cc) a gg) não estava presente nenhum dos demais gerentes da ré.
Conclui-se, assim, que o dever de informação a que se reporta o apelante não se funda no art. 290º do Código das Sociedades Comerciais e não merece censura a sentença, quando considera que o apelante não logrou provar que ficou privado de informação necessária para de forma esclarecida intervir na assembleia geral que se realizou em 01 de abril de 2013.
Improcedem, nesta parte, as conclusões de recurso.
*
Nas conclusões de recurso sob o ponto 13 considera que perante a renúncia de um gerente se devia promover a nomeação de um novo gerente na assembleia seguinte, incorrendo a sentença em violação do disposto no art. 256º e 376º/1 d) Código das Sociedades Comerciais.
Na sentença analisou-se a questão nos termos que se transcrevem:
“ Apreciemos, agora, as deliberações sociais tomadas na assembleia geral de 1 de Abril de 2013, no que diz respeito aos pontos um e dois da ordem de trabalhos, atentos os pedidos formulados.
No que diz respeito a tal assembleia geral, foi elaborado o documento denominado “Ata Avulsa”, cuja cópia se encontra junta a fls. 35 a 38.
[…]
A autora defende que a convocatória viola o disposto na alínea d) do n.º 1 do art. 376º do Código das Sociedade Comerciais, por remissão do disposto no art. 248º, n.º 1, do mesmo Código.
Às assembleias gerais das sociedades por quotas aplica-se o disposto sobre as assembleias gerais das sociedades anónimas, em tudo o que não estiver especificadamente regulado para aquelas (art. 248º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais).
De acordo com o art. 376º, n.º 1, alínea d), do Código das Sociedades Comerciais, a assembleia geral deve reunir para, entre outros, proceder às eleições que sejam da sua competência. Ora, não obstante o disposto no art. 248º, n.º 1, do Código das Sociedades Comerciais, afigura-se-nos que o art. 376º, n.º 1, alínea d), do mesmo Código, não é aplicável à convocatória da assembleia geral anual das sociedades por quotas, como sucede no caso em apreço.
De facto, o art. 256º do Código das Sociedades Comerciais prevê que as funções dos gerentes subsistem enquanto não terminarem por destituição ou por renúncia, sem prejuízo de o contrato de sociedade ou o ato de designação poder fixar a duração delas.
Ora, não existindo elementos nos autos que apontem neste último sentido, não vemos razão
para a obrigatoriedade da menção referida”.
Cumpre ter presente as normas jurídicas em causa:
Art. 256º[30] CSC
“ As funções dos gerentes subsistem enquanto não terminarem por destituição ou renúncia, sem prejuízo de o contrato de sociedade ou o ato de designação poder fixar a duração delas”.
Art. 376[31]
1 - A assembleia geral dos acionistas deve reunir no prazo de três meses a contar da data do encerramento do exercício ou no prazo de cinco meses a contar da mesma data quando se tratar de sociedades que devam apresentar contas consolidadas ou apliquem o método da equivalência patrimonial para:
a) Deliberar sobre o relatório de gestão e as contas do exercício;
b) Deliberar sobre a proposta de aplicação de resultados;
c) Proceder à apreciação geral da administração e fiscalização da sociedade e, se disso for caso e embora esses assuntos não constem da ordem do dia, proceder à destituição, dentro da sua competência, ou manifestar a sua desconfiança quanto a administradores;
d) Proceder às eleições que sejam da sua competência.
2 - O conselho de administração ou o conselho de administração executivo deve pedir a convocação da assembleia geral referida no número anterior e apresentar as propostas e documentação necessárias para que as deliberações sejam tomadas.
3 - A violação do dever estabelecido pelo número anterior não impede a convocação posterior da assembleia, mas sujeita os infratores às sanções cominadas na lei”.
No contexto dos factos provados não vemos como sustentar a posição defendida pela apelante.
Com efeito, provou-se:
- alínea c) :no registo comercial da Ré consta como gerente T…, a título individual, e também como representante da sócia, B… Lda.
- alínea n): T…, por carta datada de 25/02/2011, conforma cópia de fls. 56, comunicou à Ré, na pessoa do gerente H…, a renúncia à gerência, com efeitos a partir da mesma data.
- alínea o) tal facto não foi sujeito a registo.
Contudo, a apelante não logrou provar que a situação de renúncia da gerente não se enquadra na previsão da parte final do art. 256º Código das Sociedades Comerciais, recaindo sobre a apelante-autora o ónus da prova de tal matéria (art. 342º/1 CC). Não merece censura a decisão quando considera que não está demonstrado que da ordem de trabalhos seria necessário fazer constar a designação de novo gerente.
Por outro lado, tal circunstância não constitui fundamento de nulidade ou anulação das deliberações sociais a que se reporta o pedido da ação, pois a representação da autora estava garantida com a nomeação, em assembleia, do respetivo representante.
Improcedem, nesta parte, as conclusões de recurso, sob o ponto 13.
*
Por fim, no ponto 14 das conclusões de recurso insurge-se a apelante contra o segmento da decisão que considerou que a falta de assinaturas dos gerentes na convocatória reveste mera irregularidade formal, sanada pelo facto de todos os sócios terem comparecido na assembleia-geral.
Com efeito, na sentença considerou-se:
“ A autora fundamenta o pedido, em primeira linha, na circunstância de a convocatória não estar assinada por nenhum dos gerentes, no facto de a assembleia ter reunido no dia 1 de Abril de 2013, quando deveria ter reunido no dia 31 de Março de 2013, e no facto de não constar da ordem de trabalhos a eleição da gerência.
Nos termos do disposto no art. 56º, n.º 1, alínea a), do Código das Sociedades Comerciais, são nulas as deliberações dos sócios tomadas em assembleia geral não convocada, salvo se todos os sócios tiverem estado presentes ou representados.
O n.º 2 da mesma disposição legal dispõe que se consideram não convocadas as assembleias cujo aviso convocatório seja assinado por quem não tenha essa competência, aquelas de cujo aviso convocatório não constem o dia, hora e local da reunião e as que reúnam em dia, hora ou local diversos dos constantes do aviso.
É certo que, no caso em apreço, a convocatória não está assinada por nenhum dos gerentes.
No entanto, tal circunstância constituirá, cremos, uma mera irregularidade formal, sanada pelo facto de todos os sócios terem comparecido na assembleia geral”.
Cumpre ter presente as seguintes normas:
- Art. 58º
“1 - São anuláveis as deliberações que:
a) Violem disposições quer da lei, quando ao caso não caiba a nulidade, nos termos do artigo 56.º, quer do contrato de sociedade;
b) Sejam apropriadas para satisfazer o propósito de um dos sócios de conseguir, através do exercício do direito de voto, vantagens especiais para si ou para terceiros, em prejuízo da sociedade ou de outros sócios ou simplesmente de prejudicar aquela ou estes, a menos que se prove que as deliberações teriam sido tomadas mesmo sem os votos abusivos;
c) Não tenham sido precedidas do fornecimento ao sócio de elementos mínimos de informação.
2[…]”.
- Art. 248[32] -
1 - Às assembleias gerais das sociedades por quotas aplica-se o disposto sobre assembleias gerais das sociedades anónimas, em tudo o que não estiver especificamente regulado para aquelas.
2 - Os direitos atribuídos nas sociedades anónimas a uma minoria de acionistas quanto à convocação e à inclusão de assuntos na ordem do dia podem ser sempre exercidos por qualquer sócio de sociedades por quotas.
3 - A convocação das assembleias gerais compete a qualquer dos gerentes e deve ser feita por meio de carta registada, expedida com a antecedência mínima de quinze dias, a não ser que a lei ou o contrato de sociedade exijam outras formalidades ou estabeleçam prazo mais longo.
4 - Salvo disposição diversa do contrato de sociedade, a presidência de cada assembleia geral pertence ao sócio nela presente que possuir ou representar maior fração de capital, preferindo-se, em igualdade de circunstâncias, o mais velho.
5 - Nenhum sócio pode ser privado, nem sequer por disposição do contrato, de participar na assembleia, ainda que esteja impedido de exercer o direito de voto.
6 - As atas das assembleias gerais devem ser assinadas por todos os sócios que nelas tenham participado”.
Resulta dos factos provados que a convocatória para a assembleia agendada para 01 de abril de 2013 não foi assinada por todos os gerentes da sociedade. Contudo, também se provou que todos os sócios compareceram à assembleia que se realizou em 01 de abril de 2013 e da ata da assembleia resulta que declararam estar de acordo em realizar a assembleia, como decorre do documento nº3, fls.1/4.
Desta forma, não se pode considerar que a omissão de tal formalidade gera a anulação das deliberações, quando a irregularidade se considerou sanada com a intervenção e presença de todos os sócios.
Conclui-se que a decisão não merece censura quando considerou que a apelante-autora não logrou demonstrar os vícios suscetíveis de determinar a anulação das deliberações.
Improcedem, desta forma, as conclusões de recurso sob os pontos 09 a 14.
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- Inconstitucionalidade da interpretação das normas aplicadas -
Nas conclusões de recurso sob os pontos 5, 12, 22, 26, 28, 32, 33 suscita a apelante a inconstitucionalidade da interpretação das normas aplicadas na sentença.
Cumpre determinar se estão reunidos os pressupostos para apreciar da inconstitucionalidade suscitada e adiantando respostas somos levados a considerar que não estão reunidos os requisitos que permitam aferir da conformidade da interpretação das normas com a Lei Fundamental.
A respeito da conformidade da interpretação das normas jurídicas com o direito constitucional refere GOMES CANOTILHO:“[o] princípio da interpretação das leis em conformidade com a constituição é fundamentalmente um princípio de controlo ( tem como função assegurar a constitucionalidade da interpretação ) e ganha relevância autónoma quando a utilização dos vários elementos interpretativos não permite a obtenção de um sentido inequívoco dentre os vários significados da norma. Daí a sua formulação básica: no caso de normas polissémicas ou plurisignificativas deve dar-se preferência à interpretação que lhe dê um sentido em conformidade com a constituição”[33].
A inconstitucionalidade deve ser suscitada de forma processualmente adequada junto do tribunal que proferiu a decisão, de forma a obrigar ao seu conhecimento ( art. 72º LTC ).
Recai sobre o recorrente o ónus de colocar a questão de inconstitucionalidade, enunciando-a de forma expressa, clara e percetível e segundo os requisitos previstos na lei.
Por outro lado, pretendendo questionar certa interpretação de um preceito legal, deverá o recorrente especificar claramente qual o sentido ou dimensão normativa do preceito ou preceitos que tem por violador da Constituição, enunciando com precisão e rigor todos os pressupostos essenciais da dimensão normativa tida por inconstitucional.
Esta tem sido a interpretação desenvolvida pelo Tribunal Constitucional, como disso dá nota, entre outros, o Ac.do Tribunal Constitucional nº 560/94 (acessível em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/) quando observa:”[d]e facto, a inconstitucionalidade de uma norma jurídica só se suscita durante o processo, quando tal questão se coloca perante o tribunal recorrido a tempo de ele a poder decidir e em termos de ficar a saber que tem essa questão para resolver – o que, obviamente, exige que quem tem o ónus da suscitação da questão de constitucionalidade a coloque de forma clara e percetível.
Bem se compreende que assim seja, pois que, se o tribunal recorrido não for confrontado com a questão da constitucionalidade, não tem o dever de a decidir. E, não a decidindo, o Tribunal Constitucional, se interviesse em via de recurso, em vez de ir reapreciar uma questão que o tribunal recorrido julgara, iria conhecer dela ex novo.
A exigência de um cabal cumprimentos do ónus da suscitação atempada – e processualmente adequada – da questão de constitucionalidade não é, pois –[…]-, uma “mera questão de forma
secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal recorrido deva pronunciar-se, sobre a questão de constitucionalidade e para que o Tribunal Constitucional, ao julga-la em via de recurso, proceda ao reexame ( e não a um primeiro julgamento ) de tal questão”.
No caso presente o apelante indica os preceitos constitucionais que considera violados. Contudo, não enuncia o segmento interpretativo adotado que contraria tais preceitos constitucionais, o que impede a apreciação da constitucionalidade.
Por outro lado, a mera afirmação de que existe inconstitucionalidade na aplicação de determinadas normas, não equivale a suscitar, validamente, uma questão de inconstitucionalidade normativa.
A válida imputação de inconstitucionalidade a uma norma (ou a uma sua dimensão parcelar ou interpretação), impõe, a quem pretende atacar, na perspetiva da sua compatibilidade com normas ou princípios constitucionais, determinada interpretação normativa, indicar concretamente a dimensão normativa que considera inconstitucional, o que também não ocorre no caso concreto. A indevida aplicação da lei não configura só por si uma violação de preceitos constitucionais.
Nesta perspetiva, considera-se que o apelante não suscitou, validamente, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, pelo que, improcedem, nesta parte as conclusões de recurso sob os pontos 5, 12, 22, 26, 28, 32, 33.
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- Responsabilidade pelas custas da ação -
Nos pontos 26 e 27 das conclusões de recurso suscita a apelante a última questão do recurso, a qual se prende com a responsabilidade quanto a custas da ação.
Argumenta a apelante que de acordo com o art. 60º do Código das Sociedades Comerciais as custas da ação, ainda que se confirme a sua improcedência, constituem um encargo da ré-apelada.
A apelada considera que não foram alegados, nem provados, os factos que justificam a atribuição à ré da responsabilidade quanto a custas.
Na sentença, por aplicação do regime previsto no art. 527º CPC, atribuiu-se a responsabilidade pelas custas apenas à autora-apelante.
Cumpre apreciar se na presente ação que tem por objeto a anulação de duas deliberações sociais, se aplica o regime do art. 60º do Código das Sociedades Comerciais, quanto à responsabilidade pelas custas da ação.
O art. 60º[34] do Código das Sociedades Comerciais, sob a epígrafe “Disposições comuns às ações de nulidade e de anulação” prevê:
“1 - Tanto a ação de declaração de nulidade como a de anulação são propostas contra a sociedade.
2 - Havendo várias ações de invalidade da mesma deliberação, devem elas ser apensadas, observando-se a regra do n.º 2 do artigo 275.º do Código de Processo Civil.
3 - A sociedade suportará todos os encargos das ações propostas pelo órgão de fiscalização ou, na sua falta, por qualquer gerente, ainda que sejam julgadas improcedentes”.
No caso presente a ação foi instaurada por B…, SA na qualidade de sócia contra a sociedade e tem por objeto da anulação de duas deliberações sociais. A ação não foi instaurada pelo órgão de fiscalização, nem pelo gerente. A ação foi instaurada para tutela dos interesses e direitos do sócio e por isso, a responsabilidade pelas custas deve recair sobre quem deu causa à ação, em obediência ao princípio da causalidade.
Desta forma, não se aplica no caso concreto o regime do art. 60º do Código das Sociedades Comerciais, mas o regime geral quanto a custas, sendo responsável pelas custas da ação, nos termos do art. 527º CPC, a autora-apelante.
Improcedem nesta parte as conclusões sob os pontos 26 e 27.
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Nos termos do art. 527º CPC as custas das apelações são suportadas:
- nas apelações dos despachos proferidos em 12 de setembro de 2017 e 28 de setembro de 2017, pela apelante e apelada, na proporção do decaimento, que se fixa em 4/5 e 1/5, respetivamente;
- na apelação da sentença, pela apelante e apelada, na proporção do decaimento, que se fixa em 7/8 e 1/8, respetivamente.
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III. Decisão:
Face ao exposto, acordam os juízes desta Relação em julgar improcedente as apelações e nessa conformidade, julgar:
- improcedentes as apelações dos despachos proferidos em 12 de setembro de 2017 e 28 de setembro de 2017 e confirmar as respetivas decisões;
- rejeitar a reapreciação da decisão de facto, quanto à matéria dos pontos 43, 44, 45, 46, 47, 54 da petição (factos não provados);
- improcedente a reapreciação da decisão de facto, quanto à matéria dos art. 35º, 36º, 57º, 66º da petição (factos não provados);
- confirmar a sentença.
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Desentranhe e devolva os documentos juntos com as alegações de recurso da apelação da sentença.
Custas a cargo da apelante, fixando-se a taxa de justiça em €60,00 (sessenta euro).
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Custas das apelações:
- nas apelações dos despachos proferidos em 12 de setembro de 2017 e 28 de setembro de 2017, pela apelante e apelada, na proporção do decaimento, que se fixa em 4/5 e 1/5, respetivamente;
- na apelação da sentença, pela apelante e apelada, na proporção do decaimento, que se fixa em 7/8 e 1/8, respetivamente.
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Porto, 24 de Setembro de 2018
(processei e revi – art. 131º/5 CPC)
Ana Paula Amorim
Manuel Domingos Fernandes
Miguel Baldaia de Morais
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[1] Texto escrito conforme o Novo Acordo Ortográfico
[2] ARMINDO RIBEIRO MENDES Recursos em Processo Civil – Reforma de 2007, Coimbra Editora, Coimbra, 2009, pag. 73
[3] JOSÉ LEBRE DE FREITAS E A. MONTALVÃO MACHADO, RUI PINTO Código de Processo Civil – Anotado, vol II, 2ª edição, pag. 302.
[4] JOSÉ LEBRE DE FREITAS E A. MONTALVÃO MACHADO, RUI PINTO Código de Processo Civil – Anotado, vol II, 2ª edição, pag. 675 e ANSELMO DE CASTRO Direito Processual Civil Declaratório, vol. III, pag. 141.
[5] Cfr. JOSÉ LEBRE DE FREITAS Introdução ao Processo Civil-Conceitos e Princípios Gerais à Luz do Novo Código, 3ª edição, Coimbra Editora, Coimbra, 2013, pag. 176
[6] Cfr. ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, Vol. IV, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pag. 6.
[7] J.J.GOMES CANOTILHO Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª edição, ( 7ª Reimpressão ) Coimbra, Almedina, 2003, pág.1226.
[8] Cfr. ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, Vol. IV, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, 1987, pag. 6.
[9] ALBERTO DOS REIS Código de Processo Civil Anotado, ob. cit., pag. 11.
[10] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, julho 2013, pag.184-185.
ANTUNES VARELA et al Manual de Processo Civil,2ª edição, Revista e Atualizada, Coimbra, Coimbra Editora,Limitada, 1985, pag. 532.
[11] AMÂNCIO FERREIRA Manual dos Recursos em Processo Civil, 9ª ed., Coimbra, Almedina, 2009, pag. 215.
[12] JOSÉ LEBRE DE FREITAS Introdução ao Processo Civil- Conceito e princípios gerais à luz do novo código, 3ª edição, Coimbra, Coimbra Editora, Outubro de 2013, pag. 124
[13] JOSÉ LEBRE DE FREITAS Introdução ao Processo Civil- Conceito e princípios gerais à luz do novo código, ob. cit., pag. 133
[14] JOSÉ LEBRE DE FREITAS. ISABEL ALEXANDRE Código de Processo Civil Anotado, ob. cit., pag. 10
[15] CARLOS FRANCISCO DE OLIVEIRA LOPES DO REGO Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 1999, pag.25
[16] MANUEL A. DOMINGUES DE ANDRADE Noções Elementares de Processo Civil, Reimpressão, Coimbra, Coimbra Editora, Limitada, 1993, pag. 156
[17] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, Coimbra, Coimbra Editora, pag. 357
[18] JOSÉ ALBERTO DOS REIS Comentário ao Código de Processo Civil, vol. II, ob. cit., pag. 486
[19] ANTUNES VARELA, et al, Manual de Processo Civil,ob. cit., pag. 690.
[20] FRANCISCO MANUEL LUCAS FERREIRA DE ALMEIDA Direito Processual Civil, Vol.II, Almedina, 2015, pag. 369
[21] FRANCISCO MANUEL LUCAS FERREIRA DE ALMEIDA Direito Processual Civil, Vol.II, Almedina, 2015, pag. 369, nota 744
[22] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, Julho 2013, pag. 126.
[23] ANTÓNIO SANTOS ABRANTES GERALDES Recursos no Novo Código de Processo Civil, Coimbra, Almedina, 2013, pag. 240
[24] MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, 2ª edição, Lisboa, Lex, 1997, pag. 77.
MIGUEL TEIXEIRA DE SOUSA Estudos sobre o Novo Processo Civil, ob. cit., pag. 78.
JOSÉ LEBRE DE FREITAS, JOÃO REDINHA E RUI PINTO Código de Processo Civil Anotado, vol I, Coimbra, Coimbra Editora, 1999, pag. 467-468.
[25] CASTRO MENDES Direito Processual Civil – Recursos, ed. AAFDL, 1980, pag. 5.
[26] CASTRO MENDES, ob. cit., pag. 24-25 e ALBERTO DOS REIS, Código de Processo Civil , vol V, pag. 382, 383.
[27] Cfr. os Ac. STJ 07.07.2009, Ac. STJ 20.05.2009, Ac. STJ 28.05.2009, Ac. STJ 11.11.2003 Ac. Rel. Porto 20.10.2005, Proc. 0534077 Ac. Rel. Lisboa de 14 de maio de 2009, Proc. 795/05.1TBALM.L1-6; Ac. STJ 15.09.2010, Proc. 322/05.4TAEVR.E1.S1( http://www.dgsi.pt )
[28] Alterado pelo/a Artigo 2.º do/a Decreto-Lei n.º 76-A/2006 - Diário da República n.º 63/2006, 1º Suplemento, Série I-A de 2006-03-29, em vigor a partir de
2006-06-30
Alterado pelo/a Artigo 1.º do/a Decreto-Lei n.º 257/96 - Diário da República n.º 302/1996, Série I-A de 1996-12-31, em vigor a partir de 1997-01-05
Alterado pelo/a Artigo 1.º do/a Decreto-Lei n.º 280/87 - Diário da República n.º 154/1987, Série I de 1987-07-08, em vigor a partir de 1987-07-13
[29] Alterado pelo/a Artigo 1.º do/a Decreto-Lei n.º 280/87 - Diário da República n.º 154/1987, Série I de 1987-07-08, em vigor a partir de 1987-07-13
[30] Alterado pelo/a Artigo 4.º do/a Decreto-Lei n.º 280/87 - Diário da República n.º 154/1987, Série I de 1987-07-08, em vigor a partir de 1987-07-13
[31] Alterado pelo/a Artigo 2.º do/a Decreto-Lei n.º 76-A/2006 - Diário da República n.º 63/2006, 1º Suplemento, Série I-A de 2006-03-29, em vigor a partir de 2006-06-30
Alterado pelo/a Artigo 1.º do/a Decreto-Lei n.º 328/95 - Diário da República n.º 283/1995, Série I-A de 1995-12-09, em vigor a partir de 1996-01-08
[32] Alterado pelo/a Artigo 1.º do/a Decreto-Lei n.º 280/87 - Diário da República n.º 154/1987, Série I de 1987-07-08, em vigor a partir de 1987-07-13
[33] J.J.GOMES CANOTILHO Direito Constitucional e Teoria da Constituição, 7ª edição, (7ª Reimpressão) Coimbra, Almedina, 2003, pág.1226.
[34] Alterado pelo/a Artigo 4.º do/a Decreto-Lei n.º 280/87 - Diário da República n.º 154/1987, Série I de 1987-07-08, em vigor a partir de 1987-07-13.
Retificado pelo/a Declaração - Diário da República n.º 276/1986, Suplemento n.º 1, Série I de 1986-11-29, em vigor a partir de 1986-11-29.