Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
642/17.5T8AVR.P2
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JOÃO VENADE
Descritores: INTERMEDIAÇÃO FINANCEIRA
DEVER DE INFORMAÇÃO
RESPONSABILIDADE
Nº do Documento: RP20191210642/17.5T8AVR.P2
Data do Acordão: 12/10/2019
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: ALTERADA
Indicações Eventuais: 3ª SECÇÃO
Área Temática: .
Sumário: I - O anteriormente denominado «E…» omitiu com culpa muito grave o cumprimento do seu dever de informação enquanto intermediário financeiro ao não informar o cliente que tipo de produto estava a subscrever, o risco que o mesmo tinha e ainda menciona que se trata de um produto totalmente seguro.
II - Essa omissão origina dever de indemnização por parte do intermediário financeiro (ou de quem sucede nas suas obrigações) ao nível de responsabilidade pré-contratual.
III - O valor da indemnização, no caso concreto, corresponde ao valor de capital subscrito não reembolsado e juros moratórios, deduzido do valor de reembolsos parcelares pagos ao cliente.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: Processo n.º 642/17.5T8AVR.P2.
*
1). Relatório.
B…, residente na Avenida …, n.º .., ..º esquerdo, Aveiro, instaurou
Ação declarativa de condenação sob a forma de processo comum contra
Banco C…, S. A., com sucursal na …, n.º ., Aveiro, pedindo:
. condenação do Réu a pagar-lhe a quantia de 215.000 EUR a título de capital e juros vencidos, acrescida de juros vincendos desde a citação até integral pagamento;
. subsidiariamente, declaração de nulidade de qualquer contrato de adesão que o Réu invoque para ter aplicado 200.000 EUR que o Autor lhe entregou em obrigações subordinadas D1…;
. declaração de ineficácia da aplicação que o Réu tenha feito desses montantes;
. condenar o Réu a restituir-lhe 215.000 EUR e juros vencidos à taxa contratada, acrescidos de juros legais vincendos, desde a citação até efectivo e integral pagamento;
cumulativamente,
. condenação do Réu a pagar-lhe 5.000 EUR a título de danos não patrimoniais.
O sustento de tais pedidos radica na violação pelo E…s, S. A. do dever de informação ao Autor do tipo de produto que este estava a subscrever em maio de 2006, acabando por o fazer em relação a obrigações subordinadas da D… sem o saber e pensando que se tratava de um investimento totalmente garantido pelo próprio «E…».
*
Citado, o Réu contestou invocando:
. a incompetência territorial (indeferida) do tribunal;
.ineptidão da petição inicial – indeferida;
. a prescrição do direito do Autor;
. a sua ilegitimidade passiva – apreciação que se tornou inútil em virtude de desistência de instância pelo Autor;
. não houve violação de dever de informação, tendo na data da subscrição sido prestadas as informações relevantes, inexistindo qualquer risco de que as obrigações não seriam pagas.
*
Realizou-se julgamento tendo sido proferida sentença que condenou o Réu a pagar ao Autor a quantia de 150.000 EUR (a quantia escrita por extenso contém, na nossa opinião, um lapso como infra se irá mencionar), acrescida de juros de mora desde junho de 2016, á taxa de 4%, até efetivo e integral pagamento, absolvendo-se o Réu do demais peticionado.
*
Inconformado, interpõe o Réu o presente recurso onde alega em síntese que:
…………………………
…………………………
…………………………
Termina pedindo a revogação da decisão e a total improcedência da ação.
*
Contra-alegou o recorrido em síntese mencionando que:
. Matéria de facto.
. o tribunal formou a sua convicção na conjugação da prova por declarações de parte do autor, da prova testemunhal, tudo conjugado com a análise da documentação junta, produzida na audiência de julgamento, apreciada à luz das regras da experiência comum e de normalidade;
. o recorrente, nas conclusões, não deu indicação de qualquer prova que sustente aquela margem de dúvida ou faça questionar, por qualquer forma, os factos dados como provados;
. a testemunha funcionária do recorrente explicou que transmitiu ao Autor a informação de que se tratava de uma aplicação semelhante a um depósito a prazo e com capital garantido pelo banco e com rentabilidade assegurada e que sabia que o recorrido não investia em produtos de risco;
. a própria nota interna do Banco, em papel timbrado do «E…» faz transparecer a ideia de que o capital era garantido por este;
. o facto de o recorrido não ter reclamado de qualquer dos extratos bancários recebidos, resulta de pensar que se tratava de uma mera denominação de conta a prazo não tendo plena consciência do que verdadeiramente estava em causa;
. o facto de haver risco de insolvência e de nunca mais poder reaver o seu dinheiro é uma informação (omitida) relevante para a formação de vontade;
. deve improceder a argumentação do recorrente;
Do direito.
. se o dever de informação era menos densificado na versão inicial do CVM, isso não pode significar que nesse tempo não houvesse dever de informação;
. as novas disposições apenas tornaram mais claros e completos esses deveres;
. sendo correto que a lei em vigor ao tempo não impunha a prévia categorização dos clientes nos termos e seguindo os critérios hoje claramente definidos, não deixava de distinguir entre clientes qualificados e não qualificados (artigo 30.º, daquele Código);
. a responsabilidade civil do intermediário financeiro, por violação de deveres respeitantes ao exercício da sua atividade, impostos por lei ou regulamento emanado de autoridade pública está especificamente prevista no artigo 314º do CVM tendo por fonte a violação do dever de informação a que estão obrigados os bancos;
. é uma (não exclusivamente) responsabilidade contratual cuja culpa na violação se presume (artigo 799.º, do C. C.);
. a factualidade provada demonstra que o comportamento do recorrente esteve longe de preencher os critérios ético-normativos decorrentes das normas do CVM pois o seu gerente sabia que o Autor tinha um perfil conservador e que nunca foi seu intuito investir em produtos de risco, ou seja, tratava-se de um investidor que não tinha experiência no funcionamento do mercado de valores mobiliários;
. no entanto não se inibiu de o aconselhar a investir e aplicar as suas poupanças em Obrigações D1…, informando-o erroneamente e assegurando que a aplicação em causa era semelhante a um depósito a prazo, com capital garantido pelo «E…» e com rentabilidade assegurada (o que não correspondia à realidade), violando de forma flagrante o do dever de informação e adequação a que estava adstrito;
. o recorrente não explicou ao recorrido que se tratavam de «obrigações subordinadas» e a consequência dessa mesma subordinação, o que passava por lhe dizer que em caso de insolvência da sociedade D…, o Autor só seria pago depois de satisfeitos os credores que não tivessem créditos subordinados, como resultava do disposto na al. c) do art.48º do CIRE (DL nº53/2004, de 18 de Março);
. o facto de não ser previsível, à época, o colapso do sistema financeiro, não justifica o facto de recorrente ter omitido ao Autor o risco de insolvência da «D…» e a possibilidade de nunca mais vir a reaver o dinheiro investido, pois as obrigações do intermediário financeiro acima referidas e designadamente a obrigação de informação, já estão consagradas na lei desde data muito anterior ao início da mencionada crise;
. não há prova também de que derrocada financeira tenha ocorrido por circunstâncias exclusivamente externas ao grupo, nem que tenha resultado apenas da decisão política da nacionalização ou do contexto internacional;
. o recorrente não provou ter fornecido cópia de nota informativa sobre o produto ao recorrido nem que lhe tenha dado as explicações que dela constam, assim violando os deveres consignados nos artigos 312º-C e 312º-F, ambos do Código dos Valores Mobiliários, especialmente no que tange a falta de documentação da informação;
. também há responsabilidade extracontratual em consequência da violação de deveres, não só do exercício da sua atividade de intermediário financeiro como da violação dos mais elementares deveres de informação a que aludem os arts. 7.º, n.º 1 e 312.º, n.º1, ambos do CVM, e art. 77.º, n.º 1 do RGICSF, fazendo, assim, incorrer o recorrente na responsabilidade, a que alude o artigo 304.º-A, n.º1, do CVM, não tendo sido ilidida a presunção legal de culpa do n.º 2 do citado artigo 304.º-A.º;
. pode ainda existir responsabilidade pré-contratual ou culpa in contrahendo (art. 227.º do CC), porque nos preliminares do contrato o recorrente informou o recorrido que estava garantido o retorno do capital;
. a atuação do recorrente foi assim causal dos danos causados ao recorrido, correspondente ao capital investido (€ 250.000,00), acrescido dos juros remuneratórios em falta, igualmente garantidos;
. não há prescrição por estar em causa pois a data em que o respetivo prazo deve começar a correr é a aquela a partir da qual em que o recorrido conheceu os exatos termos do negócio, ou seja, em que tomou conhecimento da possibilidade da perda de capital sendo que o ónus da prova do decurso do prazo impende sobre o recorrente – artigo 342.º, n.º 2, do C. C. – o que não resultou provado;
. o recorrente atuou com culpa grave ficando pois excluída da aplicação do prazo curto de prescrição previsto no art.324º nº2 do CVM, e sujeita ao prazo ordinário de 20 anos (art.309º do CC).
Termina pedindo a improcedência do recurso.
*
2). Fundamentação.
2.1). De facto.
Foram julgados provados os seguintes factos:
«1º O A. era cliente do R., na sua agência de Aveiro, com a conta à ordem nº …………., onde movimentava parte dos dinheiros, realizava pagamentos e efectuava poupanças.
2º Em Maio de 2006 o gerente do Banco Réu da agência de Aveiro disse ao autor, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo e com capital garantido pelo E… e com rentabilidade assegurada, com juros a 4,5% e prazo de 10 anos.
3º O funcionário do Banco sabia que o autor tinha um perfil conservador no que respeitava ao investimento do seu dinheiro, sendo que até essa data, sempre o aplicou em depósitos a prazo.
4º O dinheiro do autor no valor de 150.000,00€, foi colocado em obrigações D1…, sem que o A. soubesse em concreto o que era, desconhecendo inclusivamente que a D… era uma empresa.
5.º O A. não sabia o que era a D…. Pensava que era uma mera denominação de conta a prazo, que o Banco Réu utilizava.
6º O autor autorizou a subscrição, por lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido pelo Banco Réu, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respectivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência.
7º O autor actuou convicto de que estava a colocar o seu dinheiro numa aplicação segura e com as características de um depósito a prazo, num produto do Banco.
8º Se o A. tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações D1…, produto de risco e que o capital não era garantido pelo E…, não o autorizaria.
9º Nunca foi intenção do A. investir em produtos de risco, o que era do conhecimento do gerente e funcionários do Réu, e o A. sempre esteve convencido que o Réu lhe restituiria o capital e os juros, quando os solicitasse.
10º A convicção do autor foi reforçada com o pagamento dos juros semestralmente pagos, o que lhe transmitiu segurança e nunca o alertou para qualquer irregularidade, face ao que lhe tinha sido dito, pelo referido gerente da agência de Aveiro;
11º E que manteve até Novembro de 2015, data em que o Banco Réu deixou de pagar os juros respectivos.
12º Nunca o gerente ou funcionários do R., nem ninguém, leu ou explicou ao A. o que eram obrigações, em concreto, o que eram obrigações D1….
13º A aplicação no valor de 100.000,00€ não foi reembolsada.
14º O A. nunca assinou qualquer ordem de compra de obrigações D….
15º Nunca qualquer contrato lhe foi lido nem explicado, nem entregue cópia que contivesse cláusulas sobre obrigações subordinadas D…, nem que contivesse prazos de resolução unilateral pelo A; e nem nunca conheceu o A. qualquer título demonstrativo de que possuía obrigações D…, não lhe tendo sido entregue documento correspondente.
16º O Réu foi apresentado pelo seu gerente como garante da aplicação financeira em causa.
17º O que constava da própria documentação interna criada, veiculada e distribuída pelo Réu aos seus funcionários.
18º Um dos argumentos invocados pela Direcção Comercial do E… e que os funcionários da rede de balcões do banco R. repetiam junto dos seus clientes, como o fez com o A., era o de que se tratava de um investimento seguro e, por isso, este assegurava o reembolso do capital investido e juros.
19º As orientações e comunicações internas existentes no E… e que este transmitia aos seus comerciais nos respectivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que o Banco garantia o capital investido.
20.º Por força da impossibilidade em reaver o dinheiro aplicado o autor tem-se sentido preocupado e ansioso, com o receio de não reaver, ou de não saber quando ia reaver o seu dinheiro;
21º E tem provocado no autor ansiedade, tristeza;
22.º O autor recebia extractos periódicos onde apareciam as obrigações como integrando carteiras de títulos»;
E resultaram não provados:
«Petição inicial:
- O funcionário do banco sabia que o A. não possuía qualificação, ou formação técnica que lhe permitisse à data conhecer os diversos tipos de produtos financeiros e avaliar, por isso, os riscos de cada um deles, a não ser que lhos explicassem devidamente.
- O autor tem sentido dificuldades financeiras para gerir a sua vida;
- Anda em permanente estado de “stress”, doente e sem alegria de viver, por ter sido desapossado das suas economias de uma vida, e sem perspectivas de futuro;
Contestação:
- 102º, 104º, 107º, 108º, 111º; - 113º: provado o que consta do facto 10º; 117º, 119º, 120º; 123º e 124º: provado a apenas o que consta dos factos provados em 4º a 7º dos factos provados; 125º, 126º, 127º.».
*
As questões a resolver são:
. manutenção da matéria de facto provada e não provada («E…» assumiu ou não a garantia do capital investido pelo Autor e este recebeu aviso de débito após a subscrição do produto);
. violação de dever de informação pelo recorrente;
. consequência de tal eventual violação – direito do recorrido em obter restituição da quantia por si entregue -;
. prescrição do direito do recorrido.
*
2.2). Dos argumentos do recurso.
A). Da alteração da matéria de facto.
A1). Factos provados 2.º, 6.º, 8.º, 16.º, 18.º, 19.º.
Em todos estes factos o que está em causa é a parte em que dos mesmos consta que o então «E…» teria garantido o capital subscrito pelo recorrido.
O recorrido assim o afirmou em declarações de parte; a testemunha F…, então funcionário da referida entidade bancária, acaba por mencionar na parte final do seu depoimento quase esta situação mas não na íntegra.
Sendo certo que esta testemunha foi referindo que o produto era apresentado como sendo uma aplicação financeira do próprio banco, garantida por este, acaba por referir que o que era transmitido é que se tratava de capital garantido e os clientes assumiam que seria da parte do «E…».
Aliás, face ao que a testemunha menciona, o que existia era tudo menos a apresentação de um produto, o que havia era a apresentação (via telefone) de um produto sem se referir que eram obrigações (muito menos subordinadas, classificação que a testemunha, segundo a própria, nessa altura não sabia o que significava), com capital garantido a uma taxa «muito boa».
Ou seja, o que se mencionava é que estava em causa um produto financeiro do próprio «E…» com capital garantido mas daí a se poder concluir que o «E…» referia, através deste funcionário, que seria esse Banco quem iria pagar o investimento pensamos que não há prova.
Não só pelo que foi dito pela testemunha como por não faz sentido que se assumisse tão levemente em tão poucas (ou praticamente nenhumas) explicações uma responsabilidade longínqua – dez anos -, e eventualmente numa situação hipotética de o emitente das obrigações não ter capacidade para reembolsar o capital e ainda assim agir em substituição da «D…».
A testemunha acaba por referir o que se oferecia era um produto do «E…», totalmente seguro, com garantia de capital, levando a crer que o próprio assumia o reembolso mas não que, em caso de o real emitente não o poder reembolsar então o «E…» surgia em sua substituição.
Deste modo, pensamos que efetivamente se devem alterar os factos provados em causa para a seguinte redação:
2.º «Em maio de 2006 o gerente do Banco Réu da agência de Aveiro disse ao autor, que tinha uma aplicação em tudo igual a um depósito a prazo, com capital garantido e com rentabilidade assegurada, com juros a 4,5% e prazo de 10 anos.».
6.º «O autor autorizou a subscrição, por lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência.».
8.º «Se o A. tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações D1…, produto de risco e que o capital não era garantido, não o autorizaria.».
18.º Um dos argumentos invocados pela Direção Comercial do E… e que os funcionários da rede de balcões do banco R. repetiam junto dos seus clientes, como o fez com o A., era o de que se tratava de um investimento seguro e, por isso, com o reembolso do capital investido e juros assegurado.»
19º «As orientações e comunicações internas existentes no E… e que este transmitia aos seus comerciais nos respetivos balcões consistiam em afirmar a segurança da aplicação financeira em causa, a sua solidez, a boa rentabilidade e assegurar que era garantido o capital investido.».
E resulta não provado:
«O «E…» tenha sido apresentado pelo gerente da agência de Aveiro como garante da aplicação financeira em causa.».
«O E…», através de seu gerente da agência de Aveiro, tenha mencionado ao Autor que iria reembolsar o capital e juros.».
No que concerne ao facto 111.º, da contestação, o mesmo foi dado como não provado e o seu teor é:
«No mês seguinte ao da operação o Autor recebeu por correio, em casa, um aviso de débito correspondente à subscrição efetuada.».
E, efetivamente, não há prova desta factualidade: não está junto aos autos esse aviso nem a testemunha do Réu afirmou que foi enviada pois mencionou que era suposto ser enviado mas isso não é suficiente para se provar o envio e o recebimento desse documento.
Mantém-se assim essa factualidade não provada.
*
Não há necessidade de repetir o elenco de factos provados e não provados por a alteração ter sido mínima.
*
B). Do direito.
Em termos de aplicação de direito aos factos, é vasto o elenco de argumentos apresentados por tribunal recorrido e as partes envolvidas pelo que não nos alongaremos na apreciação.
Entre Autor e «E…» agora na veste do atual recorrente, foi celebrado um acordo que culmina na subscrição por aquele de obrigações no valor total de 150.000 EUR (facto provado 4), pelo prazo de dez anos, com início em maio de 2006 (facto provado 2).
Uma subscrição de uma obrigação equivale a um empréstimo de dinheiro à entidade emitente, a qual fica obrigada à restituição do capital no prazo contratado, acrescido da remuneração à taxa estabelecida.
A relação que se tem de analisar é a que liga o recorrido-Autor/cliente, ao então «E…», pois foi este que se apresentou a comercializar o produto e atuou junto do recorrido-Autor no âmbito da sua atividade de intermediário financeiro (o «E…» surge a mediar a oferta das obrigações junto dos seus clientes).
A emissão de obrigações é um valor mobiliário (artigo 1º, b), do C.V.M.) pelo que o Banco atuou como um intermediário financeiro nessa compra/venda de obrigações – artigos 289.º, n.º 1, a), 290.º, n.º 1 a) e b) e 293.º, n.º 1, a), do mesmo C. V. M., e 1.º, n.º 2, e 2.º, n.º 1, Decreto-Lei 69/2004, de 25/03.
Ao recorrido-Autor foi apresentado um produto pelo então «E…» no sentido de que a rentabilidade estava assegurada pois não havia risco, com o capital garantido, rentabilidade assegurada, igual a um depósito a prazo (facto provado 2), não tendo havido explicação sobre quem era o emitente (D…), e que afinal havia risco de não reembolso do capital e juros nem lhe sendo explicado que estavam em causa obrigações nem o que eram as obrigações que estava a subscrever – factos provados 4.º, 5.º, 8.º, 12.º -.
Se não lhe foi explicado que estava a subscrever obrigações, também não houve informação sobre que as mesmas que estava a subscrever eram subordinadas, o que resulta também do facto provado 15.º.
Com este conhecimento convicção, o Autor adquiriu as obrigações.
Cumpre agora saber se o «E…» enquanto intermediário financeiro a agir nestes moldes, ou assumiu uma obrigação contratual de reembolso de capital ou se, agindo em tal qualidade, violou obrigações decorrentes, sendo responsável pela sua conduta, ou se não tem qualquer responsabilidade perante o recorrido-Autor.
Menezes Cordeiro, in «Direitos dos Valores Mobiliários», II, Coimbra Editora, página 45, refere que, nesta matéria da responsabilidade do intermediário financeiro há que ponderar, confrontando os seus pressupostos, se o seu enquadramento deve ser feito pelo instituto da responsabilidade delitual por violação de direitos absolutos ou disposições legais de proteção (artigos 483.º e seguintes do C. C.), ou obrigacional, pelo incumprimento das obrigações (artigos 798.º e seguintes, do C. C.), «ou se se deve inseri-la no âmbito das categorias de responsabilidade que têm contribuído para abalar a rigidez da repartição entre estas duas categorias, como a da responsabilidade pré-contratual, a responsabilidade por informações e a responsabilidade civil do gestor de negócios…».
Calvão da Silva, «Direito Bancário», página 335, dá-nos uma orientação para uma das hipóteses, ao referir que a relação de clientela é uma relação comercial complexa e duradoura, e todos os contratos ou negócios que envolvem as partes acarretam também obrigações acessórias de cuidado ou deveres de proteção cominados por acordo dos contraentes, pela lei ou pela boa-fé, para satisfação do interesse do credor; a violação dos princípios de confiança e lealdade mútua das partes, na negociação, conclusão, execução ou pós-extinção de uma operação financeira, traduz responsabilidade contratual.
O n.º 1 do artigo 7.º, do C. V. M. refere que a informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas organizadas de negociação, às atividades de intermediação financeira, à liquidação e à compensação de operações, a ofertas públicas de valores mobiliários e a emitentes, deve ser completa, verdadeira, atual, clara, objectiva e lícita.
O artigo 74.º, do Regime Geral das Instituições de Crédito e Sociedades Financeiras, na redação à data do DL 298/92 de 31/12, afirma que nas relações com os clientes, os administradores e os empregados das instituições de crédito devem proceder com diligência, neutralidade, lealdade e discrição e respeito consciencioso dos interesses que lhes estão confiados.
Atuando como intermediário e sendo o recorrido-Autor cliente do «E…» com conta aberta na agência (facto 1.º), tem o Banco o dever de informação decorrente desde logo do princípio da boa-fé (artigo 304.º, n.º 2 do C. V. M. - «nas relações com todos os intervenientes no mercado, os intermediários financeiros devem observar os ditames da boa-fé, de acordo com elevados padrões de diligência, lealdade e transparência» -).
Aqui, mais do que no regime civil (artigo 487.º, n.º 2, do C. C.), fixa-se um padrão que tem por referência uma pessoa muito prudente (Gonçalo dos Santos, A responsabilidade civil do intermediário financeiro, 2008, página 201).
Estipula ainda o artigo 312.º, n.º, 1 do C. V. M., relativamente ao período anterior à formação do contrato, que se deve garantir uma «tomada de decisão esclarecida e fundamentada» quanto aos «riscos especiais envolvidos nas operações a realizar», sendo a extensão da obrigação de informar tanto maior quanto menor o grau de conhecimentos e de experiência do cliente.
Quando alguém faz um empréstimo, e estando concretamente em causa emissão de obrigações a favor de entidade financeira ou bancária, quem empresta o dinheiro (aqui recorrido) tem de ser cabalmente informado sobre todos os aspetos essenciais desse contrato desde logo a quem está a emprestar para poder aquilatar da futura capacidade dessa beneficiária em efetuar o reembolso e assim ter noção dos riscos que está a assumir e se os pretende assumir.
Além do mais, é para nós manifesto que o recorrente tinha de informar que produto o seu cliente estava a subscrever (obrigações) sendo insuficiente a indicação de que se estava a subscrever algo semelhante a um depósito a prazo.
Assim, no caso em análise, essa informação não foi prestada de todo, nada se explicando sobre o que se estava subscrever, quem era a emitente das obrigações («D…»), nem os riscos que o capital poderia sofrer nem sequer o modo correto como poderia ser pedido o reembolso – facto provado 6 -.
O recorrido não só não foi devidamente esclarecido sobre a quem emprestava dinheiro como foi induzido a ficar convencido de que não havia risco algum e que estava a investir num produto do próprio Banco – facto 7.º -.
Como já acima referimos, esta garantia dada pelo Banco não tem, para nós, o sentido jurídico de «assunção de garantia», mas antes um sentido comum – como «D…» integrava no seu ativo o «E…», acabava por ser este a responder por tudo -.
Assim, para nós, não há responsabilidade do ora Autor por ter assumido uma dívida – artigo 595.º, do C. C. -.
Mas o Autor não foi devidamente esclarecido quanto à entidade (única) obrigada ao reembolso, nem quanto ao produto que subscreveu em concreto nem em abstrato, nem quanto ao risco de não haver reembolso.
Não tendo sido prestadas tais informações e que deveriam ter sido, existe, para nós, uma violação muito grave do dever de informação por parte do intermediário financeiro (no caso concreto, quase que se pode mencionar que praticamente tudo fez o «E…» para preencher todos os requisitos de maior gravidade) pois tal se lhe impunha sendo que a Banca tem de cumprir todos os seus deveres e traçar todos os cenários possíveis, mais ou menos previsíveis.
É certo que, em 2006, pode pensar-se que provavelmente não se teria de informar o cliente que podia haver uma insolvência do «E…» pois não só o funcionário não o saberia e por ser algo, dois anos antes de suceder, que a administração tivesse de comunicar aos seus colaboradores.
Mas o certo é que na nota informativa que consta a fls. 44 e seguintes, realizada por «D…» a fls. 46 se menciona expressamente a situação de possível falência do emitente o que é totalmente ajuizado e ponderado já que quem vai subscrever as obrigações tem de ter conhecimento do que pode suceder ao seu investimento e se se informar se encontra a empresa emitente das obrigações (algo que também consta na referida nota informativa – fls. 70 a 76 -) ainda mais esclarecer o potencial cliente.
Concluímos assim, tal como o tribunal recorrido, que houve culpa grave do «E…», ora recorrente na violação desse dever de informação que pode dar origem a responsabilidade, para nós, enquadrada ao nível da responsabilidade pré-contratual – artigo 227.º, do C. C. – foi na fase de formação do contrato, prévia à sua celebração, que foram omitidas as informações não havendo óbice, na nossa visão, que se aplique tal regime mesmo após a formação do contrato e sua execução (Pires de Lima e Antunes Varela, Código Civil Anotado, I, página 215, Ana Prata, «Notas Sobre Responsabilidade Pré-Contratual», página 180).
*
Analisando a questão da prescrição do direito do recorrido, havendo culpa grave do intermediário financeiro, não se pode nunca aplicar o prazo curto de prescrição fixado no artigo 324.º, nº. 2, do C. V. M., havendo que, à partida, se outro não houvesse, aplicar o prazo geral de prescrição de vinte anos (artigo 309.º, do C.C.), prazo esse notoriamente não preenchido pois mesmo tomando como base a data de celebração do contrato (maio de 2006), a citação do Réu ocorreu em 06/03/2017 – fls. 20 – pelo que se interrompeu o prazo em curso (artigo 323.º, n.º 1, do C. C. -.).
Podendo o reembolso do capital ser pedido em 2016 (a data concreta desse ano não consta dos factos provados), seria esse momento o início do momento em que o direito podia ser exercido – artigo 306.º, nº. 1, do C. C. -, iniciando-se então o prazo de prescrição e não quando há nacionalização do «E…» pois esse ato não implica que o direito do recorrido já pudesse ser exercido.
Mas, uma vez que no caso se aplicou o artigo 227.º, n.º 1, do C. C., e porque o seu n.º 2 remete para o prazo de prescrição de três anos previsto no artigo 498.º do C.C., sabendo-se que o reembolso teria de ocorrer em 2016, o que se tem como seguro é que nessa altura, não o tendo recebido, o recorrido ficou a saber do direito que lhe assistia.
Antes de o não receber pode ter ficado ciente de dificuldades da emitente mas só quando se apercebe que não foi reembolsado, passa a saber que terá um direito a reclamar um determinado valor por outro motivo que não o regular cumprimento contratual.
Se houvesse outro momento de conhecimento pelo recorrido competia ao recorrente prová-lo (artigo 342.º, n.º 2, do C. C.), prova essa que não se fez.
Ocorrendo a citação em 2017, com o conhecimento em 2016, também não existe a apontada prescrição.
*
Concluída a existência de culpa grave do dever de informação por parte do «E…» para com o recorrido, há que atentar no seguinte:
. o artigo 304.º-A, do C.V. M. na versão vigente à data da celebração do contrato determina que:
«. 1 - Os intermediários financeiros são obrigados a indemnizar os danos causados a qualquer pessoa em consequência da violação dos deveres respeitantes à organização e ao exercício da sua atividade, que lhes sejam impostos por lei ou por regulamento emanado de autoridade pública.
. 2 - A culpa do intermediário financeiro presume-se quando o dano seja causado no âmbito de relações contratuais ou pré-contratuais e, em qualquer caso, quando seja originado pela violação de deveres de informação.»
No caso concreto, estando em causa a falta de prestação de informação relevante pelo «E…» ao recorrido e inserindo-se essa falta de informação no momento prévio à celebração do efetivo contrato, como já referimos, tal entidade bancária violou aquele dever de informação no âmbito de uma relação pré-contratual, assim se entrando no âmbito do disposto no artigo 227.º, do C. C., com violação das regras de boa-fé (informação omitida), presumidamente culposa (citado artigo 304.º-A, n.º 2, do C. V. M. e também artigo 799.º, do C. C.).
O dano patrimonial traduzir-se-á na falta de devolução do capital e o nexo de causalidade entre a violação do dever de informar e o dano decorre da situação de, por força das informações erradamente prestadas e da ausência das demais, a parte ter contratado o investimento, algo que não faria se estivesse devidamente informada.
O dano indemnizável é aquilo que o lesado não teria sofrido se não fosse a lesão, ou seja, o valor que não recebeu pelo não reembolso do capital investido, a saber 150.000 EUR – artigo 562.º do C. C. – sendo que como houve a efetiva celebração do contrato, pode também o lesado pedir os valores que deixou de auferir em virtude da mencionada ilicitude, ou seja, os valores de juros (lucros cessantes) a que teria direito e que não recebe por a entidade efetivamente obrigada (ao contrário do que lhe foi transmitido) não lhe pagar esse valor (veja-se Ac. da R. L. de 22/02/2018, www.dgsi.pt onde se descreve jurisprudência neste sentido).
No que respeita ao valor do reembolso, os factos provados não são, para nós, muito elucidativos do mesmo pois assenta-se que houve um investimento de 150.000 EUR (facto provado 4.º) e que houve 100.000 EUR que não foram reembolsados (facto provado 13.º), condenando-se depois na restituição de 150.000 EUR, com indicação por extenso de 50.000 EUR.
Pensamos que, por um lado, se trata de um lapso pois na decisão, na fundamentação jurídica, volta a referir-se que o investimento foi de 150.000 EUR (fls. 238) e, por outro lado, nenhuma das partes suscita qualquer questão concreta sobre se o valor a reembolsar era esse ou outro pelo que se tem por definitivo que o que está em causa é saber se deve ou não a condenação incidir sobre 150.000 EUR (na contestação, bem como no julgamento, esta questão foi mencionada, afigurando-se que houve um investimento inicial de 250.000 EUR em cinco obrigações de 50.000 EUR cada uma e depois, nesta ação, estarão em causa três obrigações – 50.000 EUR x 3 -).
Está claramente demonstrada a ilicitude (falta de prestação de informação), a culpa (presumida e não afastada pelo recorrente) e o nexo de causalidade:
. o Autor autorizou a subscrição, por lhe ter sido dito pelo gerente que o capital era garantido, com juros semestrais e que poderia levantar o capital e respetivos juros quando assim o entendesse, bastando avisar a agência com a antecedência – facto provado 6.º -;
. se o Autor tivesse percebido que poderia estar a dar ordem de compra de obrigações D1…, produto de risco e que o capital não era garantido, não o autorizaria - facto provado 8.º -.
Uma vez que se atingiu a data de vencimento do investimento e o mesmo não se efetuou, provado que houve violação culposa do dever de informação pelo intermediário financeiro e que por causa da mesma o recorrido se desapossou de 150.000 EUR que, quando deveria receber, não recebeu, o dano está consumado.
Se na data de reembolso este tivesse sido efetuado pela entidade emitente ou por uma outra entidade em sua substituição, haveria na mesma violação do dever de informação mas não havia dano a indemnizar.
Outra questão poderia ser a de perceber se, além desta causalidade do dano de 150.000 EUR, não poderia haver uma outra que também causava dano ao investidor, por exemplo, a insolvência de «D…», ocorrida em 29/07/2016 (consulta do portal citius).
E afigura-se que também essa situação poderia provocar um dano ao recorrido pois muito provavelmente, por falta de liquidez da insolvente/emitente, o reembolso não se efetuaria total ou parcialmente mas isso pressupunha uma outra causa para o dano – incumprimento pelo emitente da sua obrigação de reembolso que assim causava um prejuízo para o subscritor, direcionada para outra entidade e com uma também diferente causa de pedir (incumprimento contratual – artigo 798.º e seguintes do C. C. -).
Mas isso não afasta a causalidade de a omissão de um dever de informação em relação ao dano que o subscritor tem – se este não celebrava a subscrição se estivesse devidamente informado, não sofria o dano de ficar desembolsado do capital pois não o teria entregue -, havendo assim um ressarcimento que tem por fonte o início de toda a relação que se estabeleceu entre cliente e intermediário financeiro.
Na outra situação (incumprimento pelo emitente) a causa encontra-se na fase de plena execução do contrato, mesmo até na parte final (reembolso do empréstimo).
O nexo de causalidade, tal como previsto no artigo 563.º, do C. C., não exige que a causa para o dano tenha de ser exclusiva (Acs. S. T. J. de 29/06/2004, 06/03/2007 e R. C. de 20/1072015, todos em www.dgsi.pt -).
O artigo 562.º, do C. C. estatui que «quem estiver obrigado a reparar um dano deve reconstituir a situação que existiria, se não se tivesse verificado o evento que obriga à reparação» e o artigo 564.º, do mesmo diploma que «o dever de indemnizar compreende não só o prejuízo causado, como os benefícios que o lesado deixou de obter em consequência da lesão.».
O dano a ressarcir é, como já referimos, o montante entregue para aquisição das obrigações – 150.000 EUR –, sendo este o dano emergente; no caso concreto não há prova de lucros cessantes – investimentos que teria deixado de realizar e rendimentos que iria auferir com aquela quantia, os quais nem foram alegados.
Como já referimos, a subscrição de obrigações configura um mútuo, ficando o subscritor titular de um direito de crédito sobre o emitente; visando a indemnização em causa reconstituir a situação ex ante à subscrição, o que sucede é que o subscritor deixa de ser titular desse direito de crédito contratual pois a sua situação patrimonial vai ser (é, no caso de pagamento da indemnização) reconstituída como se não tivesse existido, passando a ser credor com base em responsabilidade extracontratual em relação a outra entidade que não a emitente.
E, se assim é, então, por um lado, o subscritor das obrigações não pode fazer seus os rendimentos que as mesmas lhe proporcionaram pois a isso implica a restituição ex ante sob pena de se estar não a restituir a situação anterior à subscrição mas sim a fazer-se cumprir o contrato à custa de quem não tem essa obrigação legal (ora recorrente que não emitiu as obrigações).
A remuneração que o produto previa, se não for recebida, não pode ser vista, na nossa opinião, como lucros cessantes e assim ter o recorrido direito a recebê-las e a fazer sua a quantia já recebida; os lucros cessantes são antes aqueles rendimentos que se deixaram de receber por causa da falta de informação, sendo aquela outra remuneração o que se recebe por o contrato estar a ser cumprido.
Por isso, o recorrido tem direito a receber os 150.000 EUR de capital que entregou e os juros moratórios mas essa indemnização tem de ser deduzida da remuneração que anteriormente recebeu (em valor que se desconhece) desde, ao que se presume, 2006 até novembro de 2015 - factos provados 2.º, 10.º e 11.º -.
Esta questão é mencionada, ainda que não de modo muito direto, pelo recorrente quando afirma que não está provado que se tenha tornado impossível receber o montante investido nas obrigações e que a sua condenação no pagamento da integralidade do valor desembolsado pelo recorrido é excessiva – conclusão 25 -; assim mencionando o recorrente este «excesso» de condenação, neste tribunal de recurso interpreta-se esta alegação conferindo-lhe esta qualificação.
Neste sentido, veja-se o Ac. da R. P. de 23/05/2018, nota 10, também em www.dgsi e o Ac. da R. L. de 18/06/2019, no mesmo sítio.
Aliás, este último Acórdão determinar que se deve proceder, em incidente de liquidação, ao cálculo da diferença entre o que o aí subscritor recebeu pela remuneração e que excedesse valor dos juros que o Autor teria recebido se o capital estivesse aplicado num depósito a prazo no mesmo período e ainda se se deduz o valor das obrigações que o subscritor detinha; não concordamos, com elevado respeito, com esta última conclusão pois, como referimos, o Autor já não é detentor de direito de crédito sobre a emitente, logo não é detentor de qualquer obrigação eficaz, ainda que possa ter na mão algum documento que o comprove. Em possível fase reclamação de créditos na insolvência, este Autor já não tem a qualidade de credor perante a emitente, logo não há qualquer valor a deduzir neste aspeto.
Quanto à comparação com o juro obtido com a constituição de depósito a prazo, nos presentes autos não está provado que o recorrido iria constituí-lo se não tivesse subscrito as obrigações.
Deste modo, a condenação do recorrente deve ser alterada para ser condenado a pagar a quantia que se vier a apurar em incidente de liquidação nos termos dos artigos 358.º, n.º 2 e 609.º, n.º 2, do C. P. C., tendo por base os valores recebidos pelo recorrido desde o início da subscrição até novembro de 2015 que serão abatidos ao valor de capital e juros moratórios a receber pelo aqui recorrido.
*
3). Decisão.
Pelo exposto, julga-se parcialmente procedente o recurso e, em consequência, altera-se a decisão recorrida, condenando-se a Ré a pagar ao Autor a quantia que se apurar em incidente de liquidação quanto aos valores recebidos por este desde o início da subscrição em causa até novembro de 2015, sendo tais valores a abater ao valor de capital de 150.000 EUR e juros moratórios fixados na sentença recorrida.
Custas do recurso a cargo de recorrente e recorrido na proporção de 3/4 e 1/4, respetivamente.
Registe e notifique.

Porto.10-12-2019
João Venade
Paulo Duarte
Amaral Ferreira