Acórdão do Tribunal da Relação do Porto
Processo:
1257/13.2TTPNF.P1
Nº Convencional: JTRP000
Relator: JERÓNIMO FREITAS
Descritores: REMIÇÃO DA PENSÃO
REVISÃO DA PENSÃO
ATUALIZAÇÃO DA PENSÃO
APLICAÇÃO DA LEI NO TEMPO
Nº do Documento: RP201612151257/13.2TTPNF.P1
Data do Acordão: 12/15/2016
Votação: UNANIMIDADE
Texto Integral: S
Privacidade: 1
Meio Processual: APELAÇÃO
Decisão: NEGADO PROVIMENTO
Indicações Eventuais: 4ª SECÇÃO (SOCIAL), (LIVRO DE REGISTOS N.º 249, FLS.374-381)
Área Temática: .
Sumário: I - Tendo a pensão inicialmente fixada sido obrigatoriamente convertida em capital de remição, só com a alteração da pensão em função do agravamento reconhecido no presente incidente de revisão é que esta passou a ser uma pensão actualizável.
II - Sendo certo que no cálculo da pensão que passou a ser devida terá de atender-se à retribuição auferida pelo sinistrado à data do acidente de trabalho, uma vez que foi com base neste que se calculou a pensão inicial, tal conduzirá a que o valor da pensão que se obtém é exactamente aquele que se obteria se a pensão fosse calculada então. Portanto, em termos reais, esse valor está, em regra, está desvalorizado.
III - As prestações pecuniárias devidas ao sinistrado, nas quais se integram as pensões anuais e vitalícias, são um substituto do seu salário (total ou parcial) e, logo, na totalidade ou em parte, o seu meio de subsistência.
IV - Através da instituição da regra da actualização das pensões o legislador procurou assegurar um mecanismo que atenuasse os efeitos decorrentes da degradação do valor real das pensões ao longo do tempo, por efeito da desvalorização da moeda e da inflação. São essas mesmas precisas razões que levam à manutenção dessa regra, no que aqui importa sendo de ter presente que o legislador tomou posição expressa quanto à sua aplicação mesmo nos casos em que houve lugar à remição parcial ou total da pensão inicialmente fixada, ao dispor o art.º 77.º, alíneas d), da Lei n.º 98/ 2009, que a remição não prejudica “A actualização da pensão remanescente no caso de remição parcial ou resultante de revisão de pensão”.
V - Não terá sido propósito do legislador, pois não seria consentâneo com o princípio da unidade do sistema jurídico (art.º 9.º do Código Civil), que a actualização só fosse aplicada para futuro, ou seja, a partir do momento em que é devida a pensão revista. A proceder-se assim, estar-se-ia a considerar uma pensão desvalorizada como ponto de partida válido.
VI - Por esta ordem de razões, também nestes casos em que a pensão inicialmente remida vem posteriormente a dar origem a uma pensão (revista) anual e vitalícia actualizável, deve levar-se em conta a desvalorização do valor real ocorrida por efeito do tempo entretanto decorrido entre a fixação de uma e da inflação, impondo-se que se actualize a diferença entre o valor daquela primeira e o desta última, na medida em que tal tenha sido devido por força da lei.
Reclamações:
Decisão Texto Integral: APELAÇÃO n.º 1257/13.2TTPNF.P1
SECÇÃO SOCIAL

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO
I.RELATÓRIO
I.1 Na presente acção especial, emergente de acidente de trabalho, na qual é sinistrado B… e Ré C… - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. – actualmente D… - COMPANHIA DE SEGUROS, S.A. - veio aquele, em 09/03/2015, requerer a realização de exame médico de revisão do coeficiente de incapacidade que lhe foi atribuído, alegando alteração da sua situação clínica.
Admitido o incidente de revisão, realizou-se o exame médico de revisão, vindo o Senhor Perito Médico do tribunal a entender que o sinistrado se encontra afetado de uma IPP de 22,5%, estando incapaz para o exercício da sua profissão habitual.
Devidamente notificadas as partes, a seguradora requereu a realização de exame por Junta Médica, tendo apresentando os respectivos quesitos.
Realizou-se o requerido exame por Junta Médica, tendo os Srs. Peritos que a compuseram concluído, por unanimidade, que o Sinistrado era portador de espondilolistesis L5-S1 antes do acidente de trabalho acontecer; e, que esse estado prévio foi agravado em consequência direta e necessária do acidente de trabalho sobre que versam os presentes autos e lesões dele emergentes, encontrando-se o mesmo afetado com uma IPP de 22,5%, estando incapaz para o exercício da sua profissão habitual, caso tudo seja de imputar ao acidente.
A seguradora apresentou reclamação do auto de exame médico, a qual veio a ser indeferida.
I.2 Subsequentemente o tribunal a quo proferiu decisão, nos termos previstos no art.º 145.º n.º 6, do CPT, dela constando, no que aqui releva, o seguinte:
-«(..)
Deste modo, tendo em conta este parecer unanime e, bem assim as restantes informações clínicas constantes dos autos sobre a natureza das lesões, a gravidade destas, as suas sequelas, o estado geral, a idade e a profissão do sinistrado, sendo certo que inexiste fundamento que permita um entendimento diverso do sufragado, por unanimidade, pelos senhores peritos médicos no referido exame por junta médica, o qual se encontra, aliás, devidamente fundamentado e alicerçado na Tabela Nacional de Incapacidades, quando para mais se verifica que esse parecer já tinha sido aquele que tinha sido emitido pelo senhor perito médico que realizou o exame médico de revisão e ponderando no disposto no art. 11º, n.º 2 da Lei n.º 98/2009 e nas considerações jurídica que acima já se explanaram a propósito do regime legal que estatui, não se afigurando necessária a realização de outras diligências, considero que o sinistrado, em consequência direta e necessária do acidente de trabalho sofrido e das lesões e sequelas dele emergentes se encontra atualmente e desde 09 de março de 2015, data em que foi instaurado o incidente de revisão (cfr. fls. 40), afetado de uma IPP de 22,5%, estando incapaz para o exercício da profissão habitual, restando decidir quais as consequências jurídicas decorrentes desse agravamento.
A este propósito impõe-se referir que se tem entendido que o incidente de revisão de incapacidade não gera uma nova pensão mas uma alteração do montante da pensão já fixada, pelo que “no cálculo de uma pensão consequente de alteração de incapacidade deve usar-se a mesma fórmula que se usou para o cálculo da pensão inicial” – cfr. Ac. RP, de 26/06/2008, in base de dados da DGSI.
Trata-se da mesma pensão reparatória do acidente de trabalho e não de uma nova pensão, tal como se alcança do preceituado no n.º 6 do art. 145º do Cód. Proc. Trab., onde se estatui que “… o juiz decide por despacho, mantendo, aumentando ou reduzindo a pensão ou declarando extinta a obrigação de a pagar”.
No caso, por sentença proferida a fls. 30 a 33, a Ré seguradora foi condenada a pagar ao sinistrado o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de 454,21 euros, devida a partir de 17/07/2013, com base num salário anual do sinistrado de 1.450,00 euros x 14 + 120,83 euros x 11 e uma IPP de 3%.
À data do acidente sobre que versam os autos, em 07/05/2013, encontrava-se em vigor a Lei n.º 98/2009, de 04/09, pelo que é este o regime legal aplicável aos autos.
Tendo em consideração a IPP de 22,5%, com incapacidade absoluta para a profissão habitual que agora afeta o sinistrado e desde 09/03/2015, nos termos do disposto no art. 48º,n.ºs 1, 2 e 3, al. b) daquela Lei n.º 98/2009, de 04/09, assiste ao sinistrado o direito a receber uma “pensão anual e vitalícia compreendida entre 50% e 70% da retribuição, conforme a maior ou menor capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível”.
Nos termos do disposto no art. 67º,n.º 3 da mesma Lei n.º 98/2009, de 04/09, “a incapacidade permanente absoluta para o trabalho habitual confere ao beneficiário direito a um subsídio fixado entre 70% e 100% de 12 vezes o valor de 1,1 IAS, tendo em conta a capacidade funcional residual para o exercício de outra profissão compatível”.
Deste modo, tendo em consideração a retribuição anual auferida pelo sinistrado à data do acidente, a IPP de 22,5%, com incapacidade absoluta para a profissão habitual que agora o afeta, e desde 09/03/2015, o sinistrado, por referência à data de 17/07/2013 (data subsequente à data da alta e em que, por conseguinte, lhe foi fixada a pensão originária), aquele teria direito a uma pensão anual, vitalícia e atualizável de 11.787,88 euros, caso então o sinistrado já se encontrasse afetado com aquela IPP de 22,5%, com incapacidade absoluta para a profissão habitual, devida a partir de 17/07/2013.
Acontece que o sinistrado apenas se encontra afetado com a referida IPP de 22,5%, com incapacidade absoluta para a profissão habitual desde 09/03/2015, o que significa que para lhe fixar a pensão que lhe é devida a partir de 09/03/2015, tendo por referência aquele grau de IPP de 22,5%, com incapacidade para a profissão habitual impõe-se atualizar a pensão anual, vitalícia e atualizável de 11.787,88 euros, que seria devida ao sinistrado desde 17/07/2013 (data em que é devida a pensão originária) até 09/03/2015 (data a partir da qual aquele se encontra efetivamente afetado com a referida IPP de 22,5%, com incapacidade absoluta para a profissão habitual) para assim se determinar o montante dessa pensão que lhe é devido a partir do momento em que se encontra efetivamente afetado com a referida IPP de 22,5%, com incapacidade absoluta para a sua profissão habitual.
Note-se, contudo, que aquando da fixação da pensão originária, o sinistrado encontrava-se afetado de uma IPP de 3%, pelo que, nos termos da sentença proferida a fls. 30 a 33, a Ré seguradora foi condenada a pagar-lhe, e pagou-lhe, o capital de remição de uma pensão anual de 454,21 euros, pelo que sob pena de se incorrer numa situação de enriquecimento sem justa causa do sinistrado à custa da Ré seguradora, que já lhe pagou o capital de remição daquela pensão de 454,21 euros, impõe-se deduzir à pensão de 11.787,88 euros que seria devida ao sinistrado caso o mesmo, no momento da fixação daquela pensão originária, já se encontrasse afetado com a IPP de 22,5% com incapacidade absoluta para a sua profissão habitual, o que não estava, aquela pensão de 454,21 euros que já lhe foi arbitrada e paga pela Ré seguradora, sendo que é sobre essa diferença, ou seja, sobre a pensão anual, vitalícia e atualizável de 11.333,67 euros - (11.787,88 euros – 454,21 euros) -, que há-de recair aquela atualização.
Assim procedendo, tendo presente que a Portaria n.º 378-C/2013, de 31/12, fixou o valor da atualização em 0,4% a partir de 01/01/2014, aquela pensão anual de 11.333,67 euros terá de ser actualizada, a partir de 01/01/2014, para a pensão anual e vitalícia e atualizável de 11.379,00 euros.
Resulta do exposto que por via de a partir de 09/03/2015, o sinistrado estar afetado com uma IPP de 22,5%, com incapacidade permanente absoluta para o exercício da sua profissão habitual, assiste-lhe o direito a obter a condenação judicial da Ré seguradora a pagar-lhe a pensão anual, vitalícia e atualizável de 11.379,00 euros, devida a partir de 09/03/2015.
(..)
Deste modo, nos termos do disposto no artigo 145º do Cód. Proc. Trabalho, decido:
a- que o sinistrado B…, em consequência direta e necessária do acidente de trabalho sobre que versam os autos, lesões e sequelas dele emergentes, se encontra afetado de uma desvalorização permanente parcial para o trabalho (IPP) de 22,5%, com incapacidade permanente absoluta para o seu trabalho habitual (IPATH) desde 09/03/2015;
b- condeno a Ré “C… – Companhia de Seguros, S.A.” a pagar ao sinistrado, B… a pensão anual, vitalícia e atualizável de 11.379,00 euros (onze mil trezentos e setenta e nove euros), devida a partir de 09/03/2015, a ser paga pela Ré àquele adiantada e mensalmente, até ao 3º dia de cada mês, correspondendo cada prestação mensal a 1/14 da pensão anual devida ao sinistrado, sendo que os subsídios de férias e de natal, no valor de 1/14 cada da pensão anual, serão pagos nos meses de junho e novembro de cada ano, acrescendo sobre as prestações já vencidas, juros de mora, à taxa de 4% ao ano, desde a data de vencimento de cada uma dessas prestações já vencidas até integral e efetivo pagamento.
Mais condeno aquela Ré “C… – Companhia de Seguros, S.A.”, S.A.” a pagar ao sinistrado, B…, a quantia de 4.247,11 euros (quatro mil duzentos e quarenta e sete euros e onze cêntimos), a título de subsídio de elevada incapacidade permanente, acrescida de juros de mora, à taxa de 4% ao ano, a partir de 09/03/2015 até integral e efetivo pagamento.
Custa pela Ré seguradora.
Fixo ao presente incidente o valor de 146.439,09 euros.
(..)».
I.3 Inconformado com esta decisão a seguradora apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram sintetizadas nas conclusões seguintes:
1 – No âmbito do incidente de revisão de incapacidade, foi atribuída ao recorrido uma IPP de 22,5 com IPATH, por agravamento das lesões.
2 – Considerando o agravamento da incapacidade, o Mm.º Juiz a quo alterou o montante da pensão anual para 11.787,88€ com efeitos a partir de 09/03/2015 data de entrada do requerimento a pedir a revisão, a que foi deduzida a pensão anteriormente fixada e já remida de 454,21€.
3 – A recorrente foi assim condenada ao pagamento de uma pensão anual, vitalícia e atualizável de 11.333,67€, com efeitos a partir de 09/03/2015.
4 – Pese embora a pensão só seja devida desde a data do pedido de revisão, é entendimento do Mm. Juiz a quo que a aludida pensão seja atualizada como se a nova pensão estivesse a ser fixada desde o início, ou seja, no caso em apreço desde 17/07/2013.
5 – Consequentemente a douta sentença de que se recorre condenou a seguradora a liquidar ao sinistrado a pensão anual e vitalícia de 11.333,67€, atualizada para 11.379,00€ tendo em conta a Portaria 378-C/2013 de 31/12, devida desde 09/03/2015.
6 – Porém, a recorrente discorda deste entendimento, no tocante à data de efeito da atualização, por ser desconforme ao regime legal aplicável previsto no D.L. 668/75 de 24/11, e art.ºs 77º al. d), 82º e 183º da Lei 98/2009 de 04/09.
7 – Resultando a pensão dos presentes autos de uma incapacidade permanente de 3%, não era a mesma suscetível de atualização, tendo aliás sido remida.
8 – Por força da remição obrigatória a pensão inicialmente devida extinguiu-se, renascendo em virtude da revisão da incapacidade e porque a pensão revista integra os pressupostos legais para efeitos de atualização, a mesma será atualizável tendo em consideração os coeficientes estabelecidos para as futuras atualizações a que houver lugar após 09/03/2015, doutra forma estaríamos a pôr em causa os efeitos jurídicos da extinção da pensão que ocorreu com a remição inicial.
9 – A situação pretendida pelo Tribunal a quo teria sentido nos casos em que a pensão anterior ao incidente de revisão já era atualizável e aqui sim, a pensão revista que se mantivesse dentro dos pressupostos legais para efeitos de atualização, deveria ter em conta os coeficientes anteriormente aplicáveis desde o seu início.
10 –Ainda que perfilhando a fundamentação do Mm.º Decisor quando refere que a pensão revista deve ser calculada do mesmo modo que o foi a pensão inicial, não deixa de ser menos verdade que, no caso em apreço, a pensão inicialmente atribuída não era atualizável.
11 – Aliás a aludida pensão foi remida extinguindo-se o direito à pensão, pelo que, tendo sido aumentado o valor global da pensão em virtude da revisão da incapacidade, o que é devido ao sinistrado deverá corresponder à diferença entre o valor da pensão anual inicial e o valor da pensão anual revista.
12 – Ora, se para o cálculo da nova pensão impõe a lei a dedução da pensão anteriormente remida, nem por isso a atualização da atual pensão terá de ser reportada à data da alta inicial.
13 - Assim, pelas invocadas e justificadas razões, a douta decisão recorrida não fez a melhor interpretação e aplicação do D.L. 668/75 de 24/11 e art.ºs 77º al. d), 82º e 183º da Lei 98/2009 de 04/09.
Termos em que se requer seja revogada a douta decisão recorrida e substituída por outra que condene a recorrente a pagar ao recorrido a pensão anual e vitalícia de 11.333,67€, com efeitos a partir de 09/03/2015, atualizável nos termos legais, tendo em consideração os coeficientes estabelecidos para as futuras atualizações a que houver lugar após aquela data.
I.4 O Recorrido sinistrado não veio apresentar contra alegações.
I.5 A Digna Procuradora-Geral Adjunta junto desta Relação emitiu parecer nos termos do art.º 87.º 3, do CPT, pronunciando-se pela improcedência do recurso, acompanhando a fundamentação da decisão recorrida.
I.6 Foi dado cumprimento ao disposto no art.º 657.º n.º2, CPC e determinou-se que o processo fosse inscrito para ser submetido a julgamento em conferência.
I.6 Delimitação do objecto do recurso
Sendo o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações apresentadas, salvo questões do conhecimento oficioso [artigos 87.º do Código do Processo do Trabalho e artigos 639.º, 635.º n.º 4 e 608.º n.º2, do NCPC, aprovado pela Lei n.º 41/2013, de 26 de Junho] a questão suscitada pelo recorrente para apreciação consiste em saber se o Tribunal a quo errou o julgamento na aplicação do direito, ao entender que a pensão devida em razão do agravamento das sequelas resultantes do acidente de trabalho, embora reportada à data do pedido de revisão - 09/03/2015-, deverá ser atualizada como se estivesse a ser fixada desde a data em passou a ser devida pensão ao sinistrado - 17/07/2013 -, tendo em conta a atualização legal prevista na Portaria n.º378-C/2013 de 31/12, que fixou o valor da atualização em 0,4% a partir de 01/01/2014.
II. FUNDAMENTAÇÃO
II.1. MOTIVAÇÃO DE FACTO
Os factos relevantes para a apreciação do recurso são exclusivamente os que constam no relatório.
II.2 MOTIVAÇÃO de DIREITO
A recorrente insurge-se contra a decisão recorrida por ter entendido que a pensão devida ao sinistrado em razão do agravamento das sequelas resultantes do acidente de trabalho, embora reportada à data do pedido de revisão - 09/03/2015-, deverá ser atualizada como se estivesse a ser fixada desde a data em passou a ser devida pensão ao sinistrado - 17/07/2013 -, tendo em conta a atualização legal prevista na Portaria n.º378-C/2013 de 31/12, que fixou o valor da atualização em 0,4% a partir de 01/01/2014.
Para a apreciação da questão importa ter em consideração o seguinte:
i) Em consequência do acidente de trabalho, ocorrido em 07/05/2013, o sinistrado ficou afectado por uma IPP de 3%, tendo a seguradora sido condenada a pagar-lhe o capital de remição de uma pensão anual e vitalícia de 454,21 euros, devida a partir de 17/07/2013, calculada com base num salário anual do sinistrado de 1.450,00 euros x 14 + 120,83 euros x 11 e naquele grau de incapacidade;
ii) O sinistrado requereu a revisão da incapacidade em 09/03/2015.
iii) No desfecho deste incidente de revisão, o Tribunal a quo decidiu que o sinistrado se encontra afetado de uma desvalorização permanente parcial para o trabalho (IPP) de 22,5%, com incapacidade permanente absoluta para o seu trabalho habitual (IPATH) desde 09/03/2015.
II.2.1 Para melhor compreensão da questão em apreço, afigura-se-nos pertinente começar por deixar umas breves notas sobre o regime da actualização das pensões devidas por acidente de trabalho – ou por doença profissional -, introduzido pela primeira vez na nossa ordem jurídica por via do Decreto-Lei n.º 668/75, de 24 de Novembro.
Como nos dá conta o respectivo preâmbulo, ao instituir esse regime, o legislador procurou acudir às consequências resultantes da “(..) flagrante desvalorização da moeda e consequente aumento do custo de vida” , que se verificava “(..) há largos anos, com especial incidência na última década”, sem que alguma vez se tenha procedido a qualquer actualização das pensões por acidente de trabalho ou doença profissional, situação que estava na base das “legítimas reclamações de todos os atingidos, que se viram através dos anos ignorados e abandonados (..)” pela Administração, impondo-se a “(..) correcção de forma progressiva de toda uma situação, por vezes dramática, que afecta algumas dezenas de milhares de pensionistas, alguns deles totalmente incapacitados para o trabalho e que têm vindo a receber pensões de escassas centenas de escudos”.
Justificava-se ter-se optado “apenas pela actualização dos casos iguais ou superiores a 30%”, invocando-se as dificuldades financeiras da época, e que seria uma dispersão financeira em flagrante prejuízo dos casos mais graves, caso se contemplassem todos os casos, nomeadamente, as desvalorizações inferiores a 30 %, que de um modo geral não representavam uma “flagrante redução efectiva na capacidade de ganho da vítima”.
Concretizando as opções proclamadas no preâmbulo, o art.º 1.º, vinha dispor que as pensões por acidentes de trabalho e doenças profissionais seriam calculadas com base no salário anual de 48.000$00, caso a retribuição anual fosse inferior a este valor. Ficavam de fora, isto é, não eram actualizáveis as pensões resultantes de incapacidades inferiores a 30% (art.º 2.º).
A actualização, em conformidade com os princípios enunciados naqueles artigos abrangia as “pensões já estabelecidas em tribunal do trabalho”, sendo “automática e imediata” caso a responsabilidade estivesse “a cargo de entidade seguradora”, mas devendo aquela “fazer a correspondente comunicação ao tribunal do trabalho e competindo ao Ministério Público promover eventuais rectificações”.
O regime de reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho constava então da Lei n.° 2127, de 3 de Agosto de 1965, regulamentada pelo Decreto n.° 360/71, de 21 de Agosto.
Por exclusão de partes, só seriam actualizáveis as pensões que não tivessem sido obrigatória ou facultativamente remidas, segundo as condições estabelecidas pela Base XXXIX da Lei 2127 e art.ºs 64.º, do Decreto-lei 360/71, e desde que respeitassem incapacidades iguais ou superiores inferiores a 30% (art.º 2.º do Decreto-Lei n.º 668/75, de 24 de Novembro).
A Lei n.º 2127, de 3 de Agosto de 1969, veio a ser revogada com a entrada em vigor da Lei n.º 100/97, de 13 de Setembro, depois regulamentada pelo Decreto-lei n.º 143/99, de 30 de Abril.
Como se sintetiza no acórdão de 3-03-2010, do Supremo Tribunal de Justiça, nesse novo quadro legal relativo à reparação dos danos emergentes de acidente de trabalho, “(..) as pensões emergentes de acidente de trabalho continuaram a ser susceptíveis de actualização quer nas situações em que o sinistrado se mostrasse afectado de uma incapacidade permanente – fosse ela parcial com coeficiente de desvalorização igual ou superior a 30%, fosse ela absoluta ou fosse ela absoluta para o trabalho habitual – quer nas situações em que do acidente viesse a resultar a morte do sinistrado e a pensão fosse fixada ao seu ou seus beneficiários, a menos que o valor da pensão correspondente a cada nas enunciadas situações fosse inferior a seis vezes o valor da retribuição mínima mensal garantida mais elevada à data da fixação da pensão, caso em que, e à semelhança do que sucede com as pensões por incapacidade permanente parcial inferior a 30%, seria obrigatoriamente remível (art. 56.º, da Lei n.º 143/99, de 30 de Abril, que veio a regulamentar a Lei 100/97, de 13 de Setembro). Tais pensões passaram, no entanto, a ser actualizadas nos mesmos termos em que o fossem as pensões do regime geral da segurança social, atento o disposto no art.º 6.º, do D.L. n.º 142/99, de 30 de Abril”. [Processo n.º 14/05.4TTVIS.C2.S1, Conselheiro Mário Pereira, disponível em http://www.dgsi.pt/jstj].
Em suma, na vigência da Lei 100/97, as pensões emergentes de acidente de trabalho continuaram a ser susceptíveis de actualização apenas para os casos de incapacidade permanente (fosse ela parcial com coeficiente de desvalorização igual ou superior a 30%, fosse ela absoluta ou fosse absoluta para o trabalho habitual), ou por morte – art. 39.º nº2 -, mas agora nos termos em que o forem as pensões do regime geral de segurança social, em conformidade com o art.º 6º do Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de Abril, cujo n.º1 começa por dispor: [1] O valor das pensões de acidentes de trabalho é actualizado anualmente com efeitos a 1 de Janeiro de cada ano, tendo em conta os seguintes indicadores de referência: (..)”.
Com a publicação da Lei n.º 98/ 2009, de 4 de Setembro [regulamenta o regime de reparação de acidentes de trabalho e de doenças profissionais], foi revogada a Lei 100/97 e o respectivo regulamento (DL 143/99).
Contudo, o Decreto-Lei n.º 142/99, de 30 de Abril, não foi revogado - expressa ou tacitamente, continuando a reger as actualizações das pensões devidas por acidentes de trabalho.
Circunscrevendo-nos no âmbito da questão em apreço, importa apenas assinalar que no actual regime de reparação de acidentes de trabalho as condições de remição das pensões anuais e vitalícias devidas a sinistrados vieram a ser alteradas (art.º 75.º), tornando-se mais restritivas. E, consequentemente, alargou-se o leque de pensões anuais e vitalícias actualizáveis.
Pela relevância para o caso, releva ainda assinalar que de acordo com o disposto no artigo 77.º, da Lei n.º 98/ 2009, a remição não prejudica [al.b)] “[O] direito de o sinistrado requerer a revisão da prestação”, nem tão pouco [al. d)] “[A] actualização da pensão remanescente no caso de remição parcial ou resultante de revisão de pensão”.
II.2.2 A remição da pensão consiste no pagamento unitário de um conjunto de prestações que dizem respeito à pensão anual e vitalícia, normalmente paga em duodécimos. Dito de outro modo, consiste no pagamento antecipado da pensão, e de uma só vez, através de uma indemnização em capital calculada por aplicação das bases técnicas do capital da remição, bem como das respectivas tabelas práticas (art.º 76.º/1, da Lei 98/2009).
Consequentemente, a entrega do capital da remição extingue o direito à pensão devida para reparar a incapacidade laboral com base na qual foi calculada. Abrangerá a totalidade da pensão nos casos em que a remição é obrigatória (art.º 75.º/1), ou apenas a parte da pensão remida, nos casos em que é admitida, facultativamente, a remição parcial (art.º 75.º/2).
Portanto, no caso vertente, com o pagamento do capital de remição correspondente à pensão inicialmente fixada, extinguiu-se o direito à pensão e a correspectiva obrigação da seguradora.
Mas como referimos acima, a remição não prejudica o direito de o sinistrado requerer a revisão da prestação. Justamente por isso, o sinistrado veio exercê-lo no presente incidente, vindo a obter o reconhecimento do agravamento da incapacidade, com a consequente modificação da capacidade de ganho, logo, determinando a alteração da prestação devida pela reparação do acidente de trabalho, “de harmonia com a modificação verificada”(art.º 70.º, da Lei 98/2009).
Inicialmente fora-lhe atribuída uma IPP de 3%, mas no âmbito do presente incidente de revisão constatou-se existir agravamento da incapacidade para uma IPP de 22,5%, com IPATH, a qual foi fixada desde 09/03/2015.
Tendo-se extinguido o direito à pensão correspondente a uma IPP de 3% através da entrega do capital de remição, mas havendo agora lugar ao aumento do valor global da pensão em consequência do agravamento da incapacidade para uma IP de 22,5% com IPATH, o que é devido ao sinistrado deverá corresponder à diferença entre o valor da pensão anual inicial e o valor da pensão correspondente à incapacidade laboral que resulta da revisão.
Estamos perante a mesma pensão, sucedendo apenas que o valor é alterado “de harmonia com a modificação verificada”, conforme estabelece o art.º 70.º, da Lei 98/2009. Daí que, em consonância, o n.º6, do art.º 145.º do CPT, dispõe que “o juiz decide por despacho, mantendo, aumentando ou reduzindo a pensão ou declarando extinta a obrigação de a pagar”.
Como observa Leite Ferreira [Código de Processo do Trabalho Anotado, 4.ª edição, Coimbra Editora, 1996, p. 641] “A modificação da capacidade de ganho da vítima proveniente de agravamento, recaída ou melhoria da lesão ou doença não dá origem a uma incapacidade nova: opera, apenas, uma alteração da incapacidade preexistente pelo reconhecimento dum novo grau de incapacidade na incapacidade existente. Quer dizer: a incapacidade mantém-se a mesma embora diferente na sua intensidade ou dimensão pela atribuição ou fixação de um novo grau ou índice de desvalorização. Ora se a incapacidade se mantém, a pensão a estabelecer após a revisão não é também uma pensão nova”.
A actual Lei 98/2009, em termos similares às que a antecederam, não estabelece como deve proceder-se ao cálculo da pensão decorrente de incidente de revisão, quer venha a ser aumentada ou diminuída. Contudo, dentro dos princípios da lógica e por respeito ao princípio da unidade do sistema jurídico, é pacificamente entendido que são ponderados os mesmos critérios que foram considerados para a fixação da pensão inicial. Dito de outro modo, tratando-se de uma alteração de uma pensão anterior, o salário a atender no cálculo do valor da pensão que passa a ser devida em razão do agravamento ou melhoria, terá de ser aquele a que se atendeu na sentença que fixou a pensão inicial.
Tendo presente o caso em apreço, ocorrendo este novo cálculo num caso em que houve lugar ao pagamento do capital de remição, isto é, depois de resgatada a pensão devida pela IPP de 3% através do pagamento de uma quantia unitária correspondente à pensão que o sinistrado receberia até ao fim da vida, necessariamente haverá também que proceder à dedução do valor da pensão anual que serviu de base para o cálculo do capital de remição ao valor agora definido para a pensão agravada.
Esses procedimentos foram os seguidos pelo tribunal a quo, sem que nessa parte haja discordância da recorrente. Efectuado o cálculo da pensão devida em função da actual IPP de 22,5% com IPATH, foi obtido o valor de € 11.787,88, ao qual se deduziu o valor de € 454,21, este o montante da pensão anual (inicia) correspondente à IPP de 3%, com base no qual se procedeu ao cálculo do capital de remição, encontrando-se o valor de € 11.333,67, devido a partir de 09/03/2015 (data em que foi fixada a nova incapacidade, coincidente com a da apresentação do requerimento para o pedido de revisão).
Até aqui o decidido pelo Tribunal a quo não é questionado pela Recorrente. O ponto em divergência surge depois, dado que num passo seguinte, na consideração de se estar agora perante uma pensão anual e vitalícia actualizável - na medida em que está para além das situações em que é obrigatória a remição [art.º 75.º/1 da Lei 98/2009]-, o Tribunal a quo entendeu que o valor encontrado para a pensão após efecutada aquela dedução - € 11.333,67 – deverá ser actualizado, não só para o futuro, ou seja, após 09/03/2015, como será normal, mas antes desde a data em que passou a ser devida pensão ao sinistrado - 17/07/2013. E, nesse pressuposto, aplicou-lhe a atualização legal prevista na Portaria n.º378-C/2013 de 31/12, que fixou o valor da atualização em 0,4% a partir de 01/01/2014.
Entende a recorrente que a actualização só é devida a partir da data em que ocorreu o agravamento que determinou a alteração da pensão inicialmente fixada, isto é, a partir de quando esta pensão –aqui aumentada – é devida, quando a lei determinar a sua actualização. Em suma, a partir de 09/03/2015.
Buscando na jurisprudência publicada encontram-se posições em ambos os sentidos. Contudo, deixa-se já esta nota, os casos subjacentes não são similares, apenas tendo em comum o agravamento.
No acórdão desta Relação de 07/03/2005 [proc.º n.º 0416936, Desembargadora Fernanda Soares, disponível em www.dgsi.pt], procurando dar resposta a essa questão afirmou-se o entendimento seguinte:
-“Antes do demais há que referir que uma coisa é a alteração do montante da pensão por força da revisão da incapacidade do sinistrado, e outra coisa é a actualização da pensão. Esta tem por fundamento a inflação ou a desvalorização da moeda e aquela a melhoria ou o agravamento das lesões ocorridas por força do acidente.
A lei de acidentes de trabalho não nos diz como se deve proceder à actualização de pensão que foi objecto de revisão, e cujo cálculo - resultante do incidente de revisão - deve obedecer ao efectuado na data da sua fixação inicial.
E na falta de elementos, e em homenagem ao princípio da unidade do sistema jurídico, se a «pensão revista» deve ser calculada do mesmo modo que a pensão inicial, então a sua actualização deve ser feita como se a «nova pensão» estivesse a ser fixada desde o início, não obstante a mesma só ser devida desde a data da sua alteração”
Nesse caso, inicialmente fora fixada ao sinistrado uma pensão anual e vitalícia, com início em 20.1.94, e com base na IPP de 35% e na incapacidade absoluta para o exercício da profissão habitual, a qual fora sucessivamente actualizada desde então e até ao incidente de revisão em que foi proferida a decisão recorrida, no qual foi fixada uma IPP de 50%, com incapacidade absoluta para a profissão habitual.
Esta mesma Relação e secção veio a pronunciar-se no mesmo sentido, em acórdão de 12/12/2005 [Proc.º 0513681, Desembargador Domingos Morais, disponível em www.dgsi.pt], acompanhando-se a posição afirmada naquele outro acórdão, como expressamente é mencionado no texto do aresto. No respectivo sumário fez-se constar o seguinte:
- «[I] A pensão devida ao sinistrado (em consequência de acidente de trabalho) que venha posteriormente a ser aumentada, por se ter verificado uma alteração da capacidade de ganho, é devida ao sinistrado a partir da data de entrada do requerimento de revisão da incapacidade.
[II] A pensão revista deve ser actualizada com referência à data inicialmente fixada ou à data em que se verifiquem os requisitos para a actualização, como se ela tivesse sido fixada numa dessas datas, embora só deva ser paga a partir da data da entrada em juízo do requerimento de revisão da incapacidade».
Sendo de referir que também neste caso se estava perante uma situação em que a pensão inicialmente fixada, devida desde 10.10.1995, tinha por base uma IPP de IPP de 32,24 e, logo, era uma pensão actualizável, uma vez que não fora, por a lei então vigente não o admitir, sujeita a remição obrigatória.
No mesmo sentido encontra-se ainda o Acórdão do STJ de 03/03/2010 [Proc.º n.º 14/05.4TTVIS.C2.S1, Conselheiro Mário Pereira, disponível em www.dgsi.pt], tendo-se consignado no respectivo sumário, no que aqui releva, o seguinte:
-«[IX] Para efeitos do cálculo da pensão decorrente de incidente de revisão – quando do mesmo decorra alteração da capacidade de ganho do sinistrado – são ponderados, exactamente, os mesmos critérios que o foram aquando do cálculo inicial, fixando-se a nova pensão (revista) tal-qual o fosse à data da alta.
[X] E, por respeito ao princípio da unidade do sistema jurídico, constante do art. 9.º, do Código Civil, se a pensão revista deve ser calculada do mesmo modo que o foi a pensão inicial então os coeficientes de actualização devem sobre a mesma incidir como se estivesse a ser fixada desde o início, não obstante apenas ser devida desde a data de entrada do requerimento que deu início ao incidente de revisão».
Assinala-se que também neste caso estava subjacente uma situação em que foi inicialmente fixada uma pensão anual e vitalícia, calculada em função de uma IPP que não impunha a obrigatoriedade da conversão em capital de remição, a ser paga doe uma só vez ao sinistrado. Portanto, também aqui tratou-se um caso em que a pensão inicialmente ficada fora sucessivamente actualizada até à data da prolação da decisão no âmbito de incidente de revisão, onde veio a ser proferida a decisão recorrida.
Passamos agora a fazer referência ao entendimento contrário.
Assim, em decisão de 01/03/2016, da Relação de Lisboa [Proc.º n.º 1737/06.6TTLSB.1.L1-4, Desembargador Leopoldo Soares, disponível em www.dgsi.pt], entendeu-se, conforme levado ao sumário, que “as actualizações da pensão só se registam a partir da data da fixação da nova incapacidade e consequente pensão (ou seja aquela em que foi apresentado o requerimento a solicitar a revisão) e não desde a data da fixação da pensão inicial”. Neste caso, -inicialmente, fora fixada uma IPP de 15% a partir da data da alta, ocorrida em 24.04.2006, e a entidade responsável condenada a pagar-lhe o capital de remição de uma pensão anual no valor de € 3.710,67, tendo sido entregue ao sinistrado o capital de remição no montante de € 48.951,16.
Nesse mesmo sentido veio a pronunciar-se de novo a Relação de Lisboa, em acórdão de 18-05-2016 [proc.º n.º 82/10.7TTSTB.L1-4, Desembargadora Filomena Manso, disponível em www.dgsi.pt], referindo-se ai, para além do mais, o seguinte:
No caso vertente, porém, verifica-se que o sinistrado só passou a estar afectado de uma incapacidade (IPATH) que lhe permite beneficiar de actualização da pensão, a partir do momento em que foi fixada a pensão revista, ou seja, em 17.5.2013, pelo que só a partir desta data está sujeita a actualizações.
E este entendimento não colide com o que foi seguido no Ac. do STJ de 3.3.2010 citado na decisão recorrida, já que neste a pensão inicial foi fixada com referência a uma incapacidade permanente absoluta (IPA), que lhe permitia desde então beneficiar da sua actualização (..)».
Como se percebe, também nesse caso estava e causa o agravamento de um pensão anual que inicialmente fora obrigatoriamente remida, tendo o respectivo capital de remição sido entregue ao sinistrado.
Aqui chegados, a questão que se coloca é a de saber se as distintas situações subjacentes aos referidos arestos justificam, ou não, as diferentes soluções que nos mesmos foram afirmadas. Isto é, se para os efeitos em causa, há que distinguir entre as situações em que a pensão anual e vitalícia foi sempre sujeita à regra da actualização, tendo em vista obstar à sua desvalorização, daquelas outras em que houve lugar à remição da pensão, com a entrega do respectivo capital ao sinistrado, e que só passaram a ser pensões actualizáveis na sequência de agravamento reconhecido em incidente de revisão, por então terem deixado de reunir os requisitos que implicariam a remição obrigatória.
Revertendo ao caso, relembre-se, que a pensão inicialmente fixada, tendo sido calculada com base numa IPP de 3%, foi obrigatoriamente remida, tendo o respectivo capital de remição sido entregue ao sinistrado.
Significa isto, pois, que até ao dia imediatamente anterior à data em que foi fixada a nova incapacidade - 09/03/2015 – o sinistrado encontrava-se já integralmente pago da pensão que lhe era devida, uma vez que recebeu o respectivo capital de remição. Mas não só, pois tratando-se do pagamento em uma só vez da pensão, na parte correspondente à IPP então verificada, o A. foi pago integralmente, ficando extinta a obrigação da entidade responsável. Justamente por isso, não era devida qualquer actualização da pensão, já que este procedimento tem em vista obstar aos efeitos da inflação ou da desvalorização da moeda, como causas externas de diminuição do valor real da pensão, o que não acontece quando o sinistrado recebe o capital de remição.
No caso vertente, só com a alteração da pensão em função do agravamento reconhecido no incidente de revisão é que esta passou a ser uma pensão actualizável e, quanto a este ponto sem que mereça dúvida, só a partir data em que tal foi reconhecido é que é devida o aumento da pensão.
Por outras palavras, a diferença entre a pensão anteriormente fixada e aquela que cabe agora fixar face ao agravamento da incapacidade só é devida para o futuro.
Porém, sendo certo que no cálculo da pensão que passou a ser devida terá de atender-se à retribuição auferida pelo sinistrado à data do acidente de trabalho, uma vez que foi com base neste que se calculou a pensão inicial, tal conduzirá a que o valor da pensão que se obtém é exactamente aquele que se obteria se a pensão fosse calculada então. Portanto, em termos reais, esse valor está, em regra, está desvalorizado. Estará mais ou menos, consoante o tempo decorrido entre a fixação da pensão inicial e a data a que se reporta a pensão revista, e os valores da inflação que entretanto se verificaram.
As prestações pecuniárias devidas ao sinistrado, nas quais se integram as pensões anuais e vitalícias, são um substituto do seu salário (total ou parcial) e, logo, na totalidade ou em parte, o seu meio de subsistência.
Através da instituição da regra da actualização das pensões o legislador procurou assegurar um mecanismo que atenuasse os efeitos decorrentes da degradação do valor real das pensões ao longo do tempo, por efeito da desvalorização da moeda e da inflação. São essas mesmas precisas razões que levam à manutenção dessa regra, no que aqui importa sendo de ter presente que o legislador tomou posição expressa quanto à sua aplicação mesmo nos casos em que houve lugar à remição parcial ou total da pensão inicialmente fixada, ao dispor o art.º 77.º, alíneas d), da Lei n.º 98/ 2009, que a remição não prejudica “A actualização da pensão remanescente no caso de remição parcial ou resultante de revisão de pensão”.
Muito embora a norma não o diga expressamente, cremos que ao falar na actualização da pensão remanescente resultante de revisão de pensão, terá o legislador tido em mente a sua aplicação de modo a alcançar-se em toda a plenitude o resultado pretendido com a actualização, isto é, que o sinistrado não se veja confrontado com um pensão desvalorizada, mercê do decurso do tempo e da inflação. Visto noutra perspectiva, não terá sido propósito do legislador, pois não seria consentâneo com o princípio da unidade do sistema jurídico (art.º 9.º do Código Civil), que a actualização só fosse aplicada para futuro, ou seja, a partir do momento em que é devida a pensão revista.
Na verdade, a proceder-se assim, estar-se-ia a considerar uma pensão desvalorizada como ponto de partida válido. E, logo, como assinala o STJ na fundamentação do acórdão acima citado [de 3-03-2010], “(..) resultaria a incongruência de, após vários anos desde a fixação inicial da pensão, vir a ser fixada uma pensão revista que, na medida em que, resultante do cálculo a que obedeceu a sua fixação inicial, não reflectiria a desvalorização da moeda entretanto ocorrida”.
Por esta ordem de razões, com o devido respeito por opinião contrária, afigura-se-nos que também nestes casos - em que a pensão inicialmente remida vem posteriormente a dar origem a uma pensão (revista) anual e vitalícia actualizável -, que se deve levar em conta a desvalorização do valor real ocorrida por efeito do tempo entretanto decorrido entre a fixação de uma e da inflação, impondo-se que se actualize a diferença entre o valor daquela primeira e o desta última, na medida em que tal tenha sido devido por força da lei. Só assim de obterá um valor consentâneo com a realidade actual, sem prejuízo para o sinistrado e, diga-se, sem que resulte qualquer acréscimo indevido para a entidade responsável pelo pagamento da pensão.
Por fim, como já decorre do que acima se expôs, naturalmente que a pensão revista só é devida a partir da data em que foi fixada a nova incapacidade.
Foi esse o procedimento observado pelo Tribunal a quo e, logo, não merece censura a decisão recorrida, improcedendo o recurso.
III. DECISÃO
Em face do exposto, acordam os Juízes desta Relação em julgar o recurso improcedente, confirmando a sentença recorrida.
Custas do recurso a cargo da recorrente, atento o decaimento.

Porto, 15 de Dezembro de 2016
Jerónimo Freitas
Nelson Fernandes
Fernanda Soares
__________
SUMÁRIO
I. Tendo a pensão inicialmente fixada sido obrigatoriamente convertida em capital de remição, só com a alteração da pensão em função do agravamento reconhecido no presente incidente de revisão é que esta passou a ser uma pensão actualizável.
II. Sendo certo que no cálculo da pensão que passou a ser devida terá de atender-se à retribuição auferida pelo sinistrado à data do acidente de trabalho, uma vez que foi com base neste que se calculou a pensão inicial, tal conduzirá a que o valor da pensão que se obtém é exactamente aquele que se obteria se a pensão fosse calculada então. Portanto, em termos reais, esse valor está, em regra, está desvalorizado.
III. As prestações pecuniárias devidas ao sinistrado, nas quais se integram as pensões anuais e vitalícias, são um substituto do seu salário (total ou parcial) e, logo, na totalidade ou em parte, o seu meio de subsistência.
IV. Através da instituição da regra da actualização das pensões o legislador procurou assegurar um mecanismo que atenuasse os efeitos decorrentes da degradação do valor real das pensões ao longo do tempo, por efeito da desvalorização da moeda e da inflação. São essas mesmas precisas razões que levam à manutenção dessa regra, no que aqui importa sendo de ter presente que o legislador tomou posição expressa quanto à sua aplicação mesmo nos casos em que houve lugar à remição parcial ou total da pensão inicialmente fixada, ao dispor o art.º 77.º, alíneas d), da Lei n.º 98/ 2009, que a remição não prejudica “A actualização da pensão remanescente no caso de remição parcial ou resultante de revisão de pensão”.
V. Não terá sido propósito do legislador, pois não seria consentâneo com o princípio da unidade do sistema jurídico (art.º 9.º do Código Civil), que a actualização só fosse aplicada para futuro, ou seja, a partir do momento em que é devida a pensão revista. A proceder-se assim, estar-se-ia a considerar uma pensão desvalorizada como ponto de partida válido.
VI. Por esta ordem de razões, também nestes casos em que a pensão inicialmente remida vem posteriormente a dar origem a uma pensão (revista) anual e vitalícia actualizável, deve levar-se em conta a desvalorização do valor real ocorrida por efeito do tempo entretanto decorrido entre a fixação de uma e da inflação, impondo-se que se actualize a diferença entre o valor daquela primeira e o desta última, na medida em que tal tenha sido devido por força da lei.

Jerónimo Freitas